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A GENTRIFICATION: CONCEITO E METODO' Sergi Martinez i Rigol* art somo foco analisar os aportes teéricos a respeito da due se seguiu a partir da dualizagao dos enfoques, até a posigio contemporanea Tnajoritéria que se baseia na integracao destes. Posteriormente, propde-se uma posigdo conceitual e metodol6gica para a andlise empftica do fenémeno. ‘As cidades contemporineas, ha pelo menos vinte e cinco anos, se encontram em processo de reestruturagao e transformago que, em diferentes ritmose intensidades, vm mudando seu significado. A gentrification se apresenta ‘como um desses processos de transformagio: alguns espagos construfdos da ‘dade, geralmente os centrais ocupados pela classe trabalhadora, ver mudando radicalmente sua fisionomia e significado. Os velhos iméveis degradados € os antigos fecidos urbanos sio reabilitados e renovados, 0 novo espago toma-se lugar de assentamento de uma certa classe média que substitui aqueles que até ‘entdo haviamy ocupado 0 bairro degradado e um conjunto de novas atividades econiimicas coloniza 0s espagos obsoletos ou fora de uso. Tudo isso acontece no contexto de algumas transformagSes sociais, econdmicas ¢ culturais de caréter global, conceitualizadas, respectivamente, como pés-industriais (Bell, 1, 1970), pés-fordistas (Harvey D., 1989), ou pos-modemas Jenks, 1984), que mantém relagio com processo de gentrification (Ley, D., 1996:11-22). Mas, por outro lado, as caracteristicas sociais, econdmicas e culturais de cada Iga ofercem variants aes proceisos de ransfomaqio dearer gob ém disso, a gentrification aparece como um dos principais de vanfoemag wan que inertén na configura soil Gas tas O “rover da Unive Se Barons modelo de segregagio socioespacial que até a alguns anos havia especializado boa parte das éreas centrais urbanas como asseniamento das classes baixas, ‘muda radicalmente, ¢ a nova estrutura socloespacial se fundamenta, em bos parte, na gentrification das éreas centrais: substituigo social, reinvestimento ‘econdmico e, em geral, mudanca de significado e imagem dessas areas centrais, O que é a gentrification? O que é a gentrification continua sendo uma pergunta sem uma dinica resposta vélida para todos os casos. Parece aceito, de qualquer modo, que se trata de um processo de mudanca social urbana, no sentido de que determinadas éreas da cidade sio transformadas tanto morfoldgica quanto socialmente, Mas, quais sdo as causas? Quais as conseqiiéncias? Quais atores participam? Qual é o papel dessas mudangas na transformagio geral das Cidades? Todas essas questdes permanecem em aderto. Oconceito de gentrification foi definido pela socisloga Ruth Glass no ano de 1964,em Londres, ante acvidénciaempirica deque alguns bairros dacapital inglesa possufam uma dinfimicademudanga que ag entdo havia sido ignorada:ainvasiode alguns bairros operérios da cidade por parte das classes médias (Glass, 1964) Desde essa primeira definigao, esse processo de mudanga ém sido observado ‘em bairros de diversas cidades, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos, demonstrando sua existéncia empirica. Assim, as mudangas fisicas e sociais ligadas & gentrification se tornaram evidentes nas cidades norte-americanas, como no bairro de Sociery Hill na Filadélfia (Smith, N.: 1979b; Cybriwsky, R., Ley, D.¢ Wester, J., 1986), Echo Park em Los Angeles Lizarraga, M.G,, 1998), Lower East Side (Smith,N., 1991; 1992), Soho Zukin,S., 1989)o Harlem (Smith, N.e Schaffer, R., 1986) em Nova York, também em cidades do Canad, como na bairro de False Creek de Vancouver (Cybriwsky, R., Ley, D. e Western, J. 1986; Mills, C., 1993) ou nas cidades de Toronto (Caulfield, 1994), e em determinados bairros do conjunto das sei reas metropolitanas mais importantes do pais Montreal, Vancouver, Halifax, Ottawa, Edmonton e Toronto (Ley, D. 1986; 1996). Também em cidades da Gra-Bretanha, como nos barrios de Battersea (Mun, I., 1987), Sand End (Bridge, G, 1994) ou nas Docklands (Colenut, B., 1991; Brownill, S., 1994) de Londres, nos bairros de East Craigs, ‘Stockbridge Leith de Edimburgo (Bondi, L., 1999) ouem Glasgow (Boyle, M., 1992), Também nas cidades australianas, como Adelaide (Badcock, B., 1989), Sidney (Engels, B., 1989) ou Melbourne (Jager, M., 1986), em cidades suecas, como Malmoou Estocolmo (Clark, E, 1987), em cidades alemascomoHamburgo (Dangschat, J., 1991), hingaras, como Budapest (Hezedts, Je Tosics,., 1991), holandesas, como Amsterda (van Weesep, J.e Wiegersma, M., 1991) e de tantos ‘outros paises, como Japio, Africa do Sul, Brasil, Dinamarea ou Espaha, Essas mudancas tém em comum os seguintes elementos: a populacdo com poucos recursos econdmicos € culturais €expulsae substituida por uma nova populago 99, ‘com maiores recursos econdmicos ¢ culturais; as velhas residéncias degradadas Sgoteabilitadas ou renvvadas; novos empreendimentos comerciais, restaurantes gulcriasde arte bares se estabelecem nos espacos antes ocupados pelo comércio {tadicional que permitia a subsistencia dos antigos moradores; o espago piblico Srenovadoe protegido daquelasatividadesindese)éveis;antigos armazéns situados ‘em dreas indastriais so reconvertidos em instalagdesesportivas, servindoas reas residenciais de luxo; antigas fébricas abandonadas sio reabilitadas econvertidas ‘em luxuosos fofis, € outros. ‘Opredominiode cidades anglo-saxonicas nomapadas cidades “gentrificadas” bastante evidente. Alguns, inclusive, sugeriram a existencia de um Atlantic gap, ‘evidenciado por aleumas diferengas importantes entre a gentrification nos Estado Unidos e na Europa (van Weesep, J.e Muster, S., 1991; Lees, L. 1994b). Embora ‘este conceito tenha se originado com base na experiéncia de Londres, boa parte dos estudos de caso posteriores, a partir dos quais se generalizou e se consttuiu uma teoria, teve como objeto bairros de cidades norte-americanas. Tal fato levou a0 questionamento sobre as possibilidades de uma generalizagdo transocednica, inclusive sobre as possibilidades de generalizagio e criagio de uma teoria da gentrficagao (Lees, L. e Bondi, L195). Esta diversidade se colocaria sobretudo éem fungio do maior controle estatal sobre o desenvolvimento urbanona Europaem relagao As posturas liberais mais arientadas ao mercado dos Estados Unidos (Musterd, S. e van Weesep, J., 1991:12), mas também averia outros aspectos, ‘como, porexemplo, as diferengasdeidade doespago construido, diferentes historias raciais, ou diferentes economias culturais de (Smith, N, 1996:165), que ‘poderiam provocar processes distntos nos dois casos. Ainda assim, a diversidade também seapresenta nocontexioiinfracontinental,jéque, porexemplo,ascondigdes ino sao as mesmas em Londres e em Barcelona, razio pela quall ndo se pode assegurar que haja apenas um Atlantic gap, mas que cada caso apresenta suas particularidades. © principal problema seria a definigio de uma teoria da ‘gentrification capaa de englobar todos 0s casos concretos. Desde a primeira definigdo de Ruth Glass em meados dos anos 1960, a gentrification tem sido definida por diversos autores que, a partir de diferentes posigdes tedricas e metodol6gicas, vém tentando explicar 0 porqué e 0 como do processo, além de mostrar as mudangas fisicas e sociais produzidas. O fator ‘comum nessas definigées tem sido que o conceito de gentrification expressa um conflitode clasts isto, anovaclasse média como aquela que substitureexputsa aiclasSetrabulhadoraresidente nos bairos "gentrificados", Porlanto,esse conceito incorpora essa visio critica do processo de mudanga nas freas urbanas, N30 se tratando apenas de uma melhora social efisica desses bairros, mas também de um processo de segregagio social que leva 8 expilsao daquelas pessoas ncapazes de suportar o processo de revalorizacio do lugar. Deacordo com a argumentagio de Neil Smith, o conceito de gentrification é e deve se manter como uma dirty ‘word (Smith, N., 1996:30-47),istoé, deve refletiresse conflito social no processo de transformagio urbana. 