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CONSELHO EDITORIAL: ‘Antunes Fho/Juce de Oliveira Sho Medagla/Zaza Homem de Mello. Obras: ~ CHEKHOV, m Para 0 Ator = LOVELOCK, w. Histérla Coneisa da MGsica ~"BOURCIER, P. Histia da'Danga no Ocidente = KERNAN, J Musteologia — FRANCIS, A daze — BETTON, 6. Estdtien do: Cinema = HOLST ‘ABC da Msien — STANISLAUSKT, c. Manual do Ator = BAZIN, & (0 Cinema da Crveldade — CHION, M. O Roteico de Cis Prdximos langamentor = KAROLYI, 0. Inwodueso & Méstea ~~ DART, T Tnterpretacio da Mésfea ~ BOURNIQUEL, C. Chopin | | | 0 ROTEIRO DE CINEMA MICHEL CHION ‘Titulo orginal: ECRIRE UN SCENARIO opycght'© Canles di Cinta (Copyrisht @ Livraria Martins Fontes Exitora Lda, para eta tadugto 1 edit braslta:outbeo de 1989, Tradusto: Bauardo Brandio eviso de tredugdo: Monica Stel MA da Siva ‘Reubio tenleae Alvaro de Moye Revisiotipordfiea: Coordeasgo de Mauricio B. Leal Produgdo arifica: Geraldo Alves Composida: Oxwalda Voivodie Adore L. da Siva Arte final: Mossi K. Massiaki (Copa ~ Projeto: Alesandse Martine Fontes matte as Todos os direitos para a lingua portuguesa reservados & LIVRARIA MARTINS FONTES EDITORA LTDA. ‘Rus Consetneico Ramalho, 330/340 ~ Teh 253.367) 01325 — $20 Paulo SP — Brasil Pare Alain Zagaroli Indice Apresentacio Primeira parte As obras-primas também tém roteiros I. Pauline a la plage, 1983 .. ae 4, Estamos na Normandia,&beirwmer, Ove. "io chega 20 fin. (inopse) 9 2. Uma estrutura depuradan 1 3. O roweiro cena por cena, 8 WLU aventura na Martinica, 1944... 1. Estamos em Fortderanee em Bid Tanieaadminisagiode Vy ose mas 2. As‘Stcsdader de una adpiagio, 26 3. Oreo cena por cena 38 TIL O testamento do Doutor Mabuse, 1933 41, Estamos em Berlim, Alemanha, no info. os anos 30. (inopee), 43 2. O eterna foihetim, 43 3. O roteizo cena por cena, 53 IV. Sansho Dayu, 1955... 1. No século 21, no Fapio, quand o homens ‘ainda ignorava seu proprio vale. nop. 50) 68 25 45 69 2. A quintesséncia do melodrama, 71 3. O toteiro cena por cena, 74 Segunda parte © roteirista também tem as suas técnicas 'V. O tabuleiro e as pegas (os elginéntos do roteiro) 87 SL. inte ewarnagio 7 2! Unidade, 89 3. Iraportante, essencial (0 que 62, 91 3 Selindare Gatnga) 50 5. Aga0, 96 8. Petseguizdes, 97 1. Pensatmentos das personagens, 99 a2 pitloge tor suseaaanes 9. Sulbentendio, cumplicidads, aus, “un derstatement’, 167 10; Mentiras, 108 11. Nomes, 109 12, Peesonagem, 113, 13) Mutheces, 121 1. Grupo, 123 15. Acessério, 126 16. Tempo, 130 17. Dias noite, 136 18. Montagemseacencia, 139 19, Lagares, 140 VIO que movimenta as personagéns (e tapela os espectadores)? Le Kdentificagio, M5 ‘Temer, 9 Piedad, 150 ‘Mudanga do sort, 152 Recoahecimento, 153 Equlvoco, malentendido, quiproqus, 155, 145 7. Divide, 358 8: Condi social, 159 5: Morais (valores, 161 10. Pertucbaeso, 163 EL Dificuldades, 165 12, Objetivo, 166 13. Intec, vemades, 179 ‘VIL As partes e os tempos fortes do roteiro.... 17 vor. Progressio continua (le da, {77 Climax, 179| Genas'¢ sequéncias, 181 ‘Atos (us) 183 185 Desfecho, 191 "Happy end” Gina Felo, 195 Golpe teatral, 197 ‘Flashback, 199 Os procedimentos de narragio 1, Dramatizagéo, 206 2 Ponto de vista, 207 3. Informapses, 210 4 Blisdo, elipse, paralipse, 216 5. Suspentelsurpresa, 219, é 7 ® 5 a. I 2, Previsto, 220 Implants, 223, Pista flea, 25 Caracterizagio, 226 Contrast, 229" Respiragio, deseanso, 231 Fermata, 22 13. Repetigio, 34 A Piada tepetitiva (“running gag’), 235 IX. Os erros