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JOAO PAULO G. PIMENTA Texto Ww _ se ESTADO E NAGAO NO FIM DOS IMPERIOS IBERICOS NO PRATA 1808-1828 EDITORA HUCITEG SP oe Sio Paulo, 2002 nS 6 . FORTALECIMENTO E FRACASSO DA UNIDADE Antecedentes da guerra principal destes “velhos problemas” dizia respeito a viabili- zagio dos projetos unitérios. No caso da América portuguesa, a questio era a da configtragio politico-territorial do novo Império do Brasil, a0 paso que no Prata hispanico empreender-se-ia nova e derradeira ten~ tativa de aglutinar interesses politicos provinciais em torno de um mes- mo centro de poder. Ambos 0s processos continuardo caminhando jun- tos, conhecendo ponto méximo de ligagio com o inicio da guerta entre Brasil e Provincias Unidas, em dezembro de 1825. Entre 0s anos de 1822 ¢ 1825, 0 petiodismo cresceu significariva- mente no Prata hispanico e no Brasil. Em 1822 tiveram infcio as publi- cagdes, dentre varios, do Correia do Rio de Janeire ¢ de importantes pe- riédicos provinciais como o Pansense ¢ 03 pernambucanos Conciliador Nacional e a Seutinela da Liberdade na Guarita de Pernambuco, % primeira das varias publicagdes de Cipriano Barata.' No ano seguinte, surgiram trés outros de grande circulagio: 0 Didrio do Goverino, que com 0 cncer- ramento das atividedes da Gazeta do Rio de Janeiro em dezembro de 1822 passou a exercer o papel de divulgador oficial dos documentos do governo; o Tamoio, editado pelos Andradas cm oposigio a D. Pedro: ¢ 0 Tifis Pernamucano, de autoria de frei Caneca, lider da posterior Confe- derago do Equador deflagrada no Nordeste de Brasil em 1824, Em (0 Corel do Rin de Janeira cra edicado pot Joto Soares Lisbos, tend publicado ape simadantente 165 admeros entre 10/4/1822 « 24/11/1823:0 Partens. prime petite sien ediudo no Par, su entre 4/1822 e 2/1823; 0 Condadir Nacionah cle Pernambucn, salu ente 7/1822 64/1825, ea Seninla da Liberiade ente 94-© V6 1/1822. dnaie ds Bilis Nasional, «85; Sodse. Op- ci 194 FORTALECINENTO & FRAGASSO DA UNIDADE 1824, fot publicado o primetro periédico do Cearé, 0 Dirio do Governo do Ceavd No Prata hispinico merecem destaque, em Montevidén, 0 Expositor Gisplatino, edicado em portugues € pr6-Cisplatina; La Aurora © Ef Panpero, contririos a0 governo portugués.’ Em Buenos Aires, a Gaeta Mercantil, periédico mais duradouso da primeira metade do sé- culo XIX: 0 Argenvino, um dos principais veiculos defensores do federa- Jismo € de oposigao ao projeto unitério de Buenos Aires; € 0 importante E! Nacional, cujo proprio nome ja indica ser partidérie de um projeto nacional (no caso, de unido e centralizagto das provincias em torno de Buenos Aires).* Nese panorama de crescente atividade period'stica, os destaques conferidos por grupos politicos aos problemas e a fragilidade de seus rivais, por meio dos periddicos, mostra a dificuldace da construgao de novos carpos politicos na América ibérica. O Didrio de Governo noticiou adescoberta de uma conspiragio em Buenos Aires que pafecia esten- der-se a:é Santa Fe ¢ Entre Rios, ¢ que “nos confirmam que as faiscas cia gueria civil, sopradas pela ambicao e capricho dos particulates, tm excitadc um quase universal ineéndio naquela parce de América Aus- tral”, cujo governo até entio “parecia melhor acreditado” (DG n* 118 de 28/5/1823). Da mesma forma os ataques de indies pampas, que esta- iam causando problemas de abastecimento a essa cidade (DG n° 131 de 4/12/1823), De outro lado, 0 Argos de Buenos Aires empreendia tarefa semelhante, levando 0 Didrio a estampar em suas paginas frequentes contescaqdes s cle, reafirmando a suposta comunhto de interesses en- tre as provincias do Império do Brasil ¢ sua lealdade a0 novo monarca (0 Divi do Gicerna foi publicado com essa denominagdo entre 2/1/1823 e 20/5/1824, passand a se chamar Didrie Mlaminense a partic de 21)5/U824, retornando ao antigo ‘nove em 25/8/0801, com o qua enesrrou suas aividades om 25/6/1883, Era editadn pr Manuel Forreiea de Arajo Guimardes, depois fci Francisco de Santa Teresa de Jesus Sampaio e Finalmente Januisio da Cunha Barbosa: 0 Tania publicow 35 ndme- ros enige 12/8 ¢ H1/T1/1823; 0 Tit Pernambucano shiv entre 25/12/1823 & 5/8) 1824, Aris da Bibloece Navin,» 85; Sodee. Op. ct 0 Kxpuinr Gxptatina pablicow somente um timer, em 1/4/1822. No obstante sua duraga cftmers, dpifiea bem os conflites polfticas ene as diversts posigBes ‘oxpressiy ns pericalismes ima ver que favarivel A ineoeporigae a0 Reino de Brasil, nace Ferazmente -rgon Fd Panipero publicou eatorze ntimetes entre 19 & 28/12) 1822; ur Aavoit dercesete nimoros cntte 21/12/1822 e 29/4824, Feret Jans. Op. vic: Priderio, Indice eronoligie dela prensa peridica del Urugeay 1807-1852. \ Gest Merson foi editala entre 10/1823 e 2/1852, rotalizando 8.473 numeros. Do Argentine sairaon 48 qdimerus enere 17/12/1824 e 10/2/1825. ]6 Bf Nacional, editad pr lgeucio