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Santa Beatriz da Silva

Fundadora da Ordem da Imaculada Conceição (contemplativa)

(também conhecidas por Concepcionistas Franciscanas)

Comemoração: 17 de Agosto

A família

"...educada num profundo espírito e virtudes cristãs."

De nobilíssima família portuguesa, Beatriz da Silva e

Menezes, nasceu na graciosa e ensolarada vila

alentejana de Campo Maior, no ano de 1437. Filha de D.

Rui Gomes da Silva, Alcaide Mor da já mencionada vila

de Campo Maior e Ouguela e de Dona Isabel de

Menezes, que era filha de D. Pedro de Menezes que foi

Governador da Praça de Ceuta, nessa altura

pertencente à coroa dos reis de Portugal. Os pais de

Beatriz pertenciam à primeira nobreza e estavam

ainda aparentados com a família real.

Beatriz passou a sua infância e adolescência nesta

nobre vila, rodeada do carinho de seus pais que a

educaram num profundo espírito e virtudes cristãs.

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Foi a oitava de doze irmãos: Pedro, Fernando, Diogo,

Afonso, João (Beato Amadeu da Silva, fundador do

ramo franciscano dos frades Amadeus, hoje extinto),

Branca, Guiomar, Beatriz, Maria, Leonor, Catarina e

Méscia.

Na Corte

"...enchia de fervor com o seu exemplo".

Para Beatriz decorria tranquila a vida no velho solar de

Campo Maior. Totalmente entregue a Deus, tinha

esquecido o mundo com toda a sua agitação, embora

vivesse nele.

Mas o Senhor tinha-a criado para coisas maiores que

esta vida calma, e, para isso, tinha de a fazer passar

pelo crisol do sofrimento, como costuma sempre fazer

com os eleitos do seu coração.

Quando chegou aos 18 anos, Beatriz cujos predicados

e virtudes raramente se vêm em humana criatura,

deram motivo à rainha Dona Isabel, filha de D. Duarte,

rei de Portugal, e esposa em segundas núpcias de D.

João II de Castela para levar por sua dama, para a

Corte, a jovem Beatriz, que era sua parente muito

chegada. Primeiro para Lisboa e a quando do casamento

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com D. João II de Castela, para Tordesilhas. A

virtuosa dama era o mimo, e todo o desvelo da rainha

que não podia estar sem ela um só instante. Só a jovem

dama conseguia moderar alguns dos excessos da

temperamental rainha de Castela que, se enchia de

fervor com o seu exemplo e, quando a via entre as

Senhoras e Damas da Corte de Castela, tinha grande

satisfação de que a sua portuguesa brilhasse, como a

mais bela das rosa entre as flores, e resplandecesse,

como lua entre as estrelas. Diz-nos uma biografia da

Santa, que Beatriz "era formosíssima, prudente,

afável, inteligente, composta e de muita gentileza", e

outro autor: "que era bela, maravilhosamente bela, até

ao deslumbramento".

O Ciúme

"...procurava viver em recolhimento, dando todo o seu

amor e o maior tempo possível a Deus, o verdadeiro

Senhor do seu coração."

Costuma dizer-se que há males que vêm para bem, e

vice-versa, que há bens que vêm para mal. E foi

precisamente o caso de Beatriz. Porque a felicidade

humana é inconstante e falível, não podiam durar por

muito tempo os excessos de carinho e de atenção da

rainha para com a jovem dama portuguesa.

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A sua beleza, graciosidade e doçura, levou muitos

nobres a pretendê-la para casar, aos quais, ela negou

sempre a sua mão.

Mas, o facto mais doloroso, foi causado pelo ciúme da

rainha que, chegou ao cúmulo de a fechar numa cofre,

para que Beatriz ali morresse asfixiada. Tudo por

ciúme, devido às atenções que o rei dava à jovem, que,

de forma alguma, procurava atrair sobre si as

atenções de quem quer que fosse, muito pelo

contrário, procurava viver no recolhimento, dando

assim todo o seu amor e o maior tempo possível ao Pai

Eterno, o verdadeiro Senhor do seu coração.

A visão

"...a sua vocação: fundar uma Ordem com o fim de

honrar a Imaculada Conceição da Virgem Santa Maria".

Foi, porém, naquela prisão, que a Santa recebeu em

plenitude o "Dom de Deus", e lhe foi dada a conhecer a

sua futura missão, a sua vocação: a de fundar uma

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Ordem, com o fim de honrar a Imaculada Conceição da

Virgem Santa Maria.

