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mrorosmoenoncto conosn [EJ Tema proposto: Caminhos para combater 0 assédio moral infanto-juvenil no Brasil Eu no queria morrer. Eu penso que tenho um futuro pela frente. Eu sei que tenho. Tenho mais amigos para fazer, mais misicas para escutar, mais pessoas para namorar, mais shows para ir. Tanta coisa. ‘Mas sabe 0 que eu e outras milhées de pessoas pensam sobre isso? “Eu ndo tenho forea de vontade para continuar. Eu ndo sou forte, eu ndo consigo seguir em frente sem derrubar ‘mais uma lagrima’. Sejam mais gentis, por favor. Amem mais, ajudem mais, veem mais, peguem na méo de pessoas que estdo se afogando. Dé sua mao. Dé um sorriso. Cecro dcr tad prove ano uo ited “ain? Em episédio de “Os Simpsons” ~ Homer preso por Bullying - Bart sofre “bullying” na escola por dangar, entao Marge convence a cidade a criar uma legislacao antibullying. Em seguida, Homer preso por Assédio Moral contra Ned Flanders e enviado para a reabilitago, onde & tratado pelo terapeuta e ex-valentao Dr. Raufbold. © episédio encerra-se com um pedido de perdao de Homer. Tratando-se de vida real, aqui no Brasil, ha recente legislacao antibullying: a Lei 13.186, de 06 de novembro de 2018 instituiu 0 Programa de Combate a Intimidacao Sistematica (“Bullying”). Esta lei define “Bullying” ou Assédio Moral Infanto-juvenil ou Bulimento em seu primeiro artigo: “Artigo 1°. (..) § 1°. No contexto e para os fins desta Lei, considera-se intimidagao sistematica (bullying) todo ato de vio- lencia fisica ou psicolégica, intencional e repetitivo que ocorre sem motivagao evidente, praticado por individuo ou grupo, contra uma ou mais pessoas, com o objetivo de intimidé-la ou agredi-la, causando dor e anguistia é vitima, ‘em uma relacéo de desequilibrio de poder entre as partes envolvidas.” Em outros termos, define-se 0 assédio moral infanto-juvenil por comportamentos violentos diversificados, que atacam intencionalmente a dignidade do outro, om situacdes humilhantes de dominacao x submissao. A intimidagao sistematica (bullying) pode ser classificada, conforme as agées praticadas, como verbal (insultar, xingar e apelidar pejorativamente), moral (difamar, caluniar, disseminar rumores); sexual (assediar, induzir e/ou abuser), social (ignorar, isolar ¢ excluir); psicolégica (perseguir, amedrontar, aterrorizar, intimidar, dominar, mani- pular, chantagear e infernizar), fisico (socar, chutar, bater); material (furtar, roubar, destruir pertences de outrem), virtual (depreciar, enviar mensagens intrusivas da intimidade, enviar ou adulterar fotos e dados pessoais que re~ sultem em sofrimento ou com o intuito de criar meios de constrangimento psicolégico e social) (artigo 2° e a e). Estes diferentes tipos de “Bullying” t8m consequéncias particularmente negatives porque violentam vitimas vulneraveis eis que em proceso de formacao e desenvolvimento da personalidade. © Programa de Combate ao “Bullying” previsto pela Lei n® 13.185 visa, além da prevencio e da erradicagdo do assédio escolar, capacitar docentes e equipes pedagégicas para a solucdo do problema; implementar e disseminar ‘campanhas de educacao, conscientizagao e informagao; instituir préticas de conduta e orientagao de pais, fami- liares e responsdveis diante da identificacdo de vitimas e agressores; dar assisténcia psicolégica, social e juridica as vitimas e aos agressores; integrar os meios de comunicacao de massa com as escolas e a sociedade, como forma de conscientizagao do problema ¢ evitar, tanto quanto possivel, a punigao dos agressores, privilegiando mecanis- mos ¢ instrumentos alternativos que promovam a efetiva responsabilizago e a mudanca de comportamento hostil {artigo 4°) ‘A promocao da cidadania, da capacidade empatica e do respeito a terceiros, nos marcos de uma cultura de paz « tolerancia matua é também, relevante objetivo do Programa de Combate & Intimidagao Sistematica (“Bullying”) Deste modo, ainda que na Lei n° 13.185 haja expressa previsdo de fiscalizagdo e monitoramento, inclusive a partir da exigéncia da producao e publicacao de relatérios bimestrais das ocorréncias de “Bullying” nos Estados © munic(pios (artigo 6°.), em realidade, a lei ainda “nao pegou”. Alids, atualmente ha todo um contexto que agrava o enfrentamento do “Bullying”. Segundo Idilvan Alencar, do Conselho Nacional de Secretérios de Educagao, “o bullying est fortemente presente nas escolas e, com crescimento de grupos que tentam impedir discussdes sobre género, discriminagao @ intolerancia em sala de aula, a tendéncia é de aumentar’. ‘A importancia da concretizacao desta lei apresenta-se nas estatisticas sobre este tipo de violéncia psicolé- gica/fisica que acomete criangas e adolescentes. Os casos de bullying comegam muito mais silenciosos e, por isso, s80 mais graves. Quem sofre a agressao ndo conta nem na escola nem na familia, mas comega a mudar © comportamento. ss RevPOWERREDAGAD 2018 41 mrorosroenoncto conosn [J Dados do Programa Internacional de Avaliagao de Estudantes revelaram que 17,5% dos estudantes do pais, na faixa dos 15 anos, disseram ser alvo de “Bullying” algumas vezes ao més. Na Espanha especialmente, abundam estudos @ nlimeros sobre o tema que ofertam precisos contornos: os ‘ataques s30 na maioria de fundo emocional; os agressores sao em sua maioria do sexo masculino; os ataques ocor- rem majoritariamente no interior da escola ~ sala de aula/pstio- e no, nos arredores e, o “Bullying” sucede preferen- cialmente na educagio secundaria. E, para aqueles que tendem a minimizar o fendmeno do “Bullying”, afirmando ser, na realidade, mera brinca- deira de