Nate, Valentin Alsina e Pedro Feliciano de Cav, publicou 54 admeses ‘ais um suplemento, entre 23/12/1824 e O/4/1826. Cantlog de Bertie eudamerica- tris Galvin Moone. Ed periods angentiny FORTALECIMENTO £ PRAGASSO DA UNIDADE 195 # 0 caso da descrigao de festejos em Pernambuco (lembre-se do espec~ «ro da revolucio de'1817) por conta da aclamagao de D; Petiro em 12 de outubro, com 0 objetivo de levar “a todos os Brasileiros 0 conhecimento da opiniio pablica das diferentes Provincias do Império, a qual tio des- figurada aparece na boca de nossos inimigos” (DG n° 1 de 2/1/1823). Nao obstante todo o estranhamento, anteriormente descrito, que por todos os lados a incorpordeao da Cisplatina ao Brasil causara, as novas a ela referentes eram inclufdas no Didrio.dentre as noticias “nacionais”, que invariavelmente “continuam a concordar sobre a pacificagao ¢ cran- Ghilidade de que gozam aqueles Estados, 0 que ndo s6 é devido a fir- meza de carter de seus habitantes, como tambem a boa politica, pru- déncia, € moderagao da maioria dos seus Chefes” (DF n° 118 de 26/5/ 1824). Como era de se esperar, a polémica sobre o cariter da ocupagio portuguesa continuou acesa. Os principais ataques pablicos a ela conti- nuaram a vir do Argos de Buenos Aires, qualificade pelo Didrio do Gaver. 10 como “incansavel apéstolo da separagio da Provincia Cisplatina” (DG 1°58 de 12/3/1823). Por sett turno, 0 novo Império do Brasil lidava ainda com 0 “fantas- ma” das Cortes de Lisboa, que entre 1821 ¢ 1822 se manifestaram vee- mentemente contrérias & manutengio da ocupagio da Cisplatina, 0 que agora significava dificuldades em se fazer reconhecer pela ex-metipo- le como corpo politico auténomo. O argumento das fronteiras naturais {especificidade territorial) passa entio a ser empregado como legitimacao da existéncia do novo Estado, como mostra a cara de um leitor (o “Ob- servador Gonstitucional”) publicada pelo Didrio do Governo: “a conduta, que os dominadores das Cortes de Lisboa, seus Corres- pondentes, ¢ Emissarios tém adotado, Ciosos da grandeza do Brasil, assentaram esses Sicofantas, na sua alta sabedoria, ¢ liberalismo, que 0 Rio da Prata nto devera ser mais a fronteira natural d6 Brasil, € que este Império devia por aquele lado ficar exposto, e vuinerivel” (DG 0°33 de 11/2/1823).* Essa vulnerabilidade se daria na medida em que, de acordo com a mesma carta, “diferentes Estados Amervcaros do Sul ainda se acham em armas, ¢ no gozam de uma forma de governo tanquila, e estével”. E notivel como a construgio do Estado se insereve em uma conjuntura mais ampla, dependendo diretamente da ordem (ou desordem) pol ca da vizinhanga. Em defesa dos direitos do império sobre a Cisplatina, © A eae é datada do Rio de Janeiro em 30/1/1823, 196 PORTALECIMEN'TO FRAGASSO DA UNIDADE referinda-se a0 “terreno, que contra todo o direito, © fé dos tratados usiirparam 0s Espanhéis aos Estados do Brasil, a que sempre perten- ceui a banda oriental” (DG n°59 de 1019/1823), 0 Didrio publicou um ar- ‘igo utilzando a mesma argumentacio empregada em 1821-22, ou scja, a seyuranga c a estabilidade proporcionadas aos seus habitances: “Gs Povos Cisplatines conhecem perfeitamente, que a idéia de uma independéncia, tal qual ela € sugerida pelos anarquistas, nenhum fundamento tem: que o resto da América Expanhola retalhado em es- tados diferentes, © muitos destes ainda dividides em partidos, mal pode cuidar cada um da sua seguranca, arranjos internos, ¢ muito menos concorter por meio de socorros para'a dos outros; que nestas circurstancias é-Ihe sem comparacio mais vanta‘osa a sua incorpora~ $0 a0 Império do Brasil, poderoso, respeitado, ¢ jé na sua nascenga Solidamente baseado, como ele se acha, do que a outro qualquer Es- tado" (DG "70 de 29/3/1823). A “solidez” a que se refere 0 artigo advinha da permanéncia de um membro da familia real a testa do novo Estado. Mesmo antes de sua coroagis, 1. Pedro personificava um clo de ligacio possivel entre as diferentes provincias, afinal, diante da possibilidade - logo concretiza- da ~ do retorno de D. Joao & Europa, seu sucesscr legitimo parecia a \inica va para a manutengéo do sistema mondrquico na América porcu- guesa. Zssa idéia representa uma continuidade dentro de ruptura, ou Seja. 2 construgdo de um novo corpo politico (Império do Brasil) em substituigao a0 anterormente existente (Reino do Brasil) seguindo 0 mesmo prinefpio normatizador das relagdes entre as partes. A indepen- déncia do Brasil foi uma revolugo conservadora em um sentido bastan- te distirto das revolugdes americanas de 1810. Nestas, 2 manutencio da ordem emergia como justificativa para uma prética revolucionscia ‘que logo daria lugar a um discurso igualmente revolucionario. No Bra- sil, a manutengio da ordem surgia como caminho de transformago po- lirica, acentuada om sev carter de ruptura com 0 advento do consti- sucionalismo, No plano simbélico, porém, em