Nos três dias que permaneceu naquela escura prisão,

apareceu-lhe a Santíssima Virgem com o menino nos

braços. Trazia vestido um hábito todo branco e

escapulário da mesma cor, e a cobri-la um manto azul.

Era vontade de Deus e de Maria que, Beatriz, fundasse

uma Ordem destinada a defender e honrar o Mistério

da Imaculada Conceição.

O inesperado

"...a rainha deu-lhe licença e liberdade para ir viver

aonde mais fosse de sua vontade".

O desaparecimento da jovem dama, provoca no seu tio

D. João de Menezes (que também se encontrava na

corte de Tordesilhas, ao serviço de D. João II de

Castela), grande preocupação, até porque ele sabia do

grande ciúme que a rainha nutria por Beatriz e temia o

pior.

À pergunta de D. João de Meneses a Dona Isabel,

sobre o paradeiro da sobrinha, a rainha respondeu-lhe

«que viesse vê-la», e levou-o ao sítio onde a deixara

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encerrada, certa de que, ao abrir o cofre, a

encontraria morta.

Viva a viu aparecer, e mais bela do que nunca! A rainha,

pasmando do que tinha diante de si, não atinava que

dizer - conta soror Catarina - e, assombrada duma

coisa tão inesperada, não queria dar crédito aos seus

próprios olhos, que viam o que naturalmente era

impossível sucedesse.

Com este espanto, e, ao mesmo tempo, para se livrar

da ocasião de voltar a criar problemas à dama Beatriz,

a rainha deu-lhe licença e liberdade para ir viver aonde

mais fosse de sua vontade.

Certamente que esta «experiência de

encarceramento» foi, na vida de Beatriz, um marco

importante que a levou a dar uma grande viragem no

rumo da sua vida e a levou a abandonar a vida palaciana

da corte de Tordesilhas e a retirar-se para Toledo.

Em viagem

"Este encontro deixou-lhe na alma uma grande

consolação e abriu-lhe o entendimento às realidades

sobrenaturais".

A viagem para Toledo foi longa, arriscada e muito

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difícil, o que revela a personalidade forte e decidida

de Beatriz.

É significativo, o episódio que ocorreu durante a

viagem e que, todos as biógrafos da santa, são

unânimes em relatar.

"Foi o caso que, no caminho para Toledo, ao passar por

um monte (Beatriz), viu sair de trás dele dois

religiosos da Ordem do meu Padre S. Francisco, e,

julgando fossem enviados da rainha a fim de a

confessarem para que depois lhe fosse tirada a vida,

entrou, em grande temor; e não foi muito, que assim

fizesse, quem havia experimentado os arrojos do

zeloso peito duma rainha. (...) Acercaram-se os

religiosos, e, um deles, que por seu modo parecia

português, saudando-a na sua língua materna, lhe

perguntou a causa da sua aflição e pena".

Depois de saberem dos temores da nobre viajante,

tranquilizaram-na os dois frades e falaram-lhe da

fundação da Ordem da Imaculada Conceição. E, assim,

foram conversando durante a viagem para Toledo. Mas

tal como os discípulos de Emaús, também os dois

frades desapareceram aos olhos de Beatriz e da sua

comitiva, quando esta insistiu com eles, para que

partilhassem com ela a ceia na próxima pousada.

Este encontro deixou-lhe na alma uma grande

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consolação e abriu-lhe o entendimento às realidades

sobrenaturais e compreendeu que os seus

companheiros de viagem eram Santo António de Lisboa

e São Francisco de Assis.

Em São Domingos "O Real"

"Florescia em todas as virtudes, era tida por santa e

obrava milagres".

Depois do sucedido e, com a autorização da rainha,

Beatriz, retirou-se para a cidade de Toledo, onde

viveu, voluntariamente, em completo encerramento, no

Convento Dominicano de São Domingos O Real, ou O

Antigo. Ali passou trinta longos anos, como pisadera,

longe de tudo e de todos os seres queridos e

totalmente desprendida das vaidades terrenas e

desejos mundanos. E, como a formosura do seu rosto

foi a causa de tantas discórdias na corte, cobriu o

rosto com um véu branco durante o resto da sua vida,

salvo em raríssimas excepções.

