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O Amor

C on j u g a l
(As Delícias da Sabedoria sobre o Amor Conjugal;
em seguida vem as V olúpias da Loucura do Amor
Escortatório)

Emanuel Sw edenborg

Publicado em latim,Amsterdã,1768

T radução para o francês por J.F.E.de Boys de G uays

T radução do francês para o português por João de M endonça Lima,

Livraria Freitas Bastos


R io de Janeiro

1963
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Índice
Preliminares sobre as alegrias do céu e sobre as núpcias no céu ........................................ 3
Dos casamentos no céu................................................................................................... 28
Do estado dos esposos depois da morte ........................................................................... 42
Do amor verdadeiramente conjugal ................................................................................ 53
Da origem do amor conjugal pelo casamento do bem e da verdade ................................. 79
Do casamento do Senhor e da igreja e de sua correspondência ........................................ 97
Do casto e do não-casto ................................................................................................ 114
Da conjunção das almas e das mentes pelo casamento, a qual é entendida por estas
palavras do Senhor: eles não sao mais dois mas uma só carne....................................... 130
Da mudança de estado da vida nos homens e nas mulheres pelo casamento .................. 149
Universais concernentes aos casamentos....................................................................... 165
Das causas das frieza, das separações e dos divórcios nos casamentos........................... 183
Das causas de amor aparente, de amizade aparente e de favor nos casamentos.............. 208
Dos esponsais e das núpcias ......................................................................................... 225
Dos casamentos reiterados............................................................................................ 243
Da poligamia................................................................................................................ 256
Do ciúme...................................................................................................................... 274
Da conjunção do amor conjugal com o amor dos filhos................................................. 291
Da oposição do amor escortatório e do amor conjugal................................................... 313
Da fornicação............................................................................................................... 328
Da concubinagem......................................................................................................... 341
Dos adultérios, de seus gêneros e de seus graus............................................................. 351
Do prazer libidinoso da defloraçao ............................................................................... 369
Do desejo libidinoso de variedades ............................................................................... 373
Do desejo libidinoso da violaçao................................................................................... 376
Do desejo libidinoso de seduzir inocentes ..................................................................... 378
Da correspondência das escortações com a violaçao do casamento espiritual................. 380
Da imputaçao de um e outro amor, o escortatório e o conjugal...................................... 384
3

Preliminares sobre as alegrias do


céu e sobre as núpcias no céu

1 - "Prevejo que muitos dos que lerão o que vai seguir, e os M emoráveis
colocados em seguida aos Capítulos, crerão que são invenções da imaginação;
todavia afirmo em verdade que não são coisas inventadas, mas que são coisas
que verdadeiramente aconteceram e foram vistas, não em um certo estado da
mente entorpecida, mas em um estado de plena vigília, pois aprouve ao Senhor
manifestar-Se a mim,e me enviar para ensinar as coisas que devem ser da N ova
Igreja, que é entendida no Apocalipse pela N ova Jerusalém; para isso, Ele abriu
os interiores da minha mente e do meu espírito; por isso me foi dado estar no
M undo Espiritual com os Anjos, e ao mesmo tempo no M undo N atural com
os H omens,e isto agora desde vinte e cinco anos".
2 - U m dia vi sob o Céu O riental um Anjo que voava, tendo na mão e à boca
uma trombeta,e a tocava para o Setentrião,para o O cidente e para o M eio-dia;
estava vestido com uma Clâmide, que pelo vôo flutuava para trás, e estava
cintado com uma faixa que lançava como que chama e luz pelos carbúnculos e
safiras; voava com o corpo inclinado e descia lentamente para a terra perto do
lugar onde eu estava; logo que tocou a terra endireitando-se sobre os pés, foi
para cá e para lá, e então me tendo visto, dirigiu seus passos para mim; eu
estava em espírito; e, nesse estado, permanecia sobre uma colina na Plaga
M eridional; e quando chegou perto de mim, lhe dirigi a palavra, dizendo: "O
que há agora,então? ouvi o som da trombeta,e te vi descer através dos ares". O
Anjo respondeu: Fui enviado para convocar os mais célebres em erudição, os
mais perspicazes em gênio,e os mais eminentes em reputação de sabedoria que,
saídos dos R einos do M undo Cristão, estão sobre a extensão desta terra, a fim
de que se reunam sobre esta colina onde estás, e declarem do fundo do coração
o que no M undo pensaram, compreenderam e apreciaram a respeito da Alegria
Celeste e da Felicidade Eterna. Eis qual foi o motivo da minha missão: alguns
recém-vindos do M undo, tendo sido admitidos em nossa Sociedade Celeste,
que está no O riente, contaram que, em todo o M undo Cristão, não há um
único homem que saiba o que é a Alegria Celeste e a Felicidade Eterna, nem
por conseqüência que é o Céu. M eus irmãos e consociados ficaram
extremamente surpreendidos, e me disseram: Desce, chama e convoca os mais
sábios no M undo dos espíritos onde são a princípio reunidos todos os M ortais
depois de sua saída do M undo N atural, a fim de que, pelo que sair da boca de
um grande número de sábios,fiquemos certos se é uma verdade que há entre os
Cristãos uma tal obscuridade ou uma tal ignorância tenebrosa sobre a vida
futura“. E disse: "Espera um pouco, e verás Coortes de sábios que se dirigem
para aqui; o Senhor preparará para eles uma Sala de Assembléia". Esperei, e eis
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que, depois de uma meia hora, vi duas companhias vindo do Setentrião, duas
do O cidente, e duas do M eio-dia, e à medida que chegavam, eram
introduzidos pelo Anjo da trombeta em uma Sala preparada; e aí tomavam os
lugares que lhes eram designados segundo as plagas. H avia seis T ropas ou
Coortes; tinha vindo do O riente uma sétima que, por causa de sua luz, não era
vista pelas outras. Q uando estavam reunidas, o Anjo expôs o motivo da
convocação, e pediu que as Coortes, segundo sua colocação, manifestassem sua
sabedoria sobre o assunto da Alegria Celeste e da Felicidade Eterna; e então
cada Coorte se formou em círculo; com as faces voltadas para as faces, para se
relembrar este assunto segundo as idéias recebidas no M undo precedente, e
examiná-lo agora, e depois do exame e da deliberação declarar o seu
sentimento.
3 - Depois da deliberação a Primeira Coorte, que era do Setentrião, disse "A
Alegria Celeste e a Felicidade Eterna são um com a vida mesma do Céu, é por
isso que, quem quer que entre no Céu entra quanto à sua vida nas alegrias do
Céu, absolutamente do mesmo modo que aquele que entra em uma sala de
núpcias,entra nas alegrias que aí se desfrutam; o Céu diante de nossa vista, não
está acima de nós, assim, em um lugar? e é lá, e não noutro lugar, que há
felicidade sobre felicidade e volúpias sobre volúpias; o homem é introduzido
nessas delícias quanto a toda percepção da mente e quanto a toda sensação do
corpo segundo a plenitude das alegrias desse lugar, quando é introduzido no
Céu; a felicidade celeste, que é eterna também, não é portanto outra cousa
senão a admissão no Céu, e admissão pela G raça Divina". Depois que a
Primeira Coorte assim falou, a Segunda do Setentrião tirou de sua sabedoria
este sentimento: "A Alegria Celeste e a Felicidade Eterna não são outra cousa
senão R euniões muito alegres com os Anjos e Conversações muito agradáveis
com eles, pelas quais as fisionomias expandidas são mantidas na alegria, e todas
as bocas em risos graciosos, excitadas por palavras agradáveis e assuntos
divertidos; e que poderão ser as alegrias celestes, senão as variedades destes
prazeres durante a eternidade?" A T erceira Coorte, que era a Primeira dos
sábios da Plaga O cidental, se exprimiu assim segundo os pensamentos de suas
afeições:“O que é a Alegria Celeste e a Felicidade Eterna,senão Banquetes com
Abrahão, Isaac e Jacob, em cujas mesas estarão M anjares delicados e
rebuscados, e V inhos generosos e excelentes; e, depois dos repastos, Jogos e
Coros de jovens virgens e de homens jovens dançando ao som de sinfonias e de
flautas entrecortadas por cânticos, melodiosos; e enfim, à noite, representações
teatrais; e, depois destas representações, novos repastos, e assim cada dia,
durante a eternidade". Depois a Q uarta Coorte, que era a Segunda da Plaga
O cidental, enunciou seu sentimento, dizendo: "Examinamos várias idéias a
respeito da Alegria Celeste e da Felicidade Eterna, e exploramos diversas
alegrias e as comparamos entre si, e concluímos que as Alegrias Celestes são
Alegrias Paradisíacas; o Céu é outra cousa mais do que um Paraíso, que se
estende do O riente ao O cidente, e do M eio-dia ao Setentrião? N o meio destas
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árvores e destas flores está a magnífica Arvore da V ida, em torno da qual estão
assentados os bem-aventurados, alimentando-se de frutas de um sabor delicado,
e ornados com grinaldas de flores de um odor muito suave; estas árvores e estas
flores sob a influência de uma primavera perpétua nascem e renascem cada dia
com uma variedade infinita; e por este nascimento e esta floração perpétuas, e
ao mesmo tempo por esta temperatura eternamente primaveril, os espíritos
(animi) continuamente renovados não podem deixar de aspirar e respirar
Alegrias renovadas cada dia, e assim reentrar na flor da idade, e por isso no
estado primitivo, em que Adão e sua esposa foram criados, e por conseqüência
ser recolocados em seu Paraíso, transferido da T erra para o Céu". A Q uinta
Coorte, que era a Primeira dos mais perspicazes em gênio da Plaga M eridional,
se exprimiu assim: "As Alegrias Celestes e a Felicidade Eterna não são outra
cousa senão Dominações sobreeminentes e T esouros imensos, e por
conseguinte uma magnificência mais que real, e um esplendor acima de todo
brilho; que as Alegrias do Céu, e o gozo dessas alegrias, que é a felicidade
eterna, sejam tais, é o que vimos claramente por aqueles que, no M undo
precedente, gozaram dessas vantagens; e, além disso, pelo fato de que os bem-
aventurados no Céu devem reinar com o Senhor, e ser reis e príncipes, porque
são filhos d'Aquele que é o.R ei dos reis e o Senhor dos senhores, e pelo fato de
que estarão sentados em tronos, e os Anjos os servirão. V imos claramente à
magnificência do Céu,pelo fato de que a N ova Jerusalém,pela qual é descrita a
glória do Céu,terá portas,cada uma das quais será uma Pérola, e terá Praças de
ouro puro, e uma M uralha cuja fundação será de pedras preciosas; que por
conseqüência quem quer que tenha sido recebido no Céu tem um Palácio
resplandecente de ouro e cousas de um grande preço, e que a Dominação aí
passa sucessivamente e em ordem de um a outro; e como sabemos que em
semelhantes cousas há alegrias inatas e uma felicidade inerente, e elas são
promessas irrevogáveis de Deus,não podemos tirar de outra parte o estado mais
feliz da vida celeste".Depois desta Coorte, a Sexta, que, era a Segunda da Plaga
M eridional, elevou a voz e disse: "A Alegria do Céu e a Felicidade Eterna não
são outra cousa senão uma perpétua glorificação de Deus, uma festa que dura
eternamente, e um culto de grande beatitude com cantos e gritos de alegria; e
assim uma constante elevação do coração para Deus, com plena confiança na
aceitação das preces e dos louvores por esta Divina munificência de beatitude.
Alguns desta Coorte ajuntaram que esta G lorificação se fará com magníficas
iluminações, com suaves perfumes e pomposas procissões à testa das quais
marcharão, com uma grande T rombeta, o soberano Pontífice, seguido dos
Primazes e Porta-maças, grandes e pequenos, e atrás deles H omens levando
palmas e mulheres tendo estatuetas de ouro nas mãos.
4 - A Sétima Coorte, que não era vista pelas outras por causa de sua luz, era do
O riente do Céu; compunha-se de Anjos da mesma Sociedade a que pertencia o
Anjo da trombeta; tendo sabido em seu Céu que, no M undo Cristão não havia
um único homem que soubesse o que era a Alegria do Céu e a Felicidade
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Eterna, estes Anjos tinham dito entre si: "Isso não pode ser verdade
absolutamente; é impossível que haja entre os cristãos uma tão grande
obscuridade, e um tal embotamento das mentes; desçamos nós também, e
saibamos se é verdade; e, se é a verdade, certamente é um prodígio". Então
estes Anjos disseram ao Anjo da trombeta: "T u sabes que todo homem que
desejou o Céu, e pensou alguma cousa de positivo a respeito das alegrias do
Céu, é introduzido depois da morte nas alegrias de sua imaginação; e que
depois que aprendeu pela experiência o que são essas alegrias, isto é, que são
segundo as vãs idéias de sua mente, e segundo os delírios de sua fantasia, é
afastado delas e instruído; é o que acontece no M undo dos Espíritos à maior
parte daqueles que, na vida precedente meditaram sobre o Céu, e que segundo
certas idéias assentadas a respeito das alegrias celestes, desejaram possuí-las".
Depois de ter ouvido estas palavras, o Anjo da trombeta disse às seis Coortes de
Sábios do M undo Cristão que ele tinha convocado: "Segui-me, e eu vos
introduzirei nas vossas Alegrias, por conseqüência no Céu". Depois de
pronunciar estas palavras, o Anjo seguiu em frente, e, em primeiro lugar, foi
seguido pela Coorte daqueles que se tinham persuadido de que as Alegrias
Celestes eram unicamente reuniões muito alegres e conversações muito
agradáveis. O Anjo os introduziu em Assembléias da Plaga Setentrional, que
não tinham tido, no mundo precedente, outras noções a respeito das Alegrias
do Céu. H avia lá uma Casa espaçosa na qual os que eram assim tinham sido
reunidos; esta Casa tinha mais de cinqüenta salas, distinguidas segundo os
diversos gêneros de palestras; em umas se falava do que se tinha visto e ouvido
nas praças públicas e nas ruas; em outras, se tratava de diversos assuntos
agradáveis sobre o belo sexo, entremeando-os com gracejos, multiplicados ao
ponto de espalhar o riso da alegria sobre todas as faces da Assembléia; em outras
salas, ocupavam-se de N ovidades das Cortes, dos M inistérios, do Estado
político,de diferentes cousas, que tinham transpirado dos Conselhos secretos, e
se faziam raciocínios e conjeturas sobre os acontecimentos; em outras, se falava
do comércio; em outras, de literatura; em outras, do que se relaciona com a
Prudência civil e a V ida moral; em outras, de cousas Eclesiásticas e de Seitas; e
assim por diante. Foi-me dado fazer uma inspeção nesta Casa, e vi pessoas que
corriam de sala em sala, procurando companhia conforme suas afeições e por
conseqüência conforme sua alegria; e, nas companhias, vi três espécies de
pessoas; umas ansiosas por falar, outras desejosas de perguntar, e outras ávidas
de ouvir. H avia quatro portas na Casa, uma para cada Plaga, e notei que
muitos deixavam as companhias e se apressavam para sair; segui alguns deles até
à porta O riental, e vi alguns outros assentados com ar triste perto desta porta;
aproximei-me, e lhes perguntei por que estavam sentados assim tristes, e eles
me responderam: "As portas desta Casa são conservadas fechadas para os que
querem sair; e eis que agora é o terceiro dia desde que entramos aqui; e que
aqui temos vivido, conforme o nosso desejo, em companhias e em
conversações; e estas conversas contínuas nos fatigam de tal modo, que mal
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podemos suportar ouvir o seu próprio burburinho; é por isso que levados pelo
enfado, viemos para esta porta, e temos, batido; mas nos responderam: "As
portas desta Casa se abrem, não para os que querem sair, mas para os que
querem entrar; ficai e gozai as alegrias do Céu"!Por estas respostas, concluímos
que ficaremos aqui eternamente; desde esse momento a tristeza se apoderou de
nossas mentes, e agora o nosso peito começa a se cerrar, e a ansiedade a se
apoderar de nós". Então o Anjo tomou a palavra e lhes disse: "Este estado é a
morte de vossas alegrias que acreditastes serem unicamente celestes, quando
entretanto não são mais do que acessórios das alegrias celestes". E eles disseram
ao Anjo: “O que é então a Alegria Celeste?" E o Anjo respondeu em poucas
palavras: "É o prazer de fazer alguma cousa que seja útil a si mesmo e aos
outros; e o prazer do uso tira do Amor a sua essência, e da Sabedoria a sua
existência; o prazer do uso que tira sua origem do Amor pela Sabedoria é a
alma e a vida de todas as Alegrias Celestes. H á nos Céus R euniões muito
agradáveis, que alegram as mentes dos Anjos, divertem suas mentes exteriores
(animi), deleitam seus corações, e recreiam seus corpos; mas não as gozam
senão depois de terem feito usos em suas funções e em suas obras, por isto há
alma e vida em todas as suas alegrias e em todos os seus divertimentos; mas que
se tire esta alma ou esta vida, e as alegrias acessórias deixam progressivamente
de ser alegrias, e se tornam a princípio indiferentes, e em seguida como nada, e
por fim não são mais que tristezas e ansiedades". Depois que ele assim falou, a
porta se abriu, e os que estavam sentados perto dela saíram precipitadamente; e
fugiram para suas casas, indo cada um para sua função e seu trabalho; e foram
aliviados.
6 - Em seguida o Anjo se dirigiu aos que se tinham formado da Alegria do Céu
e da Felicidade Eterna esta idéia, que eram Banquetes com Abrahão, Isaac e
Jacob; e, depois das refeições, jogos e espetáculos, e de novo refeições, e assim
durante a eternidade; e lhes disse: "Segui-me e eu vos introduzirei nas
felicidades de vossas alegrias". E os fez entrar, através de um bosque, em um
campo coberto por um estrado, sobre o qual haviam colocado mesas, quinze de
um lado e quinze do outro; e eles perguntaram: "Por que tantas mesas?" e o
Anjo respondeu: "A primeira mesa é a de Abrahão; a segunda, a de Isaac; a
terceira,a de Jacob; e perto destas estão em ordem as mesas dos doze Apóstolos;
do outro lado estão outras tantas mesas para suas esposas, as três primeiras são
as de Sarah esposa de Abrahão, de R ebeca esposa de Isaac, e Leah e R achel
esposas, de Jacob; e as outras doze, as das esposas dos doze apóstolos". Alguns
instantes depois, todas as mesas apareceram cobertas de iguarias e os pequenos
espaços, entre os pratos, ornados de pequenas pirâmides carregadas de toda
espécie de doces. O s que deviam tomar parte no banquete estavam em pé, em
torno das mesas, na expectativa de verem chegar os seus Presidentes; depois de
alguns momentos de espera, foram vistos entrar em ordem de marcha desde
Abrahão até ao último dos Apóstolos; e em seguida cada um deles, se
aproximou de sua mesa, colocando-se à cabeceira sobre um leito; e daí,
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disseram aos que se mantinham em pé em torno: “T omai lugar também


conosco". E eles tomaram lugar com estes Patriarcas, e as mulheres com suas
esposas e comeram e beberam com alegria e com veneração. Depois do repasto,
estes Patriarcas saíram; e então começaram jogos, danças de moças e rapazes;
depois das danças, espetáculos; terminados os espetáculos, os assistentes foram
convidados de novo para Festins, mas com este regulamento, que no primeiro
dia comeriam com Abrahão, no segundo com Isaac, no terceiro com Jacob, no
quarto com Pedro, no quinto com T iago, no sexto com João, no sétimo com
Paulo, e com os outros seguindo a ordem até ao décimo quinto dia, a partir do
qual retornariam os festins na mesma ordem, variando de lugares, e assim
durante a eternidade. Em seguida o Anjo convocou os homens da Coorte, e
lhes disse: "T odos aqueles que vistes nas mesas têm estado em um pensamento
imaginário semelhante ao vosso, sobre as Alegrias do Céu e sobre a Felicidade
Eterna; e a fim de que vejam por si mesmos a fragilidade de suas idéias e sejam
afastados delas, tais cenas de mesas foram instituídas, e permitidas pelo Senhor.
O s Presidentes, que vistes à cabeceira das mesas, eram Anciãos desempenhando
um papel, a maior parte de origem rústica, que tendo muita barba, e sendo
orgulhosos de uma certa opulência acima dos outros, tinham tido a fantasia de
que eram antigos Patriarcas. M as segui-me pelos caminhos que conduzem para
fora deste recinto", E eles o seguiram, e viram cinqüenta em um lugar, e
cinqüenta em um outro, que se tinham ingurgitado de alimento ao ponto de
sentir náuseas, e desejavam voltar para o interior de suas casas, uns a seus
empregos, outros a seu comércio, e outros a seu trabalho;, mas um grande
número estava retido pelos guardas do bosque, e interrogados sobre os dias de
seus repastos, se tinham comido também nas mesas de Pedro e de Paulo; e lhes
diziam que se saíssem antes, como isso era contrário à decência, eles seriam
cobertos de vergonha. M as a maior parte respondia: "Estamos saciados de
nossas alegrias, as iguarias se nos tornaram insípidas, e o nosso paladar está
ressecado, o estômago as desdenha, não podemos mais tocá-las; passamos
alguns dias e algumas noites nesta festança; pedimos insistentemente que nos
mandem embora". E tendo sido despedidos, fugiram ofegantes, correndo
precipitadamente para suas casas. Depois disso o Anjo chamou os homens da
Coorte; e em caminho, eis o que lhes ensinou sobre o Céu: "N o Céu, do
mesmo modo que no M undo, há Alimentos e Bebidas, há Festins e Banquetes;
e lá entre os Principais, há M esas sobre as quais são servidas iguarias delicadas,
cousas gostosas e rebuscadas, pelas quais as mentes exteriores (animi) são
alegradas e recreadas; há também Jogos e Espetáculos; há Concertos e Cânticos;
e tudo isso na maior perfeição; estas coisas são também alegrias para os Anjos,
mas não uma felicidade, esta deve estar nas alegrias, e por conseguinte provir
das alegrias; a felicidade nas alegrias faz com que sejam alegrias, as fertiliza e as
sustenta, a fim de que não se tornem nem banais nem fastidiosas; e esta
felicidade, cada um a possui pelo uso em sua função. N a afeição da vontade de
cada Anjo, há uma certa veia escondida; que atrai a mente para fazer alguma
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cousa, a mente por isso se tranqüiliza e se satisfaz; esta satisfação e esta


tranqüilidade tornam o estado da mente suscetível de receber do Senhor o
amor do uso; desta recepção vem a Felicidade Celeste que é a vida destas
alegrias de que já se falou. A Alimentação celeste, em sua essência, não é outra
cousa mais do que o amor, a sabedoria e o uso juntos, isto é, o uso pela
sabedoria do amor; é por isso que,no Céu,é dado a cada um o alimento para o
corpo segundo o uso que ele tem, suntuoso aos que estão em usos eminentes,
medíocre,mas de sabor agradável aos que estão em um uso de grau médio, e vil
aos que estão em um uso vil,mas não é dado aos preguiçosos.
7 - O Anjo chamou em seguida para junto dele a Coorte dos pretensos sábios,
que haviam colocado as Alegrias Celestes, e segundo estas Alegrias, a Felicidade
Eterna, nas Dominações sobreeminentes e nos T esouros imensos, e em uma
magnificência mais que real e em um esplendor acima de todo brilho; e isso
porque se diz na Palavra que eles serão reis e príncipes, que reinarão com
Cristo eternamente e serão servidos pelos Anjos, além de várias outras coisas; o
Anjo lhes disse: "Segui-me, e eu vos introduzirei nas vossas alegrias". E os
introduziu em um Pórtico composto de colunas e de Pirâmides; na frente havia
um átrio pouco elevado pelo qual havia acesso ao Pórtico; foi por esse átrio que
ele os introduziu; e eis que foram vistos vinte de um lado e vinte de outro lado,
e esperavam. E de repente apareceu alguém desempenhando o papel de um
Anjo, e lhes disse: "Por este Pórtico passa o caminho que conduz ao Céu;
espera! um pouco, e preparai-vos, porque os maiores dentre vós vão se tornar
R eis e os menores serão Príncipes". A estas palavras, perto de cada Coluna
apareceu um T rono, e sobre o T rono uma clâmide de seda, e sobre a clâmide
um cetro e uma coroa; e perto de cada Pirâmide apareceu um Assento elevado
de três côvados acima da terra, e sobre o assento uma cadeia de anéis de ouro e
cordões da ordem eqüestre reunidos pelas pontas com pequenos círculos de
diamantes. E então gritou-se: "Ide, agora; revesti-vos, assentai-vos e esperai''. E
no mesmo instante os G randes correram para os tronos, e os M enores para os
assentos, e se revestiram e se colocaram; mas então apareceu um nevoeiro
elevando-se dos infernos; os que estavam assentados nos tronos e nos assentos
tendo-o aspirado,as suas faces começaram a inchar,os seus corações a estufar, e
eles ficaram cheios de confiança de que eram agora reis e príncipes; este
nevoeiro era a aura (atmosfera) da fantasia de que estavam inspirados; e de
repente, acorreram, como vindos do Céu, mancebos; e se colocaram dois atrás
de cada trono, e um por trás de cada assento, para servir; e então, de tempos
em tempos, um arauto exclamava: "Sois reis e príncipes, esperai ainda um
pouco,neste momento se preparam no Céu as vossas cortes; os vossos cortesãos
vão chegar em breve com os vossos guardas, e vos introduzirão". Eles
esperavam e esperavam, a ponto que seus espíritos apenas respiravam e eram
excedidos por seu desejo. Depois de três horas de espera, o Céu se abriu acima
de suas cabeças, e os Anjos baixaram seus olhares sobre eles, e tiveram piedade
deles, e lhes disseram: "Por que estais assim sentados como loucos, a agir como
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histriões? Fizeram troça de vós, e de homens vos transformastes em ídolos; e


isso porque pusestes em vossos corações que reinaríeis com o Cristo como reis e
príncipes, e que então seríeis servidos pelos Anjos. Será que esquecestes estas
palavras do Senhor: "Q ue aquele que quer ser grande no Céu torna-se
servidor?" Aprendei pois o que é entendido pelos reis e príncipes, e pelo
reinado com o Cristo; sabei que é ser sábio e fazer usos; com efeito, o R eino do
Cristo,que é o Céu,é o R eino dos usos; pois o Senhor ama todos os homens, e
por conseguinte, quer o bem a todos, e o bem é o uso, e como o Senhor faz o
bem ou os usos mediatamente pelos Anjos, e no M undo pelos homens, é por
isso que àqueles que fazem fielmente os usos Ele dá o amor do uso, e a
recompensa do uso, que é a beatitude interna, e esta é a felicidade eterna. H á
nos Céus, como nas terras, Dominações sobreeminentes e T esouros imensos,
pois há governos, e formas de governo, e por conseqüência, há poderes maiores
e menores,dignidades maiores e menores, e aqueles que estão no supremo grau
dos poderes e das dignidades, têm Palácios e Cortes, que ultrapassam em
magnificência e em esplendor os palácios e as cortes; dos Imperadores e dos
R eis na terra, e são cercados de honra e de glória por numerosos cortesãos,
ministros e guardas, e pelas vestimentas magníficas destes; mas aqueles que são
assim elevados à categoria suprema são escolhidos entre aqueles cujo coração é
pelo bem público e cujos sentidos do corpo estão unicamente na grandeza e na
magnitude por causa da obediência; e como é do bem público que cada um
esteja em algum uso na sociedade como corpo comum, e como todo uso vem
do Senhor, e é feito pelos Anjos e pelos homens como por si mesmos, é
evidente que é isso reinar com o Senhor". Depois de terem ouvido estas
palavras pronunciadas do Céu, estes pretensos reis e príncipes desceram dos
tronos e dos assentos, e lançaram para longe deles os cetros, as coroas e as
clâmides; e o nevoeiro em que estava a atmosfera da fantasia se afastou deles, e
eles foram envolvidos por uma nuvem branca em que havia a atmosfera da
sabedoria que restituiu a saúde a suas mentes.
8 - O Anjo voltou em seguida à Casa da Assembléia dos sábios do M undo
Cristão e chamou a si aqueles que se tinham persuadido de que as Alegrias do
Céu e a Felicidade Eterna eram delícias paradisíacas; e lhes disse: "Segui-me, e
vos introduzirei no Paraíso, vosso Céu, a fim de que comeceis a gozar das
beatitudes de vossa felicidade Eterna". E ele os introduziu por uma Porta
elevada, construída com um entrelaçamento de ramos e vergônteas de árvores
preciosas, depois que entraram, conduziu-os por caminhos sinuosos de região
em região; era efetivamente um Paraíso na primeira entrada do Céu, Paraíso a
que são enviados aqueles que, no M undo, acreditaram que o Céu inteiro é um
Paraíso único porque é chamado Paraíso, e que têm impressa em si a idéia de
que depois da morte há inteira cessação do trabalho e que esse repouso
consistirá unicamente em respirar delícias, em passear sobre rosas, em se
deleitar com o suco das uvas mais finas, em celebrar festas e festins; e que esta
vida não pode existir senão no Paraíso Celeste. Conduzidos pelo Anjo, eles
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viam uma grande multidão tanto de velhos como de moços e crianças, e


também mulheres e mocinhas, de três em três, e de dez em dez, sentadas nos
bosques de roseiras, entretecendo grinaldas com que ornavam as cabeças dos
velhos,os braços dos moços,e com ramalhetes os peitos das crianças; em outros
lugares, colhendo frutas das árvores, e levando-as em cestas para seus
companheiros; em outros lugares espremendo em taças o suco das uvas, das
cerejas e das groselhas, e bebendo-o com prazer; em outros lugares, aspirando
os perfumes exalados pelas flores, pelas frutas e pelas folhas odoríferas, e
espalhadas por toda parte; em outros lugares, cantando odes melodiosas com
que deliciavam os ouvidos dos que estavam presentes; em outros lugares,
assentadas perto de fontes, e de águas que jorravam tomando formas diversas;
em outros lugares, passeando, conversando e lançando exclamações alegres; em
outros lugares, correndo, brincando, aqui aos pares, lá em rodas; em outros
lugares, retirando-se para caramanchões no meio de jardins, para aí repousar
em leitos; sem falar de muitas outras alegrias paradisíacas. Depois que viram
todos esses grupos,o Anjo conduziu seus companheiros por circuitos aqui e ali,
e por fim para outros espíritos que estavam sentados em um bosque de roseiras
muito bonito, cercado de oliveiras, de laranjeiras e de limoeiros, e que, com a
cabeça inclinada e as mãos sobre as faces, gemiam e derramavam lágrimas; os
que acompanhavam o Anjo lhes dirigiram a palavra, e disseram: "Por que estais
assim sentados?" E eles responderam: "Faz hoje sete dias que chegamos a este
Paraíso, quando entramos, a nossa mente parecia ter sido elevada ao Céu e
mergulhado nas beatitudes íntimas de suas alegrias; mas, ao cabo de três dias
estas beatitudes começaram a diminuir e a se apagar em nossas mentes, e a se
tornarem insensíveis, e por conseguinte nulas; e quando as nossas alegrias
imaginárias assim se dissiparam, tememos a perda de todo atrativo de nossas
vidas, e nos tornamos, em relação à felicidade eterna, incertos quanto à sua
existência; desde esse momento temos andado errantes pelas aléias e pelas
praças, procurando a porta pela qual entramos; mas temos andado em vão, de
circuito em circuito; e temos interrogado os que encontramos e alguns nos
disseram: "N ão se acha a porta, porque este Jardim Paradisíaco é um vasto
labirinto, de tal natureza que aquele que quer sair dele, cada vez embrenha-se
mais; não podeis, portanto, fazer outra cousa que não seja permanecer aqui
eternamente; estais agora no meio, onde todas as delícias estão concentradas".
Além disso,disseram aos que acompanhavam o Anjo:"Faz agora um dia e meio
que estamos aqui sentados, e como não temos esperança de encontrar uma
saída, nos recolhemos neste bosque de roseiras, e vemos com abundância em
torno de nós olivas, uvas, laranjas e limões, mas quanto mais os olhamos, mais
se cansa a vista vendo, o olfato cheirando, e o paladar provando; eis a causa da
tristeza, dos gemidos e das lágrimas que vedes em nós". O Anjo da Coorte,
tendo ouvido estas palavras lhes disse: "Este Labirinto Paradisíaco é
verdadeiramente uma entrada do Céu, conheço uma saída e vos farei sair". A
estas palavras os que estavam sentados se levantaram e abraçaram o Anjo, e o
12

seguiram com sua Coorte; e no caminho o Anjo lhes ensinou o que é a Alegria
Celeste e por conseguinte a Felicidade Eterna. "N ão são as delícias paradisíacas
externas, a não ser que haja ao mesmo tempo Delícias Paradisíacas internas; as
delícias paradisíacas externas são unicamente dos sentidos do corpo, mas as
delícias paradisíacas internas são delícias,das afeições da alma; se estas não estão
naquelas, não há vida celeste, porque não há alma nas delícias externas; e toda
delícia sem sua alma correspondente definha e se entorpece pela continuidade,
e fatiga, mais que o trabalho, a mente exterior (animus). N os Céus há por toda
parte jardins paradisíacos, e os Anjos ai encontram também alegrias, e quanto
mais aí colocam a delícia da alma, tanto mais estas alegrias são para eles
alegrias".A essas palavras todos perguntaram o que é a delícia da alma, e donde
vem; o Anjo respondeu: "A delícia da alma vem do amor e da sabedoria
procedentes do Senhor,e como é este amor que age, e age pela sabedoria, é por
isso que a sede de um e da outra está na ação, e a ação é o uso; esta delícia
influi do Senhor na alma, e desce pelos superiores e pelos inferiores da mente a
todas as cousas do corpo, e aí se completa; daí a alegria tornar-se alegria, e
torna-se eterna pelo Eterno de Q ue procede. V istes, Jardins Paradisíacos, e eu
vos asseguro que neles não há a menor cousa, nem mesmo a menor folha, que
não provenha do casamento do amor e da sabedoria no uso; se portanto, o
homem está neste casamento,está no Paraíso Celeste,e assim no Céu.
9 - Em seguida o Anjo condutor voltou à Casa para junto dos que se tinham
firmemente persuadido de que a Alegria Celeste e a Felicidade Eterna são uma
perpétua G lorificação de Deus e uma Festa que dura toda a eternidade; e isso
porque no M undo tinham crido que então veriam a Deus, e porque a vida do
Céu,por causa do culto a Deus, é chamada um Sabbath perpétuo. O Anjo lhes
disse: "Segui-me, e eu vos introduzirei em vossa alegria". E os fez entrar em
uma cidadezinha, no meio da qual havia um T emplo, e cujas casas eram todas
denominadas casas sagradas. N esta cidade, viram uma afluência de espíritos de
todos os quadrantes da região circunvizinha, e entre eles um grande número de
Padres que recebiam os que chegavam,saudavam-nos e lhes apertavam as mãos,
os conduziam às portas do T emplo, e de lá para algumas moradas sagradas em
torno do T emplo, e os iniciavam no culto contínuo de Deus, dizendo: "Esta
Cidade é o vestíbulo do Céu, e o T emplo desta cidade é a entrada para o
magnífico e vastíssimo T emplo, que está no Céu, onde Deus é glorificado
durante a eternidade pelas preces e os louvores dos Anjos; as ordenanças, aqui e
no Céu,são que é preciso primeiro entrar no T emplo, e aí permanecer três dias
e três noites; e depois desta iniciação, é preciso entrar nas casas desta cidade,
que são outras tantas moradas santificadas para nós, e passar de uma para a
outra; e aí, em comunhão com os que nelas estão reunidos, orar, exclamar em
altas vozes, e recitar orações; tende muito cuidado de não pensar em vós
mesmos e de não dizer aos vossos consociados senão cousas santas, piedosas e
religiosas". O Anjo introduziu portanto a sua coorte no T emplo; ele estava
cheio com uma multidão muito compacta, composta de muita gente que no
13

M undo tinha estado em grande dignidade,e também com muita gente do povo
miúdo; e tinham sido colocados guardas nas portas, a fim de que não fosse
permitido a pessoa alguma sair antes de ter ficado aí três dias; e o Anjo disse:
"Faz agora dois dias que estes entraram; examinai-os, e vereis como eles
glorificam a Deus".E eles os examinaram e viram a maior parte dormindo, e os
que estavam acordados não cessavam de bocejar; alguns tendo, por uma
contínua elevação de seus pensamentos para Deus, sem nenhuma volta ao
corpo, a face como que separada do corpo, pois apareciam assim a eles mesmos
e por conseguinte também aos outros; outros tendo olhares esgazeados à força
de voltá-los continuamente para cima; em uma palavra, tendo todos o coração
cerrado e o espírito abatido pelo tédio,e se afastavam do púlpito e exclamavam:
"O s nossos ouvidos estão aturdidos; acabai esses sermões, não ouvimos mais
nenhuma palavra, e o som da vossa voz se nos tornou fastidioso". E então se
levantaram e correram em massa para as portas,forçando-as e se lançaram sobre
os guardas e os expulsaram. O s Padres vendo isso, os seguiram e se puseram ao
lado deles, pregando e pregando, orando, suspirando dizendo: "Celebrai a
Festa, glorificai a Deus, santificai-vos; neste vestíbulo do Céu, nós vos
iniciaremos na G lorificação eterna de Deus no magnífico e vastíssimo T emplo
que está no Céu, e assim no gozo da felicidade eterna". M as eles não
compreendiam estas palavras, e mal as ouviam, por causa do abatimento da
mente pela suspensão e pela cessação, durante dois dias de todas as atividades
domésticas e públicas. Entretanto, como eles se esforçavam por escapar aos
padres, os padres os agarravam pelos braços, e também pelas roupas, os
empurravam para as moradas sagradas onde os sermões deviam ser pregados;
mas era em vão, e gritavam: "Deixem-nos, sentimos no corpo como que um
desfalecimento".N esse instante,eis que apareceram quatro H omens vestidos de
branco e com tiaras; um deles tinha sido Arcebispo no M undo, e os outros três
tinham sido Bispos; tinham se tornado Anjos; chamaram os Padres; e,
dirigindo-lhes a palavra, disseram: "N ós vos vimos do Céu com estas ovelhas;
como as apascentais? V ós as apascentais até enlouquecê-las; não sabeis o que é
entendido pela glorificação de Deus; é entendido produzir frutos de amor, isto
é, fazer fielmente, sinceramente e cuidadosamente o trabalho de sua função,
pois isto pertence ao amor de Deus e ao amor do próximo, e isto é o liame da
sociedade e o bem da sociedade; por isto Deus é glorificado, e o é então pelo
culto que se lhe presta em tempos determinados; não lestes estas palavras do
Senhor: "N isto é G lorificado meu Pai, que deis muito fruto, e que vos torneis
meus discípulos? (João, X V , 8)". V ós, Padres, podeis estar na glorificação do
Culto, porque é a vossa função, e nela encontrais honra, glória e remuneração;
mas vós, entretanto, não poderíeis estar, mais do que eles, nesta glorificação, se
ao mesmo tempo com vossa função não houvesse honra,glória e remuneração".
Depois de ter assim falado, os Bispos ordenaram aos guardas da porta que
deixassem cada um entrar e sair; há, com efeito, uma multidão de homens que
não pensou em uma alegria Celeste que não fosse o culto perpétuo de Deus,
14

porque nada sabiam do estado do Céu.


10 - O Anjo, com os que o haviam acompanhado, voltou em seguida à sala da
Assembléia, de onde as coortes de Sábios não se tinham ainda retirado; e lá,
chamou para junto dele aqueles que acreditavam que a alegria celeste e a
felicidade eterna não são senão a admissão no Céu, e a admissão pela graça
Divina; e que então os que são admitidos têm a mesma alegria daqueles que, no
M undo, entram nas Cortes dos R eis nos dias de regozijo, ou que convidados
para núpcias entram na sala do festim. O Anjo lhes disse: "Esperai aqui um
pouco, eu vou tocar a trombeta, e aqueles que tem uma grande reputação de
sabedoria nas cousas espirituais da Igreja virão aqui". Depois de algumas horas
apareceram nove homens, coroados de louro em sinal de sua reputação; o Anjo
os introduziu na sala da Assembléia, onde estavam presentes todos os que
tinham sido precedentemente convocados; o Anjo, dirigindo em sua presença a
palavra aos nove homens coroados de louro,disse:"Sei que,segundo vosso voto
conforme à vossa idéia, vos foi dado subir ao Céu, e que voltastes a esta terra
inferior ou subceleste, com um inteiro conhecimento do estado do Céu; contai
portanto como vos pareceu o Céu". E eles responderam, um após outro; e o
Primeiro disse:"A minha idéia sobre o Céu,desde minha infância até ao fim de
minha vida no M undo, tinha sido que era o lugar de todas as beatitudes, e de
todas as diversões, prazeres, encantos e volúpias, e que se eu fosse admitido lá,
eu me encontraria cercado pela atmosfera dessas' felicidades, e respiraria a
plenos pulmões, como um noivo quando celebra suas núpcias, e entra com sua
noiva no leito nupcial; com esta idéia eu subi ao Céu, e passei os primeiros
guardas, e também os segundos, mas quando cheguei aos terceiros, o chefe dos
guardas me dirigiu a palavra e me disse: "Q uem és amigo?" E eu respondi:
"N ão é aqui o Céu?" Subi até aqui pelo voto do meu desejo; peço-te que me
deixes entrar!" E ele me deixou entrar; e vi Anjos vestidos de branco, e eles me
cercaram, e me examinaram, e disseram baixinho: "Eis um novo hóspede que
não tem a vestimenta do Céu", e eu ouvi estas palavras e tive este pensamento:
"Parece-me que se dá comigo como com aquele de quem o Senhor disse que
tinha entrado no festim de núpcias, sem uma vestimenta nupcial; e disse: Dai-
me vestimentas do Céu,eles,porém,se puseram a rir; e então acorreu um Anjo
da Corte com esta ordem: “Ponham-no completamente nu, expulsai-o, e jogai
suas roupas atrás dele''; e fui assim expulso. O Segundo em ordem disse: eu
acreditava, como ele, que se fosse apenas admitido no Céu, que está acima da
minha cabeça, as alegrias me cercariam e eu poderia gozá-las eternamente;
obtive assim o que havia desejado; mas vendo-me os Anjos fugiram, e disseram
entre si: "Q ue prodígio é este?'' Com efeito, senti uma mudança como se eu
não fosse mais homem, ainda que eu não tivesse mudado; isso provinha, em
mim, da atração da atmosfera celeste; mas em breve acorreu um Anjo da Corte
com esta ordem, que dois servidores me fizessem sair e retornar ao caminho
pelo qual eu tinha subido para me reconduzir à minha casa; e quando cheguei
em casa, apareci aos outros e a mim mesmo como homem". O T erceiro disse:
15

"A idéia do Céu era constantemente para mim uma idéia de lugar e não do
amor; é por isso que, quando cheguei a este mundo, desejei com vivo ardor o
Céu; e vi espíritos que subiam, e eu os segui, e fui admitido, mas não além de
alguns passos; ora, quando quis alegrar minha mente (animus) com a idéia das
alegrias e das beatitudes celestes, pela luz do Céu, que era branca como a neve,
e cuja essência se diz ser a sabedoria, a minha mente foi tomada de estupor e
por conseqüência os meus olhos foram cobertos de obscuridade, e eu comecei a
ficar insensato; e em breve, pelo calor do Céu, que correspondia à brancura
resplandecente desta luz, e cuja essência se diz ser o amor, meu coração
palpitou, a ansiedade se apoderou de mim, e fiquei atormentado por uma dor
interior, e me lancei por terra, estendido sobre o dorso; e, enquanto estava
assim deitado, um guarda veio da Corte com a ordem de me fazer transportar
docemente para a minha luz e o meu calor; quando para aí voltei, o meu
espírito e o meu coração me voltaram". O Q uarto disse: "Eu também, a
respeito do Céu, estava na idéia do lugar e não da idéia do amor, e desde que
cheguei ao M undo espiritual, perguntei aos sábios se era permitido subir ao
Céu; eles me disseram que isso era permitido a cada um, que era preciso tomar
cuidado para não ser expulso; esta resposta me fez rir, e eu subi, acreditando,
eu como os outros, que todos no M undo inteiro podem receber as alegrias do
Céu em sua plenitude; mas com efeito desde que entrei me achei quase sem
vida, e não podendo suportar a dor e o tormento que sentia na cabeça e no
corpo, me lancei por terra, e rolava como uma serpente aproximada do fogo, e
rastejei até a um precipício e me lancei nele; e em seguida fui levantado pelos
que estavam em baixo, e levado para uma hospedaria, onde a saúde me foi
restabelecida". O s cinco outros contaram também cousas admiráveis que lhes
tinham acontecido quando subiram ao Céu; e comparavam as mudanças de
estado de sua vida com o estado dos peixes tirados da água para o ar, e com o
estado dos pássaros no éter; e disseram que depois dessas duras provas não
tinham mais desejado o Céu, mas unicamente uma vida conforme à dos seus
semelhantes, em qualquer lugar que fosse; acrescentaram: "Sabemos que no
M undo dos espíritos, onde estamos, todos são preparados, primeiro, os bons
para o Céu e os maus para o Inferno; e que, quando estão preparados vêem os
caminhos abertos para eles em direção às Sociedades de seus semelhantes, com
os quais devem permanecer durante a eternidade; e que então entram nesses
caminhos com prazer, porque são os caminhos do seu amor". T odos os da
primeira Convocação, ouvindo estas declarações, confessaram também que não
tinham tido igualmente outra idéia do Céu senão como de um lugar, onde se
saboreia de boca cheia durante toda eternidade alegrias de que se é inundado.
Em seguida o Anjo da trombeta lhes disse:"V edes agora que as Alegrias do Céu
e a Felicidade eterna não pertencem ao lugar, mas pertencem ao estado de vida
do homem; ora o estado da vida celeste vem do amor e da sabedoria; e como o
uso é o continente de um e da outra,o estado da vida celeste vem da conjunção
do amor e da sabedoria no uso; é o mesmo se se disser da Caridade, da Fé e da
16