ambos os casos a busea da “order” parece significar uma expresso da perplexidade ¢ dificuldade de acao politica dos homens da época, em um contexto marcado pela multipli Cidade de projetos, Uma carta publicada no Didrio, subscrita pelo “si cero amigo do Brasil”, sintetiza essa posi¢io, mostrando temar com re- lacdo a9 projeto unieétio do Brasil mesmo ap6s a independéncia: FORTALECINENTO & FRACASSO DA UNIDADE 197 “Bsea tendéncia para a anarquia bem se rem manifestado aos olhos daqueles que t8m atravessado as Provincias setentrionais, nas quais pela quase total exting2o do influxo da Corte, 0s édios, ¢ rivalidades de Provincia com Provincia, de Vilas com Vilas, de familias com fa- milias, tem-se desenvolvido de um modo terrivel, © a nfl ser o Grande Nome de Pedro, 20 qual todos os partidos se referem, mais lamenti- veis ainda teriam sido 0s sucessos, ¢ rios de sangue teriam corrido. [. 1. Vamos pois repetindo, Sr, Redator, gléria, eterna gidria, @ D. Pedzo, inico né dos Membros do imenso Brasil, nico Palidio da sua atual existéneia como Império, e da sua futura eivilizagio, e pros peridade!” (DF n°93 de 28/4/1825). Ainda que correndo risco da redundancia, vale a pena transcrever ‘um trecho de um extenso artigo da mesmo Dirio, onde & reafiemada a transcendéneia da figura de 1. Pedro como fator determinante para a superagio das dissid@ncias provinciais, para a qual se esperava em bre~ ve a reunito de uma constituinte: “As Provincia, apesar do cisma Politico suscitado pelo Governo Provisério da Bahia, e das lisonjeiras expressdes, com que 0 Con- gresso de Portugaf tentava desvis-las da Confeceragao Brasilia, dando © titulo de Provincias daquele Reino as que a ele se uniam, conhe- ceram imediatamente a necessidade de um centro, € consideraram como 0 maior atentado contra @ sua liberdade, e progressos o fatal Decreto que mandava retirar a S.M.L, entio Principe Regente, gue pela Sue Alta Hierarquis, e Instrugdes que S.V.F Lhe deixou, consti- tufa aquele centro. Elas viram que perdendo aquela Augusta Persona~ gem, perdiam com Ela um ponto ao redor de qual os Povos correm naturalmente a reunit-se: viram que faltando esta reunio, faltava cam- bém a forga, € por conseguinte os meios de defesa: viram que per- dendo aquele centro, nao tinham outro que pudesse comunicar 0 impulso a tio dilatado territério, e conduzi-lo A felicidade, que ane~ lavam: viram que este impulso nao podia ser bem comunicado, sem que o centro, donde ele deve partir, tivesse 0 maior grau de forga possivel; € em conseqUéncia disto aclamarsm Imperador Aquele Mesmo Augusto Regente, ¢ querem que a Assembigia-Geral, que est4 préxima a reunirse, dé a maior latitude ao Poder Executivo, pois que de outra sorte ficaria sufocada no seu mesmo gérmen a feli- cidade da Nagio, ¢ frustradas as lisonjeiras esperancas que os Povos tém concebido. [. . J. O Brasil. longe de dividir os interesses do Mo- area e dos Povos, quer identificé-los; e desta sorte nflo teme con- 198 FORVALEGIMEN'TO & FRAGASSO DA UNIDADE fiar-Lhe a devida forga, e poder, pois que abusar dele 0 Monarca e satentat contra a sua Nagao, seria atentar contra a sua individual feli- cidade” (DG "28 de 5/2/1823). Enfim, a tarefa da unidade por ser realizada, para cujo sucesso pres- supunhasse a existéncia de um centro simbélico aglutinador dos dife- rences inseresses. Nessa tarefa, ciante da necessidace de obtengio do reconhecimento da independéncia do Brasil pelas peténcias européias, conditio sive qua non para a disponibilizagdo de recursos pecunidrios ex- temos que viabilizatiam empresas militares como a prépria manuten- clo da Cisplatina, definia-se 0 papel do monarca: personificando 0 mé- ximo poder politico € legitimando a construgao da unidade, garantiria a prese:vagio da ordem desejuda pelas elites. A conssante reafirmagao, clara e explicita, da importancia do monar- ca como viabilizador de todo esse processo, atribufa-lhe precisamente esse significado, em um movimento a ser compartilkado pelos leitores do Diiria, como nos mostram os dois trechos acima. Formado um novo corpo politico drasiteir, como articulé-lo com a referéncia nacional por- tuguesi, ainda dominante? Papel decisivo seria desempenhado. pela el boragio de um novo pacto politico constitucional Avearta de um outro leitor (subscrita “Coerente”), publicada no Did- vie, d4 a thnica da tarefa: Convencido destes Sélidos principios © Brasi/ se ergue do seu bergo d’ouro, em que jazcu por trezentos anos agrilhoado pela tira- nia Portuguesa, sacode 0s ferros, que o'maniatavam, ¢ aparece Nagio livre ¢ independente, efeitos naturais da sua geandeza fisica, © vai levado pela Mao dum Génio ao seu s6lio brilhante, partilha duvido- sa dum Deus Onipotente. Isto ato basta: quer corsolidar sua ventu- ra € € ro sempre grande e venturoso dia 12 de Outubro de 1822, que o consegue, Neste dia de eterna lembranga, por unnime