O Sesmeiro do Morro de Sant'Ana
JORGE G. FELIZARDO
do Instituto de Estudos Genealdgicos
do Rio Grande do Sul, do Instituto
Genealégico Brasileiro e do Instituto
Heraldico-Genealégico (5. Paulo).
Nos tempos heroicos do Brasil colonial, quando duas nagdes_poderosas,
Portugal e Espanha, disputavam a posse de terras sul americanas, de linhas
esfumas e por limites mal tragados, foi a Colénia do Sacramento, fundada
por D. Manoel Lobo, em 1680, 0 marco mais meridional do dominio
portugués na América. Quatro anos depois Domingos de Brito Peixoto
fundava com seus filhos e agregados, em terras de Santa Catarina, a vila da
Laguna, que serviria de "posto intermediario”, entre a série. do governo e a
nascente Colénia,
Mas entre as duas povoagées existia um trato de terra desconhecida,
onde imperava 0 indio audaz e combativo que se antepunha aos propésitos
de conquista da coroa portuguesa.
A terra promissora, rica de gado bravio, banhada pelo mar azul
sempre revolto, tinha apenas, muito ao sul, uma barra de dificil
praticagem, a que chamavam a "barra diabélica". Somente a golpes
de aud4cia e heroismo, venceriam os descendentes da “raga de
gigantes", os indmeros obstaculos as entradas conquistadoras.
Por ordem do povoador da Laguna desceu, em 1726, a primeira
“bandeira”, composta de 30 pessoas, sob a chefia de Joao de Magalhaes, o
Velho, com o fim de povoar as terras do sul. Era o inicio
A conquista do Rio “Grande comegava e com ela a radicagao dos
Pioneiros da nossa povoagao, antes mesmo de ser oficialmente instalada a
administragaéo do "Continente d'el rei", que s6 se efetivou com a fundacao
do Presidio, em 1737, pelo brigadeiro José da Silva Pais.
O Rio Grande teve na estancia, 0 berco da sua civilizagao e dentre os
primitivos povoadores, avulta a personalidade augusta de Jerénimo de
Ornelas Menezes e Vasconcelos, madcirense de nascimento, que para aqui
transferiu sua familia, na primeira metade do século XVIII.REVISTA GENEALOGICA BRASILEIRA
Eram os Ornelas gente de prol das ilhas da Madeira e Terceira, tendo
tomado seu apelido da vila de Dornelas, lugar e freguesia do conselho e
comarca de Amares, distrito ¢ arcebispado de Braga, em Portugal. Dessa gente
descendem d. Catarina de Ornelas, que na vila da Praia levantou um mosteiro de
franciscanas, sob a invocag’io de Nossa, Senhora da Luz, onde se recolheu e veio a
falecer, com fama de santidade e também Jo’o de Ornelas, natural da ilha da
Madeira, que socorreu o territério de Cafima, na Africa ocidental portuguesa,
sitiado pelos mouros.
Proveniente da linhagem dos Ornelas era também Joao Fernandes
Vieira, o grande heréi das guerras contra os holandeses, em Pernambuco, no
século XVII. Jodo Fernandes Vieira, cognominado o "Libertador", por seus
grandes servigos prestados a el-rei, foi fidalgo da sua casa ¢ do seu conselho de
guerra, alcaide-mor da vila do Pinhal, comendador da Ordem de Cristo, da de
S. Pedro de Torradas e da de Santa Efigénia de Atila, superintendente das
fortificagdes de Pernambuco e de todas mais do Estado do Brasil para o norte €
primeiro aclamador da liherdade e restanragao de Pernambuco.
Joao Fernandes Vieira foi 0 nome que tomou Francisco de Ornelas,
batizado em 1613 na freguesia da Natividade do Faial, diocese do Funchal, que
jovem ainda, com 11 anos apenas, fugira da casa paterna para tentar fortuna no
Brasil, por ser filho segundo, sem dircito, portanto, aos bens de seus
antepassados, que passariam ao seu irmao mais velho e primogénito, Manoel
d'Ornelas.
Joao Fernandes Vieira (Francisco de Ornelas) era filho legitimo de
Francisco de Ornelas e de sua mulher d. Anténia Mendes da Lombada de Santa
Cruz ; neto paterno de Mendo d’Ornelas (que era filho de Francisco de Gées)
e de sua mulher d, Helena Gomes (que era filha do médico Pedro Anténio) ;
neto materno de Jerénimo Mendes ¢ de d. Barbara Cristévao. Era bisneto de
Antonio Fernandes das Covas ¢ terneto do morgado Pedro Vieira, tendo,
destes dois tiltimos ascendentes, tirado 0 apelido que adotou no Brasil.
