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E ODER JUDICLARIO ‘SECAO JUDICIARIA DO DISTRITO FEDERAL DECISAO N. 413/2011-B ACAO CIVIL PUBLICA CLASSE: 7160 PROCESSO N°. 2009.34.00.038240-0 AUTOR: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL REUS: FUNAIE OUTROS DECISAO © Ministério Pablico Federal, por meio da petigo de fls. 384/387, de 10/11/2011, requereu a este Jutzo a reconsiderago da decisdo de fis. 330/337, tendo em vista a ocorréncia de fatos novos que tém 0 condiio de alterar 0 andamento da causa. na Fulni-O Noticia que, através de e-mail repassado pela Comunidade In Tapuya, recebeu o laudo antropoldgico elaborado pelo Grupo Multidisciplinar, institufdo pela Portaria FUNAT/PREST n°. 73, de 26/01/2010, 0 qual consta as fis. 390/414, Aiém do referido estudo, a Procuradoria da Republica agrega aos autos uma listagem com os trabalhos anteriormente realizados pelos antropélogos responséveis, de modo a atestar a experiéncia deles; um parecer do analista pericial antropélogo da 6° Camara de Coordenacao ¢ Revisio do MPF, Sr. Marco Paulo Schetinno, dando conta da aparente correi¢ao do laudo; e, por fim, alguns termos de ocorréncia policial relativas a invastio edificagio no terreno objeto do presente litigio. W PODER UDICLARIO ese Fh: — | SHCAO JUDICIAREA DO FEDERAL es A peticGo ministerial encerra-se com pedidos no sentido de que se determine a FUNAL a instituicao imediata de grupo técnico de identificagio e delimitagao da terra indigena Bananal e a adogdo de medidas que impegam a remogiio da Comunidade. Requer- se ainda que a autarquia apresente formalmente o laudo que Ministério Paiblico trouxe em juizo. Contra a-TERRACAP, solicita:se 0 deferimento de medida linina® que vede “a realizagdo de qualquer obra tendente a alterar, reduzir, impactar, transferir ou restringir 0 modo de ocupacio ¢ a area reivindicada pela Comunidade Indigena do Bananal (aproximadamente 50 hectares), bem como de nio alienar os lotes que interferem com a frea pretendida, ¢ nfo promover quaisquer atos que possam intimidar ou ameagar os membros da Comunidade Indigena, até solugio final da questio”. A FUNAL, as fils. 373/376, pede a devolucio do prazo para contestar, considerando que o proceso estivera suspenso em virtude de excegao de impedimento. Nos autos da agdo possess6ria de n°. 41819-82.2010.4.01.3400, a construtora Emplavi demandou a suspensio daquele feito pelo prazo de 30 (trinta) dias. E orelatorio. DECIDO. i. Do estado dos processos relativos ao conflito demarcatério Esta ago civil piblica é origindria da 21* Vara Federal, tendo sido deferida liminer pelo Juiz Federal Hamilton $4 Dantas, & época do seu ajuizamento, nos seguintes termos: “considerando-se que, na hipétese dos autos, 0 nfo deferimento de medida acautelat6ria poderd acarretar 4 Comunidade Indigena prejuizo de dificil mensuragdo e reparagio, afigura-se-me razodvel que se d& protecio provisoria ao direito coletivo defendido nesta demanda, até regular apreciago de todos os pedidos antecipatérios formillados na inicial, 0 que seré feito apés a manifestagZo dos representantes judiciais da FUNAIe do IBRAM”. \ PODER JUDICIARIO SEQAO JUDICIARIA DO DISTRITO FEDERAL A FUNAI aduziu, na sua manifestago preliminar, que nfo se opunha & permanéncia dos indios na 4rea, mas seria contréria A instituigfo naquele momento do grupo téenico para estudos de identificagdo ¢ delimitagio. O érgo opés que existiriam mais de 400 terras aguardando os seus estudos, inclusive com pleitos mais antigos que o da s desnecessiria a constitigzo de win grupo séit ~€omunidade*do Bananal, mostrando- minimos indicios de tradicionalidade da ocupagio. A fl. 107, a autarquia careou uma medigio preliminar realizada pelo topégrafo Mossuel Nunes Moreira Junior, a indicar que a Area percorrida teria aproximadamente 35 hectares. Por sua vez, 0 IBRAM asseverou que apenas uma aco anulatoria poderia ter promovido a invalidagio do termo de ajustamento de conduta que permitira o licenciamento ambiental e a licitago da 4rea do Setor Habitacional Noroeste, pugnou, nessa linha, pela possibilidade de prosseguimento das obras. Ap6s