Boa O bra, pois a Caridade é o Amor, a Fé é a V erdade donde procede a


Sabedoria, e a Boa O bra é o U so; além disso, em nosso M undo Espiritual há
lugares como no M undo N atural, de outra forma não haveria habitações nem
moradas distintas; todavia, o lugar não e um lugar, mas é a aparência de um
lugar segundo o estado do amor e da sabedoria, ou da caridade e da fé. Q uem
se torna Anjo carrega interiormente em si o seu Céu, porque carrega
interiormente em si o amor de seu Céu, pois o homem por criação é uma
pequenina efígie, a imagem e o tipo do grande Céu; a forma humana não é
outra cousa; é por isso que cada um vem à sociedade do Céu, de que é a forma
em uma efígie singular; é por isso que, quando entra nesta sociedade, entra em
uma forma correspondente a si mesmo. Assim entra nesta sociedade como de si
em si, e ela entra nele como dela nela, e tira a vida desta sociedade como sendo
dele, e tira a sua como sendo desta sociedade; cada sociedade é como um
Comum, e os Anjos aí estão como partes singulares pelas quais coexiste o
Comum. R esulta, portanto dai que os que estão nos males e por conseguinte
nos falsos formaram em si uma efígie do Inferno, e esta efígie é atormentada no
Céu pelo influxo e a violência da atividade do oposto contra o oposto, pois o
amor infernal é oposto ao amor celeste, e por conseguinte os prazeres destes
dois amores combatem um contra o outro como inimigos, e se matam quando
se encontram".
11 - Estas diversas provas tendo terminado, ouviu-se do Céu uma voz, dizendo
ao Anjo da trombeta: "Escolhe dez dentre todos os que foram convocados, e os
introduz junto a nós; sabemos que o Senhor os preparará, a fim de que o calor
e a luz ou o amor e a sabedoria de nosso Céu, não os prejudique em nada
durante três dias". E foram escolhidos dez deles, e seguiram o Anjo; e por um
caminho inclinado, subiram a uma colina, e daí, a uma M ontanha, onde estava
o Céu destes Anjos, o qual a princípio lhes tinha aparecido a uma certa
distância como uma Extensão nas nuvens; e as portas se abriram para eles; e,
depois que passaram a terceira, o Anjo introdutor correu para o Príncipe desta
Sociedade ou deste Céu, e anunciou a sua chegada; e o Príncipe respondeu:
"T oma alguns da minha guarda, e anuncia aos que se apresentam que a sua
vinda me é agradável,e os introduz em meu Á trio, e dá a cada um seu quarto e
seu gabinete; toma também alguns dos meus cortesãos e de meus servidores
para lhes prestar bons ofícios, e servi-los ao menor sinal". E foi feito assim.
M as, quando foram introduzidos pelo Anjo, perguntaram se era permitido se
aproximar e ver o Príncipe; e o Anjo respondeu: "É ainda de manhã, e isso não
é permitido antes do meio-dia; todos, até esse momento, estão em suas funções
e em suas ocupações; mas fostes convidados para jantar; e então estareis
sentados à mesa com nosso Príncipe; enquanto esperais, vou introduzir-vos em
seu Palácio,onde vereis coisas magníficas e resplandecentes".
12 - Q uando chegaram perto do Palácio, viram primeiro o seu exterior, era
vasto, construído em pórfiro sobre fundações de jaspe, diante da porta (havia)
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seis altas colunas de pedra lazuli, o teto (era) de lâminas de ouro, (tinha) altas
janelas de um cristal extremamente transparente, as suas esquadrias (eram)
também de ouro. Em seguida, foram introduzidos no interior do Palácio, e
conduzidos de apartamento em apartamento; e viram ornamentos de uma
beleza inefável; nos tetos (havia) decorações de uma cinzeladura inimitável;
perto das paredes, (havia) mesas de prata damasquinada de ouro, sobre as quais
estavam diversos utensílios de pedras preciosas e de pérolas finas em formas
celestes; e muitas outras cousas que ninguém viu sobre a terra, e as quais, em
conseqüência, ninguém podia acreditar que existissem no Céu. Como a vista
destes objetos magníficos lhes produzia admiração, o Anjo lhes disse: "N ão,
fiqueis surpreendidos; os objetos que vistes não são feitos nem fabricados pela
mão dos Anjos, mas são compostos pelo Artífice do U niverso, e dados de
presente a nosso Príncipe; é por isso que aqui a Arte arquitetônica está em sua
arte mesma, e dela são derivadas todas as regras desta arte no M undo". O Anjo
acrescentou: "Poderíeis presumir que tais cousas encantam os nossos olhos e os
deslumbram a ponto de nos fazer crer que estão nelas as alegrias do nosso Céu;
mas como não pomos os nossos corações unicamente nessas cousas, pois elas
são acessórios para as alegrias de nossos corações, resulta que quanto mais as
contemplamos como acessórios, e como obras de Deus, tanto mais
contemplamos nelas a Divina O nipotência e a Divina Clemência".
13 - Em seguida o Anjo lhes disse: "Ainda não é M eio-dia, vinde comigo ao
Jardim de nosso Príncipe, ele é contíguo a este Palácio". E eles foram, e na
entrada ele lhes disse: "Eis um Jardim mais magnífico do que os outros jardins
desta Sociedade Celeste". E eles responderam: "Q ue dizes? N ão há aqui um
jardim,nós só vemos uma única Arvore, e em seus galhos e em seu cimo frutos
de ouro e como que folhas de prata, e seus bordos ornados de esmeraldas; e sob
esta Arvore crianças com suas amas". Então o Anjo disse com uma voz
inspirada: "Esta Arvore está no meio do Jardim, e é chamada por nós a Arvore
de nosso Céu, e por alguns a Arvore da vida. M as avançai e aproximai-vos, e
vossos olhos serão abertos, e vereis o Jardim". E fizeram assim; e seus olhos
foram abertos, e eles viam Amores carregadas de frutos saborosos, cercadas de
vinhas com seus cachos, cujas extremidades se inclinavam com seus frutos para
a Arvore da vida que estava no meio. Estas árvores estavam plantadas em uma
série contínua, que partia e se prolongava em curvas ou voltas contínuas como
os de uma hélice sem fim; era uma H élice perfeita de árvores, na qual as
espécies seguiam as espécies sem interrupção segundo a excelência dos frutos; o
começo da formação das voltas era separado da Arvore do meio por um
intervalo considerável,e o intervalo brilhava com um clarão de luz, pelo qual as
árvores da volta resplandeciam com um esplendor sucessivo e contínuo desde as
primeiras às últimas; as primeiras destas árvores eram as mais excelentes de
todas, abundantemente carregadas dos melhores frutos; eram chamadas árvores
paradisíacas; e não se viu delas em parte alguma, porque não há e não pode
haver delas nas terras do M undo natural; e em seguida a estas árvores, estavam
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oliveiras, depois destas cepas de vinhas, depois árvores odoríferas, e enfim


madeiras de construção. Aqui e ali, nesta H élice de árvores ou nesta série de
voltas, havia Assentos, formados com ramos novos das árvores aproximadas e
entrelaçadas por trás, e enriquecidos e ornados com seus frutos. N esta curva
continua de árvores havia portas que se abriam para canteiros, de onde se
passava para lugares de verduras distribuídas em faixas e em leitos. O s que
acompanhavam o Anjo exclamaram vendo isso: "Eis o Céu em forma! Para
qualquer lado que voltemos os olhos influi algum celeste paradisíaco que é
inefável". O Anjo ouvindo estas palavras, sentiu alegria, e disse: "T odos os
Jardins de nosso Céu são Formas representativas ou T ipos das beatitudes
celestes em suas origens; e como o influxo dessas beatitudes elevou as vossas
mentes,exclamastes:Eis o Céu em forma!mas os que não recebem este influxo
não encaram estes objetos paradisíacos senão como objetos campestres; e
recebem o influxo todos aqueles que estão no amor do uso; mas não o recebem
aqueles que estão no amor da glória, e não do uso". Ele lhes explicou em
seguida e lhes ensinou o que cada objeto deste jardim representava e
significava.
14 - Enquanto recebiam estas instruções, veio um mensageiro da parte do
Príncipe que os convidou para comer pão com ele; e ao mesmo tempo dois
guardas da corte trouxeram vestimentas de linho fino, e disseram: "R evesti-vos
com elas, porque ninguém é admitido à mesa do Príncipe a não ser que esteja
com vestimenta do Céu". E eles se prepararam e acompanharam seu Anjo, e
foram introduzidos no H ipetro, pátio de passeio do Palácio, e esperaram o
Príncipe; e aí,o Anjo os pôs em relação com os G randes e os G overnadores que
esperavam também o Príncipe; e eis que depois de algum tempo, as portas se
abriram, e por uma porta mais larga do lado do O cidente eles viram a entrada
do Príncipe com a ordem e a pompa de um cortejo. Adiante dele marchavam
os Conselheiros assistentes, depois destes os Conselheiros camaristas, e em
seguida os Principais da corte; no meio destes estava o Príncipe, e depois dele
os cortesãos de diversas categorias, e por fim, os guardas, todos formavam um
conjunto de cento e vinte. O Anjo se mantinha de pé diante dos dez recém
vindos, que por suas vestimentas pareciam então como comensais, aproximou-
se com eles do Príncipe, e lhos apresentou respeitosamente; o Príncipe sem
diminuir sua marcha, lhes disse: "V inde comigo ao pão". E eles o seguiram a
Sala de jantar, e viram uma mesa magnificamente servida, e no meio da mesa
uma alta Pirâmide de ouro com pratos fundos em tríplice ordem sobre seus
suportes, contendo pães açucarados e geléias de vinho doce com outras cousas
delicadas preparadas com pão e vinho; e do meio da Pirâmide saía como que
uma fonte que jorrava um vinho fino de néctar,e cuja veia se dividia no alto da
Pirâmide e enchia as taças. Aos lados desta alta Pirâmide estavam diferentes
formas celestes em ouro, sobre as quais estavam travessas e pratos cobertos de
toda sorte de iguarias; as formas celestes, sobre as quais estavam as travessas e
pratos, eram formas de arte segundo a sabedoria, que não podem, no M undo,
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ser traçadas por nenhuma arte, nem descritas por nenhuma expressão; as
travessas e os pratos eram de prata, cinzelada em formas semelhantes nos
bordos e nos fundos, com seus suportes; as taças eram pedras preciosas
transparentes; tal era a coberta da mesa.
15 - O ra, eis qual era a vestimenta do Príncipe e de seus M inistros: o Príncipe
estava vestido com um hábito comprido cor de púrpura, recamado de estrelas
bordadas cor de prata; sob o hábito, trazia uma túnica de seda brilhante cor de
jacinto; esta túnica era aberta no peito, onde se via a parte anterior de uma
espécie de cinto com a Insígnia de sua Sociedade; a Insígnia era uma Á guia
cobrindo seus filhotes no cimo de uma árvore; era de ouro brilhante, cercada
de diamantes. O s Conselheiros Assistentes não estavam vestidos de outro
modo, mas sem esta Insígnia, em lugar dela tinham safiras gravadas que
pendiam de um colar de ouro no seu pescoço. O s cortesãos tinham hábitos de
cor castanho-claro, sobre os quais havia em relevo flores em torno de aguietas;
as túnicas sob estes hábitos eram de seda cor de opala; da mesma eram também
as vestes que cobriam as coxas e as pernas.T al era seu Costume.
16 - O s Conselheiros Assistentes, os Conselheiros Camaristas e os
G overnadores ficaram em pé, em torno da mesa, e à ordem do Príncipe
juntaram as mãos, e pronunciaram ao mesmo tempo em voz baixa um louvor
votivo ao Senhor; e em seguida, a um sinal do Príncipe, se puseram à mesa em
leitos; e o Príncipe disse aos recém-vindos: "Ponde-vos à mesa também,
comigo; eis, aí estão os vossos lugares". E eles se puseram à mesa; e oficiais da
corte, enviados de antemão pelo Príncipe para os servir, mantinham-se em pé
atrás deles; e então o Príncipe lhes disse: "T omai cada um o prato de cima de
seu suporte, e em seguida cada um prato junto da Pirâmide". E eles os
tomaram; e eis que em seguida novos pratos e novos pratos fundos foram vistos
substituindo-os, e suas taças estavam cheias com o vinho da fonte que jorrava
da grande Pirâmide; e comeram e beberam. Q uando estavam meio saciados, o
Príncipe dirigiu a Palavra aos dez convidados, e disse: "Fui informado de que
na terra, que está sob este Céu, fostes convocados para conhecer os vossos
pensamentos sobre as Alegrias do Céu, e sobre a Felicidade eterna que elas
produzem, e vós os havíeis manifestado de diferentes maneiras, cada um
segundo os prazeres dos sentidos do seu corpo.M as,e o que são os prazeres dos
sentidos do corpo sem os prazeres da alma? É a alma que faz que eles sejam
prazeres; os prazeres da alma sã , o em si mesmos beatitudes não perceptíveis,
mas se tornam cada vez mais perceptíveis conforme descem nos pensamentos
da mente, e por estes pensamentos nas sensações do corpo; nos pensamentos da
mente, são percebidas como felicidade, nas sensações do corpo como
divertimento,e no corpo mesmo como volúpias; e outras tomadas em conjunto
constituem a Felicidade eterna; mas esta Felicidade que não resulta senão das
últimas, sós, não é eterna, é uma felicidade temporária que acaba e passa, e que
por vezes se torna infelicidade. V istes agora que todas as vossas alegrias são
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também alegrias do Céu, e muito acima do que jamais pudestes imaginar; mas
não obstante estas alegrias não afetam interiormente as nossas mentes (animi)
H á três coisas que influem como uma só do Senhor em nossas almas; estas três
cousas como uma só, ou este trino são o amor, a sabedoria e o uso; todavia, o
amor, e a sabedoria não existem senão de uma maneira ideal, quando não estão
senão na afeição e no pensamento da mente; mas no uso eles existem em
realidade, porque estão ao mesmo tempo no ato e na obra do corpo; e onde
existem em realidade, aí também subsistem; e pois que o amor e a sabedoria
existem e subsistem no uso, é o uso que nos afeta, e o uso consiste em executar
fielmente, e, sinceramente, e cuidadosamente os trabalhos de sua função; o
amor do uso, e por conseguinte a aplicação do uso, impede a mente de se
espalhar por aqui e por ali, de errar vagamente, e de se encher de todas as
cobiças que influem do corpo e do mundo pelos sentidos com atrativos
sedutores, e pelas quais os veros da R eligião e os veros da M oral com seus bens
são dissipados a todos os ventos; mas a aplicação da mente ao uso contêm e liga
em conjunto estes veros,e dispõe a mente em uma forma susceptível de receber
a sabedoria por estes veros; e então expulsa para os lados os brinquedos e os
divertimentos das falsidades e das vaidades. M as aprendereis mais sobre este
assunto com os sábios de nossa Sociedade, que vos enviarei esta tarde". O
Príncipe tendo assim falado se levantou, e com ele todos os convivas, e disse:
"Paz!" e deu ordem ao Anjo, seu condutor, que os levasse aos seus
apartamentos,e lhes prestasse todas as honras da civilidade, e chamasse também
homens polidos e afáveis para os entreter agradavelmente sobre diferentes
alegrias desta sociedade.
17 - Q uando entraram esta ordem foi executada; e os que tinham sido
chamados da cidade,para os entreter agradavelmente sobre as diferentes alegrias
da Sociedade, chegaram, e após as saudações, tiveram com eles agradáveis
conversações, em quanto passeavam; mas o Anjo, seu condutor, disse: "Estes
dez homens foram convidados ao nosso Céu, para ver as suas Alegrias, e por
conseguinte receber uma nova idéia da Felicidade eterna; falai-lhes portanto
sobre as alegrias deste Céu, alguma cousa que afete aos sentidos do corpo;
depois virão Sábios que falarão do que faz com que estas alegrias produzam
satisfação e felicidade". A estas palavras, os que tinham sido chamados da
cidade relataram as particularidades seguintes: "1. H á aqui dias de festa
indicados pelo Príncipe, a fim de que as mentes (animi) se refaçam da fadiga
que o ardor da emulação terá causado a alguns; nesses dias há nas praças
públicas Concertos de harmonia musical e de cantos, e fora da cidade jogos e
espetáculos; então nas Praças públicas são instaladas O rquestras cercadas de
grades formadas; com cepas entrelaçadas de que pendem cachos de uvas; no
interior dessas grades sobre três ordens de elevação estão sentados os músicos
com instrumentos de cordas, e com instrumentos de sopro, de sons diversos,
altos e baixos, fortes e suaves, e dos lados estão os Cantores e as Cantoras, e
recreiam os cidadãos com árias e cantos muito agradáveis, em coro e em solo,
21

variados por intervalos quanto às espécies; isto dura nestes dias de festa desde a
manhã até ao meio-dia, e continua depois do meio-dia até à tarde. 2. Além
disso cada manhã, das casas que cercam as Praças, ouve-se Cantos muito suaves
de virgens e de meninos; toda a cidade vibra com eles; é uma única afeição do
amor espiritual que é cantado em cada manhã, isto é, que ressoa pelas
modificações do som da voz ou pelas modulações; e esta afeição no canto é
percebida como se fosse a afeição mesma; ela influi nas almas dos que a ouvem
e excita estas almas à correspondência, tal é o canto celeste; as cantoras dizem
que o som de seu canto parece se inspirar e se animar do interior, e se exaltar
agradavelmente a medida que é recebido por aqueles que o ouvem. Acabado
este canto, as janelas das casas da Praça, e ao mesmo tempo as das casas das
ruas,são fechadas, e as portas também; e então toda a cidade fica em silêncio, e
em parte alguma ouve-se barulho, e não se vê pessoa alguma indo de cá para lá;
todos então estão ocupados no desempenho das funções do seu estado. 3. M as
ao meio-dia as portas são abertas, e depois do meio-dia, em alguns lugares, as
janelas o são também; e se olha os brinquedos das crianças dos dois sexos nas
ruas, sob a direção de suas amas e de seus professores sentados sob os pórticos
das casas. 4. Aos lados da cidade, nas suas extremidades, há diferentes jogos de
rapazes e de adolescentes, jogos de corridas, jogos de bola, jogos de raquetes,
exercícios públicos entre rapazes, a saber, quem será mais veloz, e quem será
mais lento, em falar em agir, e em perceber, e para os mais velozes algumas
folhas de louro como prêmio, além de vários outros jogos próprios para
exercitar as aptidões ocultas nas crianças. 5. Além disso, fora da cidade, em
teatros há espetáculos de comediantes que representam diversos feitos de
honestidade e de virtude na vida moral; entre eles há também histriões por
causa das relações". E um dos dez perguntou o que significavam estas palavras:
Por causa das relações; e eles responderam: "N enhuma virtude pode ser
apresentada de maneira frisante com o que tem de honesto e de belo, senão por
(meio de) relativos desde seus máxima até seus mínima; os histriões
representam seus mínima até que se tornem nulos; mas lhes é proibido por
uma lei,apresentar a não ser de uma maneira figurada e como de longe; alguma
cousa do oposto, que é chamado desonesto e indecente; se isso foi proibido, é
porque nada de honesto e de bom de uma virtude qualquer passa por graus
sucessivos ao desonesto e ao mau; mas vai unicamente a seus mínima até que
isso pereça e quando isso perece o oposto começa; é por isso que o Céu, onde
tudo é honesto e bom, nada tem de comum com o Inferno, onde tudo é
desonesto e mau".
18 - Durante esta conversa acorreu um servidor e anunciou que oito Sábios se
apresentavam por ordem do Príncipe e queriam entrar; a essa notícia o Anjo
saiu, e os recebeu e os introduziu; e em seguida os Sábios, após as fórmulas de
cordialidade e polidez, falaram a princípio dos começos e dos acréscimos da
sabedoria, aos quais entremearam diversas cousas sobre sua duração, dizendo
que nos anjos a sabedoria não tem fim e não descontinua, mas cresce e
22

aumenta durante a eternidade. Estas explicações tendo sido dadas, o Anjo da


Coorte lhes disse: “O nosso Príncipe lhes falou, à mesa, da sede da sabedoria e
lhes disse que ela está no uso; peço-vos que lhes falem, também, sobre este
assunto". E eles disseram: “O homem, criado a princípio, foi imbuído com a
sabedoria e o amor da sabedoria, não para ele mesmo, mas para fazer
comunicação dela aos outros por ele; por conseguinte, foi gravado na sabedoria
dos sábios que quem quer que seja não deve ser sábio nem viver para si, a não
ser que ao mesmo tempo viva para os outros; daí a Sociedade, que de outro
modo não existiria; viver para os outros, é fazer usos; os usos são os laços da
sociedade; há tantos desses laços quanto há de bons usos,e o número dos usos é
infinito; há usos espirituais que pertencem ao amor para com Deus e o amor
em relação ao próximo; há os usos morais e civis que pertencem ao amor da
sociedade e da cidade nas quais o homem está, e ao amor dos companheiros e
dos cidadãos com os quais ele mora; há os usos naturais que pertencem ao amor
do mundo e de suas necessidades; há os usos corporais que pertencem ao amor
de sua própria conservação por causa dos usos superiores. T odos estes usos
foram gravados no homem, e seguem-se em ordem, um após outro, e quando
estão junto, um está no outro: aqueles que estão nos primeiros usos, isto é, nos
usos espirituais,estão também nos usos seguintes, e esses são sábios; mas os que
não estão nos primeiros, e entretanto estão nos segundos, e daí nos seguintes,
não são sábios do mesmo modo, mas unicamente segundo a moralidade e a
civilidade externas, aparecem como se o fossem; os que não estão nos primeiros
nem nos segundos, mas estão nos terceiros e nos quartos, não são sábios de
modo algum, pois são satanases; com efeito, amam unicamente o mundo, e
pelo mundo amam-se a si mesmos; mas os que não estão senão nos quartos são
os menos sábios de todos, pois são diabos, porque vivem para si sós, e se vivem
para os outros, é unicamente por causa deles mesmos. Além disso, cada amor
tem seu prazer, e o prazer do amor dos usos é um prazer celeste, o qual entra
nos prazeres que seguem em ordem, e os exalta segundo a ordem de sucessão e
os torna eternos". Em seguida fizeram a enumeração das Delícias celestes que
procedem do amor do uso, e disseram que há miríades de miríades e que os
que entram no Céu entram nessas delícias; e, de mais, passaram com eles o
resto do dia até à tarde a tratar do amor do uso por sábias conversações.
19 - M as ao entardecer veio um correio vestido de brim aos dez recém-vindos
que acompanhavam o Anjo, e os convidou às N úpcias que deviam se celebrar
no dia seguinte; e os recém-vindos se regozijaram muito porque iam ver
também núpcias no Céu. Em seguida foram conduzidos à casa de um
Conselheiro assistente, e cearam com ele, e depois da ceia, voltaram, e
separando-se, cada um se retirou para seu apartamento, e dormiram até de
manhã; e então, tendo despertado, ouviram o Canto das virgens e das meninas,
que partia das casas em torno da Praça pública de que já se falou; cantava-se
então a afeição do amor conjugal; profundamente afetados e comovidos pela
suavidade desse canto, percebiam, insinuado em suas alegrias um encanto
23

delicioso que os elevava e renovava. Q uando chegou a ocasião, o Anjo lhes


disse: "Preparai-vos; tomai as vestimentas do Céu que nosso Príncipe vos
enviou". E eles se vestiram; e eis que as vestimentas resplandeciam como de
uma luz inflamada; e eles perguntaram ao Anjo donde provinha isso, e ele
respondeu: "Isto provém de que ides assistir a núpcias; entre nós então, as
vestimentas resplandecem e se tornam núpcias".
20 - Em seguida o Anjo os conduziu à Casa das núpcias, e o porteiro abriu a
porta; e apenas tinham chegado à entrada quando foram recebidos e saudados
por um Anjo que o N oivo tinha enviado, e foram introduzidos e conduzidos a
poltronas designadas para eles; e pouco depois foram convidados a entrar na
Sala que precedia o Q uarto nupcial; viram aí, no meio, uma M esa sobre a qual
tinha sido posto um magnífico Candelabro composto de sete braços e de sete
lâmpadas de ouro, e nas paredes estavam suspensos lustres de prata, que
estando acesos faziam parecer a atmosfera como de ouro; e viram aos lados do
Candelabro duas M esas sobre as quais tinham sido colocados pães sobre três
fileiras; e nos quatro ângulos da Sala, M esas sobre as quais estavam T aças de
cristal. Enquanto examinavam esta distribuição, eis que a porta de um
apartamento junto ao Q uarto N upcial se abriu, e eles viram sair seis V irgens, e
após elas, N oivo e a N oiva de mãos dadas, e se dirigindo para um Assento
elevado, que tinha sido colocado defronte do Candelabro, e sobre o qual se
assentaram, o N oivo à esquerda e a N oiva à sua direita, e as seis V irgens se
colocaram ao lado do assento perto da N oiva. O N oivo estava vestido com um
M anto de púrpura brilhante, e com uma T única de linho fino resplandecente,
com um éfode sobre o qual havia uma placa de ouro cercada de diamantes; e
sobre esta placa estava gravada uma aguileta, insígnia nupcial desta sociedade
do Céu; e a cabeça do N oivo estava coberta com uma tiara. A N oiva estava
com uma Clâmide escarlata, sob a qual trazia um vestido bordado, indo do
pescoço aos pés; tinha abaixo do peito um cinto de ouro, e na cabeça uma
coroa de ouro guarnecida de rubis. Q uando se assentaram o N oivo se voltou
para a N oiva e lhe pôs no dedo um anel de ouro, e tirou braceletes e um colar
de pérolas, e pôs os braceletes no pulso da N oiva, e o colar em torno de seu
pescoço, e lhe disse: "R ecebe estes penhores". E logo que ela os recebeu, ele lhe
deu um beijo e disse: "Agora tu és minha". E chamou-a de sua Esposa.
Imediatamente os convidados exclamaram: "Q ue haja B ênção!" Estas palavras
foram pronunciadas por cada um em particular, e em seguida por todos em
conjunto; um Anjo enviado pelo Príncipe para o representar as pronunciou
também; e nesse momento esta Sala, que precedia o Q uarto nupcial, encheu-se
com uma fumaça aromática, o que era um sinal de bênção vinha do Céu; e
então oficiais de serviço tomaram os Pães sobre as duas mesas perto do
Candelabro, e as T aças então cheias de vinho sobre as mesas dos ângulos, e
deram a cada convidado seu pão e sua taça; e comeu-se e bebeu-se. Em seguida
o M arido e sua Esposa se levantaram, as seis virgens tendo na mão lâmpadas de
prata, então acesas, os seguiram até ao limiar da porta, e os Esposos entraram
24

no Q uarto nupcial,e a porta foi fechada.


21 - O Anjo condutor falou em seguida de seus dez companheiros aos
convidados; e lhes disse que por ordem ele os havia introduzido, e os havia
feito ver a magnificência do Palácio do Príncipe, e as cousas admiráveis que ele
encerrava, que eles tinham comido com o Príncipe em sua mesa; que em
seguida tinham conversado com os Sábios da sociedade; e lhes pediu para
entreterem conversação com eles; e eles consentiram, e conversaram; e um
sábio dentre os homens das núpcias lhes disse: "Compreendeis o que significam
as coisas que vistes?'' R esponderam que as compreendiam pouco; e então lhe
fizeram esta pergunta: "Por que o N oivo, agora M arido, tinha uma tal
vestimenta?" Ele respondeu: "Porque o N oivo, agora M arido, representava o
Senhor, e a N oiva, agora Esposa representava a Igreja, pela razão de que as
N úpcias no Céu, representam o casamento do Senhor com a Igreja; daí vem
que ele tinha sobre a Cabeça uma T iara, e estava revestido com um manto,
uma T única e um Éfode, como Arão; e a N oiva, agora Esposa tinha sobre a
cabeça uma Coroa, e estava vestida com uma Clâmide como uma R ainha; mas
amanhã eles estarão vestidos diferentemente, porque esta R epresentação é
apenas para hoje". Eles lhe fizeram ainda esta pergunta: "Pois que Ele
representava o Senhor, e Ela a Igreja; por que Ela estava à direita d'Ele?" O
Sábio respondeu "Porque há duas cousas que fazem o Casamento do Senhor e
da Igreja, o Amor e a Sabedoria; ora, o Senhor é o Amor, e a Igreja é a
Sabedoria; e a Sabedoria está à direita do Amor,pois o homem da Igreja é sábio
como por ele mesmo, e conforme é sábio, recebe do Senhor, o amor; a direita
também significa a força,e o amor tem a força, pela sabedoria; mas como acaba
de ser dito, após as núpcias, a representação é mudada, pois então o M arido
representa a Sabedoria, e a Esposa representa o Amor da sabedoria do marido;
entretanto este Amor não é o amor anterior, mas é um amor secundário, que
vem do Senhor à Esposa pela Sabedoria do marido; o amor do Senhor, que é o
amor anterior, é o amor de ser sábio no marido, é por isso que depois das
núpcias, os dois em conjunto, o marido e sua Esposa representam a Igreja".
Eles fizeram ainda esta pergunta: "Por que vós, H omens, não estáveis ao lado
do N oivo,agora M arido, como as seis V irgens estavam ao lado da N oiva, agora
Esposa?” O sábio respondeu: "É porque nós, hoje, somos contados entre as
virgens, e o número seis significa tudo e o completo". M as eles disseram: "Q ue
entendeis por isso?" Ele respondeu: "As V irgens significam a Igreja, e a Igreja é
de um e outro sexo; é por isso que nós também,quanto à Igreja somos V irgens,
que assim seja, vê-se pelas palavras do Apocalipse: "São aqueles que com as
mulheres não se contaminaram, pois virgens são". (Apoc. IX V , 4). E como as
V irgens significam a Igreja, eis porque o Senhor comparou a Igreja a dez
V irgens convidadas às núpcias. (M ateus X X V , 4 e seguintes); e como a Igreja é
significada por Israel, por Sião e por Jerusalém, eis porque se diz tão
freqüentemente na Palavra, V irgem e Filha de Israel, de Sião e de Jerusalém; o
Senhor descreve também Seu Casamento com a Igreja por estas palavras em
25

David:"A R ainha se mantém à tua Direita no ouro excelente de O fir; tecido de


ouro é seu vestido; em Bordados ela será levada ao R ei, as V irgens suas amigas
para perto dela virão no palácio do R ei". (Sal. X LV , 10 a 16). Em seguida
disseram: "N ão é conveniente que um Sacerdote esteja presente, e desempenhe
um ministério nestas cerimônias?". O sábio respondeu: "Isso é conveniente nas
terras, mas não nos céus, por causa da representação do Senhor M esmo e da
Igreja; nas terras não se sabe isso; mas não obstante entre nós, um Sacerdote
celebra os Esponsais, e ouve, recebe, confirma e consagra o Consentimento; o
Consentimento é o essencial do casamento, e as outras cousas que seguem são
as formais".
22 - Depois disso, o Anjo condutor se aproximou das seis V irgens, e lhes falou
também dos que o acompanhavam, e lhes pediu que se dignassem admiti-los
em sua companhia; e elas se aproximaram, mas quando chegaram perto deles,
se retiraram bruscamente e voltaram para o apartamento das mulheres, onde
estavam também virgens suas amigas. O Anjo condutor, tendo visto este
movimento brusco, seguiu-as, e lhes perguntou porque se tinham retirado tão
prontamente sem falar com eles; e elas responderam: "N ão pudemos nos
aproximar". E ele lhes disse: "Por que isso?" E elas responderam: "N ão o
sabemos, mas percebemos alguma cousa que nos repeliu e nos fez voltar; que
eles nos perdoem". E o Anjo voltou a seus companheiros; e lhes referiu a
resposta; e acrescentou: "Presumo que não há em vós o amor casto do sexo; no
Céu nós amamos as virgens por sua beleza e pela elegância de suas maneiras, e
as amamos muito, mas castamente". Isto fez os seus companheiros sorrirem, e
eles disseram: "T u presumes bem; quem pode ver de perto tais belezas, e não
ter algum desejo?".
23 - Depois desta conversação amigável, todos os convidados às núpcias se
retiraram e também estes dez homens com seu Anjo; a tarde estava adiantada, e
eles foram se deitar. Ao clarear do dia, ouviram uma Proclamação: H oje o
Sabath; e se levantaram, e perguntaram ao Anjo o que era; e ele respondeu: "É
para o Culto de Deus; este Culto, revém em tempos marcados, e é publicado
pelos Sacerdotes; é celebrado em nossos T emplos, e dura cerca de duas horas;
por isso, se o desejardes, vinde comigo, e eu vos introduzirei". E eles se
prepararam, e acompanharam o Anjo, e entraram; e eis que o T emplo era
vasto, podendo conter cerca de três mil pessoas, semicircular, os bancos ou
assentos contínuos arranjados segundo a forma do T emplo em semicírculo, e os
últimos mais elevados do que os primeiros; o púlpito diante dos assentos, um
pouco retirado atrás do centro; a porta atrás do púlpito à esquerda. O s dez
homens recém-vindos entraram com o Anjo seu condutor, e o Anjo lhes
indicou os lugares onde deviam sentar-se, dizendo-lhes: "Q uem quer que entra
no T emplo conhece seu lugar; o conhece pelo ínsito, e não pode sentar-se em
outro lugar; se coloca em outro lugar, não ouve cousa alguma, e nada percebe,
e ao mesmo tempo perturba a ordem e a ordem estando perturbada o Sacerdote
26

não é inspirado.
24 - Q uando estavam reunidos, o Sacerdote subiu em um púlpito e
pronunciou um discurso cheio do espírito de sabedoria; esse discurso tratava da
Santidade da Escritura Santa, e da conjunção do Senhor com um e outro
M undo, o Espiritual e o N atural, por esta Escritura; na ilustração em que
estava, ele convenceu plenamente que este Livro Santo foi ditado por Jehovah,
o Senhor,e que por conseqüência Ele M esmo está nesse Livro,de tal modo que
Ele M esmo é aí a Sabedoria, mas que a Sabedoria que é o Senhor M esmo nesse
Livro, fica escondida sob o sentido da letra, e não se manifesta senão aos que
estão nos veros da doutrina e ao mesmo tempo nos bens da vida, e assim, que
estão no Senhor e em quem o Senhor está; a esse discurso ele acrescentou uma
prece votiva, e desceu. Enquanto os ouvintes saíam, o Anjo pediu ao Sacerdote
para dizer algumas palavras de paz a seus dez companheiros; e este se
aproximou deles, e conversaram durante uma meia hora; e lhes falou da
T rindade Divina, dizendo-lhes que ela está em Jesus Cristo, em quem habita
corporalmente toda a Plenitude da Divindade, conforme à declaração do
Apóstolo Paulo; e em seguida lhes falou da U nião da Caridade e da Fé; disse,
porém,"a U nião da Caridade e da V erdade" porque a Fé é a V erdade.
25 - Depois de ter agradecido, eles voltaram para casa; e o Anjo lhes disse:
"H oje é o terceiro dia depois que subistes a esta sociedade deste Céu, e fostes
preparados pelo Senhor para ficar aqui três dias, é por conseguinte tempo de
nos separarmos; assim' tirai as vestimentas que vos foram enviadas pelo
Príncipe,e retomai as vossas".E quando as retomaram,foram inspirados com o
desejo de se retirar, e se retiraram e desceram, acompanhados pelo Anjo, até ao
lugar da assembléia, e aí, deram graças ao Senhor por se ter dignado torná-los
felizes, fazendo-os conhecer, e por conseguinte compreender, o que são as
Alegrias do Céu e o que é a Felicidade eterna.
26 - "De novo afirmo em verdade, que estas cousas aconteceram e foram ditas,
como acaba de ser relatado; as primeiras, no M undo dos Espíritos, que fica no
meio entre o Céu e o Inferno, e as seguintes, na Sociedade do Céu, a que
pertencia o Anjo da trombeta, que serviu de condutor. Q uem teria sabido no
M undo Cristão alguma cousa sobre o Céu, e sobre as Alegrias e a Felicidade
que lá estão, cuja ciência é também a ciência da salvação, se não aprouvesse ao
Senhor abrir à alguém a V ista de seu espírito, e lhe mostrar e ensinar? Q ue
cousas semelhantes existem no M undo espiritual, isso é bem evidente pelas que
foram vistas e ouvidas pelo Apóstolo João, as quais foram descritas no
Apocalipse se; assim, ele viu o Filho do H omem no meio de sete Candelabros,
um T abernáculo, um T emplo, uma Arca, um Altar no Céu; um Livro selado
com sete selos, este livro aberto e Cavalos que saíam dele; quatro animais em
torno de um T rono; doze mil eleitos de cada T ribo; gafanhotos que subiam do
abismo; um Dragão e seu combate contra M iguel; uma M ulher que deu à luz
um Filho homem, e que fugiu para o deserto por causa do Dragão; duas bestas
27

subindo, uma do mar, a outra da terra; uma M ulher sentada sobre uma B esta
escarlate; o Dragão lançado em um tanque de fogo e enxofre; um Cavalo
branco, e uma grande Ceia; um N ovo Céu e uma N ova T erra, e a Santa
Jerusalém descendo do Céu, descrita quanto a suas portas, à sua muralha e aos
fundamentos de sua muralha; depois um R io de água da vida,e Arvores de vida
que davam fruto cada mês; além de várias cousas que foram todas vistas por
João, e vistas enquanto ele estava, quanto a seu espírito, no M undo espiritual e
no Céu; além das que foram vistas pelos Apóstolos depois da ressurreição do
Senhor, e das que foram vistas em seguida por Pedro (Atos dos Apóst. X I);
depois,as que foram vistas e ouvidas por Paulo. Além disso, as que foram vistas
pelos Profetas; por exemplo: Ezequiel viu quatro Animais, que eram
Q uerubins, (Cap. I e X ); um N ovo T emplo e uma nova T erra, e um Anjo que
os media, (Cap. X L-X LV III); ele foi transportado a Jerusalém, e viu aí
abominações; e foi também transportado à Caldéia, no cativeiro, (Cap. V III e
X I). A mesma cousa aconteceu a Z acarias; ele viu um H omem a cavalo entre
murtas, (Cap. 1, 8 e seg.); viu quatro cornos, (Cap. I, 18); e em seguida um
H omem com um cordel de medir à mão, (Cap. II, 2); viu um Candelabro e
duas oliveiras, (Cap. IV , 1 e seg.); viu um R olo que voava e um Éfode, (V , 1 e
6); viu quatro Carros saindo dentre duas montanhas, e Cavalos, (V I, 1 e seg.).
Deu-se o mesmo com Daniel; viu quatro B estas subindo do mar, (V II, 1 e
seg.); depois,os combates,de um Carneiro e de um Bode,(V III, 11 e seg.); viu
o Anjo G abriel, e teve com ele uma longa conversa, (IX ) . O servo de Eliseu
viu Carros e Cavalos de fogo em torno de Eliseu, e os viu quando seus olhos
foram abertos, (II R eis V I, 17). Por estes exemplos e vários outros que estão na
Palavra, é constante que as cousas que existem no M undo Espiritual
apareceram a vários antes e depois do advento do Senhor; que há portanto de
admirar que elas apareçam ainda no presente quando a igreja começa, ou a
N ova Jerusalém descendo do Senhor pelo céu.
28

Dos casamentos no céu

27 - Q ue nos Céus haja Casamentos é o que não pode entrar na fé dos que
imaginam que o homem depois da morte é uma Alma ou um Espírito, e não
concebem uma Alma ou um Espírito senão como um éter ou sopro leve; que
imaginam também que o homem não viverá como homem senão depois do
Julgamento Final; e que, em geral, nada sabem do M undo Espiritual, no qual
estão os Anjos e os Espíritos, assim, onde estão os Céus e os infernos; e como
este M undo é desconhecido, e se ignora completamente que os Anjos do Céu
são H omens em uma forma perfeita, e semelhantemente os Espíritos Infernais,
mas em uma forma imperfeita, é por isso que não pode ser revelada cousa
alguma sobre os Casamentos no M undo Espiritual; com efeito, ter-se-ia dito:
"Como uma alma pode ser conjunta com uma alma, ou um sopro com um
sopro como um esposo com uma esposa sobre a terra?" Sem falar de várias
outras objeções que, no momento em que fossem feitas, tirariam e dissipariam
a crença nos Casamentos na outra vida. M as agora que várias cousas foram
reveladas sobre esse M undo, e que Ele, também, foi descrito tal qual é, o que
foi feito no T ratado "do Céu e do Inferno” e também no "Apocalipse
R evelado”,a afirmação de que há, lá, Casamentos pode ser confirmada, mesmo
diante da razão, pelas proposições seguintes: I. O H omem vive H omem depois
da morte.II.Então o M asculino é M asculino,e o Feminino é Feminino.III.O
Amor de cada um permanece depois da M orte. IV . E principalmente o Amor
do sexo; e, nos que vão para o Céu, isto é, nos que nas terras se tornaram
espirituais, o Amor Conjugal. V . Estas cousas confirmadas por demonstração
ocular. V I. Por conseqüência há casamentos nos Céus. V II. As N úpcias
Espirituais são entendidas por estas palavras do Senhor, que após a ressurreição
não se é dado em casamento. Estas proposições vão ser agora explicadas em sua
ordem.
28 - 1. O H omem vive H omem depois da morte. Q ue o homem vive homem
depois da morte,ignorou-se isso no M undo até ao presente, pelas razões de que
se acaba de falar; e o que é de admirar, ignorou-se mesmo no M undo Cristão,
onde há a Palavra, e por conseqüência ilustração a respeito da vida eterna, e
onde o Senhor M esmo ensina que "todos os mortos ressuscitarão, e que Deus
não é Deus de mortos, mas de vivos". (M ateus X X II, 31 e 32; Lucas X X , 37 e
38). Além disso quanto às afeições e aos pensamentos de seu mental, o homem
está no meio de anjos e de espíritos e foi de tal modo consociado a eles,que não
pode ser separado deles sem morrer imediatamente. E ainda é mais de admirar
que se ignore isso, quando entre tanto todo homem, que morreu desde a
29

primeira criação foi e vai depois de sua morte para os seus, ou, como se diz na
Palavra, foi recolhido para os seus; e além disso, o homem tem uma percepção
comum, que é a mesma cousa que o influxo do Céu nos interiores de sua
mente pelo qual percebe interiormente em si mesmo os veros e por assim dizer
os vê, principalmente este vero que o homem vive depois da morte, feliz se
bem viveu,e infeliz se viveu mal.Com efeito,quem é que não pensa assim, por
pouco que eleve a mente acima do corpo e do pensamento mais próximo dos
sentidos do corpo, o que acontece quando está interiormente no Culto Divino,
e quando está estendido moribundo em seu leito e espera o último momento;
semelhantemente quando ouve falar dos que estão mortos e de sua sorte?
Contei sobre estes milhares de cousas; por exemplo, disse a certas pessoas qual
era a sorte de seus irmãos, de seus cônjuges, de seus amigos; escrevi também
sobre a sorte dos Ingleses, dos H olandeses, dos Católicos-romanos, dos judeus,
dos gentios, e semelhantemente sobre a sorte de Lutero, de Calvino, e de
M elanchton; e até ao presente jamais ouvi alguém me dizer:"Como podem eles
ter uma tal sorte, visto como ainda não saíram de seus túmulos, por que o
julgamento final ainda não foi feito? Será que, durante esse tempo, não são eles
almas que são sopros, e estão em Q ualquer parte, ou em um O nde não se sabe
(in quodam Pu seu U bi)?" N ão ouvi ainda pessoa alguma me falar nesta
linguagem; daí pude concluir que cada um em si mesmo percebe que vive
homem depois da morte. Q ual é a pessoa que tendo amado seu cônjuge e seus
filhos, não diz em si mesmo, quando eles morrem ou estão mortos, se está em
um pensamento elevado acima dos sensuais do corpo, que eles estão na mão de
Deus, que os reverá após sua morte, e que será de novo unida a eles em uma
vida de amor e de alegria?
29 - Q uem é que, segundo a razão, não pode ver, se quer ver, que o homem
depois da morte não é um Sopro, do qual não se pode fazer idéia senão como
de um vapor, ou de um ar e de um éter, que isto é ou contêm em si a alma do
homem,a qual deseja e espera a conjunção com seu corpo a fim de poder gozar
dos sentidos e dos prazeres dos sentidos, como precedentemente no M undo?
Q uem é que não pode ver que, se acontecesse assim com o homem após a
morte, seu estado seria mais vil que o dos peixes, dos pássaros e dos animais da
terra, cujas almas não vivem, e por conseqüência não estão em uma semelhante
ansiedade de desejo e de espera? Se o homem após a morte fosse um tal Sopro,
e assim um vapor, então ou ele esvoaçaria no U niverso, ou segundo certas
tradições estaria reservado em uma Q ualquer porta (in Pu), ou com os Pais nos
limbos até ao Julgamento final.Q uem é que não pode, pela razão, concluir que
os que viveram desde a primeira criação, que se acredita ter tido lugar há seis
mil anos, estariam ainda em um semelhante estado inquieto, e
progressivamente mais inquieto, porque toda espera proveniente de um desejo
produz a inquietação, e aumenta de um tempo a outro tempo; que por
conseqüência esses, ou esvoaçariam ainda no U niverso, ou estariam ainda
encerrados na Q ualquer parte (in Pu), e assim, em uma extrema miséria;
30

semelhantemente Adão e sua Esposa; semelhantemente Abrahão, Isaac e Jacob,


e semelhantemente todos os outros desde esse tempo? Segue-se daí que não
haveria coisa alguma mais deplorável do que nascer homem. M as dá-se
inteiramente ao contrário; foi provido pelo Senhor, que é Jehovah de toda
eternidade, e o Criador do U niverso, para que o estado do homem, que se
conjunta com ele pela vida segundo Seus preceitos, seja depois da morte mais
feliz e mais próspero que antes da morte no M undo, e esse estado é mais feliz e
mais próspero, porque então o homem é espiritual, e o homem espiritual sente
e percebe o prazer espiritual, que é bem superior ao prazer natural, pois o
ultrapassa milhares de vezes.
30 - Q ue os Anjos e os Espíritos sejam homens, isso se torna evidente por
aqueles que foram vistos por Abrahão, G ideão, Daniel, e os Profetas,
principalmente por João quando escreveu o Apocalipse, e também pelas
M ulheres no Sepulcro do Senhor; mais ainda, o Senhor M esmo após a
ressurreição se fez ver pelos Discípulos. Se foram vistos, é porque então os
olhos do espírito daqueles que os viram tinham sido abertos; e quando são
abertos, os Anjos aparecem em sua forma, que é a forma humana; mas quando
os olhos do espírito estão fechados,isto é,velados pela vista dos olhos que tiram
do M undo M aterial tudo o que lhes pertence,os Anjos não aparecem.
31 - Entretanto é preciso que se saiba que o homem depois da morte não é
homem natural, mas é homem espiritual, e não obstante lhe parece que é
absolutamente semelhante, e de tal modo semelhante que não pode deixar de
crer que está ainda no M undo natural; pois tem um corpo semelhante, uma
linguagem semelhante e sentidos semelhantes, porque tem uma afeição
semelhante, ou uma vontade semelhante; é verdade que na realidade ele não é
semelhante, porque é espiritual, e por conseguinte homem interior; mas a
diferença não se manifesta, a ele, porque não pode comparar seu estado com
seu precedente estado natural, pois foi despojado deste, e está naquele; é por
isso que muito freqüentemente ouvi Espíritos dizerem que não sabem outra
cousa senão que estão no M undo precedente, com esta única diferença que não
vêem mais aqueles que deixaram nesse M undo, mas vêem aqueles que saíram
desse M undo ou que estão mortos, ora, se então vêem estes e não aqueles, é
porque não são homens naturais, mas homens espirituais ou substanciais, e o
homem espiritual ou substancial vê o homem espiritual ou substancial, como o
homem natural ou material vê o homem natural ou material, mas não
vice-versa,por causa da diferença entre o substancial e o material, que é como a
diferença entre o anterior e o posterior; ora, o anterior, sendo em si mesmo
mais puro, não pode aparecer ao posterior que é em si mesmo mais grosseiro, e
o posterior,sendo em si mesmo mais grosseiro, não pode tampouco aparecer ao
anterior que é em si mesmo mais, puro; por conseqüência o Anjo não pode
aparecer ao homem deste M undo, nem o homem deste mundo ao Anjo. Se o
homem após a morte é homem espiritual ou substancial, é porque este homem
31

espiritual estava interiormente escondido no homem natural ou material; este


era para ele como uma vestimenta, ou como um invólucro, o qual sendo
despido, o homem espiritual ou substancial sai, assim mais puro, interior e
mais perfeito. Q ue o homem espiritual seja não obstante um homem perfeito,
ainda que não seja visível pelo homem natural, é o que foi claramente
manifestado pelo Senhor, quando foi visto pelos Apóstolos após a ressurreição,
em que apareceu e pouco depois desapareceu, e entretanto era homem
semelhante a Si M esmo quando foi visto e quando não foi mais visto; os
Apóstolos disseram também que, quando O viram, seus olhos tinham sido
abertos.
32 - II. Então o M asculino é M asculino, e o Feminino é Feminino. Pois que o
homem vive homem após a morte e o homem (homo) é masculino e feminino,
e que uma cousa é o masculino, e'outra cousa o feminino, e de tal como outra
cousa que um não pode ser mudado no outro; segue-se que depois da morte o
masculino vive masculino, e o feminino vive feminino, um e outro homem
espiritual.Foi dito que o masculino não pode ser mudado em feminino, nem o
feminino em masculino, e que é por isso que depois da morte o masculino é
másculo, e o feminino é feminino; mas como se ignora em que consiste
essencialmente o masculino, e em que consiste essencialmente o feminino, isto
vai por conseguinte ser dito aqui em poucas palavras. A diferença consiste
essencialmente em que o íntimo no M asculino é o Amor, e que seu véu é a
Sabedoria, ou, o que é a mesma cousa, em que o íntimo é o Amor velado pela
Sabedoria; e em que o íntimo no Feminino é esta Sabedoria do M asculino, e
que seu véu é o Amor que daí provém; mas este Amor é o Amor feminino, e é
dado pelo Senhor à esposa por meio da sabedoria do marido; mas o Amor
precedente é o Amor masculino, e é o amor de se tornar sábio, e é dado pelo
Senhor ao marido segundo a recepção da sabedoria; daí vem que o M asculino é
a Sabedoria do Amor e que o Feminino, é o Amor desta sabedoria; é por isso
que por criação foi incutido em um e no outro um Amor de conjunção em
um; mas será dito mais sobre este assunto no que segue. Q ue o feminino vem
do masculino, ou que a M ulher tenha sido tomada do H omem, vê-se por estas
palavras na G ênesis(II, 21-23): "Jehovah Deus tomou uma das Costelas do
H omem, e fechou a carne em seu lugar, e edificou em M ulher a Costela que
tomou o homem, e a levou para o homem; e o homem disse: Esta é O sso de
meus ossos, e Carne da minha carne; por causa disso ela será chamada Ischah,
porque do homem foi tomada". Será dito em outro lugar o que significa a
Costela,e o que é significado pela Carne.
33 - Desta formação primitiva resulta que o M asculino nasce Intelectual, e que
o Feminino nasce V oluntário; ou, o que é a mesma cousa, que o M asculino
nasce para a afeição de saber, de compreender e de se tornar sábio, e que o
Feminino nasce para o amor de se conjuntar com esta afeição no M asculino. E
como os Interiores formam a sua semelhança os Exteriores, e que a forma
32

masculina é a forma, do Entendimento, e a forma feminina é a forma do Amor


deste entendimento, daí vem que o M asculino tem uma face, um som de voz e
um corpo, que são diferentes dos do Feminino, a saber, uma face mais dura,
um som de voz rude e um corpo, que são diferentes dos do Feminino, a saber,
uma face mais dura, um som de voz mais rude e um corpo mais forte, e além
disso um mento barbado, em geral uma forma menos bela que a feminina;
diferem também pelos gestos e pelos costumes; em uma palavra, nada há de
semelhante, mas não obstante há o conjuntivo em cada cousa; ainda mais, o
masculino no macho é masculino em cada parte e mesmo na menor parte de
seu corpo, e também em cada parcela de sua afeição; semelhantemente o
feminino na fêmea; e como conseqüência um não pode ser mudado no outro,
segue-se que após a morte,o masculino é masculino e o feminino é feminino.
34 - III. O Amor de cada um permanece depois da morte. O homem sabe que
o Amor existe, mas ignora o que é o Amor; que o amor existe ele o sabe pela
linguagem comum, por exemplo, quando se diz: U m tal me ama; o R ei ama
seus súditos, e os súditos amam o R ei; o marido ama a esposa, e a mãe ama os
filhos, e reciprocamente; e também: T al ou tal ama a pátria, os concidadãos, o
próximo; do mesmo modo para as cousas; abstração feita da pessoa, por
exemplo: Ele ama tal ou tal cousa. M as, ainda que na linguagem se trate tão
universalmente do Amor, entretanto acontece sempre que apenas um ou outro
sabe o que é o Amor; quando o homem medita sobre o amor, como não pode
então formar dele idéia alguma do pensamento, nem por conseqüência
apresentá-lo na luz do entendimento, por esta razão, que o amor pertence, não
à luz, mas ao calor, ele diz ou que nada é, ou que é somente alguma cousa que
influi da vista, do ouvido, do tato e da freqüentação, e assim emociona; ignora
absolutamente que é sua vida mesma, não somente a vida comum de todo seu
corpo, e a vida comum de todos os seus pensamentos, mas é mesmo a vida de
todos os singulares do corpo e dos pensamentos; É o que pode perceber o sábio,
quando se diz: "Se afastas a afeição que pertence ao amor, podes pensar alguma
cousa, ou podes fazer alguma cousa? O pensamento, a palavra e a ação não
esfriam conforme esfria a afeição que pertence ao amor, e não se aquecem
conforme se aquece esta afeição?" O Amor é portanto o Calor da vida do
homem, ou o seu calor vital; o calor do sangue, e também a sua cor vermelha,
não provém de outra parte; o Fogo do Sol Angélico, que é puro Amor produz
estes efeitos.
35 - Q ue cada um tenha seu amor,ou um amor distinto do amor de um outro,
isto é, que não haja em um homem um amor semelhante ao que está em um
outro, pode-se ver pela variedade infinita das faces; as faces são os tipos dos
amores; sabe-se, com efeito, que as faces mudam e variam segundo as afeições
do amor; os desejos, que pertencem ao amor, pois suas alegrias e suas dores, se
manifestam também nas faces; daí, é evidente que o homem é seu amor, e
mesmo a forma de seu amor.M as é preciso que se saiba que o homem interior,
33

que é o mesmo que seu espírito que vive depois da morte, é a forma de seu
amor, e não igualmente o homem exterior no M undo, porque este desde a
infância aprendeu a esconder os desejos de seu amor, e mesmo a fingir e a
mostrar outros desejos que não os seus.
36 - Se o Amor de cada um permanece nele depois da morte, é porque o Amor
é a vida do homem, como acaba de ser dito, n. 34, e que por conseguinte é o
homem mesmo. O homem também é seu Pensamento, por conseqüência sua
Inteligência e sua Sabedoria, mas estas fazem um com seu Amor; pois é por seu
Amor e segundo seu Amor que o homem pensa,e que fala e age mesmo, se está
no livre1 (*); daí pode ver que o Amor é o Ser ou a essência da vida do homem,
e que o Pensamento é o Existir ou a existência de sua vida segundo o ser ou a
essência; é por isso que a linguagem e a ação, que decorrem do Pensamento,
decorrem não do pensamento, mas do Amor pelo pensamento; por numerosas
experiências me foi dado saber que o homem depois da morte não é seu
Pensamento, mas é sua Afeição e conseqüentemente seu pensamento, ou é seu
Amor e conseqüentemente sua inteligência; além disso também, que o homem
depois da morte se desfaz de tudo que não concorda com seu Amor, e que
mesmo, progressivamente se reveste com a face, o som de voz, a linguagem, os
gestos e os costumes do amor de sua vida; daí vem que o Céu inteiro foi posto
em ordem segundo todas as variedades das afeições do Amor do bem, e o
Inferno inteiro segundo todas as afeições do amor do mal.
37 - IV . E principalmente o Amor do sexo; e, nos que vão para o Céu, isto é,
nos que nas terras se tornaram espirituais, o Amor conjugal. Q ue o Amor do
sexo no homem permanece depois da morte, é porque então o macho é macho
e a fêmea é fêmea,e que o masculino do macho é masculino no todo e em cada
parte,igualmente o feminino na fêmea,e que há o conjuntivo em cada cousa, e
mesmo nos muito singulares de cada coisa que lhes pertence; ora como este
conjuntivo aí foi posto por criação, e por conseguinte ai está perpetuamente,
segue-se que um deseja a conjunção com o outro e a aspira; o Amor,
considerado em si mesmo, não é outra cousa mais que um desejo e por
conseguinte um esforço para a conjunção, e o amor conjugal, para a conjunção
em um; pois o homem macho e o homem fêmea são criados de tal sorte que de
dois eles podem se tornar um, então tomados em conjunto são o H omem em
sua plenitude; mas sem esta conjunção, eles são dois, um e outro sendo como
um homem dividido ou uma metade de homem. Agora, como este conjuntivo
está escondido intimamente em cada cousa do macho e em cada cousa da
fêmea, e como a faculdade e o desejo pela conjunção em um está em cada
cousa, segue-se que o Amor mútuo e recíproco do sexo permanece nos homens
depois da morte.
38 - Foi dito o Amor do sexo e o Amor conjugal, porque o Amor do sexo é
diferente do Amor conjugal; o Amor do sexo está no homem N atural, mas o
1
Em liberdade; sem constrangimento.
34