100 ginsitpeetcoiatnoce recuse dogemtioneen eee eae ¢, portant, ¢ difieil poder generalizar umanovaclasse média Octchere een gentrification: € definitivamente umaexpressiode um processo de transformacai social urbana no qual uma parte dos. implicados.¢ segregada, ee Os enfoques da gentrification Desde que termo oidefinido pelaprimeira vez,agentrificagliotem i samc terrasse se em uma temitica de estudo jé consolidada entre « comunidade de gedgratos © socidlogos urbanos, com uma produgo bibliogrifica destacada. O debate vem se centrando sobretudono seu significado, nos processos que encera, nas Sas calisas efeitos (Hamnett,C.,1991a),enosdiversos enfoquese métodos utiizados. Alguns autores tém abordado a evolugio dos enfoques sobrea gentrification (entre outros, Hamnet, C., 1984; Smith, N. ¢ Williams, P, 1986; Smith, N., 1996), destacando a cexisténcia de uma questio fundamental que vem animando este debate m O geégrafoinglés Chris Hamnett destacouemumartigo, publicadoem 1991, © conjunto de razées pelas quais a gentrification havia chegado A posigio de objetode estudo ao atraemte aos académicos, apesar de tratar se dé uin processo ‘geografico concentrado € de pequena escala se comparado aos fendmenos da suburbanizagao e da degradago urbana do pés-guerra (Hamnett, C. 199 1a: Berry, BJLL., 1985). A primeira razio seri trumental, jf que o grande niimero de estudos de caso que surgiram a tespeito da gentrification, marcadamente de cardter local, significava um novo tema para toda uma nova geragio de geGgrafos e socidlogos urbanos que buscavam um tema nove & iteressante. Em segundo lugar, significariaarupturacom ospostuladose tories tradicionais arespeito dalocalizacio residencial ea Tltragemresidencial, desde a Esol de Chicago (Burges. 1925), ineindo a tag da coogi social ‘Alonso, W., 1964) ea escola positivist de economia urbana do pos-guerra (Alonso, W., 1968), que nao haviam previsto a pessibilidade do retorno dos cots moradiasdezradadase obsoletado centeourbano, Eh terceiro lugar la mesma forma que a gentrification havia aberto caminho aos processos dé expulsio edeslocamento da populacio afetada, também abriu espagoaosdebates 8 respeito das pottcasurbanas esas elas com ais fendmenos. im quarto lugar, configurava um dos principais processos de reestruturagio metropolitana 4dos anos 1970 ¢ 1980, assim como a suiburbanizagio e a degradacio urbana © hhaviam sido nos anos 1950 e 1960. E, em quinto lugar. c esta seria a razao mais. importante, a gentrification representava um dos debates teicos e Wdeolgicos {nalsimporamesdenroda Geografiaurbaneem gealdentodaGeogriahurana 101 The eral Monet who stress the ey role of ehoice, culture, consenpion ndconsumerdemand.andihestractural Marsisswhostresstheroleof capita class podution and supply Gerrfication is one ofthe main arenas of confit been {he proponents of culture, preference and human agency and the proponent ofthe inperaives of copital and profitability. Hamnet, C, 1991a:174) ‘Aléim disso, Hamnett apontava Neil Smith e David Ley como os dois maiores combatentes nesta relagio dialética presente nas explicagSes desse processo: 0 primeiro como representante do enfoque marxista-estruturalista, ¢ 0 segundo ‘como representante do enfoque liberal-humanista, Assim, a gentrification nido apenas constituiria uma fronteira econdmica, fisica, social ¢ cultural, como também te6rica, ideolégica e politica (Hamnett, C., 1991a). Por outro lado, Neil Smith e Peter Williams distinguiam duas etapas na investigagio sobre esse processo (Smith, N. e Williams, P. , 1986). A primeira abarcaria desde a criagdo do conceito até 0 final dos anos 1970, na qual a ‘maior parte das investigagdes era de cardter empitico, e destacava sobretudo 95 efeitos da gentrification, mais centrados na descrigio da nova classe média € dos bairros afetados pelo novo processo social que na questao da populaglo deslocada e dos