aclamagao dos Povos, subiu a0 Trono dos Diamantes 0 Senhor D. Pedro Defen- sor Pempétuo do Brasi/, seu Imperador Consticucionak: era Ele esse Génio da Harmonia. Eis firmada, ¢ constituida a Nagio Brasileira” (DG 1122 de 3/6/1823)." © nove Estado, nese ponto, passa a ser associado também com uma nova nage. Contude, no era essa uma posigdo undnime, nem sequer dominante. Gomo nos. mostraram anteriormente 0 Correio Braziliense & Sour due FORTALECIMENTO & FRACASSO DA UNIDADE 199 a Malagueta, a criagao de um novo corpo politico nao implicava, neces- sariamente, uma nova referéncia nacional. Afinal de contas, naga de- signa uma coletividade que, no caso do Império do Brasil, ainda preci- sava ser definida, As resisténcias de provincias do Brasil a esse projeto de unidade sig- nificavam nio somente a possibilidade de govemos a ele alternativos, mas sobretudo a de manutengio da velha ordem. Apés a declaragao de 1822, a5 juntas governativas da Bahia, Maranhio, Paré ¢ Cisplatina continuaram fiéis as Cortes de Lisboa, e'as sangrentas Juas por sua ade~ silo 20 império inclufram a ag3o da marinha inglesa e da francesa.” Aca- baram por aderir 20 novo projeto politico somente a partir de julho de 1823, pouco tempo depois da inauguracao das sessGes da primeira as- sembléia constituinte do Império do Brasil (maio). ‘Tendo sido convocada ainda durante a regéncia de D. Pedro, em 3 de junho de 1822, a demora de um ano para sua reunito corresponde as, lutas politicas que se seguiram durante 1822 ¢ 1823, incluindo a defini- a0 da posicao de D. Pedro como novo imperaior. Isso demonstra a indefinicdo que persistia mesmo apés a declaraco de independéncia quanto & perpetuagao de qualquer solugao politica em detrimento de outcas.” Em meio & reaedo absolutista em Portugal ~ a Vilafrancada, iniciada em maio de 1823, terminou por extinguir o movimento constitucionalista vintista ¢ restaurar,o Antigo Regime’ -, a discussio sobre uma nova ordem no Brasil coube & assembléia, que logo se incompatibilizou com 2 pretensio de D. Pedro de concentrar amplos poderes, sendo dissolvi- da em novembro desse ano. A constituigdo outorgada pelo imperador em 1824 e a eclosto em Pernambuco do movimento contestatério da Confederactio do Equador, envolvendo varias provincias do Nordeste do Brasil, completam o quadro de crise institucicnal do império."* No quadro dessa crise estava levantada 2 diseussto sobre a melhor adequagio de cal ou qual sistema de governo, Da mesma forma como ocorrera nas anteriores centativas constitucionais das provincias do Pra- ta, no Brasil discutia-se abertamente qual tipo de governo regeria 0 novo corpo politico ~ ainda que 0 sisterna adotado na primeira carta viesse a a Costa Introduio ao estudo da emancipas © Novais & Mota. l ndependéncia politica do Braet, p. 38. Alexandre, Or sensdas do impéria, 9.753 e 9. ‘O movimento da Confederapio do Equador durou poucu mais de quateo meses sex o fwzilado um de seus principals lidetes, frei Joaquim do Amoe Divino Caneca, redator do Tifis Pernambucnno, Vide: Bernardes, Pacts sociale constitucionalisina sm frei Caneca p.122. 200 FORTALECIMENTO E FRAGASSO DA UNIDADE ser ode monarquia constitucional"* - em contrapontos inspirados, mais uma vez, pela situac3o da América espanhola. Em uma época na qual o argumento das fronteiras naturais subsicia- va leginmizagio de novos corpos politicos, 0 Didrio do Governo nos fa- lida vastidio e extensdo do Brasil, o que definiria o sistema monirquico como 0 mais adequado as suas caracteristicas. Raciocinio que remonta, novamente, a Montesquieu © ao The Federalist: “Passa em Politica por um axioma que as Governas devem ser aco- modaaos aos Pates para que sao feitos: © 0 Esptrito das Leis do profun- do Montesquiew é, desde 0 principio até o fim, uma continuada prova desta verdade. Outro axioma que também até agora nenhum homem sensato se atreveu a impugnar, € que 0 Sistema Republicano apenas podera ter lugar nos pequenos Estados, € que aos grandes sb concént 0 Mondnguico; verdade esta que 0 mesmo Roussear, tratando do seu Gontrato Sorial, vin-se Obrigado a confessar.” Assim sendo, é coerente que se recomendasse para a extensa Améri- ca espanaola 0 mesmo sistema do Brasil que, pela presenga de um ele~ mento articulador da diversidade ~ 0 monarca ~ resolveria 9 problema di falea de convergéncia de interesses politicos: “Ns ado podemos escurecer que, se 0 Brasi? rem caminhado tio rapidamente para a sua felicidade, se as Poténcias Estrangeiras ad~ miram a harmonia, com que prossegue no adiantamento da sua Re~ generaslo, se as Provincias gravitam todas para um centro comum, foi isto também devido em grande parte A muito atendivel circuns- incia de ter dentro de si a Augusta Pessoa de SM. gue nio concorreu na América Espanhola: porém fez ela todos 0s es- forgos para remedia-la? Esgotou todos os meios de-obter uma Pessoa da Dinastia