de roteiro (para melhor cometé-los) 239 1. Como & que se sabe?, 260 2. Conversa (sensaeso de ter sido Tevado ta), 241 3. Fragmentagto, 242 3° Colpelaneia, 243 5. Desfechoroqueass do), 244 6. Desvio, 246 7. Explieatvo (Qislogo), 247 8. Implantes fleos, 248 5° Inverossimilhanga, 249 10 Miotiee, 250 Hi Pobre do hai, 251 12, Indolénca, estagnagéo, 252 13, Personagns (efeitos na utlinago das), 253 14, O que e impede de 2, 254 415. Telegrafado(eeito), 235 46. Buraeo, 257 Terceira parte X.As formas de apresentagio do roteir nnn 263 1. Lia, histor 2. Sinopse, 264 3 "Outline 265, 4 Tratamento, 266 5 é 7 Continuidade dislogads, 267 ecurager enien 266 “Storyboard”, 289 Bibliografia sumatia an ‘4. Prinipais obras ct 8. Outtos manuals de rote, 278 ¢! Numeros expels de revista e jomais,278 4. Coletineas de entrevstas com recs, 28 : e.Obras sobre os problemas de sdaptagao, 279 f. Obras sabres problemes da narrative, 279 f. Roteitos publicados, 2800 = Indice dos filmes €itad08 wecereoununinnnne 283 Apresentagio Em 1983, Bénédicte Puppinck, do INA, propunhs- xnos contribuir para sta pesquisa com vistas a eriar um ‘curso de roteiro, que comegou a partir de entéo. Nos ‘2 contribuigdo pessoal, gragas & sua confianga, deu ori gem a este livro. Na Franca, esse curso constitui uma relativa novi- dade, Muitos dizem que roteiro nao se ensina,e tém re Zo... em principio. Os bons roteiros ndo stirgem por ‘geragio espontanea; em geral, nascem de certo dom! nio do oficio, ou da intuicdo de certas leis, que 0 rote rista decide’ respeitar ou ignorar, Esse oficio, essa {nauiggo, adquiremse em grande parte com a experién cia e um pouco através do estuido. E para esse esiudo que o presente trabalho pretende contribu. No ingeio, tratavase simplesmente de esmiugar al- guns manuais anglo-saxdes, obras cuja ambicdo extre- ‘mamente prética (‘como escrever seu roteiro em vinte ligdes") suscita nos franceses aquele misto de fascinio ¢ ironia caracteristico de sua relagéo com a cultura americana. A lista desses manuais, finalmente limita. daa sete titulos, é fornecida no inicio da segunda par- te; sao obras bastante citadas neste livro e analisadas uma a uma na bibliografia. Devemos muito a elas — embora este trabalho tenha-se ampliado depois, com o acréscimo de observacdes mais pessoais, pesquisas mais 2 O roteiro de cinema abrangentes, além do estudo de quatro roteiros de fil ‘mes clissicos, tomados como modelos vivos ¢ reserva trios de exemplos. ‘Tinhatnos, de inicio, ume opinigo preconcebida so- bre o tema, e a mantivemos até o fim. Por que no? B 86 dizélo. Essa opinido era de que as historias, decid damente, S20 sempre as mesmas. Ha quem se afija com isso. Quanto a nés, alegramo-nos ao ver ai o sinal de ‘uma coesio da experiéncia humana através do espaco| € do tempa, Como as criancas, gostamos das historias repetidas, e quase chegarfamos a negar a possibilida- de de “historias navas”,,mesmo.que com as mais no- vas técnicas (pois, se fosse assim, o desenho animado nos teria trazido essas historias novas ha muito tem- po). Em compensacio, indefinidamente aberta ¢ reno vavel 6 @ arte da narragdo, a arte do conto, da qual a arte do roteirista é apenas uma aplicagio particular, pensada para o cinema. Por isso nao hesitamos em propor a.aspirantes ou aprendizes de roteiristas quatro filmes de diferentes épocas do cinema e de quatro paises bem diferentes: Franca, Estados Unidos, Alemanha e Japio— Das Tes: tament’ des Dr. Mabuse (0 testamento