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it . On Vrredoes. Ad Cif NOVA ATLANTIDA 1478 ‘TRABALHO INACAUADO ESCRITO PELO MUITO ILUSTRE FRANCIS BACON, LORDE DE VERULAM, VISCONDE DE ST. ALBAN “Trade notns de JookAlusio Rela de Andrade Ao Lerror Esta fibula Milorde concebeu-a com 9 propésito de apresentar ym_ modelo ou a descricio de um colégio instituido para a interpre- tagio da natureza.e produgao de grandes e maravilhosas obras para 0 beneficio do homem, sab o nome de Casa de Salomio ou Colégio dos Trabalhos dos Seis Dias. E apenas até ai Sua Senhoria avangou, até & mais vasto e mais gran- as. Contudo, em sua sou também Sua Senhoria em um corpo de leis ou no melhor dos Estados, ou em uma comunidade exemplar. Mas, prevendo tratar-se de empresa prolongada, desviou-o sex desejo de compilar a Histéria ‘Natural, colocada muitos graus antes desta obra. Para este trabalho da Nova Acléntida (em particular no que con- ceme a edigao inglesa), Sua Senhoria assinou este lugar, tendo em vista a estreita afinidade (com uma das partes) da precedente Histéria Natural. W.Rawie* + Wan Rewey 6 sets paralac ence Bacon oar denn brs puns & Nove ‘atta Er ed l'on ¢ pleads on aste esd one Sehr ‘eee crndegSe mde pOvAS ATLANTIDA™: ~ Velejamos do: Peru (onde permariecemos por todo um ano) ; rumo & China e Japio, pelo mar do Sui, levando conosco provisdes | | para doze meses; ¢ tivemos bons ventos do leste, embora suaves ¢ fra: 08, por cinco meses ou mais. Mas entio o vento cessous detendo-se no oeste por muitos dias, de tal maneira que mal podiamos avangar, algumas'vezes pensamos em voltar..Mas, a seguir, engueram-se ‘ ‘grandes ¢ fortes ventos, vindos do sul com ligeira tendéncia para o : “ Teste, que nos levaram (apesar. dos.nossos esforgos) para o norte. A ‘ essa altura, as provisdes nos faltaram, embora delas tivéssemos boa I Bem m feserya. Ao nos encontrarmos em meio 4 maior vastidio de Agua do mundo, desprovidos, demo-nos por perdidos e preparamo-nos para & morte. Entretanto, elevamos nossos coragdes e vozes a Deus, que mg “"mostrou seus milagres nas profundezas”," suplicando de Sua Merce mi que, assim como no principio descobriu a face das profundezas e criou a terra seca,? descobrisse-nos agora terra, que ndo queriamos perecer. E.aconteceu que no dia seguinte & tarde vimos diante de nés,na direc do norte, algo como espessas nuvens, que nos alentaram alguma espe- ranga de terra. Sabiamos ser aquela parte do mar do Sul por completo ‘desconfecida, podendo 14 haver ilhas ou continentes até agora ndo descobertos, Por isso desviamos nosso curso na diregéo daqueles indi- cios de terra, durante a noite. E no amanhecer do dia seguinte, pude- mos pereeber plenamente que se tratava de terra, plana a nossa vista ¢ coberta de bosques, o que a fazia parecer mais escura. E de- pois de uma hora e meia de navegagio, entramos em um bom ancora- douro, que era o porto de uma aprazivel cidade. Nao era grande, ‘com efeito, mas bem construida e oferecia uma agradével vista do ‘mar. E contando 0s longos minutos que passavam, alcangamos a ae BACON costa. Porém, logo divisamos considerdvel niimero de pessoas, com bastdes em suas mios, como a proibir-nos o desembarque. Todavia, sem gritos ow ameagas, apenas nos advertindo com sinais para que ‘no nos aproximassemos. Entfo, nfo pouco inquietos, consultamo- nos