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Desenvolvimento de Um Sistema PDF
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RESUMO
O presente artigo apresenta um sistema de apoio à análise de outorga de lançamento de efluentes para a variável
Demanda Bioquímica de Oxigênio. Esse sistema partiu da premissa de quatro problemas nacionais: crescente poluição dos
corpos hídricos, falta de dados para conhecimento do comportamento do corpo receptor, equipe técnica reduzida nos órgãos
outorgantes e falta de uma metodologia para análise de outorga de lançamento de efluentes.
O sistema utilizou as equações do Modelo de Streeter-Phelps para fazer uma análise na Bacia do Alto Iguaçu entre este mode-
lo, utilizando coeficientes conservadores para proteção dos corpos aquáticos e o Modelo QUAL2E calibrado para esta bacia.
O sistema testou quatro coeficientes e ainda fez uma análise de erros em dados hidráulicos (velocidade média).
Assim, pode-se dizer que este sistema pode auxiliar inicialmente, em ocasiões e locais com deficiência de dados para calibração
de modelos, nos processos de outorga de lançamento de efluentes até que haja condições suficientes (dados, equipe técnica,
metodologia consolidada) para se utilizar novos modelos que representem melhor a qualidade das águas.
Palavras-chave: outorga de lançamento de efluentes, Demanda Bioquímica de Oxigênio, bacia do Alto Iguaçu.
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Desenvolvimento de um Sistema de Apoio à Análise de Outorga de lançamento de Efluentes – Estudo de Caso: Bacia do Alto Iguaçu
Saneamento Ambiental (SUDERHSA) e pelo Insti- De acordo com o sistema, se a vazão apro-
tuto Ambiental do Paraná (IAP). Existem ainda 35 priada para diluição (Qa,l) for maior que a vazão
estações exclusivas de monitoramento da qualidade disponível para outorga (Qdisp_out), a outorga não
da água, de responsabilidade do IAP e uma estação poderia ser concedida e, portanto, sua carga deveria
de responsabilidade da Empresa Brasileira de Pes- ser reduzida ou o local de lançamento deslocado
quisa Agropecuária (EMBRAPA). para outro com disponibilidade. Com o sistema,
As estações fluviométricas da bacia do Alto ainda é possível localizar pontos onde há vazão dis-
Iguaçu estão bem distribuídas sobre a área da bacia, ponível para outorga referente à carga solicitada ou
representando bem as características hidrológicas da calcular a redução de carga necessária para o lan-
região, sendo que nos principais afluentes existe çamento no mesmo local. Por outro lado, se o corpo
pelo menos uma estação hidroambiental. hídrico possui vazão disponível para outorga
Apesar de existir uma grande quantidade de (Qa,l<Qdisp_out) ao longo do trecho (do ponto de
informações, ainda há muita inconsistência entre lançamento para jusante deste) para o qual a outor-
essas. Quase todas as séries históricas de vazão dos ga foi solicitada, passa-se para a etapa 2, na qual é
postos fluviométricos possuem meses e até anos feita a verificação quanto à variável Oxigênio Dissol-
seguidos com falhas de observação. vido (OD). Uma vez atendida a exigência de con-
centração mínima de oxigênio dissolvido, a outorga
Estudo realizado com modelo de qualidade de água seria favorável. Caso contrário, a carga do efluente
deveria ser reduzida até atender o limite exigido ou
Fernandes (2005) utilizou o modelo dever-se-ia mudar o local de lançamento.
QUAL2E na Bacia do Alto Iguaçu, com dados atua-
lizados da Matriz de Fontes de Poluição gerada no Vazão apropriada para diluição com relação à DBO5
Plano de Despoluição Hídrica da Bacia do Alto I-
guaçu (SUDERHSA, 2000). Este estudo foi dado A vazão apropriada para diluição com rela-
continuidade através do projeto “Bacias críticas: ção à DBO5 originou-se da equação de Streeter-
bases técnicas para a definição de metas progressivas Phelps, considerando a autodepuração do corpo
para seu enquadramento e a integração com os receptor com decaimento de primeira ordem da
demais instrumentos de gestão”, também conhecido matéria orgânica, processo de sedimentação e
como “Projeto Enquadramento”, que teve início no transporte advectivo para escoamento unidimensio-
ano de 2006. nal e permanente (dC/dt = 0) (Chapra, 1997).
