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ACULTURA DAEDUCACAO. Vv Mais & guisa de post-scriptum do di xcriptum do que de conclusio geral, proponho uma gitima reflexio sobre 0 conjunto de principios que acabei de expor. no intuito de uma perspectiva psicol6gico-cultural daeducagdo, Ao revé-los, verifico até que ponto eles pdem em relevo os poderes da consciéncia, da reflexdo, da largueza de didlogo e da negocagio. Em todos os sistemas que dependem da autridae, mesmo idade devidamente constituida estes factores parecem c Sar, aes a autoridade actualment educagio é arriscada, poi 6 fracasso em apetrechar as set oo agit dentro do mundo cull no sig ontuagao zero a pedagogia. Corre o risco de eriar a alienaga Sesobediéncine a incompeténca prdtica Etudoisto minaa Viabilidade desobotincie prética. Etudo isto mina a viabilidade ‘Tomemos finalmente ao tema i que abriu este eens ik nencete sv ecaciias oc adv ahi nek assunto técnico de processamento de aprendizagem” ou de usar 0s resultados da “pr 0” Centada no sijelo. Aeducayta Guma complete procra no serio de ajustar uma cultura is necessidades dos seus membros ede ajustar (0s seus membros e seus modes de conhecer ds necessidades da cultura. Nos capftulos que se seguem, encontraremos “em particular” muitos dos temas que neste foram discutidos em termos mais gerais. Foi meu props, af anu, siuar a educagdo num context mais aol, deforma ser etna adeqnaamene,Poemos agora 70 ila ears nom scat ust as ib sug sae PEDAGOGIA CULTURAL senha antag a areas Se ae OE [As pessoas reflectidas estiveram sempre preocupadas com 0 enigma da aplicagao do conhecimento te6rico a problemas préticos. ‘A aplicagao da teoria psicol6gica a pritica educativa nao € excep¢o a regra, nao sendo menos embaragante do que a aplicagao da ciéncia 4 medicina, Aristoteles comenta (muito ao de leve) na sua Etica a ‘Nicdmaco (Livro V, 1137a): “Matéria de fécil entendimento sio os efeitos do mel, do vinho, do heléboro, do cautério e do corte. Saber, porém, como, para quem e quando devemos aplicar estas coisas como Temédios nio 6 menor empresa do que a de ser médico”. Mesmo com favangos cientificos, o problema do médico nao € muito mais fécil do {que 0 era no tempo do heléboro e do cautério: “como, para quem € “quando” sfo os problemas que ainda persistem. O desafio é sempre 0 de situarmos 0 nosso conhecimento no contexto vivo que poe “o problema de apresentagdo”, para empregar um termo do jargio Imédico. Ora, este contexto vivo, no qual a educagdo esté envolvida, €a sala de aula —a sala de aula situada numa cultura mais ampla. Eaali que, pelo menos nas culturas desenvolvidas, professores © ‘alunos se encontram para efectuar esse crucial mas misterioso “Ambio a que chamamos, tao ligeiramente, “educag30”, Por muito ue tal possa parecer, fariamos melhor em concentrar-nos {que se segue sobre a “aprendizagem e 0 ensino no contexto do que, como fazem por vezes 0s psicdlogos, em generalizar ‘partir da aprendizagem num labirinto para ratos, a partir da aprendizagem de sflabas sem sentido de segundanistas encarcerados num eubjculo de laboratério ou a partir da realizagao de uma n RADA EDUCACAO. simulagao por computador de TA em Camegie-M uma agitada aula de eriangas de nove anon comm preteens esforgado, e perguntem que espécie de conhecimento tedrico ov oderia ajudar. Uma teoria genética que Ihes garante que as pessoas So diferentes umas das outras? Bem, talvez, mas nio muito. Trabalh mais com os menos brilhantes ou ignora-os? E que tal a teoria da associagdo dizendo’que essas sflabas sem sentido estao associadas lumas com as outras através dos efeitos de frequéncia, proximidade ontiguidade semelhanga? Nao quer tragar um curriculo 5 “onhecimento do modo como as sflabas sem sentido se prendem? Bem, talvez. um pouco ~ onde as coisas sio um pouco mo os nomes dos ina elementos da tabela periSdica ___ Hum “problema recorrente” que permanece connose: lidamos com ensino e aprendizagem, tao insinuante, tao contents constitutivo do processo de viver que, muitas vezes, nem o amos nem o descobrimos — como reza 0 provérbio “o peixe 6 0 Uiltimo a dar pela 4gua”. E 0 tema de como os seres homanoe realfzare o-conto das mens, {expresso normalmente pelos professores nos “como hei-de eu atingir as criancas?” cranes: “onde quer ele chegat” Este € 0 clissce prablens dat Qutras Mentes, como era originalmente designado na filosofa, e a Suu importneia para a educaeio tem sido extremamente preterida muito pouco tempo. Na ultima década, tomou-se um tépico de tum interesse apaixonado e de intensa pesquisa entre os psicblogos, lente-0s interessados no desenvolvimento, Sobre ele verva lo ~ a aplicagao deste novo trabalho ao processo da cub” 8 quase inteiramente esquecido pelos behavioristasanti- suplectivos no passado, as nossas interacgdes com os outros sao profundamente afectadas pelas nossas quotidianas teorias intuit Sobre 0 modo como funcionam as outras mentes. Estas raramente explicitas, so omnipreses sido sujeitas a u agora mencionadas pelos profi condescendente de “psicologia ct reflectem determinadas tendénci como Considerar que as pessoas agem normalmente sob o seu proprio. controlo), mas reflectem também umas certas crengas culturais 2 PEDAGOGIA CULTURAL indamente arraigadas acerca da “mente”. Nao se preocupa s6 a ogia cultural com o modo como a mente funciona, aqui ¢ agora, ii também apetrechada com nogdes sobre a forma como a te dacrianga aprende e até mesmo 0 que the dé o desenvolvimento. samente na medida em que somos, pela nossa psicologia cultural, jientados para a interacgio comum, somo-lo também para a idade de ajudar a crianga a conhecer 0 mundo, por meio das jogdes da pedagogia cultural. Olhemos qualquer mae, qualquer ‘ofessor, mesmo até qualquer babysitter, com uma crianca, € emos espantados pelo modo como muito do que fazem esta determinado por nogdes sobre “como so as mentes das criangas € como se podem ajudar a aprender”, embora possam nio ser capazes de verbalizar 0s prit ‘A partir deste trabalho, apsicologia cultural e a pedagogia cul alcancaram