sobre o que fazer. Durante este tempo, enviaram-nos um pequeno Bote com ceca de ota psoas» bord, das quis uma empunhava fe junco amarelo, com as extremidades pintadas de azul. ERE fone sublua bordo tam rior monte Sse desconfianga. E ‘quando viu um dentre nds ligeiramente-destacido dos demais, puxou ~um rolo.de pergaminho (um .pouco- mais ‘amarélo: que ‘o'nosso e bri- Ihante como as folhas das tébuas de escrever; porém, mais miacio’e flexivel) ¢ entregou-o ao 'nosso'comandante: Nes tas, em hebrafco € grégo antigos, em bor latim e: aol, estas palavras: “Nao desembarqueis, nenhum de'vés; € procu: “rai afastar-vos desta costa dentro de dezesseis dias, exceto se v08 for concedido mais tempo.’ Enquanto isso, se quiserdés agua frescd, provisées, assisténcia para os enfermos ou algum reparo de'que’6 navio nevessite, escrevel vossos desejos ¢ tereis'o. que prescreve a misericbrdia”, O pergaminho estava timbrado- com um. emblema representando as asas de ‘um querubim,? no abertas, mas encurva? das, ¢ junto delas uma cruz. Depois de entregé-lo, o oficial retomou, deixando conosco apenas um ctiado ‘para receber nossa resposta Consultamo-nos uns aos outros a respeito da situagio'e vimo-nos em grande perplexidade. A. minava varias lingu de Bumanidade nos det alu contro, E Sob -bonanga. Nossa resposta foi em espantol: “Que nosso bateo estava em ordem porque encontréramos mais. ventos calmos ¢ contrérios que tempestades. No tocante aos nossos doentes, eles eram ‘muitos e em mau estado, ¢ se nao lhes fosse permitido desembarcar corriam perigo de vida”. As nossas demais precisées foram uma a ‘uma apontadas ¢ acrescentamos “que tinhamos um pequeno carrega- mento de mercadorias, que, se Ihes aprouvesse comerciar, poderia rover nossas necessidades sem que lhes constitufssemos em uma * OcuenbinEosinolo de haticndin, aparece ga nn Bande 3729 NOVA ATLANTIDA 29 sobrecarga”. Oferecemos como recompensa alguns dobrées a0 criado ‘¢ uma pega de veludo vermelho para ser entregue ao funcionério. Mas oeriado nio as aceitou. E a seguir nos deixou, voltando em outro pequend bote que the foi envi ane? <” Cerea'de trés horas depois do envio de nossa resposta, veio-em nossa direso um homern (conforme parecia) de posigao. Vestia’uma toga de mangas amplas, de uma espécie dé camiurga’brilharite; de um ‘magnifico azul-celeste, mais lustrosa que as nossas; a roupa que tra- zia embaixo era verde, assim como o’chapéu, que tinka a forma de um turbante, muito bem feito © ndo tdo grande como os'turbantes turcos; e'mechas do seu cabelo saiam sob suas.bordas, Era um homem de aspecto.venérével.:Vinha em um bote, dourado ém algumas partes, ‘com somente mais quatro pessoas dentro;’e etaseguido por outro bote com cerca de vinte mais. Quando estava a urn tiro de besta de nosso navio, fizeram-nos sinais para que envidssemos alguém de nés para encontré-los na gua, o que prontamente fizemos, enviando, em tum boté, nosso segundo homem, acompanhado de outros quatro. Quando distavamos seis jardas, mandaram-nos parar endo nos apro- ximarmos'mais, 0 que foi feito. Entdo o:homem gue ‘antes descrevi levantou-se e com vor forte perguntou em‘espanhol: “Sois cristios?” Respondemos que sim, sem medo, por causa da cruz vista na mensa~ ‘gem. A esta resposta, o homem em questo ergueti a mao direita para © cfu, levando-a suavemente a boca (este