Amor conjugal está no homem Espiritual; o homem natural ama e deseja


unicamente as conjunções externas, e as volúpias do corpo que delas provêm;
mas o homem espiritual ama e deseja a conjunção interna, e os prazeres do
espírito que dela provêm, e percebe que elas são concebidas com uma única
esposa, com a qual pode ser perpetuamente cada vez mais conjunto em um; e,
quanto mais está assim conjunto, mais percebe seus prazeres se elevarem em
um grau semelhante, e devem ser constantes para a eternidade; mas o homem
natural não pensa nisso. É portanto, por isso que se diz que o Amor conjugal,
depois da morte, permanece naqueles que vão para o Céu, isto é, naqueles que
nas terras se tornaram espirituais.
39 - V . Estas cousas plenamente confirmadas por demonstração ocular. Q ue o
H omem vive homem depois da morte, e que então o M acho seja macho e a
fêmea, e que o amor de cada um permanece, e principalmente o Amor do sexo
e o Amor conjugal, é o que até aqui me empenhei em confirmar por cousas
que pertencem ao entendimento, e, que são chamadas racionais; mas como o
homem, desde a infância, recebeu de seus pais e de seus professores, e em
seguida dos eruditos e dos sacerdotes, a crença que depois da morte ele não
viverá homem senão depois do dia do julgamento final, que é esperado, já
agora, há seis mil anos, e como vários puseram esta crença no número das
cousas que devem ser recebidos pela fé e não pelo entendimento, tornou-se
necessário que estas mesmas proposições fossem confirmadas também por
provas oculares; sem o que o homem que crê unicamente nos sentidos, poderia
dizer segundo a fé inculcada: "Se os homens vivessem homens depois da morte
eu os veria e os ouviria; quem desceu do Céu e quem subiu do Inferno e nos
informou a respeito?" Entretanto, como não pode e não pode acontecer que
um Anjo do Céu desça, ou que um espírito do Inferno suba, e fale a um
homem,exceto a aqueles cujos interiores da mente ou do espírito foram abertos
pelo Senhor, e isso não pode ser feito plenamente senão naqueles que foram
preparados pelo Senhor, para receber as cousas que pertencem à sabedoria
espiritual, aprouve por conseqüência, ao Senhor preparar-me assim, a fim de
que o estado do Céu e do Inferno, e o estado da vida dos homens depois da
morte, não permanecesse desconhecido, nem entorpecido na ignorância, nem
enfim sepultado na negação. T odavia, as provas oculares sobre estes assuntos
não podem, em razão de seu grande número, ser relatadas aqui; mas o foram
no T ratado do Céu e do Inferno; e em seguida na Continuação sobre o M undo
espiritual; e mais tarde no Apocalipse R evelado; e o serão especialmente aqui, a
respeito dos Casamentos, nos M emoráveis, que estão em seguimento aos
Parágrafos ou Capítulos desta O bra.
40 - V I. Por conseqüência há Casamentos no Céu. Esta proposição, tendo sido
confirmada pela R azão e ao mesmo tempo pela Experiência, não necessita de
uma demonstração ulterior.
41 - V II. As núpcias Espirituais são entendidas por estas palavras do Senhor,
35

que após a ressurreição não se é dado em casamento.N os evangelistas lê-se estas


palavras: "Alguns dos Saduceus, que sustentam que não há ressurreição,
interrogaram Jesus, dizendo: M estre, M oisés escreveu, que se o irmão de
alguém morre tendo uma esposa, e que sem filhos morre, seu irmão tomará a
esposa, e suscitará semente a seu irmão. H avia sete irmãos, que tomaram um
após outro a esposa; mas morreram sem filhos, depois, a mulher também; na
ressurreição portanto,de qual entre eles,será a esposa; M as, respondendo, Jesus
lhes disse: O s filhos deste século fazem núpcias e são dados em casamento; mas
os que serão julgados dignos de obter o outro século, e a ressurreição dentre os
mortos, não farão núpcias nem serão dados em casamento; pois não podem
mais morrer, porque semelhantes aos anjos serão, e filhos de Deus eles são,
sendo filhos da ressurreição. O ra, que os mortos ressuscitam, M oisés mesmo o
mostrou perto da sarça, pois chamou o Senhor o Deus de Abrahão, e o Deus
de Isaac e o Deus de Jacob; ora, Ele não é Deus de mortos, mas de vivos".
(Lucas X X , 27 a 38; M ateus X X II, 22 a 31; M arcos X II, 18 a 27). H á duas
coisas que o Senhor ensinou por estas palavras; a primeira, que o homem
ressuscita depois da morte; e a segunda que não se é dado em casamento no
Céu. Q ue o homem ressuscita depois da morte, Ele o ensinou por estas
palavras, que Deus não é Deus de mortos mas de vivos; e que Abrahão, Isaac e
Jacob vivem; e além disso na Parábola sobre o R ico no inferno, e sobre Lázaro
no Céu, (Lucas X V I, 22 a 31). Segundamente, que não se é dado em
casamento no Céu, Ele o ensina por estas palavras, que os que são julgados
dignos de obter o outro século não fazem núpcias, e não são dados em
casamento. Q ue aqui não são entendidas outras núpcias que não sejam as
N úpcias espirituais, isso é bem evidente pelas palavras que seguem
imediatamente, a saber, que não podem mais morrer, porque são semelhantes
aos anjos, e que são filhos de Deus, sendo filhos da ressurreição; pelas N úpcias
espirituais é entendida a conjunção com o Senhor, e esta se faz nas terras, e
quando foi feita nas terras, foi feita também nos Céus, é por isso que nos Céus
não são feitas núpcias uma segunda vez e não se é dado em casamento; isto é
entendido também por estas palavras: "O s filhos deste século fazem núpcias e
são dados em casamento; mas os que serão julgados dignos de obter o outro
século, não farão núpcias nem serão dados em casamento". Estes também são
chamados pelo Senhor "Filhos de N úpcias" (M ateus IX , 15; M arcos II, 19); e
na presente circunstância, "Anjos, filhos de Deus, e filhos da ressurreição".
Q ue fazer núpcias, seja ser conjunto ao Senhor, e que entrar nas núpcias, seja
ser recebido no Céu pelo Senhor, isso é evidente por estas passagens:
"Semelhante é o R eino dos Céus a um H omem R ei,que fez N úpcias". (M ateus
X X II, 1 a 14). "Semelhante é o R eino dos Céus a dez V irgens, que saíram ao
encontro do N oivo; as cinco que estavam prontas entraram às N úpcias",
(M ateus X X V , 1 e seg.); que o Senhor tenha falado aqui d’Ele M esmo, isso é
evidente pelos V ers. 13, onde se diz: "V elai, porque não sabeis o dia nem a
hora, em que o Filho do homem virá". Além disso também no Apocalipse: "É
36

vindo o tempo de N úpcias do Cordeiro, e sua Esposa se preparou. Bem-


aventurados os que à Ceia de N úpcias do Cordeiro foram chamados!" (X IX , 7,
9). Q ue haja um entendimento espiritual em todas e em cada uma das coisas
que o Senhor pronunciou, isto está plenamente demonstrado na Doutrina da
N ova Jerusalém sobre a Escritura Santa,publicada em Amsterdã em 1763.
42 - Ao que precede acrescentarei dois M emoráveis do M undo Espiritual.
Primeiro M emorável: U ma manhã dirigi o olhar para, o Céu, e vi acima de
mim três Extensões, uma acima da outra; e eis que a Primeira Extensão, que
era a mais próxima, se abriu; e pouco depois, a Segunda que estava mais alta; e
por fim a T erceira, que era a mais alta; e pela ilustração que daí provinha,
percebi que sobre a primeira Extensão estavam os Anjos de que se compõe o
primeiro ou último Céu, sobre a segunda Extensão os Anjos de que se compõe
o segundo Céu ou Céu médio; e sobre a terceira Extensão, os Anjos de que se
compõe o terceiro Céu ou Céu supremo. Eu me perguntei primeiramente com
admiração: “O que é isto, e por que isso? E em breve, foi ouvida do Céu uma
voz como de uma trombeta, dizendo: "Percebemos, e agora vemos que meditas
sobre o Amor Conjugal; e, sabemos que nas terras não há ainda pessoa alguma
que saiba o que é o Amor verdadeiramente Conjugal em sua origem, e em sua
essência; o entretanto é importante que se saiba isso; por isso aprouve ao
Senhor abrir para ti os Céus, a fim de que nos interiores da tua mente influam
a luz que ilustra e, por conseguinte, a percepção; entre nós, nos Céus, sobre
tudo no T erceiro, as nossas delícias celestes vêm principalmente do Amor
Conjugal; vamos portanto, pela permissão que nos foi dada, enviar a ti um
Casal de esposos a fim de que vejas". E eis que no momento apareceu um
Carro descendo do Céu supremo ou terceiro Céu; nesse carro via-se um único
Anjo; mas quando se aproximava, viu-se dois; de longe, o carro brilhava diante
de meus olhos como um diamante, e tinha atrelados dois cavalos novos e
brancos como a neve; e os que estavam sentados no carro tinham na mão duas
rolas, e me bradaram: "Q ueres que nos aproximemos mais perto; mas então
toma cuidado para que o brilho que provém de nosso Céu, de onde
procedemos, e que é de chama, não penetre interiormente; por seu influxo são
ilustradas, é verdade, as idéias superiores do teu entendimento, que em si
mesmas são celestes, mas estas idéias são inefáveis para o M undo em que estás;
recebe, portanto, racionalmente as cousas que vais ouvir, e expõe-nas desta
maneira ao entendimento". E respondi: "T omarei cuidado; vinde mais para
perto". E eles vieram; e eis que eram um M arido e sua Esposa; e disseram:
"N ós somos Esposos; desde a primeira Idade, que é chamada por vós o Século
de O uro, vivemos felizes no Céu, e sempre na mesma flor da idade, em que
nos vês hoje". Eu os olhei atentamente, a um e outro, porque percebi que
representavam o Amor Conjugal em sua vida e em seus adornos; em sua vida,
por suas faces, e em seus adornos, por suas vestimentas; pois todos os Anjos são
afeições do amor em uma forma humana; a afeição dominante brilha mesmo
em suas faces, e as vestimentas lhes são distribuídas pela afeição e segundo a
37

afeição; também se diz no Céu, que cada um é vestido por sua Afeição. O
M arido parecia de uma idade média entre a adolescência e a juventude; e em
seus olhos brilhava uma luz cintilante derivada da sabedoria do amor; por esta
luz a sua face era intimamente como radiante, e pela radiação que dela
provinha a pele em sua superfície externa era como cintilante,de sorte que toda
sua face era uma beleza resplandecente; estava vestido com uma túnica
comprida, e por cima tinha uma vestimenta de cor jacinto, serrada por um
cinto de ouro, sobre o qual havia três pedras preciosas, duas safiras dos lados e
um carbúnculo no meio; as suas meias eram de linho resplandecente,
entremeado com fios de prata, e seu calçado era de veludo; tal era a Forma
representativa do Amor Conjugal no M arido. M as na Esposa, eis o que ela era:
A sua face foi vista por mim, e não foi vista; foi vista como a beleza mesma, e
não foi vista porque essa beleza era inexprimível; pois havia em sua face o
esplendor de uma luz inflamada, tal como é a luz para os Anjos do terceiro
Céu; e esta luz tornou a minha vista perturbada; por isso fiquei por assim dizer
estupefato; ela tendo percebido isso, me falou dizendo: "Q ue vês? R espondi:
"N ão vejo senão o Amor Conjugal e sua forma; mas vejo, e não vejo". A estas
palavras ela se desviou obliquamente de seu marido; e então pude olhá-la mais
atentamente; seus olhos brilhavam com a luz de seu Céu, a qual, como acaba
de ser dito, é inflamada e provém do amor da sabedoria; pois nesse Céu as
Esposas amam os M aridos por sua sabedoria e em sua sabedoria, e os M aridos
amam as Esposas por este amor e neste amor para com eles, e assim eles são
unidos; daí vinha sua beleza, que é tal, que nenhum pintor a poderia imitar
nem a apresentar em sua forma; pois não teria cousa alguma tão brilhante em
seu colorido, e cousa alguma tão bela poderia ser expressa por sua arte; os seus
cabelos estavam decentemente arranjados segundo a correspondência com sua
beleza, e flores em diadema estavam colocadas neles; tinha um colar de
carbúnculos, de onde pendia um conjunto de rosas em crisólitos; e seus
braceletes eram de pérolas; estava vestida com uma túnica escalarte, e sob essa
túnica seu peito estava coberto com uma vestimenta púrpura presa na frente
por broches de rubis; mas o que me surpreendia, é que as cores variavam
segundo o aspecto em relação ao marido; e também segundo este aspecto elas
brilhavam, ora mais ora menos; mais, em um aspecto mútuo; e menos, em um
aspecto oblíquo. Depois que vi estas coisas, eles me falaram de novo; e quando
o M arido falava, era ao mesmo tempo como pela esposa; e quando a Esposa
falava,era ao mesmo tempo como pelo marido; pois tal era a união das mentes,
de que decorrem as palavras; e então eu ouvi também o som do Amor
Conjugal,que era interiormente simultâneo, e procedia também das delícias do
estado de paz e da inocência. Enfim eles disseram: "Fomos chamados e vamos
partir". E no mesmo instante apareceram de novo; levados em um carro como
precedentemente; e foram levados por um caminho pavimentado através de
tabuleiros matizados de flores, cujos canteiros continham oliveiras e árvores
carregadas de laranjas; e quando chegaram perto de seu Céu, ao encontro deles
38

vieram virgens,e elas os receberam,e os introduziram.


43 - Depois disso, me apareceu um Anjo desse Céu, tendo na mão um rolo de
pergaminho que ele desenrolava, dizendo: "V i que meditas sobre o Amor
Conjugal; este pergaminho contém sobre esse amor arcanos da sabedoria não
ainda desvendados no M undo; eles vão ser desvendados agora, porque é
importante que o sejam; estes arcanos estão em nosso Céu mais do que nos
outros Céus, porque nós estamos, no casamento do Amor e da Sabedoria; mas
predigo que não haverá outros que se apropriem deste Amor, senão aqueles que
são recebidos pelo Senhor na nova Igreja que é a N ova Jerusalém". Depois de
ter pronunciado estas palavras, o Anjo deixou cair o Pergaminho desenrolado,
que um certo Espírito' Angélico recebeu e colocou sobre uma M esa em uma
Câmara que ele fechou imediatamente, e me entregou a chave, e disse:
"Escreve".
44 - Segundo M emorável: U m dia vi três Espíritos noviços de nosso M undo,
que iam para aqui e para ali, examinavam e se informavam; estavam admirados
de viverem como homens absolutamente como antes, e de verem objetos
semelhantes aos que tinham visto antes; pois sabiam que tinham saído do
M undo precedente ou natural, e lá tinham acreditado que não viveriam como
homens senão depois do dia do Julgamento final, quando seriam revestidos
com a carne e os ossos encerrados nos túmulos; portanto a fim de que não
restasse dúvida alguma de que eram verdadeiramente homens, às vezes se
examinavam e se tocavam uns aos outros, e apalpavam os objetos; e, por
milhares de provas se confirmaram de que eram agora homens, como no
M undo precedente, além disso que se viam mutuamente em uma luz mais
clara, e viam os objetos em um maior esplendor, e assim mais perfeitamente.
Então dois Espíritos Angélicos os encontraram por acaso, e os detiveram,
dizendo: "Donde sois?", Eles responderam: "N ós saímos de um M undo, e de
novo vivemos em um M undo, assim passamos de um M undo para outro
M undo; isso agora nos surpreende". E então os três N oviços interrogaram os
Espíritos Angélicos sobre o Céu; e como dois dos três N oviços eram moços, e
de seus olhos reluzia como um pequeno fogo de cobiça pelo sexo, os Espíritos
Angélicos disseram: "T alvez tivésseis visto mulheres?" E eles responderam:
"N ós as vimos". E como interrogassem estes Espíritos sobre o Céu, eles lhes
disseram: "N o Céu todos os objetos são magníficos e resplandecentes, e tais
como jamais o olho viu; e lá há virgens e rapazes, as virgens de uma tal beleza,
que podem ser chamadas as Belezas em sua forma, e os rapazes de uma tal
moralidade, que podem ser chamados as M oralidades em sua forma; e as
Belezas das virgens e as M oralidades dos rapazes se correspondem como formas
mútuas e apropriadas uma para a outra". E os dois N oviços perguntaram se no
Céu as formas humanas são em tudo semelhantes as que estão no M undo
natural; e lhes foi respondido: "Elas são em tudo semelhantes; nada foi tirado
do homem,nem da mulher; em uma palavra,o homem é homem,e a mulher é
39

mulher, em toda perfeição da forma na qual foram criados; afastai-vos, se


quiserdes, examinai se vos falta a menor cousa para que sejais homens como
antes". O s N oviços disseram ainda: "O uvimos dizer no M undo, donde saímos,
que no Céu não se é dado em casamento, porque se é Anjo, será que então, há
Amor do sexo lá?" E os Espíritos Angélicos responderam: “O vosso amor do
sexo não há lá; mas há o amor angélico do sexo, amor que é casto, e isento de
toda atração libidinosa". O s N oviços replicaram: "Se há um amor do sexo sem
atração alguma,o que é então o amor do sexo?" E como pensassem nesse amor,
gemeram e disseram: "Ó ! Como a alegria do Céu é insípida! Q ue rapaz pode,
então, desejar o Céu? U m tal amor não é estéril e despido de vida?" O s
Espíritos Angélicos, sorrindo desses propósitos, replicaram: "O Amor Angélico
do sexo, ou tal como é no Céu, é não obstante cheio de delícias íntimas; é a
mais agradável expansão de todas as cousas da mente, e por conseguinte a mais
agradável expansão de todas as do peito, e dentro do peito, é como se o coração
brincasse com o pulmão, jogo de que resultam uma respiração, um tom de voz
e uma linguagem, que fazem com que as ligações entre os sexos, ou entre
rapazes e virgens, sejam as suavidades celestes mesmas, as quais são puras.
T odos os N oviços que sobem ao Céu, são examinados quanto à sua castidade;
pois são introduzidos na Companhia de V irgens, as Belezas do Céu, que
percebem pelo tom de voz, pela linguagem, pela face, pelos olhos, pelo gesto e
pela esfera que deles emana, o que eles são quanto ao amor do sexo; se esse
amor não é casto,elas fogem e anunciam a seus companheiros que viram sátiros
ou príapos; e mesmo esses noviços mudam de forma, e aos olhos dos Anjos
aparecem cobertos de pelos, e quanto aos pés como bezerros ou leopardos, e
pouco depois são expulsos, a fim de que não maculem a atmosfera com seu
desejo libidinoso". O s dois N oviços, tendo ouvido esta explicação, disseram de
novo: "Assim no Céu, não há amor algum do sexo; o que é o amor casto do
sexo, senão um amor privado da essência de sua vida? As ligações dos rapazes e
das virgens não são alegrias insípidas? N ão somos nem pedras, nem troncos,
mas somos percepções e afeições da vida". A estas palavras, os dois Espíritos
Angélicos indignados responderam: "V ós não sabeis de modo algum o que é o
amor casto do sexo, porque não sois ainda castos; este amor é a delícia mesma
da mente, e por conseqüência do coração, e não ao mesmo tempo da carne sob
o coração; a castidade angélica, que é comum a um e outro sexo, impede este
amor de passar além da câmara do coração, mas dentro e acima desta câmara a
moralidade do rapaz se deleita com a beleza da virgem, delícias do amor casto
do sexo, delícias que são interiores e demasiado cheias de encantos para que
possam ser descritas por palavras. T odavia, este amor do sexo está nos Anjos,
porque neles há unicamente o Amor conjugal, e este amor não pode existir ao
mesmo tempo com o amor incasto do sexo; o amor verdadeiramente conjugal é
um amor casto, e nada tem de comum com um amor incasto; existe
unicamente com uma pessoa do sexo com exclusão de todas as outras, pois é
um amor do espírito e por conseqüência um amor do corpo,e não um amor do
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corpo e em conseqüência um amor do espírito; isto é, não um amor que infesta


o espírito". O s dois jovens noviços, ouvindo estas cousas, se regozijaram e
disseram:"Sempre há,então,lá um amor do sexo; que outra cousa seria o amor
conjugal?" M as os Espíritos Angélicos responderam: "Pensai mais
profundamente, examinai bem a coisa, e percebereis que o vosso amor do sexo
é um amor extraconjugal, e que o amor conjugal é absolutamente diferente,
sendo este distinto daquele, como o trigo o é da palha, ou antes como o
humano o é do bestial! Se perguntardes às mulheres no Céu o que é o amor
extraconjugal, eu vos asseguro que elas responderão: O que é isso? Q ue dizeis?
Como de vossa boca pode sair uma tal palavra que fere nossos ouvidos? Como
um amor que não foi criado pode ser produzido no homem? Se então lhes
perguntardes o que é o Amor verdadeiramente conjugal, sei que vos
responderão que não é o amor do sexo, mas que é o amor de uma única pessoa
do sexo, amor que não existe senão quando o rapaz vendo uma virgem que lhe
foi destinada pelo Senhor,e a virgem vendo o rapaz, sentem, de uma parte e de
outra o conjugal se abrasar em seus corações, e percebem, ele que ela é suave,
ela, que ele é seu; pois o amor vai ao encontro do amor, e se faz conhecer, e
conjunta imediatamente as almas, e em seguida a mentes, e daí entra no peito,
e depois das núpcias vai mais longe, e assim se torna pleno amor que dia a dia
aumenta em conjunção, ao ponto de que não são mais dois mas são como um.
Sei também que elas jurarão que não conhecem outro amor do sexo; pois
dizem: Como pode haver um amor do sexo, a não ser que tenda assim a um
mútuo encontro, e seja recíproco, a fim de aspirar a uma união eterna que
consiste em que dois sejam uma única carne?" A estas explicações os Espíritos
Angélicos acrescentaram: "N o Céu não se sabe absolutamente o que é a
escortação, nem que ela exista; nem que ela possa existir; os Anjos sentem um
frio glacial em todo o corpo por um amor incasto ou extraconjugal, e
vice-versa, sentem calor em todo o corpo pelo amor casto ou conjugal; lá, nos
homens, todos os nervos se afrouxam à vista de uma prostituta, e se tornam
tensos à vista da Esposa". O s três N oviços, depois de terem ouvido estas novas
explicações, perguntaram se o Amor Conjugal entre esposos nos Céus era
semelhante ao Amor conjugal nas terras; e os dois Espíritos Angélicos
responderam: "É absolutamente semelhante"; e como perceberam que eles
queriam saber se as delícias finais aí eram semelhantes, eles disseram que eram
absolutamente semelhantes,mas muito mais deleitáveis, porque a percepção e a
sensação angélicas são muito mais apuradas que a percepção e a sensação
humanas; depois,acrescentaram:"O que é a vida deste amor, se não provém da
veia da potência? Esta faltando, não acontece que este amor também falta e se
torna frio? Este vigor não é a medida mesma e o grau mesmo, e a base mesma
deste amor? N ão é ele o começo, a afirmação e o complemento? É uma lei
universal, que os primeiros existem, subsistem e persistem pelos últimos; do
mesmo modo também este Amor; se portanto não houvesse as delícias finais, o
amor conjugal não teria delícia alguma". Então os N oviços perguntaram se das
41

delícias finais deste amor, lá, nasciam filhos; e se não nasciam, que utilidade
podiam ter. O s Espíritos Angélicos responderam que delas nasciam filhos
espirituais, mas não filhos naturais. E eles perguntaram o que eram filhos
espirituais; e os outros responderam: "Dois esposos pelas delícias finais ficam
cada vez mais unidos no casamento do bem e do vero, e o casamento do bem e
do vero é o casamento do amor e da sabedoria; ora, o amor e a sabedoria são os
filhos que nascem deste Casamento; e como o marido aí é a sabedoria, e a
esposa o amor dessa sabedoria,e como todos dois são espirituais, por isso lá não
podem ser concebidos e engendrados senão filhos espirituais; daí vêem que os
Anjos, após as delícias, não ficam tristes, como alguns homens nas terras, mas
ficam alegres; e isso resulta de um contínuo influxo de novas forças pelas
precedentes, as quais servem a sua renovação e ao mesmo tempo à sua
ilustração; pois todos os que vão para o Céu, voltam à primavera de sua
juventude, e às forças dessa idade, e aí permanecem eternamente". Depois de
ter ouvido isso,os três N oviços disseram:"N ão se lê na Palavra que no Céu não
há núpcias porque lá todos são Anjos?" A esta pergunta, os Espíritos Angélicos
responderam: "Elevai os vossos olhos para o Céu, e recebereis uma resposta". E
eles perguntaram porque deviam elevar os olhos para o Céu. Disseram: Porque
de lá nos vêm todas as interpretações da Palavra; a Palavra é inteiramente
espiritual; e os Anjos sendo espirituais, ensinarão o entendimento espiritual
dela".E pouco tempo depois,o Céu se abriu acima de sua cabeça,-e dois Anjos
se apresentaram à sua vista,e disseram: "H á N úpcias nos Céus como nas terras,
mas não para outros que não sejam os que estão no Casamento do bem e do
vero, e outros que não sejam esses não são Anjos; é porque lá é entendido por
N úpcias espirituais, as que concernem ao casamento do bem e do vero; estas (a
saber, as núpcias espirituais) têm lugar nas terras, e não depois do trespasse,
assim não nos Céus; como se diz das cinco virgens insensatas, convidadas
também para as núpcias, onde não puderam entrar porque não havia nelas
casamento do bem e do vero, pois elas não tinham azeite, mas unicamente as
lâmpadas; pelo azeite é entendido o bem, e pelas lâmpadas o vero; e ser dado
em casamento é entrar no Céu, onde há o casamento do bem e do vero". O s
três N oviços tendo ouvido estas palavras, ficaram cheios de alegria; e cheios do
desejo do Céu e de esperança de núpcias celestes; disseram: "N ós nos
aplicaremos à moralidade e à decência da vida, a fim de que nossos votos sejam
cumpridos".
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Do estado dos esposos depois da


morte

45 - Q ue haja casamentos nos Céus, é o que acaba de ser mostrado; aqui,


agora,cumpre examinar se a aliança conjugal contraída no M undo deve, após a
morte permanecer e ser estável, ou não; como isto é uma questão não de
julgamento, mas de experiência, e como eu adquiri esta experiência por uma
consociação com os Anjos e os Espíritos, vou tratar deste ponto, mas entretanto
de maneira que a razão também lhe dê seu assentimento; está mesmo entre os
votos e desejos dos esposos saber isso; pois os maridos que amaram suas esposas,
querem saber, quando elas morrem, se sua sorte é feliz, igualmente as esposas,
que amaram seus maridos; querem saber também, se ainda se encontrarão.
V ários esposos desejam mesmo saber de antemão se depois da morte serão
separados, ou se viverão juntos; aqueles cujos caracteres (animi) não
concordam,se serão separados,e aqueles cujos caracteres concordam, se viverão
juntos; como o conhecimento dessas cousas é vivamente desejado, ele vai ser
dado, o que terá lugar na ordem seguinte: 1. O Amor do sexo permanece em
cada homem, depois da morte, tal como no M undo era interiormente, isto é,
em sua vontade interior e em seu pensamento interior. 11. O Amor conjugal
igualmente. III. O s dois Esposos ordinariamente depois da morte se
encontram, se reconhecem, de novo se consorciam, e durante algum tempo
vivem juntos, o que tem lugar no Primeiro Estado; assim enquanto estão nos
externos como no M undo. IV . M as sucessivamente, a medida que se despojam
dos externos, e que entram nos internos, eles percebem em que amor e em que
inclinação estiveram mutuamente um em relação ao outro e por conseguinte se
podem viver juntos, ou não. V . Se podem viver juntos, permanecem esposos;
mas se não o podem, eles se separam; às vezes o M arido da Esposa, às vezes a
Esposa, do M arido, e às vezes, mutuamente um do outro. V I. E então é dada
ao homem uma Esposa, conveniente, e à mulher um marido conveniente. V I.
O s Esposos gozam entre si de comunicações semelhantes as que tinham no
M undo, mas mais agradáveis e mais felizes, todavia sem prolificação; em lugar
desta, eles, têm uma prolificação espiritual que é a do amor e da sabedoria.
V III.É isso que acontece aos que vão para o Céu; mas acontece de outro modo
com os que vão para o Inferno. Segue agora a Explicação, pela qual estes
Artigos são ilustrados e confirmados.
46 - 1.O Amor do sexo permanece em cada homem depois da morte, tal como
no M undo era interiormente, isto é, em sua vontade interior e em seu
pensamento interior. T odo Amor segue o homem depois da morte, porque é o
43

Ser de sua vida; e o Amor reinante, que é o chefe de todos os outros,


permanece no homem pela eternidade, e com este amor ao mesmo tempo os
amores subordinados; se permanecem,é porque o Amor pertence propriamente
ao espírito do homem, e pertence ao corpo pelo espírito, e o homem depois da
morte se torna espírito,e assim leva consigo o seu amor. O que o Amor é o Ser
da vida do homem, é evidente que tal foi a vida do homem no M undo, tal se
torna a sua sorte depois da morte. Q uanto ao que concerne ao Amor do sexo,
ele é o amor universal de todos, pois é, por criação, implantado na Alma
mesma do homem, da qual é derivada a essência do homem inteiro, e isso para
a propagação do gênero humano; que seja este amor que permanece
principalmente, é porque, depois da morte, o homem é homem, e a mulher é
mulher; e porque não há cousa alguma na alma, na mente e no corpo, que não
seja masculino no macho,e feminino na fêmea; e estes pois foram criados de tal
sorte, que estão em um contínuo esforço para a conjunção, e mesmo para a
conjunção a fim de se tornarem um; este esforço é o Amor do sexo, que
precede o Amor Conjugal; ora, como a inclinação conjuntiva está gravada em
todas e em cada uma das cousas do macho e da fêmea, segue-se que esta
inclinação não pode ser suprimida nem morrer com o corpo.
47 - Se o Amor do sexo permanece tal como era anteriormente no M undo, é
porque em todo homem há um Interno e um Externo, os quais são chamados
também homem Interno e homem Externo, e por conseguinte há uma vontade
interna e uma vontade externa, um pensamento interno e um pensamento
externo; o homem deixa seu Externo e retém seu Interno, quando morre; pois
os Externos pertencem propriamente ao corpo, e os Internos pertencem
propriamente ao espírito; uma vez que, portanto, o homem é seu Amor; e que
Amor reside em seu espírito, segue-se que o Amor do sexo permanece nele
depois da morte,tal como interiormente estava nele; por exemplo,se este Amor
interiormente era conjugal e casto, permanece depois da morte conjugal e
casto; mas se interiormente, foi escortatório, permanece também como tal
depois da morte. M as é preciso que se saiba que o Amor do sexo não é em um,
tal como é em outro, as diferenças são infinitas; mas sempre acontece que tal
como é no espírito de cada um,assim permanece.
48 - II. O Amor conjugal permanece no homem tal como no M undo era
interiormente,isto é,na vontade interior e no pensamento interior.
Como um é o Amor do sexo e outro o Amor conjugal, é por isso que são
mencionados um e outro, e que se diz que este permanece também, depois da
morte, tal como era no homem em seu homem interno, quando vivia no
M undo; mas como poucas pessoas conhecem a distinção entre o Amor do sexo
e o Amor conjugal, vou por isso mesmo dizer alguma cousa a respeito, no
começo deste T ratado. O Amor do sexo é o Amor por várias e com várias do
Sexo, mas o Amor Conjugal é o amor por uma unicamente e com uma do
Sexo; ora, o amor por várias e com várias é um Amor natural, pois é comum
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com as bestas e, os pássaros, e estes animais são naturais; mas o Amor Conjugal
é um Amor espiritual, e é particular e próprio dos homens, porque os homens
foram criados e por conseqüência nascem para se tornarem espirituais; tanto
mais,portanto,o homem se torna espiritual, tanto mais se despoja do Amor do
sexo,e se reveste do Amor conjugal. N o começo do casamento o Amor do sexo
se apresenta como conjunto ao Amor conjugal, mas na progressão do
casamento eles são separados, e então naqueles que são espirituais o Amor do
sexo é destruído e o Amor conjugal é insinuado, mas naqueles que são naturais,
acontece o contrário. Pelo que acaba de ser dito, é evidente que o Amor do
Sexo, sendo um amor com várias, é em si natural e mesmo animal, é impuro e
incasto, e sendo vago e ilimitado, é escortatório; mas dá-se interiormente ao
contrário com o Amor conjugal. Q ue o Amor conjugal seja espiritual, e
propriamente humano,ver-se-á claramente no que segue.
47 - (bis) III.O s dois esposos ordinariamente depois da morte se encontram, se
reconhecem, de novo se consorciam, e durante algum tempo vivem juntos, o
que acontece no Primeiro Estado, assim, enquanto estão nos externos como no
M undo. H á dois Estados por que o homem passa depois da morte, o estado
Externo e o estado Interno; passa primeiro pelo estado externo, e mais tarde
pelo interno; e durante o estado externo, o marido e a esposa, se um e outro
estão mortos, se encontram, se reconhecem, e, se viveram de acordo no
M undo, eles se consorciam, e durante algum tempo vivem juntos; e enquanto
estão neste estado,um não conhece a inclinação do outro a seu respeito,porque
esta inclinação se esconde nos internos; mas mais tarde, quando atingem o
estado interno, a inclinação se manifesta; se é concordante e simpática, eles
continuam a vida conjugal; mas se é discordante e antipática, rompem o
casamento. Se um H omem teve várias esposas, ele se conjunta com elas pela
ordem, enquanto está no estado externo; mas quando entra no estado interno,
no qual percebe as inclinações do amor, tais quais são, então ou adota uma das
esposas,ou as abandona todas; pois no M undo espiritual, do mesmo modo que
no M undo natural, não é permitido a cristão algum ter várias esposas, porque
isso macula e profana a religião; a mesma cousa acontece com uma mulher que
teve vários maridos; mas entretanto as mulheres não se juntam a seus maridos,
unicamente se apresentam, e os maridos se juntam a elas. Saiba-se que os
M aridos conhecem raramente suas esposas, mas as esposas, conhecem muito
bem os maridos; e isso porque as mulheres têm uma percepção interior do
amor,e os homens tem unicamente uma percepção exterior.
48 - (bis) IV . M as sucessivamente, à medida que se despojam dos externos, e
que entram nos internos percebem em que inclinação estiveram mutuamente,
um em relação, ao outro, e por conseguinte se podem viver juntos, ou não.
Isto não tem necessidade de ser mais explicado, pois é uma conseqüência do
que foi mostrado no Artigo precedente; bastará ilustrar aqui como o homem
depois da morte se despoja dos externos e se reveste dos internos. Cada um
45

depois da morte, é a princípio, introduzido em um M undo que é chamado


M undo dos espíritos, e que fica no meio entre o Céu e o Inferno; e lá é
preparado, o bom para o Céu, e o mau para o Inferno, a preparação aí tem por
fim que o Interno e o Externo concordem e façam um e que não sejam
discordantes e não façam dois; no M undo natural eles fazem dois; e não fazem
um senão nos que são sinceros de coração; que façam dois, isso é evidente nos
velhacos e nos astuciosos, principalmente nos hipócritas, nos bajuladores, nos
dissimulados e nos mentirosos; mas no M undo espiritual, não é permitido ter
assim a mente dividida; o que foi mau nos internos será mau também nos
externos; acontece o mesmo com o bom nos internos, ele será bom também
nos externos; pois todo homem depois da morte tornam se tal como foi
interiormente, e não tal como foi exteriormente; é para esse fim que o homem
é então posto alternativamente em seu Externo e em seu Interno; e cada
homem, quando está em seu Externo, é sensato, isto é, quer parecer sensato,
mesmo o mau; mas este em seu Interno é insensato; pode durante estas
vicissitudes ver suas loucuras, e se arrepender delas; mas se não se arrependeu
no M undo, não o pode fazer mais tarde, pois ama suas loucuras, e quer
permanecer nelas; por isso força também o seu Externo a ser igualmente louco;
assim seu Interno e seu Externo se tornam um; e quando isso foi feito, está
preparado para o Inferno. M as o contrário acontece ao bom. Como este no
M undo dirigiu suas vistas para Deus e se arrependeu, era mais sensato no
Interno que no Externo; por vezes, também, no externo foi arrastado à loucura
pelos atrativos e pelas vaidades do mundo, por isso seu Externo é posto de
acordo com seu Interno que, assim como foi dito, é sensato; e, quando isso foi
feito, ele está preparado para o Céu. Por isto foi ilustrado como o homem
depois da morte se despoja do Externo e se reveste do interno.
49 - V . Se podem, viver, juntos, permanecem esposos; mas se não o podem,
eles se separam; às vezes o M arido da Esposa, às vezes a Esposa, do M arido, às
vezes mutuamente um do outro. Se se faz separações depois da morte, é
porque as conjunções, que se fazem nas terras, se fazem raramente por alguma
percepção interna do amor, mas se fazem por uma percepção externa que
esconde o interno; a percepção externa do amor tem sua causa e sua origem em
cousas que pertencem ao Amor do M undo e do Corpo; as do Amor do mundo
são principalmente as riquezas e as posses, e as do Amor do corpo são as
dignidades e as honras;, e, além disso, são também diversos atrativos que
seduzem, como a beleza e o fingimento de costumes decentes, algumas, vezes
mesmo a falta de castidade; e, além disso, os Casamentos se contraem nos
região, da cidade ou da vila onde as partes nasceram, e onde habitam; e daí
resulta uma escolha restrita e limitada às famílias que se conhecem, e que estão
em uma condição semelhante de existência; dai vem que os casamentos
contraídos no M undo são ordinariamente externos, e não ao mesmo tempo
internos, quando entretanto a Conjunção interna, que é a das Almas, constitui
o Casamento mesmo; e esta conjunção não é perceptível antes que o homem
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tenha se despojado do Externo e se revestido do Interno, o que se faz depois da


morte; é portanto por isso que então se fazem as separações, e em seguida novas
conjunções entre os que são semelhantes e homogêneos, a não ser que tenha
sido provido para estas nas terras, o que tem lugar para os que desde a
juventude amaram, desejaram e pediram ao Senhor uma aliança legítima e
agradável com uma única pessoa do sexo, e que desprezam e desdenham os
vagos caprichos do amor.
50 - V I. Então é dada ao homem uma Esposa, conveniente, e à mulher um
marido conveniente. A razão disso é que não podem ser recebidos no Céu para
aí permanecer, senão os Esposos que foram interiormente unidos, ou que
podem ser unidos em um; pois lá, dois Esposos são chamados não dois Anjos,
mas um Anjo; o que é entendido por estas palavras do Senhor, "que eles não
são mais dois, mas uma única carne". Se não são recebidos outros Esposos no
Céu, é porque outros não podem ai coabitar, isto é, estar juntos em uma
mesma casa, em um mesmo quarto e em uma mesma cama; com efeito, todos
os que estão nos Céus foram consociados segundo as afinidades e as
proximidades do amor, e tem habitações segundo estas afinidades e estas
proximidades; pois no M undo espiritual não há espaços, mas há aparências de
espaço, e estas são segundo os estados de vida dos habitantes, e os estados da
vida são segundo os estados do amor; é por isso que ninguém aí pode morar
senão em sua casa, a qual foi provida para ele, e lhe foi designada, segundo a
qualidade do seu amor; se morar em outro lugar, sentirá o peito opresso, e
respirará com dificuldade; dois não podem morar juntos em uma casa, a não
ser que sejam semelhantes; e os Esposos não podem de modo algum a não ser
que tenham inclinações mútuas; se têm inclinações externas e não ao mesmo
tempo internas, a casa mesma ou o lugar mesmo os separa, os rejeita e os
expulsa; é por causa disso que, para os que, após a preparação, são introduzidos
no Céu, é provido um Casamento com um cônjuge cuja alma se inclina à
união com a do outro, a ponto de não quererem ser duas vidas, mas uma só
vida; é por esta razão que, depois da separação é dada ao homem uma esposa
conveniente,e à mulher um marido conveniente.
51 - V II. O s Esposos gozam entre si de comunicações semelhantes às que
tinham no M undo,mas mais agradáveis e mais felizes,todavia sem prolificação;
em lugar desta, tem uma prolificação espiritual, que é a do amor e da
sabedoria. Se os Esposos gozam entre si de comunicações semelhantes às que
tinham no M undo, é porque depois da morte o macho é macho, e a fêmea é
fêmea, e porque a inclinação à conjunção foi implantada em um e outro por
criação; e esta inclinação no homem pertence a seu espírito e por conseguinte a
seu corpo; é por isso que depois da morte,quando o homem se torna espírito, a
mesma inclinação mútua permanece e ela não pode existir sem semelhantes
comunicações; pois o homem é homem como antes,e nada falta ao macho nem
à fêmea; quanto à forma são semelhantes a eles mesmos, igualmente quanto às
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afeições e aos pensamentos; que pode então resultar, senão que há semelhantes
comunicações; e que, como o Amor conjugal é casto, puro e santo, as
comunicações são mesmo completas? M as, sobre este assunto, pode se ver
maiores detalhes no M emorável n. 44. Se as comunicações são então mais
agradáveis e mais felizes, é porque este Amor, quando se torna o Amor do
espírito, torna-se interior e mais puro, e por conseguinte mais perceptível, e
todo prazer aumenta segundo a percepção, e aumenta até ao ponto em que sua
beatitude é discernida em seu prazer.
52 - Se os Casamentos nos Céus não têm prolificação, mas em lugar desta há
uma prolificação espiritual, que é a do Amor e da Sabedoria, é porque nos que
estão no M undo espiritual, falta o terceiro (princípio) que é o natural, e este
terceiro é o continente dos espirituais; ora os espirituais sem seu continente não
tem a consistência, como a têm as cousas que são procriadas no M undo
natural; e as espirituais consideradas em si mesmos, se referem ao Amor e à
Sabedoria; é por isso que o amor e a sabedoria são as cousas que nascem dos
casamentos dos habitantes dos Céus. Diz-se que o amor e a sabedoria nascem,
porque o amor conjugal aperfeiçoa o Anjo, pois o une a seu consorte, donde
resulta que se torna cada vez mais homem, pois, como foi dito acima, dois
Esposos no Céu não são dois mas um único Anjo; é por isso que pela união
conjugal eles se enchem do humano, que consiste em querer se tornar sábio, e
em amar o que pertence à sabedoria.53 - V III. É isso o que acontece nos que
vão para o Céu, mas é diferente para os que vão para o Inferno. Q ue depois da
morte seja dada ao homem uma esposa conveniente, e que estes, gozem de
comunicações agradáveis e felizes mas sem outra prolificação que não seja uma
prolificação espiritual, isso deve ser entendido a respeito dos que são recebidos
no Céu e se tornam Anjos; a razão é que estes são espirituais, e por conseguinte
santos. M as os que vão para o Inferno são todos naturais, e os casamentos
puramente naturais não são casamentos, mas são conjunções que provém de
uma paixão incasta, N o que segue, quando se tratar do casto e do incasto, e
mais adiante quando se tratar do Amor escortatório, se dirá o que são essas
conjunções.
54 - Ao que foi relatado até aqui sobre o Estado dos esposos depois da morte, é
preciso acrescentar os detalhes seguintes: 1. T odos os Esposos, que são
puramente naturais são separados depois da morte; e isso porque neles o amor
do casamento é frio, e o amor do adultério é quente; entretanto, depois da
separação, às vezes eles se consorciam como esposos com outros, mas pouco
tempo depois se afastam mutuamente um do outro, o que muitas vezes é
repetido várias vezes; e enfim o homem se liga a alguma prostituta, e a mulher
a algum adúltero, o que se efetua em uma prisão infernal de que se falou no
Apocalipse R evelado n. 153, p. X , onde a promiscuidade é interdita a um e a
outro sob pena de castigo. 2. O s Esposos, dos quais um é espiritual e o outro
natural, são separados também depois da morte, e é dado ao Espiritual um
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cônjuge conveniente, mas o N atural é relegado para um dos lugares de


depravação junto aos seus semelhantes. 3. Q uanto aos que no M undo viveram
celibatários, e afastaram inteiramente do casamento a sua mente, se são
espirituais, permanecem celibatários, mas se são naturais, tornam-se
escortatórios. É diferente com aqueles que em seu Celibato desejaram o
casamento, e, com mais forte razão, que o solicitaram sem sucesso; se são
espirituais, é provido para eles um casamento feliz, mas não antes de estarem
no Céu. 4. Aqueles que no M undo estiveram fechados em mosteiros, tanto
homens como mulheres, esses depois de terem levado uma vida monacal, que
continua algum tempo depois da morte, são desonerados e libertados e gozam
da plena liberdade de seus desejos, seja que queiram viver como esposos ou
não; se querem viver como esposos, eles o serão; se não o querem, são
transportados para junto dos celibatários sobre o lado do Céu; mas os que
ardiam com o fogo de desejos proibidos são precipitados. 5. Se ao Celibatários
estão sobre o lado do Céu, é porque a esfera de um celibato perpétuo infesta a
esfera do amor conjugal, que é a esfera mesma do Céu; a esfera do amor
conjugal é a esfera mesma do Céu porque ela descende do Casamento do
Senhor e da Igreja.
55 - Ao que precede ajuntarei dois M emoráveis. Primeiro M emorável: U m dia
ouviu-se do Céu uma melodia muito suave; eram esposas com virgens que
cantavam juntas um cântico; a suavidade do canto era como a afeição de algum
amor que flui harmoniosamente; os cantos celestes não são mais que afeições
sonoras, ou afeições expressas e modificadas pelos sons; pois assim com os
pensamentos são expressos pelas palavras, do mesmo modo as afeições o são
pelos cantos; pela medida e o fluxo da modulação os Anjos percebem o assunto
da afeição. H avia então muitos espíritos em torno de mim e alguns deles
disseram que ouviam esta melodia muito suave e que era a melodia de alguma
afeição agradável, cujo objeto não conheciam; por isso fizeram várias
conjecturas, mas em vão. U ns conjeturavam que este canto exprimia a afeição
de um noivo e de uma noiva quando há promessa de casamento; outros que
exprimia a afeição do noivo e da noiva na solenidade das núpcias; e outros, que
exprimia o primitivo amor do marido e da esposa. M as então no meio deles
apareceu um Anjo vindo do Céu, e lhes disse que se cantava o Amor casto do
sexo; mas, os que o cercavam perguntaram o que era o Amor casto do sexo; e o
Anjo disse: "É o Amor de um homem - por uma virgem ou por uma esposa
bela de forma e decente de costumes, sem nenhuma idéia de lascívia, e
reciprocamente, o amor que uma virgem ou uma esposa sente por um
homem". Depois de ter falado, assim, o Anjo desapareceu. O canto continuou
e então, como conheciam o objeto da afeição que exprimia, eles o ouviam com
muita variedade, cada um segundo o estado de seu amor, os que encaravam as
mulheres castamente ouviam este canto como sinfônico e suave; mas os que
encaravam as mulheres incastamente o ouviam como sem harmonia, e triste; e
os que encaravam as mulheres com desdém o ouviam como discordante e
49

rouco. M as de repente a Planície sobre a qual eles estavam foi mudada em um


T eatro, e uma voz foi ouvida: "Discuti este Amor". E imediatamente se
apresentaram Espíritos de diversas sociedades, e no meio deles alguns Anjos
vestidos de branco; e estes, tomando a palavra disseram: "N ós, neste M undo
espiritual,fizemos pesquisas sobre todas as espécies de amor,não somente sobre
o amor da mulher e sobre o amor recíproco do marido e da esposa mas também
em relação aos homens ;e nos foi permitido percorrer as sobém sobre o amor
do homem em relação às mulheres, e da mulher em relação aos homens; e nos
foi permitido percorrer as so e examinar, e não encontramos ainda o comum
amor do sexo casto senão naqueles que, pelo amor verdadeiramente conjugal
estão em uma potência contínua, e estes estão nos Céus supremos; e nos foi
permitido perceber também o influxo deste amor nas afeições de nossos
corações, e sentimos que pela suavidade ultrapassavam todos os outros amores,
exceto o amor de dois esposos cujos corações são um; mas nós pedimos que
discutais este amor, porque a vossos olhos, ele é novo e desconhecido; e como
este amor é a amenidade mesma, por nós no Céu é chamado a suavidade
celeste". Q uando discutiam, pois, os que não tinham podido pensar na
castidade a respeito dos casamentos, foram os primeiros a falar, e disseram:
"Q uem é que vendo uma virgem ou uma bela e amável esposa pode reprimir e
purificar de cobiças as idéias de seu pensamento, a ponto de amar a beleza e
entretanto não querer saboreá-la inteiramente, se isso for permitido? Q uem
pode mudar a cobiça inata em cada homem em uma tal castidade, assim em
alguma cousa que não é ele, e entretanto amar? O amor do sexo, quando pelos
olhos entra no pensamento, pode se deter no rosto de uma mulher? N ão desce
imediatamente ao peito, e além? O s anjos falaram de cousas vãs, dizendo que
este amor é casto, e que entretanto é o mais suave de todos, e que existe
unicamente nos maridos que estão no amor verdadeiramente conjugal e por
conseguinte em uma potência muito grande com suas esposas. Estes, quando
vêem belas mulheres, podem mais que os outros, manter no alto e como que
suspender as idéias de seu pensamento,a fim de impedi-las de descer e ir para o
que constitui esse amor?". Depois deles, falaram os que estavam no frio e no
calor, no frio por suas esposas. e no calor pelo sexo, e disseram: “O que é o
amor casto do sexo? N ão, há contradição em juntar a castidade ao amor do
sexo? O que é um sujeito com um adjetivo contraditório, senão uma cousa a
que se tirou seu atributo, uma cousa que nada é? Como o amor casto do sexo
pode ser o mais suave de todos os amores, quando a castidade o priva de sua
suavidade? Sabeis todos onde reside a suavidade deste amor, quando portanto a
idéia de conjunção com isso é banida, onde está e donde vem então a
suavidade?" N esse momento alguns o interromperam e disseram: "N ós temos
estado com as mais belas mulheres, e não as temos cobiçado; nós portanto,
sabemos o que é o amor casto do sexo". M as seus consociados, que conheciam
a sua lascívia responderam:"V ós,então,estáveis em um estado de desgosto pelo
sexo por impotência, e este não é o amor casto do sexo, mas é o último estado
50

do amor incasto".O uvindo estas proposições,os Anjos indignados pediram que


os que se achavam a direita ou ao meio-dia, falassem, e estes disseram: "H á o
amor entre homem e homem, e também entre mulher e mulher, e há o amor
do homem pela mulher, e o amor da mulher pelo homem; estes três amores
por pares diferem absolutamente entre si; o amor entre homem e homem é
como o amor entre entendimento e entendimento, pois o homem foi criado e
por conseguinte nasce para se tornar entendimento; o amor entre mulher e
mulher é CG M G o amor entre afeição e afeição do entendimento dos homens,
pois a mulher foi criada e nasce para se tornar amor do entendimento do
homem; estes amores, a saber entre homem e homem, e também entre mulher
e mulher não penetram profundamente no peito, mas ficam de fora, e apenas
se tocam, assim não conjuntam os interiores; é por isso que dois homens por
meio de raciocínios e de raciocínios combatem entre si como dois atletas; e
duas mulheres às vezes, por meio de cobiças e cobiças combatem entre si com
seus punhos como dois lutadores. M as o amor entre o homem e a mulher é o
amor entre o entendimento e a afeição do entendimento, e este amor penetra
profundamente e conjunta; e esta conjunção é este amor; mas a conjunção das
mentes e não ao mesmo tempo dos corpos,ou o esforço para esta conjunção só,
é o amor espiritual, e por conseguinte o amor existe unicamente naqueles que
estão no amor verdadeiramente conjugal, e por conseguinte em uma potência
eminente,porque estes,por causa da castidade,não admitem o influxo de amor
do corpo de uma outra mulher que não seja a sua esposa; e como estão em
uma potência sobreeminente, não podem deixar de amar o sexo, e ao mesmo
tempo ter em aversão o que é incasto; dai lhes vem o amor casto do sexo, amor
que, considerado em si mesmo, é uma amizade interior espiritual tirando sua
suavidade de uma potência eminente, mas casta; tem uma potência eminente
pela abdicação total da escortação, e esta potência é casta porque só a esposa é
amada. O ra, como este amor neles não participa da carne, mas unicamente do
espírito, é casto; e como a beleza da mulher, pela inclinação inata, entra ao
mesmo tempo na mente, este amor é suave". A estas palavras vários dos
assistentes puseram as mãos sobre os ouvidos, dizendo: "Estas palavras ferem
nossos ouvidos, e as cousas que acabais de enunciar são para nós como nada".
Eram os espíritos não castos; e então este canto do Céu foi ouvido de novo e
neste momento era mais suave que precedentemente; mas era tão discordante
aos ouvidos dos Espíritos não castos, que em razão desta ruidosa discordância
eles se precipitaram para fora do T eatro e fugiram; só ficou um pequeno
número de Espíritos que pela sabedoria,amavam a castidade conjugal.
56 - Segundo M emorável: U m dia, no M undo espiritual, conversando com os
Anjos, fui inspirado pela deliciosa volúpia de ver o T emplo da Sabedoria, que
já tinha visto uma vez, e eu os interroguei a respeito do caminho para ir lá; eles
me disseram: "Segue a luz, e tu o acharás". E eu disse: “O que é isso? Segue a
es disseram: "A nossa luz se torna cada vez mais brilhante luz!" Eles à medida
que a gente se aproxima desse T emplo, segue portanto a luz segundo o
51

crescimento de seu brilho, pois a nossa Luz procede do Senhor como Sol, e por
conseguinte, considerada em si mesma, ela é a Sabedoria". Então,
acompanhado pelos dois Anjos, dirigi meus passos segundo o crescimento do
brilho da luz,e subi por senda escarpada até ao cimo de uma Colina,que estava
na Plaga meridional; e lá,havia uma Porta magnífica; e o guarda, tendo visto os
Anjos comigo, a abriu; e eis que vimos um pórtico de palmeiras e de loureiros,
para o qual dirigimos os nossos passos; o Pórtico fazia uma volta e terminava
em um jardim no meio do qual estava o T emplo da Sabedoria. Aí, quando
dirigi o olhar em torno de mim, vi pequenos Edifícios parecendo-se com o
T emplo, nos quais estavam Sábios; aproximamo-nos de um desses edifícios, e à
entrada falamos ao que o habitava,e lhe expusemos a causa de nossa vinda,e de
que maneira tínhamos chegado, e ele nos disse: "Sede bem vindos, entrai
assentai-vos e consociemo-nos por conversações de sabedoria". V i que o
Edifício,por dentro,era dividido em dois,e entretanto era um; era dividido em
dois por uma antepara transparente, mas parecia como um pela transparência
da antepara, que era como de cristal muito puro, perguntei porque isso era
assim; ele me disse: "N ão estou só, minha esposa está comigo; e nós somos
dois, entretanto não somos dois mas uma só carne". M as repliquei: "Sei que és
um sábio; e o que é que o sábio ou a sabedoria tem de comum com a mulher?
A estas palavras, o nosso hóspede, tomado por uma espécie de indignação,
mudou de fisionomia, e estendeu a mão; e eis que se apresentaram
imediatamente outros sábios dos edifícios vizinhos, aos quais ele disse,
sorrindo: “O nosso estrangeiro me disse aqui, interrogando-me: O que é que o
sábio ou a sabedoria tem de comum com a mulher?" R iram-se todos desta
pergunta, e disseram: “O que é o sábio ou a sabedoria sem a mulher, ou sem o
amor? A esposa é o amor da sabedoria do sábio". M as o nosso hóspede disse:
"Consociemo-nos agora por alguma conversação sobre a sabedoria; falemos das
causas, e em primeiro lugar da causa da Beleza feminina". E então eles falaram
em ordem, e o primeiro deu por causa que as mulheres foram criadas pelo
Senhor afeições da sabedoria dos homens, e a afeição da sabedoria é a Beleza
mesma. O segundo deu por causa, que a mulher foi criada pelo Senhor por
meio da sabedoria do homem, pois que ela o foi segundo o homem, e por
conseguinte é a forma da sabedoria, forma inspirada pela afeição do amor; e
como a afeição do amor é a vida mesma, a mulher é a vida da sabedoria,
enquanto que o homem é a sabedoria; e a vida da sabedoria é a Beleza mesma.
O terceiro deu por causa, que as mulheres receberam como dom a percepção
das delícias do amor conjugal, e, como todo seu corpo é o órgão desta
percepção, não pode deixar de ser que a habitação dessas delícias do amor
conjugal com sua percepção, seja a Beleza. U m quarto deu por causa, que o
Senhor tirou do homem a beleza e a elegância da vida e as fez passar para a
mulher, e por conseqüência, sem a reunião com sua beleza e sua elegância na
mulher, o homem é selvagem, áspero, seco, e não amável, não é sábio senão
para si mesmo, e isso é insensato; mas quando o homem, está unido com sua
52

beleza e sua elegância da vida na esposa ele se torna agradável, gracioso, vivo e
amável, e por conseqüência sábio. U m quinto deu por causa, que as mulheres
foram criadas Belezas,não para elas mesmas, mas para os homens, a fim de que
os homens, duros por si mesmo, se adocem; que suas mentes (animi) severas
por si mesmas, se abrandem; e que seus corações, frios por si mesmo, se
aqueçam; e os homens tornam-se tais, quando se tornam unia só carne com
suas esposas. U m sexto deu por causa, que pelo Senhor o U niverso foi criado
obra muito perfeita, mas que nele não foi criado nada mais perfeito que a
mulher bela de face e decente de costumes,a fim de que o homem renda graças
ao Senhor por esta munificência, e lhe prove seu reconhecimento pela recepção
da sabedoria que procede d'Ele". Depois que estas razões e várias outras
semelhantes foram dadas, a Esposa apareceu, através da antepara de cristal, e
disse ao M arido: "Fala, eu te peço". E enquanto ele falava, no discurso era
percebida a vida da sabedoria procedente da Esposa pois seu amor estava no
som da linguagem; assim esta verdade foi provada pela experiência. Depois
disso, visitamos o T emplo da Sabedoria, e também os lugares paradisíacos que
o cercavam; e cheios da alegria que ai sentimos, fomos embora, e passamos
através do Pórtico até à porta, e descemos pelo caminho pelo qual tínhamos
subido.
53

