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O Juízo Final e o Relativismo

A doutrina do Juízo Final de Deus testifica contra todas as formas de relativismo. É por
isso que o liberalismo secular rejeita esta doutrina cristã. O conservadorismo secular
também. A doutrina do Juízo Final de Deus anuncia que certas ideias são eternamente
verdadeiras e, portanto, que outras ideias são eternamente falsas. Deus irá impor
sanções negativas irreversíveis contra aquelas pessoas que acreditam em
determinadas doutrinas teologicamente incorretas, como a negação das seguintes
verdades: “Quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, porém, desobedece ao Filho
não verá a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus”. (Jo 3.36) “Respondeu-lhe
Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim”.
(Jo 14.6) A doutrina do Juízo Final faz com que os transgressores do pacto fiquem sem
escapatória. Não há saídas. Não haverá acordos judiciais no Dia do Juízo.

O Juízo Final de Deus é o fundamento dos julgamentos temporais dos homens. A


habilidade dos homens de julgarem corretamente somente existe porque os homens
são criados à imagem de Deus. Os homens podem exercer juízo preliminar porque Deus
irá exercer o Juízo Final. Se Deus não irá exercer o Juízo Final então todos os
julgamentos humanos não tem fundamento moral ou estético. Tudo que os homens
fizessem seria sugado pelo relativismo e impessoalidade cósmica.

Há três visões científicas sobre a história cósmica, a parte da doutrina da Criação e


Juízo Final. A primeira é a morte térmica do universo. Esta é a posição cosmológica
mais popular em nossos dias. Defende que o mundo está se acabando. Se estiver,
então seu fim será o triunfo da insignificância e impessoalidade do zero absoluto sobre
toda a vida e sobre todo processo natural que supostamente pode levar a vida no
cosmos. A segunda visão mais popular é a ideia da história cíclica. Tudo se repete. A
versão da ciência cósmica desta doutrina antiga é a eterna expansão e contração do
universo. E a terceira é a visão da criação e destruição contínua. Átomos de hidrogênio
aparecem e desaparecem do nada. (Esta teoria estacionária do universo não é popular
entre cientistas. Foi dificultada pela falha dos satélites orbitais em detectar a radiação
que a teoria exige). Todas as três visões refletem uma impessoalidade cósmica. Não há
Deus para imputar sentido a história ou natureza.

A ideia de imputação é a ideia de julgamento. Imputar é exercer juízo. Os homens


avaliam o sentido, propósito ou papel histórico deste ou daquele evento. Como poderiam
fazer isso com base na própria autoridade? Qual sentido, propósito ou papel tem o
julgamento de qualquer pessoa? Depois que ele morrer, qual sentido, propósito ou papel
sua vida de julgamentos possuirá em retrospectiva? Quais de seus sucessores
temporais determinará isso com autoridade? Como qualquer sucessor poderá impor
seus julgamentos retroativamente? Ele também é mortal. Ele morrerá. O último juiz
humano no processo terá a última palavra. Mas, se ele também, enfim, for engolido pela
insignificante e impessoal força natural da morte, então ninguém terá a palavra final.
Tudo acabará sendo revelado como sem sentido quando não há agente capaz de
exercer juízo retrospectivamente.

O homem moderno prefere declarar uma doutrina oficial de relativismo. Ele declara essa
doutrina com autoridade. “Tudo muda, nada é permanente”. Esta é uma visão revisada
da doutrina de Heráclito de que, na história, tudo flui. “A mudança é a essência da
realidade”. Mas isso significa um mundo sem significância final, um mundo sem
julgamentos fixos. Isso significa o triunfo do relativismo. O homem pagão moderno imita
o pagão da antiguidade e prefere o relativismo em vez do Juízo Final de Deus. O
relativismo é o transgressor do pacto dizendo para si mesmo em seu próprio “juízo final”:
“Inocente!”.

A apresentação do Evangelho – as boas notícias de Jesus Cristo – necessariamente


envolve a doutrina do Juízo Final por Jesus Cristo: a notícia terrível. As sanções
positivas da salvação de Deus sobre alguns somente faz sentido no contexto das
sanções negativas da condenação de Deus sobre outras pessoas. Portanto, os cristãos
devem exercer um juízo preliminar contra aqueles que rejeitam a doutrina da expiação
substituta de Cristo. Eles dizem aos ouvintes: “Nenhuma decisão é, na verdade, uma
decisão: uma decisão contrária”. Estão certos. Julgamento é um conceito
inevitável. Ao ignorar Jesus Cristo, os homens estão exercendo juízo contra
Ele. Nenhuma decisão é também uma decisão. O pecado original começa com uma
decisão contra Cristo. Cristãos pressupõe isso quando anunciam o direito legal de Cristo
sobre seus ouvintes.
Ao mesmo tempo, cristãos sentem-se ressentidos com os julgamentos feitos contra eles
por outros cristãos. Acusam seus críticos cristãos de serem muito críticos, como
fariseus. Dizem que estão com Jesus contra o farisaísmo. Eles não se fazem a seguinte
pergunta decisiva: “Sob que base legal Jesus acusou os fariseus se não foi sua visão
correta sobre Deus, o homem, a Lei, sanções e o tempo?” Julgamento é um conceito
inevitável.