bairros onde era realocada. Estes primeiros trabalhos empiricos representavam uma celebragdo acritica desse processo, jé que esta era lida ‘como uma resposta positiva & degradagao dos centros urbanos. ‘A segunda etapa, iniciada no final dos anos 1970, enfatizava as causas da gentrification e, portanto, dizia respeito a trabalhos de caréter mais tedrico. ‘Assim, a gentrification foi situada em um contexto mais amplo do funcionamento do mercado imobilidrio e da terra urbana, Alguns-pretenderam explicé-la relacionando-a as polfticas piblicas ¢ privadas relativas & moradia, cenquanto outros a situaram no contexto de desenvolvimento desigual - uneven development = da reestruturagio urbana € Usds do solo-urban-€m-processo. Foi apartirdotrabalho teérico dessa segunda etapa que surgiram osenfoques diferenciados: as explicagdes baseadas no consumo em confronto com aquelas baseadas na producdo: 0 enfogue liberal-humanista frente ao enfoque marxista- cestruturalista (Hamnett, C., 1991a), a cultura frente & economia (Lees, 1994a). Boa parte dos trabalhos empiricos da primeira etapa estava situada no enfoque liberal-humanista isto é, era afirmada a soberania do consumidor no mercado e na localizagio residencial. Portanto, determinadas mudangas no estilo de vida, ‘mudangas demogréficas e também mudangas nas preferéncias residenciais explicariam 0 processo de retorno ao centro urbano de determinada parcela da classe média. Em confronto com essa posi¢ao, surgiram explicagGes altemativas baseadas no papel do Estado em tal processo (Hamnett, C., 1973), assim como ‘no papel das instituigdes financeiras aportando o capital necessério para a reabilitagao (Williams, P., 1976; 1978). A contribuigto mais importante de tal enfoque foi sem chivida, a proposigao da teoria dopent gap de Neil Smith (1979, 1982), dentro da perspectiva teGrica mais ampid do desenvolvimento desigual, 102 seguando a qual o papel mais importante no processo de gentrification era.o do ‘tsinvesiments, que sera ssencialn cago opt a © desenvolvimento do enfoque economicista levou também a0 desenvolvimento paralelo do enfoque baseado nacultura,cujos autores lograram superar os argumentos simplistas propostos durante a primeira etapa, Dessa forma, o consumo foi colocado sob uma perspectiva mais ampla, baseada no contexto das mudangas sociais, demogrificas e culturais que se sinietizavam na sociedade ¢ nas cidades pés-industriais (Bell, D., 1973; Ley, D., 1980; 1982), Esta dualidade de enfoques também foi interpretada como uma dualidade de posicionamento politico em relagao & gentrificagio (Smith, N., 1996). Assim, (os argumentos baseados na cultura e no consumo tém sido usualmenteutilizados por-aqueles-que de alguma forma comemoraram a chegada da gentrification, que justfica i vidos, enquanto os argumentos bascados na economia e na produgao tém sido utilizados por aqueles que se situariam fi perspectivar de uma teoria x 2 partir da segunda melade Wi Uécada de 1980 observou-se cera aproximagao entre as duas posturas, ensaiando uma integra. € pioneiro (Lees, L., 1994; Smith, N., 1996) na integrago dos clementos culturais e econdmicos como para a explicagao da gentrification. enfoque cultural Segundo Chris Hanmet, as bases teéricas do enfoque cultural na explicacdo da gentrification se encontram em um artigo publicado por David Ley em 1980, “Liberal Idcology and the post-induatrial city” (Ley,D., 1980). Eram trés © principais pontos de sua tese, respectivamente, fazendo referéncia 4economia, cultura e politica: «Em primeito lugar, destacava que a passagem do perfodo industrial industrial ava ificdo ena de lena da mo deo no guia Drocesso produtivoe oaumentode usode novastesnolcgias em fabricaseescritrios. ‘Tals alos estariam associados a uma transformagao de forga joainda mais, importante, no sentido de terhavido uma diminuigi do rimero de trabalhadores da indistria, denominados blue collar,¢ aumento paraleo dos trabalhadores ocupados ‘ematividades