Casou Fernandes Vieira em Pernambuco com d. Maria César, filha do
capitio Francisco Berenguer de Andrada, natural da ilha da Madeira,
descendente pelo lado paterno dos Condes de Barcelona e pelo materno, dos
Andrada a que pertenciam os Condes de Lemos. A origem dos Berenguer na
Madeira remonta a 1480, quando alf se domiciliou Pedro Berenguer, de
Lumitana, fidalgo catalio e da casa real portugués e cavalheiro da Ordem de
Cristo, que naquela ilha casou com d. Izabel Rodrigues de Andrada.
Francisco Berenguer de Andrada, sogro de Fernandes Vieira, casou em
Pernambuco com d. Joana de Albuquerque, filha de Belchior da Rosa e de
d. Siméa de Albuquerque; neta materna de Jerdnimo de Albuquerque — o
Torto — (cunhado de Duarte Coelho, primeiro donatario de Pernambuco) e da
india tabajara d. Maria do Espirito Santo Arco Verde.
omO SESMEIRO DO MORRO DE SANT'ANA
Joao Fernandes Vieira, de seu matrimonio, nfo deixou descendéncia
havendo, porém, bastardos com geragao.
A ascendéncia de Jerénimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos é das mais
nobres da Madeira e pelas arvores de costado que por obséquio dos confrades
dr. Wolf Werner Wyszomirski e capitiéo de fragata Luiz Alves de Oliveira
Bélo, me chegaram as maos, podem ser contadas 10 geragdes, que se seguem:
1 — Jodo Fernandes d'Ornelas, que em 1343 j4 era armado cavaleiro, foi casado
com d. Maria Pires Cardoso; houve :
Il — Pedro Eanes d'Ornelas, grande fidalgo da corte de D. Joao I, casou em
1360 com d. Estefania, da casa real portuguesa. houve :
IL — Lopo Esteves d'Ornelas, vassalo dos reis D. Joao I * ¢ D. Duarte I, grande
fidalgo e muito honrado, falecido em 1435, que casou com d. Maria de Atila, da
fam{flia do 1.° Conde de Portalegre ; houve =
1V — Alvaro d'Ornelas, grande vassalo do rei D. Joao I, fidalgo da sua casa e da
do infante D. Henrique, o Navegador, sesmeiro de Canissa, na itha da
Madeira, a quem foi concedido em 1513, por D. Manoel, 0 brasiio de armas
de seus antepassados : em campo azul, uma banda vermelha com trés flores
de Iz, entre duas sereias de sua cor, tendo urna um espelho na mao direita e
na esquerda um pente de ouro ; elmo de prata aberto : timbre, urna das
sereias. Casou d. Alvaro d'Ornelas, em 1416, com d. Elvira Fernandes de
Saavedra, filha de d. Sancho Herrera de Saavedra, castelhano nobilfssimo ;
houve :
V — Alvaro d'Ornelas Saavedra, que foi 0 primeiro que passou a Madeira,
fazendo seu assento na Canissa, onde teve grande casa e terras, desde a
Ponta do Garajou ( ?) até a Ribeira da Canissa, desde o mar a terra
Casou em primeiras népeias com d. Constanga de Mendonga e Vasconcelos,
filha de Mem Rodrigues de Vasconcelos e de d. Catarina Furtado de
Mendonga, tendo institufdo morgado, em 1499, no seu primogénito. Em
segundas nipeias casou com d. Branca Fernandes d'Abreu. filha de Joao
Fernandes, 0 do Arco, por ser fundador da freguesia do Arco da Calheta,
e de sua mulher d. Brites de Abreu: houve do segundo matriménio
VI — Jerénimo d'Ornelas de Abreu, que parece haver sido 0 primeiro que usou
os nomes Jeronimo d’Ornelas ; faleceu na Sé, em 1649. Era fidalgo da
casa real e foi administrador da capela de Sto. Anténio da Sé, institufda por
seu pai. Tirou brasdo d'armas em 1563 e provou que sua avo d. Brites
d’Abreu, era filha de Rui Gomes d'Abreu, alcaide-mér d’Elvas. Casou com
d. Catarina de Barros e Cunha, filha de Diogo de Barros e de d. Francisca
Henriques; houve :
VII — Lufza d'Ornelas, que casou com Antonio Garcia de Gambéa, cavaleiro da Ordem
de Cristo, natural da vila de Almeida, sargento mér e governador de Funchal o qual
acompanhou D. Sebastido 4 Africa, como sargento-mér do coronel Vasco da
Silveira. Ficando cativo foi resgatado e voltou 4 Madeira. Jaz perto do altar de Sta.