era 0 gesto por eles usddo para agradecer a Deus), e entio falou: “Se todos vés jurardes pelos méritos do Salvador que néo sois piratas nem derramastes sangue, legal ou ilegalmente, durante os tiltimos quarenta dias, podereis ter permisséo para vir a terra”. Nés respondemos: “Estamos prontos a prestar 0 juramento”. Entio, uma das pessoas que o acompanhavam, segundo parecia, um tabelido, registrou tal ato. Feito isto, outro dos acompanhantes do personagem, que com ele estava no mesmo bote, depois que seu senhor falou um pouco com ele, disse em voz alta: “Meu senhor quer que saibais que ndo é por orgulho ou'soberba que nio foi a bordo do vosso navio, mas porque, em vossa resposta, de- clarais ter muitos enfermos entre vés, tendo sido prevenido pelo Con- servador de Saiide da cidade para que conservasse distanci: Fizemos, de. nossa parte, uma reveréncia e respondemos: “Somos seus humildes servidores ¢ agradecemos a grande honra e sin- gular humanidade que j& nos demonstraram; mas esperamos que no oo BACON seia contagiosa a doenga dos nossos homens”. A seguir retomnou e, ‘pouco depois, veio a betdo 0 notério trazendo na mao uma fruta do pais, parecida com a laranja mas de uma car entre’ 0-laranj, queimado e 0 vermelho, que desprendia um excelente odor: Usaya.2, segundo parecia, como proteso contra 0 contigio. E tomou-nos o juramento: “Em nome de Jesus e de seus.méritos”s e depois nos disse que n0 dia seguinte, as seis horas da manhi, seriamos conduzidos & Casa dos Estrengeiros (como ele a chamou), onde’serfamos supridos de coisas, tanto para os sos como para doentes. Quando se retirava, oferecemos-lhe alguns dobries, a0 que, sorrindo, disse “que nfo devia. ser pago duas vezes pelo mesmo trabalho”, significando (assim pen- sei) que recebia salério suficiente do, Estado pelo seu servigo. Por iss0, como vim 4 saber, depois; eles.chamam um funcionério que aceita recomapensa de “duplamente pago”. ©. ° - ed 'Na manha seguinte, logo eedo,veio'aténés 0 mesmo funciond- rio, aquele primeiro que empunhava o bastio, ¢ disse tet vindo para conduzir-nos a Casa dos Estrangeiros, ¢ que se havia antecipado na hora para que pudéssemos ter 0 dia todo diante de n6s para nossos negocios. “Entio”, disse ele, “se quiserdes seguir meu conselho, pri- ‘meito venham comigo alguns dentre v6s, para ver o local ¢ indicat como fazé-lo conveniente; e depois podereis enviar vossos doentes ¢ 0 restante do pessoal que ird a terra.” Pelo que agradevemos ¢ disse- mos: “Que Deus recompensé-lo-ia pelo cuidado para com desampa- rados estrangeiros”. E em niimero de seis desembarcamos com-ele;'e, quando jé em terra, ele, que caminhava adiante, voltou-see disse “no ser mais que nosso servidor © nosso guia”. Conduziu-nos por trés belas ruas, e por todo o caminho que petcorremos havia pessoas reu- nidas, de ambos os lados da rua, colocadas em fila, mas com aparén- cia muito cortés, como se ali estivessem nio para nos admirar mas para nos dar boas-vindas. Muitas delas, conforme passivamos, esten- diam ligeiramente os bragos, gesto por eles usado de boas-vindas. A Casa dos Estrangeiros & um agradavel e espagoso edificio, construldo “Ge tijolo, de uma cor mais azulada que 0s noss0s tijolos, ¢ com am- as gimas de vidro, Sutras de una espécie de tecido imper- izado. Fomos conduzidos primeiramente a uma confortével sa- ‘ta