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ee A COMPLEXIDADE DOS OBJECTIVOS EDUCACIONAIS ce nae, alah arene ni commer tes ‘Como nos tempos mais revolucionérios, também o nosso é ‘surpreendido em contradigées. Na verdade, a um exame mais acurado, ‘as contradigdes em semelhantes tempos transformam-se frequentemente em antinomias — essas parelhas de amplas verdades que, embora possam ambas ser verdadeiras, nem por isso deixam de se contradizer uma & outra. As antinomias proporcionam frutwosos campos nao s6 em conflitos, mas também em reflexao. E que elas recotdam-nos que as verdades nfo existem independentemente das perspectivas de quem as sustenta tais como so. ‘As verdades educacionais em tempos revolucionérios sao também afectadas por antinomias. Nada tem de surpreendente, pois, que haja contradigdes antinémicas até nos objectivos da primeira educagdo — ‘gentuinas antinomias. Sao estas que pretendo explorar neste capitulo. Estou particularmente interessado em saber como as nossas ideias ‘emergentes sobre a primeira educago nos conduziram a tais antinomias como, através de uma consciéncia maior, as podemos transformar em liges para os tempos de mudanga que temos pela frente. ‘Comecer ‘a exploragio expondo brevemente trés das antinomias mais desconcertantes. Estas fornecer-nos-do temas sobre antin sm uma reso pragi johr gostava equenas verdades slo falsos; os opostos de grandes verdades podem também ser verdade. Por isso, a nossa preocupagio sera sobretudo pragmética 7 ACULTURA DA EDUCACAO. A primeira antinomia é esta: por um lado, 6 uma inquestionével fungo da educago capacitar as pessoas, seres humanos individuais, a ‘operar no maximo do seu potencial, las com instrumentos e sentido de oportunidade para usar 0 proprio engenho, capacidades paixdes, ao n imo. A sua contrapartida antinémica é que a fungio da educagio é reproduzir a cultura que a suporta ~nio apenas reproduzi- la, mas também ainda os seus fins econémicos, politicos e culturais. Por exemplo, o sistema educativo de uma sociedade industrial deve produzir uma voluntéria ¢ complacente forca de trabalho que a faga avangar:trabalhadores incapacitados e semicapacitados, trabalhadores de escritério, gerentes intermédios, empresdrios sensiveis ao risco, todos eles esto convencidos de que semelhante sociedade industrial constitui © correcto, valido € tinico modo de vida. Mas pode a escolaridade ser interpretada como instrumento de realizagao individual e, simultaneamente, como técnica ra? A resposta, ‘no inteiramente sim”. E enquanto reprodugio cul hegemonia e do con mo, mesmo que mantenha a Encontrar um caminho dentro ‘obretudo em tempos de répida ntecerd facilmente seja em que época for. Mas se nao se enfrenta esse problema, corre-se 0 risco de falhar ambos os ideais. A segunda antinomia reflecte duas concepgées contraditérias sobre a natureza e os usos da mente, de novo ambas meritérias quando tomadas individualment aprendizagem é, por assim dizer, dentro da cabeca, Os alunos devem, ao fim e ao cal € na prépria motivagao para benefi Para oferecer. A educagao fornece os meios de robustecer e cap: 98 nossos poderes mentais inatos. Embora, segundo esta visio, educagio eleve o nivel de funcionamento de toda a g mentes dos mais superiormente pro que os mais bem dotados podem beneficiar mais da educasio, 98 A COMPLEXIDADE DOS OBJECTIVOS EDUCACIONAIS _____ACOMPLEXIDADE DOS OBECTYOEEr——— i tal se situa Jo contrastante desta é que toda aactividade mental s em, céwustenada por umaparlho cultural mais ou menos habilitador. Nao somos meras mentesisoladas de capacidade divers, &s qua se hed jontar umas capacidaes. O modo mais ou menos adequado dante procede quanto ao dominio ¢ 40 us0_ So gree ee nt ode frau de favorecimento e de eapacitago da "utensilager” cltural i a0 aluno. Na verdade, 0 Fe ror bola da cultura actuliza as auttcascapacidades nevitavelmente interpessoais, pois envo i ncluem uma variedade de inicativas conjuntas «professors, Atravs desse tipo de colaboragio. a v ha acesso aos recursos, aos sistemas erianga.em desenvolvimento ganhaacesso a recurs ane seas ‘Se hé diferenga nos dotes maior proveito da sua inerentes ao impulsionar de um dos lados desta antinomia com exclusio do outro sd to erticos que € melhor aprazara sa discusso até que sejamos capazes de as encary do contexto, 0 que faremos daqui a pouco. ; jrfamos na confusio da contro\ converte-se com demas Murray! ira e ultima antinomia rarfssimas vezes se explicita no ‘como as maneiras de pensar, rimentar © mundo hio-de ser v radi aan a rporada na questo, "Quem possi a versio correcta ‘Permita-se-me que, sem ceriménias e com o necessério ‘0s dois lados desta antinomia. Um lado defende (¢) Procurou-se obter um jogo de palavras como no original nature. urture, wr) [RJ Hermstein and C. Murray, The Bell Curve: Intelligence and Class Structure in American Life (Nova lorque: Free Press, 1994). 