Do amor verdadeiramente
conjugal
57 - O Amor conjugal é de uma variedade infinita; não é em um tal como é em
outro; parece, na verdade, semelhante em muitos, mas parece assim diante do
julgamento do corpo, e o homem discerne pouco de semelhantes cousas por
esse julgamento, porque ele é grosseiro e embotado; pelo julgamento do corpo
é entendido o julgamento da mente segundo os sentidos externos; mas diante
dos que vêem segundo o julgamento do espírito, as diferenças se manifestam, e
mais distintamente diante dos que podem elevar mais alto a vista deste
julgamento, o que se faz subtraindo-o aos sentidos, e elevando-o a uma luz
superior; estes por fim podem se confirmar pelo entendimento e assim ver que
o Amor conjugal não é em um tal como é em outro. M as, entretanto, seja
quem for, não pode ver as variedades infinitas deste Amor em alguma luz do
entendimento mesmo elevado, a menos que saiba primeiro o que é esse Amor
em sua essência mesma e em sua integridade, assim o que ele era quando foi
posto por Deus no homem ao mesmo tempo que a vida; se este estado, que foi
o seu estado mais perfeito, não é conhecido, todas as pesquisas para
descobrir-lhe as diferenças são vãs; pois não há ponto algum sólido, de onde as
diferenças sejam deduzidas como de um princípio, nem ao qual elas se refiram
com a um fim,e possam por conseguinte se manifestar com verdade e não com
falsidade.É por esta razão que aqui vamos começar por descrever este Amor em
sua essência real; e como era, quando foi infundido por Deus no homem ao
mesmo tempo que a vida; começaremos a descrevê-lo tal como foi em seu
estado primitivo; e como nesse estado era verdadeiramente conjugal, este
Parágrafo tem por título: Do Amor V erdadeiramente Conjugal; mas esta
descrição será feita nesta ordem: 1 - H á um Amor verdadeiramente conjugal
que hoje é tão raro, que não se sabe o que ele é, e que apenas se sabe que ele
existe.II - A origem deste Amor vem do Casamento do bem e do vero. III - H á
correspondência deste Amor com o Casamento do Senhor e da Igreja. IV -Este
Amor, considerado segundo sua origem e sua correspondência, é celeste,
espiritual, santo, puro e limpo, mais do que todos os outros amores que pelo
Senhor estão nos anjos do Céu, e nos homens da Igreja. V - Ele é mesmo o
Amor fundamental de todos os amores celestes e espirituais, e por conseqüência
de todos os amores naturais. V I N este amor foram reunidas todas as alegrias e
todas as delícias, desde as primeiras até às últimas. V II - M as a este amor não
vêm e não podem estar senão aqueles que se dirigem ao Senhor, e que amam os
veros da Igreja e praticam seus bens. V III - Este Amor era o Amor dos amores
entre os Antigos, que viveram nos séculos do ouro, da prata e do bronze; mas
em seguida foi progressivamente se apagando. A explicação destes Artigos vai
seguir-se:
54

58 - I. H á um Amor verdadeiramente conjugal, que hoje é tão raro, que não se


sabe o, que ele é, e que apenas se sabe que existe. Q ue haja um Amor
conjugal, tal como é descrito adiante, pode-se mesmo reconhecer pelo primeiro
estado deste amor, quando ele se insinua e entra no coração de um rapaz e de
uma moça, assim naqueles que começam a amar uma única pessoa do sexo, e a
desejar obtê-la em casamento, e mais ainda no tempo dos esponsais, quando é
prolongado e se aproxima das núpcias, e enfim durante as núpcias, e nos
primeiros dias que as seguem; quem é que então não reconhece, e não
concorda,que este,Amor é o amor fundamental de todos os amores; e também
que nele foram reunidas todas as alegrias e todas as delícias desde as primeiras
até às últimas? E quem é que não sabe, que após esse tempo delicioso, estas
alegrias passam e se apagam progressivamente, até ao ponto dos esposos mal as
sentirem? Se então, do mesmo modo que antes, se lhes diz que este Amor é o
amor fundamental de todos os amores, e que nele foram reunidas todas as
alegrias e todas as delícias, eles não concordam, e não o reconhecem; e dirão
talvez que são contos, ou sutilezas místicas acima do seu alcance. Dai, é
evidente que o primitivo amor do casamento imita o Amor verdadeiramente
conjugal, e o apresenta à vista em uma espécie de sexo, que é incasto, e em seu
lugar foi implantado o amor de sexo, que é incasto, e em seu lugar foi
implantado ao amor de uma única pessoa do sexo, o qual é o verdadeiro amor
conjugal e casto; quem é que então não olha para as outras mulheres com olhar
indiferente,e para a sua única bem amada,com olhar amoroso?
59 - Se, entretanto, o Amor verdadeiramente conjugal é tão raro, que não se
sabe o que ele é, e que apenas se sabe que existe, é porque o estado de delícias
antes das núpcias é mudado depois delas em um estado de indiferença
proveniente da insensibilidade; as causas desta mudança de estado são em
número demasiado grande para que possam ser referidas aqui; mas o serão
adiante, quando as causas de frieza, de separações e de divórcios serão
desvendados em ordem; por estas causas se verá que na maioria, hoje, esta
imagem do amor conjugal, e com ela o conhecimento deste amor, foram de tal
modo destruídos, que não se sabe o que é este amor, e apenas se sabe que
existe. É sabido que todo homem, quando nasce, é puramente corporal e que
de corporal se torna natural cada vez mais interiormente, e assim racional, e
enfim espiritual.Se isso acontece progressivamente,é porque o corporal é como
um húmus, no qual os naturais, os racionais e os espirituais são semeados em
ordem; assim o homem se torna cada vez mais homem; acontece quase a
mesma cousa quando ele se casa; o homem então se torna mais plenamente
homem porque é conjunto com uma companheira com a qual constitui um
único homem; mas isso se faz em uma espécie de imagem no primeiro estado,
de que se acaba de falar; igualmente então ele começa pelo corporal, e avança
para o natural, mas quanto à vida conjugal, e por conseguinte quanto à
conjunção em um; os que então amam os corporais-naturais, e só os racionais
que daí provêm, não podem ser unidos a sua consorte com em um, a não ser
55

quanto aos externos; e quando os externos faltam,os internos são invadidos por
um frio que expulsa os prazeres deste amor tanto da mente como do corpo, e
em seguida tanto do corpo como da mente; e isso até que nada mais reste da
reminiscência do primitivo estado de seu casamento, nem por conseqüência
deste estado. O ra, como isto acontece hoje com a maioria, é evidente que não
se sabe o que é o amor verdadeiramente conjugal, e que apenas se sabe que ele
existe. É inteiramente diferente com os que são espirituais; para eles o primeiro
estado é uma iniciação a felicidades perpétuas, que crescem gradativamente,
conforme o espiritual-racional da mente, e por ele o natural-sensual do corpo,
de um se conjunta e se une com o do outro; mas estes,são raros.
60 - II. A origem deste Amor vem do Casamento do B em e do V ero. T odo
homem inteligente reconhece que todas as cousas no U niverso se referem ao
bem e ao vero, porque isto é um vero universal; não se pode também deixar de
reconhecer que em todas e em cada uma das cousas do universo o bem está
conjunto ao vero, e o vero ao bem, porque isso também é um vero universal
que está ligado com o outro. Se todas as cousas no universo se referem ao bem
e ao vero, e si o bem está conjunto ao vero, e o vero ao bem, é porque um e
outro procedem do Senhor, e procedem d'Ele como um. As cousas que
procedem do Senhor são o Amor e a Sabedoria porque estes dois são o Senhor,
assim segundo Ele; e todas as cousas que pertencem ao amor são chamadas
bens, e todas as que pertencem à sabedoria são chamados veros; e pois que dele
como criador procedem o Amor e a Sabedoria, segue-se que estes dois estão nas
cousas criadas.Isto pode ser ilustrado pelo Calor e a Luz,que procedem do Sol,
todas as cousas da terra procedem deles, pois elas germinam segundo sua
presença e segundo sua conjunção; ora, o Calor natural corresponde ao Calor
espiritual, que é o Amor, e a Luz natural corresponde à Luz espiritual que é a
Sabedoria.
61 - Q ue o Amar Conjugal procede do Casamento do bem e do vero, é o que
será demonstrado na Lição seguinte ou Parágrafo seguinte; se faz menção disso
aqui apenas para fazer ver que este Amor é celeste, espiritual e santo, porque é
de uma origem celeste espiritual e santa. A fim de que se veja que a origem do
Amor Conjugal vem do Casamento do bem e do vero, importa falar disso aqui
sucintamente; acaba de ser dito que em todas e em cada uma das cousas.
criadas há uma conjunção do bem e do vero; ora, não há conjunção a não ser
que seja recíproca, pois a conjunção de uma parte e não reciprocamente de
outra, se dissolve por si mesma; quando portanto há conjunção do bem e do
vero, e essa conjunção é recíproca, resulta daí que há o vero do bem ou o vero
segundo o bem, e há o bem do vero ou o bem segundo o vero; que o vero do
bem ou o vero segundo o bem esteja no M acho, e que seja o M asculino
mesmo, e que o bem do vero ou o bem segundo o vero esteja na Fêmea e que
seja o Feminino mesmo, além disso também, que haja uma união conjugal
entre estes dois, ver-se-á na Lição que segue; isto é referido aqui, a fim de que
56

se tenha alguma idéia preliminar.


62 - III. H á correspondência deste Amor com o Casamento do Senhor e da
Igreja; quer dizer que,do mesmo modo que o Senhor ama a Igreja e quer que a
Igreja O ame, assim também o M arido e a Esposa se amam mutuamente; que
entre este amor e este casamento haja uma correspondência, sabe-se no M undo
Cristão, mas qual é esta correspondência, não se sabe ainda, é por isso que ela
será explicada mais adiante em um Parágrafo especial; aqui, se faz menção
disso, a fim de que se veja que o Amor Conjugal é celeste, espiritual e santo,
porque corresponde ao Casamento ao Casamento celeste, espiritual e santo do
Senhor e da Igreja.Esta correspondência é também uma conseqüência de que o
amor conjugal tira sua origem do Casamento do bem e do vero, origem de que
se tratou no Artigo precedente, porque o Casamento do bem e do vero é a
Igreja no homem; pois o casamento do bem e do vero é a mesma cousa que o
Casamento da caridade e da fé, pois que o bem pertence à caridade e o vero à
fé; que este Casamento faça a Igreja,não se pode deixar de reconhecer porque é
um vero universal, e todo vero universal é reconhecido imediatamente quando
é ouvido, o que resulta do influxo do Senhor e ao mesmo tempo da
confirmação do Céu.O ra,pois que a Igreja pertence ao Senhor porque vem do
Senhor,e pois que o Amor conjugal corresponde ao Casamento do Senhor e da
Igreja,segue-se que este Amor vem do Senhor.
63 - M as como pelo Senhor é formada a Igreja nos dois esposos, e como por
meio da Igreja é formado o amor conjugal, isso será ilustrado no Parágrafo de
que se acaba de falar; aqui é somente observado que a Igreja é formada pelo
Senhor no M arido, e por meio do M arido na Esposa, e que depois que ela foi
formada em um e no outro a Igreja está completa, pois então se faz uma
completa conjunção do bem e do vero, e a conjunção do bem e do vero é a
Igreja. Q ue a inclinação conjuntiva, que é o Amor conjugal, esteja em um
mesmo grau que a conjunção do bem e do vero, que é a Igreja, isso vai ser
confirmado em série,por argumentos demonstrativos,no que segue.
64 - IV .Este Amor,pela sua origem e sua correspondência, é celeste, espiritual,
santo, puro e limpo mais do que todos os outros amores que pelo Senhor estão
nos Anjos do Céu e nos homens da Igreja. Q ue o Amor Conjugal, por sua
origem, que é o Casamento do bem e do vero, seja tal, é o que acaba de ser
confirmado acima em poucas palavras, mas aí somente por adiantamento, foi,
da mesma maneira, confirmado que este Amor é tal pela sua correspondência
com o Casamento do Senhor e da Igreja; estes dois Casamentos, de que
descende como um rebento o Amor conjugal, são as santidades mesmas; é por
isso que, se segundo seu Autor, que é o Senhor, este amor é recebido, decorre
do Senhor uma santidade, que continuamente o decanta e o purifica; se então
na vontade do homem há um desejo e um esforço para este amor, ele se torna
perpetuamente dia a dia mais limpo e mais puro. O Amor conjugal é chamado
celeste e espiritual,porque está nos Anjos dos Céus; é celeste,nos Anjos do Céu
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supremo, porque estes Anjos são chamados celestes; e espiritual, nos Anjos
abaixo deste Céu, porque estes Anjos são chamados espirituais; estes anjos são
assim chamados porque os Anjos celestes são Amores e em conseqüência
Sabedorias, e os Anjos espirituais são Sabedorias e em conseqüência Amores;
semelhante é o seu conjugal.O ra, pois que o Amor conjugal está nos Anjos dos
Céus, tanto superiores como inferiores, conforme foi mostrado no Primeiro
Parágrafo sobre os Casamentos no Céu, vê-se que este Amor é santo e puro. Se
este Amor, considerado em sua essência segundo sua derivação, é santo e puro
mais do que todos os outros amores dos anjos e dos homens, é porque ele é
como a cabeça dos outros amores. Q uanto à supremacia deste amor, se dirá
alguma cousa no Artigo que vai seguir.
65 - V . Ele é mesmo o Amor fundamental de todos os amores celestes e
espirituais, e por conseqüência de todos os amores naturais. Q ue o Amor
conjugal, considerado em sua essência, seja o Amor fundamental de todos os
amores do Céu e da Igreja, é porque sua origem vem do Casamento do bem e
do vero, e deste Casamento procedem todos os amores que fazem o Céu e a
Igreja no homem; o bem deste casamento constitui o amor, e seu vero constitui
a sabedoria; e quando o amor se aproxima da sabedoria ou se conjunta com ela,
o amor então se torna amor; e quando reciprocamente a sabedoria se aproxima
do amor e se conjunta com ela, a sabedoria então se torna sabedoria. O Amor
verdadeiramente conjugal não é outra cousa senão a conjunção do amor e da
sabedoria; dois Esposos entre os quais ou nos quais há este amor são a sua efígie
e a sua forma; nos Céus, onde as faces dos Anjos são os tipos reais das afeições
do seu amor, todos são também semelhanças do Amor conjugal pois ele está
neles no comum e em toda parte, como já foi mostrado; ora, pois que dois
Esposos são este Amor em efígie e em forma, segue-se que todo amor, que
procede da forma do amor mesmo, é sua semelhança; é por isso que se o Amor
conjugal é celeste e espiritual, os amores, que dele procedem, são também
celestes e espirituais; o Amor conjugal é portanto como um pai, e todos os
outros amores são como uma descendência; daí vem que dos Casamentos dos
Anjos nos Céus são engendradas descendências espirituais,que são as do amor e
da sabedoria,ou do bem e do vero; a respeito desta geração,ver acima o n.51.
66 - A mesma cousa é evidentemente manifestada pela criação dos homens por
este amor, e por sua formação em seguida por este amor: o M acho foi criado
para que se torne sabedoria pelo Amor de ser sábio, e a Fêmea foi criada para
que se torne o Amor do macho por sua sabedoria, assim segundo a sabedoria
que está nele; daí é evidente que dois Esposos são as formas mesmas e as efígies
mesmas do casamento do amor e da sabedoria, ou do bem e do vero. É
importante que se saiba que não há bem nem vero, que não esteja em uma
substância como em seu objeto; os bens e os veros abstratos não existem, pois,
não estão em parte alguma, uma vez que não tem sede; e mesmo não podem
aparecer, muito menos, como voando; são portanto unicamente entidades
58

(entia), a respeito dos quais a razão parece pensar abstratamente, mas não o
pode entretanto, a menos que os suponha em objetos; pois toda idéia do
homem, mesmo sublimada, é substância, isto é, ligada a substâncias: além
disso, é preciso que se saiba que não há substância, a não ser que tenha uma
forma; uma substância não formada não é cousa alguma, porque não se pode
dizer dela coisa alguma, e um sujeito sem predicados é também uma entidade
que não tem existência alguma na razão (ens nullius rationis). Estas
considerações filosóficas foram acrescentadas, a fim de que desta maneira se
possa ver também que dois Esposos, que estão no Amor verdadeiramente
conjugal,são na realidade formas do Casamento do bem e do vero, ou do amor
e da sabedoria.
67 - Como os amores naturais decorrem dos amores espirituais, e os amores
espirituais decorrem dos amores celestes, é por isso que se diz que o Amor
conjugal é o amor fundamental de todos os amores celestes e espirituais, e por
conseqüência de todos os amores naturais. O s amores naturais se referem aos
amores de si e do mundo; mas os amores espirituais se referem ao amor a
respeito do próximo, e os amores celestes ao amor para com o Senhor; e como
tais são as relações dos amores, vê-se claramente em que ordem eles se seguem,
e em que ordem estão no homem; quando estão nesta ordem, então os amores
naturais vivem pelos amores espirituais e os espirituais pelos celestes, e todos
nesta ordem vivem pelo Senhor,de que procedem.
68 - V I. N este amor foram reunidas todas as alegrias e todas as delícias, desde
as primeiras até às últimas. T odos os prazeres, quaisquer que sejam, que são
sentidos pelo homem, pertencem a seu amor; por eles o amor se manifesta e
mesmo existe e vive; que os prazeres se exaltem no mesmo grau que se exalta o
amor, e também conforme as afeições que sobrevêm tocam de perto o amor
reinante, isso é notório. Agora, uma vez que o amor conjugal é o amor
fundamental de todos os amores, e que foi inscrito nos singularíssimos do
homem, como foi mostrado acima, segue-se que os prazeres deste amor
ultrapassam os prazeres de todos os amores, e que ele dá também prazer aos
outros amores segundo sua presença e sua conjunção com eles; pois ele dá
expansão aos íntimos da mente e ao, mesmo tempo aos íntimos do corpo, à
medida em que a veia deliciosa de sua fonte neles corre e os abre. Q ue neste
amor tenham sido reunidos todos os prazeres desde os primeiros até aos
últimos, é devido à excelência de seu U so em comparação com o de todos os
outros; seu U so é a propagação do gênero humano, e por conseguinte a do Céu
Angélico; e como este uso tem sido o fim dos fins da criação, segue-se que
todas as beatitudes, todas as doçuras, todos os prazeres, todos os encantos e
todas as volúpias que podiam ser reunidas no homem pelo Senhor Criador,
foram reunidas neste amor.Q ue os prazeres seguem o uso, isso é evidente pelos
prazeres dos cinco Sentidos, a V ista, o O uvido, o O lfato, o Paladar e o T ato;
cada um destes sentidos tem seus prazeres com variações segundo seus usos
59

particulares; com muito mais forte razão o Sentido do amor conjugal, cujo U so
é o complexo de todos os outros usos.
69 - Sei que há poucos que reconhecerão que no Amor conjugal foram
reunidas todas as alegrias e todas as delícias desde as primeiras até às últimas; e
isso, porque o amor verdadeiramente conjugal, em que elas foram reunidas, é
hoje tão raro,que não se sabe o que ele é e apenas se sabe que existe, segundo o
que foi explicado e confirmado acima, nos nº 58, 59, pois estas alegrias e estas
delícias não existem em um amor conjugal que não seja o amor conjugal real; e
como este é tão raro nas terras, é impossível descrever suas felicidades
sobreeminentes de outro modo que não seja pela boca dos Anjos, por que eles
estão neste amor: Eles me disseram que suas delícias íntimas, que pertencem à
alma, na qual influi primeiro o conjugal do amor e da sabedoria ou do bem e
do vero, procedendo do Senhor, não são perceptíveis e por conseguinte são
inefáveis porque são ao mesmo tempo as delícias da paz e da inocência; mas em
sua descida estas mesmas delícias tornam-se cada vez mais perceptíveis, nos
superiores da mente como felicidades, no peito como prazeres que derivam daí,
e do peito se espalham em todas e cada uma das partes do corpo, e enfim se
unem nos últimos em delícia das delícias; além disso, os anjos contaram
maravilhas, acrescentando que as variedades destas delícias nas almas dos
Esposos, e pelas almas em suas mentes, e pelas mentes no peito, são infinitas, e
também eternas, e que elas são exaltadas nos maridos segundo a sabedoria; e
isso, porque vivem eternamente na flor da idade, e porque não tem maior
felicidade do que tornar-se cada vez mais sábios. M as quanto a vários outros
detalhes saídos da boca dos Anjos a respeito destas delícias, ver-se-á nos
M emoráveis, principalmente naqueles que vão seguir no fim de alguns
capítulos.
70 - V II. M as a este amor não vêm e não podem estar sendo os que se dirigem
ao Senhor, e que amam os veros da Igreja e praticam os seus bens. Se a este
amor não vêm senão os que se dirigem ao Senhor, é porque os Casamentos
M onogâmicas, que são os de um só marido com uma única esposa,
correspondem ao Casamento do Senhor e da Igreja, e sua origem vem do
Casamento do bem e do vero, ver acima os nº. 60 e 62. Q ue desta origem e
desta correspondência, segue-se que o Amor verdadeiramente conjugal vem do
Senhor, e está nos que se dirigem diretamente a Ele, isso não pode ser
plenamente confirmado,a não ser que se trate em particular destes dois arcanos
o que será feito nos dois Capítulos que seguem imediatamente a este; um sobre
a origem do Amor conjugal pelo Casamento do bem e do vero; e o outro sobre
o Casamento do Senhor e da Igreja, e sobre sua correspondência; que daí
resulta que o Amor conjugal é o homem segundo o Estado da Igreja nele, é
também o que se verá nesses Capítulos.
71 - Se no Amor verdadeiramente conjugal não podem estar senão os que o
recebem do Senhor, isto é, que se dirigem a Ele diretamente, e vivem por Ele a
60

vida da Igreja, é porque este Amor, considerado segundo sua origem e sua
correspondência, é mais celeste, espiritual, santo, puro e limpo, do que todo
outro amor que existem nos anjos do Céu e nos homens da Igreja,como acima,
n. à; e estes atributos do amor verdadeiramente conjugal não podem existir
senão nos que foram conjuntos ao Senhor, e consociados por Ele aos anjos do
Céu; pois estes fogem dos amores extraconjugais, isto é, das conjunções com
outros que não sejam a própria esposa ou o próprio marido, como fugiriam da
perda da alma e dos pântanos do inferno; e quanto mais os esposos fogem
dessas conjunções, mesmo quanto aos desejos libidinosos da vontade e por
conseguinte às intenções, tanto mais este amor é purificado neles, e se torna
progressivamente espiritual, primeiro quando ainda vivem nas terras, e em
seguida no Céu; nenhum amor pode jamais tornar-se puro nos homens, nem
nos anjos, assim este amor também não o pode; mas como a intenção, que
pertence à vontade, é principalmente considerada pelo Senhor, é por isso que
quanto mais o homem está nesta intenção e nela persevera, tanto mais é
iniciado na pureza e na santidade deste amor, e nisso faz progressos
sucessivamente. Se no Amor conjugal espiritual não podem estar senão os que
são tais pelo Senhor, é porque o Céu está neste amor, e o homem natural, em
quem este amor não tira seu encanto senão da carne, não pode se aproximar do
Céu, nem de anjo algum, nem mesmo de homem algum em que haja este
amor, pois é o Amor fundamental de todos os amores celestes e espirituais, ver
acima ns. 65, 66 e 67. Q ue seja assim, é o que me foi confirmado pela
experiência. N o M undo espiritual, vi gênios, que estavam preparados para o
Inferno se aproximarem de um Anjo que estava em delícias com sua esposa a
medida que se aproximavam, estando a uma certa distância, se tornaram como
fúrias, e procuraram para asilo cavernas e fossos, nos quais se lançaram. Q ue os
maus espíritos amem o homogêneo de sua afeição, por mais imundo que seja e
tenham aversão pelos espíritos do Céu, como por seu heterogêneo porque este
heterogêneo é puro, pode-se concluir do que foi referido nos Preliminares n.
10.
72 - Se a este amor não vêm e não podem estar senão os que amam os veros da
Igreja, e praticam os seus bens, é porque os outros não são recebidos pelo
Senhor; pois aqueles estão em conjunção com o Senhor, e por conseqüência
podem ser mantidos por Ele neste Amor. H á duas cousas que fazem a Igreja e
por conseguinte o Céu no homem, o V ero da fé e o B em da vida; o V ero da fé
faz a presença do Senhor, e o Bem da V ida segundo os veros da fé faz a
conjunção com Ele, e assim a Igreja e o Céu. Se o V ero da fé faz a presença, é
porque ele pertence a luz, a Luz espiritual não é outra coisa; se o Bem da vida
faz a conjunção, é porque pertence ao calor, o Calor espiritual não é outra
cousa também, pois é o amor, e o bem da vida pertence ao amor; ora, sabe-se
que toda luz, mesmo a do inverno, faz a presença, e que o calor unido à luz faz
a conjunção,` pois os jardins e os canteiros aparecem qualquer que seja a luz,
mas não florescem e não frutificam senão quando o calor se conjunta a luz. Daí
61

resulta claramente esta conclusão, que pelo Senhor são gratificados com o
Amor verdadeiramente conjugal, não os que sabem unicamente os veros da
Igreja,mas os que os sabem e praticam seus bens.
73 - V III. Este Amor foi o Amor dos amores entre os Antigos que viveram nos
séculos de ouro, de prata e de bronze. Q ue o Amor conjugal entre os
Antiqüíssimos e entre os Antigos, que viveram nos primeiros Séculos assim
chamados tenha sido o Amor dos amores, não se pode saber pela H istória,
porque não existem escritos deles, e os que existem são de Autores que viveram
depois desses Séculos; pois estes fazem menção deles, e descrevem também a
pureza e a integridade de sua vida, e igualmente o declínio progressivo desta
pureza e desta integridade, tal como é o do O uro até ao Ferro; mas o último
Século ou Idade de Ferro, que começou no tempo desses Escritores, pode ser
conhecido em parte pelas H istórias da vida de alguns R eis, de alguns Juizes, e
de alguns Sábios que, na G récia e em outros lugares, foram chamados Sophi:
que este Século entretanto não duraria, como dura em si mesmo o ferro, mas
que se tornaria como o ferro misturado com a argila, os quais não têm
coerência,é o que foi predito por Daniel,cap.11,43.O ra,como esses Séculos,
que tiram seus nomes do ouro, da prata, e do bronze, tinham passado, antes do
tempo cujos escritos nos restam, e assim é impossível adquirir nas terras um
conhecimento dos Casamentos dos homens daqueles séculos, aprouve ao
Senhor dar-me esse conhecimento por um caminho espiritual, conduzindo-me
aos Céus onde estão seus domicílios, a fim de que aprendesse de sua boca, o
que tinham sido entre eles os Casamentos, quando viviam em seu Século; pois
todos, quaisquer que sejam, que depois da Criação saíram do M undo natural,
estão no M undo espiritual e todos aí são tais quais foram quanto a seus amores,
e aí permanecem eternamente. Como estas particularidades são dignas de ser
conhecidas e relatadas, e como confirmam a santidade dos casamentos, vou
dá-las ao público tal como me foram mostradas em espírito, no estado de
vigília, e relembrados em seguida à minha memória por um Anjo, e assim
descritas: e como são relatos do M undo espiritual, tais como os que são
colocados no fim dos Capítulos, desejei dividi-los em Seis M emoráveis segundo
as Progressões das Idades.
74 - "Estes Seis M emoráveis do M undo espiritual sobre o Amor Conjugal,
revelam o que foi este Amor nas Primeiras Idades, e o que foi depois dessas
idades e o que é hoje. Por aí se vê que este Amor retirou-se progressivamente
de sua santidade e de sua pureza, até ao ponto de tornar-se escortatório; mas
que entretanto há esperança de que seja reconduzido a sua primitiva e antiga
Santidade".
75 - Primeiro M emorável: U m dia em que eu meditava sobre o Amor
Conjugal, minha mente foi tomada pelo desejo de saber o que tinha sido este
Amor nos que viveram no Século do O uro, e o que tinha sido nos que viveram
nos Séculos seguintes,chamados Século da Prata,do Bronze e do Ferro:e como
62

eu sabia que todos os que viveram bem naqueles Séculos estão no Céu, pedi ao
Senhor para que me fosse permitido conversar e me instruir com eles: e eis que
um anjo se apresentou a mim, e me disse: "Fui enviado pelo Senhor para te
servir de guia e de companheiro de viagem; e primeiramente, te conduzirei e te
acompanharei aos que viveram na Primeira Idade ou Primeiro Século, que é
chamado Século de O uro"; e disse: “O caminho que conduz a eles é escarpado;
passa por uma floresta espessa que ninguém pode atravessar sem o socorro de
um guia dado pelo Senhor". Eu estava em espírito e me preparei para a viagem
e voltamos a face para o O riente, e avançando vi uma M ontanha cuja altura ia
além da região das nuvens.Atravessamos um grande deserto, e chegamos a uma
Floresta formada de diferentes espécies de árvores, cuja espessura produzia uma
grande obscuridade; era a Floresta de que o Anjo tinha falado, mas era cortada
por várias picadas estreitas e o Anjo me disse que eram outros tantos labirintos
de erros, e que se o viajante não tivesse os olhos abertos pelo Senhor, e não
visse O liveiras cercadas de ramos de vinha, e não fosse de O liveira em O liveira,
iria se lançar nos T ártaros que estão nos arredores sobre os lados; esta Floresta é
assim disposta com o fim de defender a passagem; pois nenhuma outra N ação
que não seja a da Primeira Idade habita esta M ontanha. Q uando entramos na
Floresta, os nossos olhos foram abertos, e vimos aqui e ali O liveiras cercadas de
cepas, donde pendiam cachos de uvas de uma cor azul celeste, e as O liveiras
por sua disposição formavam curvas contínuas, nós também fizemos voltas e
voltas seguindo sua direção; e enfim vimos um Bosque formado de Cedros
elevados, e em seus galhos algumas Á guias. A esta vista, o Anjo disse: "Agora
estamos na M ontanha, não muito longe de seu Cume". E continuamos a
caminhar; e eis que depois do Bosque uma Planície de uma extensão circular,
onde pastavam Cordeiros e O velhas novas, que eram formas representativas do
estado de inocência e de paz dos H abitantes da M ontanha. Atravessamos esta
Planície; e eis, T abernáculos e mais T abernáculos em número de vários
milhares, se apresentavam a nossos olhos, adiante e dos lados, tanto quanto a
vista podia abranger; e o Anjo disse: "Agora, estamos no Acampamento; lá está
o Exército do Senhor Jehovah; é assim que eles se chamavam, a eles e a suas
habitações; quando estavam no M undo, estes Antiqüíssimos habitavam em
T abernáculos; é por isso também que habitam assim agora; mas prossigamos o
nosso caminho para o Sul, onde estão os mais sábios dentre eles, a fim de
encontrar algum com quem conversemos". Caminhando vi ao longe três
rapazinhos e três meninas, que estavam sentados à porta de U ma T enda; mas
uns e outros, quando nos aproximamos, foram vistos como homens e mulheres
de uma estatura média; e o Anjo disse: "T odos os habitantes desta M ontanha
aparecem de longe como Crianças, porque estão em um estado de inocência, e
a Infância é a aparência da inocência". Logo que estes homens nos viram,
acorreram e disseram:"Donde sois? e como viestes aqui? As vossas faces não são
faces da nossa M ontanha". M as o Anjo respondeu e contou como a entrada
pela Floresta nos tinha sido permitida, e porque tínhamos vindo. Depois de ter
63

ouvido esta explicação, um dos três H omens nos convidou a entrar em seu
T abernáculo e nos introduziu nele: O H omem estava vestido com um manto
de cor de jacinto e com uma túnica de lã branca, e sua Esposa estava vestida
com um vestido de púrpura, e por baixo uma túnica de fino linho, bordada a
agulha lhe cobria o peito; e como havia no meu pensamento o desejo de
conhecer os Casamentos dos Antiqüíssimos, eu olhava alternativamente para o
M arido e para a Esposa; e percebi, por assim dizer, a unidade de suas almas
sobre suas faces, e disse: "V ós dois, sois um". E o H omem respondeu: "N ós
somos um; a sua vida está em mim, e a minha vida está nela; nós somos dois
Corpos, mas uma única Alma; a união entre nós é como a que existe no Peito
entre as duas tendas que se chamam o Coração e o Pulmão, ela é meu Coração,
e eu sou o seu Pulmão; mas como pelo Coração nós entendemos aqui o Amor e
pelo Pulmão a Sabedoria, ela é o Amor da minha sabedoria, e eu sou a
Sabedoria do seu amor; é por isso que por fora o seu amor vela a minha
sabedoria, e por dentro a minha sabedoria está em seu amor; é daí que a
unidade de nossas Almas se mostra sobre nossas faces, como o disseste". E
então, lhe fiz esta pergunta: "Se tal é a união, será que podes contemplar uma
outra mulher além da tua?" E ele respondeu: "Eu o posso; mas como minha
Esposa está unida à minha Alma, nós a contemplamos os dois juntos, e então
nada de libidinoso pode penetrar; pois quando vejo as esposas dos outros, eu as
vejo por minha Esposa a quem eu amo unicamente; e, como tem ela a
percepção de todas as minhas inclinações, ela dirige, como intermediária, os
meus pensamentos; afasta tudo que é discordante, e introduz ao mesmo tempo
frieza e horror por tudo que é incasto; é por isso que aqui nos é tão impossível
olhar para a Esposa de um outro com desejo libidinoso, como é impossível das
trevas do T ártaro,encarar a luz de nosso Céu; por isso também não existe entre
nós nenhuma idéia do pensamento, nem com mais forte razão nenhuma
expressão da linguagem, para os atrativos de um amor libidinoso". Ele não
pôde pronunciar a palavra escortatório, porque a castidade de seu Céu a isso se
opunha. Então o Anjo que me servia de guia me disse: "Compreendes agora
que a linguagem dos Anjos deste Céu é a linguagem da sabedoria, pois eles
falam segundo as causas".Depois disso dirigi o olhar em torno de mim,e vi seu
T abernáculo como coberto de ouro, e perguntei donde provinha isso. Ele
respondeu: "Isto provém de uma luz inflamada que brilha como ouro, e que
ilumina com seus raios e incide levemente sobre os pavilhões de nosso
T abernáculo, quando falamos sobre o Amor Conjugal; pois o Calor de nosso
Sol que em sua essência é o Amor, se põe então a nu, e tinge com sua cor de
ouro a luz, que em sua essência é a Sabedoria; e isso acontece, porque o Amor
Conjugal, em sua origem, é o jogo da Sabedoria e do Amor; pois o H omem
nasceu para ser sabedoria, e a M ulher para ser amor da sabedoria do homem;
daí provêm as delícias deste jogo no Amor conjugal e por este Amor, entre nós
e nossas esposas. N ós aqui vimos claramente, desde milhares de anos, que estas
delícias, quanto à sua abundância, a seu grau e a sua vontade, aumentam e se
64

elevam em razão do culto que prestamos ao Senhor Jehovah, de quem influi


esta união celeste ou este Casamento celeste, que é o do Amor e da Sabedoria".
Depois que assim falaram, vi uma grande luz sobre a colina na parte do meio,
entre os T abernáculos; e me informei de onde vinha essa luz. Ele disse: "É do
Santuário do T abernáculo de nosso Culto". E perguntei se era permitido
aproximar-me; e ele, disse: "Isso é permitido". E aproximei-me, e vi um
T abernáculo inteiramente semelhante, por fora e por dentro, à descrição do
T abernáculo que foi construído no deserto pelos filhos de Israel, e cuja forma
tinha sido mostrada a M oisés no M onte Sinai. (Êxodo X X V , 40; X X V I, 30). E
perguntei o que havia no interior daquele santuário, que produzia uma tão
grande luz. E ele respondeu: "É uma M esa sobre a qual há esta inscrição:
Aliança entre Jehovah e os Céus". E não disse mais a respeito. E como então
nós nos dispúnhamos a nos retirar, lhe fiz esta pergunta: "Alguns de vós,
quando estáveis no M undo natural, viveram com mais de uma esposa?'' Ele
respondeu: "N enhum, que eu saiba; pois nós não podíamos pensar em várias;
os que tinham pensado nisso nos tinham dito que imediatamente as beatitudes
celestes de suas almas se tinham retirado dos íntimos para os extremos de seus
corpos até às unhas, e com elas ao mesmo tempo tudo o que há de louvável na
virilidade; esses, desde que se tinha a percepção disso, eram expulsos de nossas
terras". Depois de ter pronunciado estas palavras, o marido correu a seu
T abernáculo, e voltou com uma R omã que continha em abundância grãos de
ouro; e ele ma deu, e eu a levei; era para mim um sinal de que tínhamos estado
com os que viveram no Século de ouro. E então, depois da saudação de paz,
nós nos retiramos,e voltamos para casa.
76 - Segundo M emorável: N o dia seguinte, o mesmo Anjo veio a mim, e disse:
"Q ueres que te conduza e acompanhe aos Povos que viveram na Idade ou no
Século de Prata, a fim de que ouçamos falar sobre o que concerne aos
Casamentos de seu tempo"; e acrescentou que não se pode igualmente penetrar
entre eles senão sob os auspícios do Senhor. Eu estava em espírito, como na
véspera, e segui meu guia. E primeiramente chegamos a uma Colina sobre os
limites do O riente e do Sul; e, enquanto estávamos sobre sua encosta, ele me
mostrou uma grande extensão de terra; e vimos ao longe uma eminência como
cheia de montanhas,entre a qual e a colina onde nos achávamos havia um vale,
e depois uma campina, e a partir desta campina uma subida que se elevava
lentamente. Descemos da Colina para atravessar o vale, vimos dos lados, aqui e
ali, esculturas em madeira e em pedra que representavam figuras de homens e
de diversas espécies de animais, de pássaros, de peixes; e perguntei ao Anjo:
"Q ue vemos lá? são ídolos?" E ele respondeu: "De modo algum; são
configurações representativas de diversas virtudes morais e de diversas verdades
espirituais; a Ciência das Correspondências existiu entre os povos desta idade; e
como todo homem, toda besta, toda ave, todo peixe, correspondem a alguma
qualidade, resulta daí que cada uma destas esculturas representa alguma
especialidade de virtude ou de verdade, e que várias juntas representam a
65

V irtude mesma ou a V erdade mesma em alguma forma comum extensa; são


estas representações que, no Egito, foram chamados H ieróglifos". Atravessamos
o vale e quando entramos na Campina, eis que vimos Cavalos e Carros;
Cavalos diversamente ajaezados e enfreados, e Carros de diferentes formas,
figurando uns Á guias, outros Baleias e outros Cervos com seus chifres, e
U nicórnios, e em seguida alguns Carros, e Estrebarias por toda parte sobre os
lados. M as quando nos aproximamos, os Cavalos e os Carros desapareceram, e
em seu lugar vimos H omens, aos casais, que passeavam, conversando e
raciocinando; e o Anjo me disse: "Estas formas de Cavalos, de Carros e de
Estrebarias que se vê de longe são as aparências da inteligência racional dos
homens desta Idade; pois pela correspondência o Cavalo significa o
entendimento do vero, o Carro a doutrina do vero, e as Estrebarias as
instruções; tu sabes que neste mundo tudo aparece segundo as
correspondências". M as passamos além, e subimos por uma longa rampa, e
enfim vimos uma Cidade em que entramos; e percorrendo as ruas e as praças,
examinamos as casas, eram outros tantos palácios construídos em mármore; na
frente tinham degraus de alabastro; e de cada lado dos degraus, colunas de
jaspe: vimos também T emplos construídos de pedras preciosas de cor de Safira
e de Lazuli; e o Anjo me disse: "As suas casas são de Pedras, porque as Pedras
significam as verdades naturais, e as Pedras preciosas as verdades espirituais; e
todos os que viveram na Idade da Prata tinham a inteligência pelas verdades
espirituais e daí pelas verdades naturais; a Prata tem também uma semelhante
significação". V isitando a cidade, vimos aqui e ali pessoas reunidas por casais; e
como eram maridos e esposas, esperávamos ser convidados Para algum lugar; e
enquanto passeávamos, tendo esse pensamento, dois dentre eles nos chamaram
para uma casa; e subimos e entramos; e o Anjo, falando por mim, lhes expôs o
motivo de nossa chegada neste Céu: "É, disse ele, o desejo de ser instruído
sobre os casamentos dos Antigos, de que fazeis parte". E eles responderam:
"N ós pertencemos aos Povos da Á sia; e o estudo de nossa Idade era o estudo
das verdades, pelas quais adquirimos a inteligência; este estudo era o de nossa
alma e de nossa mente; mas o estudo dos sentidos de nosso corpo consistia nas
R epresentações das verdades sob formas, e a Ciência das Correspondências
conjuntava os sensuais de nosso corpo com as percepções de nossa mente, e nos
proporcionava a inteligência". Depois de ter ouvido estas cousas, o Anjo lhes
pediu para nos dar alguns detalhes sobre seus Casamentos; e o M arido disse:
"H á correspondência entre o Casamento Espiritual, que é o do vero com o
bem, e o Casamento N atural, que é o de um homem com uma única esposa; e
como nos aplicamos ao estudo das Correspondências, vimos que a Igreja, com
seus veros e seus bens, não pode jamais existir senão naqueles que vivem no
amor verdadeiramente conjugal com uma única esposa; pois o Casamento do
bem e do vero é a Igreja no homem; também todos nós, que estamos aqui,
dizemos que o M arido é o V ero e que a esposa; é o Bem desse vero, e que o
bem não pode amar outro vero que não seja o seu, nem o vero dar amor por
66

amor a outro bem que não seja o seu; se fosse de outro modo, o Casamento
interno, que faz a Igreja, seria destruído, e se tornaria um Casamento
unicamente externo, ao qual corresponde a idolatria e não à Igreja; é por isso
que o Casamento com uma única esposa, nós o chamamos Sacrimônia, mas se
se fizesse entre nós com várias, nós o chamaríamos Sacrilégio". Depois que ele
falou, fomos introduzidos na peça que precede ao quarto de dormir; havia
sobre as paredes vários desenhos feitos com arte, e pequenas imagens que
pareciam fundidas em prata; e eu perguntei o que significavam essas cousas.
Eles disseram: "São pinturas e formas representativas de várias qualidades,
atributos e prazeres que pertencem ao amor conjugal; estas representam a
unidade das almas, aquelas a conjunção das mentes; aquelas outras lá a
concórdia dos corações, aquelas outras as delícias que daí procedem".
Continuando o nosso exame, vimos sobre a parede uma espécie de Íris
composta de três cores, Púrpura, Jacinto e Branco, e notamos que a cor
púrpura atravessava o jacinto e tingia o branco com uma cor azul-celeste, e que
esta cor refluía pelo jacinto na púrpura, e a elevava, por assim dizer, ao brilho
da chama. E o M arido me disse: "Compreendes isso?" E eu respondi: "Instrui-
me". E ele disse: "A cor púrpura, por sua correspondência, significa o Amor
Conjugal da esposa; a cor branca, a inteligência do marido; a cor jacinto, o
começo do amor conjugal na percepção do marido pela esposa; e a cor azul
celeste (azur) de que a cor branca se tingiu, o amor conjugal então no marido;
esta cor que refluía pelo jacinto na púrpura, e a elevava por assim dizer ao
brilho da chama, significa o amor conjugal do marido refluindo sobre a esposa;
T ais cousas são representadas nas paredes quando, pela meditação sobre o
Amor conjugal, sobre sua união mútua, sucessiva e simultânea, nós
consideramos com olhos atentos os íris que aí são pintados". Disse a esse
respeito: "Estas cousas são hoje mais que místicas; pois são aparências
representativas de arcanos do amor conjugal de um único homem com uma
única esposa". E ele respondeu: "Elas são assim, mas para nós, aqui, elas não
são arcanos, nem por conseqüência cousas místicas". Q uando ele assim falou
apareceu de longe um Carro puxado por dois cavalos brancos novos. A vista
disso, o Anjo disse: "Este carro é para nós um sinal de que devemos nos
retirar". Então, quando descíamos os degraus, o nosso hóspede nos deu um
Cacho de uvas brancas aderente a folhas da cepa; e eis que as Folhas se
tornaram de prata; e nós as levamos como um sinal de que tínhamos
conversado com os Povos do Século da Prata.
77 - T erceiro M emorável. N o dia seguinte o Anjo que me tinha conduzido e
acompanhado veio ainda, e me disse,: "Prepara-te, e vamos aos H abitantes
Celestes, no O cidente; eles fazem parte dos homens que viveram na terceira
Idade ou Século do Bronze; suas habitações estão desde o Sul sobre o O cidente
até ao Setentrião,mas não no Setentrião". E, tendo me preparado, eu o segui, e
entramos em seu Céu pelo lado meridional e lá, havia um magnífico Bosque de
palmeiras e de loureiros; nós o atravessamos, e então nos confins mesmo do
67