Reinante, que viesse coma sua presenga impor freio aos partidos, sufocar as audazes pretenses dos particulares mais pode- rosos. ¢ ligar de novo 03 separados membros daquele vasto territd- rio? [.. [eA vista pois do que fica exposto podemos concluit com seguranga que, se a América Espanhola abragar o sistema Monirquico. (bier Livre que “o congragemento inicial das Forgas polteas se dissolveria © 0 ‘untroutede dias, sobre formas divergentes de pensar as bates do poder do Esta, mara a forte esse momento. E curt que. consttueionalisre monérquico se impu- ‘nha na discuss8e politica como via mais segura de legiimagio do Estado nascente ‘Novensinto, diverzente era pusigio de maior ou menor adesio aos prinefpios proc ‘atom ctimo liberals nagucle momento” ~ Op. cit, p. 224-5, ‘ FORTALEGIMENTO F FRACASSO BA UNTDADE 201 modificado por ume Constituigio sébia, sistema cuja utilidade Ihe niio € desconhecida, ¢ chamar ao Trono a todo o custo ums Persona- gem de qualquer das Dinastias Reinantes, para deste sorte evitar as funestas conseqtiéncias da ambigio dos naturais mais poderosos, a cujos caprichos tem sido até agora sacrificads, ¢ segurar ao mesmo tempo a conterplagio das Nagies Estrangeires, nio sé podera con tar com um mais prontg reconhecimento dos Soberanos da Europa, mas ainda com a eficaz cooperagao do grandioso Lmpério do Brasil” (DG 1928 de 5/2/1823). ‘A adogio da monarquia pelas provincias do Pata significaria para o Império do Brasil a seguranga de contar dentre seus vizinhos com um governo de base semelhante, o que no plano pritico estabelecia uma solidariedade politica tal qual j4 se observara entre 0 governo realista de Montevideu e 2 corte portuguesa do Rio de Janciro, em 1810. Gom isso, nfo s6 se garantiria mais segura base de negociagio a respeito dos conflitos com Buenos Aires ~ que, segundo o Diario, em tendo & testa do poder um monarca teria autoridade reconhecida pelo império ~ fo- cados na regiZo oriental, como também apareceria 0 novo império me~ nos incompativel ante as demais politicas em curso na América em geral, onde o republieanismo adquiria conotagio de modalidade espe~ cifica e radical de superagio do sistema colonial. Por fim, atender-se-ia ‘40s anseios das poténcias européias empenhadas no triunfo dos princi pios de legitimidade estabelecidos pela Santa Alianga no Congresso de Viena, oito anos antes. Uma série de artigos sobre a “marcha do Brasil e da América Espa- nhola, durante a atual Revohucio destes dois Prises” publicados pelo Dizirio nos primeiros meses de 1823 sintetizam esse panorama, Em um deles, lemos a preocupagto com “o meio de elevar nZo s6 0 Império do Brasil, porém todo 0 Hemistério Americano, 40 grau de felicidade, em que acdentemente desejamos ve-i0", ou seja, “pugnando pelo estabe~ lecimento do sistema Monérquico em todos Estidos deste Novo Mun- do” em prol do “bem geral da grande, e generosa Familia Americana” Mais adiante, no mesmo artigo, a construgio dos novos territérios (0 do Brasil obedecendo as suas “fronteiras naturais”) justifica a conquista © incorporasio de reas, com uma diferenga entre habitar e passuir inscri- ta na antiga Logica territorial do sistema colonial, com a possibilidade. de distingdo entre dircito sobre uma drea ¢ sua ocupagio de faco: “Discorrendo pelo vastissimo continente que habitamos, vemos um extenso Império limitado pelos dois meiores rios d'América, 0 202 FORTALECINENTO & FRAGASSO DA UNIDADE Amasones ¢ 0 Prata, Outro Império vai desde 0 istmo de Panamd © tem os seus limites setentrionais em a Nova A/bion, Todo 0 espaco que continua desde 0 Prana até ao Cabo de Horn, a costa que pelo ‘outro lado € banhada pelo Oceano Pacifico, e 0s Paises que desde o Golfo do México se dilatam até aos gelos do Pélo, sio habitados em a pequena parte por Nagées incultas: c os Povos civilizados, que 5 possuem, tém adotado todos pela forga invencivel de circunstin- cits, o s'stema Republicano; donde se segue que este tem sido a:é agora pradominante na naioe parte &! Amie, Yajamos porém se cle pode continuar @ sé-lo”. A persisténcia de idgias do Antigo Regime também é vislumbrada com a oposigdo entre América e Europa, com a referénzia a “Povos” © a reunido de seus representantes em “Dietas”: “Com efeito, quando Mr. De Pradt disse que a separagio d'América deve tet grande influgneia sobre 0s destinos do Universo, anuneiou a Exropa uma terrivel verdade. Todas as rclagdes existentes vao na- tural ¢ forgosamente invercer-se. Elevada a indiistria Americana a0 ponto de perfeigao, em que se acha a da Zrvpa, nada careceremos desta, a qual todavia nfo pode dispensar muitos dos nossos géneros, gue sio para ela da primeira necessidade. Esta época seré a da sua inevitavel e total decad@ncia: ¢ devemos crer de boa mente que a Buropa a espere imével ¢ de sangue frio, ¢ que deixe de-antepor todos os ttopegos, para embaracar o adiantamento d'América? (,..] Nenhum homem dotado de ordindrios talentos deixar de concordar conosco que 86 « forca de uma Liga Amerizana poderd resistir & forga de uma Liga Eurypéia: porém onde encontraremos n6s uma base para aquela Liga entre as Democracias Americanas? |. ..