ter sido rejeitada a excego de impedimento que sobrestava o feito, a Juiza Federal Candice Lavocat Galvio Jobim indeferiu o pedido de tutela antecipada, valendo-se do estudo da FUNAI que, no panorama entio existente, entendia nao haver nenhuma evidéncia de terra indigena tradicionalmente ocupada. © Ministério Publico interpds agravo contra a aludida decisio, 20 qual nao foi-dado ptovimento. Em outros processos relativos a terra controvertida, deferi medida liminar acautelando a permanéncia da Comunidade no local em que ela se encontra, Delimitei a extensiio da cautela em 4,1815 hectares, por ser esta pretensdo solicitada na ago declaratéria proposta pelos prdprios fndios. Nunca antes este proceso coletivo foi submetido & minha anilise. PODER TUDICIARIO FUDICIAREA DO. FEDERAL O objetivo deste Juizo, ao deferix a medida liminar na ago cautelar de n°, 2009.34,00.038807-5, foi justamente o de aguardar o estudo do Grupo Multidisciplinar da Portaria FUNAI/PRESI n°. 73/2010, de modo a que houvesse maior clareza quanto 20 caréter tradicionalmente indigena da érea ocupada, No meu tiltimo pronunciamento, 20 -indeferir uma petigao inicial de ago possess6ria proposta’ pela Comuriidade (proceso n°, 53469-92.2011.4.01.3400), deixei assente a possibilidade de reapreciagaio dos pedidos desta ago civil publica, caso houvesse suscitagio de fatos novos que indicassem tal necessidade. Reproduzo trecho da referida sentenga: “Nao entendo descabida uma reavaliagdo dos pleitos da ago civil pablica e declaratério, com esteio nas novas consideragdes do Grupo Multidisciplinar. Entretanto, a sede para estes fatos novos ndo é a da ao possesséria, porque aqui se exige posse, contato, presenga visivel em rea definida”. Parece-me que, A vista do laudo antropolégico que conclui_ pela tradicionalidade da ocupagio, é chegada a hora de novo exame dos termos do indeferimento da tutela antecipada. Reputo, enfim, que 0 estudo juntado aos autos pelo adogio fato novo relevante que a Ministério Pabli medidas no presente processo. 2, Do laudo antropoldgico produzido pelo Grupo Multidisciplia O pedido langado nesta ago civil piblica no é no sentido de que o Poder Judicirio proceda diretamente A demarcagiio de terra indigena, mas sim de que a FUNAIL, de acordo com os termos do Decreto n°, 1.775/96, institua o grupo técnico de identificagao ¢ delimitacao da terra indigena Bananal. Também a tutela antecipada requerida reside na ctiagdo do mencionado grupo, 9 PODER MUDICIARIO mo SSe 1 CU BL: S56 scnonseano neat Se ewe 72 | O Decreto n°, 1.775/96 traga a linha mestra do processo de demarcagao, prescrevendo que, uma vez concluido o relatério do grupo técnico, define-se publicamente a rea eo local da terra a ser demarcada. Veja-se: “Art, 1° As terras indigenas, ‘de que tratam 0 art. 17, I, da Lei n° 6001, de 19 de dezembro de 1973, € 0 art. 231 da Constitui demarcadas por iniciativa € sob a orientagio do érgio federal de assisténcia jo, sero administrativamente 0 indio, de acordo com o disposto neste Decreto. Art. 2° A demarcagdo das terras tradicionalmente ocupadas pelos fndios seré fundamentada em trabalhos desenvolvidos por antropélogo de qualificagao reconhecida, que elaboraré, em prazo fixado na portaria de nomeago baixada pelo titular do érgio federal de assisténcia ao indio, estudo antropolégico de identificagao. § 1° O Grgio federal de assisténcia a0 indio designaré grupo técnico especializado, composto preferencialmente por servidores do préprio quadro funcional, coordenado por antropélogo, com a finalidade de realizar estudos complementares de natureza etno-histérica, sociol6gica, _juridica, cartografica, ambiental e o levantamento fundidrio necessérios & delimitagio. [-] § 6° Conclufdos os trabalhos de identificaciio ¢ delimitacio, 0 grupo técnico_apresentard_relatério_circunstanciado_ao_érgio_federal_de assisténcia ao indio, caracterizando a terra indigena a ser demarcada. isténcia ao indio, § 7° Aprovado o relatério pelo titular do érgio federal de a: este fara publicar, no prazo de quinze dias contados da data que 0 receber, resumo do mesmo no Diério Oficial da Unido e no Didtio Oficial da unidade federada onde se localizar a area sob demarcagio, acompanhado de PODER JUDICIARIO SECAO JUDICIARIA DO DISTRITO FEDERAL 2° VE memorial descritivo e mapa da drea, devendo a publicagao ser afixada na sede da Prefeitura Municipal da situagdo do imével”. No caso dos autos, hé a c6pia de laudo preliminar ¢ parcial, no concluso, no sentido da tradicionalidade da ocupago, © estudo antropolégico fornece as suas conclusdes do seguinte modo: discordancia n°. 