Barbara, da igreja de Nossa Senhora do Calhio; houve:
VILL — Jeronimo d'Ornelas e Abreu, sargento-mér da Capitania de Machico, na ilha de
Madeira ; casou em primeiras nupcias com d. Izabel Pereira, filha do sargento-mor
Vasco Rodrigues de Carvalho e de d. Maior Pereira. Em segundas népcias casou
com d. Bernarda de Menezes, filha de Manoel de Castro, do Porto Santo ¢ de d.
Maria de Menezes, casados em Machico ; houve do segundo matrimonio:
aREVISTA GENEALOGICA BRASILEIRA
IX — Izabel Moniz de Menezes, que casou, em 1670, com Manoel Homem da Costa, filho
de Pedro Jorge d'Arvelos e de d. Izabel de Souza; neto paterno de Gaspar
Rodrigues ¢ de d. Catarina d’Arvelos: neto materno de Gaspar Fernandes ¢ de d.
Guiomar Luiz; houve :
x Antonia Moniz, que em 1690 casou com Jodo Pestana de Veloso (ou Jodo Manoel
Pestana de Veloso), cuja ascendéncia é a seguinte:
4) Pedro da Rua, (descendente de Francisco da Rua, cujos ancestrais provieram das
‘Asturias, passando-se para o Algarve e dai, para o Minho), natural da cidade
do Porto, que foi feitor da Especiaria em Flandres e que teve por armas
que Ihe deu Carlos V : um escudo tendo o campo d'ouro, com seis rosas
vermelhas, em duas palas ¢ uma fl6r-de-lis, em azul, no centro do escudo ;
houve :
b) Antonio da Rua, casou por 1560 com d, Maria Lomelino, filha de Antonio Baido
de Castro e de d. Maria Madalena Lomelino; houve :
c) Antonio Ruas Lomelino, casou com 4d. Maria das Neves de Velosa, filha de
Gabriel Pestana de Velosa e de d. Garcia de Castro Calassa; houve
d) Antinin Ruas Lomelina, que cason em primeiras niipeias em 1650, com d
Mariana Moniz, filha de Martim de Castro ¢ de d. Catarina de Gées; neta
paterna de Manoel Ferreira de Mendonca ¢ de a. Francisca de Castro; neta
materna de Braz de Castro c de d. Catarina de Gées. Em segundas nipcias
casou em 1660 com d, Agueda de Mendonga de Vasconcelos, filha de Bonifacio
de Vasconcelos ¢ de d. Maria de Castro de Vasconcelos ; houve do primeiro
matrimonio
€) Joao Pestana de Veloso, que como vimos em X acima, casou com d. Antonia
Moniz; houve
XI — Jeronimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos, natural da vila de Santa Cruz da ilha
da Madeira e que no inicio do século XVIII, passou-se para o Bra:
Ainda niio sabemos o ano exato da passagem de Jerénimo de Ornelas, da Madeira
para o Brasil, mas em 1721 ja andava ele por Guaratingueté, onde, sendo solteiro €
Passageiro, batizou na freguesia local, alguns inocentes, tendo, por essa época, mais ou
menos, nascido Lourengo, seu filho natural, na freguesia de S. José dos Pinhais, bispado
de S. Paulo.
Jerénimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos casou em Guaratingueté,
bispado de S. Paulo, cerca de 1723, com d. Luerécia Leme Barbosa, natural e
batizada na freguesia de Santo Anténio de Pédua da referida vila de Guaratingueté,
filha legitima de Baltazar Corréa Moreira e de d. Fabiana da Costa Rangel.
Coube ao erudito historiador e genealogista paulista, Dr. Carlos da Silveira,
esclarecer a ligagdo genealdgica de d. Lucrécia Leme Barbosa, com as linhagens
paulistas dos Leme, dos Prado e dos Raposo Gées.