}. Parece-nos so- bejamente demonstrada a necessidade que tom a América de fundit em outro o Sistema Democratico, que por ora se acha em vigor em grande parte deste Continente; e discorrendo pelos inconveniences, que notamos naquele Sistema, ndo descobrimos outro que os reme- deie, sentio 0 Monarquico temperado ou Constitucional. Para evicar- mos repetigio das mesmas idéias, remetemos 08 nossos Leitores as que no pré-citado n 28 deste Diario expendemos sobre a matéria, acrescentando contudo que s6 por este modo veremos uma respeité- vel Die-a de Monareas Americanos, zelando os Direitos deste Hemis- fério, vigiando sobre a felicidade de scus stiditos, ¢ tratando por meio também de parentesco com as Dinastias Luropéias, de preservar © mantera harmonia dos dois Mundos” (DG a°64 de 20/3/1823). PORTALECIMENTO € FRACASSO DA UNIDADE 203 Finalmente, também a idéia de “solidariedade” entre governos de um mesmo tipo (monarquias) pode ser tomada como persisténcia de velhas idéias, ou seja, da positividade, por princfpio, de regimes mond quicos, embasada no interesse em se manter boas relagdes com os gran- des Bstados europeus (Gri-Bretanha, Austria, Franga, Prissia, Rssia) que poderiam garantir a existéncia politica do Império do Brasil. A su- peragio das relagdes com as metrépoles, comum ne década de 1820 a toda a América ibérica, ainda desempenha considerfvel papel de aglu- tinador potencial de interesses, até que a agudizacto dos conflites pla- tinos, com a guerra de 1825, redefina as posigGes. ‘esse modo, a discussdo sobre formas de governo tomando por base 1s caracteristicas de cada pats significa o avango do movimento, jé des- tacado em sua anterioridade, de especificidades a diferenciarem as an- tigas colOnias de suas antigas metrépoles e a determinarem politicas e5- pecificas, Dentre essas especificidadcs, a territorial é central, Sé para & elevagia do Brasil 2 condigfo de reino o préprio principe regente se valera do argumento de sua grandeza para justificar a medida, com a criagio do Império do Brasil adaptar-se-& a nova sealidade o duplo sen- ido da idéia de grandesa: grandeza fisica e grandeza moral. £ esse o sensido encontrado nas manifestagbes provinciais de ade- ‘slo a0 novo pacto em funcio da aclamagio do imperidor. Dezenas delas foram publicadas no Didrio do Governo a partir de \823, quase sempre fazendo referéncia A “grandeza” do novo império associada ao career da “obra” de seu “fundador”. E 0 caso das declaragdes da Junta da Pa zenda Nacional de Alagoas (“Protetor deste Vastissimo Império do Bra- si”), da Vila de Cananéia (“este fértil, © vastissima Continente, que a Providéneia, quando o tirou do esquecimento do Mundo, destinara sos Animos dos Brasileiros, ao Heréi por exceléncia, a0 Imortal Pedro, o Gran- de Fundador do primeiro Império do Novo Mundo”, da Vila de Valen~ a, comarca de IIhéus “({o chefe] Ihes afianga a paz, prosperidade, ri- queza, eliberdade em todas as Provincias deste vasto¢ rico Império”)* e da declaragto da Vila de Caneloncs, na provincia Cisplatina (“rico, € ‘vasto Império do Brasil”)." O proprio imperador reafirmava constante- mente a idéia, sendo a grandeza do Brasil fisicamente marcada pela na- ureza (ou seja, os rios Amazonas © Prata): © Darada de Alagoas, 7/2/1823, publicada no DG a? 65 de 21/3/1828, 1 Daraga de Cananéia, 1/1/1823, publicada no DG a” 67 de 2415/1828. & Datada de Valenga, 24/2/1823, publicads no DG n° 68 de 2631/1823, 1S Datada de Canelones, 15/7/1823, publicads no DG 0°65 de 18/9/1823. 204 FORTALECIMEN'TO E FRAGASSO DA UNIDADE “Confiai, Brasileiros, no Vosso Imperador, ¢ Defensor Perpétuo, 9 Qual nem Quer alheias atribuigdes, nem Deixard jamais usurpar as que de Direito Lhe devem competir, € que sio indispensiveis, para que sejais felizes, e para que este Império possa encher os altos des- tinos, que Ihe s4o marcados pelo imenso Atlant:co, e pelos soberbos Prata, ¢ Amazonas. [. . .] IMPERADOR" (DG 1°34 de'9/8/1823). Mas a importincia da idéia de territério.nesse momento nfo se res- tringe « tal associagio. Novos corpos politicos, imperativo era saber once terminava um © comegava o outro, do que surgia a necessidade de se acabar com a incerteza de limites com espacos pol'ticos externos. A as- sinaturs, em dezembro de 1822, de um tratado entre Carlos Frederico Lecor e Lucio Mansilla na condigao de represententes da Cisplacina ¢ de Entre Rios, respectivamente, pelo qual buscavam estabelecer os lie mites territoriais de ambas as provincias."