99) ACULTURA DA EDUCACAO_ que a experiéncia humana, o “ E legitimado por seu proprio di digamos assim, : r reduzido a uy u superior” e mais autoritéria®. fodos os esforgos para impor significados mais autoritirios sobre uma experiéncia local estdo sob a suspeita de hegeménicos, servindo objectivos de poder e de dominio, sejam intencionais ou nao. Isto, naturalmente, € uma caricatura do tipo de an > algumas vezes refetido como “ uma © até nos estudos legais criticos. Na educaga decerto 0 movimento da “desescolarizacao” Mas até nas versoes mate extremas, ndo pode ser imediatamente posta de parte. Ela exprime algo de profundo sobre os dilemas que implica 0 viver na sociedade burocratizada contemporinea. © lado contrastante deste terceira antinomia — a busca de uma Yor autoritariamente universal ~ & também susceptivel de ser empolado pela auto-integridade. Mas ignore-se pot momentos a Pomposidade dos autodesignados intérpretes de indisputdveis verdades uniyersais. E que hé aqui também, neste lado, uma exigéncia inresistivel. E inerente & integridade profunda, para o bem ou para 0 ‘mal, com a qual qualquer modo de vida de uma cultura mais vasta exprime as suas aspiragdes, historicamente radicadas, a boa vontade. 8 ordem, ao bem-estar & justiga. As situagdes humanas, embora possam sempre exprimir-se a si mesmas localmente, no tempo, no lugar e na circunstiincia, s8o todavia uma expressio de uma historia mais universal. Ignorar essa hist6ria mais universal 6 negar a legitimidade da cultura mais alargada. A histéria da classe trabalhadlora sem referencia a um conjunto mais lato em que aquela se manifestava ar s nto serem nio deixam de fazer parte de um continente mai particulares, largo. ©. Geert, Afier the Fact (Cambridge, Mass.: Harvard U. Press, 1995); cal Knowledge (Nova Torque: Basic Books, 1983), cau Detrida, Writing and Difference (Chicago: U. of Chicago Press, 1978). 100 A COMPLEXIDADE DOS OBJECTIVOS EDUCACIONAIS ‘Temos, pois, trés antinomias: a da realizado individual versus a da preservagao da cultura; a antinomia centrada no talento versus a centrada no utensilio e a antinomia do particular versus 0 universal. Nao as tendo em linha de conta, arriscamo-nos a perder © modo de avaliar o que aprendemos sobre a primeira agem e onde nos movemos. Elas ajudam a guardar 0 08 diversos talentos inatos, mas carecemos também de prover a todos com os instrumentos da cultura. Precisamos de respeitar a unicidade da experiéncia e das identidades locais, mas nao podemos amparar-nos como povo, se o custo da identidade local for uma Torre de Babel cultural. Estas so as questdes que raramente se levanta por forga dos preceitos gerais de larga escala. Elas requerem um jufzo caso a caso. Mas concentrar em escolas individuais comprometidas em préticas particulares, para ver 0 que delas podemos aprender em geral, € uma {arefa demasiado grandiosa. Por isso, debrucar-me-ei sobre uma espécie particular de educagao e sobre 0 modo como as suas préticas sedesenvolveram a partir da busca e do trabalho pratico. Em seguida, deslocar-me-ei para matérias mais gerais. Comecemos por "Head Start", um microcosmos revelador. Embora tenha tido precursores incipientes, todos eles de pendor ideol6gico e ut6pico, étinico por ter sido impulsionado por uma série de descobertas cientificas sobre a natureza da primeira fase de desenvolvimento. E a semethanga da maioria dos factos relativos & condigdo humana, aqueles cedo se converteram de factos em ‘metéforas e daf em preceitos orientados a pratica. Antes de mais, um pouco de hist6ria, para perceber melhor 0 sentido daquilo que motivou este particular conjunto de acontecimentos. luz de descobertas, que os animais criados em ambientes ‘eram deficientes quando, mais tarde, se submetiam & prova de aprendizagem estandardizada e a tarefas de solugdo de 101

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