Knapik et al. (2006) calibraram o modelo Partindo da solução analítica para a concen-
QUAL2E nesta bacia através de tentativas de ajuste tração da DBO5 ao longo do corpo receptor [Equa-
das curvas simuladas de vazão e concentração de ção (1)], obtém-se a vazão apropriada para diluição
DBO5 num intervalo de 25 a 75% de permanência (Qa,l):
dos respectivos dados coletados em campo, com
valor ótimo próximo à mediana. L = L 0 .e −( K1 + K 3 ).t (1)
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Qr: Vazão do rio (m3/s) dobrar quando chegar nesse trecho que a classe
Cr: Concentração do parâmetro no rio (mg/L) passa a ser 2. Assim, o usuário deverá atender o limi-
Qe: Vazão do efluente (m3/s) te do corpo hídrico onde está sendo lançado o eflu-
Ce: Concentração do parâmetro no efluente ente, bem como o limite do trecho a jusante onde
(mg/L) houve mudança de classe.
Com a inserção desse fator, a Equação (4)
Admitindo que Cr é zero (conforme SUDE- passa a ser:
RHSA, 2002) e substituindo o valor de L0 na Equa-
ção (1), obtém-se: Q C .e −( K 1 + K 3 ).t
Q a,l = e e − Q e .Fc (6)
C lim, i
Q eCe −( K 1 + K 3 ).t
L = e
(3)
Q r + Qe
Os coeficientes (K1 e K3) utilizados serão
aqueles descritos no tópico Dados do sistema.
Admitindo que L é a concentração limite do A adoção da concentração nula de DBO5
corpo de água (Clim,i = L), conforme sua classe de no corpo hídrico, em lugar da concentração atual, é
enquadramento (ver Tabela 1) e que a vazão do rio para avaliar o comprometimento individualizado de
(Qr) é a vazão apropriada para diluição do efluente cada usuário na qualidade da água, sem interferên-
(Qr = Qa,l), chega-se na Equação (4): cia de outros usuários. A vantagem é que, quando
implementado o sistema de cobrança, o usuário só
Q C .e −( K 1 + K 3 ).t estará pagando pela sua carga poluidora lançada no
Q a,l = e e − Qe (4)
C lim, i corpo de água. A desvantagem é que, sem conside-
rar a concentração atual do corpo receptor, a con-
centração real poderá ficar acima do permitido.
Quando t = 0, o valor de Qa,l é igual a vazão Análise do OD
adotada pelo Manual de outorga do estado do Para-
ná. A análise de OD é realizada para verificar os
Para se considerar as mudanças dos limites níveis de oxigênio dissolvido dentro do corpo recep-
de classe conforme o ponto que se deseja analisar, tor, contemplando os lançamentos já outorgados.
adotou-se um fator de proporcionalidade (Fc), o Para a simulação do OD foi considerada perda pela
mesmo adotado por MMA (2000), dado pela Equa- decomposição da matéria orgânica (K1) e ganho
ção: pela reaeração atmosférica (K2). Conforme Chapra
(1997), foi utilizada a solução analítica de Streeter-
C lim,i Phelps [Equação (7)].
Fc = (5)
C lim,l
K1.L 0U − K1.t − K 2 .t − K 2 .t (7)
ODt = ODsat − .(e −e ) + (OD sat - C 0 ).e
K 2 − K1
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Nesta etapa, faz-se uma análise com a situa- (ver Tabela 1), exceto em casos em que o órgão
ção conservadora para o caso do OD, determinando responsável pelo gerenciamento dos recursos hídri-
a concentração mínima de OD para uma situação cos ou os comitês de bacia tenham estabelecido
crítica, com o objetivo de verificar se o curso de outros limites. Essas concentrações limites servem
água apresentará déficit de oxigênio. É assumida, como base para o cálculo da vazão apropriada para
portanto, uma alta taxa de decomposição no ecossis- diluição (Qa,l) e para verificar se os níveis de OD
tema, situação que necessitaria de maior reaeracão estão adequados em cada nó do corpo de água.
do corpo receptor, e caso o OD fique menor que a
exigência da classe de enquadramento, então o
sistema acusa a necessidade de redução de carga ou Tabela 1 — Concentrações limites de DBO5 e OD
deslocamento do ponto de lançamento.