mau gosto, pela qual todos jé passamos e sobrevivemos, ha 0 ensinamento do advogado e doutor em An- tropologia Social, Geovanio Rossato, que escreveu o livro “Educando para a superagao do Bullying escolar” “Ha quem diga que certos processos ou situacdes de violéncia ajudam, sao naturais ¢ auxiliam as criangas e adolescentes a se desenvolverem, a amadurecerem. Essa perspectiva aplicada 8 questo do bullying é um mito. A brincadeira é um jogo de faz de conta em que as criangas se socializam, representam papels sociais, de perso- nagens bons e maus. Aprende a lidar com 0 medo, a ansiedade a frustracao, raiva, a vencer desafios, a criar estra- tégias para resolver seus problemas atuais e futuros. O bullying, ao contrério, nao promove nada disso, diferente- mente de um conffito natural e saudavel, em que as duas partes s8o responsaveis, tornando as criancas mais fortes para enfrentar as adversidades da vida, o bullying é uma violéncia gratuita e unilateral de uma parte ‘forte’ que mal- trata a ‘fraca’, fragilizando-a ainda mais.” Em verdade, o “Bullying” significa uma violéncia aos caros principios democraticos da igualdade, da solidarie- dade, do respeito, da paz e da dignidade humana. E assim, deve iniciar-se qualquer ligao sobre esta modalidade de assédi Hé todavia, interessantes ages isoladas que devem ser enfocadas como exemplo de combate. No Colégio Bandeirantes, na cidade de Sao Paulo, a direcdo fez parceria com o Grupo de Estudos e Pesquisas ‘em Educagéo Moral (Gepem), da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), para treinar professores e alu- nos. E, uma das iniciativas foi a criagdo de equipes formada por estudantes de todos os anos do ensino fundamen- tal, que passam a observar os colegas mais isolados nos patios - que talvez estejam sofrendo “Bullying” ~ ¢ oferecer ajuda. Perceba, contudo, que hoje, tal empreendimento caracteriza-se como um dever legal do estabelecimento de ensino ~ a assegurar medidas de conscientizagao, prevengao, diagnose e combate ao “bullying” (artigo 5°.) - passi- vel inclusive, de responsabilizacao civil derivada de fatos antijuridicos e nao, mera filantropia Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE) realizada em 2015 com mais de 70 mil ‘alunos, um a cada trés adolescentes brasileiros ja sofreu bullying. Outros 20% admitem praticé-lo. ‘Amaior parte dos agressores e das vitimas tem, em média, 14 anos. E a fase da puberdade, das conquistas amo- rosas, e quem nao se enquadra nos padrées de beleza é quase sempre alvo. Nao a toa, de acordo com a pesquisa, 08 principais motivos das zoeiras so a aparéncia do corpo e do rosto. Em geral, 0 alvo do bullying ndo dispée de recursos, status ou habilidade para reagir ou cessar a pratica de tal ato. Bullying é também um problema social e que, portanto, ocorre fora da escola, como nas familias, igrejas, politi- cas, enfim, em todo o contexto social. Em verdade, é indispensavel a sensibilizaco de todos - escola/familia/meios de comunicagao e informatica - e um olhar mais atento as nossas criangas e adolescentes. Origens histéricas do assédio moral no ambiente escolar Cleo Fante, especialista no assunto, afirma que ha muito tempo a violéncia entre estudantes tem sido um trago caracteristico das relagdes escolares. Entretanto, seu foco era direcionado ora para a violéncia contra a escola e ‘seus representantes (no caso das rebelides estudantis), ora para os préprios pares (como nos trotes). Fante informa ainda que no que se refere as rebelides, registros que mostram sua ocorréncia ja no século XVII, na Franga. A de 1883, no Liceu Louis-le-Grand, em consequéncia da expulsdo de um aluno, tornou-se célebre. As revoltas de estudantes contra os pedagogos eram constantes e marcadas por atos de violéncia, inclusive com a utilizagao de instrumentos como bastées, pedras, espadas e chicotes. ‘A mesma autora informa que: “A origem dos trotes estudantis é incerta; porém, existem registros de sua ocorréncia na Idade Média. Um dos documentos mais antigos desse tipo data de 1342 e refere- se & Universidade de Paris. Nas instituicdes europeias, era comum separar 0s novatos dos veteranos. Aos novos alunos era negada a possibilidade de assistir ds aulas junto com 0s demais, no interior das salas: eles eram obrigados a se dirigir aos vestibulos (patios de acesso ao prédio) - dai o uso do termo vestibulando para identificar aqueles que estdo prestes a entrar para a universidade. Sob a alegagao de profilaxia e necessidade de manter a higiene, os novatos tinham a cabe¢a rapada e, na maioria das ve- zes, suas roupas eram queimadas. Essa prética, no entanto, logo se converteu numa espécie de culto & humilhagGo Fante informa que no inicio do século XX, na Alemanha, era comum que calouros fossem obrigados a vestir REDPOWER REDAGAO 2018 2 mrorosroenoncto conosn [J roupas feitas de falsa pele de animal, que contavam, inclusive, de orelhas, chifres ¢ presas. Assim travestido, 0 jo- vem era arrastado pelos colegas até cinco ou seis “juizes’, sob olhares atentos de uma grande plateia. Era insultado ¢ tratado como “monstro fedorento” por “assistentes” que em dado momento recebiam ordens para “depend-lo’, tal depenamento consistia no corte das orelhas com tesouras e dos chifres com serras; os dentes, por seu turno, eram arrancados com tenazes. O nariz era limado e as nédegas, “polidas’; O ritual continuava com 0 novato sendo sacu- dido, empurrado e, por fim, agoitado com varas. Durante a tortura, 0 calouro tinha de se reconhecer culpado de inimeros “pecados’, sobretudo sexuais. E, como forma de punigdo, era obrigado a oferecer um banquete aos vete- ranos. O