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ALYY VO VEU ID V G1d1dSSaud NYAALS SUPERE OS BLOQUEIOS E VENCA SUAS BATALHAS INTERIORES DE CRIATIVIDADE STEVEN PRESSFIELD Ediouro STE LIVRO E SOBRE 0 TALENTO QUE VOCE SABE QUE POSSUI E QUER DIVIDIR COM A HUMANIDADE, SOBRE PROJETOS HA MUITO ACALENTADOS, SEJAM ELES ESCREVER UM LIVRO, COMECAR UMA OBRA SOCIAL OU UM NEGOCIO. NO ENTANTO, 0 PRIMEIRO PASSO PARECE SEMPRE IMPOSSIVEL. ENTRE VOCE E SEU OBJETIVO, EXISTE UMA MONTANHA DE OBSTACULOS. E'MESMO QUE NA MAIORIA DAS VEZES ELES SEJAM IMAGINARIOS, PARECEM, AQUI E AGORA, INTRANSPONIVEIS. ASSIM COMO DE NADA VALE TODO 0 ESFORCO DO MUNDO SEM TALENTO E UM POUCO DE SORTE, TALENTO E SORTE NAO BASTAM PARA QUEM NAO SE ESFORCA. STEVEN) PRESSFIELD ENSINA O LEITOR A BUSCAR SUAS MUSAS ONDE ESTAO ESCONDIDAS, E A CHAMAR OS ANJOS DE MANEIRA QUE ELES RESPONDAM, LEIA COMO © PRIMEIRO PASSO PARA UMA VIDA DIFERENTE, NA QUAL VOCE TOMA A ATITUDE. Der antes, The Har of Art Gorvinsnt @ 2002 wy STEVEN PRESSFIELD COPLRIGUT py TRIDLCKE © Eprovno PurLiecscors Lena. IAPA E DHOIETO GRAFICO — PIMENTA DESIGS Prope gin koIToRiAL SULIANA ROMERO Rivisie ripounsrics GRATIA DOMINGUES Wace Da cars @XAZUFOMO KAWAL/PHOTONICA CIP-BRASIL. CATALOGAGAG Na FONTE SINDIGATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RI POS; Presale, Stoven, Guerra da arte / Steven Pressfield ; tradugio de Geni Hirata. Rio de Jancieo : Edlouro, 2005 ‘Tradugio de: War of art ISBN €5-00-01534-9 4. Pressfield, Seoven. 2. Cringtio (Literéria, arsisdea, ete.). 5, Pensamento criative, 4. Resisténeia (Psicanlises 3, Proceastinagio. 6. Ini 0546650. - PD 153.58 coy 39.9544 Tseeorns B75 432 Todas os direitos reservados a EDIOURO PUBLICAGOES LTDA Rua Nova Jerusalém, 345 - Bonsuces Buc de Janeiro — RJ — CEP 21042-236 = (21) 3882-8200 Fax: (21) 3882-8212 /3882.8513 SUMARIO PREFACIO x © QUE EU FACO rs © QUE EU SEI 17 AVIDA NAQ-VIMIDA 18 Livao uM R Defininds o inimigo 14 atencia O5 MAIORES SUCESSO8 Da BESISTENCIA 36 A RESISTENGIA E INVISIVEL 28 \RESISTENGIA £ INTERNA 29 a RESE ENGIA £INSIDIOSA 30 ARESISTENCIA EIMPLACAVEL 36 A RESISTENUIA EIMPESSDAL 32 ARE STERCIA 6 INFALIVEL 33 3 RES JETENCTA E UNIVERSAL 34 A RESISTRENCTA NUNCA DORME 35 A RESISTENGIA JOGA PABA CANIAR 36 A RESISTENCTA ALIMENT: DO MEDO 37 \ RESISTENGIA ATUA EM UMA ENICA DIREGAO 38 A RISE ENCLA E MAIS FOIPE NA RETA FINAL 39 ARE: JATENCIA REGRUTA ALJADOS ye RESISTENCLA © PROGRASTINACIO 42 | RESISTE: Ristst RESESTENCEN E RESESTE E RESISTR RESISTENCIA E RESISTENCIA F RESISTENCIA E, BESISTENCIA E. TENGIA E STENCTA E RESISTENGEA F RESISTENCIA E RESISTENCTA FE RESISTENCIA E RESISTENCIA E KESISTENCIA E F ISTENGTA FE RESISTENGIA E RESISTENCIA E RESISTENCIA E A RESISTENCIA ; PROCRASTINAG 0. PARTE HOES 45 SENO 44 PROBLEMAZ a5, DBAMATIZAGAD 46 E AUTOMEDICAGRO 43 YITIMIZACAO 48 A ESCOLIA DE EM PARCTIRO 49 ESTE LIYRO 50 INFELICIDADE 54 FUNDAMENTALISHO 53 CRITICS 57 VALTA DE CONFIANGA EM ST 58 MEDO 50 AMOR 61 SER EMS ESTRELA 62 ISOLAMENTO 63 TSOLAMENTO, PARTE BOIS 65 CORA 67 APOIO 69. RACIONALY? RACIONALIZAG IO. paRTE BOIS 72 PODE SEK YENCIDA 73 LIVRO DOIS Combatendo a Resisténecia Tornaudo-se win profissional 35 PROFISSIONSIS E AMADORES 78 UM PROFISSIONAT 80 0 DIA-A-DIA DE CM ESGRITOR sr COMO $e SENTIR EM POBRE COITADO 83 TODOS NGS Ji SOMOS PROFISSIONAIS 4 POR AMOR AO 10G0 88 UM PROFISSINAL E PACIENTE go UM PROFISSIONAL BUSCA A ORDEM 3 UM PROFS TONAL DESMISTIFICA 93 PIANTE DD MEBO, UM PROFISSIONAL REAGE. 94 UM PROFISSIONAL N30 4 ITA DESCULPAS 95 EM PROFISSIONAL ENFRENTA AS CONDIGOES COM QUE SE DEPARA 96 UM PROFIS SIONAL E PREPARADO 97 UM PROFISSIONAL NAG SE ENIBE 98 EM PROPISSONAL DEDICA-SE A DOMINAR A TECNICA 99 UM PROFESSIONAL NAG HEESITA EAL PEDIR AJLDA 100 EM PROFISSIONAL SE DISTANGIA DE SEL INSTREMENTO. rer UM PROFISSIONAL NAO LEVA O FRACASSO (OU 0 SUCESSO) PARA O LADO PESSDAL coz UM PROFISSIONAL SUPORTA 4 ADVERS DADE cog. UM PROFISSIONAL HOMOLOG A AST PROPRIO 106 UM PROFISSIONAL y SUAS LIMITAGOES 10g UM PROFISSIONAL BEINVENTA AST PROPRUD 160 UM PROTISSIONAL E RECONHEGIDO. POR OUTROE PROFISSIONATS ne vou BAL aa UMA CRIATURA QUE NAO DESISTE uy NENT 16 LivRO TRES Além da Resisté O reine superior uy neia ANIOS NO ARSTRATO 122 ABORDANDO © MIRTERIO 924, INVOCANDO A MUSA 126 INYOCANDO \ MUSA. Pane DOLS 429 TESTAMENTO DE UM WASIONARTO 13 ANSOCANDO 4 MUSA, PARTE TRES 133 A MAGIA DE GOMEGAR 135 AMSGIA DE CONTINUAR 137 LARGO 140 VIDA HORTE 143 O RGD EOS F146 ENPERIMENTANDO O EU 4g MEDO gt O SELF AUTENTICO 155, TERRITORIO FERSUS MIEBARQUIA 555 A ORIENTAGLO HIERARQUICA 156 O ARTISTA EA HIERAROLIA 168 A DEFINIGAO DE UM ESCREVINIADOR 160 A ORJENTAGAO TERRITORIAL 562 © ARTISTA £9 TERRITORIO 164 NTRE 8 DIFERENGS ERRITORIO BE MLERARQUIA 166 A VIRTUDE SUPREMA 568 O8 FRUTOS DE NOSKO TRABALHO 169 RETRATO DO ARTISTA 191 A VIDA DO ARTISTA 192 AGRADECIMENTOS 173 PREFACIO de Robert McKee Steven Presstield escreveu A guerra da arte para mim. Certa- mente, também o escreveu para vocé, mas sei que ele o fez expressamente para mim porque sou detentor de recordes olim- picos de procrastinagio. Sou capaz de procrastinar o ato de pen- sar sobre meu problema de procrastinag%io. Sou capaz de pro- crastinar a iniciativa de lidar com men problema de procrastinar © ato de pensar sobre meu problema de procrastinacio. Assim, Pressficld, esse deménio, pedi-me para escrever 0 preficio ¢ estabelecen um prazo de enuega, sebendo que, por mais que eu protelasse, por fim teria que me dar por vencido e fazer o tra- balho, Em cima da hora, finalmente me debrucei sobre a tare- fa e, enquanto folheava 0 Livro Um, “Definindo o inimigo”. me vi refletindo, com ar de culpa, a cada pagina, Entreranro, © Livro Dois me deu um plano de batalha; o Livro Trés, uma visio da vitéria; ¢ a0 fechar A guerra da arte, senti uma onda de calma positiva, Agora sei que posso vencer esta guerra. E se cu posso, voc’ também pode. No inicio do Livro Um, Presstield rotula de Resistén- cia o inimigo da criati que Freud denominou “pulsio de morte”’,aquela forea destru- idade — um terrno abrangente para 0 tiva que habita 0 Amago da natureza humana e que aflora sempre que consideramos wma a¢io de longo prazo que pode fazer algo de realmente bom para nés ou para outrem, Em seguida, ele apresenta uma galeria das muitas manifestagdes da A GUERRA O48 ARTE Resisténcia. Vocé reconhecera cada uma delas, porque esta fora reside no intimo de todos nés — auto-sabotagem, auto- engano, autocorrupeao. Nos escritores a conhecemos por “bloqueio”, uma paralisia cujos sintomas podem provocar um comportamento espanteso. Hi alguns anos, eu estava tio bloqueado quanto o esgo- to de Calcutd, entio o que fiz? Resolvi experimentar todas as minhas roupas. Para mostrar até que ponto posso chezar, vesti cada camnisa, calga, suéter, paletd e meia, separando-as em pilhas: primavera, vero, outono, inverno, Exército da Salvagio. Em fi cando-as em primavera informal, primavera formal, verio seguida, experimentei todas elas novamente, desta vez class informal... Depois de dois dias assim, pensei que estava enlouquecendo. Quer saber como curar um bioqueio de escti- tor? Nao é com uma visita 20 psiquiatra, pois como Pressfield *& a mais sedutora forma de Resistén- cia, Nao, a cura encontra-se no Livro Dois: “Tornando-se um destaca, buscar “apoio’ profissional”, Steven Pressfield € a prépria definigao de um profis- sional. Sei disso porque ja perdi a conta do niimero de vezes que convidei o autor de The legend of Bagger Vance para uma pattida de golfé e, embora tentade, ele recusou. Por qué? Por que estava wabalhando e¢, como qualquer escritor que ja deu uma tacada