Classe dos corpos Limite máximo de Limite mínimo
de água DBO5 (mg/L) de OD (mg/L)
Dados do sistema 2 5 5
3 10 4
4 10 2
Como se trata de um modelo unidimensio-
Fonte: CONAMA (2005)
nal, o corpo receptor deve ser representado na sua
longitudinal, divididos em nós. Os dados necessários
foram divididos em três tipos: dados do corpo recep- ¾ Altitude do local em relação ao nível do mar
tor, dados calculados ou estimados através de equa- (m)
ções empíricas e dados do efluente. Influencia na pressão atmosférica do local,
que por sua vez é utilizada para o cálculo da concen-
a) Dados do corpo receptor (hidrogeométricos, físicos e quí- tração de saturação de OD.
micos) em cada nó:
b) Dados calculados ou estimados através de equações
¾ Vazão de referência (m3/s) empíricas de literatura.
A vazão de referência é um dos dados mais
importantes e deve ser calculada com bastante rigor, ¾ Concentração de Saturação do Oxigênio
pois os critérios de outorga e a maior parte dos pa- Dissolvido (mg/L)
râmetros são baseados nela. Quanto maior for a A influência da altitude na concentração de
quantidade de estações e de suas séries históricas, saturação de oxigênio dissolvido pode ser inserida
melhor será o resultado das vazões. Neste estudo foi através da relação da Equação (8) (Qasim, 1985
utilizada a vazão Q95, vazão de referência no Estado apud Von Sperling, 1996):
do Paraná.
¾ Velocidade média (m/s)
Cs A
A velocidade média serve para os cálculos fA = = 1 − (8)
do coeficiente de reaeração (K2) e do tempo de Cs' 950
percurso.
¾ Profundidade média do corpo receptor (m)
A profundidade média é utilizada para o Onde,
cálculo dos coeficientes de reaeração (K2) e de se- fA: fator de correção da concentração de saturação
dimentação (K3). de OD pela altitude (-)
¾ Temperatura da água (°C) Cs’: Concentração de oxigênio de equilíbrio, a 1
É utilizada para correção dos coeficientes atmosfera de pressão (mg/L)
do modelo e para o cálculo da concentração de A: altitude (m)
saturação de OD.
¾ Concentrações limites dos parâmetros De acordo com Brown e Barnwell (1987), a
(mg/L) concentração de saturação de OD é calculada pela
As concentrações limites (Clim) dos parâ- Equação 9:
metros são baseadas na classe em que o corpo recep-
tor está enquadrado pela Resolução do CONAMA 1,5.105 6,6.107 1,2.1010 8,6.1011
ln Cs' = -139,3+ -
+
-
(9)
Nº 357/05. Esta Resolução dita os limites de cada 2 3 4
T T T T
parâmetro, incluso DBO5 e OD, no corpo de água
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tação.
60 Os resultados da primeira análise (análise 1)
40
encontram-se na Figura 4, que considera parâmetros
conservadores, ou seja, quando K1 e Vs possuem os
20 valores mais baixos (K1= 0,09 dia-1 e Vs = 0,04
0 m/dia). Essa velocidade de sedimentação representa
0 10 20 30 40 50 60 70 partículas com tamanho de 1 µm e densidade de 1,8
Rio Iguaçu (km) g/cm3, que gerou um K3 médio ao longo do trecho
de 0,05 dia-1.