primeiro registro de morte no Brasil - de um aluno da Faculdade de Direito - ocorreu em Recife, em 1831. Ainds hoje, essas praticas so consideradas por muitos como ritos de passagem —e esperadas com certa ansie- dade tanto por calouros quanto por seus parentes. Entretanto, aqueles que se dedicam ao estudo do tema con- cordam que se trata de um ritual de exclusao e no de integragao. Deve ser considerado como um mecanismo de dominagdo fundamentado por discriminacao, intolerancia, violéncia e preconceitos de classe, etnia e género. O abuso de poder é sua marca principal. Em razdo de atitudes agressivas e abusos psicolégicos, sob a alegagao de que se trata de “brincadeiras, muitos estudantes se convertem em “bodes expiatérios” do grupo, desde a sua entrada no ensino superior até a sua conclusio ©, em alguns casos, essa situacdo se estende na vida profissional. Os que se negam a participar da iteracio” so sumariamente coagidos, intimidados, perseguidos ou mesmo isolados do convivio e das atividades dos demais. Existem os que se resignam e aceitam submeter-se as diversas formas de opressao e tortura, ou se tornam ciim- plices delas: respaldados na tradicao dos trotes, justificardo seus atos de posterior dominacao. Hé ainda aqueles ‘que apenas presenciam 0 que acontece aos colegas, mas, mais tarde, também se sentirdo aptos a reproduzir a experiéncia. Estamos, assim, diante de uma dindmica repetitiva de abusos. Pesquisas mostram que grande parte daqueles que sofreram abusos psicolégicos na inféncia utilizaré na vida adulta essas praticas na educacao de seus filhos, acreditando ser esse 0 procedimento mais adequado. Outros se tornarao submissos, passivos, indefesos, acreditando ser merecedores dos maus-tratos. Muitos ainda reproduzirao a violencia no espaco socializador imediato a familia, ou seja, na escola. Erros comuns dos pais diante do bullying © ser humano é resultado das relagées intersubjetivas que possui, principalmente, das relagdes familiares. A familia é responsavel pela formagao e pela estabilidade da personalidade de seus membros. Cada pessoa precisa se sentir amparada, respeitada e amada em seu seio familiar. A maxima frase: lar doce lar de fato deve ser uma constancia. E preciso que cada pessoa se sinta envolvida na felicidade dos seus entes familiares e busque uma convivéncia saudavel. Assim, as familias produzirao seres humanos felizes e prontos para viver em sociedade. Todavia, ha 5 grandes erros que os pais podem cometer diante de um caso de bullying * Pensar que ‘isso 6 coisa de crianga’. Quando se produz uma relago de dominante © dominado e, além disso, ‘existe uma vitima que sofre maltrato psiquico constante e quando uma crianga sofre com atos reiterados de outros, isso 6 bullying. E no 6 coisa de criangas. Nenhum ato violento 0 é. * Acreditar que isso acontece com criangas esquisitas. ‘Algo que terdo feito para outras criangas as moleste tanto’. A vitima de bullying escolar pode ser qualquer aluno. Pode ser tire notas excelentes ou no. Que use éculos undo. Que seja gordo ou nao. Que use calga jeans ou nao. * Pensar “isso nunca aconteceré com o meu filho sem que eu fique sabendo”. ‘Eu seria a primeira pessoa a ficar sabendo. Eu conhego ao meu filho melhor do que ninguém’. A maioria dos pais cujo filho sofre assédio demora ‘em se dar conta. A crianga sofre assédio pode se sentir envergonhada e acaba ocultando 0 que esté ocorrendo. ‘Além disso, ela sente medo e nao é capaz de contar 0 que estd acontecendo a ninguém. * ‘Alguém te insultou? Nao seja dedo-duro e aguente’. Dedo-duro é o que conta segredos com intengao de causar mal a terceiros. A pessoa que 6 capaz de denunciar um dano ou um ato de agressividade (fisica ou psicolé- gica), ela esté fazendo o que é correto. « Dizer ao seu filho: ‘Nunca se meta nos problemas dos outros. O problema nfo é seu e vai acabar respingan- do em voce’. O problema de um companheiro de classe também é problema seu. E é problema de todos. Muitos pais pensam que o bullying s6 coisa que acontece em escolas e por culpa dos pais que nao tenham ‘educado bem aos seus filhos. Mas, 0 bullying pode ir muito mais além das portas da escola ou da negligéncia do colégio ou da ma educagdo dos pais... O bullying pode estar dentro de um lar e pode acontecer entre irmaos. © bullying entre irmaos é muito mais comum do que pensa a maioria das pessoas. Uma grande parte do bullying entre irmaos tem a ver com a rivalidade ou a competicao que pode haver um com 0 outro, ou que ndo so os mes- mos para os seus pais. Numa situagao como essa, se nao forem tomadas medidas adequadas pode se agravar consi- ReDPOWERREDAGAO 2018 3 morosmoenoncto conosnn [EJ negativo de uma crianga quando o seu agressor vive na mesma casa (ou no mesmo quarto) pode ser horrivel. mas também pode chegar a idade adulta, algo que pode deixar graves sequelas nas criangas. autoestima de uma crianga fazendo com que tenha problemas na sua vida. Qualquer forma de negatividade de um irméo ao outro deve ser tratada imediatamente. + Agressées fisicas. As criancas podem se sentir frustradas quando ndo sabem expressar suas emogdes de forma assertiva por ndo poder expressar as coisas que as esto incomodando. Ao invés disso arremetem contra seus irmdos e thes agridem fisicamente (chutes, socos, beliscdes, puxdes de cabelo, etc.). A agressii fisica ndo deve ser tolerada sob nenhuma circunstancia, *# Ganging (termo em inglés usado quando mais de dois irmaos esto envolvidos no bullying em relagdo a outro). Os itmaos podem combinar para atacar a um irmao e isso provocaré uma luta desigual. Por exemplo, podem causar um ‘vacuo’ fazendo com que o irmao vitima se sinta sé e possa levé-lo inclusive & depressio ou ansiedade. « Tentar destruir ao irmao em qualquer aspecto (fisico, social, psicol6gico). Pode ir desde quebrar 0 brinquedo favorito do irmao, até ridicularizé-lo de forma social diante de pessoas conhecidas como amigos e familiares ou des- conhecidos, como num bar ou nas escolas e colégios. Algumas vezes tais condutas agressivas e repetitivas, de forma a violar a integridade psiquica e moral da vitima, 40 visualizadas na forma de brincadeiras, mas podem aparecer em agressdes verbais brutas dos préprios pais e outros familiares. Frases como: “Voce é uma burra’; "Vocé é um frouxo”; “Voeé no faz nada direito”; “Gorda assim vocé nao ird arrumar namorado”; “Vocé esta muito magra"; “Vocé é uma desgraca’, ditas em repeticdo geram grande mécula na autoestima e na autoconfianca da vitima. Deve-se ter em mente que 0 assédio moral na familia pode se dar em todas as dimensées, ou seja, entre pai e filho, marido e mulher, mae e filho, e vice-versa, Nao hé uma regra. O que é comum a todos os casos é justamente ‘suas graves consequéncias. Observa-se que 0 assédio moral na familia muitas vezes é reconhecido somente a partir de seus efeitos e isso agrava 0 quadro da vitima, pois jé se est diante de danos causados pela rotina de violénci O outro lado do bullying © autor do bullying normalmente aprende sobre o poder da agressio em seu préprio lar, através dos exemplos dos adultos. Mechthild Schaefer, psicologa educacional, menciona que usualmente sao criangas dominadoras, que descobriram que através da agressao poderiam se tornar lideres de um grupo. Seu modus operandi consiste na humithagao fisica ou psicolégica de colegas suscetiveis para assim galgarem o topo da ordem social & qual estéo vinculadas. Para Katia Chedid, pedagoga e especialista em neurociéncia, os agressores querem chamar a atencdo das pes- ‘3028 e, para isso, agem como “valentdes", adotando comportamentos de intimidagao e provocacao. Consideram que todos devem atender aos seus desejos e s8o incapazes de colocar-se no lugar do outro. Assim como as vitimas, apresentam dificuldades de relacionamento interpessoal e so inseguros. Vale observar que algumas criangas se ‘envolvem com eles nao por amizade, mas sim por medo. O agressor pode ser de ambos os sexos. Tem cardter violento e perverso, com poder de lideranca, obtido por meio da forga @ da agressividade. Age sozinho ou em grupo. Geralmente 6 oriundo de familia desestruturada, em que hé parcial ou total auséncia de afetividade. presenta averso as normas; nao aceita ser contrariado, geral- mente esté envolvido em atos de pequenos delitos, como roubo e/ou vandalismo. Seu desempenho escolar 6 de- ficitério, mas isso no configura uma dificuldade de aprendizagem, j4 que muitos apresentam nas séries ini rendimento normal ou acima da média. alvo ou vitima caracteriza-se pela pouca sociabilidade, inseguranga, desesperanca e baixa autoestima. Co- mumente sente-se inadequado em meio ao grupo no quel ests forgosamente inserido por motivos circunstancieis. ‘Aramis Lopes Neto, ex-presidente do Departamento Cientifico (DC) de Seguranca da Crianca e do Adolescente da ‘SBP, informa que hé casos nos quais a autoestima esté to comprometida que a vitima chega a sentir-se como me- recedora dos maus-tratos sofridos. Salienta ainda que algumas caracteristicas fisicas, comportamentais ou emo- cionais podem tornar 0 alvo mais vulnerdvel as aces dos autores e gerar dificuldades na sua aceitacao pelo grupo. A rejeicdo aos diferentes 6 um fato descrito como de grande importancia na ocorréncia do bullying ‘Aramis Lopes Neto salienta que: “embora nao haja estudos precisos sobre os métodos educativos familiares que incitem ao desenvolvimento de alvos de bullying, alguns deles so identificados como facilitadores: protegao excessiva, gerando dificuldades para enfrentar os desafios e para se defender, tratamento infantilizado, causando desenvolvimento psiquico e emocional aquém do aceito pelo grupo; e 0 papel de “bode expiatério” da familia, ReprowerneDachoz00 mrorosroenoncto conosnn [EJ sofrendo criticas sisteméticas e sendo responsabilizado pelas frustragdes dos pais.” O bullying nao & um fenémeno que surge de repente, sem origem explicével. Os envolvidos com este problema frequentemente tém um hist6rico familiar que os predispéem a se tornarem vitimas ou agressores. Criangas que passam muito tempo sozinhas em casa, que tem caréncia afetiva ou falta de limites tem a potencialidade de se tor- narem agressores. As vitimas, por seu turno, costumam ser criangas humilhadas pelos pais em casa ou que possuem algum atributo que as diferencia das demais. E valido observar que nos casos extremios em que vitimas de bullying reagiram as agressdes através de armas, ‘sua “mira” nao possuia alvos especificos, traduzindo de forma sintomatica o fato de que o desejo de tais vitimas era, nna verdade, “matar a escola’. Local onde diariamente todos os viam softer, mas nada faziam para protege-tos. Isso pode ser observado no Massacre de Columbine, ocorrido nos Estados Unidos no ano de 1999, o qual serviu para 0 pesquisador sueco Dan Olweus definir os valentdes que, na escola Columbine High School, procuravam intimidar 08 colegas, © Massacre de Columbine foi um massacre escolar que ocorreu em 20 de abril de 1999, no Colorado, Estados Unidos. Além do tiroteio, 0 ataque complexo e altamente planejado envolveu 0 uso de bombas para afastar os bombeiros, tanques de propano convertidos em bombas colocados na lanchonete, 99 dispositivos explosivos, carros-bomba. Os autores do crime, os