No mar, o navio é presa fácil do risco dos ventos, se,

porém, chegar a um calmo e tranquilo porto, já não

teme calamidades, mas está seguro. Também Beatriz,

enquanto se encontrou no meio dos homens, contou

com tribulações, riscos e embates contra a sua

sensibilidade. Mas, ao chegar ao porto do silêncio, para

ela preparado, não mais teve medo, e entrega-se toda

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nas mãos de Deus, confiando no Seu amor sem medida.

Não fazia parte das religiosas que compunham a

comunidade, mas, ali vivia como uma delas, em completa

vida de clausura. Como nos canta soror Catarina:

Beatriz "Florescia em todas as virtudes e comia

parcamente, que era tida por santa e obrava milagres,

que se distinguiu sempre por sua humildade e

obediência às superioras" do dito Convento de São

Domingos O Real e a sua vida era verdadeiramente

exemplar. Das rendas, que possuía, reservava uma

moderada parte para o tratamento, e decência da sua

pessoa, e, tudo o mais, o gastava em esmolas e outras

obras de piedade.

Há almas que aspiram a uma perfeição mais elevada, a

uma união mais íntima com Deus. E só pela entrega

total de si mesmo se entra neste caminho de perfeição

e de união com Deus. Contudo, quem diz "entrega

total", diz "renúncia total". Deus de todos espera o

desapego completo de tudo o que não seja Ele. O mais

pequeno vínculo impede a alma de levantar voo. Por

isso, é urgente perder tudo, para ganhar O Tudo. É

urgente entregar tudo o que temos e somos sem

hesitação.

O mercador de pérolas do Evangelho, vendeu todos os

seus bens para comprar a pérola mais fina que tivera a

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sorte de encontrar. Beatriz, por sua vez, renunciou à

sua luminosa beleza, à sua posição social, à sua fortuna

e à possibilidade de fazer um casamento invejável, aos

olhos do mundo, para se fechar num Convento, onde

nem sequer era freira. Assim, sem vínculo nenhum,

poderia levantar voo e voar na imensidão do amor de

Deus e saciar a sua sede na fonte da Água Viva.

Preparando-se desta forma, para a Obra a que fora

destinada pela Imaculada.

A espera

"...mantinha-se simplesmente à escuta do que Deus lhe

ordenava".

A nós, que vemos os acontecimentos no seu aspecto

meramente exterior, sem muitas vezes, poderem

apreender-se as realidades profundas que essas

aparências encobrem, parecerá incompreensível esta

demora tão grande em realizar planos que se sabia

serem divinos. Que significavam tantos anos de

aparente inacção, segundo os nossos juízos? Que fazia

Beatriz da Silva e Meneses em São Domingos O Real,

onde, nem sequer era religiosa? Porque esperava?

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Ora, tais circunstâncias, levam-nos a crer que ela se

mantinha simplesmente à escuta do que Deus lhe

ordenava. Ia-se exercitando na conquista de uma das

virtudes mais difíceis de praticar quando se deseja um

bem que tarde em vir; a paciência, na perfeita

conformidade com a Vontade de Deus.

"Poucas vezes uma fundadora terá sido preparada tão

profunda e prolongadamente para a sua missão

carismática"

Quando ela atingiu o grau de perfeição na virtude

requerido para empreendimento tão sublime, corria o

ano de 1484, recebeu então a ordem aguardada

durante trinta longos anos entre os muros de São

Domingos "O Real". E logo se seguiu um período de

intensa actividade, a esses longos anos vividos na

obscuridade e no silêncio do claustro.

Os preparativos

"Com a sua admirável generosidade, passou a dar-se

sem reservas, ao cumprimento da missão que Deus lhe

confiava".

Dizem os biógrafos da Santa fundadora, que lhe

apareceu outra vez a Mãe de Deus, tornando a

mostrar-lhe como haveria de ser o hábito que trariam

vestido as suas religiosas, pois, já o havia feito, a

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quando da visão no cofre em Tordesilhas, e, ainda, para

lhe dizer que tinha chegado o tempo de pôr mãos à

realização da Obra. Tinha soado a hora para a qual

Beatriz da Silva orientara o curso de toda a sua vida,

na qual concentrara todos os seus esforços e, para a

qual, dirigira todas as suas aspirações. Urgia, agora,

dedicar à realização da sua Obra todas as forças e o

tempo que lhe restava viver na terra.

Com a sua admirável generosidade, passou a dar-se

sem reservas, ao cumprimento da missão que Deus lhe

confiava. Finalmente, o sonho que iluminara toda a sua

vida, o desejo que o seu coração acalentava de

espalhar pelo mundo a devoção à Imaculada Conceição,

e honrar através da sua futura Ordem, este mistério

tão grande e tão sublime, começava a realizar-se e a

criar forma.