uma nova, talvez até uma revolucionéria acutilancia, Eo seguinte: ao teorizar acerca da prética educativa na sala de aula (ou outro qualquer meio, para 0 caso), 0 methor que se fazia era contar ‘com as teorias culturais que tém ja os que estio comprometidos com ‘0 ensino e a aprendizagem. E que sejam quais forem as inovagdes ‘que, enquanto “verdadeiro” teérico pedagégico, se queira introduzir, teré de competir com as teorias culturais que orientam professores como alunos, substitui-las ou em todo 0 caso modificé- las. Por exemplo, se vocé, enquanto tedrico de pedagogia, ests convencido de que a melhor aprendizagem se dé quando o auxilio do professor leva 0 aluno a descobrir generalizagdes por si mesmo é natural que depare com a crenga cultural estabelecida de que 0 professor é uma autoridade que, supostamente, deve dizer & crianga tem que consiste 0 caso geral, a0 mesmo tempo que a crianga estaria ‘ocupada em memorizar os particulares. E se vocé estuda a maneira como € orientada a maior parte das aulas, hé-de descobrir com frequéncia que a maioria das perguntas do professor aos alunos so acerca de particulares cuja resposta consiste em poucas palavras ou até por meio de “ a introdugdo que voce pode fazer de uma inovagao no ensino implicard necessariamente a alteragao das teorias da psicologia e da pedagogia culturais do professor — e, numa extensio surpreendente, também dos alunos. ( ensino, numa palavra, baseia-se inevitavelmente em nogdes sobre a natureza da mente do discente. As crengas e as convicgdes acerca do ensino, seja na escola seja noutro contexto qualquer, so 0 B ACULTURA DA EDUCAGAO reflexo directo das crengas e convicgdes que o professor tem acerca do aluno. (Mais tarde, havemos de considerar o outro lado desta ‘moeda: de que modo é a aprendizagem afectada pela nogio da crianga sobre o aparelho mental do professor, como de as raparigas chegarem acter que os professores esperam que elas ndo se saiam com respostas no convencionais). Naturalmente, como a maioria das verdades profundas, esta é jé bem conhecida. ajustar 0 seu ensino a realidade os interesses das criangas que er © que nos propomos. O nosso objectivo é antes explorar os modos mais gerais segundo os quais as mentes dos professores so convencionalmente consideradas e as praticas pedagégicas que decorrem desses modos de considerar a mente. Mas no ficaremos Por af, pois pretendemos também propor algumas reflexes sobre “a emergéncia da consciéncia” neste contexto: que pro em levar os professores (e estudantes) a pensar suas convies6es psicol6gico-culturais, para as tirar das sombras do ‘conhecimento tacito. ‘Uma maneira de apresentar a tragos largos a questo geral da Psicologia e pedagogia culturais € através do contraste entre a nossa espécie humana e os primatas ndio-humanos. Na nossa espécie, as ccriangas mostram uma “predisposigdo para a cultura” espantosamente forte; sio sensfveis e avidas de adoptar os modos populares que véem sua volta. Manifestam um impressionante interesse na actividade igual categoria e, sem absolutamente nenhuma io, tentam imitar 0 que observam. Quanto aos adultos, como -m Kruger e Tomasello', existe uma “disposigio pedagégica” ‘unicamente humana para explorar esta tendéncia, em virtude da qual (98 adultos demonstram uma realizacao correcta em beneficio do aluno. ‘Tais tendéncias concomitantes existem sob diferentes formas e1 as sociedades humanas. Mas note-se que as disposigdes i demonstrativas, aparentemente, quase no existem na famiflia dos Primatas mais proxima de nés: a dos chimpanzés. Os chimpanzés adultos ndo s6 no “ensinam” os seus jovens por meio da demons- (A.C. Kruger e M. Tomasell, “Cultural Learning and Learning Culture”, in Handbook of Education and Human Development (Oxtord: Blackwell, 1996), 14 PEDAGOGIA CULTURAL, an ae ES tragio da correcta realizago, mas, por seu lado, também os jovens parecem nao imitar as acgBes dos sul pee oe ia definigao suficientemente estrita de imitagao. Se entende a habilidade para repetir no s6 0 objectivo aleangado, ‘mas também os meios usados para o ating, hd uma débil prova imitagao em chimpanzés criados em liberdade* e, com maior rigor ainda, uma fraca t ensinar. E muito revelador, no entanto, {que quando um jovem chimpanzé é criado “como se” fosse uma ‘aos modos dos humanos, comega a mostrar ativas’. A ev’ das disposigbes “ "em inzés adultos € muito menos clara, mas ws tepsigbs podem também existir deforma rudimentar 5 ‘Tomasello, Ratner e Kruger sugeriram que, em virtude de os primatas ndo-humanos néo atribuirem crengas e conhecimento aos ‘outros, provavelmente nao reconhecem em si a presenga dos seu: semelhantes*. Nés, os humanos mostramos, dizemos ou ensinamos alguma cosa outros, apenas porque reconhecemos ates deles ue nfo sabem, ou que ¢ fas o que eréem. A deficiéncia dos primatas nio-humanos_em atribuirignorincia ou falas crengas aos seus jovens pode, por isso, explicar a auséncia de esforgos pedagégicos, pois s ir a jwando estes estados sio reconhecidos € que tentamos corrigir deficigncia, através da demonstrago, da explanagzo ou da sal. ‘Até os chimpanzés mais humanamente “assimilados” pou ‘manifestam, se algo manifestam, da atribuigo que leva & actividade ‘ional. se pengisa sobre primatas inferiores mostra mesmo quai, Com base nas observagdes que efectuaram sobre o comportamento ;°Cultural Learning”, Behavioral CM Toms A.C Kg Ra and Bram Seances, 180) 1993). 