Por um processo de dispensa de impedimentos, foi possfvel ao dr. Carlos da
Silveira, identificar a ascendéncia de Baltazar Corréa Moreira ¢ de sua mulher d.
Fabiana da Costa Rangel, infelizmente nao citados nominalmente, na Genealogia
Paulistana de Silva Leme e que resumiremos a seguir.
geO SESMEIRO DO MORRO DE SANT'ANA
Ascendéncia de d. Fabiana da Costa Rangel
I— Martin Lems, de Bruges, condado de Flandres, nos Pafses-Baixos, vivia pelos
anos de 1400 ; foi casado ¢ houve
I— Martim Leme, natural de Bruges, passou para Portugal entre os anos de 1438 &
1481 ; era solteiro mas teve de d. Leonor Rodrigues, natural de Portugal:
I — Anténio Leme, natural de Lisboa, casou com d. Catarina de Barros, filha de Pedro
Gongalves da Clara, falecido cerca de 1506, ¢ de d. Izabel de Barros; neta mat. de Lopes
Vaz Delgado, comendador de Messijana e de d. Catarina, de Barros, sendo por esta,
bismeta mat. de Vasco Delgado de Barros, que passou para a ilha da Madeira, no
principio de seu descobrimento, e de sua mulher d. Francisca de Abreu; houve
WV — Antao Leme, fidalgo da casa real, natural de Funchal na ilha da Madeira, onde casou
eteve
V — Pedro Leme, natural de Funchal ¢ fal. em S. Paulo, em 1600 ; casou em primeiras
nupeias com d. Luiza Fernandes, fal. cerca de 1560 ¢ em segundas nupcia- com d
Gracia Rodrigues de Moura, fal. em S. Vicente a 5 de agosto de 1593 ; houve do
primeiro matrimonio
Vi— Leonor Leme, nat. de Funchal ¢ fal. em $. Paulo « 13 de jaueire de 1633 ; foi cusada
com Braz Teves, nat. da tha da Madeira e houve
VII — Pedro Leme, nasc. em S. Vicente cerca de 1560 ; casou em primeiras nupcias com d
Helena do Prado, filha de Jodo do Prado ¢ de d. Felipa Vicente, primitivos
povoadores de S. Vicente, ¢ em segundas nipcias com d. Maria de Oliveira ; houve do
primeiro matrimonio
VIII — Mateus Leme do Prado, casou em S. Paulo em 1642, com d. Beatriz Barbosa do Rego,
filha de Diogo Barbosa do Rego, natural de Portugal ¢ fal. em Guaratingueté em
1661, e de d. Branca Raposo; neta mat. de Antonio Raposo, nat. de Beja, Portugal, ¢
fal. em S, Paulo em 1601, tendo ai casado, cerca de 1633, com d. Izabel de Gées:
houve =
IX — Lucrecia Leme Barbosa, que casou com Francisco Nunes da Costa, nat. da Capitania
do Espirita Santo : hnnve
X — Fabiana da Costa Rangel, nat. de Guaratingueta, onde casara em 1697 com Baltazar
Corréa Moreira
Ascendéncia de Baltazar Corréa Moreira
I~ Jodo do Prado, natural de Olivenga, provincia de Além-Téjo, Portugal,
veio a falecer no ano de 1597, no arraial do capitio-mér Joo Pereira
de Souza Botafogo ; casou em S. Vicente com d. Felipa de Vicente, fal.
Em S. Paulo em 1627, filha de Pedro Vicente ¢ de d. Maria de Faria; houve
II ~ Jodo do Prado, falecido no sertio em 1616 ; casou com d. Maria da Silva de S.
Paio , filha de Domingos Martins; houve
III ~ Domingos Ribeiro, casou em S. Paulo em 1632, com André Bernardes, filho de
Jodo Bernardes e de d. Helena Gongalves; houve:
IV - Matias Martins foi casado e teve
V - Baltazar Corréa Moreira, nascido em 1676 em Guaratingueté, onde, como vimos
em X acima, casou com d. Fabiana da Costa Rangel. O Dr. Americo Brasiliense
Antunes de Moura, destacado membro do Instituto Heraldico Genealogico,
presume ser Baltazar Corréa Moreira, descendente, talvez pelo lado materno, de d
Guiomar de Alvarenga, segunda mulher de Francisco Alves Corréa. (Silva Leme,
V, 431).
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