1.775/96. “Primeiro, que 9 Santudrio dos Pajés é, de fato, terra _de_ocupa: tradicional_indigena, conforme_determina_o_art. 231 _da Carta Constitucional_de 1988. Logo, a_reivindicacio apresentada pela Comunidade é pertinente_do_ponto de vista dos direitos dos_povos originérios no Brasil. Significa dizer, com efeito, que procede a requisi¢io do Ministério Péblico Federal/DF, constante no Oficio n°. 41/2009 — LLO/PRDE/MPF, Por outro lado, pareceres contrérios & reivindicagao dos indigenas, produzidos por agentes do Estado a servigo da FUNAI sugerem a existéncia de um habitatus no interior do érgio indigenista oficial. Tal habitatus ali parece existir desde longa data, conforme pode ser atestado pela maneira sistemética com que a FUNAI negou o reconhecimento da jica a grupos que passaram por processos de etnogénese, a J idade € exemplo dos Krahé-Kanela (Ver Mauro 2011). [... Quinto, se faz imperative que a FUNAI constitua um GT (Gsupo de Trabalho) sob a Coordenacio de um antropélogo_para_proceder_aos estudos necessirios 4 identificacao, delimitacio e demarcacio da terra indfgena, em conformidade com o que estabelece o Decreto n°. 1775, de 08/01/1996, ¢ a Portaria MJ n°. 14, de 09/01/1996”. [Grifei]. A peculiaridade deste processo reside no fato de que ha omisséo ou da FUNAI quanto & instituigao do processo de demarcagio segundo 0 Decreto \ SECAO JUDICIARIA DO DISTRITO FEDERAL Além disto, a Portaria FUNAI /PRESI n°, 73/2010 designou os profissis a seguir indicados para o Grupo Multidisciplinar, mas somente dois deles assinaram o laudo ora acostado pelo Ministério Pablico: i) Jorge Eremites de Oliveira, Antropélogo Coordenador; ii) Levi Marques Pereira, Antropélogo Colaborador; iii) Giovana Acécia ‘Tempeste ~- Antropéloga CA/CGID/FUNAVBSB: iv) Migiiél Vicerite Foti, Antropdlogo Colaborador CGID/FUNAV/BSB; v) Suzy Evelyn de Souza e Silva, Assessora Técnica CGID/FUNAVBSB; vi) Mossuel Nunes Moreira Junior, Assistente Técnico CGG/FUNALBSB. Apenas os antropélogos Jorge Eremites de Oliveira e Levi Marques Pereira assinaram 0 estudo submetido a este Juizo como fato novo. Noto, por outro lado, que grassa controvérsia sobre © tamanho da drea que serd objeto de demarcacdo, em se confirmando oficialmente pela FUNAI este laudo preliminar acerca da tradicionalidade da ocupagio, porquanto existem agdes da Comunidade requerendo a demarcagao de 4,1815; a Terracap ofereceu 12 hectares de outro terreno como opeio de acordo; a FUNAT mediu preliminarmente a érea em 35 hectares; e, por fim, 0 Ministério Publico na pega exordial acena com.50 hectares. A extensiio da Vige, com isso, um estado de inseguranca juridica qua rea que talvez. venha a ser foco de uma demareaco. A situagio se agrava pelo fato de que as projegies da Terracap foram licitadas, havendo inicio de obra de edificagao no local.-Assim, antes que se instaure 0 grupo téchico de identificagiio e delimitagio ~ caso ele venha a ser instaurado, é necessfrio que a FUNAI € seus especialistas se manifestem com clareza acerca das razdes pelas quais 0 estudo nio foi assinado por todos os profissionais, e, sendo mesmo tradicional a area, sobre qual a efetiva medigao preliminar que deve ser resguardada do avango de toda e qualquer construgio ou desmatamento, até o final do proceso previsto pelo Decreto n°. 