no.pavimento super e, calao, sle now perpontu quanos éramos e quantos doentes havia entre nés. Respondemos “que ramos 40 todo (doentes ¢ sos) cingiienta ¢ uma pessoas, sendo que dezessete nesta’ terra” NOVA ATLANTIDA a estavam doentes”, Pediu-nos um pouco de paciéncia, e que aguardés- semos a sua Yolta,'o que fez cerca de uma hora depois; levou-nos 8 ver of aposentos, para nés preparados, que eram em niimero de dezenove. Dispostos, segundo parecia, de tal forma que quatro deles, (os melhores, recebessem quatro dos nossos principais homens aloj do-os sozinhos. Os outros quinze quartos exam para receber-nos doi a dois. Os quartos eram elegantes, alegres e bem mobiliados. Depois fomos conduzidos a uma ampla galeria, como um dormitério, onde © nosso guia nos mostrou, 20 longo de um dos lados (pois © outro tinka’apenas a parede ¢ janelas), dezessete celas, muito limpas, sepa- radas com madeira de cedro. Esta gaefi, com celés_ em um tot de quarenta (muitas mais do que necessitavamos), fora insttiida como enfermaria para pes- soas doentes. Adiantou-nos também que, quando algum dos riossos doentes melhorasse, poderia ser removido de sua cela para um quar- ara este fim estavam destinados dez quartos de reserva, além 0 niimero acima referido. Isto feito, nos levou de volta saleta ¢, Tevantando'um pouéo o bastic (como fazem quando dio uma incum- béncis ou uma ordem), disse-nos: “Deveis saber que 0s costumes da terra estabelecem que, depois dos dias de hoje ¢ de amanhii (desti- nados & remogio de vossa gente do navio), deveis aqui permanecer por irés dias. Mas no vos preocupeis ou penseis que se trata de res- ‘singir a vossa liberdade, pois a medida visa a0 vosso descanso € bem-estar. De nada precisarcis, ¢ ha seis dos nossos, destinados a atendé-los, ein qualquer assunto que possam ter fora”. Agradecemos com aftigad e respeito, ¢ dissemos: “Deus, seguramente, est presente ra”. Oferecemos-Ihe também vinte dobrdes, ao que sorriu disse somente: “O qué? Pago duas vezes!”, retirando-se a seguir. Logo depois, nos serviram uma refeigZ0; muito boas iguarias, tanto © plo quanto a carne, melhor do que qualquer dieta coletiva que co- nheci na Europa. Setviram também bebidas de teés tipos, todas sau- daveis e boas: vinho de uva; uma bebida feita de grifo, como a nossa ccerveja, mas mais clara, ¢ uma espécie de sidra de fruta do pais, bebi- da deliciosamente agradAvel ¢ reftescante. Além disso, trouxeram-nos grande quantidade daquelas laranjas vermelhas para nossos doentes, pois eram remédio seguro, segundo disseram, para doengas adquiri- das no mar. Ofereceram-nos também wma caixa de pequenas pilulas acinzentadas, que nossos doentes deviam tomar, uma por noite, antes | i ti ona ae BACON de dormir, e que, segundo disseram, apresseria a cura. No dia seguin- te, estando jé os trabalhos de transporte e remogao dos homens e equipagens adiantados e tranqiilos, julguei conveniente chamar todos (08 nossos homens, € quando estavam’reunidos disse-Ihes: “Prezados amigos, examinemos nossa situagao e a nds mesmos. Somos homens atirados & terra, assim como Joitas'o foi do ventre da baleia, * quando {40s considerdvamos sepultados’ nas profundezas do mars’ agora estamos ef ferra, mas nos encontramos entré'a vida-e a morte, por? que estamos além do Velho e do Novo Mundo; ¢ 6 Deus sabe 8¢ vot? specie de ‘iilagre n nos