* mostra contudo como os ter- ritérios conheciam no ambito provincial contornos mais claros do que ‘em outro ambito mais abrangente."” ‘Também.ndo € desprovido de significado 0.fato de 0 Didrio ter pu: blicado, dentre varios extratos do Correia Brasiliense ~ que corm liber- dade de imprensa de 1621 passara.a circular mais livremente no univer so portagués ~ um.em especial: uma “Coleco de Maximas Politi nas quais a espevificidade territorial — extensio e fronteiras delim das, de preferéncia, por limites “nacurais” ~ aparece como determinante tanto para a justificativa da superacao do sistema colonial quanto para a definigio da forma de se administrar um novo Estado. ‘Tomadas pelo Didrio som nenhuma critica, mostram que adquiriam um sentido real de axiomas politicos: “Todo o Estado ganha em forga unindo-se a outro; Todo 0 Estado perde da sta forga subdividindo-se em muitas partes; ‘Todo o Esta do luera.em ter fronteiras, que ocasionem\poucas, ou nenbumas con- testagdes com os Estados vizinhos; As melhores fronteiras de qual- quet Estado sto 1°. 0 mar: 2. as montanhas: 3°, os rios caudalasos; O Governo,de todo 0 Estado deve diligenciar ter as melhores frontei- ras} ¢ uma vez que as obtenha, nio deve pertender dilacé-las; Tanto menor € uin Estado, quanto mais precérias sio a sua independéncia € trongililidadey A independéncia, ¢ tranquilidade de um pequeno "0 teat foi publicade no DG n°81 de 12/4/1823, O que ademais reforea a andlise de Chiacarneate (La euestidn regiohal en el pro de gesavidn ct Hstado aavional argentine. FORTALECINENTO & FRACASSO DA UNIDADE 205 Estado, vizinho de uma grande Poténcia, sae extremamente prec rias; Tais Estados devem a sua existéncia ou ao citime das grandes Poréncias entre si, ou protegio (nto desinte-essada) de alguma de~ las; Tanto mais vasto é um Estado, quanto mais firmes so a sua in- dependéncia ¢,tranqulilidade, porque menos exposto esté a como- g6es interiores © a agressdes por parte de scus vizinhos; Os Estados que tém uma grande exfensio de costa, precisam de uma considers vel forca naval, para defesa dela, e da sua respectiva navegagio; A forga naval tem a preciosa vantagem de empregar um pequeno nti- meto de bragos, ¢ de poder operar em pontes muito distantes; Um grande litoral facilita as comunicagdes entre as diversas Provincias de um mesmo Estado; A arte de governar os Grandes Estados se tem tornado mais Fécil, & medida que os Povos tém progredido em civilizacto, ¢ que as luzes se ho propagsdo; porque entio se tem achado e empregado os meios de economizaro tempo, e de abreviar as distancias” (DG n°83 de 15/4/1823), Em uma carta enviada ao mesmo Didrio, subscrita por “Um Minei- 10", afirma-se que o grito de “Viva o Imperado: do Brasil", publicado “pela primeira vez. no Revérbero [Constitucional Flumiaense] em 6 de agosto de 1822” teria desde entio ecoado "com o maior entusiasmo do Amazonas até o Prata, ¢ do Oceano até 03 Andes” (DF n°96 de 24/10/ 1825). Aqui, a idéia diz respeito 20 Estado sua territorialidade “natu- ral” que, segundo o leitor, corresponder-Ihe-ia em vistude da adesto dos que, tendo lido 0 Revdrbero, se teriam decidido por ele. Tertitério como espago de poder restrito 20 Ambito provincial, teri t6rio como etitétio de diferenciagao € de grandeza em um sentido mo- ral, qualificando uma grande unidade composta por diversas provincias, ‘Tudo isso surge com grande elareza quando 0 que esté em questao é no- vamente a construgio de uma unidade conformada por um poder poli- tico organizado em um Estado. Em nome dessa unidade, as diferengas jo desproblematizadas, deslegitimadas. Tais pontos surgem também, esse mesmo momento, no projeto de uniao seciada em Buenos Ais. gue conhecia difusdo privilegiada em periédicas como 0 Nacional, 0 Mensagero Argentino e, na tegiio oriental, com a Gazeta de la Provincia Oriental. O tertitério como espaco de poder das provincias ~ no plural "0 Hensogers Argentiny er edizado por Juan de a Crvz Vare a Plorencio Varela, Agustin Delzado, Feanciseo Pico etambém pelo mesmo ValentinAlsina do E/ Nadine Boi mais importante periddice defenser da unig provincial ede consteupdo de um Esta cdo centralized durante os anos de 1825 4 1827, com atensio especialmente veka a 206 FORTALECINENTO & FRACASSO DA UNIDADE ~ € expressado pelo primeiro em diversas passagens: “ojalé los recursos le cada una de las provineias, que componen los diferentes estados correspondiesen a la extensién de sus territorios” (Nacional n° 17 de 14) 44/1825), na referéncia a “los buques construidos en los terticorios de las Provineias Unidas” (Nacional n°26 de 16/6/1825), € em uma passagem. sobre a formago de governos de acordo com as necessidades do pais: “Nosotros pues somos de Ia opinién de que seria de le més alta importancia, que estas provincias, aprovechando el estado de inde- pendencia que les ha garantizado la ley para cuidar de su régimen interior ¥ darse [as instituciones mas andlogas a sus necesidades y que mds convengan a su felicidad particular, establezean por una ley en sus