sabe, o golfe é uma forma particularmente viru- lenta de procrastinagio, Em outras palavras, Resisténcia. Steve concentra uma disciplina forjada em aco. Li Portes de fogo ¢ Tentpos de guerra, de Steve, de ponta a ponta enquanto viajava pela Europa. Veja bem, nic sou um sujeito lacrimoso; eu no chorava com um livro desde The Red Pony, nas esses romances me emocionaram, Vi-me sen- tado em cafés, contendo as lagrimas por causa da coragem altruista daqueles gregos que moldaram ¢ salvaram a civilizacio ocidental. Ao olhar sob sua prosa fluida e sentir a profundi- dade da pesquisa, do conhecimento da sociedade e da natureza PREFACIO humana, dos detalhes vividamente imaginados da narrativa, fui tomado de uma admiracio teverente pela obra, por todo o trabalho que consteuia as bases de suas fascinantes criagdes, E niio estou sozinho nesta avaliagic, Quando comprei os livros em Londres, contaram-me que os romances de Steve agora so recomendados pelos professores de bistéria de Oxford, os quais dizem a seus alunos que, se quiserem conhecer a vida na Grécia classica, leiam Pressfield. Como um artista alcanca esse poder? No segundo livro, Pressfield expde a campanha do profissional, dia a dia, passo a passo: preparacdo, ordem, paciéncia, perseveranca, atitude dian- te do medo € do fracasso — nada de desculpas, nada de toli- ces. E o methor é o brilhante insight de Steve de que, antes de tudo @ sempre, o profissional dave se concentrar no perteito dominio de seu oficio. © Livro Trés,“O reino superior”, aborda a Inspiracio, esse resultado sublime que viceja nos suleos do profissional que coloca os arreios ¢ ara os campos de sua arte. Nas palavras de Pressfield: “Quando diariamente nos sentamos e fazemos nosso trabalho, o poder se concentra ao nosso redor... tor- namo-nos um bastio magnetizado que atrai limalhas de ferro. As idéias vém. Os insights acumulam-se.” A esse respeito, o efeito da Inspiragio, Steve ¢ eu concordamos plenamente. De fato, imagens e idéias surpreendentes surgem como se saissem do nada. Na realidade, esses lampejos aparentemente esponti- neos sio tio formidaveis que é dificil ecreditar que nosso insignificante eu os tenha criado. De onde, entdo, vem nosso melhor material? E sobre este ponto, entretanto, 2 causa da Inspiragao. que temos visdes diferentes. No Livro Um, Steve remonta as raizes evolutivas da Resistencia aos genes. Concordo. A causa & genética. Essa forca negativa, esse sombrio antagonismo a criatividade, est4 profundamente imbuida em nossa condigio humana. Mas no Livro Trés, ele muda de dirego € procura a A DLERRA DA ARTE causa da Inspiragio nao na natureza humana, mas em um “seine superior”. Em seguida, com um fogo poético. expoe sua crenga em musas ¢ anjos. A fonte maxima da criatividade, argumenta, é divina. Muitos, talvez a maioria dos leitores, achario o Livro Trés profandamente emocionante. Eu, por outro lado, acredito que a fonte da criatividade encontra-se no mesmo plano de realidade da Resisténcia. Ela, cambém, é genética. Chama-se talento: 0 poder inato de descobrir a conexic oculta entre duas coisas — imagens, idéias, palavras — que ninguém nunca associou antes, criando para o mundo uma terecira obra, absolutamente unica. Como nosso QI, o talento é um dom de nossos ancestrais. Se tiver- mos sorte, nés o herdamos. Nos poucos ¢ afortunados talen- tosos, a sombria dimensio de suas naturezas primeiro resiste ao trabalho que a criatividade impde, mas assim que se dedicam 4 tarefa, seu lado talentoso comega a agir e os recom- pensa com feiros surpreendentes, Esses lampejos de geniali~ dade criativa parecem surgir do nada pela razdo Sbyia: vém do inconsciente. Em resumo, s¢ a Musa existe, ela nao sussurra aos ouvides dos desprovidos de ralento. Assim, embora Steve e eu possamos discordar quanto 4 causa, concordaimos quanto ao efeito: quando a inspiracao toca 0 talento, produz verdade e beleza. E quando Steven Presstield escrevia A guerra da arte, ela sem ditvida tinha as maos sobre ele. O QUE EU FACO Eu me levanto, entro no chuveiro, tomo o café da manhi. Leio o jornal, escovo os dentes. Se tiver telefonemas a dar, telefono. Pego uma caneca de café. Calgo minhas botas da sorte que uso para erabalhar e amarro os cadarcos da sorte que minha sobrinha Meredith me deu. Dirijo-me ao meu escritério, ligo 0 computador. Mea moletom da sorte. de capuz, esta dobrado sobre a cadeira, com o talisma’ da sorte que comprei de uma cigana em Saintes Maries de la Mer pelo equivalente a apenas oito délares, ¢ minha etiqueta da sorte com 0 nome LARGO, que veio de um sonho que tive uma vez. Coloco tudo. Sobre o meu thesaurus esta o canhao da sorte do Castelo de Morro, Cuba, que meu amigo Bob Ver- sandi me deu. Aponto-o na dinegio de minha cadeira, para que possa disparar inspiracdo em mim. Faco minha oragio, que € a“Invocagado da Musa”, da Odiss¢ia de Homero, traducio de TE. Lawrence, Lawrence da Aribia, que meu querido par- ceiro Paul Rink me deu ¢ que fice perto da prateleita com as abotoaduras que pertenceram ao meu pai e com meu fruto do carvalho, cambém um amuleto da sorte, do campo de batalha de Termépilas. Sio aproximadamente deze meia agora. Sen- to-me ¢ mergalho no trabalho. Quando comesa a cometer erros de digitagYo, sei que estou ficando cansado, Passaram-se cerca de quatro horas. Cheguei ao ponto em que as respostas do corpo e da mente vio se reduzindo, Encerto 0 dia de trabalho. A CEERRA DA ARTI Faco uma cépia do que fo! feito em um disquete © guardo-o no porta-luvas do mea caminhio para o caso de haver um incéndio ¢ eu ter que sair correndo, Desligo 0 computador. Sdo trés, trés € meia. Fecho o escritério. Quantas paginas pro- duzi? Nao me importa. Serio boas? Nem sequer pense nisso. Tudo que conta é que cumpri minhas horas de trabalho € 0 fiz com toda a concentragao. Tudo que importa é que, para este dia, para esta sessio de crabalho, eu superei a Resisténcia. O QUE EU SEI Ha um segredo que os verdadeiros escritores conhecem ¢ que 05 aspirantes a escritor nao sabem, ¢ o segredo € 0 seguinte_o_ dificil ngo é escrever. O dificil & sentar-se para escrever. G que nos impede de Sentar pare Creer oa REEcia. A VIDA NAO-VIVIDA A maioria de nés possui duas vidas. A vida que vivemos e a vida nio-vivida que ¢: enconia-se a Resisténcia. siste dentro de nds. Entre as duas. Vocé jé levou para casa umta esteira ergométrica ¢ dei- sou-a acumulndo poeira no s6téo? Ja abandonon uma dieta, uum curso de yoga, uma prética de meditagio? Ja se esquivou de um chamado para envolver-se numa pratica espiritual, para dedicar-se a uma vocacio humanitiria, para consagrar sua vida ao servico de outros? JA quis ser mie, médico, advogado dos fracos ¢ desamparados? Concorrer a um cargo pubblico, tomar parte numa cruzada para salvar o planeta, fazer cam- panha pela paz mundial ou pela preservacio do meio ambien- te? Tarde da noite, j§ experimentou uma visio da pessoa que vocé poderia se tornar, da obra que conseguiria realizar, do ser realizado que vocé deveria ser? Voc$ € um eseritor que no esereve, um pintor que ndo pinta, um empresério que nunca se aventurou num empreendimento de risco? Entao vocé sabe o que é Resisténcia. A VIDA NAG-vivipn Uma noite, quando eu estava deitado, Ouvi papai conversando com mamae, Ouvi papai dizer para deixar o garoto tocar 0 boogie-woogie Poigue isso esta dentro dele e ele tem gue colocar para fora. * John Lee Hooker, letra da cang3o Boogic Chitien A Resisténeia é a forca mais txica do planeta. B fonte de mais infelicidade do que pobreza, doenca ¢ distuncio erétil. Ceder 4 Resisténcia deforma nosso espirito. Atrofia-nos € nos torna menores do que nascemos para ser. Se voc’ acredita em Deus (e eu acredito), deve considerar a Resisténcia um mal, pois nos impede de alcancar 2 vida que Deus planejou para nés ao dotar cada ser humano de seu préprio ¢ tinico génio ctiativo. A palavra génio vem do latim genfus. Os romanos usavamena para designar um espirito interior, sagrado e invio~ lavel, que nos protege, guiando-nos para nossa vocacio. Um eseritor escreve com seu génie; tm artista pinta com o seu: todo aquele que cria o faz a partir deste centro sagrado. B a morada de nossa alma, 0 recepticulo que abriga nosso ser potencial, é 9 nosso farol, nossa estrela polar. ‘Todo sol janca uma sombra ¢ a sombra do génio é Resisténcia. Por mais forte que seja o chamado de nossa alma para a realizacdo, igualmente potentes sio as forcas da Resis- téncia reunidas contra ele. A Resisténcia é mais ripida do que © projétil de uma arma, mais poderosa do que uma locomo~ tiva, mais dificil de cenegar do que cocaina. Nao estaremos sozinhos se formos dizimados pela Resist&ncia; milhdes de mulheres e homens bons foram derrubados antes de nés. E 0 pior € que nem ficamos sabendo o que nos atingin. Eu nunca * No original cm inglés: “One aight 1 was layin’ down, / 1 heard Papa callin’ to Mame. I heard Papa say. 0 lec that boy boogie~ do) woogie. / “Cause it’s in him and ies sit to came out. (N A VIDA NAO-viVIDA vocagio que é sua ¢ apenas sua. Vocé sabe. Ninguém tem que Ihe dizer. E a menos que eu seja louco, voc’ ndo esté mais per- to de tomar uma atitude em relacdo a ela do que estava ontem ou estard amanha. Acha que a Resisténcia nao é real? A Resis- téncia o matard. Sabe, Hitler queria ser artista. Aos 18 anos, pegou sua heranga, setecentos kronen, ¢ mudou-se para Viena para viver e estudar. Inscreveu-se na Academia de Belas-Attes € poste- tiormente na Faculdade de Arquitetura. Ji viu algum quadro dele? Eu também néo. A Resisténcia o derrotou. Pode achar que é exagero, mas vou dizer mesmo assim: foi mais fécil para Hitler deflagrar a 2 Guerra Mundial do que encarar uma tela em branco. A VIDA NAO-viVIDA vocagio que é sua ¢ apenas sua. Vocé sabe. Ninguém tem que Ihe dizer. E a menos que eu seja louco, voc’ ndo esté mais per- to de tomar uma atitude em relacdo a ela do que estava ontem ou estard amanha. Acha que a Resisténcia nao é real? A Resis- téncia o matard. Sabe, Hitler queria ser artista. Aos 18 anos, pegou sua heranga, setecentos kronen, ¢ mudou-se para Viena para viver e estudar. Inscreveu-se na Academia de Belas-Attes € poste- tiormente na Faculdade de Arquitetura. Ji viu algum quadro dele? Eu também néo. A Resisténcia o derrotou. Pode achar que é exagero, mas vou dizer mesmo assim: foi mais fécil para Hitler deflagrar a 2 Guerra Mundial do que encarar uma tela em branco. LIVRO UM RESISTENGIA Definindo o inimigo O inimigo é um 6étimo professor. Dalai Lama RESISTENCIA © emprecndimento de qualquer imiciativa oa esforco cujo objetivo seja ajudar os outros 10. Qualquer ato que implique comprometiments do coragdo. A decisio de se casar, de ter um filho, de aplai- nar algum trecho particularmente pedregoso de um relacionamento, 11, A adocdo de uma atitude de principios diante da adver- sidade. Em outras palavras. qualquer ato que rejeite a gratificacio imediata em favor do crescimento, da satide ou da integridade de longo prazo. Ou, expresso de outra forma, qualquer ato que se origine de nossa natuteza superior e nao inferior. Qualquer um desses evocara Resisténcia. E agora, quais so as caracteristicas da Resistencia? RESISTENCIA © emprecndimento de qualquer imiciativa oa esforco cujo objetivo seja ajudar os outros 10. Qualquer ato que implique comprometiments do coragdo. A decisio de se casar, de ter um filho, de aplai- nar algum trecho particularmente pedregoso de um relacionamento, 11, A adocdo de uma atitude de principios diante da adver- sidade. Em outras palavras. qualquer ato que rejeite a gratificacio imediata em favor do crescimento, da satide ou da integridade de longo prazo. Ou, expresso de outra forma, qualquer ato que se origine de nossa natuteza superior e nao inferior. Qualquer um desses evocara Resisténcia. E agora, quais so as caracteristicas da Resistencia? TENGIA E INVISIVEL A Resisténcia nao pode ser vista. tocada, percebida através do olfato ou ouvida, Mas pode ser sentida, Nés a experimenta- mos como um campo energético irradiando-se de um traba- Iho potencial. uma forga de repulsio. E negativa. Seu obje- tivo é nos afastar, distraiz, nos impedir de fazer nosso trabalho. A RESISTENCIA EB INTERNA A Resisténcia parece vir do exterior. Nés a localizamos em cdnjuges, empregos, chefes ¢ criancas, “Adversirios petiféri- cos”, como Par Riley costumava dizer quando era técnico do Los Angeles Lakers. A Resisténcia nao é um adversario periférico.A Resis- téncia surge em nosso interior. Tem geracio propria e perpe- tua-se por si mesma. A Resisténcia ¢ 0 inimige interno. © INSIDIOSA A Resisténcia Ihe dirs qualquer coisa para impedi-lo de fazer seu trabalho, Cometera perjario, inventara, falsificard: seduzir, intimidaré, adulara. A Resisténcia é multiforme. Assumira qualquer forma necessdria para engani-lo. Argumentara com voc’ come um advogado ou enfiard uma nove milimetros no seu rosto como um assaltante a mao armada. A Resisténcia é desprovida de consciéncia. Prometeri o que for preciso para conseguir ¢ que quer e 0 trairé assim que vocé the virar as costas. Se vocé acreditar na Resisténcia, merece o que vier a Ihe acontecer. A Resiscéncia est4 sempre mentindo ¢ enganando. A RESISTENCIA 6 IMPLACAVE] A Resisténcia é como 0 Alien, o Exterminador do Futuro ou © animal do filme Tibarie, Nao € possivel chamé-la i razio. Nao compreende mada além da forca. E uma maquina de destruigéo, programada de fibrica com um objetivo Gnico: impedir-nos de realizar nosso trabalho. A Resisténcia ¢ impla- cavel, inflesivel, incansivel. Reduza-a a uma tnica célula e esta célula continuard a atacar. Esta é a natureza da Resisténcia. E ado que ela conhece. A RESISTENCIA E IMPESSOAL A Resisténcia nio esta interessada em atacd-lo pessoalmente. Nio sabe quem vocé é ¢ nao se importa. A Resistencia € uma forga da natureza. Ela age objetivamente. Embora pareca mal-intencionada, a Resisténcia na verdade age com a indiferenca da chuva ¢ transite pelos céus de acordo com as mesmias leis das estrelas, Devemos nes lem brar disso quando arregimentarmos nossas forgas contra a Resisténcia. ” A RESISTENCIA DANFALIVEL Como uma agulha magnetizeda flutvando em uma superficie de leo, a Resisténcia sempre apontar para o Notte — o Norte significando aquela vocacéo ou acdo que ela quer nos impedir de realizar Podemios usar esse fator como uma bassola, Podemos navegar usando a Resisténcia, deixando que ela nos guie para aquela vocagiio ou acio que devemos seguir antes de qualquer outra. Principio basico: quanto mais importante uma vocacio ou acao for para a evolucio de nossa alma, mais Resisténcia sentiremos em persegui-la. NCIA E UNIVERSAB Estaremos enganados se pensarmos que somos 08 Gnicos a hitar contra a Resistincia, Tudo que tem corpo sofre Resistencia. M A RESISTENCIA NUNGA DORME Heary Fonda continuava a vomitar antes de cada apresentagio no palco, mesmo quando jé tinha 75 anos. Em outras palavras, © medo nio nos abandona. O guerreiro ¢ o artista vivem pelo mesmo cédigo de necessidade, que dita que a batalha tem que ser travada a cada novo dia. a A RESISTENCIA JOGA PARA GANHAR O objetivo da Resisténcia néo & ferir ou aleijar. Sua intencio & matar. Seu alvo é 0 epicentro de nosso ser: nosso génio