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A poesia não tem recuos e avanços. Ela – é, permanece.

Depois de retirar sua atuação “social”,


é impossível deixá-la sem a plenitude vital e humana, do aprofundamento, de ser autônoma. E
então? –Ela pode evidentemente aprofundar-se também naquelas esferas em que o sono atua
com tamanha intensidade. “Ousar” permanecer no sono, enriquecer-se em seu domínio,
comunicar-se com ele – nisto, se quiserem, é lenta certeza da poesia em si mesma – ela não
necessita que lhe façam “indicações”, que lhe “permitam” e que a controlem (também é
assim, e em concordância, o seu leitor).
Será que a poesia perde ou adquire algo em tais condições? Seria desejável deixar isso como
uma pergunta formulada. O mais importante: ela sobrevive. Expulse-a pela porta, ela se
esgueira pela janela.

Guenádi Aigui. Sono e poesia.

Deixe-me colocar-lhe uma questão, senhor Breton. Todos conhecemos a noite e os dois lados
que todas as noites têm: a noite dentro de casa e a noite fora de casa. Ou seja: há a
tranquilidade e o esperado e há, ainda, o medo e a estranheza. Claro que se poderá sempre
dizer que a poesia não se encontra nem em um lado nem no outro: a noite tem dois lados e a
poesia é a porta da casa no momento em que é aberta e o escuro cobre a relva e o céu. Mas
quando alguém tem medo, deve correr para casa; e quando sente tédio, deve correr para a
parte de fora da noite. E a poesia, que parece uma coisa parada, resolve, ao mesmo tempo, o
tédio e o medo; o que é bom e dois, sendo uma única, a poesia.

Gonçalo M. Tavares. O Senhor Breton e a entrevista.

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