trouxe aqui‘e 6 ‘algo semelhante nos pode levar de volta. Portanto, considerands ‘Mossa libertagao passada € n0830' perigo presente ¢ futuro, elevemos nossos olhos a ao e reflitamos ‘sobre nossa conduta. Além’ disso, estamos entre vim aide! na _‘Permitamos gue noss0s semiblantes” deixem transparecet_nossas ~apreensSes ou 0s nossos vicios e indignidades. Ainda ha mais, como fos stoeraran anda gu oom Cortese) ens catas parce, por G26 dias, quem sabe nao ter sido para observar nossas maneiras educa- go? E nao nos mandarfio embora, se as acharem mas, dar-nos-do ‘mais tempo se a8 acharem boas? Bade ser que estes homens que nos atendem nos estejam vigiando. Portanto, por amor a Deus, ¢ posto que amamos 0 bem-estar de nossas almas ¢ corpos, comportemo-nos como deve ser para estarmos em paz com Deus, que encontraremos benevoléncia nos olhos deste povo”. A nossa tripulagao, a uma énica voz, agradeceu-me o bom aviso, prometendo-me viver com sobrie- ‘dade ¢ educagiio, e sem dar a menor ocasido de agravo. Passamos, assim, os trés dias alegremente e sem preacupagdes, esperando o que seria feito conosco quando expirassem. Durante esse tempo, tivemos 2 cada hora a satisfagio de ver melhorarem nossos doentes, que se acreditavam colocades nalguma milagrosa fonte de cura, ja que tio ‘bem e tio prontamente se recuperavam. ‘Na manh seguinte, transcorridos os trés dias, veio a nés um homem que nao haviamos visto antes, vestido de azul como o primei- TO, exceto que seu turbante era branco, com uma pequens cruz verme- Iha no alto, Trazia também uma pala de fino linho. A sua chegada, inclinou-se ligeiramente em nossa dirego e estenden os bragos. De Jone. NOVA ATLANTIDA 2 nossa parte, saudamo-lo de maneira humilde e submissa, como se dele esperassemos uma sentenga de vida ou de morte. Desejava falar com alguns de nds: ante o que ficamos seis apenas, ¢ 0s demais sbando- nnaram 0 aposento. Entéo nos disse: “Sou, por oficio, goveador desta Casa dos Estrangeiros, c. e fe cristo; e por isso" vim oferecer-vos os meus servigos, j& que Sois estrangeiros principalmente eristiios. Posso-dizer-vos algumas coisas que, penso, nao sero ouvidas de m& yontade. Pois bem, o Estado vos concedew Hicenga para permanecerdes em terre pelo espajo de ss seanas: ¢ no vos preocupeis se suas necessidades exigirem tais tempo, pois a lei nao é estrita-neste ponto; ¢ néo duvido que’et’ mesmo consiga Abter-vos 0 tempo’ que’ seja‘convenienté: Sabei, também, que a Casa dos Estrangeiros agora ¢ rica ¢ muito apropriada, pois ‘conserva’ acu- mulado 6 rendimedtto dess¢s diltimos trinta‘e sete anos, de vez que ha tanto tempo nenhim estrazgeiro'aqui aporia, Por isso, nfo vos preo- cuptis, o Estado vos mantera durante o tempd que ficardes, nem tam- pouco precisais abreviar a éstadia por isso. Com ‘respeito @ mercado- ria que trouxesies, teré bom uso, e recebereis, quando voltardes, 0 cequivalente em mereadoria ‘ou em oiro ¢ prata; para nés € @ mesma coisa. E se tiverdes qualquer outro pedido a fazer, no 0 oculteis, Pois percebereis que, qualquer que seja a resposta, ndo ficareis sem 4 nossa protecdo. Somente isto preciso dizer-vos, qué nenhum de vos deve ir além de wm Karam” (uma milha e meia entre eles) “dos muros da Cidade, sem permissio especial”. Respondemos, depois de nos en- treolharmos, admirando esse tratamento amavel e paternal, “que