alunos seniores Eric Harris e Dylan Klebold, mataram 12 alunos e um pro- fessor. Eles também feriram outras 21 pessoas, e mais outras trés ficaram feridas enquanto tentavam fugir da escola. Depois de trocarem tiros com policiais respondentes, a dupla cometeu suicidio. (Os dois atiradores eram classificados como garotos superdotados que supostamente foram vitimas de bullying por quatro anos. De acorde com Brooks Brown, Dylan Klebold e Eric Harris eram os alunos mais exclufdos em toda escola, ¢ até mesmo muitos daqueles que eram mais préximos deles consideravam os dois como "os perdedores dos perdedores". Dylan & conhecido por ter comentado com seu pai sobre seu édio pela cultura atleta em Columbine, acrescentando que Eric, particularmente, tinha sido vitima deste grupo social. Neste comentario, Dylan havia afirmado: "Eles certamente infernizam Eric”. Em outra ocasiao, apenas algumas semanas antes do massacre, Eric e Dylan foram confrontados por um grupo de jovens na escola—todos membros do time de futebol ameri- ‘cano—que tinham jogado ketchup e mostarda neles enquanto se referiam ao par como “boiolas” e "veados". As primeiras hist6rias criadas apés o massacre acusaram os administradores e professores de Columbine de terem tolerado 0 bullying feito pelos entéo atletas, permitindo que uma atmosfera de intimidaco e ressentimento fosse criada. Tal contexto também foi observado no Brasil, como no assassinato de vérias criangas e adolescentes na lo- calidade de Realengo no municipio do Rio de Janeiro no dia 07 de abril de 2011 por uma suposta vitima de bullying que teria ido se “vingar” do passado de humilhagdes sofridos na escola que antigamente foi aluno. Em maio de 2002, 0 Servico Secreto dos Estados Unidos publicou um relatério que examinava 37 tiroteios em escoles dos Estados Unidos. Eles encontraram as seguintes constatagées: ‘ Incidentes de violéncia direcionada na escola raramente eram atos repentinos e impulsivos, ‘Antes da maioria dos incidentes, outras pessoas sabiam a respeito da ideia e/ou plano de ataque do autor do crime, A maioria dos autores dos crimes no ameagavam suas vitimas diretamente antes de realizarem o ataque. ‘© Nao hé um perfil preciso e util de alunos que tenham praticado violéncia escolar. +A maioria dos autores dos crimes envolvidos em algum comportamento antes do incidente que causou preocupagao em outras pessoas ou indicou necessidade de ajuda. © A maioria dos autores dos crimes tinham dificuldades em lidar com perdas significativas ou falhas pessoais. Além disso, muitos tinham considerado ou tentado suicidio. ‘* Muitos dos autores dos crimes se sentiam intimidados, perseguidos, ou feridos por outros antes do ataque. ‘* A maioria dos autores dos crimes tinham acesso e jd haviam usado armas antes do ataque. ‘* Em muitos casos, outros alunos estavam envolvidos de alguma forma. © Apesar das respostas imediatas da lei, a maioria dos ataques foram interrompidos por outros meios, nao pela intervengdo policial Observa-se ainda que, frequentemente, as vitimas tsm medo de ir & escola e quando vao sofrem de forma silen- ciosa. Ao invés de reagir e pedir ajuda, elas costumam se isolar, ficar deprimidas, pensando em abandonar os estudos, por nao se acharem boas o suficiente para conquistar amigos, também costumam apresentar queda no rendimento escolar e evitam falar sobre a situagao problematica. Aconta de Twitter @2Cronopia postou um relato de bullying da perspectiva da mae de uma abusadora. Sua fi- lh, sob 0 pseudénimo de Tiburcia, 6 uma das colegas de classe que complicam a vida de Erifila, pseudénimo da vitima, @2Cronopia joga com a ambiguidade em sua historia no Twitter. Fala de pequenos gestos, nada que a priori ReDPOWERREDAGAO 2018 § rrorosrancecoache conor AY pareca assédio, mas na verdade 6. Acompanhe: “Vejam como o bullying é disereto, malandro, sacana ¢ dificil de se detector: duas amigas de toda uma vida che- gam ao sexto ano do Ensino Fundamental Il. Lé comegam a ter alguns problemas, nada de importante. Coisas de riangas. Uma delas amplia o circulo de amizades e véo se separando, apesar da amizade continuar. Um dia, uma delas — vamos chamé-la de Tiburcia ~ chega em casa dizendo que nunca mais quer ser amiga da outra ~ vamos chamé-la de Erifla -. Sei que vocés gostaram dos meus nomes. Certo, Tiburcia diz que jé ndo quer ser mais amiga de Erifila e em sua casa lhe dizem que nao hé nenhum pro blema, que ela ¢ livre para escolher as amizades que quiser. Alguns dias depois, Tiburcia explica em casa que, sem saber por que, existem mais meninos/as que jé ndo que- rem mais brincar com Erifila. Aimée de Tiburcia Ihe avisa: *néo é para deixar ninguém de lado, entendeu? Uma coisa é ndo ser amigas, e outra muito diferente 6 deixar alguém isolado”, porque na casa de Tiburcia so muito conscientes do assunto bullying. Tiburcia explica que ndo hé problema, que Erifila tem mais amigas e que néo estd sozinha. De vez em quando explica “hoje disseram tal coisa a Erifla’, mas nunca é um insulto, sempre so pequenas frases um pouco desagra- daveis, mas aparentemente sem importéncia. Até que um dia Tiburcia chega em casa explicando que « diretora a chamou em sua sala para saber que diabos esté acontecendo com Erifila. A mée de Tiburcia nota que hé alguma coisa que Ihe escapa, porque a diretora nao chama alguém a sua sala somente porque perdeu uma amizade, de modo que decide ligar para a mae de Erifil. E a mée de Erifila Ihe explica o seguinte: -Que esto hé semanas sem falar com sua filha a ndo ser para Ihe fazer comentarios depreciativos. -Que TODOS OS DIAS tiram seu casaco do cabide e 0 jogam no