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RESUMO: O trabalho parte do pressuposto de que Nietzsche é o pensador que se rebelou contra a
tradição do pensamento surgido na Grécia Antiga. O pensamento tinha unicamente, como guia a
razão. Nietzsche, a partir da análise da tragédia antiga, inaugura um caminho para a superação da
visão. Visão que tem o conhecimento centrado na razão, num otimismo científico que nega a condição
do ser humano porque, ao estar submetido a regras da razão, o ser vive na ilusão, num otimismo que
inviabiliza e nega a sua vontade. Assim, o objetivo deste trabalho centra-se no papel da tragédia antiga
e da música no pensamento de Nietszche e na sua crítica e superação do modelo de conhecimento que
Platão e Eurípides representam.
ABSTRACT: This study reflects Nietzsche as the thinker who dared to deny the Ancient Greek
tradition of thinking. Well, Nietzsche proposes a new way of overwhelming vision through his studies
on ancient tragedy. In fact, this vision for him his its centre on reason, which reveals this scientific
optimism that happens to deny human being’s condition as he or she, when is ruled by laws of reason,
he or she tends to live under illusion that may deny his or her will due to his or her optimism. In short,
the aim of this work is to study the role of either ancient tragedy or the music on Nietzsche’s thinking
and his criticism and how he managed to overcome Plato’s and Euripides’s models of knowledge.
AS ORIGENS
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Mestre em Filosofia. Professor da Faculdade de Artes do Paraná (FAP). Membro do Grupo de Pesquisa
Interdisciplinar em Artes.
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mundo inacessível para quem não saiu da caverna1. A caverna representa o mundo do visível
e mutável que percebemos pelos sentidos, o mundo real não é esse, é um mundo superior que
independe para existir deste mundo aparente. O acesso a esse mundo exige um grande esforço
e abdicação dos prazeres corpóreos é preciso buscar a verdade e a correta virtude enquanto
cidadão, a verdade e o agir moral não estão separados. Platão cria a dicotomia entre razão e
sentimentos e acusa a segunda de afastar-nos do caminho do bem que é causa de tudo que é
justo e belo.
A ruptura que Platão criou no livro X da República entre arte e conhecimento, para a
constituição do seu projeto de sociedade perfeita, exclui a arte da cidade por promover a
mímesis, a imitação. A arte era um simulacro da verdade e afastava o cidadão do caminho da
verdade por falar ou mostrar coisas falsas, como sendo verdadeiras. A poesia, entendida como
toda a cultura oral ou escrita que não seja a filosofia, enganava quem não tivesse o antídoto
que é o de conhecer o caminho da verdade.
Assim, surge no século IV antes de cristo, a dicotomia que bane a arte do reino do
conhecimento. Uma vez que, Platão no decorrer do Livro X mostra que a escultura, a pintura
e a poesia são mímesis. A escultura deforma a realidade ao não seguir as proporções; a pintura
mostra um ângulo que não representa o real; a poesia sofre a crítica mais dura ao ser
considerada como não educadora afastando o cidadão do caminho da verdade e da virtude e
ressaltando os sentimentos mais infantis.
1
Alegoria apresentada no Livro VII da República, no qual Platão supõe pessoas acorrentadas desde o
nascimento no interior de uma caverna, onde a realidade são as sombras projetadas no seu interior.
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A POSIÇÃO DE NIETZSCHE
E por que abandonaste Dionísio, por isso Apolo também te abandonou: afugenta
todas as paixões de seu covil e as conjura em teu círculo, afila e aguça como se
deve uma dialética sofística para as falas de teus heróis - também os teus heróis
têm paixões arremedadas e mascaradas e proferem apenas falas arremedadas e
mascaradas. (NIETZSCHE, 2003, p. 72).
Portanto, a maneira de superarmos esta condenação, imposta por uma nova visão da
condição humana, a saber, não mais guiada pelo mito e pela conjunção entre Apolo e Dionísio
e sim pela razão e a consciência, é resgatarmos o modo trágico dos gregos. Os Gregos sabiam
da condição trágica da vida e a suportavam pela cultura dionisíaca do teatro. A arte é elevada
à condição de único caminho para uma existência humana: a cultura trágica substitui a razão e
as normas morais.
A partir do resgate da Grécia antiga, Nietzsche realiza a crítica à razão ocidental. A
questão fundamental para Nietzsche é explicar como os gregos conseguiram superar o
pessimismo que se origina com a própria condição humana de ser finito e habitar um mundo
assustador. Nietzsche, recuperando a sabedoria popular dos Gregos, o mito de Sileno, ilustra
esta condição.
Reza a antiga lenda que o rei Midas perseguiu na floresta, durante longo tempo, sem
conseguir capturá-lo, o sábio Sileno, o companheiro de Dionísio. Quando, por fim, ele
veio a cair em suas mãos, perguntou-lhe o rei qual dentre as coisas era a melhor e a mais
preferível para o homem. Obstinado e imóvel, o demônio calava-se; até que, forçado
pelo rei, prorrompeu finalmente, por um riso amarelo, nestas palavras: - Estirpe
miserável e efêmera, filhos do acaso e do tormento! Por que me obrigas a dizer-te o que
seria para ti mais salutar não ouvir? O melhor de tudo é para ti inteiramente inatingível:
não ter nascido, não ser, nada ser. Depois disso, porém, o melhor para ti é logo morrer.
(NIETZSCHE, 2003, p.36)
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De que forma os gregos conseguiram superar a visão pessimista de Sileno? Por que
continuar vivendo em um mundo tão assustador? Superaram esta condição ao criarem o
mundo dos deuses olímpicos e substituindo a “[...] primitiva teogonia titânica dos terrores, se
desenvolvesse, em morosas transições, a teogonia olímpica do júbilo, por meio do impulso
apolíneo da beleza[...]”(NIETZSCHE, 2003, p.37). A condição exposta por Sileno é
contornada, no sentido que a morte deve ser evitada e a vida preservada ao máximo. Neste
sentido, “Os deuses e heróis apolíneos são aparências artísticas que tornam a vida desejável,
encobrindo o sofrimento pela criação de uma ilusão. Essa ilusão é o princípio de
individuação”. (MACHADO, 2005, p.7)
Nietzsche faz a análise de três momentos na história da cultura grega antiga: teogonia
titânica, teogonia olímpica, tragédia grega. Esta análise pressupõe duas noções fundamental
Apolíneo e Dionisíacos, termos que se originam do deus Apolo e Dionísio. As duas noções
são tratadas, primeiramente isoladas. Na teogônia titânica Dionísio reina até seu
despedaçamento pelos titãs. Dionísio despedaçado da origem a individuação e ao sofrimento
que somente a arte, a música, pode torná-lo suportável.
Da essência da arte, tal como ela é concebida comumente, segundo a exclusiva categoria
da aparência e da beleza, não é possível derivar de maneira alguma, honestamente, o
trágico; somente a partir do espírito da música é que compreendemos a alegria pelo
aniquilamento do indivíduo. Pois só nos exemplos individuais de tal aniquilamento é
que fica claro para nós o eterno fenômeno da arte dionisíaca, a qual leva a expressão a
vontade em sua onipotência, por assim dizer, por trás do principium individuationis, a
vida eterna para além de toda aparência e apesar de todo o aniquilamento.
(NIETZSCHE, 2003, p101)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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