nfo sabiamos 0 que dizer por nfo termos palavras para expressar nossos agradecimientos; e que seus oferecimentos nobres e espontineos tor- navam desnecessfria qualquer pergunta. Parecia-nos ver diante dos olhos o quadro de nossa’salvago no céu: ba pouco, quase nas garras dda morte, e agora nos encontrévamos num lugar onde s6 havia conso- lo. Quanto & ordem que nos foi dada, nio a deixarfamos de obedecer, ainda que parecesse impossivel nio’se inflamarem nossos coragSes do desejo de percorrer esta terra sagrada e feliz.” Acrescentamos “que antes se haviam de ficar presas nossas linguas no céu de nossas bocas, do que esquecerem nossas preces da sua venerfivel pessoa ¢ de toda a sua nagdo”. Também humildemente Ihe pedimos que nos aceitasse como seus verdadeiros servos, com tao justo direito quanto o que qualquer homem sobre a terra tenha estado obrigado, e que deposi- me BACON vaihos a seus pés tanto nossas pessoas como tudo 0 que possuia- rmos.-Disse-nos, entio, “que era um sacerdote,¢ buscava dos sac a 1s, Retirou-se a seguir. com os olhos marejados de te ‘ternura, deixando- 0S ee pela alegria e afeto, dizendo entre nds que tinhamos vindo a umé ra de anjés, que nos apareciam diariamente eee ea ae esperdvamos. No dla segtinie, por volte das ded. horas, 0 govemnador eis outra vez ¢, depois das saudagées, disse familiarmente que nos viera visitar. Pediu uma cadeira ¢ sentou-se, ¢ nds, que éramos cerca de dex (@s demais, ou eram subalternos, ou haviam safdo), sentamo-nos com ele. Depois de estarem todos sentados, assim iniciou suas palavra “Nés, desta itha de Bensalém” (pois assim a chamavam em sua:Jin- gua), * “encontramo-nos na seguinte situagio: em virtude da, nossa solidao e das leis do segredo em que mantemos nossos Viajantes, ¢ da. rara admissio de estrangeiros, conhecemos bem a maior parte do mundo habitado, e de nossa parte, jecidos. Portanto, sono ema is aquele que sabe micnos, é mais razoavel, para nosso entretenimento, que elas partami de vos do que de Respondemos que humildemente Ihe agradeciamos nos permitisse esse proceder, ¢ que pensivamos, pélas provas que ti- nhamos, ndo haver no mundo coisa maxis digna de ser conhecida ave © estado desta terra feliz. “Mas, acima de tudo”, dissemos, “desde que foi possivel 0 nosso encontro, procedentes que éramos de diferen- tes confins do mundo, e esperavamios que nos encontraremos segura- mente de rovo, um dia, no reino dos céus (posto que éramos de ambas as partes cristios), desejévamos Saber (por ser esta terra tio remota separada, por nn ee mares, da terra por onde an- dou no mundo nosso Salvador) quem foi o apéstolo desta nacio, ¢ como foi cla convertida a fe." Transpareceu em seu semblante a gran- de satisfagdo que provocava a nossa pergunta, e disse: “Ligais meu ‘coragdo aos vossos, fazendo esta pergunta em primeiro lugar, pois ‘la mostra que primeiro buscais o reino dos céus; ¢ satisfarei de bom grado e brevemente ao vosso pedido”. “Cerca de vinte anos depois da ascensiio do nosso Salvador, aconteceu ser visto pelo povo de Renfusa (cidade na costa oriental + soe coo oem como iia de emai, tb," ih og" NOVA ATLANTIDA, us da itha), durante a noite (a noite era nublada ¢ calma), a slgumas milhas mar adentro;im gr fe Taz) nfo facetado, mas em forma de uma coluna ou eilindro, formando um grande caminho, nas- cendo do mar