profissionaiS d¢difegao, administratvace tecnolégicas, os chamados white collar Além do mais, se detectava uma mudangede ume Sociedade produtora ddebenssmateriisparauma produtorade servicos,compraleladiminuigdodainddstia ‘manufatureira e aumento do setor de servigos ¢ escritios. Em segundo lugar, sociedade pés-industral se distinguiria da industrial pelo ‘Papel ativodos governs. tomadade decisGes alocalizagao de recursosmo seriam apenas uma questo de fo, mas se haviam convertido também em uma {uestio politica rao pela qual assistia-se a uma politizagaode diversox grupos mas empresas para mianiet lobbies ou grupos de pressiomnaiomada de decisoes pownticas. 103 E,emterceiro higatsem um nivel sociocultural, assistia-se Aaparicio de uma nova classe sovial;-@ service class, que com a base econdmica asvegurada daa ‘aisimportincia’ estética €ao individualismo. Surgiam, assim, novosestilos de ‘vida baseados no consumo ostensivo € no statis social como realizagao pessoal Para David Ley, além disso, o surgimento de uma nova classe social estava ‘Reograficamente caracterizada. Assim, era mais provvel que essa nova classe surgisse em cidades como Londres, Sao Francisco ouem Glasgow ou Cleveland, por sua localizagao claramente urbana, e sobretudo nas grandes cidades e reas metropolitanas. Posteriormente, na explicagao dessas teses para a cidade de Vancouver, David Ley estabeleceu.aconexioentrea gentrification ocrescimento dos setores tercedrio e quatemirio, das ocupages nas atividades profissionais ¢ de diregio e as mudangas na demanda residencial (Ley, D., 1981). ‘Assim, o ntimero crescente de residéncias de dimensbes reduzidas (para uma ou duds pessoas, geralmente casais sem filhos) destinadas a pessoas mais jovens e com altos salrios, exercia pressio no mercado imobiliério residencial nas éeas mais centrais da cidade, ja que estas eram atraentes por fatores de cariter cultural. Em um estudo sobre o processo de gentrification em 22 dreas ‘metropolitanas que formavam o sistema urbano do Canada entre 1971 ¢ 1981, David Ley estabeleceu que as principais explicagdes para esse processo se referiam a base econdmica e fatores relacionados & urban commodity, enquanto aquelas que se referiam 4 mudanga demografica ou a dinamica do mercado residencial eram menos importantes. A respeito das explicagoes fundamentadas em bases econémicas, David Ley destacava como argumento mais importante a existéncia de uma economia metropolitana de caréter pés-industrial, orientada ao segmento de servigos mais, avangados, convergindo para uma estrutura de mercado de trabalho dominada pelos white collar. Além disso, no caso canadense, 0 crescimento das ocupagdes ddo setor quaterrio estava concentrado nao s6 nos centros de servigo nacionais regionais, mas sobretudo nos centros urbanos dessas cidades “Asexplicagées baseadas no valorda urban commodity se referiam aaspectos relativos ao valor ambiental e cultural dos centros urbanos, aspectos atrativos para'a nova‘ classe-média, dificeis de se encontrar nas éreas suburbanas. Assim, segundo David Ley, nao era de se estranhar que nas primeiras eGo proceso de gentrification tenham sido justamente aqueles grupos sociais associados a estilos de vida contraculturais que desempenharam o papel mais relevante,como no caso dos artistas de Nova York (Jackson, P., 1985), da comunidade gay em ‘Sao Francisco ou dos ativistas politicos e associativos em Vancouver (Jackson, B., 1984). A participagao em comunidades socialmente diversas e densas, com a possibilidadede umamuttipticidadkede contatos sociais ede acessoaumacxtensa ‘oferta de atividades de lazer e cultura, além da acessibilidade a mais postos dé trabalho com melhores saldrios, seriam as raz6es mais relevantes pelas quais os centros urbanos.eram atratives para essa nova classe social, que convertia um. felerminado tipo de consumo naexpressio de um estilo pessoal (Allen, I., 1980). ‘Também haveria uma correlacao positiva entre a revitalizagio das