95 a 'S. Savage-Rumbaugh, J. Murphy, R. A. Sevick, ee Ba Witianye DL. Rmbwgh Language Compcrsion in Ape and ithe Sven for Research Chd Development 58-4 use. Schoenfeld "Sin Langage Com cascen Chimpanees Sign Language Suis 42 1988) ert The Chimpanzees of Gombe: Pater of Behvir (Canbrge, Harvard Unersiy Pes,98) i ams, Kroger Rates, “Ctra Lanning 18 ACULTURA DA EDUCAGAO dos pequenos macacos afticanos em liberdade*, Cheney e Seyfarth foram levados a conc! ipesar de poderem utilizar conceitos abstractos ¢ ter motivagées, crengas e desejos, os macacos parecem. stados mentais aos outros: falta-Ihes uma ‘teoria Iho sobre outras espécies de macacos revela ites’. A questio geral é clara: as convicgdes acerca da mente do aluno sustentam a intengao de ensinar. Sem imputacdo de ignordncia, nao hé empenho no ensino, ‘Mas dizer que apenas os seres humanos compreendem outras ‘mentes e tendem a ensinar os ignorantes € passar em claro os variados rocessos como o ensino se pratica nas diferentes culturas. A variedade éassombrosa'. Precisamos de saber muito mais sobre esta diversidade, se pretendermos avaliar a relagao entre ia © pedagogia Populares nos diferentes contextos culturais. Compreender esta relagao torna-se particularmente urgente Sempre que se trate ir no campo de reforma educativa. Decididamente, temos por certo que a uma dada concepgio de aluno, {nsita no docente, corresponde uma conformagao de ensino por este Praticado, tornando-se, pois, fundamental munir os professores (ou os pais) das mais actualizadas teorias sobre a mente da crianga, Neste mesmo sentido, precisamos também de fornecer aos professores um certo discernimento acerca das préprias teorias culturais” que orientam, ‘0 seu ensino. As pedagogias culturais, por exemplo, reflectem uma variedade de conviegdes acerca das criangas: estas podem ser vistas como teimosas e carecendo de correcgdo; como inocentes e precisando de ser protegidas da sociedade vulgar; como carentes de capacidades DL. Cheney eR. M, Sylar, How Monkeys See th World (Cia University of Chicago Press, 1990). - a vs “Do Monkeys Ape Pater K. ivamente por « ‘Popular por serem os sentidos mais apropriados (N. do"T). 76 PEDAGOGIA CULTURAL passiveis de desenvolvimento apenas através da pratica; como recipientes vazios, destinados a ser preenchidos com o conhecimento que 86 05 adultos podem fornecer; como egocéntricas, com necessidade de socializagao. Cor culturais deste género, expressas por leigos ou por “pe iém de ser severamente “desconstruidas” para se Ihes avaliar as implicagSes. E que, sejam correctas ou nao, o impacte que estas maneiras de ver provocam sobre as actividades docentes pode ser enorme. Uma psicologia cognitiva culturalmente orientada nao ‘menospreza a psicologia popular como mera superstigao, como algo ue apenas interesse ao conhecedor de popularices bizarras. Tenho afirmado constantemente que nao basta explicar o que fazem as criangas’ ; trata-se & de determinar o que eles pensam que fazem e que razbes tém para o fazer. Como nova tarefa no ambito das teorias da mente infantil," uma abordagem cultural acentua que a crianga s6 gradualmente chega a realizar que esté a agir ndo directamente sobre “o mundo”, mas sobre as crencas que tem acerca desse mundo, Esta deslocagdo crucial do realismo ingénuo para uma compreensio do papel das crengas, que corre nos primeiros anos escolares, provavelmente nunca € completa. Mas uma vez em marcha, dé-se frequentemente uma deslocacao correspondente naquilo que os professores podem fazer para ajudar as criangas, Com tal deslocagio, por exemplo, as criangas podem assumir mais responsabilidades no sentido da sua prépria aprendizagem e do seu proprio pensamento." Podem comegar a “pensar sobre o seu pensamento” e sobre “o mundo”. Nao € de estranhar, pois, que os testadores de exceléncia se preocupem cada vez mais néio com aquilo que as criangas sabem, ‘mas com a forma como elas chegaram ao seu conhecimento'®, Assim (4. Bruner, Acts of Meaning (Cambridge, Mass: Harvard University Press, portuguesa: Actos de significado, Lisboa, Edigbes 70, 1997. ;, Contributions in Human Development, 21 (Basileia: Krager, 1990), pp. 108-126. n ACULTURA DA EDUCAGAO. se exprime Howard Gardner, em The Unschooled Mind: “Temos de meter-nos dentro das cabecas dos nossos alunos ¢ tentar entender 0 mais exactamente possivel a fonte ea energia das suas concepgdes"”, Em termos ousados, a tese emergente & que as prticas educativas escolares se baseiam num conjunto de crengas populares acerca da mente infantil, algumas das quais podem ter funcionado advertidamente a favor ou inconscientemente contra o préprio bem- -estar da crianga. Elas devem ser explicitadas e reexaminadas. Diversas abordagens ao ensino e diversas formas de instrugio - desde do até & instrugdo, & descoberta, & colaboracio ~ reflectem assungoes e crengas diversas acerca do aluno ~ desde o actor conhecedor, ao experimentador privado, ao pensador colaborante' © que falta aos primatas superiores € os humanos continuam ¢ desenvolver um conjunto de crengas acerca da mente, Estas crengas, Por sua vez, alteram as crengas acerca das fontes e da quanto a lamos com a compreensdo da mente infantil sio, pois, um requisito prévio a todo o progresso em pedagogia. E evidente que tud tenha salientado 0 “ensino- ‘no sentido convencional, poderfamos com a mesma_ facilidade slientar outros aspects do espirito humano igualmente importantes para a pritica educativa, tal como concepgdes populares (°) K. Egan, Primary Understandin 8 PEDAGOGIA CULTURAL de desejo, de intengio, de significado ¢ também de “dominio”. Mas hem sequer a nogao de “conhecimento” é tao pacificamente apolinea como isso. Considere-se, por exemplo, 0 que & 0 conhecimento, qual a sua origem e que vantagem dele obtemos. Estas so também questdes ‘com profundas raizes culturais. Para comecar, veja-se a distingdo entre coisa permite concluir que um conhecimento aparentemente complexo pode, muitas vezes, ser reduzido por derivagdo a formas mais simples de conhecimento antes adquiridas. As hist6rias de mistério de Ellery Queen “5”, e que elas tém de ser capazes de imaginar o que “significarn” nomes de logaritmo, a partir de trés exemplos, sendo cada um dos quais uma série que leva esses nomes. A primeira série € 2, 4, 8, 16, 32; a segunda série, 3,9, 27, 81,43, eaterceira série, 1, 10, 100, , 100000. Os mimeros correspondem, em logaritmicos de 1, 2, 3, 4 e 5. Mas com é possivel designar 8 também por 27 e por 1000? 