A fundação

"Terão como carisma próprio o da Imaculada

Conceição".

Ajudada pela rainha Isabel "a Católica", que lhe deu os

palácios chamados de Galiana, por terem outrora

pertencido à princesa Galiana, filha de um rei mouro

que os mandara construir propositadamente para esta

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sua filha, bem como a Igreja de Santa Fé, situada

junto ao Palácio de Galiana. Beatriz deixa o Convento

de São Domingos O Real, onde viveu 30 longos anos,

para se instalar com mais doze donzelas de muita

virtude e nobreza, no local que a rainha lhes oferecera.

Entrou com grande alegria nessa casa tão

desacomodada e, logo, deu ordens para que se

fizessem as obras necessárias e conveniente para a

transformar num Convento de religiosas

contemplativas de clausura, começando por arranjar a

Igreja. Tanto que, logo que se instalaram no seu

Convento de Santa Fé, e, provido este, do essencial

para a vida comunitária contemplativa, ordenou a santa

fundadora o modo de viver que haviam de guardar ela e

suas filhas e, composta a Regra, a enviar ao Sumo

Pontífice Inocêncio VIII com petição da rainha Isabel

"a Católica" para que Sua Santidade aprovasse esta

Ordem com o título da Imaculada Conceição, bem como

a Regra, o modo de rezar e de vestir (o hábito).

Foi, por meio de um «estranho» mensageiro, que a

fundadora soube que, Roma tinha expedido a Bula de

aprovação da Ordem. Contudo, mais tarde, chega a

notícia de que o navio que transportava a Bula de

aprovação, tinha naufragado. Beatriz comunicou o

facto à rainha, e só teve uma ideia: por-se a rezar. Ao

fim de três dias, aparece a Bula num cofre do

Convento. Como aconteceu este «prodígio»? A verdade

é que, hoje, a dita Bula se encontra no Convento de

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Toledo. Inocêncio VIII tinha dito sim ao pedido de

Beatriz, com o apoio da rainha Católica. Estava a Bula

dirigida ao bispo de Coria e Catânia, e ao Vigário de

Toledo, para «executar a Bula» em 1491. A Bula papal

cita expressamente a rainha Isabel e soror Beatriz, a

quem autoriza a fundar um Convento, de clausura.

Segundo palavras de Sua Santidade: Nos foi

humildemente suplicado que se dignasse a Nossa

Benignidade Apostólica erigir na referida casa um

Mosteiro de Monjas, sob a invocação da Imaculada

Conceição. Beatriz gozaria da dignidade de Abadessa,

e a casa teria campanário, dormitório, refeitório,

hortas e outras oficinas, na qual vivam as religiosas em

comunidade sob a regular observância e perpétua

clausura. E dá poder à Abadessa para que possa

formar estatutos e ordenanças. Vestirão de branco,

com manto cor (azul) celeste, e, «no manto e

escapulário, tragam fixa a imagem da Virgem Maria, e

se cinjam com uma corda de canhamo, à maneira dos

Frades Menores». Terão como carisma próprio o da

Imaculada Conceição. A Bula «Inter Universa» está

datada de 30 de Abril de 1489, quinto ano do

Pontificado de Inocêncio VIII. É esta, certamente, a

autorização solene, oficial e pontifícia para a

Fundação.

E, finalmente, no antigo palácio, de uma princesa

moura, tem o seu berço a Ordem da Imaculada

Conceição, melhor dizendo, começam a escrever-se

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com letras de luz, silêncio e oração as glórias da

Imaculada Conceição.

A passagem

"...no ocaso da vida tudo passa, só Deus fica e o que

por Ele tivermos feito".

Seis anos passaram estas almas desejosas de uma

entrega radical, à espera que lhes chegasse a

aprovação de Roma. Quando esta, finalmente chega, a

Obra começa a desenvolver-se em pleno. No entanto,

um novo sacrifício lhes estava reservado.

Tinha já sido marcada pelo Bispo de Toledo, a festa

das profissões, de Beatriz e das suas doze

companheiras, quando a Santíssima Virgem de novo lhe

aparece dizendo-lhe: - "Dentro de dez dias virei

buscar-te porque não é vontade de Meu Filho que

gozes aqui na terra o que tanto desejastes".