O cidente vimos G igantes de uma altura dupla do talhe ordinário do homem;


estes nos fizeram esta pergunta: "Q uem vos introduziu por este Bosque?" O
Anjo disse “O Deus do Céu". E eles responderam: "N ós somos os G uardiães
para o Céu antigo O cidental; quanto a vós, passai". E nós passamos, e de seu
posto de observação vimos uma M ontanha elevada até às nuvens; e entre nós
neste lugar, e esta montanha, numerosas aldeias cercadas de jardins, de bosques
e de campos, e fomos, através destas aldeias até à montanha, e subimos; e eis
que seu Cume era, não um cume ordinário, mas uma Planura, e sobre ela uma
Cidade extensa e espaçosa; e todas as casas da Cidade eram construídas de
madeira de árvores resinosas, e os telhados eram de tábuas; e perguntei porque
as casas aí eram de madeira; o Anjo respondeu: "Porque a madeira significa o
Bem natural, é por isso que o Século em que eles viveram foi chamado Bem;
como o Cobre, ou o Bronze, significa também o Bem natural, e por isso que o
Século em que eles viveram foi chamado pelos antigos o Século de Bronze; há
também aqui Edifícios sagrados construídos na M adeira de O liveira, e no meio
há o Santuário, onde está depositada em uma Arca a Palavra dada aos
habitantes da Á sia antes da Palavra Israelita; os Livros H istóricos desta Palavra
são chamados as G uerras de Jehovah, e os Livros Proféticos, os Enunciados;
uns e outros são citados por M oisés, N úmeros X X I, 14, 15 e 27 a 30; esta
Palavra hoje está perdida nos R einos da Á sia, e conservada unicamente na
G rande T artária". E então o Anjo me conduziu a um destes Edifícios sagrados,
e nós examinamos o seu interior, e no meio vimos esse Santuário, todo ele em
uma luz muito brilhante; e o Anjo disse: "Esta luz é produzida por esta Antiga
Palavra Asiática, pois nos Céus todo Divino vero brilha". Saindo do Edifício
sagrado, soubemos que tinha sido anunciado na Cidade que dois estrangeiros
tinham chegado, e que era necessário examinar donde eles vinham, e que
negócio os trazia; e da Corte de Justiça acorreu um guarda, e ele nos levou
perante os Juizes; e à pergunta donde éramos e que negócio nos tinha trazido,
nós respondemos: "N ós atravessamos o Bosque de palmeiras, e também os
Domicílios dos G igantes que são os G uardiães de vosso Céu, e em seguida a
R egião das aldeias; podeis concluir daí que não é por nós mesmos, mas que é
pelo Deus do Céu, que chegamos aqui; e o negócio, pelo qual viemos, é ser
instruídos a respeito de vossos Casamentos, se são M onogâmicos ou
Poligâmicos". E eles responderam: “O que! Poligâmicos! Esses casamentos não
são escortatórios?" E então esta Assembléia Judiciária nomeou um homem
inteligente para nos instruir em sua casa sobre este assunto; e em sua casa este
se reuniu a sua Esposa, e nos falou nestes termos: "Conservamos entre nós
sobre os Casamentos os Preceitos dos homens das primeiras Idades, ou das
Antiqüíssimas, que no M undo estiveram no Amor verdadeiramente conjugal, e
por conseqüência mais do que todos os outros na V irtude e na potência deste
amor, e que agora, em seu Céu que é no O riente, estão no estado mais feliz;
nós somos, a sua Posteridade; e eles, como Pais, nos deram, a nós, como filhos,
as R egras da vida, entre as quais há, sobre os Casamentos, estas: "Filhos, se
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quereis amar a Deus e ao próximo, e se quereis vos tornar sábios, e ser felizes
pela eternidade, nós vos aconselhamos a viver M onogâmicos; se abandonardes
este Preceito, todo Amor celeste se afastará de vós, e com ele a Sabedoria
interna,e sereis exterminados".N ós obedecemos como filhos,a este preceito de
nossos Pais, e percebemos a sua verdade, que é que, quanto mais alguém ama
uma Esposa, tanto mais se torna celeste e interno; e que, quanto mais alguém
não ama uma Esposa, só, tanto mais se torna material e externo; e este não ama
senão a ele mesmo e às imagens de sua mente, e é um insensato e um louco.
Daí resulta que todos, neste Céu, somos M onogâmicos; e porque somos assim,
todos os limites de nosso Céu são guardados contra os Polígamos, os Adúlteros
e os Escortatórios; se os Polígamos penetram aqui, são lançados nas T revas do
setentrião; si os Adúlteros, são lançados nos Fogos do ocidente; e se os
Escortatórios, são lançados nas Luzes quiméricas do sul". A estas palavras, eu
perguntei o que ele entendia pelas trevas do setentrião, os fogos do ocidente e
as luzes quiméricas do sul; ele respondeu que as T revas do setentrião são as
estupidezes da mente e as ignorâncias das verdades; que os Fogos do ocidente
são os amores do mal; e que as Luzes quiméricas do sul são as falsificações do
vero, as quais são escortações espirituais". Depois disso ele me disse: "Segui-me
ao nosso G abinete de cousas antigas". E nós o seguimos; e ele nos mostrou que
as Escrituras dos Antiqüíssimos eram sobre T abletes de madeiras polidas; e que
a segunda Idade tinha consignado suas escrituras sobre Folhas de Pergaminho,
e nos apresentou uma Folha sobre a qual estavam as R egras dos homens da
primeira Idade, transcritos de suas tábuas de pedra, e entre as quais havia
também o preceito sobre os Casamentos. Depois que vimos estas cousas
M emoráveis da Antigüidade mesma e várias outras, o Anjo disse: "Agora é
tempo de irmos embora". E então, o nosso hóspede foi ao Jardim, e tomou de
uma Arvore alguns ramos, e os ligou em um feixe e nos deu, dizendo: "Estes
ramos são de uma Arvore nativa de nosso Céu, ou própria a nosso Céu, e seu
suco tem um aroma balsâmico". Levamos este feixe, e descemos por um
caminho perto do O riente que não era guardado; e eis que os ramos se
mudaram em Bronze brilhante, e suas extremidades superiores em ouro; era
um sinal de que tínhamos estado em uma nação da T erceira Idade, que é
chamada o Século do Cobre ou do Bronze.
78 - Q uarto M emorável: Dois dias depois, o Anjo me falou de novo, dizendo:
"Acabemos o Período das Idades; nos resta a última Idade, que tem o nome do
Ferro. O povo desta Idade, mora no Setentrião sobre o lado do O cidente
dentro dele ou em largura; todos eles são antigos habitantes da Á sia, que
possuíam a Antiga Palavra, e tinham tirado dela seu culto; por conseqüência
antes da vinda do Senhor ao M undo; isso é evidente pelos Escritos dos Antigos,
nos quais estes tempos são, assim mencionados. Estas mesmas Idades são
entendidas pela estátua,que N abuchadnezar viu em sonho,”cuja Cabeça era de
O uro, o Peito e os Braços, de Prata; o V entre e as Coxas, de Bronze; as Pernas
de Ferro; e os Pés,de Ferro e também de Argila".(Daniel 11,32 e 33). O Anjo
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me referiu estas particularidades no caminho, que era encurtado e antecipado


pelas mudanças de estado introduzidos em nossos mentais segundo os gênios
dos habitantes para o meio dos quais nós passávamos; pois os espaços e por
conseguinte as distâncias, no M undo espiritual, são aparências segundo os
estados dos mentais. Q uando levantamos os olhos, eis que estávamos em uma
Floresta de faias,de castanheiros e de carvalhos; e quando olhamos em torno de
nós, vimos U rsos à esquerda e Leopardos à direita; como me admirasse, o Anjo
disse: "N ão são ursos nem leopardos, mas são homens que guardam estes
H abitantes do Setentrião; eles apreendem pelo cheiro as esferas de vida
daqueles que passam, e se lançam contra todos que são Espirituais, porque os
H abitantes são naturais; aqueles que lêem apenas a Palavra, e dela nada tiram
da doutrina, aparecem de longe como U rsos, e os que depois confirmam os
falsos aparecem como Leopardos". M as estes, nos tendo visto, se afastaram, e
nós passamos. Depois da Floresta se apresentaram Charnecas, e em seguida
Campos de grama divididos por tábuas e bordados de luxo; depois destes
campos, a terra se abaixava obliquamente em um vale, onde havia cidades e
aldeias; passamos algumas e entramos em uma grande; as ruas eram irregulares;
as casas igualmente; estas eram construídas, de tijolos entremeados de barrotes,
e cobertos com uma argamassa; nas Praças públicas havia T emplos de pedra
calcária talhada, cuja construção inferior estava sob a terra, e a construção
superior acima da terra; descemos em um destes templos por três degraus, e
vimos em torno nas paredes ídolos de diversas formas, e a multidão que os
adorava de joelhos; no meio estava o Coro, donde se oferecia à vista a cabeça
do Deus tutelar desta cidade. Ao sair o Anjo me disse, que entre os Antigos,
que tinham vivido no século da Prata, de que se falou acima, estes ídolos
tinham sido as imagens representativas de V erdades espirituais e de V irtudes
morais; e que,quando a Ciência das Correspondências apagou-se da memória e
se extinguiu, estas imagens se tornaram a princípio objetos de culto, e foram
em seguida adoradas como Deidades; daí as Idolatrias. Q uando estávamos fora
do T emplo, examinamos os homens e suas roupas; tinham a face como de aço,
de cor acinzentada; e estavam vestidos como comediantes, tendo em torno dos
rins manteletes que pendiam de uma túnica fechada no peito, e na cabeça
traziam bonés anelados de marinheiros. M as o Anjo disse: "É bastante;
instruamo-nos sobre os Casamentos dos povos desta Idade".E entramos na casa
de um M agnata, que tinha na cabeça um boné em forma de torre; recebeu-nos
polidamente, e disse: "Entrai e conversaremos". Entramos no V estíbulo, e aí
nos sentamos; e lhe fiz perguntas sobre os Casamentos desta cidade e da região;
e ele disse: "N ós vivemos não com uma única esposa, mas uns com duas ou
três, e os outros com maior número; e isso, porque a variedade, a obediência e
a honra, como marca de M ajestade, nos agradam; e nós as obtemos de nossas
esposas, quando temos várias; com uma só não teríamos o prazer da variedade,
mas o tédio da identidade; nem a satisfação de ser obedecidos, mas o desgosto
da igualdade; nem o encanto da dominação e da honra que dela resulta, mas o
70

tormento de querelas pela superioridade; e o que é a mulher? N ão, nasceu ela


para ser submissa à vontade do homem; e também para servir e não para
dominar? Aqui portanto, cada M arido em sua casa goza. como que de uma
majestade real; isso, estando conforme com o nosso amor, faz também a
felicidade de nossa vida". M as eu lhe fiz essa pergunta: "O nde está então o
amor conjugal, que de duas almas faz uma, e que conjunta as mentes e torna o
homem feliz? Este Amor não pode ser dividido; se é dividido torna-se em ardor
que faz efervescência e passa". A isto ele replicou: "N ão compreendo o que
dizes; há outra coisa que torna o homem feliz que não seja a emulação das
esposas pela honra da proeminência junto de seu marido". Depois de ter
pronunciado estas palavras, o homem entrou no Apartamento das mulheres e
abriu os dois batentes da porta; mas saiu de lá uma exalação libidinosa que
tinha um cheiro de lodo; isso provinha do amor poligâmico, que é conubial e
ao mesmo tempo escortatório; por isso me levantei e fechei os batentes da
porta. Em seguida disse: "Como podeis subsistir sobre esta terra, pois que não
tendes nenhum amor verdadeiramente conjugal, e também uma vez que
adorais ídolos?" Ele respondeu: "Q uanto ao Amor conubial, nós temos por
nossas esposas um ciúme tão violento, que não permitimos a quem quer que
seja entrar em nossas casas além do vestíbulo, e uma vez que há ciúme há
também amor; quanto aos ídolos, nós não os adoramos; mas não podemos
pensar no Deus do U niverso senão por imagens oferecidas aos nossos olhos,
pois não podemos elevar os nossos pensamentos acima dos sensuais do corpo,
nem a respeito de Deus acima das cousas visíveis". Então fiz ainda uma
pergunta: "O s vossos ídolos não são de diversas formas? como podem .elas
apresentar à vista um único Deus?" Ele respondeu: "Isso é um mistério para
nós; há escondido em cada forma alguma cousa do culto de Deus". E, eu disse:
"V ós sois puramente sensuais - corporais; não tendes nem o amor de Deus,
nem um amor da mulher, que tenha alguma cousa de espiritual; e estes amores
formam em conjunto o homem, e de sensual o fazem celeste". Q uando acabei
de dizer isso apareceu através da porta como um relâmpago; e eu perguntei: “O
que é isso?" Ele disse:"U m tal relâmpago é para nós um sinal que vai chegar do
O riente um Ancião,que nos ensina,a respeito de Deus,que Ele é U m, o único
O nipotente, que é o Primeiro e o último; ele nos adverte também para não
adorarmos os ídolos, mas encará-los somente como imagens representativas de
virtudes procedentes de um único Deus, os quais formam juntos seu culto; este
Ancião é nosso Anjo, que reverenciamos, e ao qual obedecemos; ele vem a nós,
e nos reergue, quando caímos em um tenebroso culto de Deus segundo a
fantasia concernente às imagens! Depois de ter ouvido estas cousas, salmos da
casa e da cidade; e no caminho, segundo o que tínhamos visto nos Céus,
tiramos conclusões sobre o Circulo e a Progressão do Amor Conjugal; sobre o
circulo,que ele tinha passado do O riente ao Sul,e do Sul ao O cidente, e daí ao
Setentrião; sobre a Progressão que ele tinha declinado segundo a Circulação, a
saber, que no O riente, tinha sido celeste, no Sul, espiritual, no O cidente,
71

natural; e no Setentrião, sensual; e também, que ele tinha declinado no mesmo


grau que o amor e o culto de Deus. Daí foi além disso concluído, que este
Amor na Primeira Idade tinha sido como o O uro,na Segunda como a Prata, na
T erceira como o Bronze,e na Q uarta como o Ferro,e que enfim tinha cessado:
e então o Anjo, meu guia e meu companheiro, disse: "Entretanto concebo a
esperança de que este Amor será ressuscitado pelo Deus do Céus, que é o
Senhor,porque ele pode ser ressuscitado.
79 - Q uinto M emorável. O Anjo que tinha sido meu guia e meu companheiro
nas moradas dos Antigos que tinham vivido nos quatro Séculos, do O uro, da
Prata, do Bronze e do Ferro, veio de novo e me disse: "Q ueres ver qual foi, e
qual é ainda, o Século que sucedeu a estes quatro Séculos antigos? Segue-me e
tu verás. São aqueles sobre quem Daniel profetizou nestes termos: "Elevar-se-á
um R eino, depois destes quatro, no qual o Ferro será misturado com a Argila
dó oleiro; eles se misturarão por semente de homem, mas não terão coerência
um com o outro, do mesmo modo que o ferro não se mistura com a argila.
(Daniel 11, 41, 42, 43). E ele disse: "Pela semente de homem pela qual o ferro
será misturado com a argila, sem entretanto ter coerência, é entendido o vero
da Palavra falsificado". Depois que disse essas palavras, eu o segui; e, no
caminho, ele me contou estas particularidades: "Estes habitam nos confins
entre o Sul e o O cidente, mas a uma grande distância por trás daqueles que
viveram nas quatro Idades precedentes, e também a uma maior profundidade".
E avançamos pelo Sul para a região que toca o O cidente, e atravessamos uma
Floresta medonha; pois havia lá Pântanos de onde Crocodilos elevavam as
cabeças, e dirigiam para nós suas vastas goelas armadas de dentes; e, entre os
pântanos, havia Cães terríveis, dos quais alguns tinham três cabeças como
Cérbero, outros duas cabeças, todos nos olhavam com uma horrível goela e
olhos ameaçadores, em quanto passávamos. Entramos no país O cidental desta
região, e vimos Dragões e Leopardos, tais como são descritos no Apocalipse
(Cap. X II, 3; X III, 2); e o Anjo me disse: "T odas estas bestas ferozes, que
vistes, não são bestas ferozes; mas são correspondências e assim formas
representativas das cobiças, em que estão os H abitantes que vamos visitar; as
cobiças mesmas são representadas por esses horríveis cães; as suas velhacarias e
suas astúcias, pelos crocodilos; as suas falsidades e suas inclinações depravadas
pelas cousas que pertencem a seu culto, pelos dragões e pelos leopardos; mas os
H abitantes representados aqui moram não imediatamente perto da Floresta,
mas além de um grande Deserto, que é intermediário, a fim de que sejam
plenamente afastados e separados dos H abitantes das Idades precedentes; pois
eles lhes são absolutamente estranhos, ou diferem deles totalmente: eles têm, é
verdade,a cabeça acima do peito, o peito acima dos lombos, e os lombos acima
dos pés, como os homens das primeiras idades, entretanto em sua cabeça não
há cousa alguma de ouro, em seu peito coisa alguma de prata, em seus lombos
coisa alguma de bronze, e mesmo nos pés cousa alguma do ferro puro; mas em
sua cabeça há ferro misturado com argila,em seu peito ferro e argila misturados
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com bronze,em seus lombos ferro e argila misturados com prata, e em seus pés
ferro e argila misturados com ouro; por esta inversão, de homens foram
mudadas em esculturas de homens, nas quais não há interiormente cousa
alguma coerente; pois o que era o, supremo tornou-se o ínfimo, assim o que
era a cabeça tornou-se o calcanhar, e vice-versa; eles nos aparecem do Céu
semelhantes a histriões que se põem sobre os cotovelos com o corpo invertido,
e andam; ou como bestas que se deitam sobre o dorso e levantam os pés para o
ar, e com a cabeça, que eles escondem na terra, olham o Céu". Atravessamos a
floresta, e entramos no, Deserto, que não era menos assustador; consistia em
montões de pedras, entrecortados de fossos, de onde se lançavam hidras e
víboras, e de onde partiam serpentes voadoras; todo este deserto ia
continuamente se abaixando; e nós descemos por uma longa rampa, e enfim
nos vimos em um V ale habitado pelo povo desta região e desta idade; havia
aqui e ali cabanas que por fim apareceram aproximadas e juntas formando uma
cidade; entramos aí e eis que as casas eram construídas de galhos de árvores
queimados em volta, e ligados com barro; eram cobertos com ardósias negras;
as ruas eram irregulares, muito estreitas no começo, mas alargando-se para
diante, e espaçosas no fim, onde havia praças públicas, daí, tantas as ruas
quantas as praças públicas. Q uando entramos na cidade, se fez espessa treva,
porque o Céu não aparecia; por isso olhamos para cima, e a luz nos foi dada, e
vimos; e então perguntei aos que encontrava: "Será que podeis ver, visto como
o céu acima de vós não aparece?" E eles responderam: "Q ue pergunta fazes tu?
N ós vemos claramente, caminhamos em plena luz". O Anjo, tendo ouvido esta
resposta, me disse: "As trevas são para eles a luz, e a luz é para eles a treva; é
como para os pássaros noturnos, pois eles olham para baixo e não para cima.
Entramos aqui e ali nas cabanas, e vimos em cada uma um homem com sua
mulher, e perguntamos se, nesta cidade todos viviam em suas casas com uma
única esposa; e eles responderam com um assobio: “O que! Com uma única
esposa; Por que não perguntais se é com uma única cortesã? O que é uma
esposa; senão uma cortesã? Segundo nossas leis não nos é permitido viver com
várias mulheres, mas unicamente com uma; entretanto, não é para nós uma
desonra,nem uma indecência viver com várias,mas fora de casa; fazemos glória
disso entre nós; assim gozamos, da licença, e da volúpia que ela produz, mais
do que os polígamos; por que a pluralidade das esposas nos foi recusada,
quando entretanto foi concedida,e o é ainda hoje,em todas as regiões do globo
em torno de nós? O que é a vida com uma única esposa senão um cativeiro e
uma prisão? M as nós, aqui, quebramos os ferrolhos desta prisão, e nos
libertamos da servidão, e recuperamos nossa liberdade; quem pode se irritar
contra um prisioneiro que se escapa quando pode?".N ós lhe respondemos:"T u
falas amigo, como alguém que não tem religião; há alguém, dotado de alguma
razão, que não saiba que os adultérios são profanos e infernais, e que os
casamentos são santos e celestes? N ão estão os adultérios entre os diabos no
inferno, e os casamentos entre os Anjos no Céu? N ão leste o sexto preceito do
73

Decálogo,e,em Paulo,que os que são adúlteros não podem de maneira alguma


ir para o Céu?" A essas palavras, o nosso hóspede se pôs a rir desbragadamente,
e me considerou como um homem simples e quase como um insensato. M as
no mesmo instante acorreu um enviado do chefe da cidade e disse: "Leva os
dois estrangeiros à praça pública, e se não quiserem ir, arrasta-os para lá nós os
vimos na sombra da luz; eles entraram secretamente; são espiões". E o Anjo
disse: "Se fomos vistos na sombra é porque a luz do Céu, em que estamos, é
para eles a sombra, e a sombra do inferno é para eles a luz; e isso tem lugar
porque eles não consideram cousa alguma como pecado, nem mesmo o
adultério; e por conseguinte eles vêem o falso absolutamente como vero, e o
falso brilha no inferno diante dos satãs, em quanto que o vero obscurece seus
olhos como a sombra da noite". E dissemos ao enviado: "N ão é necessário nos
constranger, e ainda menos nos arrastar à praça pública; mas iremos de bom
grado contigo". E fomos. E eis que havia uma multidão numerosa, donde
saíram alguns legistas, que nos disseram ao ouvido: "G uardai-vos bem de dizer
alguma cousa contra a R eligião, a forma de G overno e os bons Costumes". E
respondemos: "N ada diremos contra eles, mas falaremos a favor deles e
segundo eles". E fizemos esta pergunta: "Q ual é a vossa R eligião a respeito do
Casamento?". A essas palavras a multidão murmurou e disse: "Q ue tendes que
fazer aqui com os Casamentos? O s casamentos são casamentos". E fizemos esta
outra pergunta: "Q ual é a vossa R eligião a respeito das Escortações?" A
multidão murmurou ainda dizendo: "Q ue tendes que fazer aqui com as
escortações? As escortações são escortações; quem estiver inocente delas que
atire a primeira pedra". E fizemos uma terceira pergunta: "A vossa R eligião não
ensina,a respeito dos casamentos, que eles são santos e celestes, e a respeito dos
adultérios que eles são profanos e infernais? A estas palavras,alguns da multidão
desataram a rir; zombaram e gracejaram, dizendo: ”Dirigi-vos, para as cousas
da religião aos nossos Sacerdotes, e não a nós; nós concordamos plenamente
com tudo que eles nos dizem, porque cousa alguma da religião é da alçada do
entendimento; não tendes ouvido dizer que a respeito dos mistérios, de que se
compõe toda R eligião, o entendimento desarrazoa? E o que tem as Ações de
comum com a R eligião? N ão é murmurando com um coração devoto palavras
sobre a expiação,a satisfação e a imputação,que as almas são beatificadas, e não
pelas O bras?" M as então se aproximaram alguns dos pretensos sábios da cidade,
e disseram: "R etirai-vos daqui, a multidão se esquenta, o tumulto está
eminente; conversemos a sós sobre este assunto; há um passeio por trás do
Palácio, retiremo-nos para lá; vinde conosco". E nós os seguimos. E então nos
perguntaram quem nós éramos, e que negócio nos tinha levado ao meio deles.
E nós dissemos: "V iemos para ser instruídos a respeito dos Casamentos, se
entre vós, como entre os Antigos que viveram nos Séculos de O uro, de Prata e
de Bronze, são cousas santas, ou se não o são". E eles responderam: “O que!
cousas santas! não são eles obras da carne e da noite?" E nós respondemos:
"N ão são eles também obras do espírito? E o que a carne faz segundo o espírito,
74

não é espiritual? E tudo que faz o espírito, ele o faz segundo o casamento do
bem e do vero; não é esse Casamento espiritual que entra no Casamento
natural, isto é, de um M arido e de uma Esposa?" A isso os pretensos sábios
responderam: "V ós tratais este assunto com sutileza e demasiada sublimidade,
passais acima dos racionais para os espirituais; quem pode começar a uma tal
elevação, descer de lá e assim tomar alguma decisão? "Depois, zombando,
acrescentaram: "T alvez tenhais azas de águia, e podeis voar na suprema região
do Céu, e aí fazer tais descobertas? quanto a nós, não o podemos". E então nós
lhes pedimos para dizer do alto ou da região em que voavam as idéias aladas de
suas mentes, se sabiam ou podiam saber, que existe um Amor Conjugal de um
único marido com uma única esposa, no qual foram reunidas todas as
beatitudes, todos os prazeres, todos os encantos, e todas as volúpias do Céu; e
que este amor vem do Senhor segundo a recepção do bem e do vero procedente
d'Ele, assim segundo o estado da Igreja". O uvindo estas palavras, eles se
desviaram e disseram: "Estes homens são loucos, entram no éter com seu
julgamento, e fazendo vãs conjecturas espalham disputas". Em seguida se
voltaram para nós, e disseram: "R esponderemos diretamente às vossas
conjecturas empoladas e aos vossos sonhos". E disseram: “O que é que o Amor
conjugal tem de comum com a R eligião e com a inspiração vinda de Deus? Este
amor não está em cada um segundo o estado de sua potência? N ão está ele
igualmente nos que estão fora da Igreja, como nos que estão na Igreja; entre os
gentios como entre os Cristãos; e mesmos entre os ímpios como entre os
piedosos? A força deste amor não está em cada um segundo o hereditário, ou
segundo a saúde, ou segundo a temperança da vida, ou segundo o calor do
clima? N ão pode ela também ser aumentada e estimulada por drogas? N ão há a
mesma cousa nas bestas, sobretudo nos pássaros que se amam por par? N ão é
este amor carnal? O que é que o carnal tem de comum com o estado espiritual
da Igreja? Será que este amor, quanto ao último efeito com a esposa, difere na
menor cousa do amor quanto a esse efeito com uma cortesã? O prazer não é
semelhante, e a delícia semelhante? É portanto injurioso tirar das cousas santas
da Igreja a origem do amor conjugal". Depois de ter ouvido estas palavras, nós
lhes dissemos: "V ós raciocinais por um delírio de lascividade, e não pelo amor
conjugal; vós não sabeis absolutamente o que é o Amor conjugal, porque este
amor em vós é frio; por vossas palavras, estamos convencidos de que sois do
Século que é chamado e se compõe de ferro e de argila, os quais não tem
coerência, segundo a predição de Daniel, (II, 43); pois fazeis um do Amor
conjugal e do amor escortatório; será que os dois têm mais coerência do que o
ferro e a argila? Acreditam que sois sábios e vos chamam de sábios, entretanto
vós nada sois menos do que sábios". A estas palavras, arrebatados de cólera, eles
gritaram e chamaram a multidão para nos expulsar, mas então, pelo poder que
nos foi dado pelo Senhor, nós estendemos as mãos, e eis que serpentes
voadoras, víboras e hidras, e também dragões do deserto, se apresentaram, e
invadiram e encheram a cidade, o que lançou o terror entre os habitantes que
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fugiram; e o Anjo me disse: "N esta R egião chegam cada dia recém-vindos da
T erra, e de tempos em tempos os que os precederam são relegados e
precipitados nos abismos do O cidente, que de longe aparecem como Pântanos
de fogo e de enxofre; todos lá,são adúlteros espirituais,e adúlteros naturais".
80 - Sexto M emorável. Depois que o Anjo pronunciou estas palavras, olhei
para a extremidade do O cidente, e eis que apareceram como Pântanos de fogo
e enxofre; e lhe perguntei porque os Infernos apareciam assim neste lugar; ele
respondeu: "Aparecem como Pântanos pelas falsificações do vero, porque a
água no sentido espiritual é o vero; e aparece como um fogo em torno e dentro
pelo amor do mal, e como enxofre pelo amor do falso; estes três, o Pântano, o
Fogo e o Enxofre, são aparências, porque são correspondências dos amores
maus em que estão os habitantes. T odos, lá, estão encerrados em eternas
cadeias, e trabalham pelo alimento, a roupa e a cama; quando agem mal, são
severamente e miseravelmente punidos". Fiz ainda esta pergunta ao Anjo: "Por
que disseste que lá estão adúlteros espirituais e naturais? por que não disseste
malfeitores e ímpios?" Ele respondeu: "Porque todos os que consideram como
nada os adultérios,isto é, que acreditam pela confirmação que não são pecados,
e assim os cometem de propósito deliberado, são em seus corações malfeitores e
ímpios; pois o Conjugal humano e a R eligião marcham juntos com o mesmo
passo; toda marcha e todo avanço pela R eligião e na R eligião, é também uma
marcha e um avanço pelo Conjugal e no Conjugal que é particular e próprio
do homem Cristão". T endo lhe perguntado o que é este Conjugal, ele disse: "é
o desejo de viver com uma única Esposa, e este desejo está no homem Cristão
segundo a R eligião". Depois fiquei aflito em meu coração porque os
Casamentos, que nas Idades Antigas tinham sido santíssimos, tivessem tão
horrivelmente se mudado em adultérios; e o Anjo disse: "Acontece hoje o
mesmo com a R eligião, pois o Senhor disse que na Consumação do século
haverá a Abominação da desolação predita em Daniel; e que haverá uma
Aflição grande,tal como não houve desde o começo do mundo (M ateus X X IV ,
15,21).A Abominação da desolação significa a falsificação e a privação total de
todo vero; a Aflição significa o estado da Igreja infestada pelos males e pelos
falsos; e a Consumação do século, a respeito da qual isso é dito, significa o
último tempo ou o fim da Igreja; é agora o fim porque não resta mais vero que
não tenha sido, falsificado; e a falsificação do vero é a escortação espiritual, que
faz um com a escortação natural,porque elas são coerentes".
81 - Q uando falávamos destas coisas e estávamos aflitos, apareceu de repente
um grande clarão de luz que me feriu fortemente os olhos; por isso olhei para
cima,e eis que todo o Céu acima de nós apareceu luminoso; e lá do O riente ao
O cidente em uma longa série se fazia ouvir uma G lorificação; e o Anjo me
disse: "Esta G lorificação é a G lorificação do Senhor por causa do Seu Advento;
é feita pelos Anjos do Céu O riental e do Céu O cidental". N ão se ouvia do Céu
M eridional e do Céu Setentrional senão um doce murmúrio; e como o Anjo
76

tinha compreendido tudo, ele me disse primeiro que estas G lorificações e estas
Celebrações do Senhor se faziam pela Palavra, porque então elas se fazem pelo
Senhor, pois o Senhor é a Palavra, isto é, o Divino V ero na Palavra, e ele disse:
"Agora eles glorificam e celebram o Senhor em particular por estas palavras que
foram ditas pelo Profeta Daniel: "T u viste o ferro misturado com a argila do
oleiro; eles se misturarão por semente de homem, mas não terão coerência: e
nestes dias o Deus dos Céus fará surgir um R eino, que pelos séculos não
perecerá; este quebrará e consumirá todos estes R einos, ele porém subsistirá
pelos séculos” (Daniel 11, 43, 44). Depois disso, ouvi como um ruído de
canto, e mais adiante, no O riente, vi um clarão de luz mais resplandecente que
o primeiro; e perguntei ao Anjo quais eram as palavras desta G lorificação; ele
disse que eram estas em Daniel:"V endo eu estava em visões de noite, e eis com
as N uvens do Céu como um Filho do H omem que vinha; e a Ele foi dado
Dominação e R eino, e todos os povos e nações O servirão; a sua Dominação
(será) uma Dominação do século, a qual não passará; e seu R eino, (um R eino)
que não, perecerá" (Daniel V II, 13, 14). Além disso, celebravam o Senhor por
estas palavras do Apocalipse: "A Jesus Cristo seja a glória e a força; eis que ele
vem com as N uvens; Ele é o Alfa e o ômega, o Começo, e o Fim, o Primeiro e
o último, Q ue É, e Q ue Era, e Q ue V em, o T odo Poderoso. Eu, João, ouvi
isto do Filho do H omem,do meio de sete candelabros" (Apoc.I, 5, 6, 7, 8, 10,
11, 12, 13; X X II, 13) e também segundo M ateus X X IV , 30, 31. Dirigi de
novo meus olhos para o Céu O riental, e o lado direito resplandecia de luz, e o
esplendor luminoso entrou na Extensão M eridional, e ouvi um som doce; e
perguntei ao Anjo qual era, lá o assunto da glorificação do Senhor. Ele disse
que eram estas palavras do Apocalipse: "Eu vi um Céu novo e uma T erra nova,
e via a Cidade Santa, Jerusalém N ova, descendo de Deus pelo Céu, enfeitada
como uma N oiva ornada para seu M arido. E o Anjo me falou e disse: V em, eu
te mostrarei a N oiva, do Cordeiro, a Esposa; e me levou em espírito sobre uma
M ontanha grande e elevada,e me mostrou a Cidade,a Santa Jerusalém" (Apoc.
X X I, 1, 2, 9, 10). E também estas: "Eu, Jesus, sou a Estrela brilhante e da
manhã e o Espírito e a N oiva dizem: V em. E Ele diz: Sim, eu venho breve;
Amém !Sim, V em, Senhor Jesus!" (Apoc. X X II, 16, 17, 20). Depois destas
glorificações e várias outras, ouviu-se uma comum G lorificação do O riente ao
O cidente do Céu, e também do Sul ao Setentrião; e perguntei ao Anjo quais
eram então as palavras; e ele disse que eram estas, tomadas nos Profetas: "A fim
de que saiba toda carne, que Eu (sou) Jehovah teu Salvador e teu R edentor"
(Isaías X LIX , 26). "Assim disse Jehovah, o R ei de Israel, e seu R edentor
Jehovah Z ebaoth: Eu, o Primeiro e, Eu o último, e exceto Eu, não há Deus".
(Isaías X LIV , 6). "Dir-se-á naquele dia: Eis nosso Deus, Este, que esperávamos
para que nos libertasse; Este (é) Jehovah que esperávamos". (Isaías X X V , 9).
"U ma vós há do que clama no deserto: Preparai o caminho a Jehovah; eis, o
Senhor Jehovah em forte vem; como Pastor seu, rebanho apascentará". (Isaías
X L, 3, 5, 10, 11). "U m M enino nos nasceu, um Filho nos foi dado, e
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chamarão seu N ome: Admirável, Conselheiro, Deus, H erói, Pai da Eternidade,


Príncipe da Paz". (Isaías IX , 5). "Eis que dias virão, e suscitarei a David um
G erme justo, que reinará R ei, e eis seu N ome: Jehovah nossa Justiça".
(Jeremias X X III, 5, 6; X X X II, 15, 16). "Jehovah Z ebaoth (é) seu N ome, e teu
R edentor, o Santo de Israel, Deus de toda a T erra será chamado". (Isaías LIV ,
5) . "N aquele dia estará Jehovah como R ei sobre a terra; naquele, dia será
Jehovah um, e seu N ome U m". (Isa. X IV , 9). T endo ouvido e compreendido
estas cousas, meu coração pulou, e foi com alegria para casa, e lá voltei do
estado de espírito para o estado do corpo, no qual escrevi o que tinha visto e
ouvido. Agora, a estas cousas eu acrescento que o Amor Conjugal, tal como foi
entre os Antigos,é ressuscitado pelo Senhor depois de Seu Advento porque este
Amor vem do Senhor Só, e está naqueles que por Ele, por meio da Palavra se
tornam espirituais.
82 - Depois disso um homem da Plaga setentrional acorreu com
impetuosidade,e me encarou com ar ameaçador e, dirigindo-se a mim com um
tom irritado, disse: "N ão és tu o que quer seduzir G M undo, instaurando uma
N ova Igreja, que designas com o nome da N ova Jerusalém que deve descer de
Deus pelo Céu, e ensinando que o Senhor aos que abraçam as doutrinas dessa
Igreja o Amor verdadeiramente conjugal, de que exaltas até ao Céu as delícias e
a felicidade? N ão é isso uma invenção; e não a apresentas como um engodo e
uma isca para atrair para as tuas N ovidades? M as diz-me, em suma, quais são
esses Doutrinais da nova Igreja, e eu verei se são concordantes ou
discordantes". E eu respondi: "O s Doutrinais da Igreja, que é entendida pela
N ova Jerusalém, são estes: I. H á um único Deus, em Q uem está a Divina
T rindade, e este Deus é o Senhor Jesus Cristo. II. A Fé salvífica é crer n'Ele.
III. É preciso fugir dos M ales, porque são do diabo e vem do diabo. IV . É
preciso fazer os Bens, porque são de Deus e vem de Deus. V . O homem deve
fazer os bens como por si mesmo, mas crer que são feitos pelo Senhor nele e
por meio dele". Depois de ter ouvido estes doutrinais, o seu furor se acalmou
durante alguns momentos; mas depois que deliberou um pouco em si mesmo,
ele me olhou de novo com ar zangado, dizendo: "Estes cinco Preceitos são os
Doutrinais da fé e da caridade da N ova Igreja?" E eu respondi: "Eles o são".
Então ele me perguntou com um tom duro: "Como podes demonstrar o
Primeiro,que há um único Deus,em Q uem está a Divina T rindade, e que esse
Deus é o Senhor Jesus Cristo?" Eu disse: "Eu o demonstro assim: Deus não é
U m e Indivisível? N ão há uma T rindade? Se Deus é U m e Indivisível, não há
uma única Pessoa? Se H á uma única Pessoa, a T rindade não está n’Ele? Q ue
este Deus seja o Senhor Jesus Cristo, isso é evidente por estas considerações,
que Ele foi concebido de Deus Pai, (Lucas I, 34 e 35), e que assim Ele é Deus
quanto à Alma; e por conseguinte, como Ele mesmo o diz, o Pai e Ele são um;
(João X ,39); que Ele está no Pai, e o Pai n’Ele, (João X IV , 10, 11); que aquele
que O vê e O conhece, vê e conhece o Pai, (João X IV , 7 e 9); que ninguém vê
e não conhece o Pai, senão Ele que está no seio do Pai, (João I, 18); que todas
78

as cousas do Pai são d'Ele, (João III, 35; X V I, 15); que Ele é o Caminho, a
V erdade e a V ida e que ninguém vem ao Pai senão por Ele, (João X IV , 6),
assim por Ele, porque o Pai está n'Ele, e que segundo Paulo, toda a plenitude
da Divindade habita corporal n'Ele, (Col. II, 9); e, além disso, que Ele tem o
Poder sobre toda carne, (João X V II, 2); e que Ele tem todo Poder no Céu e
sobre a T erra, (M at. X X V III, 18); de todas estas passagens resulta que Ele é o
Deus do Céu e da T erra".Ele me perguntou em seguida como eu demonstraria
o Segundo que a Fé salvífica é de crer n'Ele, Eu disse: "Demonstro-o por estas
palavras do Senhor M esmo: É a vontade do Pai, que quem quer que crê no
Filho tenha a vida eterna, (João V I, 40). Deus amou de tal modo o mundo,
que seu Filho U nigênito Ele deu, a fim de que quem quer que crê n'Ele não
pereça, mas tenha a vida eterna, (João III, 15, 16). Q uem crê no Filho tem a
vida eterna, mas quem não crê no Filho não verá a vida, mas a cólera de Deus
permanece sobre ele, (João III, 36) ". Em seguida ele me disse: "Demonstra
também o T erceiro e os seguintes". E eu respondi: "Q ue necessidade há de
demonstrar que é necessário fugir dos males, porque são do diabo e vem do
Diabo; e que é necessário fazer os bens, porque são de Deus e vêm de Deus; e
que o homem deve fazer os bens como por si mesmo, mas crer que são feitos
pelo Senhor nele e por meio dele? Q ue essas três Doutrinas sejam veros, é o
que confirma toda Escritura Santa desde o começo até ao fim. Q ue outra cousa
há, em suma, senão que é preciso fugir dos males fazer os bens, e crer no
Senhor Deus? e, além disso, sem estes três Doutrinais, não há R eligião alguma;
a R eligião não concerne à vida? [E o que é a vida, se não é fugir aos males e
fazer os bens? Como o homem pode fazer estes e fugir daqueles, se não for
como pôr ele mesmo? Se portanto tiras da Igreja estes Doutrinais, tu lhe tiras a
Escritura Santa, e tiras também a R eligião; e quando estas coisas são tiradas, a
Igreja não é a Igreja". Este homem, tendo ouvido estas explicações se retirou, e
meditou; mas foi embora estando sempre indignado.
79

Da origem do amor conjugal


pelo casamento do bem e da
verdade
83 - H á O rigens internas do Amor conjugal, e O rigens externas; as internas são
em grande número, igualmente as externas; mas a origem íntima ou universal
de todas é uma; que esta origem seja o Casamento do bem e do vero, isso será
demonstrado no que vai seguir. Se ninguém deduziu ainda daí a O rigem deste
Amor, é porque se ignora que haja alguma união entre o bem e o vero; e
ignorou-se isso, porque o bem não se apresenta na luz do entendimento, como
o vero, e por conseguinte o seu conhecimento escondeu-se e se furtou às
pesquisas; e pois que o bem está assim no número das cousas desconhecidas,
ninguém suspeitou um casamento entre ele e o vero; mais ainda, diante da vista
racional-natural o bem se apresenta tão afastado do vero,que não se pode supor
entre eles conjunção alguma; que isso seja assim, pode-se ver pela linguagem
ordinária, quando se faz menção dele; por exemplo, quando se diz: "Isto é um
bem", não se pensa absolutamente no vero; e quando se diz: "Isso é um vero",
não se pensa absolutamente no bem; é por isso que hoje, muitos acreditam que
o vero é absolutamente uma outra cousa, igualmente o bem; e muitos também
acreditam que o homem é inteligente e sábio e, por conseqüência, homem,
segundo os veros que pensa, diz escreve e crê, e não ao mesmo tempo segundo
os bens; que entretanto não haja bem sem vero, nem vero sem bem, que assim
haja entre eles um casamento eterno, e que este casamento seja a origem do
amor conjugal, é o que vai ser agora exposto; será nesta ordem: I. O Bem e o
V ero são os universais da criação, e estão por conseguinte em todas as coisas
criadas; mas nos seres criados eles estão segundo a forma de cada um. II. N ão
há Bem solitário, nem V ero solitário, mas por toda parte eles estão conjuntos.
III. H á o V ero do bem e, por ele, o B em do vero, ou o V ero segundo o bem, e
o Bem segundo este vero, e nestes dois, por criação, foi inserida uma inclinação
para se conjuntarem em um. IV . N os seres do R eino animal o V ero do bem ou
o V ero segundo o bem é o M asculino, e por ele o Bem do vero ou o Bem
segundo este vero é o Feminino. V . Do influxo do Casamento do bem e do
vero procedendo do Senhor vem o Amor do sexo, e vem o Amor Conjugal. V I.
O Amor do sexo pertence ao homem Externo ou natural, e por conseguinte é
comum a todo animal. V II. M as o Amor conjugal pertence ao homem interno
ou espiritual, e em conseqüência é peculiar ao homem. V III. N o homem o
Amor conjugal está no amor do sexo, como uma pedra preciosa em sua matriz.
IX .O Amor do sexo no homem não é a origem do Amor conjugal, mas é a sua
primeira coisa, assim, é como o Externo natural no qual está implantado o
80

Interno espiritual. X . Q uando o Amor conjugal é implantado, o Amor do sexo


se volta, e torna-se o Amor casto do sexo. X I. O M acho e a Fêmea foram
criados para serem a Forma mesma do Casamento do bem e do vero. X II. Eles
são esta Forma nos seus íntimos, e em conseqüência nas cousas que deles
derivam, conforme os interiores de sua mente são abertos. Segue agora a
explicação destes Artigos.
84 - I.O Bem e o V ero são os universais da criação e estão por conseguinte, em
todas as coisas criadas; mas nos seres criados estão segundo a forma de cada um.
Q ue o Bem e o V ero sejam os universais da criação, é porque estes dois estão
no Senhor Deus Criador; mais ainda, eles são Ele M esmo, pois Ele é o Divino
Bem M esmo, e o Divino V ero M esmo; mas isso cai mais claramente na
percepção do entendimento, e assim na idéia do pensamento se em lugar do
Bem se diz o Amor, e em lugar do V ero a Sabedoria; por conseqüência, se se
diz que no Senhor Deus Criador há o Divino Amor e a Divina Sabedoria, e
que estes dois são Ele M esmo, isto é, que Ele é o Amor M esmo e a Sabedoria
M esma; pois estes dois são os mesmos que o Bem e o V ero; e isso, porque o
Bem pertence ao Amor e o V ero à Sabedoria, pois o Amor se compõe de bens e
a Sabedoria de veros. O Amor sendo a mesma cousa que o Bem, e a Sabedoria
a mesma cousa que o V ero,daqui por diante, se dirá ora o Amor e a Sabedoria,
e ora o Bem e o V ero,e se entenderá a mesma cousa. Isto é dito aqui em forma
de preliminar, a fim de que, daqui por diante, quando estas expressões forem
empregadas,o entendimento não perceba cousas diferentes.
85 - U ma vez que o Senhor Deus Criador é o Amor M esmo e a Sabedoria
M esma, e que por Ele foi criado o U niverso que, por conseqüência é como
uma O bra procedente d'Ele,não pode deixar de haver em todas e em cada uma
das cousas criadas o Bem e o V ero d'Ele; pois o que é feito por alguém e dele
procede, retêm dele uma semelhança. Q ue isso seja assim, a razão também
pode vê-lo pela O rdem, em que estão todas e cada uma das coisas do U niverso
criado, a saber, que uma cousa existe em vista de uma outra, e que por
conseguinte uma cousa depende de uma outra, como os anéis de uma mesma
cadeia; pois elas são todas para o G ênero H umano, a fim de que dele seja
composto o Céu Angélico, pelo qual a Criação retorna ao Criador M esmo de
que ela vem, e por esse meio que há conjunção do U niverso criado com seu
Criador, e pela conjunção conservação perpétua. Daí vem que o B em e o V ero
sejam chamados os U niversais da Criação; que assim seja, é evidente para todo
homem que vê este assunto com racionalidade; este vê em cada cousa criado o
que se refere ao bem,e o que se refere ao vero.
86 - Q ue o Bem e o V ero nos seres criados estejam segundo a forma de cada
um, é porque todo ser recebe o influxo segundo sua forma; a Conservação de
tudo não é outra cousa senão o influxo perpétuo do Divino Bem e do Divino
V ero nas formas criadas para eles, pois assim a subsistência ou a conservação é
uma perpétua existência ou uma perpétua criação. Q ue todo ser recebe o
81

influxo segundo sua forma, isso pode ser ilustrado por diversas cousas; por
exemplo,pelo influxo do calor e da luz do Sol nos vegetais de todo gênero; cada
vegetal recebe este influxo segundo sua forma; assim, toda árvore segundo a
sua; todo arbusto segundo a sua, toda planta segundo a sua, toda erva segundo
a sua; o influxo é semelhante em todos, mas a recepção, porque é segundo a
forma,faz que cada espécie fique espécie particular. A mesma cousa pode ainda
ser ilustrada pelo influxo nos Animais de todo gênero segundo a forma de cada
um. Q ue o influxo seja segundo a forma de cada cousa, é o que pode ver
mesmo um homem iletrado, se presta atenção aos diversos instrumentos de
som,tais como os assobios,as flautas,as trompas,as trombetas e os órgãos, pelo
fato deles ressoarem por um mesmo sopro ou influxo do ar segundo suas
formas.
87 - II. N ão há Bem solitário, nem V ero solitário, mas por toda parte eles
foram conjuntos.
Aquele que quer por algum sentido formar uma idéia do Bem, não o pode
conseguir sem acrescentar alguma cousa que o apresente e manifeste; sem isso o
Bem é um Ser (Ens) que não tem nome; aquilo pelo que ele é apresentado e
manifestado se refere ao vero; diz simplesmente o B em, e não ao mesmo tempo
tal ou tal cousa com que ele está, ou define-o de uma maneira abstrata ou sem
algum adjunto coerente, e tu verás que não é cousa alguma, mas que com o
que foi junto, é alguma cousa; e se empregas toda a tua razão, perceberás que o
Bem sem algum adjunto não é suscetível de denominação alguma, nem por
conseqüência de relação alguma, de afeição alguma, nem de estado algum, *em
uma palavra, de qualidade alguma. Dá-se o mesmo com o V ero, se é ouvido
sem que tenha sido junto a ele alguma cousa; que o que foi junto a ele se refere
ao bem, a razão purificada pode vê-lo. M as como os Bem são inumeráveis, e
cada bem sobe ao seu máximo e desce ao seu mínimo como pelos degraus de
uma escada, e mesmo muda de nome segundo sua progressão e, segundo sua
qualidade, é difícil a outros que não aos sábios ver a relação do bem e do vero,
com os objetos,e sua conjunção nos objetos.Q ue entretanto não haja bem sem
vero, nem vero sem bem, é o que vê claramente a percepção comum, quando
de começo se reconhece que todas e cada uma das cousas do U niverso se
referem ao Bem e ao V ero, como foi mostrado no Artigo precedente, n. 84,85.
Q ue não haja bem solitário, nem V ero solitário, isso pode ser ilustrado e ao
mesmo tempo confirmado por diversas considerações; assim, não há Essência
sem forma,nem Forma sem essência; ora,o bem é a essência ou o ser e o vero é
aquilo pelo qual a essência é formada e pelo qual o ser existe.Assim,no homem
há a V ontade e o Entendimento, o Bem pertence à vontade, e o V ero pertence
ao entendimento; ora, a vontade só nada faz senão pelo entendimento; e o
entendimento só não faz alguma cousa senão pela vontade. Assim, há duas
fontes da vida do corpo no homem,o Coração e o Pulmão; o coração não pode
produzir alguma vida sensitiva e motriz sem a respiração, do pulmão, nem o
82

pulmão sem o coração; o coração se refere ao bem, e a respiração do pulmão se


refere ao vero; há também correspondência. Dá-se o mesmo com todas e cada
uma das cousas da mente, e com todas e cada uma das cousas do corpo no
homem; mas produzir mais amplas confirmações, não é aqui o lugar; todavia,
pode-se ver este assunto mais plenamente confirmado na Sabedoria Angélica
sobre a Divina Providência, n. 3 a 26, onde foi exposto nesta ordem: I . O
U niverso com todas e cada uma das cousas que ele contém, foi criado do
Divino Amor pela Divina Sabedoria, ou, o que é a mesma cousa, do Divino
Bem pelo Divino V ero. II. O Divino Bem e o Divino V ero procedem como
um do Senhor.III.Este um está em uma espécie de imagem em todas as cousas
criadas. IV . O Bem não é o bem senão tanto quanto está unido do vero, e o
V ero não é vero senão tanto quanto está unido ao bem. V . O Senhor não
suporta que alguma cousa seja dividida, é por isso que o homem deve estar ou
no bem e ao mesmo tempo no vero, ou no mal e ao mesmo tempo no falso;
sem falar de várias outras proposições.
88 - III. H á o V ero do bem e, por ele, o Bem do vero, ou o V ero segundo o
bem e o Bem segundo este vero, e nestes dois, por criação, foi inserida uma
inclinação para se conjuntarem em um.
É necessário que se adquira sobre este assunto alguma idéia distinta, porque
disso depende o conhecimento concernente à origem essencial do Amor
conjugal; pois, como se vê adiante, o V ero do bem ou o V ero segundo o bem é
o M asculino, e o Bem do V ero ou o Bem segundo este vero é o Feminino; mas
isso pode ser compreendido mais distintamente, se em lugar do Bem se disser o
Amor,e em lugar do V ero a Sabedoria, o que dá no mesmo, como se vê acima,
n. 84. A Sabedoria não pode existir no homem senão pelo amor de se tornar
sábio; se este amor é tirado, o homem não pode de modo algum tornar-se
sábio; a Sabedoria segundo este amor é entendida pelo V ero do bem ou o V ero
segundo o bem; mas quando o homem por este amor adquiriu a sabedoria, e a
ama em si ou se ama por causa dela, forma então um amor que é o Amor da
sabedoria é entendido pelo Bem do vero ou o Bem segundo este vero; há
portanto no H omem (V ir) dois Amores, dos quais um, que é anterior, é o
Amor de se tornar sábio, e o outro, que é posterior, é o Amor da Sabedoria;
mas este Amor, se fica no H omem, é um Amor mau e é chamado fasto ou
amor da própria inteligência; que tenha sido provido, por criação, a que este
Amor fosse retirado do homem,de que causaria a perda, e que fosse transferido
para a M ulher, para tornar-se o Amor Conjugal que restabelece o homem na
integridade, é o que será confirmado mais adiante: sobre estes dois Amores, e
sobre a transferência do segundo para a mulher, veja-se acima algumas
explicações, n. 32, 33; e nos Preliminares, n. 20. Se, portanto, em lugar do
Amor é entendido o Bem, e em lugar da Sabedoria o vero, então, segundo o
que acaba de ser dito, vê-se que há o V ero do bem ou o vero segundo o bem, e
por ele o Bem do vero ou o Bem segundo este vero.
83

89 - Q ue nestes dois, por criação, tenha sido inserida uma inclinação para se
conjuntar em um, é porque um foi formado do outro, a Sabedoria foi formada
do amor de se tornar sábio, ou o vero foi formado do bem, e a Amor da
sabedoria foi formado desta sabedoria, ou o bem do vero foi formado deste
vero; por esta formação pode-se ver que há uma inclinação mútua para se
unirem e para se conjuntarem em um. M as isso tem lugar nos H omens que
estão na Sabedoria real, e nas M ulheres que estão no Amor desta Sabedoria no
M arido, assim naqueles que estão no Amor verdadeiramente conjugal. Q uanto
a Sabedoria que deve estar no homem e que deve ser amada pela Esposa, se
falará dela também mais adiante.
90 - IV .N os seres do R eino Animal o V ero do bem, ou o V ero segundo o bem
é o M asculino, e por ele o B em do vero ou o Bem segundo este vero é o
Feminino.
Q ue do Senhor Criador e Conservador do U niverso influi uma perpétua U nião
do Amor e da Sabedoria, ou o Casamento do bem e do vero e que os seres
criados o recebam cada um segundo sua forma, é o que foi mostrado, ns. 84,
85, 86; mas que segundo este Casamento ou esta U nião o M acho recebe o
V ero da Sabedoria, e que o Bem do amor lhe seja conjunto pelo Senhor
segundo a recepção, e que esta recepção se faça no entendimento, e que por
conseguinte o M acho nasce para se tornar intelectual, a R azão segundo sua luz
pode vê-lo, por cousas nele, sobretudo por sua Afeição, sua Aplicação, seus
Costumes e sua Forma. Por sua Afeição, pelo fato de ser a afeição de saber, de
compreender e de se tornar sábio; a afeição de saber na infância, a afeição de
compreender na adolescência e na primeira juventude, e a afeição de se tornar
sábio depois desta juventude até à velhice; daí é evidente que sua natureza ou
seu caráter se inclina a formar o entendimento, e que por conseqüência ele
nasce para se tornar intelectual; mas como isso só se pode fazer pelo amor, o
Senhor acrescenta-lhe segundo a recepção, isto é, segundo a intenção que ele
tem de se tornar sábio. Por sua Aplicação, que se dirige para as cousas
pertencentes ao entendimento, ou nas quais predomina o entendimento, e das
quais a maior parte se refere às ocupações externas e concernentes aos usos em
público. Por seus Costumes, que participam todos do predomínio do
entendimento; dai vem que os atos de sua vida, que são entendidos pelos
costumes, são racionais, e que se não o são, ele quer que o pareçam; a
racionalidade masculina é mesmo visível em cada uma de suas virtudes. Pela
sua Forma pelo fato de ser diferente e absolutamente distinta da forma
feminina; sobre esta forma,veja-se também o que foi dito acima, n. 33. Q ue se
acrescente a isto que o prolífico está nele; o prolífico não vem de outra parte
senão do entendimento, pois existe pelo vero segundo o bem; que o prolífico
vem daí,é o que se verá adiante.