0 que as criangas “descobrem’” (ou inventam) E no 6 a ideia de expoente e de poténcia, mas descobrem/inventam também a ideia de expoente para uma base: ou seja, que 2 & terceira poténcia é 8, que 3 a terceira poténcia é 27 e que 10 8 terceira poténcia é 1000, Uma vez. que as criangas (por volta dos dez anos) tenham pasado Por esta experiéncia, a sua concepgdo de conhecimento matemético ‘enquanto “derivacional” ficard para sempre alterada: elas terdo captado 9 ACULTURA DA EDUCAGAO. ‘que, sabida a adigdo e também que a adigdo pode ser repetida diferentes vezes para formar uma multiplicagao, se fica a saber 0 que so os logaritmos. O tinico que é preciso determinar € a “base”. ‘Ou, para sairmos de um dominio demasiado “matemético”, experimente-se levaras criangas a representar o Capuchinho Vermelt i com toda a gente a ter um seguidamente por actores e: personagens perante uma assisténci recitada ou lida atum grupo, por um: processos? Alguma crianga adiantaré de imediato que, no primeiro exemplo, s6 hd actores, sem assisténcia, mas no seguinte existe ambos, a aula terminard para dar lugar a uma discussio sobre “teatro”, em termos que rivalizam com a sugestdo de Victor Turner'®. Como no ‘caso do exemplo anterior, as criangas so levadas a reconhecer que sabem muito mais do que pensavam, mas que tinham de “pensar sobre isso” para saber 0 que sabiam, E isso, afinal de contas, era 0 que 0 Renascimento e a Idade da Razdo procuravam, Mas ensinar e aprender desta maneira significa adoptar uma nova teoria da mente. escolha-se 0 tema da origem do nosso conhecimento, p igualmente profunda. As criangas comegam tabinahnents por admkic que » professor poset © coshec nto que transmite & classe, Em condigdes apropriadas, cedo aprendem que 0s outros elementos da turma podem também possuir 0 conhecimento e que este pode ser partithado, (Naturalmente, sabem isto A partida, mas 6 a propésito de questées, tais como, onde se devem encontrar as coisas). Nesta segunda fase, o conhecimento existe no grupo ~ mas de forma inerte. E que papel tem a discussao de grupo enquanto modo de criar 0 conheciment simplesmente descobrir quem possui esse conhecii um passo mais além, um dos mais profundos aspectos do conhecimento humano. Se ninguém no grupo “sabe” a resposta, onde se tem de ir “descobrir coisas”? Este € 0 salto para a cultura enquanto armazém, casa de ferramentas ou qualquer coisa do género, Hé coisas {que cada individuo sabe (mais do que ele préprio julga); mais ainda (CV. Turmer, From Ritual to Theater: The Human Seriousness of Play (Nova Jorque: Performing Ars Jou ications, 1982). (°) Brown and Campione, “Communities of Learning and thinking” 80 00018 CETL onhece o grupo ou é passivel de ser descoberto por meio da discussfio muito mais ainda se encontra armazenado algures — na isto é, nas cabegas das pessoas mais sabedoras, nos ros livros, nos mapas, e por af adiante, Virtualmente definigdo, ninguém, numa dada cultura, sabe tudo o que ha para | Entio, que fazemos quando ficamos bloqueados? E que problemas topamos ao buscar 0 conhecimento de que precisamos? Avangando para a resposta a esta pergunta, entramos na estrada real, rumo a inteligéncia do que é a cultura. Em circunstancia ‘alguma comegard uma crianga por reconhecer que o conhecimento € poder, ou que é uma forma de riqueza, ou que € uma rede de seguranga. Consideremos, pois, mais em pormenor, algumas concepgdes alternativas acerca das mentes dos alunos comummente sustentadas por te6ricos educacionais, professores ¢, finalmente, pelas prOprias criangas, Sao elas que podem determinar as priticas educativas que tém lugar na sala de aula nos diferentes contextos culturais. Modelos da mente e modelos de pedagogia So quatro os modelos dominantes de mentes dos discentes que tem preponderado nos jempos. Cada um deles realga um objective educacional distinto, Estes modelos nao sio apenas cconcepgdes da mente que determinam 0 modo como ensinamos € educamos”, mas so também concepgdes sobre as relagdes entre as ‘mentes e as culturas. O repensar da psicologia educativa requere que examinemos cada uma destas concepgées alternativas do desenvolvimento humano € reavaliemos as implicagdes que tém na aprendizagem € no ensino. 1. As criangas enquanto aprendizes por imitagdo: a aquisigao do *saber-fazer". Quando um adulto demonstra ou modela, para a \cgfio bem sucedida e especializada, essa demonstraao esta implicitamente baseada na convicgao do adulto de que: a) a crianga nao sabe fazer x; b) actianga pode aprender a fazer x, vendo ‘a demonstragdo. © acto de executar pressupée também que: c) a ccrianga quer fazer x; d) pode, de facto, experimentar fazer x. Para aprender por imitagao, a crianga tem de reconhecer os objectivos perseguidos pelo adulto, os meios usados para atingir esses Objectivos e o facto de que a acco demonstrada a fard alcangar 81 ACULTURA DA EDUCAGAO com éxito 0 objectivo. Pelos dois anos de idade, as eriangas si . as apazes, difeentemente dos chimpanzés erados na natusza, de © acto em questio. Os adul a imiiar 0 acto em questo, Os adultos, reconhecendo mis rans a correctamente". Com efeito, fornecem “ 0 jecem “exemplares silenciosos" do acto, exemplos arti Y desejada”. Esta modelagem é a base do aprendi i m prendizado, levando o aprendi aos métodos especializados do perto. O perito procura eammiti uma habilidade, que ele préprio adquiriu através da pratica repetida, um aprendiz.que, por sua vez, tem de praticar 0 acto-modelo para ter sucesso. E pequena a distingao, neste intercdmbio, conhi -m e a imitagao tornam possivel i ralmente relevante, até mesmo uma gerago pra sgu i io como vereulo de ensi u conviogdo adicional acerea da competéneia humana: a de que ova consiste em talentos, capacidades e habilidades, mais do que em conhecimento e compreensio. Do ponto de vista da imitagio, a p ige através da prética. Um ponto de vis aue impossiblita 0 ensino dos logaritmos ou do teat noe moldcs anteriormente descritos. O conhecimento “desenvolve-se como um bio” endo se prende nema eorias nem a negociagBes ou dscussio, certo que rotulamos de tradicionais as culturas que contam Bruner and D. R. Olson, “Learning th ae n, rough Experience and ing through Medi P. Gross, and W. Melody, orgs. Understanding the New *Culturai 82 PEDAGOGIA