éreas centras da cidade e a presenga de entornos, servigos ou elementos que tornariam estas dreas atrativas. Esse conjunto de elementos, servigos ou entamnos se cconeretizaria na proximidade de parques e reas de lazer, ou iclUsivenerhistoria” ‘materializada em alguns estilos arquitetGnicos do espago construfdo. Em muitS casos-a administragao local havia promovido'e sibvencionado as atividades culturais © a manutengdo da estética ambiental para induzir 0 aumento da relagdes que explicam € si0 arazao fundamental das retagbes sociais observaveis,e que determi anise sujet 70a, iid -Densamo ean aes mulheresgofut ntrale af As pessoas: e ms ‘explicago da sociedad depende das estratégias uiizadas para chegar a, 6 significados compartilhados c atitudes e comportamentos que estes geram, ‘A iinlegragio dos dois enfoques Que aqui sé propoe representa encontrar tum ponto intermedidrio a ambas as posigdes tedricas sem que nenhuma delas resulte completamente negada, embora nio haja um ponto intermedirio valido para todas as situagGes, todos os temas ou todos 0s estudos de caso. O ponto intermedirio € negociado pelo investigador com sua prépria investigagio a ada momento (ackson, P.e Smith, S. J., 1984:11). A integragio dos enfoques No nivel estrutural, aceita-se que exista um processo de produgio do rent gap ¢-da.classe média, que constitui a oferta e a demanda no proceso de ‘gentrification, Isso quer izet que, por um lado, existe a oportunidad econémica A criagio de mals-vatla e aproprisgao do Tucro nos CentrOs UFbanos, embora, or outro lado, exista um novo grupo social ou classe, definido a partir de sua nova posigaéeconGmieae cultural, que consttuirias ofertae a demanda latentes O que deve ser explicado é, entaio, como esses dois elementos pot conyertem em efetivos, isto €, por sis6a exist8ncia da oportunidade econémica ‘no centro ea existéncia de um novo grupo social nao implicam dirctamente que este vé residir no centro. Por que as freas centrais da cidade, que durante tanto tempo nao haviam sido atraentes para a classe média, agora so? E por que essa nova classe média exerce uma demanda sobre as reas centrais da cidade? Essas ‘duas questées constituem os dois lados de uma mesma moeda ‘O foro, talvez, esteja em descer ao nivel empirico para entender, por um lado, ‘oporqueé parte dessa nova classe social decide viver no centro, a partir do estudo da cconstruciocarticulagao feta pelos proprios “ gentrificadores” em relagao ao fatode decidirem morar nesses bairros centrais. E, por outro lado, qual & o processo de criagdo das condigdes paraa apropriagdo do lucro: quais agentes participame como conduzem o proceso. Ambos os elementos devem serandlisados nocontexto geral da reestruturagdo, considerando o marco concreto do lugar. (Onnivel de contexto geral corresponderia a0 da reestruturagdo. As relagées entre as transformagdes materiaisda cidade e adinémicadeacumulagiodecapital ‘m sido demonstradas por diversos autores (Whitehand, J., 1972, 1987; Harvey, m1 D., 1978; 198251985; Beauregard, R. A., 1991). A reestruturagdo urbana, fruto da Teestnuturagio do-capitalyse convertc:no contexto de andlise da gentrification. ‘Mas também a reestruturacao do sistema capitalista tem seus efeit esirutura trabalhista. Ambas as reestruturagdes, urbanae trabalhista, sio 0 marco ‘geral para situa. gentrification &-0s-processos de transformagao urbana. ‘A reestruturagao do capital iniciada a partir dos anos 1973-75 foi deserita, entre outros, por David Harvey (1985), que define uma estrutura teméria dos, circuitos do capital como resultado do periodo de sobreacurmulagio anterior, 0 capital se desloca do circuito primério de produgdo para o secundério de inyestimento em capital fixoe também para o tercidrio como investimento em ciénciae tecnologia, buscando novas formas de obtencao de Tucro. Dessa forma, (8 booms imoBilidrioscoincidiram com osmomentos detransferéncia de capitais entre o circuito primério de acumulacdo para 