91 - Q ue a M ulher, ao contrário, nasce para ser voluntária, mas voluntária


84

segundo o intelectual do homem, ou, o que é a mesma cousa, para ser o amor
da sabedoria do homem,porque ela foi formada por esta sabedoria, como acaba
de ser mostrado, n. 88 e 89, é também o que se pode ver pela Afeição da
M ulher, por sua Aplicação, por seus Costumes e por sua Forma. Por sua
Afeição, por ser esta a afeição de amar a ciência, a inteligência e a sabedoria,
entretanto, não nela mesma, mas no homem, e assim amar o homem; pois o
homem (vir) não pode ser amado por causa da forma só que faz com que
apareça como homem (homo), mas é amado por causa da qualidade que está
nele, a qual faz que ele seja homem. Por sua Aplicação, por que ela é levada
para as cousas que são obras das mãos, e são chamadas filé, bordados, e diversos
outros nomes, servindo para ornamentos, e a se enfeitar, e a realçar sua beleza;
e,além disso,para diversos deveres, chamados domésticos, que se adjuntam aos
deveres dos homens, os quais, como foi dito, são chamados afazeres fora de
casa; as mulheres são levadas a estas ocupações pela inclinação ao Casamento, a
fim de se tornarem esposas, e ser assim um com os maridos. Q ue a mesma
cousa se manifesta também pelos Costumes e por sua Forma, vê-se sem
explicação.
92 - V . Do influxo do Casamento do bem e do vero procedente do Senhor
vem o Amor do sexo,e vem o Amor conjugal.
Q ue o Bem e o V ero sejam os universais da criação, e por conseguinte estejam
em todos os seres criados, e que estejam nesses seres segundo a forma de cada
um; e que o Bem e o V ero procedem do Senhor não como dois mas como um,
é o que foi mostrado acima, n. 84 e 87; segue-se dai que uma Esfera U niversal
Conjugal procede do Senhor, e se espalha no U niverso desde seus primeiros até
seus últimos, assim desde os anjos até aos vermes. Q ue uma tal esfera do
Casamento do Bem e do V ero procede do Senhor, é porque esta esfera é
também a Esfera de propagação,isto é, de prolificação e de frutificação, e esta é
a mesma que a Divina Providência para a conservação do U niverso por
gerações sucessivas. O ra, como esta esfera universal, que é a do Casamento do
Bem e do V ero, influi nos seres segundo a forma de cada um, n. 86, segue-se
que o M acho a recebe segundo a sua, assim no Entendimento, porque ele é
uma forma intelectual; e que a Fêmea o recebe segundo a sua, assim na
V ontade, porque ela é uma forma voluntária segundo o intelectual do homem;
e como esta mesma esfera é também a esfera da prolificação, segue-se que daí
vem o Amor do sexo.
93 - Q ue daí vem também o Amor conjugal, é porque esta Esfera influi na
forma da sabedoria nos homens, e também nos Anjos; pois o homem pode
crescer em sabedoria,até ao fim de sua vida no M undo, e em seguida durante a
eternidade no Céu; e quanto mais cresce em sabedoria, tanto mais é
aperfeiçoada a sua forma; e esta forma recebe não o amor do sexo, mas o amor
de uma única pessoa do sexo; pois com esta pode ser unido até aos íntimos, nos
quais está o Céu com suas felicidades; e esta união pertence ao Amor conjugal.
85

94 - V I. O Amor do sexo pertence ao homem externo ou natural, e por


conseguinte é comum a todo animal.
T odo homem nasce corporal, e se torna cada vez mais interiormente natural, e
à medida que ama a inteligência se torna racional, e em seguida se ama a
sabedoria se torna Espiritual; o que é a sabedoria pela qual o homem se torna
espiritual, isso será dito depois, n. 130. O ra, à medida que o homem avança da
ciência para a inteligência, e da inteligência para a sabedoria, sua M ente
também muda Sua forma, pois é cada vez mais aberta, e se conjunta de mais
perto com o Céu, e pelo Céu com o Senhor; por conseguinte se torna mais
amorosa do vero e mais ligada ao bem da vida. Se portanto, ele se detém no
primeiro passo em sua marcha para a sabedoria, a forma de sua M ente
permanece natural, e não recebe o influxo da Esfera universal, que é o do
Casamento do bem e do vero, senão como o recebem os seres inferiores do
R eino animal, que são chamados bestas e pássaros; e como estes animais são
puramente naturais,este homem torna-se semelhante a eles,e por conseqüência
ama o sexo da mesma maneira que eles. É assim que é entendido que o amor
do sexo pertence ao homem externo ou natural, e que por conseguinte é
comum a todo animal.
95 - V II. M as o Amor Conjugal pertence ao homem Interno ou espiritual, e
por conseguinte,é peculiar ao homem.
Q ue o Amor conjugal pertence ao homem Interno ou espiritual, é porque
quanto mais o homem se torna inteligente e sábio, mais se torna interno ou
espiritual e mais é aperfeiçoada a forma de sua mente, e esta forma recebe o
amor conjugal; pois ele percebe e sente neste amor o prazer espiritual, que é
interiormente beatificado, e por este prazer o prazer natural, que dele tira sua
alma,sua vida e sua essência.
96 - Se o Amor conjugal é peculiar ao homem, é porque só o homem pode se
tornar espiritual, pois ele pode elevar seu entendimento acima de seus amores
naturais, e desta elevação os ver abaixo dele, e os julgar tais como são, e
também emendá-los, corrigi-los e repeli-los; nem um animal pode fazer isso,
pois os amores do animal foram absolutamente unidos com sua ciência inata
(conata); é por isso que, esta ciência não pode ser elevada à inteligência, nem
com mais forte razão à sabedoria; o animal é portanto conduzido pelo amor de
sua ciência, inserida nele, como um cego é conduzido nas ruas por um cão.
Está aí a causa porque o Amor conjugal é peculiar ao homem; pode também ser
chamado nativo e irmão gêmeo do homem (nativus e germanus), porque no
homem há a faculdade de se tornar sábio,com a qual este amor faz um.
97 - V III. N o homem o Amor conjugal está no Amor do uso como uma pedra
preciosa em sua matriz.
Isto sendo unicamente uma comparação será explicado no Artigo seguinte, por
esta comparação também é ilustrado que o Amor do sexo pertence ao homem
86

Externo ou natural, e o Amor conjugal ao homem Interno ou espiritual, e isso


acaba de ser mostrado,n.95.
98 - IX . O Amor do sexo no homem não é a origem do Amor conjugal, mas é
a primeira coisa dele,assim é como o externo no qual está implantado o interno
espiritual.
T rata-se aqui do Amor verdadeiramente conjugal, e não deste Amor vulgar,
que é também chamado conjugal, e que em alguns nada mais é que o Amor
limitado do sexo; mas o Amor verdadeiramente conjugal está unicamente
naqueles que desejam a sabedoria, e que por conseguinte, progridem cada vez
mais na sabedoria; o Senhor os vê de antemão, e provê para eles o Amor
conjugal, este amor, é verdade, começa neles segundo o amor do sexo, ou antes
por este amor, mas não obstante não é dele que nasce; pois nasce à medida que
a sabedoria avança e entra na luz no homem, pois a sabedoria e este amor são
companheiros inseparáveis. Se o amor conjugal começa pelo amor do sexo, é
porque antes que uma companheira seja encontrada, o sexo em geral é amado e
olhado com olhar amoroso; e é tratado com civilidade e honestidade; pois o
jovem tem sua escolha a fazer; e então, pela inclinação inserida nele para o
casamento com uma única do sexo, inclinação escondida no íntimo do seu
mental, o seu externo é agradavelmente aquecido; e como as determinações ao
casamento são diferidas por várias causas até a uma idade mais madura, durante
esse tempo o começo deste amor é como um desejo libidinoso, que em alguns
cai de fato no amor do sexo,mas não obstante neles o seu freio não é afrouxado
além do que é vantajoso para a saúde. T odavia, isto é dito do Sexo masculino
porque este sexo tem instigações que realmente abrasam, mas não o Sexo
feminino. Por estas explicações é evidente que o Amor do sexo não é a origem
do Amor verdadeiramente conjugal, mas que é o primeiro pelo tempo e não
pelo fim; pois o que é o primeiro pelo fim,é o primeiro na mente e na intuição
da mente, porque é o principal; mas não se chega a este primeiro senão
sucessivamente pelos médios; estes não são primeiros em si mesmos, mas
unicamente conduzem ao que é primeiro em si mesmo.
99 - X . Q uando o Amor conjugal foi implantado, o Amor do sexo, se volta, e
torna-se o Amor casto do sexo.
Diz-se que o Amor do sexo se volta, porque, quando o Amor conjugal vem à
sua origem, que está nos interiores do mental, ele vê o Amor do sexo, não
diante dele,mas atrás dele; ou melhor,não acima dele, mas abaixo dele, e assim
como alguma cousa que deixou de passagem. Semelhantemente como acontece
quando alguém se eleva de um emprego para outros empregos até a uma
dignidade sobreeminente,e que em seguida olha para trás ou para baixo dele os
empregos pelos quais passou; ou, quando alguém que se aproxima da corte de
um rei, dirige, depois da chegada, seus olhos para os objetos que viu no
caminho. Q ue o Amor do sexo fique e então se torne casto, e entretanto mais
delicioso do que antes para os que estão no Amor verdadeiramente conjugal,
87

pode-se vê-lo nos dois M emoráveis, ns. 44 e 45, pela sua descrição por aqueles
que estão no M undo espiritual.
100 - X I. O M acho e a Fêmea foram criados para ser a Forma mesma do
Casamento do bem e do vero.
É porque o M acho foi criado para ser o Entendimento do vero, assim o V ero
em uma forma, e a Fêmea foi criada para ser a V ontade do bem, assim o Bem
em uma forma,e em um e outro foi implantado, pelos íntimos, uma inclinação
a se conjuntarem em um, veja-se o n. 88; assim os dois fazem uma única
forma,que imita a Forma conjugal do bem e do vero.Diz-se que imita, porque
não é a mesma, mas é semelhante a ela; pois o Bem que se conjunta com o
V ero no homem vem imediatamente do Senhor, mas o Bem da esposa que se
conjunta com o V ero no homem vem mediatamente do Senhor pela esposa é
por isso que há dois Bens, um interno, o outro externo, que se conjuntam com
o V ero no marido; e fazem com que o marido esteja constantemente no
entendimento do vero, e por conseguinte na sabedoria pelo Amor
verdadeiramente conjugal; mas adiante se dirá mais sobre este assunto.
101 - X II. O s dois Esposos são: esta forma nos seus íntimos, e por conseguinte
nas causas que daí derivam,conforme os interiores da sua mente foram abertos.
H á três cousas nas quais consiste todo homem, e que se seguem em ordem
nele,a Alma, a M ente e o Corpo; seu íntimo é a Alma, seu médio é a M ente, e
seu último é o Corpo; tudo o que influi do Senhor no homem influi em seu
íntimo que é a Alma, e desce daí em seu médio, que é a M ente, e por esta no
seu último, que é o Corpo; o Casamento do Bem e do vero influi assim do
Senhor no homem, imediatamente em sua alma, e daí passa para as coisas que
daí derivam, e por estas para os extremos; e assim conjuntas todas as cousas
constituem o Amor Conjugal; segundo a idéia deste influxo, é evidente que os
dois Esposos são esta forma em seus íntimos, e por conseguinte nas coisas que
deles derivam.
102 - M as que os Esposos se tornem essa forma conforme os interiores de sua
mente foram abertos, é porque a M ente é sucessivamente aberta desde a
infância até a velhice mais avançada; pois o homem nasce corporal, e à medida
que a M ente é aberta de mais perto acima do Corporal ele se torna racional; e
do mesmo modo porque este racional é purificado e como que decantado das
ilusões que influem de seus corpos, e das cobiças das seduções da carne, do
mesmo modo é aberto o R acional, e isso se faz unicamente pela sabedoria, e
quando os interiores da mente racional foram abertos, então o homem se torna
uma forma da sabedoria,e esta forma é o receptáculo do amor verdadeiramente
conjugal. A Sabedoria que constitui esta forma, e recebe este amor, é uma
sabedoria racional e ao mesmo tempo uma sabedoria moral; a sabedoria
racional considera os veros e os bens que aparecem interiormente no homem,
não como seus, mas como influindo do Senhor; e a sabedoria moral foge dos
88

males e dos falsos como da lepra, sobretudo as lascividades, que maculam seu
amor conjugal.
103 - Ao que precede acrescentarei dois M emoráveis. Primeiro M emorável:
U ma manhã, antes do nascer do sol, dirigi o olhar para o O riente no M undo
espiritual, e vi quatro Cavaleiros sair, como se voassem, de uma nuvem
brilhante pela chama da aurora; sobre as cabeças dos cavaleiros havia capacetes
com penachos, nos braços como que asas, e em torno do corpo túnicas leves
cor de laranja; assim vestidos como para uma pronta corrida, eles se levantavam
e deixavam agitar as rédeas sobre as crinas dos cavalos, que assim corriam como
se tivessem azas nos pés: segui com a vista a sua corrida ou seu vôo na intenção
de saber onde iam; e eis que três Cavaleiros tomaram a direção de três plagas, a
saber, o Sul, o O cidente e o Setentrião; e o quarto, depois de uma curta
distância ao O riente, se deteve. Admirado disso, olhei para o Céu, e perguntei
onde iam esses Cavaleiros, e recebi esta resposta: "Para os sábios dos R einos da
Europa, que gozam de uma razão sã e de uma grande penetração no exame das
cousas,e tiveram entre os seus uma reputação de gênio, a fim de que venham e
desenvolvam o segredo concernente à O rigem do Amor Conjugal, e sua
V irtude ou Força''. E me disseram do Céu: "Espera um pouco, e verás vinte e
sete Carros, dos quais três ocupados por Espanhóis, três por Franceses ou
G auleses,três por italianos, três por G ermanos ou Alemães, três por B atavos ou
H olandeses, três por Ingleses, três por Suecos, três por Dinamarqueses e três
por Poloneses". E então, depois de uma meia hora, estes Carros foram vistos
puxados por cavalos baios novos elegantemente ajaezados, e se dirigiam com
uma grande velocidade para uma Casa espaçosa que se via nos limites do
O riente e do Sul; chegados perto desta casa, todos os que estavam nos carros
desceram, e entraram com ar resoluto. E então, me foi dito: "V ai e entra
também; e ouvirás". Fui e entrei; e examinando a casa por dentro, vi que era
quadrada; seus lados davam para as quatro Plagas; de cada lado, três altas
janelas com vidraças de cristal, seus Caixilhos em madeira de oliveira; de cada
lado dos caixilhos, Prolongamentos de paredes formando como que câmaras
abobadadas em cima, nas quais havia M esas; as suas Paredes eram de cedro, o
T eto de uma bela madeira odorífera, o Soalho em tacos de choupo; a parede
oriental, onde não se via janelas, estava colocada uma M esa recoberta de ouro,
sobre a qual havia uma T iara toda coberta de pedras preciosas, que devia ser
dada como prêmio ou recompensa àquele que descobrisse por sua investigação
o Segredo que ia ser proposto. Q uando dirigi o olhar para esses
Prolongamentos em forma de câmaras, que eram como G abinetes perto de
janelas, vi em cada um cinco H omens de cada R eino da Europa, que, todos
preparados, esperavam o Assunto que ia ser submetido ao seu julgamento.
Então se apresentou imediatamente um Anjo no meio do Palácio, e disse: “O
assunto submetido ao vosso julgamento será este: Da O rigem do Amor
Conjugal, e de sua V irtude ou Força; examinai-o, e decidi; escrevei a decisão
sobre um papel,metei-o na U rna de prata que vedes colocada perto da M esa de
89

ouro, e dai-lhe por assinatura a letra inicial do R eino de onde sois; assim um F
para os Franceses ou G auleses, um B para os Batavos ou H olandeses, um I para
os Italianos, um A para os Ingleses (Anglais, em francês), um P para os
Poloneses, um G para os G ermanos ou Alemães, um H para os Espanhóis
(H ispani), um D para os Dinamarqueses, e um S para os Suecos". Depois de
ter pronunciado estas palavras o Anjo se retirou, dizendo: "Eu voltarei". E
então os cinco H omens nativos do mesmo país, em cada G abinete perto das
janelas, examinaram a proposição, agitaram-na sob todas as faces; e segundo a
excelência das qualidades de seu julgamento, tomaram uma decisão, a
escreveram sobre um boletim tendo por assinatura a letra inicial, de seu R eino,
e o puseram na U rna de prata. Isso tendo terminado no espaço de três horas, o
Anjo voltou, e tirou da U rna os boletins um após outro, e os leu diante da
Assembléia.
104 - Então sobre o Primeiro Papel que sua mão tomou ao acaso, leu isto:
"N ós cinco,nativos do mesmo país,decidimos em nosso G abinete,que o Amor
Conjugal tira sua O rigem dos Antiqüíssimos do Século de O uro, e que entre
eles provinha da criação de Adão e de sua Esposa; daí vem a O rigem dos
casamentos,e com os casamentos a O rigem do Amor Conjugal. Q uanto ao que
concerne à V irtude ou Força do Amor conjugal,não a derivamos de outra parte
que não seja do clima ou da região do sol, e do calor que ele espalha sobre as
terras; encaramos este assunto não segundo vãs invenções da razão, mas
segundo índices evidentes da experiência; por exemplo, pelos Povos sob a linha
ou círculo equinocial, onde o Calor do dia é como um braseiro; e pelos povos
que estão perto deste Circulo, e os povos que estão mais afastados; e também
pela cooperação do calor solar com o calor vital nos animais da terra e nos
pássaros do céu na estação da primavera durante a prolificação; além disso, o
que é o Amor conjugal, senão um Calor que se torna V irtude ou Força, se o
calor subsidiário o Sol se junta a ele?" Esta decisão trazia em baixo a letra H ,
inicial do R eino de onde eles eram.
105 - Depois disso, ele pôs uma Segunda vez a mão na urna, e tirou um Papel,
onde se lia isto:"N ós, nativos do mesmo pais, concordamos, em nossa Câmara,
que a O rigem do Amor conjugal é a mesma que a origem das Casamentos, que
foram sancionados pelas leis a fim de refrear as cobiças inatas dos homens pelos
adultérios,os quais perdem inteiramente as almas,maculam as razões da mente,
corrompem os costumes, e infectam os corpos de moléstias; pois os adultérios
são atos, não humanos mas de natureza bestial, não racionais mas brutais, e
assim de modo algum cristãos mas bárbaros; é a condenação de tais atos, que
fez a origem dos Casamentos e ao mesmo tempo do Amor Conjugal. Dá-se o
mesmo com a virtude ou Força deste Amor; ela depende da castidade, que
consiste em abster-se de escortações; e isso, porque a V irtude ou Força naquele
que ama só a sua Esposa; é reservada a uma só, e é assim reunida e como que
concentrada; e então se torna nobre como Q uintessência isenta de máculas; de
90

outro modo, seria dispersada e lançada de um lado e de outro. U m dos nossos


cinco, que é sacerdote, acrescentou também a Predestinação como uma causa
desta virtude ou Força dizendo: O s Casamentos não são predestinados? E visto
que o são, as Prolificações que deles provêem, e as Eficácias para estas
prolificações, não são também predestinadas? Ele insistiu para que se
acrescentasse esta causa, porque afirmou com juramento a predestinação". Esta
decisão trazia em baixo a letra B. Alguém, ouvindo isso, disse sorrindo: “A
Predestinação!Ó que bela apologia da fraqueza ou da impotência!”
106 - Depois, pela T erceira vez, ele tirou da urna um papel sobre o qual leu:
"N ós, nativos do mesmo país, examinamos em nossa Célula as causas da
origem do Amor conjugal, e vimos que a causa principal é a mesma da origem
do Casamento, porque este Amor não teve existência antes; e o fundamento de
sua existência, é que, quando alguém ama apaixonadamente uma donzela, quer
com a alma e o coração possuí-la como uma propriedade digna de ser amada
acima de todas as cousas; e que, desde que ela se torna sua noiva, ele a
considera como uma outra ele mesmo:que esteja aí a origem do amor conjugal,
isso é evidente pelo furor de cada homem contra seus rivais, e pelo ciúme
contra os escortadores. Examinamos em seguida a origem da virtude ou força
deste amor, e três contra dois decidiram que a virtude ou força com a esposa
vem de alguma licença com o sexo; disseram saber por experiência, que a força
do amor do sexo ultrapassa a força do Amor conjugal". H avia em baixo a letra
I. Desde que se ouviu isto, exclamaram das M esas: "R ejeitai esse papel, e tirai
da urna um outro boletim".
107 - E no mesmo instante ele tirou um Q uarto, sobre o qual leu isto: "N ós,
nativos do mesmo país, sob a nossa Janela decidimos que a origem do Amor
conjugal e do amor do sexo é a mesma, porque aquele vem deste; que somente
o amor de sexo é ilimitado, indeterminado, dissoluto, indistinto e mutável,
enquanto que o Amor conjugal é limitado, determinado, fixo, regular e
constante; e que este amor foi, por isto, sancionado e estabelecido pela
prudência da sabedoria humana; pois de outro modo não haveria nem império,
nem reino, nem república, nem mesmo uma sociedade, mas os homens
andariam errantes por bandos nos campos e nas florestas com prostitutas e
mulheres raptadas, e fugiriam de refúgio em refúgio para evitar carnificinas
sangrentas, violências e rapinas pelas quais todo o gênero humano correria para
sua destruição; é esse o nosso julgamento sobre a origem do Amor conjugal.
Q uanto a virtude ou força conjugal, nós a deduzimos da saúde do corpo
continuamente persistente desde o nascimento até à velhice; pois o homem
dotado de boa constituição e gozando de uma saúde vigorosa nada perde de sua
força; suas fibras, seus nervos, seus músculos não se entorpecem, mas
permanecem no vigor de suas forças; passem bem".H avia em baixo a letra A.
108 - N a Q uinta vez ele tirou da urna um papel, sobre o qual leu isto: "N ós,
nativos do mesmo país, junto de nossa M esa, examinamos segundo a
91

racionalidade de nosso mental a origem do Amor conjugal e a origem de sua


virtude ou força; e, depois de ter considerado as razões em todos os sentidos,
vimos e confirmamos, que a origem do Amor conjugal não é outra senão esta:
T odo homem, por excitamento e móveis escondidos no lugar mais secreto de
sua mente e de seu corpo, após diversas cobiças de seus olhos, dirige enfim sua
atenção e sua inclinação para uma única mulher do sexo, a ponto de arder
inteiramente por ela; desde esse momento seu calor se inflama cada vez mais,
até tornar-se um incêndio; nesse estado o desejo libidinoso do sexo é expulso, e
o amor conjugal toma seu lugar: o jovem noivo nesse incêndio não sabe outra
cousa, senão que a virtude ou força desse amor jamais cessará, pois falta-lhe
experiência, e por conseqüência conhecimento, concernente ao estado de
enfraquecimento das forças,e também do esfriamento do amor após as delícias;
a origem do Amor conjugal vem portanto deste primeiro ardor anterior às
núpcias; e deste ardor vem sua virtude ou força mas, depois das núpcias, esta
virtude ou força muda suas chamas, depois também diminui e aumenta, mas
continua sempre com mudanças regulares, ou com diminuição e aumento, até
à velhice, por meio da moderação que dita a prudência, e da repressão dos
desejos libidinosos que se lançam dos esconderijos ainda não limpos da mente;
pois o desejo libidinoso marcha antes da sabedoria; é o nosso julgamento sobre
a origem e sobre a continuação da virtude ou força conjugal". Em baixo a letra
P.
109 - N a Sexta vez ele tirou um papel sobre o qual leu isto: "N ós, nativos do
mesmo país, em nossa R eunião, examinamos em todos os sentidos as causas de
origem do Amor conjugal, e chegamos ao acordo sobre duas causas, das quais
uma é a boa educação das crianças, e outra é a posse distinta das heranças; nós
nos decidimos por estas duas,porque elas tendem e visam ao mesmo fim, que é
o Bem público; e este fim é atingido, porque as crianças, concebidas e nascidas
de um amor conjugal, são propriamente e verdadeiramente filhos de dois
esposos, e pelo amor da prole, exaltado pela consideração de sua origem
legítima, eles são criados como herdeiros de todas as posses tanto espirituais
como naturais de seus pais; que o Bem público seja fundado sobre a boa
educação dos filhos e sobre a posse distinta das heranças, é o que vê a razão. H á
o Amor do sexo, e há o Amor conjugal, este parece ser um com aquele, mas é
distintamente diferente; eles não estão também um perto do outro, mas um
está dentro do outro, e o que está dentro é mais nobre do que o que está por
fora; e nós vemos que o Amor conjugal por criação está por dentro, e está
escondido no amor do sexo, absolutamente como uma amêndoa dentro de sua
casca; é por isso que, quando o Amor conjugal é tirado de sua casca, que é o
amor do sexo, ele brilha diante dos Anjos como uma pedra preciosa, um B erilo
e um Astróite; isto acontece, porque no Amor conjugal foi inscrita a Salvação
de todo G ênero H umano,salvação que entendemos,pelo Bem público; é esse o
nosso julgamento sobre a origem deste Amor. Q uanto à origem de sua V irtude
ou Força, depois de ter examinado suas causas, concluímos que é o
92

desenvolvimento e a separação do Amor conjugal do amor do sexo, o que é


feito pela sabedoria da parte do marido, e pelo amor da sabedoria do marido da
parte da esposa; com efeito, o amor do sexo é comum ao homem e as bestas,
mas o Amor conjugal é peculiar aos homens; é por isso que, quanto mais o
Amor conjugal é desenvolvido e separado do amor do sexo, tanto mais o
homem é homem, e não uma besta; e o homem adquire a virtude ou Força,
segundo seu amor,e a besta pelo seu".Em baixo estava a letra G .
110 - N a Sétima vez ele tirou um papel no qual leu isto: N ós, nativos do
mesmo país, na Câmara sob a luz de nossa janela, alegramos os nossos
pensamentos e por conseguinte os nossos julgamentos por uma meditação sobre
o Amor conjugal; quem é que não se alegra com isso? Pois quando este amor
está na mente, está ao mesmo tempo em todo o corpo. N ós julgamos da
O rigem deste amor pelos seus prazeres; quem é que conhece ou jamais
conheceu o traço de algum amor, se não for pelo prazer e a volúpia que ele dá?
O s prazeres do Amor conjugal, em suas origens, são sentidos como beatitudes
satisfações e felicidades; depois, em suas derivações, como encantos e volúpias;
e, nos últimos, como delícia das delícias. H á portanto origem do amor do sexo,
quando os interiores da mente, e por conseguinte os interiores do corpo, são
abertos pelo influxo destes prazeres; mas havia origem do Amor conjugal,
quando por causa dos esponsais a esfera primitiva deste amor apresentava por
antecipação na idéia estes prazeres. Q uanto ao que concerne à V irtude ou
Força, deste amor, ela vem de que este amor com sua veia passa da mente ao
corpo; pois a mente, pela cabeça, está no corpo quando sente e age, sobretudo
quando goza as delícias deste amor, nós, por isso, julgamos dos graus de sua
Força,e das constâncias de suas alternativas.Além disso, deduzimos também da
raça a V irtude da Força, se é nobre no pai, ela se torna nobre também por
transmissão (per traducem) nos descendentes; que esta nobreza seja transmitida
por geração, hereditariedade e sucessão, é o que está de acordo com a razão
apoiada pela experiência".Em baixo a letra F.
111 - N a O itava vez, saiu um papel sobre o qual ele leu isto: "N ós, nativos do
mesmo país, em nossa R eunião, não achamos a origem mesma do Amor
conjugal, porque está inteiramente escondida nos santuários da mente; a mais
consumada sabedoria não pode mesmo por algum raio do entendimento atingir
este amor em sua origem; formamos muitas conjecturas, mas depois de ter em
vão discutido sutilezas, não sabemos se fizemos as nossas conjecturas sobre
quimeras ou sobre cousas judiciosas: aquele portanto que quer tirar dos
santuários da mente a origem deste amor, e a pôr diante de si, que vá a Delfos.
N ós contemplamos este amor abaixo de sua origem,e vimos que ele é espiritual
nas mentes, e que aí é como a fonte de uma veia doce, e corre daí para o peito,
onde se torna delicioso, e é chamado amor peitoral, o qual, considerado em si
mesmo, é cheio de amizade e cheio de confiança, por causa de sua plena
inclinação à mutualidade; e que, quando passa além do peito, torna-se um
93

amor de prazeres. Estas cousas e outras semelhantes, quando um mancebo as


rola em seu pensamento,o que ele faz quando deseja ardentemente para si uma
pessoa do sexo, acendem em seu coração o fogo do amor conjugal; este fogo,
porque é o fogo primitivo deste amor, é a sua origem. Q uanto à origem de sua
V irtude ou força, não conhecemos outra que não seja este amor mesmo, pois
este amor e sua força, são companheiros inseparáveis, mas, entretanto de tal
modo que ora é um que precede e ora é o outro; quando o amor precede e a
virtude ou força,o segue,um e outro é nobre,porque a força, então é a virtude
do amor conjugal; mas se a força, precede e o amor segue, então um e outro
são ignóbeis, porque o amor então pertence à força, carnal; nós portanto,
julgamos da qualidade de um e de outro, pela ordem na qual o amor desce ou
sobe, e assim avança de sua origem para seu objetivo". Em baixo estava a letra
D.
112 - Em último lugar, ou na N ona vez, ele tomou o papel sobre o qual leu
isto: "N ós, nativos do mesmo país, em nosso Comitê, exercemos nosso
julgamento sobre os dois assuntos propostos, a saber, sobre a O rigem do Amor
conjugal, e sobre a O rigem de sua virtude ou força. Q uando discutimos as
cousas sutis que concernem à origem do amor conjugal,para evitar obscuridade
nos raciocínios, distinguimos o amor do sexo em espiritual, natural e carnal;
pelo amor espiritual do sexo entendemos o Amor verdadeiramente conjugal,
porque este amor é espiritual; pelo amor natural do sexo entendemos o amor
poligâmico, porque este é natural; e pelo amor inteiramente carnal do sexo
entendemos o amor escortatório, porque este é inteiramente carnal. Q uando
examinamos com o nosso julgamento o amor verdadeiramente conjugal, vimos
claramente que este amor existe entre um único homem e uma única mulher, e
que por criação ele é celeste, íntimo, além disso é também a alma e o pai de
todos os bons amores, tendo sido inspirado a nossos Primeiros Pais, e podendo
ser inspirado aos Cristãos; ele é de tal modo conjuntivo, que por ele duas M en-
tes podem tornar-se uma única M ente, e dois H omens (H omines), (a saber,
um homem e uma mulher) podem tornar-se como um único H omem (H omo),
o que é entendido por tornar-se uma única Carne. Q ue por criação este Amor
tenha sido inspirado,isso é evidente por estas palavras no Livro da Criação: E o
homem deixará seu pai e sua mãe e se ligará a sua esposa,e eles serão uma só
Carne. (G en. 11, 24). Q ue ele possa ser inspirado aos Cristãos, vê se
claramente por estas palavras: "Jesus disse: N ão lestes que Aquele que (os fez)
no começo macho e fêmea os fez, e disse: Por causa disso o homem deixará seu
pai e sua mãe, e se ligará à sua esposa, e os dois estarão em uma só carne; por
isso não são mais dois, mas uma só "Carne". (M ar. X IX , 4, 5, 6). Eis o que
concerne à origem do amor conjugal. Q uanto à origem da V irtude ou força do
amor verdadeiramente conjugal, nós presumimos que ela vem da semelhança
das mentes, e da unanimidade; pois quando duas mentes são conjugalmente
conjuntos, seus pensamentos então se dão um ao outro espiritualmente beijos,
94

e estes inspiram ao corpo a sua virtude e força''.Em baixo a letra S.


113 - Por trás de uma Separação oblonga no Palácio, elevada diante das portas,
se mantinham de pé estrangeiros da Á frica,que gritaram aos nativos da Europa:
"Permiti que algum de nós
exponha também seu sentimento sobre a O rigem do Amor Conjugal, e sobre
sua V irtude ou força''. E todas as M esas fizeram sinal com as mãos que isso era
permitido; e então um deles entrou e se colocou perto da M esa sobre a qual
tinha sido posta a T iara; e disse: "V ós, Cristãos, deduzis do Amor mesmo a
origem do Amor Conjugal; mas nós, Africanos, nós a deduzimos do Deus do
Céu e da T erra; não é o Amor Conjugal um Amor casto, puro e santo? N ão
estão os Anjos do Céu nesse Amor? O G ênero H umano, inteiro, e por
conseguinte o Céu Angélico, inteiro, não são a Semente deste Amor? U ma
cousa tão sobreeminente pode tirar sua existência de outra parte que N ão seja
de Deus M esmo, Criador e Conservador do U niverso? V ós, Cristãos deduzis a
V irtude ou força conjugal de diversas causas racionais e naturais; mas nós,
Africanos, a deduzimos do estado de conjunção do homem com o Deus do
U niverso; este estado,nós o chamamos o estado da R eligião; mas vós o chamais
o estado da Igreja; portanto, desde que o Amor vem deste estado, e é estável e
perpétuo, não pode deixar de operar sua virtude, que é semelhante a ele, e por
conseqüência, do mesmo modo estável e perpétuo. O Amor verdadeiramente
conjugal só é conhecido de um pequeno número de pessoas, que estão
próximas de Deus, e por conseguinte a força deste amor não é conhecida dos
outros; esta força com este amor, é descrito pelos Anjos nos Céus como a
delícia de uma primavera perpétua.
114 - Q uando eles pronunciaram estas palavras, todos se levantaram; e eis que
por trás da M esa de ouro, sobre a qual estava a T iara, apareceu uma Janela que
antes não tinha sido vista, e através da janela foi ouvida uma voz: "A T iara será
para o Africano". E o Anjo lha pôs na mão, mas não sobre a cabeça; e ele se foi
com a tiara para sua casa; e os habitantes dos R einos da Europa tendo saldo,
subiram para seus Carros,e voltaram para suas sociedades respectivas.
115 - Segundo M emorável: T endo sido despertado de meu sono no meio da
noite, vi a uma certa altura para o O riente um Anjo tendo na mão direita um
Papel que, pela luz do Sol, aparecia de uma brancura resplandecente; havia no
meio uma Escritura em letras de ouro; e eu vi escrito: Casamento do Bem e do
V ero; da Escritura sala um esplendor que formava um grande círculo em torno
do Papel; este círculo ou contorno apareceu em seguida como aparece a aurora
na estação da primavera. Depois disso, vi o Anjo descer com o Papel na M ão, e
a medida que descia, o Papel aparecia cada vez menos brilhante, e esta
Escritura, a saber: Casamento do Bem e do V ero, aparecia mudada da cor de
ouro para cor de prata,em seguida para cor de bronze,depois para cor de ferro,
enfim para cor de ferrugem de ferro e ferrugem de bronze; e enfim vi o Anjo
entrar em uma N uvem obscura, e chegar através da N uvem sobre a T erra; e aí
95

embora esse Papel ainda estivesse na mão do Anjo, eu não o vi; isso se passava
no M undo dos espíritos, no qual chegam primeiro todos os homens depois da
morte; e então o Anjo me falou dizendo: "Pergunta aos que vêm aqui, se me
vêem, ou se vêem alguma cousa na minha mão": V eio uma multidão de
espíritos,uns do oriente outros do sul,outros do ocidente,outros do setentrião,
e perguntei aos que vinham do O riente e do Sul, eram os que no M undo se
tinham dedicado à erudição, se viam alguém perto de mim, e se viam alguma
cousa em sua mão; todos disseram que não viam cousa alguma absolutamente;
em seguida fiz a mesma pergunta aos que vinham do O cidente e do Setentrião,
eram os que no M undo tinham acreditado nas palavras dos eruditos, disseram
que também nada viam; entretanto os últimos dentre eles, que no mundo
tinham estado na fé simples pela caridade, ou em algum vero pelo bem, depois
que os primeiros se retiraram, disseram que viam um H omem com um Papel,
o H omem vestido elegantemente, e o Papel com letras traçadas em cima; e
quando aproximaram os olhos, disseram que liam Casamento do Bem e do
V ero; e se dirigiram ao Anjo,pedindo-lhe para dizer o que isso significava; e ele
disse: "T odas as cousas que existem no Céu inteiro, e todas as que existem no
M undo inteiro,não são mais que o Casamento do bem e do vero, porque todas
e cada uma delas, tanto as que vivem e são animadas, como as que não vivem e
não são animadas foram criadas do Casamento do bem e do vero e por este
Casamento; não existe cousa alguma criada pelo V ero só, nem pelo Bem só, o
bem só ou o vero só nada é, mas pelo Casamento eles existem e se tornam
alguma cousa tal como é um casamento. N o Senhor Deus Criador o Divino
Bem e o Divino V ero estão em sua Substância mesma, o Ser da Substância de
Deus é o Divino Bem, e o Existir da Substância de Deus é o Divino V ero;
n'Ele também eles estão em sua U nião mesma, pois n'Ele fazem um de uma
maneira infinita; como estes dois são um, no Deus Criador M esmo, por isso
eles são também um em todas e cada uma das cousas criadas por Ele; por isso
também o Criador está conjunto com todas as Suas criaturas por uma aliança
eterna como por uma aliança de Casamento". Além disso, o Anjo disse: "A
Escritura Santa,que procede imediatamente do Senhor,é no comum e na parte
o Casamento do bem e do vero; e como a Igreja que é formada pelo V ero da
Doutrina, e a R eligião que é formada pelo Bem da vida segundo o V ero da
Doutrina,são, nos Cristãos, tirados unicamente da Escritura Santa, pode-se ver
que a Igreja no comum e na parte é o Casamento do Bem e do V ero". Q ue isso
seja assim, vê-se no Apocalipse R evelado, ns. 373, 483. - O que acima foi dito
do Bem e do V ero, foi dito também para o Casamento da Caridade e da Fé,
porque o Bem pertence à Caridade, e o V ero pertence à Fé. Alguns dos
primeiros que não tinham visto o Anjo nem a Escritura, estando ainda
presentes e ouvindo estas palavras, disseram a meia voz: "Sim, nós
compreendemos isso". M as então o Anjo lhes disse: "Afastai-vos um pouco de
mim,e dizei a mesma coisa''. E eles se afastaram, e disseram a plena voz: "N ão,
isso não é assim". Em seguida o Anjo falou do Casamento do B em e do V ero
96

nos Esposos, dizendo: Se suas M entes estiveram nesse Casamento, o M arido


sendo o V ero e a Esposa o Bem desse V ero, os dois estarão nas delícias da
beatitude da inocência, e por conseguinte na felicidade em que estão os Anjos
do Céu; neste estado o prolífico do M arido estará em uma primavera continua
e por conseguinte no esforço e na virtude de propagar seu vero, e a esposa
estará em uma recepção contínua deste vero pelo amor; a sabedoria, que nos
maridos vem do Senhor, nada sente de mais agradável do que propagar seus
veros; e o amor da sabedoria, que nas esposas vem do Senhor, nada sente de
mais delicioso do que recebê-los como em um útero, e assim concebê-los,
carregá-los e lhes dar nascimento; as prolificações espirituais entre os Anjos do
Céu são desta espécie, e se o quiserdes crer, desta origem são também as
Prolificações naturais". O Anjo, depois de dar a saudação de paz, elevou-se da
terra, e levado através das nuvens subiu ao Céu; e eis que então o Círculo, que
antes tinha aparecido como a aurora, abaixou-se e dissipou a N uvem que tinha
espalhado trevas sobre a T erra,e o tempo se tornou claro e sereno.
97

Do casamento do Senhor e da
igreja e de sua correspondência

116 - Se aqui se trata também do Casamento do Senhor e da Igreja e de sua


Correspondência, é porque sem a ciência e sem a inteligência concernentes a
este assunto dificilmente haverá alguém que possa saber que o Amor Conjugal
em sua origem é santo, espiritual e celeste, e que vem do Senhor. É verdade
que na Igreja alguns dizem que os Casamentos têm uma relação com o
Casamento do Senhor e da Igreja,mas qual seja essa relação,se Ignora; a fim de
que, portanto, ela se apresente à vista em alguma luz do entendimento, é
necessário que se trate em particular deste Santo Casamento, que está entre
aqueles e naqueles que são da Igreja do Senhor; é também entre eles e não entre
outros que há o Amor verdadeiramente conjugal. M as para elucidação deste
Arcano, o assunto será dividido nos artigos seguintes: I. O Senhor na Palavra é
chamado o N oivo e o M arido, e a Igreja a N oiva e a Esposa; além disso, a
conjunção do Senhor com a Igreja, e a conjunção recíproca da Igreja com o
Senhor, é chamada Casamento. II. Além disso o Senhor também é chamado
Pai, e a Igreja M ãe. III. As descendências do Senhor como M arido e Pai e da
Igreja como Esposa e M ãe, são todas espirituais, e no sentido espiritual da
Palavra são entendidas por filhos e filhas, irmãos e irmãs, genros e noras, e
pelos nomes relativos a geração. IV . As descendências espirituais, que nascem
do Casamento do Senhor com a Igreja, são os V eros de que procedem o
entendimento, a percepção e todo pensamento, e os Bens de que procedem o
amor, a caridade e toda afeição. V . Do casamento do bem e do vero, que
procede do Senhor e influi, o homem recebe o vero, e o Senhor conjunta o
bem a esse vero, e é assim que a Igreja é formada pelo Senhor no homem. V I.
O marido não representa o Senhor e a Esposa não representa a Igreja, porque
os dois em conjunto,o marido e a Esposa constituem a Igreja.V II.Por isso não
há correspondência do marido com o Senhor, nem da Esposa com a Igreja, nos
Casamentos dos Anjos nos Céus e dos homens nas terras. V III. M as há
Correspondência com o Amor conjugal, a seminação, a prolificação, o amor
dos filhos, e outras cousas semelhantes que estão nos Casamentos, e que deles
procedem.IX .A Palavra é o médium de conjunção,porque ela vem do Senhor,
e é assim o Senhor.X .A Igreja vem do Senhor,e está naqueles que se dirigem a
Ele e vivem segundo Seus preceitos. X I. O Amor conjugal é segundo o estado
da Igreja, porque é segundo o estado da sabedoria no homem. X II. E como a
Igreja vem do Senhor, o Amor conjugal vem também d'Ele. Segue agora a
explicação destes Artigos.
98

117 - I. O Senhor na Palavra é chamado N oivo e M arido, e a Igreja N oiva e


Esposa; além disso, a conjunção do Senhor com a Igreja, e a conjunção
recíproca da Igreja com o Senhor é chamada Casamento.
Q ue o Senhor na Palavra seja chamado N oivo e M arido, e a Igreja N oiva e
Esposa; pode-se ver por estas passagens: "Aquele que tem a N oiva, N oivo é;
mas o amigo do N oivo,que permanece de pé e escuta,de alegria se regozija por
causa da voz do N oivo". (João 111, 29); estas palavras foram ditas do Senhor
por João Batista". Jesus disse: "Enquanto está com eles o N oivo, os Filhos das
N úpcias não podem jejuar; mas dias virão em que o N oivo lhes será tirado,
então jejuarão". (M at. IX , 15; M arc. 11, 19, 20; Lucas V , 34 e 35). "Eu vi a
Cidade Santa, a N ova Jerusalém, enfeitada como uma Esposa; ornada para seu
M arido". (Apoc. X X I, 2); que pela N ova Jerusalém seja entendida a N ova
Igreja do Senhor, vê-se no Apocalipse R evelado, ns. 880, 881. “O Anjo disse a
João: V em, eu te mostrarei a N oiva, do Cordeiro a Esposa; e ele lhe mostrou a
Cidade, a Santa Jerusalém". (Apoc. X X I, 9, 10). "É vindo o tempo de N úpcias
do Cordeiro, e sua Esposa; se preparou; bem-aventurados aqueles que à ceia de
N úpcias do Cordeiro foram convidados". (Apoc. X IX , 7, 9). Pelo N oivo, ao
encontro do qual vieram as cinco V irgens preparadas, que entraram com Ele na
sala de N úpcias. (M at. X X V , 1 a 10), é entendido, o Senhor, como é evidente
pelo vers. 13, onde se diz: "V elai, portanto, porque não sabeis o dia, nem a
hora em que o Filho do homem virá". E além disso, em muitas passagens dos
Profetas.
118 - II.Além disso o Senhor também é chamado Pai,e a Igreja M ãe.
Q ue o Senhor é chamado Pai, vê-se por estas passagens: "U m menino nos
nasceu, um Filho nos foi dado, e será chamado seu nome: Admirável,
Conselheiro, Deus, Pai de Eternidade, Príncipe da Paz". (Isaías IX , 5). "T u,
Jehovah, N osso Pai, N osso R edentor desde o século (é) teu N ome". (Isaías
LX III,16)."Jesus disse:Q uem me vê,vê o Pai que me enviou".(João X II, 45).
"Se M e tivésseis conhecido, meu Pai também conheceríeis, e desde agora O
tendes conhecido, e O tendes visto". (João X IV , 7). "Filipe disse: M ostra-nos o
Pai; Jesus lhe disse: Q uem M e vê, vê o Pai; como portanto, dizes tu;
mostra-nos o Pai?" (João X IV , 8, 9). "Jesus disse: O Pai e eu, nós somos um".
(João X , 30). "T odas as cousas que o Pai tem, são minhas". (João X V I, 15,
X V II, 10). "O Pai está em M im, e Eu no Pai. (João X , 38, X IV , 10, 11, 20).
Q ue o Senhor e Seu Pai são um, como a Alma e o Corpo são um; e que Deus,
o Pai, tenha descido do Céu, e tenha tomado o H umano para resgatar e salvar
os homens, e que Seu H umano seja o que é chamado o Filho enviado ao
M undo,é o que foi plenamente mostrado no Apocalipse R evelado.
119 - Q ue a Igreja seja chamada M ãe,vê-se por estas passagens: "Jehovah disse:
Pleiteai com vossa M ãe; ela não é minha Esposa, e Eu não sou seu M arido".
(O se. 11, 2, 5). "T u és a filha de tua M ãe, que desdenha seu M arido".
(Ezequiel X V I, 45). "O nde está a carta de divórcio de vossa M ãe, que eu
99

repudiei?" (Isaías L, 1). "T ua M ãe, como a cepa plantada perto das águas,
tornou-se carregada de frutos". (Ezequiel X IX , 10); estas passagens concernem
à Igreja Judaica."Jesus,estendendo a mão para os discípulos, disse: M inha M ãe
e meus irmãos são os que ouvem a Palavra de Deus, e a fazem". (Lucas V III,
21, M at. X II, 48, 49; M arcos 111, 33, 34, 35); pelos discípulos do Senhor é
entendida a Igreja. "Perto da cruz de Jesus, estava sua M ãe; e Jesus vendo sua
M ãe, e perto dela o discípulo que Ele amava, disse à sua M ãe: M ulher, eis teu
filho; e disse ao discípulo: Eis tua M ãe, por isso desde aquela hora, este
discípulo a tomou em sua casa". (João X IX , 25, 26, 27), por estas palavras é
entendido que o Senhor não reconheceu M aria por M ãe, mas a Igreja, é por
isso que Ele a chama M ulher e M ãe do discípulo; se Ele a chamou M ãe deste
discípulo ou de João é porque João representava a Igreja quanto aos bens da
caridade; estes bens são a Igreja no efeito mesmo, é por isso que se diz que ele a
tomou em sua casa. Q ue Pedro tenha representado a verdade e a Fé, e T iago a
Caridade, e João as O bras da Caridade, vê-se no Apocalipse R evelado, ns. 5, 6,
790, 798, 819; e que os doze Discípulos tenham representado em conjunto a
Igreja quanto a todas as cousas que a concernem,ns.233,790,903,915.
120 - III. As descendências do Senhor como M arido e Pai, e da Igreja como
Esposa e M ãe, são todas espirituais, e no sentido espiritual da Palavra, elas são
entendidas por filhos e filhas, irmãos e irmãs, genros e noras, e por outros
nomes relativos à geração.
Q ue não nasça outras descendências do Senhor pela Igreja, isso não tem
necessidade de demonstração, porque a razão o vê suficientemente, com efeito,
é do Senhor que procede todo bem e todo V ero, e é a Igreja que os recebe e os
põe em efeito; e todos os espirituais do Céu e da Igreja se referem ao bem e ao
vero; daí resulta que pelos Filhos e Filhas na Palavra, em & eu sentido
espiritual, entende-se os veros e os bens, pelos filhos os veros concebidos no
homem Espiritual e nascidos no homem N atural, e pelas filhas
semelhantemente os bens; é por isso que, os que foram regenerados pelo
Senhor são chamados, na Palavra, filhos de Deus, filhos do R eino, nascidos
d'Ele; e o Senhor chamou de filhos aos Seus discípulos; pelo filho homem que
a M ulher deu à luz, e que foi levado para Deus, (Apoc. X II, 5), não é
entendida, outra cousa, ver o Apocalipse R evelado, n. 543. Como pelas filhas
são significados os bens da Igreja, é por isso que na Palavra se diz tantas vezes a
Filha de Sião, de Jerusalém, de Israel e de Jehudah, pela qual é significado, não
alguma filha, mas a afeição do bem, afeição que pertence à Igreja, ver também
o Apocalipse R evelado, n. 612. O Senhor também chama Irmãos e Irmãs aos
que são de Sua Igreja, (M at. X II, 49; X X V , 40; X X V III, 10; M arc. 111, 35;
Lucas V III,21).
121 - IV . As descendências espirituais que nascem do Casamento do Senhor
com a Igreja, são os V eros de que procedem o entendimento, a percepção e
todo pensamento, e os Bens de que procedem o amor, a caridade e toda
100

afeição.
Q ue os V eros e os Bens sejam as descendências espirituais que nascem do
Senhor pela Igreja, é porque o Senhor é o Bem mesmo e o V ero mesmo, e
n'Ele este bem e este vero são não dois mas um; além disso também, porque do
Senhor não pode proceder outra cousa que não seja o que está n'Ele e o que é
Ele M esmo. Q ue o Casamento do bem e do vero procede do Senhor, e influi
nos homens, e seja recebido segundo o estado da mente e da vida daqueles que
estão na Igreja, é o que foi mostrado na seção precedente concernente ao
Casamento do Bem e do V ero.Se o homem tem pelos V eros o entendimento,a
percepção e todo pensamento e pelos Bens o amor, a caridade e toda afeição, é
porque todas as cousas do homem se referem ao V ero e ao B em; ora há no
homem duas cousas que o constituem, a V ontade e o Entendimento, e a
V ontade é o receptáculo do bem, e o Entendimento é o receptáculo do vero;
que os próprios da V ontade sejam o amor, a caridade e a afeição, e os próprios
do Entendimento a percepção e o pensamento, isso não tem necessidade de
uma demonstração, porque a luz está nesta proposição pelo próprio
entendimento.
122 - V . Do Casamento do bem e do vero, que procede do Senhor e influi, o
homem recebe o vero, e o Senhor conjunta o bem a esse vero; e é assim que a
Igreja é formada pelo Senhor no homem.
Q ue do bem e do vero que procedem como um do Senhor, o homem recebe o
vero,é porque ele o recebe como vindo dele,e do mesmo modo fala dele; e isso
acontece porque o vero está na luz do entendimento, e por conseguinte ele o
vê, e tudo que ele vê em si ou em sua mente, não sabe de onde vem, pois não
vê o influxo como vê as cousas que caem sob à vista do olho; dai ele imagina
que o vero está nele.Foi dado ao homem pelo Senhor,que isso apareça assim, a
fim de que ele seja homem, e a fim de que haja para ele um recíproco de
conjunção; acrescentasse a isso que o homem nasce com a Faculdade de saber,
de compreender e de se tornar sábio; e esta Faculdade recebe os veros pelos
quais ele tem a ciência, a inteligência e a sabedoria; e como a fêmea foi criada
por meio do vero do macho, e é formada para ser cada vez mais amor deste
vero depois do casamento, segue-se que esta também recebe o vero do marido
nela,e o conjunta com seu bem.
123 - Se o Senhor adjunta e conjunta o bem aos veros que o homem recebe, é
porque o homem não pode tomar o bem como por si mesmo,pois o bem não é
visível para ele,por esta razão que ele pertence não à luz,mas ao calor, e o calor
é sentido mas não é visto; é por isso que, quando o homem vê o vero em seu
pensamento ele reflete raramente sobre o bem, que influi do amor da vontade
no vero, e lhe dá a vida. A Esposa também não reflete sobre o bem que está
nela, mas reflete sobre a inclinação do M arido a seu respeito, a qual é segundo
a elevação do entendimento do marido para a sabedoria; o bem que está nela
pelo Senhor, ela o aplica sem que o marido saiba alguma cousa dessa aplicação.
101