CULTURAL EDA OGTA CULTURAL amente com a psicologia e pedagogia populares de pendor ‘vo. Mas as culturas tecnicamente avangadas também contam 1a macissa com as teorias implicitamente imitativas ~ por 0, sobre aprendizados orientados ps idades sofisticadas. A formagio de ui ige mais do que “o conhecimento da teoria das regras do pentdmetro jambico. E tal e qual Aristételes ¢ 0 ‘uma vez mais. ‘Que sabemos, pois, acerca da demonstragao e do aprendizado? Nao muito; mais, porém, do que se poderia suspeitar. Por exemplo, ‘simples demonstragao do “modo de fazer” ¢ a correspondent pritica sabe-se que nio bastam. Hé estudos de pericia que provam ‘que a mera aprendizagem para aquisigdo de destreza nao tem a mesma eficdcia que a pericia flexive aprende através de uma combinagio entre a pratica ¢ a explicagio conceptual tal como o pianista bem formado precisa de mais do ‘que umas mios geis, sendo-the necesséio pelo conhecimentos tedricos de hi de sol ima simpl se qt Ig0 fe mais avangada. O que nos leva ao seguinte conjunto de pressuposigdes sobre a mente humana. 2. Ascriangas que aprendem a partir de uma exposigdo diddctica. Aaaquisicao do conhecimento proposicional. O ensino didéctico baseia- se normalmente na nogdo de que os alunos devem ser confrontados ‘com factos, princfpios e regras de acgiio que so para aprender, recordar e aplicar, Ensinar nestes moldes € admitir que 0 aluno “nao sabe que p”. € admitir que ele ou regras ou prinefpios trans! ‘bjecto de aprendizagem para o aluno é concebido como estando “na” ‘mente dos professores, tanto como nos livros, nos mapas, na arte, na ACULTURA DA EDUCAGAQ_ base de dados, seja onde for. O conhecimento destina-se simplesmente a ser “admirado” ou “escutado”. Trata-se de um none explicito ou corpus—uma representacao daquilo que-se-conhece. Assume-se que 0 conhecimento processual, 0 saber como, decorre automaticamente-do Gonfeimento de certs proposgdes acerca de fas, tons cols 0 tridngulo Go sno no tdngulo eto, 0 quatado da hiptenisa igual & Neste cendrio didactico, jé no se concebe as habilidades enquanto saber como fazer com destreza alguma coisa, mas antes enquanto novo conkecimento, como aside cers ais como, verbal, espacial, numér imtrpessoal, ov qualgue our, Eis avez a mais popula correne de pedagogia cultural na pritica de hoje — seja em hist6ria, estudos socials, literatura, geografia ou até em ciéncias e mat seu principal atractivo € ode pretender oferecer uma especificagao clara justamente daquilo que se rata de aprender e, igualmente questiondvel, ode sugerit padroes para alcangar a correspondente realizagdo, Mais do que outra teoria de pedagogia cultura, tem produzido intimeras formas de testes ghietivos, Para avai eo alo “aprendeu” a capal da Albina, 0 que é preciso fazer€ propor-he uma: jaentreTi fino ue ¢ ren fzeréprporhe uma esclha mile Tan, Mas vociferar contra a conject modo. E gue, rancamente, hi se pode ter utilmente por “obj al como s aeeettis aaa anaes examinado a luz do direito consuetudinario inglés, ou saber que a Fugitive Slave Law” se transformou num estatuto americano em 1793, ou que o terramoto de Lisboa destruiu a cidade em 1755. 0 ‘mundo est certamente repleto de factos. Mas 0s factos nio servem para muito, quando oferecidos a esmo ~ seja pelo professor ao aluno ‘a aula, seja na direcgao inversa, como o debitar de nomes num exame laremos a este asunto mais tarde, quando falrmos iva ntrar-nos aqui sobre a concepedio da ment que a visio didéctica impose ao ensino ~ a sun pedagogia cultor _ Esta visio pressupde que a mente do aluno é uma tabula rasa, um quad spagado. O conhecimento depositado na mente diz-se sendo 0 conhecimento ulterior edificado sobre 0 mento anteriormente existente. Mais importante € © ica € como chover no em que 0 conhecimento 84 PEDAGOGIA CULTURAL sto desta visio segundo a qual a mente infantil ¢ passiva, qual receptéculo apto a ser preenchido. A interpretagdo activa, construtivista, nfo entra no quadro. A perspectiva didacticista vé a crianga de fora, de um ponto de vista proprio de terceira pessoa, em “entrar nos seus pensamentos”, E nitidamente de via © ensino no é um didlogo matuo, mas um ditado de um para ‘a crianga falha na operagio adequada, de “habilidades mentais” ou pelo baixo QI: e o sistema educat livre de censura. E precisamente 0 esforgo por alcangar uma perspectiva na primeira pessoa, em reconstruiro ponto de vista dacrianga, que marca a terceira pedagogia popular, a qual regressamos agora. 3. As criangas enquanto pensadoras. O desenvolvimento do intercémbio intersubjective. A nova onda de pesquisa sobre “outras ‘mentes” descrita anteriormente é a mais recente manifestagio de um esforgo contempordneo mais geral para reconhecer a perspectiva da crianga no processo de aprendizagem. O professor, segundo esta cconcepgio, preocupa-se em perceber o que a crianga pensa € como chega aquilo em que acredita. As criangas, tal como os adultos, so vistas como construindo um modelo do mundo, para as ajudar a construir a sua experiéncia, Exercer a pedagogia € ajudar a crianga a entender melhor, mais consistentemente, menos unilateralmente. A compreensio é fomentada através da discussio ¢ da colaboracdo, cencorajando-se a crianga a exprimir melhor as suas préprias visdes, para a conseguir uma certa conjugago de mentes com outros que podem ter outras concepedes. Uma tal pedagogia da mutualidade pressupde que todas as mentes hhumanas sio capazes de sustentar crengas e ideias que, através da discussio e da interacgo, podem ser orientadas para um determinado ‘quadro participado de referéncia, Criangas e adultos tém os seus pontos de vista,e cada qual € animado a reconhecer a visdo do outro, mesmo que possa ndo concordar com ele. Devem chegar a reconhecer que as visGes divergentes podem assentar em razdes aprecidveis e que estas, razies fornecem a base para dirimir crencas rivais. Umas vezes, estou cu “errado”, outras vezes, esto os outros — isso depende da razoabilidade das concepgses. Por vezes, ambas as visdes opostas estio correctas ~ ou ambas erradas. A crianga ndo € puramente ignorante nem um recipiente vazio, € antes alguém capaz.de raciocinar, de encontrar sentido, tanto por si mesma como através da discussio 85 ACULTURA DA EDUCAGAO com 0s outros. A crianga, néo menos que o adulto, é vista como capaz de pensar acerca do proprio pensamento, e de corrigir as suas ideias ‘e nogdes por meio da reflextio —“indo além”, como as vezes se diz. A crianga, numa palavra, 6 olhada como um epistemélogo e como um te. Nao menos que 0 adulto, a crianga € pensada como detendo “teorias” mais ow menos coerentes, nio s6 acerca do mundo, mas também acerca da sua propria mente e da forma como funciona. Estas teorias ingénuas so levadas & congruéncia juntamente com as dos ais © professores, no por imitagdo, ndo por meio da instrugdo didgctica, mas por meio do discurso, da colaboragiio, da negociagio. O conhecimento € aquilo que se partilha num quadro de discurso”, dentro de uma comunidade “textual”. As verdades so 0 produto da rova, do argumento e da construgdo, mais do que da autori textual ou pedagégica. Este modelo de educagio é mutuali dialéctico, mais preocupado com a interpretago e a compreensio, do que com a perfeigao do conhecimento factual ou da realizagao jé exercitada. Nao € que esta visio mut i ianga” (um termo com um si as € muito menos dominadora da mente infantil. Tenta um intercdmbio de entendimento entre o professor e a crianga: a fim de encontrar nas intuigées da crianga as raizes do conhecimento sistemitico, como reclamava Dewey. Quatro orientagdes de uma recente pesquisa vieram enriquecer esta perspectiva sobre o ensino e a aprendizagem. Se bem que estejam intimamente relacionadas, merece a pena distingui-las. A primeira tema ver como modo como as criangas desenvolvem a sua capacidade de “ler outras mentes”, de conseguir saber o que os outros pensam ou sentem. E 0 que normalmente se classifica como pesquisa da inters idade. A intersubjectividade comeca pelo prazer da relagdo visual entre a crianga e a mie, durante as primeiras semanas de vida, transfere-se para a atengo conjunta de ambos para objectos (*) C.F, Feldman, “Oral Metalanguage”, D. R. Olson and N. Torrance, ‘xgs.. Literacy and Orality (Cambridge: Cambri 65, versity Press, 1991), pp.47- B. Stock, The Implications of Literacy (Princeton, N.J.: Princeton Press, 1983) 86 PEDAGOGIA CULTURAL ynuns, € culmina numa primeira fase em que a crianga € a sua ra conseguem a conjungao das mentes por meio de uma ade palavras ~ uma conquista que nunca esté terminada’ ica a apreensic por parte da ” dos outros — as stias crengas, teorias da mente, de um programa ind sobre o modo de a crianga adquirir as nogdes acerca do modo como os outros ststentam ou abandonam estados mentas varios. Preocupa-se em particular com a selecgiio que a erianga faz das crengas e opinides das pessoas, contrapondo as verdadeiras ou c as falsas ou , descobriu esta jeias da crianga ha € 0 estudo da metacognicdo — aquilo que as ceriangas pensam sobre a aprendizagem, a recordagio eo pensament ain ori pcan ee prdprias operagtes cogitvas aecta os prpris processos ments ‘Aprimeira contribuicdo importante deste trabalho, um estudo Brown, mostrava como as estratégias de recordagao eram profundamente alteradas pela orientagio do olhar interior da crianga para o modo como ela mesma procedia ao tentar fixar algo na sméria.” Os estudos da aprendizagem colaborativa e de solugio de problemas constituem a quarta linha da nova pesquisa, a qual se centra no modo como as criangas explicam e reexaminam discursivamente A CULTURA DA EDUCAGAO. as suas crengas™. Tém proliferado nao s6 na América mas também nna Suécia, onde a recente pesquisa pedagégica se tem dedicado a estudar © modo como as criangas compreendem e como gerem a propria aprendizagem”. (O que todas estas linhas de pesquisa tém em comum é 0 esforgo de compreenstio da forma como as criangas organizam a propria aprendizagem, a meméria, a colocagao de hip6teses e 0 pensamento, Diferentemente de outras teorias psicolégicas, voltadas para modelos “cientificos” aplicados as actividades cognitivas infantis, esta obra explora a estrutura da prépria crianga para perceber melhor como ela ‘chega as concepedes que acabam por provar serem as mais titeis para ela. A psicologia cultural da crianga (e 0 seu crescimento) tomna-se objecto de estudo. E, naturalmente, uma tal pesquisa prove o professor lo muito mais profundo e menos condescendente daquilo encontrar na situagao de ensino-aprendizagem. Dizem alguns que a debilidade desta abordagem esté no facto de ela tolerar um grau de relatividade inaceitével no que se tem por “conhecimento”. Sem diivida, exige-se mais para justficar crengas do que simplesmente partilhé-las com os outros. Esse “mais” € 0 vo das crengas de cada um, os cénones do ft fico e filos6fico. O conhecimento, ao fime ao cabo, € a crenga justificada, Ha que s ientemente pragmético nas préprias Concepgoes sobre a za do conhecimento para reconhecer a importéncia de uma tal critica. Existe um “pés- modernismo” desvairado que aceita que todo 0 conhecimento pode ser justificado simplesmente por encontrar ou formar uma “comunidade interpretatitva” que esteja de acordo. Também nao Precisamos de ser to da velha guarda que insistamos em que 0 conhecimento s6 € conhecimento quando é “verdadeiro” no sentido de que toda a contestagio fica eliminada. A “hist6ria verdadeira”, sem ter em conta a perspectiva em que foi escrita, é, na melhor das ‘Deanna Kuhn, org.. Developmental Perspectives on Teaching and Learning Thinking ‘Skills, Contributions in Human Development, 21 (Basileia: Krager, 1990), pp. 108- Roy D. Pea, "Seeing What We Build Together: Distributed Multimedia Learning ments for Transformative Communications” The Journal of the Learning 8, (3) (1994): 219-225, Ver, por exemplo, Ingrid Pramling, Learning to Lear: A Study of Swedish Preschool Children (Nova Torque: Springer-Verlag, 1990), 88 PEDAGOGIA CULTURAL uma tentativa de jipéteses, uma anedota maliciosa e, na pior, n eee a. As contestagdes a “verdade” devem ser sempre justificadas. Devem ser j