do Doutor Ma- use), de 1933; To Have and Have not (Uma aventura nna Martinica), de 1944; Sansho Dayt (sem titulo brasi- leiro), de 1955; e Pauline @ fa plage (sem titulo brasile- 10), de 1983. Achamos que so exemplos atuais e vivos, inclusive quanto a seus erros, suas irregularidades ¢ as vicissitudes da sua génese. Séo.estudados no todo e-em detalhe, quanto a seus grandes temas e seus pe- ‘quenos procedimentos. De fato, toda narragdo repousa ndo em idéie, mas em macetes, em procedimentos praticos — dat o,cars ter de colcha de retalhos que urh manual como este nfo pode deixar de ter (¢ acaso um tratado de composigao| ‘musical € mais do que um mosaico de usos & procedi Apresentagio 3 mentos?), $6 quando um roteiro funciona mum filme, fem que ele vive e respira, ¢ que 0 procedimento tora: se expresso, poesia. Ndo importa, entéo, que a princi- pio ele tenha sido apenas um recheio dramatico, ou um estratagema inconfessdvel de narracdo. Os mais belos achados dos poetas as veres também nascem ligados A necessidade de encontrar a rima, ou de reunir 0 mi- mero certo de pés. Por isso este livro nao é hierarduic co, recusando se a separarmacetes modestos de idéias gerais, ‘Do mesmo modo, ele evita ser normativo e preten- de lembrar, ao lado da forea dos bons modelos, a se- cdugdo do mau exemplo, a tranaiiladisplictncia de Una aventura na Martinica ow o frenesi folhetinesco de O testamento do Doutor Mabuse. Nao ha milagre, porérn: esses dois filmes puseram a servigo das suas “irregue lridades” e de seus “defeitos” o trunfo de um profis- sionalismo irrepreensivel — para néo dizer mais — em 5: atores, diresAo, etc. Alguns talver se espantardo por néo encontrarem neste livro conselhos para vender um roteiro. E que nao acreditamos nisso: na Fravic, o roteiro é apenas um ele- mento etre outros endo necesaramente mas im sortante — na decisao de fazer om filme. De que serve, Entfo, um ivr como este? Ele smplesinentesjuda ctiar rotetros melhores. Querem nos fazer crer que es- 3e6 roteiros melhores sejam ipso facto mais féceis de serem vendidos, 0 que comprovaria uma justica ima- nente, que todavia néo corresponcle a realidade. Os filmes que obtém os maiores. sucessos nfo tém, necessariamente, bons roteiros. H& mesmo alguns cujo roteiro ¢ particularmente desinteressante e desleixado. Bsses filmes conquistam o puiblico gracas a presenca cde um ator, ao aspecto “empolgante” de um tema, & qua- lidade do ritmo, da diregao, a0 frescor de um look. Tal: vez, mais tarde, revélos no seja to apaixonante quanto 4 0 roteiro de cinema rever outros filmes mais bem “escritos” — mas, por en- quanto, eles dio certo. E por isso que somos céticos quarto’ propalada “desnanda’” de bons roteiros no ci- zema francés, pelo menos por parte dos produtores, ¢ mesmo dos diretores. No entanto, como todos sentem ‘uma Zacuna nessa dea, foi possvel o surgimento a publicacao, ao lado de outros. ica, entso, a adverténcia: este manual é vendido sem a garantia de “roteiro aceito ou dinheiro do livro devolvido" Nao ha roteiro qué se possa fazer de ante- fo para agradar aos produtores ou a uma comisséo —o que, em certo sentido, € até trangiilizador. Falla fomecer o modo de usar desia obra, dividi- dda em duas partes principais Ela comera com o estudo de quatro filmes ditos eléssicos, mas que, para nés, sio antes de mais nada representativos de quatro tipos de roteiros tipicos. ~Pauline @ la plage, escrito e dirigido por Eric Rohmer, é uma comédia sentimental