Duro golpe difícil de compreender, mas que Beatriz

aceita com o coração em festa, como através de toda a

sua vida aceitou sempre qualquer manifestação da

Vontade do Pai Eterno. E nisto consistiu precisamente

o segredo de toda a sua santidade, pois, só no

cumprimento da vontade de Deus, reside o segredo da

santificação de qualquer alma. Fora desta vontade não

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há santificação possível.

Efectivamente, no dia preciso em que estava marcada

a festa do início da Ordem, Beatriz voou para o Céu,

tendo, antes, recebido o hábito branco e azul, como a

Senhora lhe tinha indicado, e feito nas mãos de um

sacerdote Franciscano, a sua Profissão Religiosa.

Morria assim, como uma verdadeira Concepcionista. A

noite da sua vida passara. Tinha sido uma noite de

lutas e sofrimentos em que venceu, é certo, mas que,

para isso, teve de lutar denodadamente. Tudo agora

findava, melhor, tudo agora começava, e morria feliz,

pois, como diz o autor, "no ocaso da vida tudo passa, só

Deus fica e o que por Ele tivermos feito". É que, na

eternidade seremos julgados, não tanto pelo muito que

fizemos ou possuímos, mas pelo muito que amámos. E

Beatriz viveu uma vida intensa de amor e de entrega

total a Deus.

A estrela

"...do seu rosto saiam raios de luz e uma estrela

luminosa fixou-se-lhe na testa e ali permaneceu até

que soltou o último suspiro".

No momento da sua morte há um pormenor que não

pode ser esquecido. Desde que saíra da Corte de

Tordesilhas, Beatriz cobria o seu belíssimo rosto com

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um véu branco a fim de ocultar, aos olhos de todos, a

sua grande beleza que fora causa de tantos desgostos

e dissabores. E, assim, viveu os cerca de trinta anos

que durou a sua vida retirada no Convento de S.

Domingos "O Real", e depois já no seu Convento

definitivo.

No momento derradeiro, ao levantarem-lhe o véu para

lhe ser administrado o sacramento da Unção dos

Enfermos, todos viram, com assombro, que, do seu

rosto, saiam raios de luz que iluminaram todo o

aposento em que se encontravam, e uma estrela

luminosa fixou-se-lhe na testa e ali permaneceu até

que soltou o último suspiro. E é este o motivo pelo que

a imagem da santa de Campo Maior se representa com

uma estrela na fronte. Esta significa, certamente, a

luz que ela irradiou então e que continua, ainda hoje, a

irradiar ao longo destes cinco séculos que nos separam

já da sua morte, ocorrida em Toledo no dia 9 de

Agosto de 1492.

Luz que brota do testemunho de vida de Beatriz, que

"...toda se abandonou à vida de santidade..." e das suas

filhas, que encerradas nos seus Conventos seguem as

pisadas da sua mãe e mestra, vivendo os rigores do

evangelho.

Depois da morte

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"...todas viviam unidas, «num só coração e numa só

alma»".

Como nos conta Soror Catarina: "Logo que a serva de

Deus expirou pensaram as religiosas de São Domingos

levar para o seu Convento, não só as doze religiosas,

porque não haviam professado e ficavam sem Madre,

senão também o venerável corpo da Fundadora, porque,

tendo vivido tantos anos com elas, julgavam que lhes

pertencia; e, nesta ideia, começaram a fazer

diligências, levando em seu auxílio alguns religiosos da

sua Ordem para conseguirem levar a cabo a sua

empresa, e, por conseguinte, para que a casa e Ordem

da Imaculada Conceição ficasse desfeita. Não era

porém essa a vontade do Senhor, que constantemente

velava pelas suas servas; e não queria que

desaparecessem de sobre a terra; e, por isso, mais

uma vez as ilustrou com um novo milagre, como foi o

aparecimento da Santa Fundadora a frei João de

Tolosa."

Antes, mesmo, da chegada de frei João de Tolosa já os

religiosos franciscanos de Toledo haviam impedido que

o corpo de Beatriz da Silva fosse levado pelas

religiosas de São Domingos "O Real" e o sepultaram na

Igreja de Santa Fé, junto às suas filhas.

Contudo, as religiosas de São Domingos não

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desarmaram e, visto que, não tinham conseguido os

restos mortais da fundadora, pelo menos, achavam-se

no direito de reclamar para si as doze jovens que

faziam parte da comunidade de Beatriz, argumentando

que estas ainda não tinham tomado hábito nem feito

votos.

Foi, neste contexto, que frei João de Tolosa veio

encontrar as jovens discípulas de Beatriz da Silva.