chao. -Que TODOS OS DIAS no refeitério Ihe dizem para mudar de meso. ‘A mée de Tiburcia pergunta se sua pequena Tiburcinha teve algo a ver com toda essa estupidez e a resposta 6 ofirmativa, A boa mulher tenta ndo se encolerizar, mas TIBURCIA VENHA AQUI AGORA MESMOOQOOOOO QUE PRE- CISAMOS CONVERSAR. E entdo interroga a pequena Tiburcia: ~Vocé alguma vez pegou 0 casace de Erifila para jogé-lo no chao? -Hmmmm...ndo..eu no. Mas vi quem fez. -E quando vocé viu que jogavam 0 casaco no chao, ndo fez nada para impedir? -Néo. ~Vocé alguma vez disse 6 Erifila que mudasse de mesa no refeitério? .. $6 uma vez, mamée. Mas eu disse que s6 se ela quisesse, que se ndo quisesse, néo. Os que Ihe dizem para mudar todos os dias so “os outros”. E isso é tudo: ninguém fez nada de concreto. Uma sé Ihe disse um dia que mudasse de mesa, Fulaninho joga seu casaco no chéo porque Agapita Ihe disse que o fizesse, e Tiburcia viu, mas néo fez nada. Ninguém fez nada de “muito grave’, mas Erifla era uma menina que ia ao colégio feliz e que tinha muitos amigos em questao de quatro dias se transformou em uma menina que esté sozinha e que chora todas as tardes. Ninguém fez nada de “muito grave’, mas Erifla era uma menina que ia ao colégio feliz e que tinha muitos amigos ‘em questéo de quatro dias se transformou em uma menina que esté sozinha e que chora todas as tardes. CO pior de tudo isso é que na casa de Tiburcia se falou mil vezes sobre o que é 0 bullying, como se origina e o que NAO se deve fazer para se transformar em uma abusadora. E 0 outro pior é que *Tiburefa’ nao é Tiburcia: é minha fi tha mais velha. Eu Ihe perguntei como péde fazer algo assim e, apés pensar uns segundos, disse: “acontece sem que vocé per- ceba”.” Adaptagao apés o bullying ‘Apés 0 trauma, criangas e adolescentes podem encontrar dificuldade na socializago em uma nova escola. A solugéo do problema esté na escuta, apoio e compreensao por parte da familia e do colégio. Independentemente REDPOWERREDAGAO 2018 6 mrorosmoenoncto conosnn [J da idade, 0 bullying pode ser “devastador”. Mas é sobretudo na adolescéncia que a situacdo pode ser mais critica. ‘Aagressio, no momento da vida em que o individuo busca se abrir para o mundo, afeta em cheio sua auto-confian- a. "E importante conversar com esse adolescente, tanto a escola quanto os pais. Dizer ‘nessa escola vocé nao vai estar sozinho’. Veja a seguir algumas dicas para pais: ‘* Conversar com educadores: £ importante manter uma relagao proxima com a escola. Coordenadores e pro- fessores devem saber do histérico da crianga ou adolescente para que possam estar atentos a novas ameagas. Com ‘esse aviso, uma brincadeira entre alunos pode ser vista com outros olhos. * Acolher seu filho: A crianca ou o adolescente que sofre bullying tem sua autoestima e autoconfianca abala- das. E importante que os pais acolham esse momento. A escuta é a principal ferramenta; pontanto, deve-se evitar dizer 0 que ele deveria ter feito ou dito na ocasiéo. * Evitar a superprotecdo: A preocupacio de alguns pais com a adaptagao do filho pode tender & superprote- ‘¢do. Os pais devem “equipar” a crianga ou adolescente para essa mudanga, mas ndo tomar para sia tarefa de supe- rar o bullying. Em seu site, @ Fundagao de Ajuda a Criangas e Adolescentes em Risco (ANAR) dé conselhos para pais para pre~ venir 0 assédio escolar. Nao fala s6 como identificar possiveis vitimas, também explica como tentar evitar que as ciancas assediem. © Ensi que existem limites: Que nao podem ser ultrapassados, em casa e fora dela e que as acées vio- lentas tém consequéncias para quem as faz. Assegure-se que ela tem clara a diferenga entre “ser popular” (por ser agressiva e abusedora) e ser aceita e querida pelos demais por sua forma saudével de se relacionar. ‘+ Mostre a seu filho/a que se existe uma situagao de violéncia no colégio, é preciso ser solidai fender um colega e silenciar a situagdo, também significa fazer parte do jogo do assédio escolar e fortalece a posi- go de poder do agressor. “Se vocé se cala, diante do assédio a outro colega, se transforma em ciim agressor passivo". Ajude-o a ser empatico/a: “colocar-se no lugar da vitima”. Reflita com seu filho/a: se alguém te as- sediasse, como vocé se sentiria? # Seo filho(a) mostra atitudes violentas para conseguir algum fim, deve-se corrigir: Nao se deve deixar que essa seja a maneira com a qual ele conquista seus objetivos portanto, deve-se mostrar também através do exemplo como pai/mae, que as metas sao atingidas sem necessidade de violencia. Aprender a respeitar os demais é basico ‘em qualquer relagao de convivéncia. ‘A Fundagao ANAR coordena um servigo de ajuda telofénica para vitimas de bullying ¢ familiares. Ao longo de 2016 receberam 52.966 ligacées. 1.200 delas foram identificadas como casos de bullying, o dobro de 2016. “Nossos telefones nunca tém descanso. Do outro lado, existem menores em apuros. A maioria das vezes, s6 precisam de um Pouco de orientagao. Mas, em outras ocasibes, suas ligagdes de pedido de ajuda te deixam gelado’, explicou em abril de 2017 uma das orientadoras, Yanire Gutiérrez. Bullying e Politicas Pablicas De forma geral, observam-se politicas publicas sem grande expresséo: ‘grama de Combate a0 Bullying ou outros similares ainda é diminuta. Pesquisas indicam que as consequéncias geradas pelo bullying so to danosas que criangas e adolescentes norte-americanos identificam o problema como algo mais grave do que o racismo, presses para fazer sexo ou con- ‘sumir dleool e drogas. efetividade de programas como 0 Pro- Esse silenciar de politicas piblicas no que tange ao fendmeno ora abordado