cria~ ‘tive . nossa alma, o dom tinico e inestimavel com que fomos tazidos ao mundo para dar ¢ que ainguém mais possui. A Resisténcia joga para valer. Ao combaté-la, travamos uma guerra com a morte. AR ALIMENT CHA DUO MEDO A Resisténcia nao tem forea propria. Cada gota de sua seiva vem de nds. Nés lhe damos forca com 0 nosso medo. Domine esse medo e vencerd a Resistencia \ RESISTENCIA ATUA EM UMA UNICA DIREGAO A Resisténcia obstrui a agio apenas de uma esfera inferior para uma esfera superior. Ela se manifesta quando buscamos seguir uma vocacio nas artes, iniciar um empreendimento inovador ou evoluir para um patamar moral, ético ou espiri- tual mais alto. Portanco. se vocé estiver em Calcuta trabalhando para a Fundagio Madre Teresa e estiver pensande em ir embora para iniciar uma carreira em telemarketing... relaxe. A Resisténcia Ihe dara um salvo-conduto. i A RESESTENGIA E MAIS FORTE NA RETA FINAL © herdi grego Odisseu quase chegou em casa anos antes de seu verdadeiro retorno ao lar. A itha de Itaca jf estava a vista, suficientemente perto para que os marinheiros pudessem ver a fumaca dos fogdes de suas casas no litoral. Odisseu estava to certo de que ja estava a salvo, que se deitou para tirar an cochilo, Fei entio que seus homens, acreditando haver ouro em uma sacola de couro que havia entre os pertences de seu comandante, apossaram-se dela ¢ a abriram.A sacola continha os Ventos adversos, que o deus Eolo prendera para Odisseu ‘imara anteriormente de sua abencoada itha. Os ventos irromperam da sacola, livres, com quando © navegador se apron um grande estrondo, arremessando os navios de Odisseu de volta, através de cada légua de oceano que jé haviam atraves- sado com tanta dificuldade, ¢ fazendo-o suportar novas provacées ¢ sofrimentos, até finalmente, sozinho, retornar a0 lar para sempre. © perigo é maior quando a linha de chegada esti a vista. Nesse ponto, 2 Resisténcia sabe que estamos prestes a vencé-la, Ela acende a luz vermelha. Ela organiza um ale mo ataque ¢ nos golpeia com todas as forgas. O profissional deve estar alerta para esse contra-ataque. Cuidade na reta final. Nao abra a sacola dos ventos. A RESISTENCIA RECRUTA ALIADOS Por definicio, Resisténcia ¢ auto-sabotagem. Mas existe um perigo paralelo contra o qual também é preciso se precaver:a sabotagem cometida por outros. Quando um escritor comega a superar sua Resistéacia — em outras palavras, quando comega realmente a escrever — ele pode verificar que as pessoas préximas comegam a agir de modo estranho. Podem se tornar amuadas ou mal-humoradas, podem adeecer, podem acusar 0 novo escritor de “estar mu- dado”, de “ndo ser mais quem era”. Quanto mais préximas essas pessoas forem do escritor iniciante, de forma mais bizarra irao agir e mais emogio colocarSo por tras de seus atos. Estio tentando sabotd-lo. A razo € que essas pessoas esto, conscientemente ou nao, lutando contra sua prépria Resisténcia. O sucesso do recém-revelado escritor torna-se uma censura a elas. Se ele consegue vencer esses demdnios, por que elas nio? Em geral, amigos préximos ou casais, até mesmo fami- lias inteiras, deixam-se levar em tdcitos acordos pelos quais cada individuo compromete-se (inconscientemente) a se man- ter atolado no mesmo lamagal em que ele e seus colegas pas- saram 4 se sentir to confortaveis. A mais alta trai¢ao que um caranguejo pode cometer é saltar para a borda do balde. © artista deve ser implacivel, nfo s6 consigo mesmo, mas também com os outros. Uma vez vencida a Resisténcia, 4 RESISTENCIA nio pods voltar para puxar seu colega que ficou preso pelas calgas no arame Farpado. © melhor que pode fazer por esse amigo (2 ele proprio lhe dird isso, se for realmente seu amigo) é pular o muro e seguir em frente. A melhor ¢ Gnica coisa que um artista pode fazer por outro € servir de exemplo € de inspiracio. Agora, consideremos o pr imo aspecto da Resistén— cia: os sintomas. RESISTENCIA BF PROCRAS TINAG: A procrastinacao é a maniféstacio mais comum de Resistén- cia porque é a mais facil de racionalizar. Nao dizemos a nds mesmos:“Nunca vou compor minha sinfoni, Ao invés disso, dizemos: “Vou compor miuha sinfonia; s6 que vou comecar amanhi.” RESISTENCIA E PROCRA PAW E DOES. © aspecto mais pernicioso da procrastinagio é que pode se transformar num habito. Nés nio adiamos nossas vidas hoje; nd: as adiamos até nosso leito de morte. Nunca se esqueca: neste exato instante, podemos mudar nossas vidas. Nunca houve um momento, nem nunca haverd, em que nao tenhames o poder de aleerar nosso destino, Neste mesmo segundo, podemos virar a mesa sobre a Resisténcia. Neste mesmo segundo, podemos nos sentar e fazer nosso trabalho. 4 RESISTENGIA As vezes, a Resisténcia assume a forma de sexo ou de uma preocupagdo obsessiva com sexo. Por que sexo? Porque 0 sexo proporciona uma gratificagSo forte ¢ imediata. Quando alguém dorme conosco, sentimno-nos sancionados ¢ aprova- dos, até mesmo amados. A Resisténcia diverte-se com isso. Sabe que nos distrain com um suborno facil e barato € nos impediu de fazer nosso trabalho, Obviamente, nem todo sexo & uma manifestagao de Resisténcia. Em minha experiéncia, vocd pode saber pela intensidade do sentimento de vazio que sente depois. Quan- to mais vazio vocé se sente, mais certeza pode ter de que sua verdadeira motivac3o nio foi amor, nem mesmo luxtiria, mas Resisténcia. Nio € preciso dizer que este principio se aplica a dro- gas, compras compulsivas, masturbagio, TV, bisbilhotice, dlcool € consumo de todo produto que contém gordura, agticar, sal ou chocolate. a RESISTENCEA E PROBLEMAS Nés nos metemos em confusio porque é um meio facil de cha- mar atencao. Os problemas s30 una forma canhestra de fama. E mais facil ser pego na cama com a mulher do diretor da Faculdade do que terminar aquela dissertagio sobre a metatisica da variedade de elementos incongruentes nos contos de Joseph Conrad. A saiide precéria é uma forma de problema, assim como 9 alcoolismo, o vicio em drogas, a tendéncia a se acidentar, todas as neuroses, inclusive o sexo compulsivo, ¢ aquelas fra- quezas aparentemente inofensivas como cities, o jeito créni- co de estar sempre atrasado e a estrondeante musica rap a todo volume em um Supra 95 de vidro fumé. Qualquer coisa que chame atencdo por meios indolotes ou artificiais € uma mani- festacdo de Resisténcia. A crueldade com outras pessoas é uma forma de Resis- tencia, como a toleraincia passiva da crueldade dos outros. O artista cm atividade nio tolera confusio em sua vida porgue sabe que os problemas 0 impedem de realizar seu tra~ balho. © artista ativo bane de seu mundo toda fonte de pro- blemas. Ele domina sua necessidade de confusdo e a transforma em trabalho, ss Criar um melodrama em nossas vidas é um sintoma de Resis- téncia, Para que investir anos de trabalho projetando uma interface de software quando vocé pode obter a mesma atengio levando para casa um namorado com ficha na policia? As vezes, familias inteiras participam inconscicntemente de uma cultura de dramatizagio. As criangas enchem os tan- ques de combustivel, os adultos armam os estagios, toda a nave espacial salta de um episddio alarmante para outro. E a tipu- lacdo sabe como manté-la em movimento. Se o nivel de dra- ma cai abaixo de um certo patamar, alguém trata de agir para intensificd-lo, © pai se embebeda, a mie fica doente, Janie aparece na igreja com uma tatuagem dos Oakland Raiders. E mais divertide do que um filme. E funciona: ninguém rea- liza absolutamente nada. As vezes, penso na Resisténcia como uma espécie de mal igual a Papai Noel, que vai de casa em casa, cuidando de