Imediatamente este ilustre franciscano fez desistir

dos seus intentos as religiosas de São Domingos "O

Real" e marcou, para dentro de oito dias, a tomada de

hábito e a profissão religiosa das doze valorosas filhas

de Beatriz. Tendo sido nomeada para Abadessa soror

Filipa da Silva, sobrinha da fundadora.

Contudo, não ficaram por aqui as dificuldades por que

teve de passar a jovem comunidade Concepcionista.

As religiosas Beneditinas do Mosteiro de São Pedro

das Donas haviam decaído um pouco no fervor

primitivo da sua Ordem. Por isso, o Reformador Geral

de todas as Ordens no Reino de Castela, frei Francisco

de Cisneros, ordenou que o Convento de Santa Fé e o

Mosteiro de São Pedro das Donas se juntassem num

só. Passando as religiosas de Santa Fé a viver no

Mosteiro de São Pedro das Donas. Por outro lado, por

breve do Papa Alexandre VI as monjas das Donas

passavam a vestir o hábito da Ordem da Imaculada

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Conceição e adoptavam a forma de viver desta jovem

Ordem. E ainda, deveria a Abadessa de São Pedro das

Donas renunciar ao seu cargo em favor de Madre Filipa

da Silva que passaria a ser a Abadessa da nova

comunidade.

No entanto, as mudanças não foram fáceis, pois,

graves divisões surgiram na comunidade, que, por três

vezes, esteve à beira da extinção, devido às reforma

implantadas por Madre Filipa da Silva e que,

desagradaram muito às antigas religiosas de São Pedro

por não aceitarem que uma Ordem mais nova, viesse

impor a uma Ordem mais antiga correcções e

tradições.

A tal ponto chegou a situação que, frei Francisco de

Cisneros, à data, arcebispo de Toledo, esteve a ponto

de ordenar se extinguisse de vez a Ordem da

Imaculada Conceição. Não era esse, no entanto, o

projecto de Deus que levou o ilustre prelado a fazer

uma última tentativa para repor a unidade e a caridade

no referido Convento. Para isso, dirigiu às religiosas do

dito Convento, uma veemente exortação a que se

apaziguassem. Conta-nos Soror Catarina que o

arcebispo lhes falou com tão inspirado afecto que lhes

abriu o coração e os pacificou de tal maneira que, as

que haviam abandonado a comunidade, voltaram

bastante emendadas, conformando-se todas numa só

vontade e amor, transformando-se o Convento num

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autentico paraíso.

E dava gosto, depois, ver o Convento da Imaculada

Conceição, onde todas viviam unidas, "num só coração e

numa só alma".

Depois destas duras provas, a Ordem da Imaculada

Conceição entra num período de grande florescimento,

tornando-se numa das maiores Ordens Religiosas

femininas de vida contemplativa, da Igreja.

A glorificação

"...a Igreja sente necessidade e alegria em nos dizer que

Beatriz da Silva, é Santa".

Ao longo da história, Deus suscita homens e mulheres

que, compreendendo o único Absoluto, e que foram

capazes de assumir atitudes de vida que, ainda hoje, têm

lições de vida e de sabedoria. A vivência do Evangelho

continua a gerar verdadeiros sábios em todas as épocas,

que, com os seus exemplos e palavras, possuem uma

força de persuasão que não vem dos livros, mas do

Espírito Santo.

Inteiramente abandonados à acção de Deus, os santos

deixam-se conduzir pelo Espírito Santo por caminhos

desconhecidos, até ao dom total de si mesmos. E foi o

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que aconteceu com Beatriz da Silva e Menezes, por isso

mesmo, a Igreja sente necessidade e alegria em nos

dizer que, fundadora da Ordem da Imaculada Conceição,

faz parte deste grupo de obras-primas da criatividade

do Espírito Santo e que nunca se repetem, que são os

Santos. E fá-lo oficialmente, quando o Papa Pio XI a 28

de Julho de 1926 a beatifica e a 3 de Outubro de 1976,

o papa Paulo VI a canoniza.

Oração: Lembrai-vos ó Santa Beatriz da Silva, das

muitas angústias e tribulações pelas quais passastes

nesta vida e intercedei por nós.

Ó Santa Beatriz, virgem singularmente amada de Maria

Imaculada, alcançai-nos a pureza da alma e do corpo, com

a graça que ardentemente vos suplicamos.

Amém.

autor: Pe. Marcelino Caldeira

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