incide em graves problemas para ‘a sociedade nao apenas no presente, como também no futuro. E preciso notar que em um pais como o Brasil, onde o incentivo a melhoria da educagao de seu povo se tornou um instrumento socializador e de desenvolvimento, no qual grande parte das politicas sociais é voltada para a in- clusio escolar, devem as escolas passarem a ser 0 espaco proprio e mais adequado para a construgao coletiva e permanente das condigées favordveis para o pleno exercicio da cidadania. Medidas Preventivas Dentro do quadro preventivo do bullying, percebe-se como de fundamental importancia o envolvimento de professores, pais e alunos para estabelecer normas, diretrizes e ages coerentes. Assim, as acées devem priorizar ‘a conscientizagao geral; 0 apoio as vitimas de bullying, fazendo com que as mesmas se sintam protegidas; necesséria a conscientizacao dos agressores sobre a incorrecdo de seus atos, buscando-se dessa forma a garantia de um ambiente escolar seguro. Se deve encorajar os alunos a participarem ativamente da supervisao ¢ intervencao dos atos de bullying, pois o REDPOWERREDAGAO 2018 7 mrorosmoenoncto conosn [EJ enfrentamento da situago pelas testemunhas demonstra aos autores que eles no receberdo 0 apoio do grupo. Uma outra estratégia 6 a formacao de grupos de apoio, os quais protegem 0s alvos e auxiliam na solucdo das situa- ‘ges de bullying. ‘As escolas devem seguir em busca de um aperfeicoamento de suas técnicas de intervencdo, bem como buscar ‘a cooperacéo de outras instituigdes, como os centros de satide, conselhos tutelares ¢ redes de apoio social. O incentivo ao protagonismo dos alunos deve sempre ser visado, pois permitiré a sua participagdo nas decisdes no desenvolvimento do projeto, o que pode ser um instrumento ainda maior de sucesso. Normalmente néo hé necessidade da atuagao de profissionais especializados; pois a propria comunidade escolar esta apta a identificar seus problemas e apontar as melhores solugSes. O importante é a promocao de um ambiente escolar seguro e sa~ dio, no qual elementos como amizade, solidariedade e respeito as caracteristicas individuais de cada um de seus alunos seja recorrente. © papel mais util que os educadores podem assumir é o da criagdo de um contexto no qual os alunos possam refletir a respeito de sua experiéncia, examinar sua posigao e ampliar o alcance de sua perspectiva. Por fim, conclui-se que é fundamental a construco de uma escola que ndo se restrinja a ensinar apenas 0 con- tetido programatico, mas que também se comprometa em educar criancas ¢ adolescentes para a pratica de uma cidadania justa e eficaz. A familia tem grande poder de influéncia e transformagao na vida de criangas e adolescentes. No Brasil, entre- tanto, segundo pesquisa da OCDE ~ Organizagao para Cooperagio e Desenvolvimento Econémico, os pais parti- cipam pouco da vida escolar dos filhos. De acordo com a pesquisa, existe uma relacdo direta entre o engajamento das familias no processo de aprendizado e os bons resultados escolares. Vale mencionar que os melhores exemplos nesse campo vém de paises asiéticos, como Japao e Coréia do Sul, onde as maes chegam ao extremo de fazer cursos para aprender a ligdo dos filhos, nao é por acaso que tais estudantes estdo entre os melhores do mundo. ‘Além do envolvimento ativo na vida escolar dos filhos, a educagdo pela ¢ para a afetividade jé & um bom co- mego. O exercicio do afeto entre os membros de uma familia é pratica de toda educagio estruturada, que tem no didlogo 0 sustentaculo da relacao interpessoal. Além disso, a verdade e a confiabilidade so os demais elementos necessérios nessa relagao entre pais ¢ filhos. Adolescentes e criangas, neurolégica e psicologicamente, tem necessidade primordial de seguranga afetiva pare realizar a expresso de seu movimento ritmico. E a partir deste movimento que aprendem a pensar e, com isso, ‘a expressar sua percepgao vivencial. As situagées de violéncia produzem desorganizagaio emocional e afetiva e desembocam tanto no social, quanto no existencial, portanto, afetam a condi¢do humana no processo educative. Muitas vezes a vitima de bullying opta pelo siléncio e que alguns sinais devem ser observados pela familia, so cles: agir de forma estranha, isolando-se; apresentar frequentemente sinais de trauma como ferimentos ou hema- tomas para os quais no exista explicacao; chegar em casa com roupas rasgadas; apresentar panico na hora de ir & ‘escola; possuir problemas para dormir; apresentar mudancas de humor bruscas; parar de falar sobre a escola; en- contrar desculpas para faltar a escola; fazer subitamente novas amizades; demonstrar comportamento agressivo em casa, Hé algumas atitudes que a familia deve tomar ao detectar a ocorréncia de bullying, segundo o mesmo é preciso: levar o assunto a sério, nao buscando nunca a minimizagéo do ocortido; manter um dilogo aberto sobre o assunto; no imaginar que o bullying acabou porque a vitima deixou de tocar no tema; dar conselhos consistentes; reforcar a autoestima da vitima e ajudé-la em sua adaptacao ao grupo no qual encontra-se inserida; ndo agir sozinho; & importante compartilhar o tema com a escola e com outras familias que porventura estejam enfrentando o mesmo problema; a familia deve sempre lembrar a vitima de bullying o quanto ela 6 amada e encorajé-la sempre. Por fim, nunca se deve dizer ao jovem que 0 que est acontecendo faz parte de uma fase normal; no minimizar © problema; nunca se deve dizer que ele/ela esta sendo exageradamente sensivel; nunca se deve atribuir a eles a culpa por estarem sofrendo bullying nem que os colegas estdo apenas brincando. Diante