em diregio aos céus; ¢1no alto resplandecia uma grande cruz, mais brilhante ¢ fulgurante que o corpo do-plar Ant sorpe do pilar. Ante tao estra- mnho espeticulo, 0 povo, da cidade acorreu rapidamente para a praia, para admiré-lo, Em seguida embarcou em pequenos botes, procuran- do mais se aproximar,daquela maravilhosa visio. Mas, quando os boies distavam de sessenta jardas do pilar, viram-se obstados, ¢ nio puderam ir além. Ainda que se pudessem locomover noutras diregées, ‘se podiam aproximar: assim os botes permaneceram todos, como fnum teatro, com as pessoas observando essa luz,-como a um sinal celestial. Aconigony stat un um dos botes um_dos homens mais s4- bias. da Sociedade da.'Casa de Salomao” — casa ou colégio, meus bons irmios, que, é a. vergadcira menina dos olhos.deste_rein ‘que havendo por um instante visto e contemplado atenta ¢ devote- ‘mente 0 referido pilar com a cruz, dobrou-se'sobre sua face ¢, logo se erguendo sobre os joelhos elevando,as mios,para o cfu, fez a seguinte prece: ‘Senhor Deus do.céu e da terra. que por. Tua graga’ ‘permitiste conhecer as obras da criagdo ¢ seus segredos; discernit (até onde podem, as geragdes dos homens) entre os milagres divinos, as obras da hatureza, as obras de arte, ¢ imposturas ¢ ilusdes de todas sortes; fago aqui reconhecimento e, diante deste povo, dou testemu- nnho de que, naquilo que vemos agora diante de nossos,olhos, esté ‘Tex Dedo e é um verdadeiro Milagre; ¢ como segundo est em nossos livros nfo reatizas milagres, a néo ser pare um fim divino e excelente (ois as leis da natureza so Tuas propias leis, e no as modificas ‘a no ser por um grande motivo), nés humildemente Te supticamos favorecer este grande sinal, ¢ nos dar a interpretagdo € 0 sev uso Por misericérdia; © que, em parte, tacitamente prometeste enviar-nos’. “Quando terminou sua prece, logo petcebeu que 0 seu'bote podia mover-se sem impedimento, enquanto 0$ outros permaneciam presos. E tomando 0 fato como permissio de se aproximar, fez com que 0 bote, mansa ¢ silenciosamente, se aproximasse do piler. Mas 20 che- gar perto o plat € a cruz luminosa se desfizeram, espalhando-se como que num firmamento de muitas estrelas, que também se desvaneceu logo depois, ¢ nada ficou para ser visto, a ndo ser uma pequena arca ou gofre de cedro, seca, sem qualquer sinal de umidade, apesar de lu- sera. ence 9 eee 6 pacon & Qe tuar sobre a Agua. Em sua parte anterior, que estava em sua ditegio, crescia um pequeno ramo verde de palma; ¢ quatde sabio, com toda reveréncia, colocou-o em seu bote, abriu-se por si s6, € nela foram encontrados um livré e uma carta, ambos escritos em fino per- ‘gaminho ¢ envoltos em pedagos de linho. O livro continha todos os li ros cantinieos do Velho ¢ do, Novo, Testamento, tal coma des (pois bem sabemos o que entre v6s as’Iprejas accitam),"623 ‘Apocalipse; e otros livrds'do novo Testamento, ainda néo escritos?e que no obstante éstavam no livro. Ea carta estas palavras! “Bu, ied, servo do, Altissimo, © apbstolo de Teaus Cris: to; fui avisado por um anjo, que me’ aparece: numa visdo dé sl6ria, ‘que déveria’ conf” esta’“arca’ as “ondas ‘do mar. Por conéeguinité, Sees = di de aus povs-20 aul segué o coe por den de Deis, ot i; 710 mesmo dia da chegada, sua salvageo ¢ paz ¢ a bei aventuranga do_ fal ‘¢ do Senhor Jesus Cristo’. Ocorreu com ambos'os