eve, de estrutura muito pura: tr8s mogas, 8s rapazes, as férias, e nada além de questées sentimentais “Através do caso de Una aventura na Martinica, com diregao de Howard Hawks e roteiro de Jules Ferthman ¢ William Faulkner, bascado mum romance ée Emest Hemingway, podemos reconhecer, por usr: lado, pers0- nagens tipicas do cinema romanesco kollywoodiano, € por outro certos problemas comuns a todas as adapt bes de livros. O testamento do Doutor Mabuse, dirigido por Fritz Lang, com roteiro dele mesmo e de Thea von Harbou, tipieo rote de "ances com cnasfregmeniaas, personagens esbogados de maneira bastante suméria (mais representando ideias: 0 Mal, a Lel), baseado na curnulagto das peripécas: perséguigbes, aposentos se- cretos, maquinas infernais, desaparecimentos,&s vezes em detrimento da Logica, Apresentiacao 5 , Sansho Day, apesar de ser um filme apo s de 1955, representa, em nossa opinigo, a esséncia mais pura do melodrama, 20 mais belo sentido do ter- mo. Seria preciso, no caso desta pelicula, esquecer to- do exotismo para conseguir nela encontrar néo $3 ‘motivos universais, mas também um belissimo exem lo de mestria drsingtca, um filme de Keni Mizo guchi, com roteiro de Yoshigata Yoda (revisto depois pelo diretor), baseadio numa novela de Ogai Mori Para cada um desses filmes, fornecemos primeiro um resumo rapido da historia (Sinopse), depos um es: ‘tudo ao mesino tempo histérico e analitica, que desta- ca seu interesse para o aprendizado do roteiro e conta a sua génese (ambém interessante, pois a maioria dos roteiros sofrem modificagées, submetendo-se a impo: sigdes especificas) Enfim, para os que desejam estuds- Jos mais de perto, fornecemos um resumo detalhado, espécie de “tratamento”, no sentido americano, com 2 lista das cenas, das personagens, etc. Esclarecemos que Of textos das sinpses e dos tratamentos sto de ato ria e responsabilidade nossa, nao sendo recopiados de textos preexistentes. Sua redacgo levou-nos @ entren- tar o dificil problema de restnir um filme, em inhas gerais ou mais detalhadamente. Exercicio dificil ein- teressante, que propomos a qualquer pessoa que dese- Jesse aperleigoar na técnica do roteiro,¢ tentar resumix em algumas pginas um filme que viu e confrontar se trabalho com o de outras pessoas, sobre o mesmo ob- Jeto, A experiéncia é muito enriquecedora ___ Asegunda parte, O roteirista também fem as suas ‘écnicas, corresponde a forma mais classica do manual americana, com as grandes leis, os procedimentos, os ° conselhos, os exemplos, extraidos prineipalmente dos quatro filmes de referéicia, mas também de Vérios ou- tos. Nunca sera demais relembrar 0 cardter relativo € meramente indicativo desses procedimentos e leis. 6 0 roteiro de cinema Enfim, uma terceira parte, constitufda de um ca- pitulo tinico, descreve as formas de apresentagio do ro- teiro utilizadas com maior freqtiéncia. Nao é proibido conceber putras! Resta‘nos, agora, agradecer a ajuda preciosa de to- dos os que nos permitimos citar, mais particularmen- te a Bénédicte Puppinck e Danielle Jaeggi, a primeira por ter suscitado e apoiado esta obra, a segunda por té/a beneficiado com seu trabalho de documentagao pessoal, ealizado por ocasifo de sua tese de Teresi 10 de outubro de 1985 ‘Michel Chion ‘OBSERVACKO: Na segunda parte desta obra, tomames ini. 1meras referdnclas de sels manuais de roteiro anglo-randes, que ‘Sto anulisados, além disso, na bibliografla Para nao tomar o texto pesado, esses Sis livros