do acima exposto, percebe-se que 6 de salutar importancia a presenca da familia como intermediadora ¢ até mesmo interventora de to delicado fenémeno normalmente enfrentado por criangas e adolescentes, que segundo a legislacao vigente so definidas como pessoas em desenvolvimento. Medidas Punitivas Os atos de bullying podem ser configurados como atos ilicitos, nao porque no esto autorizados pelo nosso cordenamento juridico, mas por desrespeitarem principios constitucionais (ex.: dignidade da pessoa humana) e 0 Cédigo Civil, que determina que “todo ato ilicito que cause danos a outrem gera o dever de indenizar” ‘Sendo vejamos: “Art, 927. Aquele que, por ato ilicito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a reparé-lo.” A escola é vista, tradicionalmente, como um local de aprendizado, avaliando o desempenho dos alunos com REDPOWERREDAGAO 2018 B mrorosmoenoncto conosn [EJ base nas notas dos testes de conhecimento eno cumprimento de tarefas académicas. No entanto, trés documentos, legais formam a base de entendimento com relacao ao desenvolvimento e educagao de criangas e adolescentes: a Constituicéo da Repiblica Federativa do Brasil, o Estatuto da Crianca e do Adolescente e a Convengao sobre os Di- reitos da Crianca da Organizacao das Nacées Unidas. Em todos esses documentos, esto previstos os direitos a0 respeito e a dignidade, sendo a educacao entendida como um meio de prover o pleno desenvolvimento da pessoa seu preparo para o exercicio da cidadania. E valido notar iniciativas como a da Promotoria de Justica da Infancia e da Adolescéncia da Paraiba que ela borou um requerimento para acrescentar os casos de bullying a0 DISQUE 100, numero nacional criado para de- nunciar crimes contra a crianga @ ao adolescente. Um fato interessante ocorreu no Estado de Minas Gerais, no qual a Justica condenou os pais de um aluno pra- ticante de bullying a pagar uma indenizacao de R$ 8.000,00 (oito mil reais) pela pratica de tal conduta no am-biente escolar contra outro estudante. A vitima que recebera indenizago ¢ uma menina de 15 anos, colega de sala do es- tudante agressor. Quando a deniincia foi oferecida, em 2008, eles cursavam a 7* série. Conforme a sentenga, 0 adolescente xingou e ofendeu sua colega, chamando-a de “g.e", que significaria “grupo das excluidas’, pelo fato de se relacionar com outras colegas que eram classificadas pelo estudante como “lésbicas A vitima foi classificada ainda de “interesseira” e “prostituta’ por ter comecado a namorar um colega mais rico no colégio. Os apelidos e insinuagdes ndo cessaram, mesmo apés os pais da aluna se queixarem & escola. A escola foi condenada a pagar 70% dos honorérios advocaticios da autora e parte das custas processuais. A prépria autora pagaré 20% de custas. A estudante requereu ainda uma orientagdo pedagégica ao adolescente, pedido nao aten- ido, pois o magistrado entendeu que ndo se deveria impor ao colégio tal orientagao pedagégica. Para ele, o exer- cicio do poder familiar, do qual decorre a obrigagdo de educar, segundo 0 artigo 1634, |, do Cédigo Civil, é atribui- ‘go dos pais ou tutores. © caso acima demonstra que plenamente cabivel a responsabilizacao civil nos casos de bullying, neste sen- tido, em principio, toda atividade que acarreta um prejuizo gera responsabilidade ou dever de indenizar. Haverd, or vezes, excludentes, que podem impedir a indenizagao, No caso de agressores civilmente incapazes (menores de 16 anos), quem deveré responder pelo ato sero os pais, na qualidade de responsaveis pelos filhos menores (Art. 832, |, Cédigo Civil), ou seus avés, na qualidade de tutores nomeados de seus netos menores (Art. 832, Il, Cédigo Civil). A responsabilidad pela prética de atos de bullying pode se enquadrar também no Cédigo de Defesa do Con- sumidor, tendo em vista que as escolas particulares prestam servico aos consumidores e so responsdveis por atos de bullying que ocorram nesse contexto, podendo-se dizer que nesses casos houve um defeito na prestagao do servigo. E importante atentar para 0 fato de que o contrato de prestagao de servigo educacional é, em regra, por ade~ ‘0, e no pode conter cléusulas que impossibilitem, exonerem ou atenuem a obrigagdo de indenizar do forne- cedor. O prazo prescricional previsto é de cinco anos, sendo que a identificagéo da autoria exigida pelo artigo nao std relacionada aos alunos agressores, mas sim com o estabelecimento de ensino e local de ocorréncia do fato lesivo. Em relagao a responsabilidade civil do Estado, a mesma ¢ aplicével no caso de instituig6es publicas de ensino, neste caso, a responsabilidade é objetiva e baseia-se na Teoria do Risco Administrativo, ‘A modalidade do Risco Administrativo pode ser conceituada como aquela em que o Estado sé responde por prejuizos que tiver ocasionado a terceiros, podendo afastar-se a hipétese de que o dano fol ocasionado por causas naturais, humanas ou culpa excessiva da vitima. Ampliando sev repertério sociocultural “A violéncia, seja qual for a maneira como ela se manifesta, sempre uma derrota.” Jean-Paul Sartre, flésofo, escritor e critico francés “Uma das coisas importantes da nGo violéncia & que néo busca destruir a pessoa, mas transformé-la." Martin Luther king, pastor protestante e ativista politico estadunidense “A adolescéncia é um segundo parto: nascer da fomilia para andar sozinho na sociedade.” I¢ami Tiba, professor, psiquiatra e médico brasileiro. “Criar uma erianga é facil, basta satisfazer-Ihe as vontades. Educar 6 trabalhoso.” Icami Tiba, professor, psiquiatra e médico brasil ReDPOWERREDAGAO 2018

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