Daí se manifesta agora esta verdade, que o homem recebe do Senhor o vero, e
que o Senhor adjunta o bem a esse vero, segundo a aplicação do vero ao uso,
assim à medida que o homem quer pensar sabiamente, e, por conseguinte viver
sabiamente.
124 - Se a Igreja, é assim formada pelo Senhor no homem, é por que então o
homem está em conjunção com o Senhor, no Bem pelo Senhor, no V ero como
por si mesmo; assim o homem está no Senhor, e o Senhor está nele, segundo as
palavras do Senhor em João X V , 4, 5. É o mesmo se em lugar do Bem se disser
a Caridade,e em lugar do V ero a Fé.
125 - V I. O M arido não representa o Senhor, e a Esposa não representa a
Igreja,porque os dois em conjunto,o M arido e sua Esposa constituem a Igreja.
A linguagem ordinária dentro da Igreja, é que, como o Senhor é o chefe da
Igreja, do mesmo modo o M arido é o Chefe da Esposa resultaria daí que o
M arido representa o Senhor, e a Esposa a Igreja; mas o Senhor é o chefe da
Igreja, e o homem (H omo), varão (vir) e a M ulher (femina), são a Igreja, e
mais ainda o M arido e a Esposa juntos; neles a Igreja é o princípio implantado
no homem, e por meio do homem na esposa, porque o homem pelo
entendimento recebe o vero da Igreja, e a esposa o recebe do homem; mas se
isso acontece vice-versa, não é conforme a ordem; às vezes, entretanto, isso
acontece,mas em homens que não são amantes da sabedoria, e por conseguinte
não são também da Igreja, e também naqueles que, como escravos, dependem
dos caprichos de suas esposas. Sobre este assunto, ver algumas particularidades
nos Preliminares,n.21.
126 - V II. Por isso não há correspondência do marido com o Senhor, nem da
esposa com a Igreja, nos Casamentos dos Anjos nos Céus e dos homens nas
terras.
Isto resulta como conseqüência do que acaba de ser dito; entretanto deve-se
acrescentar, que parece que o vero seja o principal da Igreja, porque é o
primeiro pelo tempo; é por esta aparência que os Prelados da Igreja deram a
palma à fé, que pertence ao vero, de preferência à Caridade que pertence ao
bem; do mesmo modo os Eruditos a deram ao pensamento, que pertence ao
entendimento,de preferência à afeição que pertence à vontade; é por isso que o
conhecimento do que é o bem da caridade, e do que é a afeição da vontade,
está escondido, como que sepultado em um túmulo, e alguns mesmo lançaram
terra em cima como sobre os mortos, a fim de que não se levante; que
entretanto o bem da caridade seja o principal da Igreja, é o que podem ver com
os olhos abertos, aqueles que não fecharam o caminho do Céu a seu
entendimento confirmando-se a respeito da fé, que só ela constitui a Igreja, e a
respeito do pensamento, que só ele constitui o homem. O ra, pois que o Bem
da caridade vem do Senhor, e que o V ero da fé está no homem como vindo
dele, e que os dois fazem a conjunção do Senhor com o homem e do homem
102

com o Senhor, tal como é entendida por estas palavras do Senhor, que Ele está
neles e eles n'Ele (João X V ,4,5),é evidente que esta conjunção é a Igreja.
127 - V III. M as há correspondência com o Amor conjugal, a seminação, o
amor dos filhos, e outras cousas semelhantes que estão nos Casamentos, e que
deles procedem. Estas cousas, todavia, são Arcanos demasiados profundos para
poderem entrar no entendimento com alguma luz, a não ser que sejam
precedidos de um conhecimento da Correspondência; se a Correspondência
não é desvendada ao entendimento, é impossível que as cousas que estão neste
Artigo sejam compreendidas de qualquer maneira que sejam explicadas. M as o
que é a Correspondência, e que haja correspondência entre as cousas naturais e
as cousas espirituais,é o que foi amplamente mostrado no Apocalipse R evelado,
e também nos Arcanos Celestes, e especialmente na Doutrina da N ova
Jerusalém sobre a Escritura Santa, e particularmente em um M emorável que a
concerne, e que se encontra mais adiante. Antes que se tenha obtido algum
conhecimento sobre este assunto, será somente apresentado diante do
entendimento, como em uma sombra, este pequeno número de
particularidades: Q ue o Amor conjugal, corresponde à Afeição do vero real, à
sua castidade, à sua pureza e à sua santidade; que a Seminação corresponde à
força do vero; que a Prolificação corresponde à propagação do vero; e o Amor
dos filhos corresponde à defesa do vero e do bem. O ra, pois que o V ero no
homem se apresenta como estando nele, e que o Bem lhe é adjunto pelo
Senhor, é evidente que estas Correspondências são as do homem N atural ou
Externo com o homem Espiritual ou Interno; mas alguma luz será lançada
sobre este assunto nos M emoráveis que seguem.
128 - IX . A Palavra é o M édium de conjunção porque ela vem do Senhor, e é
assim do Senhor.
Se a Palavra é o M édium de conjunção do Senhor com o homem, e do homem
com o Senhor, é porque em sua essência ela é o Divino V ero unido ao Divino
Bem, e o Divino Bem unido ao Divino V ero; que esta união esteja em todas e
cada uma das coisas da Palavra em seu sentido celeste e em seu sentido
espiritual, vê-se no Apocalipse R evelado, ris. 373, 483, 689, 811; donde
segue-se que a Palavra é o perfeito Casamento do bem e do vero; e como vem
ela do Senhor,e o que vem d'Ele é também Ele mesmo, segue-se que quando o
homem lê a Palavra,e tira dela os veros, o Senhor adjunta o bem; com efeito, o
homem não vê os bens que afetam, porque ele a lê pelo entendimento, e o
entendimento não tira dela senão as cousas que lhe pertencem, as quais são os
veros; que os bens ai sejam adjuntos pelo Senhor, o entendimento o sente pelo
prazer que influi quando ele é ilustrado, mas isso não acontece interiormente
senão naqueles que a lêem com o fim de se tornarem sábios, e o fim de se
tornar sábios está naqueles que querem aprender nela os veros reais, e por estes
veros formar neles a Igreja; mas os que a lêem unicamente para obter renome
de erudição, e aqueles que a lêem com a opinião de que lê-la somente ou
103

ouvi-la ler, inspira a fé e conduz à salvação, não recebem bem algum do


Senhor, porque estes têm por fim salvar-se só pelas expressões da Palavra, nas
quais não há cousa alguma do vero; e que aqueles tem por fim distinguir-se
pela erudição, mas com a qual não se conjunta bem algum espiritual, mas
unicamente o prazer natural que procede da glória do M undo. Como a Palavra
é o M édium de conjunção, é por isso que ela é chamada Aliança, Antiga e
N ova; e a Aliança significa conjunção.
129 - X . A Igreja vem do Senhor, e está naqueles que se dirigem a Ele, e vivem
segundo Seus preceitos.
H oje não se nega que a Igreja pertence ao Senhor, e que, visto que pertence ao
Senhor, ela vem do Senhor; se ela está naqueles que se dirigem a Ele, é porque
Sua Igreja, no M undo Cristão, existe pela Palavra, e a Palavra vem d'Ele, e de
tal modo vem d'Ele que é Ele M esmo; o Divino V ero aí está unido ao Divino
Bem,e isso também é o Senhor; não é entendida outra cousa pela Palavra, "que
estava com Deus,e que era Deus,da qual os homens têm a V ida e a Luz, e que
se fez Carne". (João 1, 1 a 14). E, além disso, se a Igreja está naqueles que se
dirigem a Ele, é porque ela está naqueles que crêem n'Ele; ora, crer que Ele é o
Deus Salvador e R edentor, que Ele é Jehovah a Justiça; que Ele é a Porta pela
qual se deve entrar no Curral, isto é, na Igreja; que Ele é o Caminho, a
V erdade e a V ida; que ninguém vem ao Pai senão por Ele; que o Pai e Ele são
um; além de várias outras cousas que Ele mesmo ensina; crer, digo, estas
cousas, ninguém o pode senão por Ele; se não se pode, a menos que se dirija a
Ele, é porque Ele é o Deus do Céu e da T erra, como Ele o ensina também; há
outro a quem nos devemos dirigir? H á outro a quem nos possamos dirigir? Se a
Igreja está naqueles que vivem segundo seus preceitos, é porque não há
conjunção com os outros; pois, Ele disse: “Aquele que tem os meus preceitos e
os faz, é esse que M e ama, e Eu o amarei, e morada nele farei mas aquele que
não M e ama, não guarda os meus preceitos". (João X IV , 21-24); o amor é a
conjunção,e a conjunção com o Senhor é a Igreja.
130 - X I. O Amor Conjugal é segundo o estado da Igreja, porque é segundo o
estado da Sabedoria no homem.
Q ue o Amor conjugal seja segundo o estado da Sabedoria no homem,isso já foi
dito muitas vezes e será dito muitas vezes em seguida; aqui portanto será
mostrado com clareza o que é a Sabedoria, e que a Sabedoria faz um com a
Igreja: "N o homem há a Ciência, a Inteligência e a Sabedoria; a Ciência
pertence aos conhecimentos, a Inteligência à razão, e a Sabedoria à vida; a
Sabedoria, considerada em seu plano, pertence ao mesmo tempo aos
conhecimentos, à razão e à vida; os Conhecimentos precedem, a R azão é
formada por eles, e a Sabedoria o é por aqueles e por esta; e então se vive
racionalmente segundo as verdades que são os conhecimentos; a Sabedoria
pertence portanto à razão e à vida ao mesmo tempo, e se torna Sabedoria
quando pertence à razão e em conseqüência à vida, mas é Sabedoria quando
104

chega a pertencer à vida e em conseqüência à razão. O s Antiqüíssimos, neste


M undo, não reconheceram outra Sabedoria senão a sabedoria da vida; esta era
a sabedoria daqueles que outrora eram chamados Sophi (sábios); mas, depois
destes Antiqüíssimos, os Antigos reconheceram como sabedoria a sabedoria da
razão, e estes foram chamados Filósofos; hoje, entretanto, muitos chamam
mesmo sabedoria a ciência; pois os doutos, os eruditos, e os semi-sábios (scie)
são chamados sábios; assim do cume de sua montanha, a Sabedoria caiu em seu
vale. Q uanto ao que é a Sabedoria em seu nascimento, em seu progresso e, em
conseqüência, em seu estado pleno, também se falará disso em algumas
palavras.As cousas que concernem à Igreja,e são chamadas Espirituais, residem
nos íntimos do homem; as que concernem à R epública, e são chamadas Civis,
têm seu lugar abaixo; e as que concernem à ciência,à experiência,e à arte,e são
chamadas N aturais, constituem a sede das precedentes; se as cousas que
pertencem à Igreja,e são chamadas espirituais,residem nos íntimos do homem,
é porque elas se conjuntam com o Céu, e pelo Céu com o Senhor, pois do
Senhor pelo Céu não entram outras no homem; se as que concernem a
R epública, e são chamadas civis, tem um lugar abaixo das espirituais, é porque
elas se conjuntam com o M undo; com efeito, elas pertencem ao M undo, pois
são estatutos,leis e regulamentos, que ligam os homens, a fim de que por elas a
Sociedade e a Cidade estejam em um estado regular e conveniente; se as que
concernem à ciência, a experiência e à arte, e são chamadas N aturais,
constituem a sede das precedentes, é porque elas se conjuntam estreitamente
com os cinco sentidos do corpo,e estes são os últimos, sobre os quais estão, por
assim dizer, assentados os interiores que pertencem à mente, e os íntimos que
pertencem à alma. O ra, visto como as cousas que concernem à Igreja, e são
chamados espirituais, residem nos íntimos, visto como as que residem nos
íntimos fazem a cabeça,e as que as seguem,chamadas civis, fazem o corpo, e as
últimas, chamadas naturais, os pés, é evidente que quando estes três gêneros de
cousas se seguem em sua ordem, o homem é homem perfeito; pois então elas
influem da mesma maneira que as cousas que pertencem à cabeça influem no
corpo, e pelo corpo nos pés; assim as Espirituais nas Civis e pelas civis nas
N aturais. O ra, como as Espirituais estão na luz do Céu, é evidente que por sua
luz elas ilustram as que seguem em ordem, e que por seu calor, que é o amor,
elas as animam; e quando isso acontece,o homem possui a sabedoria. V isto que
a Sabedoria pertence à V ida, e conseqüentemente à razão, como foi dito acima,
pergunta-se o que é a sabedoria da vida: Esta sabedoria, em um apanhado
sumário, consiste em fugir dos males, porque são prejudiciais à Alma,
prejudiciais à R epública e prejudiciais ao Corpo, e em fazer os bens porque são
proveitosos à Alma, à R epública e ao Corpo. Está aí a Sabedoria que é
entendida pela sabedoria com a qual o Amor conjugal se liga; pois ele se liga,
porque foge do mal do adultério como a peste da alma, da república e do
corpo; e como esta Sabedoria tem sua origem nas cousas espirituais que
pertencem à Igreja, segue-se que o Amor conjugal é segundo o estado da Igreja
105

no homem, porque é nele segundo o estado da sabedoria; por isso é também


entendido o que foi freqüentemente dito acima,que,quanto mais, o homem se
torna espiritual, tanto mais está no Amor verdadeiramente conjugal; pois o
homem se torna espiritual pelas cousas espirituais da Igreja". V eremos adiante,
ns. 163, 164 e 165, maiores desenvolvimentos sobre a Sabedoria com a qual se
conjunta o amor conjugal.
131 - X II. E como a Igreja vem do Senhor, o Amor conjugal vem também do
Senhor.
Isto sendo a conseqüência do que foi dito acima, é inútil confirmá-lo ainda
mais. Além disso, todos os Anjos do Céu atestam que o Amor verdadeiramente
conjugal vem do Senhor; e também, que este Amor é segundo o estado da
sabedoria, e o estado da sabedoria, segundo o estado da Igreja neles. Q ue os
Anjos do Céu atestam estas cousas, vê-se nos M emoráveis que estão depois dos
Capítulos,e que contêm coisas vistas e ouvidas no M undo espiritual.
132 - Ao que precede acrescentarei estes dois M emoráveis:
Primeiro M emorável: U m dia eu conversava com dois Anjos, um era do Céu
oriental, e outro do Céu meridional; quando perceberam que eu meditava
sobre os Arcanos da sabedoria concernente ao Amor Conjugal, disseram-me:
"T ens algum conhecimento dos jogos da Sabedoria em nosso M undo?"
R espondi: "Ainda não"; e eles disseram: "H á vários, e aqueles que amam os
veros pela afeição espiritual, ou porque são veros e a sabedoria existe pelos
veros, se reúnem a um sinal dado, e discutem e decidem questões que
pertencem a um entendimento muito profundo". Então tomaram-me pela
mão, dizendo: "Segue-nos, e verás e ouvirás; o sinal da reunião foi dado hoje".
Fui conduzido através de uma planície para uma Colina; e eis ao pé da Colina
um Pórtico de palmeiras, continuando até seu cimo; entramos aí e subimos; e
sobre a cabeça ou cimo da Colina vi um Bosque, cujas árvores sobre uma
elevação do solo formavam uma espécie de T eatro, dentro do qual estava um
plano pavimentado com pedrinhas de diversas cores; em torno deste plano de
forma quadrada tinham sido colocados Assentos sobre os quais estavam
sentados amadores da sabedoria; e no meio do T eatro estava uma M esa, sobre a
qual tinha sido colocado um Papel lacrado. O s que estavam sentados nas
Cadeiras nos convidaram a ocupar Cadeiras ainda vazias, e eu respondi: "Fui
conduzido aqui por dois Anjos para ver e ouvir, e não para me sentar". E então
estes dois Anjos foram ao meio do plano junto da M esa, e romperam o selo do
papel, e leram diante dos que estavam sentados os arcanos da sabedoria escritos
sobre o papel, os quais iam ser discutidos e desenvolvidos; tinham sido escritos
pelos Anjos do T erceiro Céu, e enviados de lá para cima da mesa; havia três
Arcanos, o Primeiro: O que é a Imagem de Deus, e o que é a Semelhança de
Deus, segundo as quais o homem foi criado? O Segundo: Por que o homem
não nasce na ciência de amor algum, quando entretanto as Bestas e as Aves,
tanto nobres como ignóbeis, nascem nas ciências de todos os seus amores? O
106

T erceiro: O que significa a Arvores da vida; o que significa a Arvore da ciência


do bem e do mal; e o que significa a Ação de comer dessas árvores? Em baixo
estava escrito: R euni as três decisões em uma única sentença, e escrevei-a sobre
um novo papel e colocai-o sobre esta mesa, e nós veremos; se a sentença na
balança parecer de peso e justa, o prêmio da sabedoria será dada a cada um de
vós". Após a leitura os dois Anjos se retiraram, e foram elevados aos Céus. E
então os que estavam, sentados nas Cadeiras começaram a discutir e a
desenvolver os Arcanos que lhes eram propostos e falaram em ordem; primeiro,
os que estavam sentados ao Setentrião,em seguida os que estavam ao O cidente,
depois os que estavam ao Sul, e por fim os que estavam ao O riente; e tomaram
o primeiro assunto de discussão que era: “O que é a Imagem de Deus; e o que
é a Semelhança, de Deus, segundo as quais o homem foi criado? E então leu-se
primeiro, diante de todos os assistentes, estas passagens do Livro da Criação:
"Deus disse: Façamos o homem à N ossa Imagem, segundo N ossa Semelhança;
e Deus criou o homem à sua Imagem, à Imagem de Deus o criou". (G ênesis 1,
26 e 27). "N o dia em que Deus criou o homem, à Semelhança de Deus o fez''.
(G ênesis V , 1). O s que estavam sentados ao Setentrião falaram primeiro,
dizendo que a Imagem de Deus e a semelhança de Deus são as duas V idas
insufladas no homem por Deus, isto é, a V ida da vontade, e a V ida do
entendimento,pois lê-se:"Jehovah Deus soprou nas narinas de Adão uma alma
de V idas; e o homem foi feito Alma vivente". (G ênesis 11, 7); nas narinas, é na
percepção,que a vontade do bem e o entendimento do vero, e assim uma Alma
de vidas, estavam nele; e como a vida lhe foi insuflada por Deus, a Imagem e
Semelhança de Deus significam a Integridade nele pela Sabedoria e o Amor, e
pela Justiça e o Julgamento. O s que estavam sentados ao O cidente eram
favoráveis a esta opinião, acrescentando entretanto que esta integridade,
insuflada neles por Deus, é continuamente insuflada em cada homem depois
deles; mas que no homem está como que em um receptáculo e que o homem
conforme é receptáculo, é imagem e semelhança de Deus. Em seguida os
T erceiros em ordem, a saber, os que estavam sentados ao Sul, disseram: "A
imagem de Deus e a Semelhança de Deus são duas cousas distintas, mas unidas
no homem por criação; e nós vemos como por uma luz interior que o homem
pode destruir a imagem de Deus, mas não a semelhança de Deus; isso se
apresenta como através de um véu, no fato de Adão ter retido a semelhança de
Deus, depois que perdeu a imagem de Deus, pois após a maldição, lê-se estas
palavras: "Eis que o homem é como um de nós, sabendo o bem e o mal".
(G ênesis 111, 22). E em seguida é chamado Semelhança de Deus, e não mais
Imagem de Deus, (G ênesis V , 1). M as deixemos os nossos consociados que
estão sentados ao O riente, e estão por conseqüência em uma luz superior, dizer
o que é propriamente a Imagem de Deus, e o que é propriamente a
Semelhança de Deus". E então, depois que o silêncio foi restabelecido, os que
estavam sentados no O riente se levantaram de seus assentos, e dirigiram o olhar
para o Senhor, e em seguida se recolocaram em seus assentos, e disseram: "A
107

Imagem de Deus é o R eceptáculo de Deus, e Deus sendo Amor mesmo e


Sabedoria mesma, a Imagem de Deus é o R eceptáculo do amor e da sabedoria
que procedem de Deus no homem; mas a Semelhança de Deus é a perfeita
semelhança e a plena aparência como se o amor e a sabedoria estivessem no
homem, e por conseguinte absolutamente como se lhe pertencessem; pois o
homem não pode deixar de sentir que ama por si mesmo e que é sábio por si
mesmo, ou que quer o bem e compreende a verdade por si mesmo, quando
entretanto não é na mínima cousa por si mesmo, mas é por Deus; Deus Só,
ama por si mesmo e é sábio por si mesmo, porque Deus é o Amor mesmo e a
Sabedoria mesma, a semelhança ou aparência que o amor e a sabedoria, ou o
bem e o vero, estão no homem como lhe pertencendo, faz que o homem seja
homem, e que possa ser conjunto a Deus, e assim viver para a eternidade;
segue-se dai que o homem é homem pelo fato de que pode querer o bem e
compreender o vero absolutamente como por si mesmo, e não obstante saber e
crer que é por Deus; pois à medida que sabe isso e o crê, Deus põe sua imagem
no homem; seria outra cousa se cresse que é por si mesmo e não por Deus".
Depois que assim falaram, o zelo que produz o amor da verdade se apoderou
deles, e pronunciaram estas palavras: "Como pode o homem receber alguma
coisa do amor e da sabedoria, e retê-lo e reproduzi-lo se não o sente como lhe
pertencendo? E como pode existir uma conjunção com Deus pelo amor e pela
sabedoria, se não for dado ao homem algum recíproco de conjunção? pois sem
um recíproco nenhuma conjunção pode existir; e o recíproco da conjunção é
que o homem ame a Deus e goste dá cousas que são de Deus como por si
mesmo, e creia entretanto que é por Deus; além disso, como pode o homem
viver pela eternidade, se não for conjunto ao Deus eterno? E por conseqüência
como pode o homem ser homem sem esta semelhança de Deus nele?'' T odos
aplaudiram estas palavras,e disseram:"Q ue se tire uma conclusão do que acaba
de ser dito"; e tirou-se esta: “O homem é o receptáculo de Deus, e o
R eceptáculo de Deus é a Imagem de Deus; e como Deus é o Amor mesmo e a
Sabedoria mesma, o homem é o receptáculo do amor e da sabedoria, e o
R eceptáculo se torna a Imagem de Deus conforme O recebe; e o homem é a
Semelhança de Deus, pelo fato de sentir em si que as cousas que vêm de Deus
estão nele como se lhes pertencessem; mas entretanto por esta semelhança ele
não é a Imagem de Deus, senão tanto quanto reconhece que o amor e a
sabedoria, ou o bem e o vero, nele, não são dele, e assim não vêm de modo
algum dele,estão unicamente em Deus,e vêm por conseqüência de Deus".
133 - Depois disso,tomaram o segundo objeto da discussão:"Porque o homem
não nasce na ciência de amar algum, quando entretanto as B estas e as Aves,
tanto nobres como ignóbeis, nascem nas ciências de todos os seus amores".
Primeiro confirmaram a verdade da proposição por diversos meios; por
exemplo, a respeito do homem, que ele não nasce em ciência alguma, nem
mesmo na ciência do amor conjugal; e se informaram, e observadores lhes
disseram que a criança não pode mesmo por uma ciência inata se aproximar do
108

peito da mãe; mas que é a mãe ou a ama que o aproxima; que apenas sabe
sugar, e que aprendeu isso por uma contínua sucção no útero; que mais tarde
não sabe caminhar nem articular o som em alguma palavra humana, nem
mesmo exprimir, pelo som, como as bestas, a afeição do seu amor; que além
disso, não conhece alimento algum que lhe convém, como os conhecem todas
as bestas, mas que tomam o que encontram, quer seja limpo ou sujo, e o põem
na boca; estes observadores disseram que o homem, sem instrução, não sabe
mesmo discernir o sexo, nem absolutamente cousa alguma concernente às
maneiras de amar; nem mesmo as donzelas e os rapazes sem ser instruídos por
outros,ainda que tenham sido instruídos em diversas ciências; em uma palavra,
o homem nasce corporal como o verme; e permanece corporal, a não ser que
aprenda por outros a saber, a compreender e a se tornar sábio. Depois disso,
confirmaram que as Bestas, tanto nobres, como ignóbeis, como os animais da
terra, as aves do céu, os répteis, os peixes, os vermes que se chamam insetos,
nascem em todas as ciências dos amores de sua vida; por exemplo, em tudo que
concerne à alimentação, em tudo que concerne à habitação, em tudo que
concerne ao amor do sexo e à prolificação, e em tudo que concerne à educação
de seus filhotes; confirmaram isso pelas maravilhas que relembraram em sua
memória segundo o que haviam visto, ouvido e lido no M undo natural, (é
assim que eles chamam o nosso M undo), onde tinham vivido
precedentemente, e no qual há bestas, não representativas, mas reais. Depois
que a verdade da proposição foi assim provada, eles, aplicaram suas mentes em
procurar e achar os fins e as causas, pelos quais desenvolveram e descobriram
este Arcano; e disseram todos: "Isso não pode existir assim senão pela Divina
Sabedoria, a fim de que o homem seja homem, e que a besta seja besta, e que
assim a imperfeição de nascença do homem se torne perfeição, e que a
perfeição de nascença da besta seja a sua imperfeição".
134 - Então, os do Setentrião começaram primeiro a dar sua opinião, e
disseram que o homem nasce sem as ciências a fim de que possa recebê-las
todas, em quanto que se nascesse nas ciências, não poderia receber outras além
daquelas em que tivesse nascido, e então não poderia tampouco se apropriar de
nenhuma; ilustraram isso por esta comparação: O homem ao nascer é como
um húmus no qual semente alguma foi espalhada, mas que entretanto pode
receber todas as sementes, e fazê-las crescer e frutificar; a besta, ao contrário, é
como um húmus já semeado, e cheio de grama e de ervas -, o qual não recebe
outras sementes senão as que aí estão semeadas; se outras lhe forem confiadas,
serão abafadas; daí vem que o homem, para adquirir todo seu crescimento,
emprega vários anos, durante os quais pode, como um húmus, ser cultivado e
produzir como que colheitas, flores e árvores de toda espécie, enquanto que a
besta adquire seu crescimento em muitos poucos anos, durante os quais não
pode ser cultivada senão nas ciências que recebeu ao nascer. Em seguida os do
O cidente falaram, e disseram: “O homem não nasce na Ciência, como a besta,
mas nasce na Faculdade e Inclinação, faculdade para saber, e inclinação para
109

amar; nasce na faculdade não somente para saber, mas também para
compreender e se tornar sábio, e nasce na inclinação muito perfeita não
somente para amar as cousas que são dele e do mundo, mas também as que são
de Deus e do Céu; em conseqüência por seus pais o homem nasce órgão,
vivendo unicamente pelos sentidos externos, e a princípio sem nenhum sentido
interno, a fim de que sucessivamente se torne homem, a principio natural, em
seguida racional e por fim espiritual; o que não aconteceria se ele nascesse nas
ciências e nos amores como as bestas; com efeito, as ciências e as afeições inatas
limitam esta progressão, mas a faculdade e a inclinação inatas não limitam
cousa alguma; é por isso que o homem pode ser aperfeiçoado pela ciência, a
inteligência e a sabedoria durante a eternidade". O s do Sul falaram em seguida
e emitiram sua opinião, dizendo: "É impossível ao homem adquirir por si
mesmo ciência alguma, mas é pelos outros que ele deve adquirir a ciência, pois
que ciência alguma é inata (connata) nele; e como não pode adquirir por si
mesmo ciência alguma, não pode tampouco adquirir amor algum, pois que
onde não está a ciência, aí não está o amor; a ciência e o amor são
companheiros inseparáveis,e não podem ser separados mais do que a vontade e
o entendimento,ou a afeição e o pensamento, enfim mais do que a essência e a
forma; à medida portanto que o homem adquire das outras a ciência, o amor a
ela se junta,como companheiro da ciência; o amor universal que se adjunta é o
amor de saber, de compreender e de se tornar sábio; este amor é próprio do
homem somente, e não de besta alguma, e influi de Deus. N ós concordamos,
com os nossos companheiros do O cidente, que o homem não nasce em amor
algum, nem por conseqüência em ciência alguma, mas nasce unicamente na
inclinação para amar,e por conseguinte na faculdade de receber as ciências, não
por si mesmo, mas pelos outros, isto é, por intermédio dos outros; se diz por
intermédio dos outros, pois eles também não receberam deles mesmos cousa
alguma da ciência, mas receberam de Deus. Concordamos também com os
nossos companheiros do Setentrião,que o homem ao nascer é como um húmus
no qual semente alguma foi espalhada, mas onde podem ser semeadas todas as
cousas tanto nobres como ignóbeis. A isso acrescentamos que as Bestas nascem
nos amores naturais, e por conseguintes nas ciências que lhes correspondem, e
entretanto não sabem, não pensam, não compreendem e não saboreiam cousa
alguma proveniente dessas ciências, mas por meio destas ciências são
conduzidas por seus amores, pouco mais ou menos como os cegos nas ruas por
cães, pois são cegos quanto ao entendimento; ou antes são como sonâmbulos
que fazem o que fazem por uma ciência cega, estando o entendimento
entorpecido". O s do O riente falaram em último lugar, e disseram:
"Concordamos com as opiniões que nossos irmãos emitiram, de que o homem
nada sabe por ele mesmo, mas sabe pelos outros e por intermédio dos outros, a
fim de que conheça e reconheça que tudo que sabe,. compreende e tem de
sabedoria vem de Deus; e que de outro modo o homem não pode ser
concebido, nascer e engendrado do Senhor, nem se tornar sua imagem e sua
110

semelhança; pois ele se torna imagem do Senhor, pelo fato de que reconhece e
crê que recebeu e recebe do Senhor, e não dele mesmo, todo, bem do amor e
da caridade, e todo vero da sabedoria e da fé; e é a semelhança do Senhor, pelo
fato de que tem em si este bem e este vero como vindos dele mesmo; sente isso
porque não nasce nas ciências, mas as recebe, e lhe parece que o que recebe
vem dele; o Senhor dá mesmo ao homem (a faculdade) de sentir assim, a fim
de que seja homem e não besta, pois que pelo fato de que quer, pensa, ama,
sabe, compreende e se torna sábio como por si mesmo, ele recebe as ciências e
as exalta em inteligência, e por seu uso, em sabedoria; assim o Senhor conjunto
o homem com Ele, e o homem se conjunta ao Senhor; estas cousas não
poderiam se fazer, se o Senhor não tivesse provido a que o homem nascesse em
uma ignorância total". Depois destas palavras todos quiseram que se formasse
uma Conclusão do que acabava de ser dito, e formou-se esta: “O homem não
nasce em ciência alguma, a fim de que possa alcançar todas as ciências, e fazer
progressos na inteligência, e pela inteligência na sabedoria; e não nasce em
amor algum, a fim de que possa entrar em todo amor pelas aplicações das
ciências pela inteligência, e no amor para com o Senhor pelo amor em relação
ao próximo,e assim ser conjunto ao Senhor,e por isso tornar-se homem e viver
pela eternidade.
135 - Em seguida tomaram o Papel e leram o terceiro O bjeto da discussão, a
saber: Q ue significa a Arvore da vida; que significa a Arvore da ciência do bem
e do mal; e que significa a ação de comer destas Arvores? e todos eles pediram
que os que eram do O riente desenvolvessem este Arcano, porque ele é de um
entendimento mais profundo, e porque os que são do O riente estão em uma
luz inflamada, isto é, na sabedoria do amor; e esta sabedoria é entendida pelo
Jardim do Éden, no qual estas duas Á rvores tinham sido colocadas; e estes
responderam: "N ós vamos falar, mas como o homem nada pode tomar de si
mesmo, e tira tudo do Senhor, nós falaremos por Ele, mas contudo, por nós
como se fosse por nós mesmos"; e então disseram: "A Á rvore significa o
homem, e seu fruto os bens da vida; daí pela Arvore da vida é significado o
homem vivendo por Deus, ou Deus vivendo no homem; e como o amor e a
sabedoria, e a caridade e a fé, ou o bem e o vero, fazem a vida de Deus no
homem, pela Arvore da vida, são significadas estas cousas, e por conseguinte a
vida eterna para o homem. A Arvore da vida de que será dado a comer, (Apoc.
11,7,X X II,2,14),tem a mesma significação. Pela Arvore da ciência do bem e
do mal é significado o homem que acredita viver por si, e não por Deus, assim
que crê que o amor e a sabedoria, a caridade e a fé, isto é, o bem e o vero, que
estão no homem são dele, e não de Deus, crendo isso porque pensa e quer, fala
e age, em toda semelhança e em toda aparência como por si mesmo; e como o
homem segundo essa crença se persuade que Deus se colocou nele ou infundiu
seu Divino nele,é por isso que a Serpente disse: "Deus sabe que no dia em que
comerdes do fruto desta árvore, os vossos olhos serão abertos, e vós sereis como
Deus, sabendo o bem e o mal". (G ênesis III, 5). A Ação de comer destas
111

árvores significa a recepção e a apropriação: a ação de comer da árvore da vida,


a recepção da vida eterna; e a ação de comer da árvore da ciência do bem e do
mal, a recepção da danação; é mesmo por isso que Adão e sua Esposa foram
malditos, um e outro, ao mesmo tempo que a Serpente; pela Serpente é
entendido o diabo quanto ao amor de si e ao fasto da própria inteligência; e
este amor é o possessor desta árvore, e os homens que estão no fasto por este
amor são estas árvores. Estão portanto em um grande erro aqueles que crêem
que Adão foi sábio e fez o bem por ele mesmo, e que era esse o seu estado de
integridade, quando entretanto este Adão foi amaldiçoado por causa desta
crença; pois isto é significado por comer da árvore da ciência do bem e do mal;
é por isso que então ele caiu, do estado de integridade em que havia estado
quando acreditava ser sábio e fazer o bem por Deus e de modo algum por ele
mesmo, pois isto é entendido por comer da Arvore da vida. O Senhor só,
estando no M undo, foi sábio por Si M esmo e fez o bem por si mesmo, porque
por nascimento o Divino M esmo estava n'Ele e lhe pertencia, também é por
isso que pela própria força Ele se tornou o R edentor e Salvador". De tudo que
acabaram de dizer tiraram esta Conclusão: "Pela Arvore da vida, e pela Arvore
da ciência 'do bem e do mal, e pela Ação de comer destas duas Á rvores, é
significado que a V ida para o homem é Deus nele, e que então ele tem o Céu e
a V ida eterna; e que a M orte para o homem é a persuasão e a crença de que a
vida para o homem é, não Deus, mas ele mesmo, donde ele tem o Inferno e a
M orte eterna,que é a danação".
136 - Depois disso examinaram o Papel deixado pelos Anjos sobre a mesa, e
viram escrito em baixo: "R euni as três Decisões em uma única Sentença"; e
então as reuniram e viram que as três se juntavam em uma única série, e que
esta série ou sentença era esta: “O homem foi criado para receber de Deus o
amor e a sabedoria, e entretanto com toda semelhança como de si mesmo, e
isso por causa da recepção e da conjunção, e é por isso que o homem não nasce
em amor algum, nem em ciência alguma, nem mesmo em poder algum de
amar e de tornar-se sábio por si mesmo; é por isso que se atribui todo bem do
amor e todo vero da sabedoria a Deus, se torna H omem vivo; mas se os atribui
a si mesmo, se torna homem morto". Escreveram estas palavras sobre um novo
Papel, e o colocaram sobre a M esa; e eis que imediatamente os Anjos se
apresentaram em uma nuvem de uma brancura brilhante, e levaram o Papel ao
Céu; e depois que foi lido lá, os que estavam sentados nas cadeiras ouviram
vozes vindas de lá: "Bem, bem, bem". E logo depois apareceu um Anjo que
parecia voar,tendo como que duas azas nos pés e duas nas têmporas; e tinha na
mão prêmios,que consistiam em T únicas,B onés e Coroas de louro, e desceu, e
deu aos que estavam sentados ao Setentrião, T únicas cor de opala; aos que
estavam ao O cidente, T únicas de cor escarlate; aos que estavam ao Sul, Bonés
tendo em volta bandas de ouro e pérolas, e cuja elevação do lado esquerdo era
enriquecido com diamantes talhados em forma de flores; mas aos que estavam
ao O riente, deu Coroas do louro nas quais havia rubis e safiras. T odos,
112

decorados com estes prêmios, foram embora do Jogo da sabedoria para suas
casas; e quando foram vistos por suas esposas, elas vieram ao seu encontro,
decoradas também com ornamentos dados do Céu, o que muito admirou aos
maridos.
137 - Segundo M emorável: U m dia em que eu meditava sobre o Amor
conjugal, eis que ao longe, apareceram duas crianças nuas, com açafates nas
mãos, e em torno delas rolinhas voando; e quando foram vistas de mais perto,
apareciam sempre nuas, mas decentemente ornadas com grinaldas; coroas de
flores ornavam suas cabeças, e bandas de lírios e rosas cor de jacinto, que
pendiam obliquamente das espáduas aos lombos decoravam seus peitos, e em
torno delas havia uma espécie de ligação comum, composta de folhagens
juncadas de olivas. M as quando chegaram ainda mais perto, apareceram não
mais como crianças, nem nuas, mas como duas pessoas na primeira flor da
idade, vestidas com hábitos e túnicas de seda brilhante, bordadas com flores da
maior beleza; e quando chegaram junto a mim, veio do Céu, por eles, um calor
primaveril com um aroma suave tal como o que os jardins e os campos exalam
na primavera. Eram dois Esposos do Céu; e então me dirigiram a palavra; e
como as cousas que eu acabava de ver estavam no meu pensamento, eles me
fizeram esta pergunta: "Q ue vistes?" E quando lhes contei que a princípio os
tinha visto como crianças nuas, em seguida como crianças ornadas com
grinaldas, e enfim como jovens vestidos com roupas bordadas de flores, e que
então de repente senti um calor primaveril com suas delícias, eles sorriram com
graça e disseram: "N ós, no caminho, nos víamos não como crianças, nem nuas,
nem com grinaldas, mas continuamente na mesma aparência de agora; e é
assim que de longe foi representado o nosso amor conjugal; o seu estado de
inocência no fato de termos sido vistos como crianças nuas; as suas delícias,
pelas grinaldas; e as mesmas delícias agora pelas flores de que os nossos hábitos
e túnicas estão recamados, e como disseste que quando chegamos perto de ti,
sentistes um calor primaveril com seu odor agradável como o que se exala de
um jardim, nós diremos a sua causa". E disseram: "N ós somos ,Esposos há
séculos, temos estado continuamente na flor da idade, em que nos vês; o nosso
primeiro estado foi como é o primeiro estado de uma donzela e de um
mancebo quando se unem pelo casamento; e acreditamos então que este estado
era a beatitude mesma de nossa vida; mas aprendemos com outros de nosso
Céu,e mais tarde nós mesmos o percebemos,que este estado era o do calor não
temperado pela luz, e que ele é progressivamente temperado, à medida que o
marido é aperfeiçoado em sabedoria, e que a esposa ama esta sabedoria no
marido, e que isso se dá pelos usos e segundo os usos que um e outro
desempenham por um mútuo auxílio na sociedade; além disso também que as
delícias se sucedem segundo a temperatura do calor e da luz, ou da sabedoria e
do amor.Se,portanto,quando chegamos perto de ti,tu sentiste como um calor
primaveril, é porque em nosso Céu o Amor conjugal e este calor fazem um,
pois entre nós o Calor é o Amor, e a Luz com que se une o calor é a Sabedoria,
113

e o U so é como a atmosfera, que em seu selo contém um e outro; o que é o


Calor e a Luz, sem seu continente? assim, o que é o Amor e a Sabedoria sem
seu uso? não há conjugal neles; porque não há objeto em que estejam. N o Céu,
onde está o calor primaveril, há Amor verdadeiramente conjugal; se ele, aí está,
é porque o primaveril só está onde o calor está unido com igualdade à luz, ou
antes onde há tanto de calor como de luz; e nós pensamos que, como o calor
encontra suas delícias com a luz,e a luz as suas com o calor, do mesmo modo o
amor encontra suas delícias com a sabedoria, e a sabedoria as suas com o
amor".Além disso ele disse: "Entre nós, no Céu, há uma luz perpétua, e jamais
a sombra da tarde, nem com mais forte razão as trevas, porque o nosso Sol não
se deita nem se levanta como o vosso sol, mas se mantém constantemente no
meio entre o zênite e o horizonte,isto é,segundo vossa maneira de falar, aos 45
graus do céu, daí vem que o calor e a luz que procedem de nosso Sol fazem
uma Primavera perpétua, e que um primaveril perpétuo inspira aqueles em,
quem o amor está unido em proporção igual com a sabedoria; e nosso Senhor
pela união eterna do calor e da luz não aspira a outra cousa que não sejam os
usos; daí vem também às germinasses em vossa terra, e os acasalamentos de
vossos voláteis e de vossos animais, na estação da primavera; pois o calor
primaveril abre seus interiores até aos íntimos, que são chamados suas almas, e
os afeta e aí introduz seu conjugal, e faz com que os prolíficos venham em suas
delícias para um contínuo esforço para fazer os frutos do uso, que são a
propagação de sua espécie. M as nos homens há, pelo Senhor, um perpétuo
influxo de calor primaveril; é por isso que eles podem em todo tempo, mesmo
no meio do inverno, gozar as delícias do casamento; pois os homens foram
criados recepções da luz, isto é, da sabedoria procedente do Senhor, e as
mulheres foram criadas recepções do calor, isto é, do amor da sabedoria do
homem, procedente do Senhor; daí vem, portanto, que quando chegamos
perto de ti, tu sentiste um calor primaveril com um perfume suave, tal como o
que os jardins e os campos exalam na primavera “. Depois de ter dito estas
palavras, o marido me estendeu a mão, e me conduziu às casas onde estavam
esposos na mesma flor da idade que eles, e disse: "Estas esposas que agora
parecem jovens foram, no mundo, mulheres velhas, e os maridos que agora
parecem como moços foram no mundo, velhos decrépitos; e todos estes foram
reconduzidos pelo Senhor a esta flor de idade porque se amaram mutuamente,
e fugiram, pela religião, dos adultérios como pecados enormes". E acrescentou:
"N inguém conhece os prazeres felizes do Amor conjugal, a não ser aqueles que
rejeitam os prazeres horríveis do adultério, e ninguém pode rejeitá-los senão
aqueles que são sábios pelo Senhor, e ninguém é sábio pelo Senhor, senão
aquele que faz usos por amor aos usos".V i também,então,os utensílios de suas
casas, eram todos em formas celestes, e de ouro brilhante inflamado pelos rubis
de que eram guarnecidos.
114

Do casto e do não-casto

138 - Como ainda não faço mais do que começar a tratar do Amor Conjugal
em particular, e como o Amor Conjugal em particular não pode ser conhecido
senão de uma maneira indistinta e, por conseqüência obscura, a não ser que o
seu oposto, que é o Incasto apareça também de alguma forma, e como este
Incasto aparece de alguma forma ou na sombra quando o Casto é descrito ao
mesmo tempo que o não-Casto; sendo a não-Castidade unicamente um
afastamento do Incasto de junto do Casto, vou tratar agora do Casto e do
não-Casto. Q uanto ao Incasto, que é inteiramente oposto ao Casto, tratar-se
dele na segunda Parte desta O bra, onde sob o titulo V olúpias da Loucura sobre
o Amor Escortatório, será descrito em toda sua extensão e com suas variedades.
M as o que é o Casto e o que é o não-Casto,e em quem prevalece um ou outro,
é o que vai ser ilustrado nesta ordem: I. O Casto e o não-Casto se dizem
unicamente dos Casamentos, e das cousas que pertencem ao Casamento. II. O
Casto se diz unicamente dos casamentos monogâmicos ou do casamento de um
homem com uma única esposa. III. Só o conjugal cristão é casto. IV . O Amor
verdadeiramente conjugal é a Castidade mesma. V . T odas as delícias do Amor
verdadeiramente conjugal, mesmo as últimas, são castas. V I. N aqueles que,
pelo Senhor, se tornam espirituais, o Amor Conjugal é purificado cada vez
mais, e se torna casto. V II. A Castidade do casamento existe por uma renúncia
completa as escortações por causa da R eligião. V III. A Castidade não pode se
dizer das criancinhas, nem dos meninos e das meninas, nem dos rapazes e
virgens, antes que sintam em si o amor do sexo. IX . A Castidade não pode se
dizer dos que nasceram Eunucos, nem dos que se fizeram Eunucos. X . A
Castidade não pode se dizer dos que não acreditam que os adultérios são males
contra a religião, nem com mais forte razão daqueles que não acreditam que os
adultérios sejam nocivos à sociedade. X I. A Castidade não pode se dizer
daqueles que não se abstêm dos adultérios senão por diversas razões externas.
X II. A Castidade não pode se dizer daqueles que acreditam que os Casamentos
são incastos.X III.A Castidade não pode se dizer daqueles que renunciaram aos
casamentos, votando-se a um celibato perpétuo, a não ser que tenham e que
reste neles um amor da vida verdadeiramente conjugal. X IV . O estado do
casamento deve ser preferido ao estado do celibato. Segue agora a explicação
destes artigos.
139 - I.O Casto e o não-Casto se diz unicamente dos Casamentos,e das cousas
que pertencem ao Casamento.
É porque o Amor verdadeiramente conjugal é a Castidade mesma, como vai ser
115

explicado, e o Amor oposto, que é chamado escortatório, é a Incastidade


mesma; quanto mais portanto aquele amor é purificado, tanto mais ele é Casto,
pois tanto mais é retirado o seu oposto destrutivo; por isso é evidente que é a
Pureza do Amor conjugal que é chamada castidade. N ão obstante há um Amor
conjugal não-casto que,entretanto,não é a incastidade; por exemplo,entre dois
Esposos que, por diversas razões externas, se abstém dos efeitos da lascívia ao
ponto de não pensarem nisso; todavia se este amor não foi purificado em seus
espíritos, ele não é casto entretanto; sua forma é Casta, mas não há nele uma
essência casta.
140 - Q ue a Castidade e a não-Castidade se dizem das cousas que pertencem ao
Casamento, é porque o Conjugal foi inscrito em um e outro Sexo desde os
íntimos até aos últimos, e o homem quanto aos pensamentos e às afeições, e
por conseguinte interiormente quanto aos fatos e aos gestos do corpo, é
segundo este conjugal; que isto seja assim, vê-se mais evidentemente pelas
pessoas incastas; o incasto que reside em suas mentes é ouvido pelo som de sua
linguagem, e pela aplicação de tudo que é dito, mesmo do casto, a cousas
libidinosas; o som de sua linguagem vem da afeição da vontade, e a linguagem
vem do pensamento do entendimento; está ai um sinal de que à vontade com
tudo que lhe pertence, e o entendimento com tudo que lhe pertence, assim
toda a mente, e por conseguinte todas as cousas do corpo, desde as íntimas até
às últimas, regurgitam cousas incastas; fui informado pelos anjos que entre
aqueles que são soberanamente hipócritas, o incasto é percebido pelo ouvido,
por mais castamente que eles falem, e é sentido também pela esfera que emana
deles; é isso ainda um sinal de que a incastidade reside nos íntimos de sua,
mente, e por conseguinte nos íntimos de seu corpo, e que estes íntimos são
velados exteriormente como uma crosta pintada com figuras de diversas cores.
Q ue uma esfera de lascívia emana dos incastos, isso é evidente em que entre os
filhos de Israel os estatutos declaravam imundas todas e cada uma das cousas
que, os que estavam sujos por suas impurezas, tinham unicamente tocado com
a mão. Daí pode-se concluir que se dá o mesmo com os castos, a saber, que
neles, desde os íntimos até aos últimos, todas as cousas são castas, e que é a
castidade do Amor conjugal que produz isso; é por isso que se diz no mundo
que para os Puros tudo é puro,e para os impuros tudo é impuro.
141 - II. O Casto se diz unicamente dos Casamentos monogâmicos, ou do
Casamento de um homem com uma única esposa.
Q ue o Casto se diz só desses, é porque neles o Amor conjugal não reside no
homem natural, mas entra no homem espiritual, e se abre progressivamente o
caminho para o Casamento espiritual mesmo, ou o Casamento do bem e do
vero, que é a sua origem, e se conjunta com ele, pois este Amor entra segundo
os acréscimos da sabedoria, e estes acréscimos são segundo a implantação da
Igreja pelo Senhor, como foi mostrado freqüentemente acima. Isso não pode se
fazer nos Polígamos, porque estes dividem o Amor conjugal, e este Amor
116

dividido não difere do Amor do sexo, que em si mesmo é natural; mas sobre
este assunto ver-se-á cousas dignas de atenção na Seção da Poligamia.
142 - III.Só o Conjugal Cristão é casto.
É porque o Amor verdadeiramente conjugal anda no homem com passo igual
ao do estado da Igreja nele; e porque este estado vem do Senhor como foi
mostrado na Seção precedente, ns. 130, 131, e em outros lugares; além disso
também, porque a Igreja em seus veros reais está na Palavra, e o Senhor aí está
presente nesses veros segue-se daí que não há Conjugal casto senão no M undo
Cristão e que, se aí não há, pode entretanto, haver; pelo Conjugal Cristão é
entendido o Casamento de um homem com uma única esposa. Q ue este
Conjugal possa ser instilado nos Cristãos e ser transmitido hereditariamente à
posteridade pelos pais que estão no Amor verdadeiramente conjugal, e que por
isso nascem a faculdade e a inclinação para gostar das cousas que são da Igreja e
do Céu, ver-se-á em seu lugar. Q ue os Cristãos, se tomam várias esposas,
cometem não somente um adultério natural mas também um adultério
espiritual,isso será demonstrado na Seção da Poligamia.
143 - IV .O Amor verdadeiramente conjugal é a Castidade mesma.
Eis as razões disso: 1. Este Amor vem do Senhor e corresponde ao Casamento
do Senhor e da Igreja. 2. Descende do Casamento do bem e do vero. 3. É
espiritual conforme a -existência da Igreja no homem. 4. É o Amor
fundamental e a Cabeça de todos os amores celestes e espirituais. 5. É o
legítimo Seminário do gênero humano, e por conseqüência do Céu Angélico.
6.Por isso existe também nos Anjos do Céu, e dele nascem entre eles linhagens
espirituais, que são amor e sabedoria. 7. E por conseqüência seu uso ultrapassa
em excelência todos os outros usos da criação. Segue-se daí que o amor
verdadeiramente conjugal por sua origem,é considerado em sua essência puro e
santo,a ponto de poder ser chamado a pureza e a santidade,por conseqüência a
castidade mesma; mas que entretanto ele não seja inteiramente puro entre os
homens,nem entre os Anjos,ver-se-á no Artigo V I,que segue,n.146.
144 - V . T odas as delícias do Amor verdadeiramente conjugal, mesmo as
últimas,são castas.
Isto resulta do que acaba de ser mostrado, que o Amor verdadeiramente
conjugal é a Castidade mesma; e desta consideração, que as delícias constituem
sua vida. Q ue as Delícias deste amor sobem e entram no Céu, e que no
caminho passam através dos prazeres dos amores celestes, em que estão os
Anjos do Céu; além disso que elas se conjuntam também com as Delícias de
seu amor conjugal, é o que foi referido acima. Além disso, ouvi declarar pelos
Anjos que eles percebem que estas delícias neles são exaltadas e cumuladas,
quando sobem de esposos castos que estão nas terras; e por causa dos
assistentes,que eram incastos,à pergunta,se acontecia o mesmo com as últimas
delícias, eles fizeram um sinal de cabeça, e disseram tacitamente: "Por que seria
117

de outro modo? N ão são estas as delícias do Amor conjugal em sua plenitude?"