tudo. Quando chega a uma casa viciada em fazer drama, suas boche- chas vermelhas se iluminam e ele parte alegremente atris de suas oito mintisculas renas. Sabe que naquela casa nenhum trabalho sera realizado. od RESIS AE AUTOMEDICAGAO Voc? regularmente ingere qualquer substancia, controlada ou nio, cujo objetivo é aliviar depressio, ansiedade, ete.? Ofere- co-lhe a seguinte experiéneia: Certa vez, trabalhei como redator em uma grande agéncia de publicidade de Nova York. Nosso chefe costumava nos dizer: invente uma doenca. Crie uma doenca, dizia, e poderemos vender a cura. Distarbio de Déficie de Atengao, Disturbio de Efeiro Sazonal, Distiitbio de Ansiedade Social. Nao sio doengas, sio taticas de rarkesing. Nao foram os médicos que as descobri- ram, foranz os publicitarios. Foram os departamentos de mar- keting. Foram as industrias farmacéuticas. A depressio ¢ a ansiedade podem ser reais. Mas também podem ser formas de Resisténcia. Quando nos entapimos de remédios para apagar o chamado de nossa alma, estamos sendo bons cidadios ¢ con- sumidores exemplares. Estamos fazendo exatamente 0 que 0s comerciais de TV ¢ a cultura pop materialista nos induz a fazer pela lavagem cerebral a que somos submetidos desde 0 nasci- mento. Ao invés de aplicar o autoconhecimento, a autodisci- plina, a gratificacdio protelada e 0 trabalho arduo, nés simples- mente consumimos um produto. Muitos pedestres foram mutilados ou mortos no cruza- mento da Resisténcia com 0 Comércio. a RESISTENGIA E YITIMIZAGAO. Os médicos estimam que secenta a oifenta por cento de suas atividades nio estio relacionadas 4 sande. As pessoas no estio doentes, estio fazendo drama. As vezes, a parte mais dificil do trabalho médico € manter uma expressdo impassivel. Como Jerry Seinfeld observou a respeito dos seus vinte anos de E muito tempo fingindo-se fascinado. A aquisicio de uma condicio empresta significado & encontros amorosos: existéncia de uma pessoa. Uma doenga, uma cruz a carregar... Algumas pessoas vio de condigiio em condigao: curam uma e outra surge para ocupar seu lugar. A condisio torna-se uma obra de arte em si mesma, uma versio espiria do verdadeiro ato criative que a vitima evita ao despender tantos cuidados em cultivar sua condigao Colocar-se na condigio de vitima é uma forma de agressdo passiva. Busca alcangar gratificago nio por intermé- dio do trabalho honesto, de uma contribuigéo feita a partic do amor, insight ou experiéncia pessoal, mas da manipulacio dos outros por meio da ameaca silenciosa (e nem tio silenciosa). A vitima compele os outros a virem, em seu resgate ou a se comportarem da forma como deseja, mantendo-os reféns da perspectiva de agravamenco de sua propria doenga/colapso/ dissolucéo mental, ou simplesmente ameacando tornar suas vidas to miseréveis, que clas fazem o que a vitima deseja. Fazer-se de vitima é a antitese de realizar 0 seu: traba- Iho. Nao 0 faga. Se estiver agindo assim, pare agora. 6 RESISTENGIA E A ESCOT, DE UM PARCEIRO As vezes, se nio estivermos conscientes de nossa propria Resisténcia, escolheremos como parceiro uma pessoa que superou ou esta conseguindo superar coin sucesso a Resistén- cia. Nao sei bem por qué. Talvez seja mais ficil dotar nosso parceiro com o poder que ma realidade possuimos, mes que tememos usar, Talvez seja menos ameagador acreditar que nosso amado companheiro merece viver sua vida no vivida, enquanto nés nfo. Ou talvez queiramos usar nosso parceiro como modelo. Lalvez acreditemos (ou queiramos acreditar) que parte da forca de nosso parceiro se transmitird para nds pela simples proximidade por tempo suficiente. E assim que a Resisténcia desfigura o amor. O cozido que prepara € apetitoso, € convidativo; Tennessee Williams podia transformar isso numa trilogia. Mas seré amor? Se for- mos 0 parceiro que apdia o trabalho do outro, nio deveriamos encarar nosso proprio fracasso de sair cm busca de nossa vida nio vivida, ac invés de pegar carona no sucesso de nosso cén- jnge? E se formos o parceiro que recebe o apoio, nio deve- xiamos sair do brilho da adoragdo de nosso amado ¢ encora- jé-lo a deixar sua propria luz brilhar? 8 CIA BESTE LIVRO Quando comecei este Livro, a Resisténcia quase me venceu Esta foi a forma que ela assumiu: disse-me (a voz em minha eabeca) que ew era um escritor de ficg%o, nio de ndo-ficcio, e que nic deveria estar expondo esses conceitos de Resis- céncia de maneira literal ¢ aberta; em vez disso, deveria incor pord-los metaforicamente a ui romance. E um ergumnento muito sutil e convincente. A racionalizacio que a Resistencia me apresentou era a de que eu deveria escrever, digamos uma hist6ria de guerra, aa gual os principios da Resisténcia fossem expressados na forma do medo experimentado por um guerreiro. A Resisténcia também me disse que eu nio deveria procurar instruir ou me apresentar como um fornecedor de sabedoria; que isso era arrogante, egoista, talvez até mesmo imoral, e que por fim iria me causar danos. [sso me assustou. Fazia pleng sentido, © que tinalmente me convenceu a seguir em frente foi simaplesmente o fato de que me senti muito infeliz ao desistir do projeto. Comecei a desenvolver sintomas. Tio logo me sentei ¢ comecci a trabalhar, senti-me bem outra vez. ca GUA EB INFELICIDADE Como a Resisténcia se apresenta? Primeiro, na forma de infelicidade. Sentimo-nos muito mal. Um terrivel tormento permeia tudg. Estamos entediados, estamos inquictos. Nao conseguimos sentir prazer em nada. Hé um sentimento de culpa cuja origem no conseguimos identificar. Queremos voltar para a cama: queremos Jevantar ¢ ir farrear. Sentimo-nos desprezados ¢ despreziveis. Sentimo- nos desgostosas. Detestamos nossas vidas. Detestamos a nés mesmos. Sem trégua, a Resistencia avoluma-se a um grau insu- portavel. Nesse ponto, surgem os vicios. Drogas, adultério, navegacdo na Internet. Além dese ponto, a Resistencia torne-se clinica. Depres- slo, agressio, disfngao. Em seguida, o verdadeiro crime ¢ a autodestruicdo fisica. Soa como a propria vida, eu sei. Mas nao 6. B Resisténcia. © que a torna enganadora & que vivemos em uma cul- tura de consumo, que é extremamente cdnscia dessa infelici- dade ¢ que concentra toda a sua artilharia de perseguigio do lucro_ na sua exploragio. Vendendo-nos um produto, um temédio, uma distracio. John Lennon escreveu certa yez: Bem, vorés se achaie téo espertos, Tao independentes e Hioves AGE LREA Da KRTE Ma: Nao passam de malditos caipivas.* no que me diz respeito, Como artistas ¢ profissionais, é nossa obrigagio realizar nossa propria revolugde interna, uma insurreigo particular no interior de nosso proprio crinio. Com esse Ievante, nos fiber- tamos da tirania da cultura de consumo, Derrubamos a pro- gremacio da propaganda, filmes, videogames, revistas, TV € MTV, pelos quais fomos hipnotizados desde o nascimento. Desligamo-nos da rede elétrica ao reconhecer que nunca curaremos nossa inguietagdo enquanto continuarmes a con- tribuir com nossa renda disponivel para os lucros da Empu- Thagdo S.A., mas somente ao realizarmos nosso trabalho, * No original em inglés, “Well, yout think you're so clever / and classless and free / But you're all fucking peasanes / As far as 1 can see." (N. do B.) ISTENGIA ) FUNDAMENTALISMO Tanto © artista quanto o fundamentalista defrontam-se com a mesmia questio: o mistério de sua existéncia como indivi- duos, Cada qual faz as mesmas perguntas: Quem sou eu? Por que estou aqui? Qual o sentide da minha vida? Em estigios mais primitivos da evolucio, a hamanidade Nos estagios de sel- vageria, barbarismo, cultura némade, sociedade medieval, na nio tinha que