so designados pelo nome do autor em naldsculas Asim, VALE rematea Te Technigae of Sereenplay- ‘writing, de Bugene Vale; HERMAN, 20 Practical Manual of Soeer- writing, de Lewis Herman; SWAIN, a Fllve Seript Writing, de Dwight V. Swain; NASH OAKEY, a The Screamwiter’s Handbook, de Constance Nash e Virginia Oakey; FIELD, « Screenplay, the Foundations of Screenwriting, de Sidney Field enfim, STEMPEL, a Sereenvoriting, de Tom Stampa. Por outro lado, SALE remet® livro de entrevietas de Christian Sale, Lee scéiaistes au tr ‘ail vera bibiogratia) ‘Eguivalente ao doutoredo (N. Primeira parte As obras-primas também tém roteiros 1. Pauline a Ja plage, 1983 Um filme de Eric Rohmer Roteiro original: Eric Rohmer {terceiro filme da série “Comédies et proverbes") Produgio: Les Films du Losange, les Films Ariane, Paris, Franca Duragao: 1 hh 34 1. Estamos na Normandia, a beira-mar. 0 verdo chega ao fim... (sinopse) Estamos na Normandia, perto do mar. O verao che- 0 ao fim. MARION, esilista (Arielle Dombasle uma be- 1a loura, ¢ sua prima PAULINE (Amanda Langiet) uma moreninha que ainda esté no secundaria, chegam a sua casa de praia, onde se instalam. Na praia Marion encontra um “vetho amigo", PIERRE (Pascal Greggory), mas trava conhecimento, ao ‘mesmo tempo, com HENRI, um ‘einélogo” (Fédor Atkine) Pierre propée a Marion e Pauline praticaremt ‘windsurf; Henri convida todos para jantar na‘easa dele Durante 0 jantar, os dois rapazes e as duuas mogas falam de suas respectivas concepedes do amor: livre e némade para Henn, pai divorciado; sibito e reatproco, conto uria paixao repentina, para Marion, gue estd se ivorciande e que fala, em termas preciosos, das "fogos" que pretende acender; profundo ¢ duradouro, baseado na familiaridade, para Pierre, que vive $6; por firm, re- fletido e cireunspecto para Pauline, ainda riuito jovern. ‘Na mesma noite, durante um baile, Marion repele Pierre, que hd muito tempo esté apaizonado por ela, e 10 O roteiro de cinema danea com Henri, com quem vai para casa e passa.a noi- te, Pierre ficard com um citime sombrio, tanto mais que Marion sedis apaizonada por Henri por quam se oré foucamente amada. Pauline conhece, pouco depois, unt rapaz da sua ida de, SYLVAIN (Simon de la Brosse) com quem flerta sem maiores compromissos, Marion critica a escotha da prima. Certo dia, quando Pauline e Marion saem para um passeio, Henri aproveita para tomar banho de mar com tuna vendedora dle balas, LOUISETTE (Rosette) que dera em cima dele. Levaa para casa, bem como a Sylvain, {que participara do banko de mar. 0 carro de Marion chegara intempestivamente Sylvain mal tem tempo de avisar Henri e Louisette, que esto fazendo armor no primeiro andar. Henri dd um jei- to, entéo, para Marion acreditar que Louisette estava fazendo amor com Sylvain. Este tltimo se presta passi- yamente ao jogo, ¢ Louisette também. ‘No entanto, antes da chegada de Marion, ao passar pela casa, Pierre entrovira, por wma janela, Louisette divertindo-se nua com um homem... gue, logicamente, pensou ser Henri : ‘Quando ele conta isso a Marion, ela sorri e the diz 0 que aoredita ser a verdade, ou seja, que ndo era Her ri, eva Sylvain. Pauiline estranha a auséncia de Sylvain. Pierre, que ndo quer vé-la triste por causa de wm injiel, contathe a histéria de Sylvain e Louisette (que Henri e Marion tinham evitada the contar), Magoada, Pauline procura Marion e Henri para confirmarem a historia, e estes cen: ‘suram Pierre por ter contado. Por sua