respectivos terricorios, esa libertad de que tanto se afecta el hombre moral” (Nacional n°27 de 23/6/1825). Sistematizada pela primeira vez pelo pensamento das Luzes no sé- culo XVIII, a idéia de especificidade territorial consagrava-se na Amé- rica ibérica nas primeiras décadas do XIX, amparada numa poderosa base de racionalidade oferecida pelo argumento das “fronteitas nacu- rais”, De sua aproprisglio pelos diferentes projetos da época surgirio subsidios para novos conflitos. Em uma linha crescente, ser esta a raiz do peasamento geopolitico da segunda metade do século XIX, que por meio de pensadores como Friedrich Ratzel formularé uma associacio direta entre Estado ¢ cerrit6rio, conferindo a este um carter ancestral, a-histérico, Fundamentando interesses de classes dominantes."" Evidentemente 0 movimento de territorializagio dos novos corpos politicos ndo se restringe ao campo de idéias politicas. Nesse sentido, notivel como a iminéncia da guerra acarreta formulagées cada vez mais para a ue com peal a assomblgia consticuinte © adesto dis provincias ao novo pce, Publicou 238 niimeros. J a Gasez cla Provincin Orientaleta potta-vor oficial So geverno oriental sediado em Canelones, conta a dorainagio de Brasil e pr6-Buenos Aires, Publiceu dezesseis niimeros entre 14/11/1826 e 23/2/1827. A Gazeta tina 00 ‘Senanaria Mercantil de Monevideo, periédico defensox da ineorporagzo da Cisplatina ‘0 impéri, o seu principal periddice opositor. Dele foram pubiicados 131 ndmeros centre 26/1826 ¢ 16/2/1829, Outros periédicos importantes surgidos em 1826 foram ‘Duende de Buenos Aires 0 ris Argentina e, no ano seguinte, Ei Constinucionat, oficial {de governa de Rivadavia, Tados om Buenos Aires ~ Casdigo de periéins sudame: ineanés,. Galvin Mureno, Op, cits Fereet Jans. Op. cit: Praderio. Op. cit. Nagnoli 2 onpoda pire, “Apresentagio”. Afzea oautor que "ae nuscer (com Ravel, 2 gengrafa insctevis-ss na linhagem da Silosafia politica classi, contribuindo com urn ponta de vist eriginal 3 reflexo de Maquiavel, Hobbes, Locke, Montesquieu, Rousseau, Teequeville...” (p.7-8), PORTALECINENTO E FRACASSO Da UNIDADE 207 precisas acerca da importancia do tercitério como elemento organizador dos governos nela envolvidos. Afinal, durante toda a década de 1820 esteve muito presente no universo politico das Provincias do Prata ¢ do Império do Brasil a discussiio sobre a questto que desencadeari a guer- 1a oficialmente a partir de dezembro de 1825: a Cisplatina, ou Provin- tal, o que implicava, por sua vez, a incluso ou nao da regio oriental do Prara sob a jurisdigao de dois Estados emergentes (Império do Brasil e Provincias Unidas do Prata). Diria do Governo prosseguia defendendo uma dificil ~ se nao im- possivel ~ equagio entre a defesa dos dircitos do império a Cisplatina (“naturalmente” incluida em seus limites) ¢ uma politica diplomatica de boa vizinhanga com as Provincias do Praca “O Sistema das invastes, € das conquistas sendo cm geral incom- pativel com o estado de civilizagdo moderna, ¢ inteiramente oposto principios reguladores duma Nagao, que [?] ait do scu novo ber- 0. O Brasil € por sua imensidade incapaz de agressores, ¢ de hostilizar seus vizinhos: superabundantemente rico, s6 necessita de aumentar ‘sua populagdo para ser uma Poténcia respeitivel: um paso s6 que 6 Brasil desse fora das suas naturais demarcages Ihe seria muito fa- tal, SIM. 0 Imperador conhece perfeitamente esta verdade; ¢ 0 seu primciro, 0 seu Gnico objeto € conservar a unidede da Grande Fam(- lig Brasileica” (DF n°42 de 20/8/1825). Logo essa argumentagto daria lugar a uma clara declaragao de anta- gonismos de principios politicos (monarquia versas reptiblica), corres- Pondente a efescente tensto entre o governo imperial e 0 das Provin- cias Unidas que desembocaré na guerra: “facil é de se conhecer o extraordinério temor, de que os pequenos Soberanos Argentinos esto possuidos vendo crescer tio desmarca- damente o Império do Equador, [. ..] nenhum motivo fard com que Ele [S.M.L] retire 0 seu escudo, e deixe nas margens do vuleio Re- publicano uma Provincia, que a natureza fez parte constituinte do Império do Brasil; que nos tratados, ¢ convengdes das Poréncias Eu- ropéias foi julgada nossa” (DF n° 149 de 28/12/:825). Meses antes da guerra, tampouco 0 governo de Buenos Aires pareci ter clareza em relagdo & conduta a ser observada perante 0 império.¢ & propria provincia que até entio era declarada independente de sua ju- tisdigio. O Nacional opinava, em junho, que embora a provincia orien- 208 FORTALECIMENTO F FRAGASSO DA UNIDADE tal fizesse parte do “territério” das demais provine:as do Prata, no se deveria tomar parte nos conflitos daquela, preservando-se @ soberania de cada parte: Re entre esos ancecedentes salca luego la siguiente cuestién que ticne en inquietud a Ja expectacién pablica

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