I6gico mais estrito, ficadas, apelando as razdes que, num sentido item retain ea desoenga, AS aes jem incluem obviamente apelos & prova que desafia fa cet. Masa fl dade raramente € uma questio de “sim- ou-nio”, pois hd muitas vezes interpretagdes variantes que si incompativeis com a prova disponivel = se no toda a provay pelo (0s a suficiente para que seja convincent ‘men Mao hi nenhuma razio a priori pela qual a te sbordagem ao ensino © i aprendizagem nao seja compativel com esta epistemologia mais pragmética. Trata-se de uma concepgio conhecimento muito diferente da segunda perspectiva, na qual o conhecimento era encarado como fixoe independente da perspectiva ‘do conhecedor. E que a propria natureza do processo de conheciment ® se alterou nos nossos dias, Hacking faz nota, por exemplo, que antes do século XVII se pensaya que existia uma fractura intranspontvel € opiniao, sendo objectivo aquele e subjectivo entre conhecimento ¢ opiniao, jetivo aque «subjective no o conhecimento inte Ae tiio-A). Mas até ao nivel analitico, a visio que Simos dbatendolanga m lar ceptic sobre impsico prematra de modelos formais ¢ l6gicos a médulos de conhecimento empfri s as “rigidas” ciéncias naturais. exter Tarde tad isto,€certamente possivel dar um passo em frente na concepsao da pedagogia cultural ~um passo que, 2 semelhanga de outros jf por nés examinados, se baseia em consideragdes epistemoldgicas. Em questio est 0 modo como crencas subjectivamente sustentadas se tomaram teoris vidveis acerca do mundo e dos seus facts, De que modo se converteram as cren¢as fem hipéteses sustentaveis, nao pela forga da f€ que nelas pomos, rsophical Study of 1 teking The Emergence of Probably: A Pilon arly Nee bea Pay don and Sail Inference (Cab: Eamets Unersty Pes 1915) 89) ACULTURA DA EDUCACAO_ mas porque elas se mantém no intercmbio paiblico da prova, da interpretago e do acordo com o conhecimento vige hipoteses nao podem ser simplesmente “| Tém de ser abertamente testadas. A assergdo “hoje é terga-feira” transforma-se ‘num facto convencional no em virtude de ser “verdadeira”, mas pela conformidade com as convengdes que presidem a nomenclatura dos dias da semai ‘convengdo e, por is individuais. cimento objecti visio de Nagel daquilo que ele chama “a so justamente aqueles com que esta terceira perspectiva mais admiravel e directamente lida. Debrucemo-nos agora sobre a quarta e ultima das perspectivas da pedagogia cultural. 4. As criangas engi entoras de conhecimento: A gestdo do conhecimento “obj wt focagem excessiva sobre as crengas € os “estados © sobre a sua negociagio no discurso corre o risco de sobreavaliar a importancia da permuta social na construgio do conhecimento. Esta énfase pode levar-nos a sgubestimar a importiincia do conhecimento acumulado no passado. E que as culturas preservam o conhecimento fidedigno do passado, tal como a lei consuetudindria preserva o registo de como os conflitos ‘comunitérios do passado eram jul ‘ambos os exemplos existe tum esforgo por alcangar uma consisténcia exequivel, para evitar a arbitrariedade e chegar a “princfpios gerais". Nem a cultura nem o ito podem ser interpretados de forma precipitada. A interpretagdo 0 carimbo de “revolugdes cientificas velhos paradigmas" (€°)K. Popper. Objective Knowledge: An Evolutionary Approach (Oxford: Oxford U. Press, The Siructare of Sciemific Chicago Press, 1962). 90 PEDAGOGIA CULTURAL a OE ES ‘Vamos agora & pedagogia. Bem cedo, as ciangas deparam on 1 velha distingo entre 0 que € conhecido p\ ig 5 mhecido” nao é nema irrevogavelmente presente ordem de revisiio. Mas @ reconhecemos todos demasiado bem : verdade outorgadapor-Devs nem Sigamos, a Ja cultura, por outro. ngdo, mas também entender hist6ria do conhecimento, incorporar gogia? 0s de perspectiva na nossa pedagosia ‘iu deta enna ram as criangas 0 comeyarem asingit aquilo que é canonicamente conhecido daquilo que elas conhec ent aarpiede ree ec Asington ofeece una interessante dstorgo dest céssico rg gmt pene 6 wsada para veificar a crengas, as nang a cba =o proceso como se se aase de formar ume renga a4 “razes para crer” numa hipstese idade que acrenga embrechada jira funciona bem, entdo a Gitima (5 Comunicagao pessoal 91 ACULTURA DA EDUCACAO_ ‘se em crenga (ou hip6tese) para se tornar algo mais robusto ia provada ow até uma realidade de facto, E pela mesma intuigao, com facilidade pode chegar a ver-se as ideias ou crengas de alguém como relacionadas (ou nao) “com o que se conhece” ou com o que geralmente se cré ter atravessado a prova do tempo. Desta maneira, conseguimos ver uma conjectura pessoal Contra 0 que esta por trés daquilo que acabou por ser partilhado com © passado hist6rico. Os que, no presente, se empenham na procura do conhecimento, tormam-se participantes de conjecturas com aqueles que ha muito desapareceram. Mas € possivel avangar um passo e Perguntar como uma conjectura passada adquiriu maior solidez, com © andar dos anos. Pode-se debater Arquimedes com os parceiros de baloigo no recreio e saber como ele sustenta o seu ponto de vista Mas que dizer da interpretagdo como Catarina em A Fera Amansada ‘como a maria-rapaz da escola? Nao podia ser isso 0 que Shakespeare tinha em mente: nio “a conhecia” nesse sentido. Quer dizer, havia alguma coisa desse género no seu tempo? Ha qualquer coisa de atraente e, por certo, encorajador em confrontar a propria versio do “conhecimento” com os pontos fracos das celebridades arquivisticas do nosso passado. Imagine-se uma turma de liceu citadino ~ e de facto, em St Ant6nio, houve uma constituida por latino-americanos levar & cena o Rei Edipo. Aquela gente i to que S6focles talvez nem sonhasse. Era claro para o dotado professor/director que os alunos ndo estavam minimamente intimidadas com o «falecido homem branco europeu» que escrevera 4 pega ha dois mil anos, No entanto, foram figis ao espfrito da pega, Assim, a quarta perspectiva defende que hi qualquer coisa de ‘cada um deles tepresentando uma peca sobre a breve e admirdvel narrativa do Genesis em que Abraio, obedecendo as instrugdes de