lidar com esas questd tribo © no cla, a posicao do individuo era decerminada pelos mandamentos da comunidade. Somente com o advento da modernidade (iniciada na Grécia antiga), com o nascimento da liberdade ¢ da individualidade. € que tais questdes ascen- deram ao primeiro plano. Nio sio questdes ficeis. Quem sou eu? Por que estou aqui? Nao sao faceis porque o ser humano nio foi projetado para fincionar como um individuo. Estamos unidos de forma tribal, condicionados a agir como parte de um grupo. Nossas psiques foram programadas por milhdes de anos de evolugio do cacador-coletor. Conhecemos © cla; sabemos como nos inserir no bande e na tribo. © que ndo sabemos ¢ como viver sozinhos, Nao sabemos ser individuos livres © artista ¢ o fandamentalista surgem em sociedades em diferentes estigios de desenvolvimento. © artista € o modelo avangado. Sua cultura possui afluéncia, estabilidade, suficien- te excesso de recursos para permitir 9 Juxo do auto-exame. sa A GUERRS Da ARTE © artista assenta-se na liberdade. Nao a teme.Tein sorte. N no lugar certo, Possui autoconfianga ¢ esperanga no futuro. Acredita no progresso e na evolugio. Sua fé & que a humani~ dade esta progredindo, ainda que aos tropecos e¢ de forma eu imperfeita, para um mundo melhor. O fundamentalista n3o compartilha dessa id¢ia, A seu ver, a humanidade decaiu de wm estado mais elevado. A ver- dade nao est4 Id fora, aguardando a revelagio; j4 foi revelada. A palavta de Deus foi proferida e registrada por Seu profeta, seja ele Jesus, Maomé ou Kar] Marx © fundamentalismo € a filosofia dos fracos, dos con- quistados, dos desajustados ¢ dos desprovides. O terreno pro- picio para a sua germinagéo é a devastacio da derrota militar ou politica, como o fandamentalismo hebreu surgiu durante © dominio babilénico. como o fiundamentalismo de cristios brancos apareceu no sul dos Estados Unidos durante a Recons— uucio, como a nocio de Raga Superior desenvolveu-se na Alemanha depois da 1! Guerre Mundial. Nessas épocas de desespero, a raga conquistada teria desaparecido sem uma doutrina que restaurasse a esperanca e 0 orgulho. © funda- mentalismo islimico brota do mesmo cendrio de desespero ¢ exerce a mesma enorme ¢ poderosa atracao. © que & exatamente esse desespero? E o desespero da liberdade. A desarticulacio @ a emasculagio experimentadas pelo individuo que foi cortado das estruturas familiares ¢ reconfortantes da tribo e do cla, da vila ¢ da familia. E @ estado da vida moderna. © fundamentalista (ou, mais precisamente, 0 sujeito atormentado que abraca o fundamentalism) aio consegue suportar a liberdade. Nao consegue encontrar seu caminho para © futuro, entdo regride para © passado, Retorna, na ima- ginagdo, aos dies gloriosos de sua raca ¢ procura reconstituic canto eles como a si proprio 4 sua luz mais pura ¢ virtuosa. Volta ao basico. Ao fundamental. RESISTENCIA Fundamentalismo ¢ arte so mutnamente exciudentes, Nao existe uma arte fundamentalista. Isso nao significa que o fundamentalista ndo seja criativo. Mas exatamente, sua cria~ tvidade € invertida. Ele cria destruicdo. Até mesmo as estru- turas que constréi, suas escolas @ redes de otganizacio, slo dedicadas 4 aniquilacio, de seus inimigos ¢ de si mesmo. Mas o fundamentalista reserva sua maior criatividade para a moldagem do Diabo, a imagem de seu inimigo, em oposic¢do 4 qual ele define ¢ dé sentido 4 propria vida. Como © artista, o fundamentalista experimenta a Resisténcia. Expe- rimenta-a como a tentag%o ao pecado. Para o fundamentalista, a Resisténcia é 0 chamado do Mal, procurando seduzi-lo ¢ afasta-lo da virtude. O fundamentalista consume-se com Sati a guem ama como ama a morte. Seri coincidéncia que os homens-bomba do World Trade Center fregiientavam clubes de sirip-tease durante seu treinamento ou que concebessem sua recompensa como um esquadrio de noivas virgens e a licenga de violenti-las nos caldeirées de laxtiria do céu? © fandamentalista cdeia ¢ teme as mulheres porque as vé como receptaculos de Sati, mulheres tentadoras como Dalila, que seduziu Sansio e 0 privou de sua forga. Para cormbater © chamado do pecado, isto 8, a Res téncia, o fiundamentalista mergulha na ago ou no estuda de textos sagrados. Entrega-se cormpletamente a eles, 4 seme- Ihanga do artista no proceso de criacio. A diferenca € gue, enquanto um olha para a frente, esperando criar um mundo melhor, o outro olha para tr4s, buscando retornar a am mun- do mais puro do qual ele € todos os demais cairam. © humanista acredita que a humanidade, enquante indi- viduos, é chamada a cooperar com Deus na criacio do mun- do. Por isso valoriza tanto a vida. Emi sua visio, as coisas real- mente progridem, a vida realmente evolui; cada individuo tem capacicade, ao menos em potencial, de contribuir para o progresso desta causa. O fundamentalista néo pode conceber isso. Em sua sociedade, 4 dissidéncia nao € apenas crime, mas apostasia; ¢ heresia, transgressao contra © proprio Deus. Quando o fandamentalismo vence, 0 mundo entra numa idade de trevas, Ainda assim, no posso condenar quem se sente atraido por essa filosofia, Penso em minha propria jornada interior, as vantagens gue tive de educacio, abudin- cia, apoio familiar, sade @ a sorte incontestavel de ter nasci- do nos Estados Unides, ¢ ainda assim aprendi a existir como individuo auténomo, se realmente fiz, apenas por um fio € a um custo que detestaria ter que calcular. “Talvez a humanidade nao esteja preparada para a liber- dade. O ar de liberdade pode ser rarefeito demais para a nossa respiracdo. Cercamente, eu nio estaria escrevendo este livro, sobre este assunto, se viver com liberdade fosse facil. O para- doxo parece ser, como, Sdcrates demousueu ha muito tempo. gue o individao realmente livre somente o é até 9 ponto de__ Enquanto que agueles que nio senhores u_prdpr seu_ proprio, ausodomin governam a si mesmos esto condenados a encontra que os governem. RESISTENCIA E CRITICA Se vocé se vir criticando outras pessoas, provavelmente estard agindo assim por Resisténcia. Quando vemos os outros come- gando a viver suas vidas auténticas, ficamos loucos se no estivermos vivendo a nossa propria vida real. Os individuos que se sentem realizados em suas préprias vidas quase nunca criticam os outros. Quando falam, é para oferecer encorajamento. Observe-se. De todas as mani- festagoes de Resistencia, a meioria causa danos apenas a nés mesmos. A critica ¢ a crueldade ferem a outros também. 9 RESISTENGIA E FALTS DE CONFIANGA EM 31 A falta de confianca em si mesmo pode ser uma aliada. Ela serve como indicador de aspiraclo. Reflete amor, amor por algo que sonhamos fazer, ¢ desejo, desejo de realizi-lo, Se voce flagrar-se perguntando a si proprio (e a seus amigos) “Serei realnenre um escritor? Serei yealmente um artista?”, ¢ bem provavel que voce seja. O falso inovador é extremamente autoconfiante. O ver- dadeiro morre de medo. 53 NELA FE MEDO. Vocé esta paralisado de medo? E um bom sinal. O medo é bom. Come a falta de confianca em si prd- prio, o medo é um indicador, O medo nos diz 0 que devemos fazer. Lembre-se de nosso principio bésico: quanto mais medo tivermos de uma tarefa ou vocagio, mais certeza podemos ter de que devemos realiza-la, A Resisténcia é experimentada na forma de medo; o grau de mede é igual 3 forga da Resisténcia. Portanto, quanto mais medo sentirmos sobre um determinado empreendimen- to, mais certos podemos estar de que 9 empreendimento é importante para nds e para o crescimento de nosso espirito. E por isso que sentimos tanta Resisténcia. Se nfo significasse nada para nds, n3o haveria nenhuma Resisténcia. Vocé