eaetios, tanto’ livre quanto a carta, vm grande milagre, como aquele ‘p6stolos;* no primitivo Dom das Linguas. Pois havendo, a este tempo, hesta terra, hebreus, persas ¢ indianos 20 lado dos tativos, todos leram o lvro e a carta, comio' st tivessem sido eseritos em sia propria lingua. E_desse_modo esta terra foi salva da infidelidade (eora parte do: mundo “antigo °o fol da dgua) por_uma arca, pela evangelizagio apostblica, milagrosa de Séo Bartolomeu,” F aqui fez cle umd pausa;e um miensageiro o chamou. E foi tudo o que se passoit nessa reuniao. * ~ ‘No dia seguinte, o mesmo governador veio outra vez logo aps a refeigo ¢ desculpou-se, dizendo que ne dia anterior nos deixara um tanto, bruscamente, mas agora nos faria uma compensagao, e dispen- deri’ algum tempo conasco, se achéssemos agradiveis sua comp nia e palestrar: Respondemos que a achamos tio agradavel ¢ amen: que esquecemos tanto os perigos pastados quanto 0s temores futuros durante o tempo em que © ouvimos; € que, pensivamos, uma hora em sua. ‘companhia tinha mais valor que anos da nossa vida anterior. Ele inclinou-se ligeiramente em nossa diregdo, e depois de nos havermos sentado disse: “Bem, compete a vos perguntar”. Depois de pequena_ pausa, um dos nossos disse que havia algo que tinhamos tanto dese- Be aso com oles de eco, Aes dot Apt, 24 NOVA ATLANTIDA 2a jo de saber quanto medo de perguntar, por temermos ‘Mas, encorajados por sua rara benignidade (pois que apenas nos con- Siderava esteangeiros, apesar de nos termos declarado seus servos de- ‘votados), atrever-nos.iamos a propor a questo, suplicando humilde- ‘mente que, se ele nfo a considerasse digna de ser respondida, houves- 4e por bem nos perdoar € a rejeitasse. Dissemos que observamos bem fuuda 0 que dissera anteriormente, que esta ilha feliz onde agora esté- ‘vamos era conhecida de poucos, apesir de’ conhecer a maior parte das nagSes do mundo; 0 que nos parecia verdadeiro, considerando ‘que conheciam os idiomas da Europa, e muito do seu estado'e assun- ‘ost € que 1%6s,na Europa (apessi de todos os descobrimentos de ter- as reimotas navegagdes dos GIkimos tempos), nunca’ tivemos a mie hor. idéia ou indicio, da, existéncia desta, ilha, (O° que aché vvainios assémbrosamenite estranho, Pois todas as nagdes tém conheci- mento entre i, seja por Viagens 80s outros paises, seja pelos estrari- geiros qile elas vem ©,'ainda, que aquelé que viaja a um pals estranho em geral aprende mais através da vista que aquelé que per: manece eri casa, fazendo-o ‘através dos relatos dos viajantes, mas ambos os meios sdo suficientes para promover 0 métuo conheci- mento, em certo grav, a ambas a8 partes, Porém, em relagio a esta iha, nunca ouviramos falar de qualquer navio dela provedente que tenha sido visto fundear em qualquer costa da Europa ou das Indias Orientais ou Ocidentais; nem tampouco de nenhum navio de qualquer outra parte do mando que tivesse retornado desta ilha. B, nio obstan- te, 0 assombroso no esté nisto, Pois sua situscao (com disse Vossa ‘Senhoria), no segredo de tio vastos mares, bem pode ser a,causa. Mas, quanto a terem conhecimento de linguas, livros, assuntos daaul Jo que fice a tal distancia, era algo que no sablamos explicar, pois inos parecia condigéo e atributo de poderes ¢ seres diviaes 0 permane-

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