1.75/96. \ vas PODER IUDICIARIO ; x mossy SECAO JUDICIARIA DO DISTRITO FEDERAL } SST lev ian Registro que a drea esta sendo palco de conflitos violentos e acirrados entre os funciondrios da construtora, policiais, estudantes e indios, tudo levando a crer a er cessar a inseguranga, a violéncia e a necessidade de paralisagao das atividades para fai tensio entre as partes. Actesca-se que 0 acitramento do conflito é tal que a construtora Emplavi nfo possess6ria de Vé condigies de prosseguir com os trabalhos e requereu a suspensio da a n°, 41819-82.2010.4.01.3400, pelo prazo de trinta dis Faz-se imperioso, portanto, que este Juizo se imiscua nas provas dos fatos controversos, designando uma futura inspegdo judicial, pericia e audiéncia de justificagao para posterior andlise do novo pedido de tutela, na qual se poderao ouvir os antropélogos e indgenas, bem como outras pessoas que possam esclarecer os pontos relevantes deste litigio. 3. Dispositivo Asite 0 cenério de novas circunstincias, inclusive de pedido de suspensdo processual por parte da construtora Emplavi, valendo-me do poder geral atribuido pelo art. 798 do Cédigo de Processo Civil, ndo ad cautelam, até colheita de provas ¢ exame ic da antecipaciio de tutela, os efeitos da decisio de fis. do pedido de reconsi 330/337, Ordeno que as rés se abstenham de desmatar, consteuir, destruir, igio na Grea objeto de desocupar ou remover os membros da comunidade residentes té ulterior deliberagio nesta agi civil piiblica, no importe provisério de 50 hectare: deste Juizo, restaurando-se, por ora, a decisio de fis. 86/87. Determino as Comunidades Indigenas envolvidas que nfo destruam as cercas © equipamentos da construtora Emplavi, para que nfo se aftonte a decisio da MM. Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida no agravo de n°. 0049049- wt ay 2 PODER IUDICIARIO SBCAO JUDICIARIA DO DISTRITO F 59.2011.4.01.0000/DF ¢ sejam preservadas todas as evidéncias quanto A posig&io do terreno da empresa, sua distincia em relagdo a Comunidade, local de passagem dos tratores, ete. Para comegar a por fim a dtivida existente nos autos, designo audiéncia para es pes 9 dia 27/10/2011, is 14:00 horas, determinando a intimagdo das séguint enderego da FUNAI, SEPS Quadra 702/902, Projegio A, Ed. Lex, Brasflia/DF: 1) Jorge Eremites de Oliveira, antropdlogo da Universidade Federal da Grande Dourados; 2) Giovana Acacia Tempesta, antropéloga da CA/CGID/FUNAUBSB; 3) Miguel Vicente Foti, Antropélogo Colaborador CGID/FUNAI/BSB; 4) Suzy Evelyn de Souza ¢ Silva, Assessora Técnica CGID/FUNAUBSB; 5) Mossuel Nunes Moreira Junior, Assistente Técnico CGG/FUNAVBSB; 6) Maria Auxiliadora Cruz de Sé Leo, Diretora de Assuntos Fundiarios da . FUNAL Dever a FUNAI diligenciar 0 comparecimento do antropélogo Jorge Eremites de Oliveira, tendo em vista a auséncia de tempo habil para a expedigéio de carta precatSria para a sua oitiva fora de Brasilia, tificado das testemunhas arroladas acancetara a O nao comparecimento inj sua condugao coercitiva a este Jufzo, mediante requisigdo de forca policial Em audiéncia, caberd a este Juizo avaliar a necessidade de inspegao judicial in loco, a qual seré oportunamente designada. Defiro 0 pedido da Emplavi nos autos da ago possesséria de n°. 41819- 82.2010.4.01.3400, suspendendo-se 0 curso daquele proceso. PODER RIDICIARIO sEgdo JUD ‘A BO DISTRITO FEDERAL Fe: _S6f 2° VE_ Ge Quanto ao pedido de devolugao do prazo para contestar, feito pela FUNAI, noto que a autarquia foi citada em 14/09/2011, momento em que o processo estava paralisado por forga de decisio do Ministro Benedito Gongalves do Superior Tribunal de Justiga nos autos da Medida Cautelar n°. 18.392-DF. Esta decisiio foi revogada em 06/10/2011, por isso, para eliminar o estado de diivida, restituo 0 prazo de contes autarquia, a contar da intimagao da presente decisto. Revogo a cominagio de multa ao antropélogo Jorge Eremites, no bojo da aco cautelar de n°, 2009.34,00.038807-5, tendo em vista a entrega do laudo, ainda que parcial, em jutzo. Determino que seja extrafda c6pia desta decisto para ser juntada aos autos da agio declaratéria n°, 2008.34.00.019842-7; ago cautelar de n°, 2009.34.00.038807-5; € ago possesséria de n°, 41819-82.2010.4.01.3400. Publique-se. Inti ase Comm urgéncia. rasilia, he outfde 2011. (rr Teele \CLARADA MOTASANTOS Juiza Federal Subsfituta da 11° Vara/DF m auxilio na 2* Vara da SJ/DF

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