j4 viu o programa Inside the Actors Studio? O entrevistador, James Lipton, invariavelmente pergunta a seus convidados: "Que fatores o leva a decidir aceitar um deter minado papel?” © ator sempre responde: "O medo que eu tenho dele.” © profissional enfenta o projeto que representa um desafio para ele. Assume a tarefa que o levard por mares nun ca antes navegados, que o compeliza a explorar partes incons- cientes de si mesmo. Ele tem inedo? Sem diivida. Ele esta petriticado. A GUERRA DA SRTE (Inversamente, o profissional recusa papéis que j4 fez. J4 nio os teme. Para que desperdigar tempo?) Portanto, se vocé estiver paralisado de medo, isto ¢ um bom sinal. Mostra-the o que deve fazer. i : } } RESISTENCIA AMOR A Resisténcia € diretamente proporcional ao amor. Se estiver sentindo unza Resistencia maciga, a boa nova é que isso signi- fica que aj também h4 muito amor. Se vocé nio amasse 0 pro- Jeto que o esté apavorando, nao sentiria nada. O contrétio de amor nao é Sdio; é indiferenca. Quanto mais Resistencia vocé sentir, mais importante a atte/projeto/empreendimento 6 para vocé — e mais grati- ficagSo sentir4 quando finalmente a realizar. Pp erterrrrnc cn RESISTENGIA E SER UMA ESTRELA Fantasias de grandeza sto um sintoma de Resistencia, Sia © sina) de um amador. O profissional j4 aprenden que o suces- so, como a felicidade, advém como um subproduto do taba Iho, © profissional concentra-se no trabalho e permite que as recompensas venham ou nao, como quiserem wok L i i L 4 { As vezes, deixamos de nos lancar em um empreendimento porque temos medo de ficar sozinhos. Sentimo-nos con- fortéveis com a tbo ao nosso redor; deixa-nos nervosos par- tir para a floresca sozinhos Eis 9 truque: nunca estamos sozinhos. Assim que nos afastamnos do-clarkerdy foguelra do acampaMence, nose Musa pousa tii nosso ombro come uma borboleta-O ate de tora- gi Infalivelmente evoca aquela parte mais profincr-denos- Gia € NOs ampara, ~Vocés ja virsit tntievistascom o jovem John Lennon oa Bob Dylan, quando o reporter tenta Thes fazer perguntas de ordem pessoal? Os rapazes evitam estas perguntas com un: sarcasmo desencorajador. Por qué? Porque Lennon e Dylan saber que a parte deles que compée a mncdes ndo sdo “eles”, nem aquele eu pessoal que exerce um fascinio tao excep- cional sobre scus estiipidos entrevistadores. Lennon e Dylan também sabem que a parte de si mesmos que compée & sagrada demais, preciosa demais, frgil demais para ser trans- formada em bits sonoros pata deleite de alguns pretensos idélatras (que esti, eles mesmos, enredados em sua propria Resistncia). Assim, cles zombam deles ¢ se enfurecem. E um Jugar-comum entre artistas ¢ criangas brincando que eles niio tém consciéncia de tempo ou solidio quando estio perseguindo sua vis 10. As horas voam. Tanto a escultora COLPRRA DA METE quanto 0 menine travesso em china da drvore arregalam othes. piscando, quando a mie chama: “Hora da janta!” os RESISTENCIA FE ISOLAMENTO PARTE BOIS Os amigos ds vezes perguntam:*Nio se sente isolado sentado sozinho o dia inteiro?” No comego, parecia estranho ouvir-me responder “Nao”. Depois, percebi que nio estava sozinho; estava no liveo; estava com meus personagens. Estava comigo mesmo. Nao sé nfo me sinto sozinho com meus personagens, como eles sao mais vividos ¢ interessantes para mim do que as pessoas na minha vida real. Se vocé pensar bem, ndo pode- ria ser diferente. Para que um livro (ou qualquer projeto ou empteendimento) prenda nossa atengio pelo tempo neces- sirio para se realizar, tem que estar ligado a alguma perple- xidade ou paixdo interna que seja de suprema importéncia para nds. Esse problema corna-se o crema de nosso trabalho, mesmo que, no comego, nao possamos compreendé-lo ou defini-lo. A medida que os personagens despontam, cada qual infalivelmente incorpora um aspecto dese dilema, dessa perplexidade. Tais personagens podem nao ser interes- santes para mais ninguém, mas sio absoluramente fascinantes para nds. Eles sio nés mesmos. Versdes mais sensuais, mais inteligentes, mais mesquinhas de nés mesmnos. E divertido estar ern sua companhia porque eles se debatem com a mes- ma questio que nos anima. Sao nossas almas gémeas, nossos amantes, nossos melhores amigos, Até mesino os vildes. Espe- cialmente os vildes. bs ACL ERMA DA ART Mesmo em um livro como este, que nfo possui nenhum personagem, nio me sinto sozinho porque estow imaginando © leitor, que fantasio como um aspirante a artista muito pare cido com meu préprio eu, mais novo ¢ menos grisalho. A esse leitor espero transmitir um pouco de firmeza ¢ inspiragio, bem como aparelhé-to, precariamente, com alguma sabedoria adguirida com a experiéncia ¢ alguns truques do oficio. ee ISTENGIA E CURA JA esteve em Santa Fé? HA uma subcultura de “cura” ali. A idéia & que existe algo de terapéutico na atmosfera. Um Ingar seguro para onde ir ¢ se recompor, Ha outros lugares (ocor- rem-me Santa Bérbara ¢ Ojai, na Califérnia), em geral habita- dos pela classe média-alta com auais tempo ¢ dinheiro do que sabem como gastar, onde uma cultura de cura também prevalece. O conceito em todos esses ambientes parece ser gue uma pessoa precisa completar essa cura antes de estar pronta para realizar sua obra. Essa forma de pensar (j4 esti & minha frente?) é uma forma de Resist@ncia. © que pretendemos curar, alias? O atleta sebe que nun- ca chegara o dia em que ele acordar’ sem dores. Ele tem que aceitar a dor. Lembre-se, a parte de nos que acha que precisa de cura nao é a parte com a qual criamos; esta parte € muito mais forte e profanda, A parte com a qual criamos nao pode ser tocada por nada que nossos pais tenham feito ou que a socie- dade tenha feito, Essa parte é imaculada, impoluta; 4 prova de som, 4 prova d’agua e 4 prova de bala. Na realidade, quanto mais problemas tivermos, melhor ¢ mais rica essa parte se tornara. A parte que precisa de cura € nossa vida pessoal. A vida pessoal nada tem a ver com trabalho. Além disso, que maneira 67 A EVER DA URTE melhor de curar do que encontrar nosso centro de auto~ soberania? Nao é esse 0 objetivo da cura? Hi duas décadas, fui parar em Nova York, ganhando vinte délares por noite dirigindo um taxi ¢ fuginde © tempo todo do trabalho que deveria fazer. Certa noite, sozinho em meu apartamento sublocado a cento e dez délares, cheguei ao fundo do poco em termos de ter me desviado para tantos canais estranhes, tantas vezes, que eu nado conseguia racionalizar a questo por nem mais uma noite. Peguci minha antige Smith— Corona, temendo a experiéncia como algo sem sentido, sem propésito, initil, além de ser a medida mais dolorosa que eu podia conceber. Durante duas horas, obriguei-me a ficar ali sentado, produzindo com grande esforco textos sem valor que arremessava imediatamente no lixo. Foi o suficiente. Guardei a méquina de escrever. Voltei 4 cozinha. Na pia, amontoavam- se dez dias de loucas sujas. Por algurma razio, sentia tanta ener- gia que resolvi lava-las.A gua morna transmitia uma sensagio agradavel. © sabio ¢ a esponja faziam seu trabalho. Uma pilha de pratos limpos comecou a se erguer no escorredor. Para minha surpresa, percebi que estava assobiando. Compreendi que havia virado uma pigina Eu estava bem. Estaria bem dali em diante. Compreende? Eu nao havia escrito nada de valor. Pode- riam se passar anos até que eu o fizesse, se € que chegaria a fazd-lo. Nio importava. O que contava é que cu havia, apés anos de fuga, realmente me sentado ¢ feito meu trabalho. Nao me entenda mal. Nao tenho nada contra a ver- dadeira cura. Todos nés necessitamos dela. Mas nao tem nada aver com 4 realizacio