A questão divisória aqui não é a existência de julgamento. Julgamento é inevitável. Não


existe neutralidade na vida. A questão é se o julgamento é correto ou não: a legitimidade
da autoridade do juiz para exercer juízo, a autoridade de seus padrões, a precisão de
sua aplicação destes padrões sobre eventos e ideias específicas. Cristãos ingênuos
preferem citar Mateus 7.1: “Não julgueis, para que não sejais julgados”. Eles não
compreendem que Jesus deu este aviso no Sermão da Montanha, no qual ele emitiu
sanções verbais negativas e positivas. Eles não compreendem que Jesus estava
convocando seus discípulos para exercer julgamentos de forma bíblica como afirmação
do direito de ser julgado de forma bíblica:

“Não julgueis, para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes
sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós. E
por que reparas tu no argueiro que está no olho do teu irmão, e não vês a trave que está
no teu olho? Ou como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar o argueiro do teu olho, estando
uma trave no teu? Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então cuidarás em tirar
o argueiro do olho do teu irmão”. (Mateus 7.1-5)

O que Ele queria não era afirmar a necessidade moral de não julgar lascas nos olhos
dos outros. O que ele queria mostrar é que críticos precisam julgar com precisão a
condição visual dos próprios olhos como um passo preliminar para julgar a condição
visual dos outros. Mas muitos cristãos são cegos quanto a isso. Eles livremente julgam
o status judicial de não cristãos, mas depois relegam questões morais e doutrinárias a
um status periférico na Igreja. Este é um posicionamento esquizofrênico, mas é popular.

Todo cristão quer ficar na sua zona de conforto moral, teológico e estético ao mesmo
tempo em que exerce juízo contra os antinomistas a sua esquerda e os legalistas a sua
direita, cuja autoridade ele rejeita. Mas a seguinte pergunta epistemológica é inevitável:
Qual é o padrão? Católicos Romanos expulsaram a Igreja Ortodoxa em 1054. O Leste
respondeu da mesma maneira. Os Protestantes deixaram o Catolicismo Romano no
século dezesseis. Mais anátemas mutuas por toda parte.

A epístola lida com a importância de exercer juízo: dentro da Igreja e contra o mundo.
Paulo pressionou a Igreja a se posicionar contra uma pessoa que havia cometido incesto
(capítulo 5). Ele também mandou que eles evitassem ir a tribunais seculares para
resolver disputas com outros cristãos (capítulo 6). Em nenhum dos dois casos, ele
manda que evitassem julgamentos.

A epístola é baseada na necessidade de exercer juízo na vida, começando com o juízo


de si mesmo. Por que isso é necessário? Por causa do Juízo Final de Deus. “A obra de
cada um se manifestará; na verdade o dia a declarará, porque pelo fogo será
descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de cada um. Se a obra que alguém edificou
nessa parte permanecer, esse receberá galardão. Se a obra de alguém se queimar,
sofrerá detrimento; mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo”. (I Co 3.13-15)

Ray Sutton costumava dizer que a melhor maneira para um pastor novo dividir a
congregação é começar seu ministério na Igreja com uma série de sermões sobre I
Coríntios. Não tenho dúvidas de que a constatação de Sutton é correta. Ele recomenda
começar com um dos Evangelhos. Isso é sábio se o objetivo do pastor for evitar divisões
na congregação. Mas não estou persuadido de que este é sempre o objetivo correto.
Algumas congregações precisam se dividir rápido pelo poder divisor da mensagem
bíblica de julgamento. A unidade que Paulo proclama no capítulo 12 só poderia existir
pela imposição de excomunhão no capítulo 5.

Sutton também recomenda que a Ceia seja semanal, mas ele diz que isso também
causa divisão: o meio eclesiástico de impor as sanções de Deus. As sanções que Deus
trás por meio do sacramento da Ceia do Senhor não podem ser evitadas. Paulo, no
capítulo 11, avisa sobre o perigo de tomar a Ceia em pecado: Sede meus imitadores,
como também eu de Cristo. “Examine-se, pois, o homem a si mesmo, e assim coma
deste pão e beba deste cálice. Porque o que come e bebe indignamente, come e bebe
para sua própria condenação, não discernindo o corpo do Senhor. Por causa disto há
entre vós muitos fracos e doentes, e muitos que dormem. Porque, se nós nos
julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados”. (I Co 11.1-31) As sanções de Deus
são verdadeiras. É importante julgar a si mesmo como meio de evita-las.

A Igreja é limpa do pecado e pecadores por meio de pregações que falam da


inevitabilidade do Juízo, da Ceia que trás o Juízo e da disciplina formal previsível. Estas
são as três marcas de uma igreja fiel. Sem o juízo piedoso não há uma igreja. Há
somente um encontro semanal.

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