0 secundério e tercifrio nas épocas de excessiva liquidez e problemas de acumulagdo registrados no processo produtivo (Salgueiro, T., 1995). Assim, a crise econdmica de 1973-75 fechou ‘um periodo caracterizado por um macigo investimento territorial que produziu forte expansiio urbana. F essa mesma crise forgou a mudanga e a transigo para ‘uma nova etapa de acumulagio caracterizada, dentre outras variéveis, por uma crescente internacionalizacao da economia € um incremento no ndimero de ccompanhias transnacionais presentes na economia mundial que controlavam a maior parte dos capitais, um incremento paralelo da mobilidade desses capitais; ‘uma terciarizagao progressiva da economia com relativa perda do setor industrial ante um crescimento acelerado do setor de servigos; um desmantelamento progressivo do estado de bem-estar social, e além disso a descentralizagao industrial ea concentracio de atividades de gestaoe controle no centro dacidade. ‘Oreflexona forma urbana foi ocorrespondente aumentode grandes edificios. nos espagos centrais da cidade onde se localizavam asnovas atividades de gesta0 controle, o abandono de grandes éreas centrais urbanas por parte das indtistrias cea consolidacZo de bairros degradados que passam a acolher a nova imigragao, mas também a consolidagao de bairros reabilitados que acolhem os novos pprocessos de gentrification (Sassen, S., 1989). E, pois, um crescimento desigual € desequilibrado, em que se do simultaneamente processos de descentralizaa0 recentralizacao, processos de crescimento e degradacao, constituindo 0 que foi conceitualizado como desenvolvimento desigual, ou uneven development: ‘By uneven development is often meant the self-evident tr that societal deselopment does not take place everywhere a the same speed or inthe same direction...) Uneven development should be conceived as a quite specific Process thai is both unique to capitalist societies and rooted direct in the Fundamental social relations ofthis mode of production, (Smith, N, 1996:77) reflexo na estrutura trabalhista da populag3o foi 2 reorganizacio ou a desregulamentagao do mercado de trabalho, o que deu lugar a uma crescente Polarizagio social. Essa destegulamentagio, coincidente com 0 processo de 112 terveirizagio econdmica, favoreceu aumento da mio-de-obra qualificada paralclamente forte demunds pouco especializada, com 0 que aumentaram 2s desigualdades na distribuigao de renda, aumentando também a diferenga entre as classes sociais privilogiadas e os setores mais pobres. A nova classe média, por sua vez, se alinha aos setores inferiores das classes privilegiadas. Acxpressdo territorial urbana dessa reorganizaco do mercada de trabalho seria a criagao da cidade dual (Castells, M., 1991; Sassen, S., 1989; Mollenkopf, J. € Castells, M., 1991) ou cidade fragmentada (Marcuse, P., 1989). E a gentrification se basearia: no surginvehito-de-uma-nova-classe Média originada desta reorganizacéo da estrutura ocupacional,caracerizada por sua boa posigio econdmica ¢ por seus novos modelos de consumo, incluindo.os.nesidenciais, Nesse contexto, como comentado anteriommente, deve-se ter como referéncia 0 nivel empitico para encontrar aqueles aspectos que impulsionam © processo de gentrificagio, aqueles aspectos que transformam a oferta e a demanda potenciais em oferta e demanda efetivas. ‘A respeito da oferta, deve-se descobrir como slo criadas as condigdes para a apropriagao do tucro econdmico e quais so as instituigdes que participam nessa criapao.-Inclusive-alguns enfoques sobre a gentrificagio viram nessas instituiges ou agentes, centrados sobretudo nas administragbes centrais elocais, a causa da gentrificagao-(Munt, 11987): Estas instituigdes ou agentes nZo s6 criam as condigdes para a apropriagao do ucro econdimico a partir da criago de uma legislagdo especifica, subvengoes A reabilitagdo, ou a concessao de crédito para a renovagio de propriedades

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