do nosso trabalho ¢ pode ser um exer- cicio colossal em Resisténcia. A Resisténcia adora a “cura”. A Resistencia sabe que, quanto mais energia psiquica gastar- mos remoendo as cansativas e aborrecidas injusticas de nossa vida pessoal, menos tutano teremos para realizar nosso trabalho. BES ISTENCIA E APOIO JA participou de oficinas de trabalho? Além de uma perda de tempo, sio taculdades de Resisténcia. Deveriam peroduzir PhDs em Resisténcia. Que melhor maneira de evitar 0 traba- Iho do que ir a uma oficina de trabalho? Mas 0 que detesto mais ainda é a palavra apoio Buscar o apoio da familia e dos amigos é como reunit as pessoas em volta de sew leito de morte. E bom, may quan- do 9 navio parte, tudo que podem fazer é ficar no porto ace- nando adeus. Qualquer apoio que obtenhamos de pessoas de carne e ‘9880 8 como dinheiro do Monopélio; nao ¢ moeda legal naque- la esfera onde temos que realizar nosso trabaliio. Na verdade, quanto mais energia despendemos buscando 0 apoio de cole- gas € entes queridos, mais fracos nos tornamos ¢ menos capa~ zes de administrar nossa tarefa. Minha amiga Carol teve o seguinte sonho, em uma época em que sua vids parecia estar saindo de controle Ela era passageira em um énibus. Bruce Springsteen era © motorista. De repente, Springsteen freava, entregava as cha- ves a Carol ¢ saltava do énibus. No sonho, Carol entrava em panico. Como poderia dirigir equele enorme Greyhound? A essa altura, todes os passageiros firavam-na, espantad Obviamente, ninguém mais iria se apresentar e assumir a dire- 4ic. Caro] sentou-se ao volante. Para sua surpresa, verificou jue conseguia dirigir o veiculo. g 6 A GUERRA DA ARTE Mais tarde, analisando 0 sonho, conclaix que Bruce Springsteen era o Chefe. O chefe de sua psique. O énibus era sua vida. O chefe estava dizendo a Carol que era hora de assumir a direco. Mais do que isso, o sonho, ao fazé-la sentar- se na cadeira do motorista ¢ deixar que sentisse que podia controlar o veiculo na estrada, estava fornecendo-lhe uma corrida simulada, para incutir-lhe a confianga de que ela real mente podia assumir o comando da propria vida. Um sonho assim constitui um verdadeiro apoio. £ um cheque que vocé pode descontar quando se sentar, sozinho, para fazer seu trabalho. SrGuando seu Eu intérior Ihe proporciona sonho assim, no o comente. Nao dilua seu poder. O sonho é para vocé. E entre vocé € sia Musa. Cale-se ¢ use-o. ‘A nica excecio & que vocé pode compartilhé-lo com out companheiro de luta.se o ato de compartilhar ajadar ou ~gncorajar esse companheiro em seus proprios esforgos. 7 RESISTENCIA E RAGIONALIZAC AO. A racionalizago € 0 braco direito da Resistancia, Seu traba- Iho é impedir que sintamos a vergonha que sentiriamos se realmente admitissemos o quanto somos covardes por nio realizarmos nosso trabalho. MICHAEL Nao destrua a tacionatizagie, Onde estartamos sem ela? Nie cottheco ninguén que consiga atravessar o dia sem duas ou tres “gordas” racionalizasées. Sao mais importantes do qute sexo. SAM Ali, essa ndo! Nada € mais importante do que sexo. MICHAEL Ah, 6? Jé passou uma semana sem uma racionalizagae? Jef Goldblum e Tom Berenger, em. Or ainigos de Alex, de Lawrence Kasdan Mas a racionalizagio tem seu proprio aliado. & aquela parte de nossa psique que realmente acredita no que a racionalizagio nos diz. Uina coisa é mentir para nés mesmos. Outta é acredi- tar na mentira. ” RESISTENCIA E RACIONALIZAGAO PARTE DOIS Resisténcia € medo. Mas a Resisténcia é astuta demais para mostrar-se desta forma sem disfarces. Por qué? Porque se a Resistencia nos deixa ver claramente que nosso proprio medo esta nos impedindo de realizar nosso trabalho, podemos nos sentir envergonhados. Fa vergonha pode nos levar a agir dian- te do medo. A Resisténcia nfo quer que facamos isso. Assim, ela apresenta a Racionalizagio. Racionalizagio é, para a Resistén- cia, aquele assessor que cuida da boa imagem do chefe. E a maneira usada pela Resisténcia para esconder 0 porrete da coercio as suas costas. Ap invés de nos mostrar nosso medo (que pode nes envergonhar ¢ nos impelir a realizar nossa obra), a Resistencia nos apresenta uma série de justificativas plausiveis, racionais, para nao fazermos nosso trabalho. © que é particularmenie insidioso a respeito das racio- nalizagdes que a Resistencia nos apresenta é gue muitas delas sio verdadeiras. Sio legitimas. Nossa mulher pode realmente estar no oitavo més de gravidez; pode estar realmente preci- sando de nossa presenca em casa. Nosso departamento pode realmente estar implantando uma reforma que consumira horas. de nosso tempo. De fato, pode fazer sentido adiar o término de nossa dissertag3o, ao menos até o bebé nascer. O que a Resis- téncia omite, é claro, é que tudo is50 nao significa nada. Tolstoy tinha treze filhos ¢ escreven Guerra ¢ paz. Lance Armstrong teve cancer e j4 venceu 0 Tour de France quatro vezes. A RESISTENCIA PODE SER YENCIDA Se a Resisténcia ndo pudesse ser vencida, nio haveria a Quin- ta Sinfonia, nem Romen ¢ Julieta, nem a ponte Golden Gate. Derrotar a Resisténcia € como dar 4 luz. Parece absoluta- mente impossivel até vocé se lembrar que as mulheres vém fazendo isso com muito sucesso, com ou sem apoio, hi cingiienta milhées de anos, n LIVRO DOIS COMBATENDO A RESISTENCIA Tornando-se um profissional Sherr mast ar Meat ei) Celie eek CM tome dilvaa st cen mercendrio do século V a.C. PROFISSIONAIS E AMADORES Os aspirantes a artistas derrotados pela Resisténcia tem uma caracteristica em comum. Todos pensam como amadores Ainda nao se tornaram profissionai: O instante em que um artista se torna um profissional é 20 memoravel quanto © nascimento de seu primeiro filho. De um golpe, tudo muda. Posso afirmar com toda certeza que a minha vida pode ser dividida em duas partest antes e depois de me tornar um profissional. Pera ser claro: quando digo profissional, nio estou me refecindo a médicos e advogados, aqueles das profissdes clissi- cas. Refiro-me ao Profissional como um ideal. © profissional em contraste com o amador, Considere as diferengas. © amador joga por diversi. O profissional joga para valer. Para 0 amador, o jogo é seu passatempo. Para o profis- sional, é sua vocacio. © amador joga em tempo parcial. © profissional, em tempo integral. © amador é um guerreiro de fim, de semana. O profis- sional, durante os sete dias da semana. Q radical latino da palavra amador significa “amar”. A interpretagdo convencional é que o emador segue sua vocagio por amor, enquanto os profissionais 0 fazem por dinheiro. Nao da maneira como eu vejo, Na minha opinido, o amador nio gos- ta suficientemente do jogo. Se gostasse, nic o praticaria como 7 ~ COMBATENDO A RESISTENCIA uma ocupacao secundaria, um “bico”, diferente de sua ativi- dade “real”. © profissional ama tanto sta vocagio que Ihe dedica sua vida, Compromete-se integralmente. E isso que queto dizer quando falo em tornar-se profis- } sional. i A Resisténcia detesta que nos tornemos profissionais. 7 UM PROFISSIONAL Certa vez. alguém perguntou a Somerset Maugham se ele escrevia segundo um horério ou somente quando the vinha a Escrevo apenas quando a inspiracio me vem”, respondeu.“*Felizmente, ela vem toda manh§ as nove horas em inspiragio. pento.” Isso & ser profissional. Em termos de Resisténcia, Maugham dizia: “Eu des- prezo a Resisténcia; no deixo que ela me desconcentre; eu me sento ¢ fago o meu trabalho” Maugham acreditava em outra verdade mais profunda: que ao realizar o mundano ato fisico de sentar-se € comegar a trabalhar, ele colocava em movimento uma

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