DBO MS DBO QUAL2E
73 49
62 37
52 24
42 12
31 0
21 0 12 24 37 49 61 73 85 98 110 122
10 DBO QUAL2E (mg/l)
0
0 10 21 31 42 52 62 73 83 94 104
Figura 5 - Reta com inclinação de 45º contrapondo os
DBO QUAL2E (mg/l)
resultados dos dois modelos (análise 1)
120 80
100
60
DBO5 (mg/l)
80 40
60
20
40
0
20 0 10 20 30 40 50 60 70
0 Rio Iguaçu (km)
0 10 20 30 40 50 60 70 DBO MS DBO QUAL2E
Rio Iguaçu (km)
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Nas Figura 4 e 5, nota-se que, com os coefi- de RMS diminuiu para 34,7 mg/L. Portanto, os
cientes mais conservadores possíveis, o Modelo do erros ainda são muito significativos.
Sistema está superestimando demasiadamente a A análise 3, com partículas de 5 µm e mes-
concentração de DBO5. O erro RMS foi de 41,9 ma densidade, a velocidade de sedimentação de 0,94
mg/L. Observando a Figura 4, nota-se que a taxa de m/dia, resultou num coeficiente de sedimentação
redução da concentração ao longo do rio Iguaçu são médio de 1,15 dia-1. Os resultados obtidos conside-
diferentes para os dois resultados, por exemplo, no rando esses coeficientes são mostrados na Figura 8 e
trecho entre o km 15 e 24, a declividade de queda Figura 9.
da concentração pelo QUAL2E é maior que pelo Como pode ser visualizado na Figura 8, as
MS. curvas de DBO5 de ambos os modelos se aproxima-
ram bastante, com pequena elevação dos resultados
do MS com relação ao modelo QUAL2E calibrado.
118 Este resultado era esperado, pois quando se adotou
106 a velocidade de sedimentação 0,94 m/dia, os coefi-
94
cientes conservadores e os calibrados (K1 = 0,1 dia-1
83
DBO MS (mg/l)
0 12 24 35 47 59 71 83 94 106 118
63
DBO QUAL2E (mg/l) 53
42
32
Figura 7 - Reta com inclinação de 45º contrapondo os 21
resultados dos dois modelos (análise 2) 11
0
0 11 21 32 42 53 63 74 84 95 105
120
DBO QUAL2E (mg/l)
100
80
DBO 5 (mg/l)
20 120
0 100
0 10 20 30 40 50 60 70
80
Rio Iguaçu (km)
DBO 5 (mg/l)
60
DBO MS DBO QUAL2E
40
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A última análise (análise 4) adotou a veloci- Análise dos erros na velocidade média
dade de sedimentação de 3,8 m/dia, que corres-
ponde à velocidade de partículas com 10 µm de Durante a pesquisa, puderam-se observar as
densidade 1,8 g/cm3, gerando um K3 médio de diferenças geradas nas concentrações dos parâme-
aproximadamente 4,65 dia-1. Os resultados dessa tros devido às divergências nos dados hidráulicos,
análise são exibidos na Figura 10 e Figura 11. principalmente em relação à velocidade média. Isto
Consoante Figura 10 e Figura 11, com o ocorre, pois as equações de DBO e OD são funções
emprego da velocidade de sedimentação de exponenciais que possuem como expoentes a variá-
3,8 m/dia, o MS subestimou em todos os pontos as vel tempo. Como o tempo de percurso é a distância
concentrações de DBO. A adoção deste coeficiente do percurso dividida pela velocidade média que a
para esta área de estudo seria prejudicial ao corpo substância lançada percorre [conforme Equação
de água, pois estaria otimizando sua capacidade de (10)], esta variável por sua vez tem total influência
recuperação e conseqüentemente lesando sua qua- nas concentrações dos parâmetros ao longo do tre-
lidade. O RMS para esta situação foi de 29,7 mg/L. cho.
102 120
92
100
82
71 DBO5 (mg/l) 80
DBO MS (mg/l)
61
60
51
41 40
31
20
20
10 0
0 0 10 20 30 40 50 60 70
Rio Iguaçu (km)
0 10 20 31 41 51 61 71 82 92 102
DBO QUAL2E (mg/l) DBO MS DBO QUAL2E
100
Os resultados das análises 5 e 6 para 15% e
80
DBO5 (mg/l)
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