Você está na página 1de 4
aE JEFFREY PFEFFER Chega de con Pfeffer: 6 a acao, e nao apenas © conhecimento, a vantagem competitiva da Era da Informacao Veja quando isso tende a acontecer: Ninguém confere se o que foi definido 6 realmente implementado Falar muito 6 confundido com fazer muito ‘As pessoas esquecem de que Simplesmente tomar uma decisao nao muda nada Ee ‘Um dos principals obstéculos & Implementaedo do conhecimento nas empresas, segundo Pfeffer, esti em substitulr a a¢do pela Falacso. Planojamentos, reuniées © laboragae de relatorios sa0 definides como “acdes validas”, mesmo quando nao tem efeito algum na empresa 0s funcionatios sao avaliados de acordo com o quao inteligentes parecem ser, e nao de acordo com suas agées ‘As pessoas acreditam que o ‘que esté inscrito na missao da ‘empresa 6 verdade @ necessariamente acontece Linguagem, idéias, processos c-estruturas Complexos sao considerados melhores que 08 mais simples EXAME/4 DE QUTUBRO DE 2000 versa fiada Para o professor da Universidade Stanford, ha muita discussao e pouca acao nas empresas Por Cynthia Rosenburg ODOS 0S ANOS, COMPANHIAS DO MUNDO TODO investem bilhdes de délares em treinamento, mais de 1000 livros de negécios so publica- dos e cerca de 80.000 profissionais concluem cursos de MBA apenas nas escolas americanas. Diaria- ‘mente, executives em qualquer ponto do planeta tém acesso as tiltimas informagdes do mercado. Parece que ‘nunca houve tanto conhecimento dispontvel no mundo corporativo. Por que, entio, as empresas raramente con- seguem colocd-lo em pritica? O americano Jeffrey Pfef- fer, professor de comportamento organizacional na Uni- versidade Stanford, nos Estados Unidos, estudou essa questo durante os tiltimos quatro anos. Jintamente com seu compatriota Robert Sutton, também professor em Stanford, Pfeffer descreveu suas conclusdes no livro The Knowing-Doing Gap — How Smart Companies Tum Knowledge into Action (algo como 0 Intervalo entre Sa- ber e Fazer — Como Companhias Inteligentes Transfor- mam Conhecimento em Aco), publicado pela Harvard Business School Press. “Curiosamente, conseguir agir 6 um dos maiores desafios enafrentados pelas organizacdes e pelos profissionais atualmente”, diz Pfeffer: De sua ca- ‘sa na Califérnia, ele falow a EXAME: A distancia entre Nao sei se maior, mas cer- conhecimentoe ago tamente mais critica. Até esta se tornando maior —_poucos anos atrés, a capa- no mundo corporativo? cidade de agir, de colocar informagdes em. pritica, ndo era to determinante como é hoje. Pense na Xerox. Em 1959 ela langou a tecnologia basica para a méquina copiadora. Treze anos depois, tinha 95% do mercado, EXAME/4 DE QUTUBRO DE 2000 usando basicamente os mesmos processos ¢ a mesma in- formagio. No mundo de hoje ¢ dificflimo imaginar uma empresa dominando 0 mercado por tanto tempo. AS vé- rias mudangas no ambiente competitivo — mais concor- rentes, mais énfase na velocidade, produtos com ciclos de vvida menores — fazem com que seja cada vez mais im- portante resolver a distancia entre conhecimento ¢ agio. Como a Internet influencia ‘esse cenario? Entre outras formas, fa- zendo com que 0 merca- do de agdes emita a ‘mensagem errada para as empresas. De 1999 para c4, sur- giu. um sem-niimero de companhias de tecnologia com novas idéias, planos de negécios, promessas de fazer € acontecer. Os investidores apostaram nelas de uma forma jamais vista. Deu certo? Nem sempre. Ao agir dessa for- ‘ma, 0 mercado deu 0 recado de que ter 0 conhecimento era muito mais importante do que colocé-lo em pratica. 0 senhor defende, em plena Era da Informagao, que o conhecimento nao é uma vantagem competitiva. Nao ‘Se trata de um paradoxo? Nao quero dizer, com isso, que 0 conheci- mento nao seja im- portante ou necessé- tio. Ele €, mas no 0 suficiente para deter- minar 0 sucesso ou a lideranga de uma empresa. Hoje, profissionais e companhias em qualquer parte do mundo tém acesso & mesma informagdo. Empresas de biotecno- logia e informética, entre outras, contratam gente vinda das mesmas universidades? Sim. Esse pessoal tem aces- so as mesmas ferramentas profissionais, como relat6rios cientificos, andlises de neg6cios, livros, publicacdes es- pecializadas? Sim. As tecnologias utilizadas sao seme- Ihantes? Sim. Dé para dizer, portanto, que a vantagem competitiva dessas companhias esté na informagao ou no capital intelectual que possuem? Nao, no da. Onde ela esta, entéo? Em agir. Em saber usar a in- formagdo e 0 capital intelec- ‘ual. Na indistria farmacéutica, o langamento de uma no- va droga dependeré muito mais dos processos ¢ sistemas, que permitirdo as pessoas trabalhar mais rapidamente. A 109 NTREVISTA FREY “As pessoas sao julgadas pelo que falam, nao pelo que fazem” gestiio do conhecimento coloca a informagiio num pedes- tal, fala em adquiri-la, disseminé-la, mas raramente indi- ca o que fazer com ela. As empresas Investem bilhdes Porque as empresas em treinamento. As pessoas: colocam obstaculos voltam de seminarios chelas na frente das pes- de energia @ de vontade soas. Nao permitem, de implementar coisas por exemplo, que te- novas. 