ver, Sylvain, tendo ciéncia de que Pauline “soube", zanga-se com Henri,.que 0 tinha usado. Este diz que'no dia seguinte contaré tudo. ‘Mas Pierre fica sabendo da verdade através de Loui- - Pauline a la plage u sette. Ele ndo se havia enganado: era Henri mesmo que estava com a Vendedora. Entdo, conta para Pauiline, Marion tem de se ausentar por wm dia, ¢ 08 outros — Henri, Pierre, Sylvain e Pauline — aproveitam a oca: sido para um confronto geral ema casa de Henri. Paul ne, mesmo sabendo de tudo, permanece fra com Sylvain, ‘a quem censura porter se prestado aquele papel. Sylvain se aborrece com Pierre por ele ter falado e chegam a brigar. ‘Anoitinha se separam, mais calmos, ¢ Pauline pre- fore dormir em casa de Henri enquanto espera a volia de Marion, no dia seguinte. “Henri é convidado para wm onuzeiro de barco ¢ apro- veita para abandonar Marion sem tomar a vésa. Antes, Ientara a sorte com Pauline, sem compromisso, revelan- do.0 que achava de Marion: bonita, de fato, porént per- feita demais, e cairathe nos bracos muito depressa. Marion e Pauline tornam a se encontrar sds e deci- dem voltar para Paris antes do que fora programado, Marion talver tenha divides quanto a Henri, pois pro- poe que cada uma acredite no que quiser, embora isso Seja contraditério — Pauline, que a vendedora estava com Henri; ela, Marion, o que ela continua achando ver: dade, isto 6 que ela estava com Sylvain. “Tudo be”, responde Pauline, que nao desmente Marion. E as pri- ‘mas se vio da casa de. praia. 2, Uma estrutura depurada... primeiro filme abordado neste livro é a obra de ‘um auiordiretor. Eric Rohmer, que assinou os rotei- ros de quase todas as suas obras. Mas Rohmer insiste no fato de que, na maior parte das vezes, ele os escre- ‘yeu de inicio conto histéias isto é,utlizaveis tanto para 12 O roteiro de cinema uum romance como para um fin anteméo para a tela. ‘No entanto, veremos que o roteiro de Pauline @ la lage & ura trabalho séiido, bem estruturado, que ver ce as diffculdades especificas do roteiro cinematogré- fico: 2 conducéo da narrativa, a apresentagio das personagens, 0 jogo dos mal-entendidos e das peripé Clas, a concentracto da acdo num tempo limitado e nu ma forme circular, a consideracio da impossibilidade de exprimir diretamente os pensamentos das persona: gens... em todos esses aspectos, Rohmer revela-se um roteirista superior! Dos quatro roteiros que nos seryem de referéncia, Pauline & la plage & 0 tnico que se apéia exclusivamen- te n0 mével psicol6gico e sentimental. Todas as perso- nagens, salvo a "Vendedora” (Louisette), esto de férias; no esto trabalhando, so mais ou menos da mesma classe (salvo, mais uma vez, a Vendedora), isto é, nfo tem grandes preocupagées de subsisténcia e nenhum obstéculo extero — material, metereol6gico, social ou fisico Coens, acidnte) — vem contrarar seus dese- {jos ou fazé-los eclodir. Bde seu proprio amago; de seu ‘aréter ¢ da sua personalidade que essas pessoas, jo- vyens e menos jovens, extraem a matéria e os méveis d& ‘histéria que vivem. Acestrutura de Pauline a la plage ¢ muito depura- da: no ha nenhuma personager initil, nem mesmo se- cundéria, Temos trés mocas (Marion, Pauline Louisette, a Vendedora) e tr rapazes (Pierre, Henrie Sylvain), 0s seis “livres” sob o plano sentimental, fami- liar e sexual: um divorciado (Henri), uma se divorcian- do (Marion), os outros quatro solteiros. Portanto, sio possiveis muitas combinages. stra escotha muito precisa é a da faixa