Deus, toma Isaac, seu filho tinico, para o sacrificar a Deus no alto do Monte Moria. Hé.um famoso conjunto de “versdes” da histéria de Abrado no Temor ¢ Tremor de Kierkegaard; ensaie-se isso também com eles, Ou \werifique-se a reacco de alguns adolescentes perante uma dtizia de diferentes reprodugdes da pintura da Anunciagao, em que 0 Anjo anuncia a Virgem que ela vai ser Rainha dos Céus. Pergunte-se-lhes, 92 PEDAGOGIA CULTURAL, servagio das diversas reprodugdes, o que na sua opinidio ar-se na mente de Maria — numa pintura onde Maria parece uma altiva princesa do Renascimento, numa outra onde se asemelha.auma Mata humilde, nour ainda onde parece wna jovem atrevida. E surpreendente como os adolescentes saltam rapidament mo que separa ¢ subjective “Mundo-2" de Popper, do fundo-3”. O professor, com exercfcios de turma . ajuda a crianga a ultrapassar as suas prOprias impresses i um mundo passado, que de outra forma seria remoto € alcance como cognoscente."* Educagio real Aceducagao real, naturalmente, nunca esté confinada a um modelo 10 ou a um modelo de ensino. A maior parte da edu esté longe. Qualquer escotha de uma pratica pedagégica implica uma concepgo de aluno «pode, com o tempo ser adopt por ele ou ela como a maneira adequada de pensar 0 processo de aprendizagem. que a escolha de uma pedagogia transmite inevitavelmente uma concepedo do processo de aprendizagem e do proprio professor. A pedagogia nunca é inocente. E um meio que veicula a sua propria ‘mensagem. Sumério: o repensar das mentes, das culturas e da educagio Podemos conceber as quatro visdes do ensino-e-aprendizagem até agora expostas, ordenando-as em duas dimens6es. A primeira € uma dimensio “de-dentro-para-fora”: chamemo-la a dimensio internalista-externalista. AS teorias externalistas realgam 0 que 0s adultos, a partir de fora, podem fazer pelas criangas em prol da (9) M. Donaldson, Human Minds: An Exploration (Londres: Allen Lane, Penguin Press, 1992) 93 A CULTURA DA EDUCAGAO. aprendizagem — 0 grosso da psicologia educativa tradicional. As teorias internalistas centram-se naquilo que a crianga pode fazer, naquilo que a crianga pensa que esta a fazer, e em como a aprendizagem se pode pressupor aqueles estados intencionais. ‘A segunda dimensdo descreve 0 grau de intersubjectividade ou de “compreensio comum” supostamente exigido entre o teérico pedagégico e os sujeitos a que as suas teorias se referem. Chamemos- -Ihe a dimensio intersubjetiva-objectivista. As teorias objectivistas encaram as criangas como um entomélogo pode encarar uma colénia de formigas ou um tratador de elefantes, um elefante; ndo ha a presungo de que os sujeitos se vejam a si mesmos nos mesmos termos aplicam as mesmas teorias Daf que eles procurem para as criangas organizarem a prOpria aprendizagem e gerir as suas vidas como 0 so para os adultos que trabalham com elas. As teorias intemalistas tendem a ser enfaticamente intersub- jectivas. Isto é, se alguém se preocupa com aquilo que compete ‘mentalmente & crianga, tem de se preocupar também em formular uma teoria de ensino-e-apren «muito preocupada com o modo “como pensam os teorias dos antropélogos sio, digamos, nao para os ; para os seus colegas que ficaram em casa’*, Admite-se habitualmente, embora de forma técita, que os nativos sio “diferentes” ou que simplesmente no compreenderiam. E, na verdade, algumas teorias desta mesma ordem — no preocupam-se muito com o: © nativo, a crianga é “« adulto — te6rico ou professor ~ comporta-se como 0 narrador omnisciente dos romances do século XIX: sabe perfeitamente o que se passa na mente do protagonista do romance, mesmo que 0 préprio protagonista nio o saiba. rticularmente conscienciosa da orentago ocidental ifford Geertz, Works and Lives: The Anthropologist ford University Press, 1988), 94 PEDAGOGIA CULTURAL, A pedagogia modema dirige-se progressivamente para a visio de ‘que a crianga seria consciente do seu préprio processo de pensamento, de que € crucial para o te6rico pedagégico (e o mesmo se diga do professor) ajudé-la.a tomnar-se mais metacognitiva—a ser tio consciente do seu andamento no aprender e no pensar, como 0 € acerca da matéria idade de realizagdo € 0 conhecimento curmulativo nao sio suficientes. O aluno pode ser ajudado a atingir 0 ‘completo dominio, também através da reflexio sobre o modo como trabalho e como a sua abordagem pode ser melhorada. com uma boa teoria da mente ~ ou uma teoria do funcionamento mental ~ é uma parte do auxiio nesse sentido. Ao fim e ao cabo, pois, avalia-se melhor as quatro perspectivas s de um continente mais vasto, sendo o seu significado {luz da sua parcialidade. Ninguém pode sensatamente apacidades e as habilidades cultivadas sao irrelevantes. Nem é possivel defender que a acumulagao de conhecimento factual & sem valor. Nenhum critico atento exigira alguma vez.que acrianga nao deva tomar-se consciente de que 0 conhecimento est dependente de uma perspectiva, e de que partilhamos e negociamos as nossas perspectivas no processo de demanda do conhecimento. E seria fanatismo negar que nos tomamos mais ricos ao reconhecermos o elo entre o conhecimento fidedigno herdado do passado e o que aprendemos no presente. Importa, sim, que, reconhecidas como partes de um ccontinente comum, as quatro perspectivas se fundam numa congruente unidade. As velhas concepgdes da mente, e de como a mente pode ser cultivada, precisam de ser tosquiadas do seu estreito exclusionismo, e ‘as concepgGes mais recentes precisam de ser moduladas para reconhecer ‘que, embora as capacidades e os factos nunca existam fora do contexto, ‘go so menos importantes dentro do contexto. Os avangos contemporineos no estudo do desenvolvimento humano comegaram a prover-nos de uma nova e mais firme base, sobre qual é possivel construir uma teoria de ensino-e-aprendizagem mais preocupou — ou seja, com a crianga enquanto ser activo e intencional; com 0 conhecimento enguanto “obra do homem’” e ndo apenas ja disponivel; com 0 modo como 0 nosso conhecimento do mundo e das

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