0 tempo passa © nham tempo para nada acontece. Por qué? desenvolver coisas novas. Nao incenti- vam os profissionais a inovar porque algo pode sair erra- do. As companhias precisam se preocupar em criar 0 que ‘eu chamo de uma cultura de implementacdo. Quem implementa mais nao Sim, mas uma cultura de tem mais chances de errar?_implementacao deve ser também uma cultura de tentativa e erro, Todo mundo fala em aprender com 0 fra- asso, Mas quando fracassa de verdade acaba pensando: “Bem, na prética, errar nao € nada agradavel”. Ironica- mente, as empresas querem se transformar em learning organizations, mas no querem uma organizacao onde as pessoas possam realmente. aprender. Aprender, por defi- nigdo, significa fazer algo em que vocé nao é bom. Ima- gine alguém que sobe numa bicicleta pela primeira vez. Se a pessoa tivesse de sair pedalando, sem cair, provavel- mente nem tentaria aprender. Aprendemos quando existe uma cultura de lembranca e perdio. Lembranga para que ‘os mesmos erros no sejam cometidos mais de uma vez. E perdao para que todos se sintam A vontade para admi- tir seus erros e tentar coisas novas. Sim, porque vocé aprende fazendo. E as empresas fa- zem muito pouco uso disso — motivo pelo qual a edu- cago corporativa pode ser tio ineficaz. Na maioria das vezes, as pessoas sio mais incentivadas a ler, pensar e discutir do que a experimen- tar e tentar aplicar teorias. Tenho uma amiga que traba- hou na Northwest Airlines. Certa vez, durante uma gre- ve de funcionérios, ela e outros gerentes foram orientados a deixar suas salas e cuidar de tarefas operacionais. Ela cuidou da parte do transporte de bagagens durante uma semana, Disse que, naquele periodo, aprendeu muito Vale a pena agir mesmo quando nao se tem certeza de que se trata da coisa certa a fazer? 0 mais sobre os problemas daquela frea e sobre como re- solvé-los do que conseguiria se ficasse anos dentro de seu escritério estudando o assunto. A Honda incentiva seus operdrios a visitar virias fibricas para detectar problemas in loco. Descobriu que funciona melhor do que tentar en- siné-los a resolver defeitos numa sala de aula. © empresario Michael Bloomberg Acho que é uma Sugere que as pessoas facam forma de tratar 0 reunides de pé — assim sintoma, e niio a nao se perde tempo e todos causa. As pessoas partem logo para a acao. falam demais nas © que o senhor acha disso? ‘organizagbes. Con- fundem falar e planejar com fazer. Acham que discutir um problema é a mesma coisa que resolvé-lo. Que tomar uma decisio é a ‘mesma coisa que implementé-la. As pessoas passam tan- to tempo preparando reunides, participando de reunides ¢ escrevendo relatérios que ndo sobra tempo para 0 que realmente importa. Esse € um dos principais obstéculos & aco nas organizagbes. Outro problema: estudos sobre as formas como as reuniGes so conduzidas mostram que pessoas criticas tendem a ser consideradas mais inteligen- tes. Elas gostam de demonstrar isso explicando com deta- Ihes por que determinada idéia pode nao dar certo. Num ambiente como esse, quem vai querer apresentar idéias? Por que se fala tanto Por varios motivos. Entre eles, as organizagdes? porque essa é uma forma de ser reconhecido. Repare como as pessoas costumam ser julgadas pelo que falam. Alguém diz que fulano € esperto e inteligente e, quando vocé vai ver, ele na verdade soa esperto e inteligente — é articu- lado, tem um bom vocabulario, impressiona quando diz algo, Assim, € avaliado de acordo com 0 que diz, e nao com o que faz. Come evitar isso? Dando reconhecimento pelo que as pessoas fazem e nao pelo quéo es- pertas elas parecem. Isso faz. parte da criacdo de uma cul- tura de ago. David Kelley, principal executivo da amet cana IDEO Product Development, uma das mais premia- das companhias de desenho industrial, costuma dizer que a tentativa ¢ 0 erro so mais eficientes que o planejamen- to de grandes intelectos. Essa é a mensagem que vai para todas as pessoas da IDEO, inclusive