etéri além da personagem fugidia da filhinha de Henri, cuja ‘presenga se destina sobretudo a definiro retrato social 1, sem concebé las de ‘Pauline @ la plage 13 ¢ familiar do pai, nossos herbis sto teenagers (Pauline, Sylvain) ou jovers adultos (Marion, Henri, Louisette ¢ Pierre), algo immaturos, ali. Essas duas faixas etézias tém a mesma linguagem ¢ preocupagoes bastante pro ximas; sdo pessoas que podem se associar formando ca- sais, sem parecer incesto... Nao ha quadragenarios estabelecidos ou personagens idosas; hé uma mesma ‘deologia do amor livre. Veremos que, ainda assim, a diferenca de geragao tem uma certa importéncia no filme. Ahistoria ¢ a éstrutura de Pauline inserevemse nu- mma certa tradigao chamada “teatral” (Marivaux, Mus- set), em que @ grande questdo decidir quem vai se amar ou ni se amar. O paralelismo dos casais Hen- H/Marion ¢ PaulinelSyivain, 0 segundo mostrado como ‘uma “imitacao” do primeiro —formada mais tarde — ¢appresenga de uma personagem “popular”, comparé- vel, quanto & sua estilizagao e a gua linguagem conven- cionalmente “popular”, ‘a uma “criada de Moliere” (Rohmer déxif, vem fortalecer essa referencia teatral. Mas a originalidade da técnica roteiristica de Eric Rohmer, para nfo falar da sua tematica, jé reside na recusa dos habituais “recheios” cinematografiéds e no desprezo dos “jogos de cena” que server, nos filmes, para preencher as cenas de conversa. No cinema, freqiientemente as personagens s6 fa Jam enquanto execuiam agées mais ou menos titeis, co- mo abrir uma jenela, beber, fumar, tocar piano, éirgir, cuja funcdo ¢ servir de “suporte” para a palavra e dar as cenas um caréter pretensamente cinematogratico. Em Pauiline, 20 contrétio, enquanto as personagens con versam —¢ esta é sua principal atividade —, elas no fazem mais nada, no méximo se acariciam ou se bejam! ‘A outra originalidade do roteiro esta ligada a pri- meiza, ot seja, a palavra nao é dissimulada, suavizada, evitada por ser anticinematogréafica; ao contrério, ela oy 0 roteiro de cinema se faz muito presente, pesada até, as personagens fa- zem verdadeiras profissbes de fé e declaracées de prin- Cipio. Mas a0 mesino tempo somos levados a questionar a validade do discurso delas, a ter em mente que nfo deveros obrigatotiamente Ihe dar crédito, que as per sonagens podem mentir para si proprias e que seu per samento nao corresponde inteiramente & sua palavra, se & que elas pensam mesmo. (O que as personagens se dizem, o préprio fato de elas se dizerem alguma coisa, torna-se o motor da his- tia, gio nfo na medida ém que digam a verdad, “sua” verdade, ou mentiras, mas independentemen te de dizerem ou nao a verdade. Em tal cinema, o dua- lismo ou a alternancia palavralacdo, presente em outros filmes (as personagens falam, depois agem,; ou eno fa Jam e agem paralelamente), € superado em favor de uma utilieaedo da palavra conto agao. Pauline & la plage pertence a uma série “aberta” de filmes, que Eric Rohmer intitulou globalmente de “"Comnédies et proverbes” (Comédias e Provérbios). 0 provérbio enfocado por este filme foi tomado de Chre- tien de Troyes: Qui trop parole, il se mesfait ("Quer fa- la demais mal se faz"). Como 0 proprio Rohmer esclarece, enquanto na série precedente dos scis “Con- +08 motais" o ponto de vista da narrativa era o angulo privilegiado do herbi masculino, em "Comédias e pro- vérbios” (portanto em Pauline) esse ponto de vista é dis

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