na forma como elas slo reconhecidas. Conheci um ex-funcionério de ld, por EXAME/4 DE OUTUBRO DE 2000 Bao JEFFREY PFEFFER “Nao é preciso contratar empreendedores, e sim forma-los” exemplo, que foi trabalhar numa empresa de distribuicao na Web. Enquanto uma equipe discutia um problema ope- racional, cle foi ld tentar resolvé-lo. E conseguiu. Empresas que adotam sistemas de remuneracao baseados em performance tém mais chances de diminuir 0 espago entre conhecimento e acao? Sim, desde que 0 sistema nao seja ba- seado no individuo, sim em equipes ou unidades. As orga- nizagdes so com- plexas, formadas por sistemas interdependentes, e pode ser dificil avaliar a contribuigdo ou 0 comportamento de uma tinica pessoa. Pode, também, desencorajar o trabalho em equipe. Ele esté relacionado & implementacao pelo simples fato de que’ vocé consegue fazer mais coisas quando tem a ajuda ¢ o incentivo de outras pessoas. © senhor diz que a Porque as empresas confundem smeméria corporativa fidelidade ao passado com fazer pode ser um as coisas do mesmo jeito. A ame- grande obstéculo —_ricana AES. que atua na rea de ‘fag. Por qué? —_energia, € uma companhia que ‘nao comete esse erro. A empresa possui, hé décadas, quatro principios basicos. Mesmo as~ sim, consegue responder rapidamente a mudangas, ¢ de formas sempre diferentes. Os valores permanecem os mesmos, 0 que muda é a forma como eles so implemen- tados no dia-a-dia, dependendo das circunstancias. Nao muito bem. Elas ofere- cem uma fonte fabulosa de informagdes para que as pes- soas entendam conceitos priticas do mundo dos negécios, mas no ensinam como aplicé-los. As escolas de negécios devem ser mais como escolas de medicina, no sentido de promover periodos longos de atividades préticas. Nao ¢ A toa que muitos alu- nos de MBA vao trabalhar em consultorias. Durante o curso eles aprendem a falar. Depois vdo para as consulto- rias, onde ganham fortunas para fazer isso. E mais um si- nal de que © mundo corporativo valoriza pouco a acdo. As escolas de negocios realmente proparam as pessoas para a agao? Como criar uma culture implementacao? Estabelecendo uma filosofia que fale sobre aco. E preci- so estar atento a0 que acon- tece quando alguém tenta algo falha. A empresa diz “in- teressante, vamos ver 0 que dé para aprender com isso”, 12 ou penaliza ou demite a pessoa? Também ¢ importante ti- rar algumas praticas de gesto do caminho, como o pla- rnejamento em excesso, ¢ entender que a tendéncia natu- ral das pessoas para aprender e inovar ndo deve ser barra- da, Algumas empresas gastam um tempo enorme tentan- do moldar os funciondrios de acordo com um modelo predeterminado. Enquanto isso, eles vao ficando menos criativos e perdem a capacidade de ago. Descentralizar e promover a comunicagdo intema é igualmente funda- ‘mental. Para isso, é preciso garantir que as pessoas te- ham em miios as informag@es de que precisam para to- ‘mar e implementar decisdes sempre que necessério. © senhor menciona o executive Ajuda bastante James Goodnight, dafabricante quando o exem: de software americana SAS, como plo vem de ci ‘exemplo de um presidente que ma, mas cle ndo sabe transformar conhecimento em deve vir apenas agio. 0 exemplo deve vir de cima? do presidente. Hi Iideres em diver- s partes da organizacdo, cuidando de divisdes, departa- ‘mentos ou de pequenos grupos de trabalho. Essas pessoas devem ter um comportamento modelo. Menciono Good- night, entre outras coisas, porque ele implementou uma cultura incrfvel na SAS. L4, quando alguém tem uma idéia — seja ela razodvel ou ndo —, € incentivado a im- plementé-la. Como ele diz, quem sabe no que pode dar... Companhias que querom agir Na verdade, isso nao como a SAS procisam de que tem a ver com 0 pro- tipo de profissional? fissional. O que im- porta é a forma como a empresa permite que seus funciondrios se transformem em empreendedores. Nao é preciso contratar empreende- dores, e sim formé-los e no entrar no caminho das pes- soas que querem implementar as coisas. Como descobrir a real De uma forma relativa- distancia entre mente simples. Primeiro, conhecimonto © acdo numa deve-se descobrir 0 que determinada empresa? as pessoas acreditam ser importante para 0 de- sempenho da companhia. Em seguida, é necessario per- {guntar se essas coisas esto realmente sendo feitas. Algu- mas empresas consideram que, porque acreditam em de- terminadas coisas € dizem que s4o importantes, elas acontecem na pritica —e nunca vaolfconferi. XAME/4 DE OUTUBRO DE 2000

Você também pode gostar