De onde vêm às delícias deste amor, e o que são elas, vê-se acima, n. 69, e nos
M emoráveis,sobre tudo nos que seguem.
145 - V I. N aqueles que, pelo Senhor, se tornam espirituais, o Amor conjugal é
purificado cada vez mais,e se torna casto.
1. O primeiro amor, pelo qual se entende o amor que precede as núpcias e as
seguem imediatamente, tira alguma cousa do amor do sexo; assim, do ardor
próprio do corpo, não ainda mitigado pelo amor do espírito. 2. O homem de
natural torna-se progressivamente espiritual; pois ele se torna espiritual
conforme o R acional, que fica no meio entre o Céu e o M undo, começa a tirar
sua vida do influxo do Céu, o que se faz conforme a sabedoria o afeto e o
alegra, ver acima n. 130, e quanto mais isso se faz, tanto mais sua M ente é
elevada a uma aura (atmosfera) superior, que é o continente da luz e do calor
celestes, ou, o que dá no mesmo, o continente da sabedoria e do amor, em que
estão os Anjos; pois a luz celeste faz um com a sabedoria, e o calor celeste faz
um com o amor; e conforme a sabedoria e seu amor crescem nos esposos, o
Amor conjugal é purificado neles; ora, como isso se faz progressivamente,
segue-se que este amor se torna cada vez mais casto. Esta purificação espiritual
pode ser comparada à purificação dos espíritos naturais, efetuada pelos
Q uímicos, e denominada Defecação, R etificação, Castigação, Coobação,
Acução, Decantação, Sublimação; e a sabedoria purificada pode ser comparada
ao Á lcool, que é o espírito retificado no mais alto grau. 3. O ra, como a
sabedoria espiritual é tal em si mesma, que se abrasa cada vez mais com o amor
de se tornar sábio, e que por isso cresce eternamente, o que acontece conforme
é aperfeiçoado como que por defecções, castigações, retificações, acuções,
decantações e sublimações e estas por eliminações e abstrações do
Entendimento de todas as ilusões dos sentidos, e da V ontade de todos os
amores do corpo, é evidente que igualmente o Amor conjugal, de que a
Sabedoria é a mãe (parens) se torna progressivamente cada vez mais puro, e por
conseqüência casto. Q ue o primeiro estado do amor, entre os esposos, seja o
estado do calor ainda não temperado pela luz, mas que este calor seja
progressivamente temperado, conforme o M arido é aperfeiçoado em sabedoria,
e a Esposa ama esta sabedoria no marido,vê-se no M emorável,n.137.
146 - M as é preciso que se saiba que não há Amor conjugal absolutamente
casto ou puro entre os homens,nem entre os anjos; há sempre alguma cousa de
não-casto ou de não-puro, que se adjunta ou se liga a ele em baixo, mas isso é
de uma outra natureza diferente da que pertence ao incasto; pois neles o casto
está em cima, e o não-casto em baixo, e entre um e outro foi colocado pelo
Senhor como que uma porta com gonzos, que é aberta por determinação, e foi
provido para que esta porta não fique aberta, com receio de que um não passe
ao outro, e se misturem; pois o N atural do homem é, de nascença maculado e
cheio de males, mas assim não acontece com seu espiritual porque seu
118

nascimento vem do Senhor, pois é a regeneração, e a regeneração é uma


separação progressiva dos males aos quais o homem é inclinado por
nascimento. Q ue amor algum nos homens e nos anjos não seja absolutamente
puro,e não possa vir a sê-lo mas que o fim, do designo e a intenção da vontade
sejam, principalmente, encarados pelo Senhor, e que por conseqüência quanto
mais o homem está nisso e nisso persevera, tanto mais é iniciado na pureza, e
nela faz progressos,vê-se acima,n º 11.
147 - V II. A Castidade do casamento existe por uma renuncia completa as
escortações por causa da R eligião.
A razão disso, é que a castidade é o afastamento da incastidade; é uma regra
universal que, quanto mais alguém afasta o mal, tanto mais dá ao bem a
faculdade de lhe tomar o lugar; e que, além disso, quanto mais o mal é odiado,
tanto mais o bem é amado; e vice-versa, também; em conseqüência quanto
mais se renuncia a escortação, tanto mais a castidade do casamento entra. Q ue
o Amor conjugal seja purificado e retificado conforme se renuncia às
escortações,cada um o vê pela percepção comum,desde que isso seja dito e seja
ouvido, assim antes das confirmações; mas como nem todos têm a percepção
comum, importa que isso seja ilustrado também por confirmações, as
confirmações são, que o Amor conjugal esfria, desde que é dividido; e que este
esfriamento faz com que ele pereça; pois o calor do amor incasto o extingue;
com efeito,dois calores opostos não podem existir juntos, sem que um rejeite o
outro e o prive de sua força. Q uando portanto o calor do amor conjugal afasta
e rejeita o calor do amor escortatório, o amor conjugal começa a se aquecer
agradavelmente,e,pela sensação de suas delícias,a germinar e a florir como um
vergel e um bosque de roseiras na estação da primavera; estes, pela temperatura
primaveril da luz e do calor do Sol do M undo natural; e aquele, pela
temperatura da luz e do calor do Sol do M undo espiritual.
148 - Em cada homem existe gravado desde a criação e por seguinte de
nascença um Conjugal Interno e um Conjugal Externo; o Interno é espiritual,
e o Externo é natural; o homem entra primeiro neste, e à medida que se torna
espiritual, entra naquele; se portanto permanece no Conjugal externo ou
natural, então o Conjugal interno ou espiritual é velado, a ponto de não se
conhecer dele uma única cousa, e a ponto de ser chamado uma idéia vã; mas se
o homem se torna espiritual, então começa a conhecer alguma, cousa dele,
depois a perceber alguma cousa de sua qualidade, e progressivamente a
sentir-lhe os encantos, os prazeres e as delícias; e à medida que isso se opera, o
véu entre o Externo e o Interno, de que se falou, começa a enfraquecer; depois,
por assim dizer, a se liqüefazer, e por fim a se anular e a se dissipar. Q uando
isso foi feito, o Conjugal Externo permanece, é verdade, mas é continuamente
corrigido e purificado de sua escória pelo Interno; e isso, ao ponto do Externo
se tornar como a face do Interno,e tirar da beatitude que está no Interno, o seu
prazer, e ao mesmo tempo sua vida e as delícias de sua força. T al é a renúncia
119

as escortações, pela qual existe a Castidade do casamento. Poder-se-ia crer que


o Conjugal Externo permanecendo depois que o Interno se separou dele, ou o
separou de si, é semelhante ao Externo não separado; mas soube pelos Anjos
que são absolutamente diferentes; que o Externo derivado do Interno, que eles
chamam o Externo do Interno não pode ter lascívia, mas tem somente castas
delícias, e introduz cousa igual em seu Externo no qual sente suas próprias
delícias; é completamente diferente o caso do Externo separado do Interno,
diziam que este é lascivo no comum e em cada parte. Eles comparavam o
Conjugal Externo derivado do Interno a um belo Fruto cujo sabor e odor
agradável se insinuam em sua superfície e lhe dão uma forma em
correspondência com eles. Comparavam também o Conjugal Externo derivado
do Interno a um Celeiro cuja provisão jamais diminui, mas é constantemente
renovada à medida que é gasta; mas o Externo separado do Interno, eles, o
comparavam ao T rigo em uma joeira; se é lançado em torno, só resta a palha
que é dispersada ao vento; acontece assim com o Amor conjugal, se não se
renuncia ao amor escortatório.
149 - Q ue a Castidade do casamento não existe pela renúncia as escortações, a
não ser que ela se faça pela R eligião, é porque o homem sem religião não se
torna espiritual, mas permanece natural; e que se o homem natural renúncia as
escortações, seu espírito entretanto não renuncia a elas; e assim ainda que por
esta renúncia lhe pareça que é casto, acontece entretanto que a Incastidade está
escondida por dentro como a sânie em uma chaga curada por fora. Q ue o
Amor conjugal seja conforme o estado da Igreja no homem, vê-se acima, n.
130.V er várias cousas sobre este assunto na Exposição do Artigo X I seguinte.
150 - V III. A Castidade não pode se dizer das criancinhas, nem dos meninos e
das meninas, nem dos rapazes e das virgens, antes que sintam em si o amor do
sexo.
A razão disto,é que o Casto e o Incasto se dizem unicamente dos Casamentos e
das cousas que pertencem ao casamento, ver acima n. 139; e daqueles que nada
conhecem das coisas conjugais,nada da castidade se pode dizer, pois ela é como
nada para eles; ora, um nada não pode ser objeto nem da afeição, nem do
pensamento; mas depois deste nada surge alguma coisa, quando se sente a
primeira coisa do casamento que é o amor do sexo. Se as virgens e os rapazes,
antes que sintam em si o amor do sexo, são vulgarmente chamados castos, é
porque se ignora o que é a Castidade.
151 - IX . A Castidade não pode se dizer daqueles que nasceram Eunucos, nem
daqueles que foram feitos Eunucos. Pelos que nasceram Eunucos são
entendidos principalmente aqueles em quem, de nascença, falta o último do
amor, e como o primeiro e o médio não tem fundamento sobre o qual
subsistam,eles não existem também, e se existem, estes eunucos não se ocupam
em fazer uma distinção entre o casto e o incasto, pois um e outro lhes é
indiferente, mas entre estes há várias diferenças. Acontece com os que foram
120

feitos Eunucos quase o mesmo que acontece com alguns dos que nasceram
Eunucos; mas os que foram feitos Eunucos, sendo homens e mulheres, não
podem por isso mesmo considerar o amor conjugal senão como uma fantasia, e
suas delícias senão como futilidades. Se há neles alguma cousa proveniente da
inclinação, isso se torna cousa muda, que não é nem o casto nem o incasto, e o
que não é um nem outro, não pertence a denominação alguma de um ou de
outro.
152 - X . A Castidade não pode se dizer daqueles que não acreditam que os
adultérios sejam males contra a R eligião, nem com mais forte razão daqueles
que não acreditam que os adultérios são nocivos à sociedade. Q ue a Castidade
não possa se dizer desses, é porque eles não sabem o que é a Castidade, nem
que ela exista, pois a Castidade pertence ao Casamento, como foi mostrado
aqui no Primeiro Artigo; ora, aqueles que não acreditam que os adultérios
sejam males contra a religião, fazem também os casamentos incastos, quando
entretanto a R eligião nos esposos faz a Castidade deles; assim para eles nada há
de casto; é por isso que diante deles a castidade é mencionada em vão; estes são
adúlteros por confirmação; quanto aos que não acreditam que os adultérios
sejam nocivos à sociedade, sabem ainda menos que os precedentes o que é a
castidade, e se ela existe, pois são adúlteros de propósito deliberado; se dizem
que os casamentos são menos incastos que os adultérios, eles o dizem de boca,
mas não de coração, porque neles os Casamentos são frios, e aqueles que
segundo este frio falam do calor casto, não podem ter idéia do calor casto a
respeito do Amor Conjugal; o que são essas pessoas, e quais são as idéias de seu
pensamento, e por conseqüência quais são os interiores de sua linguagem,
ver-se-á na Segunda Parte que trata das Loucuras dos adúlteros.
153 - X I. A Castidade não se pode dizer daqueles que não se abstêm dos
adultérios sendo por diversas razões externas. M uitos acreditam que abster-se
dos adultérios somente no corpo é a castidade, e entretanto não está aí a
Castidade, a não ser que também ao mesmo tempo se abstenha deles no
espírito; o espírito, pelo qual aqui se entende a mente do homem quanto às
afeições e aos pensamentos, constitui o casto e o incasto, pois daí o casto e o
incasto passam para o corpo; com efeito, o corpo é absolutamente tal qual é a
mente ou espírito; segue-se daí que os que se abstêm dos adultérios unicamente
do corpo e não do espírito, e aqueles que se abstêm deles do espírito em razão
do corpo, não são castos; há um grande número de causas que fazem com que
o homem renuncie com o corpo aos adultérios, e também do espírito em razão
do corpo; mas acontece que aquele que não renuncia a eles com o corpo em
razão do espírito é incasto; pois o Senhor disse: "quem quer que olhar para a
mulher de um outro homem para a cobiçar, já cometeu adultério com ela em
seu coração". (M at. V , 28). T odas as causas que fazem com que se abstenham
dos adultérios somente do corpo não podem ser enumeradas, pois variam
segundo o estado do casamento, e também segundo os estados do corpo; com
121

efeito,há os que se abstêm por medo da lei civil e das penalidades; por medo da
perda da reputação, e por conseqüência da honra; por medo das moléstias que
deles provêm; por medo de querelas em casa com a esposa e, por conseqüência,
de perder a tranqüilidade da vida; por medo da vingança do marido ou de um
parente, e por medo de ser batido pelos criados; além disso, os que se abstêm
deles por pobreza, ou por fraqueza proveniente seja de moléstia, seja de abuso,
seja de idade, seja de impotência; entre estes há também os que, porque não
podem ou não ousam com o corpo,condenam mesmo de espírito os adultérios,
e por conseqüência falam com moralidade entre si e em favor dos casamentos;
mas se não falam pelo espírito, e se o espírito não maldiz pela religião os
adultérios, eles continuam adúlteros, pois ainda que não os cometam com o
corpo, entretanto os cometem com o espírito; é por isso que, depois da morte,
quando se tornam espíritos, falam abertamente em favor dos adultérios. Por
estas considerações é evidente que o ímpio pode fugir também dos adultérios
como nocivos, mas só os Cristãos podem fugir deles como pecados. Por aí,
vê-se agora, a verdade desta proposição, que a Castidade não se pode dizer
daqueles que se não abstêm dos adultérios senão por diversas razões externas.
154 - X II. A Castidade não pode se dizer daqueles que acreditam que os
Casamentos são incastos. Estes não sabem também o que é a Castidade, nem
que ela existe; são como aqueles de que se falou acima, n. 152; e como aqueles
que colocam a castidade unicamente no Celibato,e de que se vai falar.
155 - X III. A Castidade não pode se dizer daqueles que renunciaram aos
Casamentos votando-se a um perpétuo Celibato, a menos que haja e
permaneça neles um amor da vida verdadeiramente conjugal. Q ue a Castidade
não possa se dizer desses, é porque o Amor conjugal, depois do voto de um
Celibato perpétuo, foi rejeitado, quando entretanto a castidade se diz
unicamente deste amor; e porque no homem há sempre por criação e assim de
nascença uma inclinação para o sexo, e que, quando esta inclinação é
constrangida e domada, é necessário que ela se escoe em um calor, e em alguns
em uma efervescência que quando se lança do corpo no espírito, o infesta, e em
algumas pessoas o macula; e pode acontecer que o espírito, assim maculado
macule também as cousas religiosas, e que de sua sede interna, onde estão na
santidade, ele os precipite nos externos onde elas se tornam, unicamente cousas
de boca e dos gestos; é por isso que foi provido pelo Senhor para que este
Celibato esteja unicamente nos que estão no culto externo, culto em que estão
porque não se dirigem ao Senhor e não lêem a Palavra; nestes, por estes
celibatos, votados ao mesmo tempo com promessa de castidade, a vida eterna
não corre perigo como nos que estão no culto interno. Acrescente-se a isso que
muitos dentre eles não abraçam este estado de vida pelo livre da vontade, mas
alguns o abraçam antes de estar no livre segundo a razão, e alguns outros por
causa de sedução da parte do mundo. Dentre os que adotam este estado para
afastar do mundo a sua mente, a fim de ligar-se ao culto Divino, não há castos
122

senão aqueles em quem o amor da vida verdadeiramente conjugal existiu, ou


antes deste estado, ou depois deste estado, e em quem ele permanece, porque é
do amor desta vida conjugal que se diz à castidade. É por isso também que
todos aqueles que viveram em mosteiros são enfim, depois da morte, desligados
de seus votos, e são repostos em liberdade, a fim de que, segundo seus votos
interiores e os desejos do seu amor, sejam levados a escolher uma vida ou
conjugal ou extraconjugal; se então abraçam a vida conjugal, aqueles que
amaram também os espirituais do culto são dados em casamento no Céu; mas
aqueles que abraçam a vida extraconjugal são enviados para seus semelhantes
que habitam sobre os lados do Céu. Perguntei aos Anjos se aquelas que se
aplicaram à piedade, que se sujeitaram inteiramente ao Culto Divino, e assim
se subtraíram às fascinações do mundo e às cobiças da carne, e que por isso
mesmo se votaram a uma V irgindade perpétua, são recebidas no Céu, e aí se
tornam, segundo sua crença, as principais entre os bem-aventurados; os Anjos
responderam que elas são, é verdade, recebidas; mas que, quando aí sentem a
esfera do amor conjugal, elas se tornam tristes, e inquietas, e então umas por
sua própria vontade, outras depois de ter pedido permissão, e outras depois de
ter recebido ordem, vão embora e são despedidas; e quando estão fora desse
Céu, lhes é aberto um caminho para suas consociadas, que no M undo tinham
estado em um semelhante estado de vida, e então de tristes se tornam alegres, e
se divertem juntas.
156 - X IV . O estado do Casamento deve ser preferido ao estado do Celibato.
Isso é evidente pelo que foi dito até aqui sobre o Casamento e o Celibato. Se o
estado do Casamento deve ser preferido,é porque este estado existe por criação;
porque a sua origem é o Casamento do bem e do vero; porque a sua
correspondência é com o Casamento do Senhor e da Igreja; porque a Igreja e o
Amor conjugal são Companheiros assíduos; porque seu uso é mais excelente,
do que os usos de todas as coisas da criação, pois é dele que, segundo a ordem,
vêm a propagação do G ênero H umano, e também do Céu Angélico, pois que
este Céu é formado do G ênero H umano; acrescente-se a isso que o Casamento
é a plenitude do homem pois, por ele, o homem se torna homem pleno, o que
será demonstrado no Capítulo seguinte; todas estas cousas não estão no
Celibato. M as se põe por Proposição, que o estado do celibato é preferível ao
estado do Casamento, e se esta proposição é submetida ao exame, para que se
lhe dê assentimento e que seja corroborada por confirmações, então seguem-se
estas asserções, que os Casamentos não são santos; que não os há Castos; que
mesmo a, Castidade no sexo feminino só existe nas que se abstêm do
casamento,e se votam a uma perpétua virgindade; e que demais, aqueles que se
votaram a um Celibato perpétuo são entendidos pelos Eunucos que se fizeram
Eunucos para o R eino de Deus (M at.X IX , 12); além de várias outras asserções,
que, provindas de uma Proposição não verdadeira, não são verdadeiras
também; pelos Eunucos, que se fazem Eunucos, para o R eino de Deus, são
entendidos os Eunucos espirituais, isto é, aqueles que nos Casamentos se
123

abstêm dos males das escortações; que não sejam entendidos os Eunucos
italianos,isso é evidente.

151 (bis).Ao que acaba de ser dito ajuntarei dois M emoráveis:


Primeiro M emorável: Q uando, deste Jogo da Sabedoria, de que se falou acima,
n. 132, eu voltava para casa, vi no caminho um Anjo em vestimenta cor de
jacinto; ele se colocou ao meu lado, e disse: "V ejo que sais do Jogo da
Sabedoria,e que estás encantado com o que ouviste lá; e como percebo que não
estás plenamente neste M undo, porque estás ao mesmo tempo no M undo
natural, e que, por conseqüência, não conheces os nossos G inásios O límpicos,
onde os antigos Sophi se reúnem, e se informam dos que chegam do teu
M undo sobre as mudanças e sucessões de estados que a Sabedoria sofreu e sofre
ainda; se queres eu te conduzirei a um lugar onde moram vários destes antigos
Sophi e vários de seus filhos,isto é,de seus discípulos". E ele me conduziu para
os confins entre o Setentrião e o O riente, e quando eu olhava de um lugar
elevado, eis que vi uma Cidade, e a um de seus lados duas Colinas; e, a mais
próxima da cidade, menos elevada que a outra; e ele me disse: "Esta cidade é
chamada Atenas; a Colina menos elevada, Parnaso; e a mais alta, H elicon; são
chamadas assim, porque na Cidade e nos arredores habitam antigos Sábios da
G récia, como Pitágoras, Sócrates, Arístipo, X enofonte com seus discípulos e os
de sua escola". E perguntei por Platão e Aristóteles; e ele me disse que eles e
seus sectários habitavam em uma outra região, porque tinham ensinado as
coisas racionais que pertencem ao entendimento, enquanto que os outros
tinham ensinado as cousas morais que pertencem à vida. Disse-me que da
Cidade de Atenas freqüentemente são enviados Espíritos estudiosos aos letrados
dentre os Cristãos, para que relatem o que se pensa hoje concernente a Deus, à
Criação do U niverso,à Imortalidade da alma, ao Estado do homem comparado
ao das bestas,e a outros assuntos que pertencem à sabedoria interior; e me disse
que hoje o arauto havia anunciado uma assembléia,o que era um índice de que
os enviados tinham encontrado recém vindos da terra, de quem tinham
aprendido cousas curiosas; e vimos um grande número de espíritos que saíam
da cidade e dos arredores,alguns tendo coroas de louro na cabeça, outros tendo
palmas nas mãos, outros com livros em baixo dos braços, -e outros com penas
sob os cabelos da têmpora esquerda. N ós nos misturamos com eles, e subimos
juntos; e eis que sobre a Colina havia um Palácio octogonal, que eles
chamavam Paladium e entramos; e eis que havia lá oito redutos hexagonais, em
cada um dos quais havia uma pequena Biblioteca, e também uma M esa, perto
das quais se sentaram os que tinham coroas de louro; e no Paladium mesmo vi
assentos talhados na pedra, sobre os quais os outros se colocaram, e então, à
esquerda, se abriu uma porta, pela qual foram introduzidos dois recém-vindos
da terra, e depois que foram saudados, um dos que estavam coroados de louro,
lhes perguntou: "Q ue há de novo na terra?" E eles disseram: "H á de novo, que
124

se encontrou nos matos homens que são como bestas, ou bestas que são como
homens; mas por sua face e seu corpo conheceu-se que tinham nascido
homens,e tinham sido perdidos ou abandonados no mato com a idade, de dois
ou três anos; dizem que eles não podem exprimir pelo som cousa alguma do
que pensam, nem aprender a articular o som em palavra alguma-,' que não
sabem também discernir, como o fazem as bestas, o alimento que lhes convém,
e que metem na boca tanto cousas sãs como mal-sãs que encontram no mato;
contam ainda várias outras particularidades; daí alguns Eruditos entre nós
conjecturarem e alguns outros concluíram várias cousas sobre o estado dos
homens comparado com o das bestas". A essas palavras, alguns dos antigos
Sophi perguntaram o que haviam conjecturado e concluído; e os dois
recém-vindos responderam:"M uitas cousas que entretanto podem se reduzir ao
que segue:1.Q ue o homem por sua natureza, e também por seu nascimento, é
mais estúpido e por conseguinte mais vil que a besta, e que assim se torna se
não é instruído; 2. Q ue ele pode ser instruído, porque aprendeu a produzir
sons articulados, e por conseguinte a falar, e que por isso começou a manifestar
pensamentos, e isso progressivamente, de mais em mais, ao ponto de poder
exprimir as leis da sociedade, das quais entretanto várias foram gravadas nas
bestas de nascença; 3. Q ue as bestas têm a racionalidade do mesmo modo que
os homens; 4. Se, portanto as bestas pudessem falar elas raciocinariam sobre
cada cousa tão sutilmente quanto, os homens; o que o indica, é que elas
pensam segundo a razão e a prudência tão bem como os homens; 5. Q ue o
Entendimento é somente uma modificação da luz do Sol, com a cooperação do
calor, por meio do éter, de sorte que é somente uma atividade da natureza
interior, e que esta atividade pode ser exaltada a ponto de se mostrar como
sabedoria; 6. Q ue é por conseqüência ridículo crer que o homem, depois da
morte, vive mais do que a besta, a não ser talvez que, durante alguns dias
depois do falecimento, ele pode, pela exalação da vida do corpo aparecer como
nimbo sob a forma de um fantasma, antes que seja dissipado na natureza,
pouco mais ou menos como um ramo queimado, retirado das cinzas se faz ver
sob a semelhança de sua forma; 7. Q ue em conseqüência a R eligião, que ensina
uma vida depois da morte, é uma pura invenção, a fim de que os simples sejam
mantidos interiormente ligados pelas leis religiosas, como o são exteriormente
pelas leis civis". Acrescentaram que são os homens puramente engenhosos que
raciocinam assim, e não os homens Inteligentes; e perguntaram-lhes: "Como
raciocinam os inteligentes?" Eles disseram que não os tinham ouvido, mas que
têm deles esta opinião.
152 (bis) . Depois desta exposição, todos os que estavam perto das M esas
exclamaram: "O h! que tempo hoje sobre a T erra! Ai! que vicissitudes a
Sabedoria tem sofrido! não foi ela torcida em um louco discurso engenhoso? o
Sol está deitado, e diametralmente oposto, sob a terra, em seu meio-dia. Pelos
que foram abandonados e achados no mato, quem não sabe que
semelhantemente é o homem não instruído? O homem não é segundo a
125

instrução que recebe? N ão nasce ele na ignorância mais que as bestas? N ão deve
aprender a caminhar e a falar? Se não aprendesse a caminhar, levantar-se-ia ele
sobre os pés? E se não aprendesse a falar, exprimiria ele pelo som alguma cousa
do pensamento? T odo homem não é segundo o que lhe foi ensinado; insensato,
se foi pelos falsos; e sábio, se foi pelos veros; e insensato pelos falsos, com a
fantasia de ser mais sábio do que é sábio pelos veros? N ão há homens loucos e
extravagantes, que não são mais homens do que os que foram achados no
mato? O s que são privados da memória não lhe são semelhante? Para nós,
concluímos de tudo isso que o homem sem a Instrução, não é nem um
homem, nem uma besta, mas é uma forma que pode receber em si aquilo que
faz o homem, e que assim ele não nasce homem, mas se torna homem; e que o
homem nasce uma tal forma, para que seja um órgão recipiente da vida que
procede de Deus, a fim de que seja um ser no qual Deus possa introduzir todo
bem, e pela união com ele torná-lo feliz pela eternidade. Percebemos pela vossa
narração que a sabedoria hoje está de tal modo extinta ou enlouquecida, que
não se sabe absolutamente cousa alguma do estado da vida dos homens em sua
relação com o estado da vida das bestas; daí vem que não se conhece também o
estado da vida das bestas; dai vem que não se conhece também o estado da vida
do homem depois da morte; quanto aos que o podem conhecer, mas não o
querem, e por conseguinte o negam, como fazem muitos dos vossos Cristãos,
podemos assimilá-los aos que foram encontrados no mato, não que se tenham
tornado assim estúpidos pela privação da instrução, mas porque eles mesmos se
tornaram assim estúpidos pelas ilusões dos sentidos, que são as trevas das
verdades".
153 - (bis) . M as então um dos assistentes, que estava de pé no meio do
Paladium, tendo na mão uma palma, disse: "Peço-vos que desenvolvais este
arcano: Como o homem criado forma de Deus, pôde ser mudado em forma de
diabo? Eu sei que os Anjos do Céu são formas de Deus, e que os anjos do
inferno são formas do diabo; e estas duas formas são. opostas entre si, estas são
Loucuras, aquelas são Sabedorias; dizei, portanto, como o homem, criado
forma de Deus, pôde passar do dia para uma tal noite, que tenha chegado a
negar Deus e a vida eterna?" A esta questão os M estres responderam nesta
ordem, primeiro os Pitagóricos, depois os Socráticos, e em seguida os outros;
entres eles havia um Platoniano; este falou por último, e sua opinião
prevaleceu; ela consistia nisto: "O s homens da idade de Saturno ou do Século
de O uro, sabiam e reconheciam que eram Formas recipientes da vida que
procede de Deus, e por conseqüência a sabedoria estava gravada em suas almas
e em seus corações; e por conseguinte pela luz do vero eles viam o vero, e pelos
veros percebiam o bem pelo prazer do amor do bem; mas à medida que os
homens, nos Séculos seguintes, se afastaram do reconhecimento de que todo
vero da sabedoria, e por conseguinte de todo bem do amor neles, influía
continuamente de Deus, eles cessaram de ser habitáculos de Deus, e então
cessou também sua conversação com Deus, e sua consorciação com os Anjos;
126

pois os interiores de sua mente, de sua direção que tinha sido elevada ao alto
para Deus por Deus, foram virados em uma direção oblíqua, cada vez mais
para fora no M undo, e assim para Deus por Deus por meio do M undo, e
enfim foram revirados na direção oposta que está em baixo, para si mesmo; e
como Deus não pode ser encarado pelo homem interiormente revirado e assim
voltado em um sentido oposto,os homens se separaram de Deus, e se tornaram
formas do Inferno ou do diabo. Segue-se dai que, nas primeiras Idades, os
homens reconheceram de coração e de alma que todo bem do amor, e por
conseguinte todo vero da sabedoria, lhes vinha de Deus, e também pertenciam
a Deus neles, e que assim eram receptáculos da vida procedendo de Deus, o
que fez com que fossem chamados Imagens de Deus, Filhos de Deus, N ascidos
de Deus; mas que, nas Idades seguintes, eles reconheceram isso não de coração
nem de alma, mas por uma certa fé persuasiva, e em seguida por uma fé
histórica, e enfim somente de boca; e reconhecer isso somente de boca; é não o
reconhecer; mais ainda, é negá-lo de coração. Por aí, pode-se ver qual é hoje a
sabedoria sobre a terra entre os Cristãos, pois que estes, ainda que possam pela
R evelação escrita ser inspirados por Deus, não conhecem a diferença que há
entre o homem e a besta; e por conseguinte muitos acreditam que se o homem
vive depois da morte, a besta também deve viver, ou se a besta não vive depois
da morte,o homem também não deve viver; a nossa luz espiritual, que ilumina
a vida da mente, não se tomou obscuridade neles; e a luz natural, que ilumina
somente a vista do corpo,não se tomou para eles uma luz brilhante?"
154 - (bis). Depois disso, eles se voltaram todos para os dois recém-vindos, e
lhes agradeceram por terem vindo ao meio deles e pela narração que tinham
feito, e lhes pediram para referir a seus irmãos o que acabavam de ouvir; e os
recém-vindos responderam que confirmariam os seus nesta verdade, que
quanto mais se atribui ao Senhor, e não a si todo bem da caridade e todo vero
da fé,tanto mais se é homem e se torna Anjo do Céu.
155 - (bis). Segundo M emorável: U ma manhã, um Canto muito suave, que eu
ouvia a uma certa altura acima de mim, me acordou; e em seguida, nesta
primeira vigília que é interna, mais tranqüila e mais doce que as outras vigílias
do dia, eu pude durante algum tempo ser mantido em espírito como fora do
corpo,e dar toda minha atenção à afeição que era cantada; o Canto do Céu não
é outra cousa senão uma afeição da mente, que é emitida pela boca como uma
modulação, pois é um som separado do discurso daquele que fala, proveniente
da afeição do amor,afeição que dá a vida à linguagem; neste estado percebi que
era a afeição das delícias do Amor conjugal, que era cantada com melodia por
esposos no Céu; vi que era assim pelo som do canto, no qual estas delícias eram
variadas de uma maneira admirável. Depois disso, eu me levantei, e dirigi meu
olhar para o M undo Espiritual; e eis que no O riente sob o Sol, lá, apareceu
como que uma Chuva de ouro; era o orvalho da manhã, caindo em grande
abundância,que batido pelos raios do Sol apresentava à minha vista a aparência
127

de uma Chuva de ouro, tendo sido por isso ainda mais plenamente despertado,
saí em espírito, e perguntei a um Anjo, que vinha então ao meu encontro, se
ele tinha visto a Chuva de ouro caindo do Sol; e ele respondeu que a via todas
as vezes que estava em meditação sobre o Amor conjugal; e então voltou os
olhos para o Sol, e disse: "Esta Chuva cal sobre um Palácio (Aula), onde estão
três M aridos com suas Esposas,que habitam no meio do Paraíso O riental.Se se
vê cair do Sol uma tal Chuva sobre esse palácio, é porque neles reside a
sabedoria sobre o Amor conjugal e sobre suas delícias, nos maridos sobre o
amor conjugal, e nas Esposas, sobre suas delícias; mas percebo que estás na
meditação sobre as delícias do amor conjugal; vou por conseguinte te conduzir
a esse Palácio, e te introduzirei nele". E me conduziu por Jardins Paradisíacos
para Casas que eram construídas com M adeira de oliveira, e que tinham duas
colunas de Cedro diante da porta; e me introduziu onde estavam os M aridos, e
lhes pediu que me fosse permitido conversar em sua presença com suas
Esposas, e eles consentiram, e as chamaram. Estas olharam para meus olhos
com finura; elas disseram: "Podemos descobrir neles exatamente qual é tua
inclinação e por conseguinte tua afeição, e por esta teu pensamento sobre o
amor do sexo, e vemos que meditas profundamente sobre este amor, mas
entretanto com castidade".A acrescentaram: "Q ue queres que te digamos sobre
este assunto?" E respondi: "Dizei, eu vos peço, alguma coisa das delícias do
Amor conjugal". E os M aridos consentiram dizendo: "Descobri a ele, se isso
vos agrada, alguma cousa dessas delícias; seus ouvidos são castos". E elas me
dirigiram esta pergunta: "Q uem te aconselhou a nos interrogar sobre as delícias
deste amor? Por que não interrogas os nossos M aridos?" E eu respondi: "Este
Anjo que está comigo, me disse ao ouvido que as Esposas, são receptáculos e os
sensórios destas delícias, porque elas nasceram Amores, e que todas as delícias
pertencem ao amor". A estas palavras elas responderam sorrindo: "Sê prudente,
e não digas nada disso senão em um sentido ambíguo, porque isso é uma
sabedoria profundamente guardado nos corações de nosso sexo, e não
descoberto a nenhum M arido, a não ser que ele esteja no amor
verdadeiramente conjugal; há para isso várias razões que escondemos
profundamente em nós". E então os M aridos disseram: "As Esposas, conhecem
todos os estados de nossa mente, e nada há aí escondido para elas; elas vêem,
percebem e sentem tudo o que procede de nossa vontade; e nós, ao contrário,
nada conhecemos do que se passa nas Esposas; e isso foi dado às Esposas;
porque elas são terníssimos Amores, e como Z elos ardentes para a conservação
da amizade e da confiança conjugal, e assim de uma e de outra felicidade da
vida, a qual elas velam cuidadosamente para seus maridos e para elas mesmas,
com uma sabedoria implantada em seu amor, que é tão cheio de prudência,
que elas não querem e por conseguinte não podem dizer que amam, mas dizem
que são amadas". E perguntei porque elas não querem e por conseguinte não
podem. Elas responderam: "Se a menor cousa semelhante se escapasse da boca
das Esposas; o frio se apoderaria dos maridos, e os separaria do leito, do quarto
128

e do aspecto; mas isso acontece a aqueles que não consideram os casamentos


como santos, e que por conseqüência não amam suas Esposas; com um amor
espiritual; é completamente diferente com aqueles que amam; nas mentes
destes, este amor é espiritual, e em seguida no corpo é natural; nós, neste
Palácio, estamos no amor natural pelo amor espiritual; por isso confiamos a
nossos maridos os arcanos sobre nossas delícias do amor conjugal". Então lhes
pedi honestamente que me descobrissem também alguma cousa desses arcanos;
e imediatamente elas olharam para a janela da plaga meridional, e eis que uma
pomba branca, cujas mas brilhavam como de prata, e cuja cabeça era ornada
com uma coroa de ouro, foi vista pousada sobre um ramo de que pendia uma
oliva; como estava ela se esforçando para estender as asas, as Esposas; disseram:
"N ós te descobriremos alguma cousa; quando esta pomba aparece, é para nós
um sinal de que nos é permitido". E disseram: "Cada homem tem cinco
Sentidos; a V ista, o O uvido, o O lfato, o G osto e o T ato; mas nós temos um
Sexto, que é o Sentido de todas as delícias do amor conjugal do M arido; e este
Sentido está em nós nas palmas das mãos, quando tocamos o peito, os braços as
mãos e as faces de nossos maridos, sobretudo o peito, e também quando somos
tocadas por eles; todos os júbilos e todos os encantos dos pensamentos de sua
mente (mens), todas as alegrias e todos os prazeres de sua mente (animus), e
toda a satisfação e todo contentamento de seu coração passam deles para nós, e
se formam e se tornam perceptíveis, sensíveis e palpáveis, e nós os discernimos
com tanta justiça e tão distintamente, como o ouvido discerne as modulações
do canto, e a língua discerne os sabores dos manjares; em uma palavra, os
prazeres espirituais dos maridos tomam em nós uma espécie de incorporação
natural, é por isso que nossos M aridos nos chamam os órgãos sensória do amor
casto conjugal, e por conseqüência de suas Delícias, mas este Sentido do nosso
sexo existe, subsiste, persiste e se exalta no grau em que os M aridos nos amam
segundo a sabedoria e o julgamento, e no qual nós, de nosso lado, os amamos
segundo esta sabedoria e este julgamento neles; nos Céus este Sentido de nosso
sexo é chamado o Jogo da sabedoria com seu amor, e do amor com sua
sabedoria". Por estes detalhes, fui animado do desejo de fazer várias perguntas,
por exemplo,sobre a V ariedade das delícias,e elas disseram:"Ela é infinita; mas
nós não queremos dizer mais; e não o podemos, por esta razão que a Pomba de
nossa janela voou com o ramo de oliveira sob os pés". Esperei sua volta, mas
em vão. Durante este tempo fiz aos M aridos esta pergunta: "T endes vós um
semelhante sentido do Amor Conjugal?" E eles responderam: "T emos este
sentido em comum, e não em particular; pela beatitude particular, o prazer
particular e o encanto particular que experimentam as nossas Esposas, nós
temos uma beatitude comum, um prazer comum e um encanto comum, e este
Comum, que nos vem delas, é como a Serenidade da paz". Depois que
disseram estas palavras, eis que através da janela apareceu um Cisne que se
mantinha sobre um ramo de figueira, e estendeu as asas e voou; a esta vista, os
M aridos disseram: "É para nós um sinal de silêncio sobre o Amor conjugal;
129

volta várias vezes, e talvez várias outras cousas te sejam desvendadas". E eles se
retiraram e nós fomos embora.
130

Da conjunção das almas e das


mentes pelo casamento,a qual é
entendida por estas palavras do
Senhor:eles não sao mais dois
mas uma só carne

156 - (bis). Q ue por Criação tenha sido implantada no H omem e na M ulher


uma inclinação e também uma Faculdade de conjunção como em um, e que
uma e outra estejam ainda no H omem e na M ulher, vê-se pelo Livro da
criação, e ao mesmo tempo pelas palavras do Senhor. N o Livro da criação, que
é chamado G ênesis, lê-se: "Jehovah Deus edificou em mulher a costela que
tirou do homem; e a levou ao homem. E o homem disse: Esta, desta vez, é
O sso de meus ossos e carne da minha carne; desta o nome será chamado
Ischah, porque de Isch, o homem (V ir) foi esta tirada; por isso o homem
deixará seu pai e sua mãe, e se ligará a sua esposa, e eles serão em uma. só
carne". (11, 22, 23, 24). O Senhor disse também semelhantemente em
M ateus: "N ão lestes que Aquele que os faz no começo, M acho e Fêmea os fez,
e disse: Por causa disso o homem deixará seu pai e sua mãe, e se ligará a sua
esposa, e os dois serão em uma só Carne? Portanto, eles não são mais dois, mas
uma só Carne". (X X , 4, 5). Por estas palavras é evidente que a M ulher foi
criada do H omem. (V ir) e que em um e outro há uma Inclinação e uma
Faculdade de se reunir em um; que seja em um H omem (H omo), isso ainda é
evidente pelo Livro da criação, onde um e outro em conjunto são chamados o
H omem, pois lê-se: "N o dia em que Deus criou o H omem, macho e fêmea os
criou, e chamou seu nome H omem". (V , 1, 2); aí, se lê: Ele chamou seu nome
Adão; mas Adão e H omem são uma mesma palavra na Língua H ebraica; além
disso, um e outro, juntos são aí chamados H omem, (1, 27; 111, 22, 23, 24);
por uma só carne é significado também um só H omem, o que é evidente na
Palavra pelas passagens onde se diz: "T oda Carne", pelo que é entendido T odo
H omem, como G ênesis V I, 12, 13, 17, 19; Isaías X L, 5, 6; X LIX , 26; LX V I,
16, 23, 24; Jeremias X X V , 31; X X X II, 27; X LV , 5; Ezequiel X X , 48; X X I, 4,
5; e em outros lugares.Q uanto ao que é entendido pela Costela do homem que
foi edificada em mulher; por "serrou a Carne em seu lugar"; e assim por "O sso
de meus ossos e Carne de minha Carne"; pelo Pai e a M ãe que o homem
deixará depois do casamento, e por Ligar-se a sua esposa, isso foi mostrado nos
Arcanos Celestes, onde os dois Livros, o G ênesis e o Êxodo foram explicados
131

quanto ao sentido espiritual. Q ue pela Costela não tenha sido entendida uma
costela, nem pela Carne a carne, nem por O sso um osso, nem por Ligar-se,
ligar-se, mas foram entendidos Espirituais que correspondem a essas cousas, e
que por conseguinte são significadas por elas, é o que foi demonstrado nessa
mesma O bra; que tinham sido entendidos Espirituais,que de dois fazem um só
H omem, isso é evidente pelo fato do Amor conjugal conjuntar os dois, e este
Amor é espiritual. Q ue o Amor da Sabedoria do Esposo tenha sido transferido
para a esposa, isso já foi dito algumas, vezes, e será mais plenamente
confirmado nas Seções que seguem esta; agora, não, é permitido fazer uma
digressão, nem por conseqüência afastar-se do assunto aqui proposto, que
concerne à conjunção de dois Esposos em uma só carne pela união das almas e
das mentes. M as esta U nião vai ser explicada nesta ordem: I. Foi impressa em
um e outro Sexo uma faculdade e uma inclinação, para que eles possam e
queiram ser conjuntos como em um. II. O Amor conjugal conjunta as duas
almas e por conseguinte as duas mentes em um. III. A vontade da esposa, se
conjunta com o entendimento do Esposo, e por conseguinte o entendimento
do Esposo se conjunta com a vontade da esposa. IV . A inclinação a unir a si o
Esposo, é constante e perpétua na esposa, mas inconstante e alternativa no
Esposo. V . A conjunção é inspirada ao Esposo, pela esposa, segundo o amor da
esposa, e é recebida pelo Esposo, segundo a sabedoria do Esposo. V I. Esta
conjunção se faz progressivamente desde os primeiros dias do casamento, e, nos
que estão no Amor verdadeiramente conjugal, ela se faz cada vez mais
profundamente durante a eternidade. V II. A conjunção da Esposa com a
sabedoria racional do M arido se faz por dentro, mas com a Sabedoria moral ela
se faz por fora. V III. Por esta conjunção como fim, foi dada à Esposa a
percepção das afeições do M arido, e também a maior prudência para as
moderar. IX . As Esposas encerram em si esta percepção, e a escondem aos
M aridos por motivos que são necessidades, a fim de que o Amor conjugal, a
amizade e a confiança, e assim a beatitude da coabitação e a felicidade da vida,
sejam asseguradas. X . Esta percepção é a Sabedoria da esposa; e esta sabedoria
não pode estar no esposo, nem a Sabedoria racional do esposo estar na esposa.
X I. A Esposa, pelo amor, pensa continuamente na Inclinação do Esposo em
relação a ela, na intenção de se lhe conjuntar; não se dá o mesmo com o
Esposo. X II. A Esposa se conjunta ao Esposo por aplicações aos desejos de sua
vontade. X III. A Esposa se conjunta a seu Esposo pela esfera de sua vida, que
sai de seu amor. X IV . A Esposa se conjunta ao M arido pela apropriação das
forças da virtude do marido, mas isso se faz segundo seu mútuo amor
espiritual. X V . Assim a Esposa recebe nela a imagem de seu M arido, e por
conseguinte a percebe, vê e sente as afeições. X V I. H á Deveres próprios ao
Esposo, e Deveres próprios à Esposa e a Esposa não pode entrar nos deveres
próprios ao esposo, nem o esposo, nos deveres próprios à Esposa nem bem se
desobrigar deles um e outro. X V III. Estes Deveres segundo o socorro mútuo
conjuntam também os dois em um; e ao mesmo tempo constituem uma única
132

Casa. X V III. Aqueles que estão no Amor verdadeiramente conjugal tornam-se


cada vez mais um único H omem. X IX . Aqueles que estão no Amor
verdadeiramente conjugal sentem que pela união eles são homens, e como uma
só carne. X X . O Amor verdadeiramente conjugal, considerado em si mesmo, é
a união das almas, a Conjunção das mentes, e o esforço para a conjunção no
peito e em seguida no corpo. X X I. O s estados deste amor são a Inocência, a
Paz, a T ranqüilidade, a Amizade íntima, a plena Confiança, e o Desejo da
mente (animus) e do coração de se fazer um ao outro toda sorte de bem; e os
estados provenientes destes são a Beatitude, a Satisfação, o Prazer, a V olúpia; e
do gozo eterno de todas estas cousas resulta a Felicidade eterna. X X II. Estas
cousas não podem existir senão no casamento de um único esposo, com uma
única Esposa Segue agora a explicação destes Artigos.
157 - I. Foi gravado por criação em um e outro Sexo uma faculdade e uma
inclinação, para que possam e queiram ser conjuntos como em um. Q ue a
mulher tenha sido tirada do homem, isso acaba de ser mostrado pelo Livro da
Criação; que por conseqüência haja em um e outro sexo uma faculdade e uma
inclinação para se conjuntar em um, é o que resulta daí; pois o que foi tirado
de uma cousa tem e retém do próprio dessa cousa o que faz seu; isso, sendo
homogêneo com essa cousa, aspira à reunião, e quando foi reunido, está como
em si quando está nela e vice-versa. Q ue haja uma faculdade de conjunção de
um sexo com o outro, ou que eles possam se unir, isso não pode levantar
dúvida alguma; dá-se o mesmo quanto à inclinação para se conjuntar; pois a
experiência nos ensina uma e outra.
158 - II. O Amor conjugal conjunta as duas almas e em conseqüência as duas
mentes em um. Cada homem se compõe de uma alma, de uma mente e de um
corpo; a alma é seu íntimo, a mente seu meio, e o corpo seu último; a alma,
porque é o íntimo do homem,é celeste de origem; a mente, porque é o meio, é
espiritual de origem e o corpo, porque é o último, é natural de origem; as
cousas que de origem são celestes, e as que de origem são espirituais, não estão
no espaço,mas estão nas aparências do espaço; isso é mesmo sabido no M undo,
por isso se diz que nem a extensão nem o lugar podem se aplicar às cousas
espirituais: pois que os espaços são aparências, as distâncias e as presenças são
também aparências; que as aparências das distâncias e das presenças no M undo
espiritual sejam segundo as proximidades, os parentescos e as afinidades do
amor, é o que foi muitas vezes mostrado e confirmado em opúsculos sobre esse
M undo. Estas explicações foram dadas, a fim de que se saiba que as almas e as
mentes dos homens não estão no espaço, como aí estão seus corpos, porque por
origem, como acaba de ser dito, as almas são celestes, e as mentes são
espirituais; e que, como as almas e as mentes não -estão no espaço, podem ser
conjuntas como em um, embora os corpos não o sejam ao mesmo tempo. Isso
acontece principalmente entre Esposos que se amam intimamente com um
amor mútuo; mas como a mulher vem do homem, e como esta conjunção é
133

uma espécie de reunião, a razão pode ver que é não uma conjunção em um,
mas uma adjunção, vizinha e próxima, segundo o amor, e chegando ao
contacto naqueles que estão no amor verdadeiramente conjugal; esta adjunção
pode ser chamada coabitação espiritual, e se dá entre os esposos que se amam
ternamente por mais afastados que estejam de corpo; há mesmo no M undo
natural várias provas que a experiência fornece para o confirmar. Por estas
considerações é evidente que o Amor conjugal conjunta as duas almas e as duas
mentes em um.
159 - III. A vontade da Esposa se conjunta com o entendimento do esposo, e
por conseqüência o entendimento do Esposo se conjunta com a vontade da
esposa. A razão disso, é que o macho nasce para se tornar entendimento, e a
fêmea para se tornar vontade amando o entendimento do macho, donde
segue-se que a Conjunção conjugal é a da V ontade da Esposa com o
Entendimento do Esposo e que há conjunção recíproca do Entendimento do
Esposo com a V ontade da Esposa cada um vê que há uma muito estreita
conjunção do Entendimento e da V ontade, e que ela é tal, que uma das
faculdades pode entrar na outra, e se deleitar com esta conjunção e nesta
conjunção.
160 - IV . A inclinação a unir a si o Esposo é constante e perpétua na Esposa e
alternativa no Esposo.
Isto vem de que o amor não pode deixar de amar, e unir-se para ser por sua vez
amado; a sua essência e a sua vida não são outra cousa; ora, as mulheres são
nascidas amores, e os homens com os quais elas se unem para serem, por sua
vez, amadas são recepções: Além disso, o amor é sem cessar atuante; é como o
calor, a chama e o fogo, que perecem se não impedidos de agir, dai vem que a
inclinação para unir a si o Esposo é constante e perpétua na Esposa se no
Esposo não há uma semelhante inclinação para com a Esposa é porque o
homem não é amor, mas é unicamente recipiente do amor; e como o estado de
recepção está ausente e está presente segundo os cuidados que se interpõem,
conforme as mudanças de calor e de não calor na mente por diversas causas, e
segundo os aumentos e diminuições de forças do corpo, as quais não voltam
constantemente nem em momentos fixos, segue-se que a inclinação a esta
conjunção nos homens é inconstante e alternativa.
161 - V . A conjunção é inspirada ao Esposo pela Esposa segundo o amor da
esposa,e é recebida pelo Esposo segundo a sabedoria do Esposo.
Q ue o amor, e por conseguinte a conjunção seja inspirado ao Esposo pela
Esposa é o que está hoje escondido para os homens, e mesmo universalmente
negado por eles; e isso, porque as esposas persuadem que são unicamente os
homens que amam, e que são elas que recebem, ou que os homens são amores,
e elas obediências; elas sentem mesmo alegria de coração, quando os homens o
crêem: se elas os persuadem disso, é por várias razões, as quais se ligam todas à
134

prudência e à circunspeção das esposas, e das quais se dirá alguma cousa em


seguida, e especialmente no Capítulo sobre as causas de frieza, de separações e
de divórcios entre os esposos. Se os homens recebem das esposas, a inspiração
ou a insinuação do amor, é porque não há cousa alguma do amor conjugal,
nem mesmo do amor do sexo nos homens, mas unicamente nas esposas e nas
mulheres; que assim seja, é o que me foi mostrado de uma maneira chocante
(ad vivum) no M undo espiritual: U m dia houve lá uma conversa sobre este
assunto, e homens persuadidos por suas esposas, sustentavam que são eles que
amam, e não as esposas, mas que as esposas, recebem deles o amor; para
terminar a controvérsia sobre este arcano,todas as mulheres foram retiradas dos
homens, com as esposas, e ao mesmo tempo com elas foi afastada a esfera
mesma do amor do sexo; desde que esta esfera foi afastada, os homens caíram
em um estado completamente estranho, e que jamais tinham percebido antes, e
se queixaram muito disso; então, enquanto estavam nesse estado, as mulheres
foram reconduzidas a eles e as esposas aos maridos,e umas e outras lhes falaram
com ternura; mas eles permaneceram frios a suas carícias, e se afastaram e
disseram entre si: "o que é tudo isso? o que é uma mulher?" e como alguns
disseram que elas eram suas esposas, eles responderam: “O que é uma esposa?
nós não vos conhecemos". M as como as esposas, começaram a se afligir com
esta indiferença absolutamente fria dos maridos, e algumas a chorar, a esfera do
amor do sexo feminino e a esfera conjugal, que até aquele momento tinham
sido retiradas dos homens, foram restituídas, e então os homens reingressaram
no seu estado precedente, os amadores do casamento no seu, e os amadores do
sexo no seu; assim os homens foram convencidos de que cousa alguma do amor
conjugal, nem mesmo do amor do sexo, reside neles, mas unicamente nas
esposas, e nas mulheres; não obstante, em seguida, as esposas, por sua
prudência levaram os homens a crer que o amor reside nos homens, e que
alguma centelha deste amor pode passar deles para elas. Esta experiência foi
referida aqui, a, fim de que se saiba que as esposas, são amores, e os homens
recepções. Q ue os homens sejam recepções segundo a sabedoria deles, sobre
tudo segundo esta sabedoria aurida na religião,que a esposa? só deve ser amada,
vê-se claramente no fato de que, quando a esposa? Só é amada, o amor é
concentrado; e como ele é mesmo enobrecido, permanece em sua força, se
mantém e persiste; e pelo fato de que, de outro modo, seria como quando o
celeiro de trigo é lançado aos cães,o que acarreta a miséria na casa.
162 - V I. Esta conjunção se faz progressivamente desde os primeiros dias do
casamento; e naqueles que estão no verdadeiro amor conjugal, ela se faz cada
vez mais profundamente durante a eternidade.
O primeiro calor do casamento não conjunta, pois ele contém o amor do sexo
que pertence ao corpo e em seguida ao espírito; e aquilo que pelo corpo está no
espírito não permanece por muito tempo; mas o amor que pelo espírito está no
corpo,permanece; o amor do espírito, e do corpo pelo espírito, é insinuado nas
135

almas e nas mentes dos esposos ao mesmo tempo que a amizade e a confiança;
quando estas duas se conjuntam com o primeiro amor do casamento, então se
forma o Amor conjugal,que abre os peitos,e lhes inspira as doçuras do amor; e
isso, cada vez mais profundamente, conforme a amizade e a confiança se
adjuntam ao amor primitivo,e conforme este amor entra nelas e elas nele.
163 - V II. A conjunção da Esposa com a Sabedoria racional do M arido, se faz
por dentro,mas com sua Sabedoria moral se faz por fora.
Q ue a Sabedoria nos homens seja dupla, R acional e M oral, e que a sua
Sabedoria racional pertence ao Entendimento só, e sua Sabedoria moral ao
entendimento e ao mesmo tempo à vida, é o que se pode concluir e ver só pela
intuição e só pelo exame: mas a fim de que se saiba o que é entendido pela
Sabedoria racional dos homens, e o que é entendido por sua Sabedoria moral,
algumas de suas distinções especiais vão ser enumeradas. As cousas que
pertencem à sua Sabedoria racional são designadas por diversos nomes; em
geral são chamadas Ciência, Inteligência e Sabedoria; e em particular,
R acionalidade, Julgamento, Imaginação, Erudição, Sagacidade; mas como há
ciências especiais para cada um em seu ofício há por conseguinte um grande
número delas, com efeito, há (ciências) especiais para os Eclesiásticos, especiais
para os M agistrados, especiais para os diversos Funcionários sob suas ordens,
especiais para os Juízes, especiais para os M édicos e os Q uímicos, especiais para
os M ilitares e os M arinheiros,especiais para os Artistas e os O perários, especiais
para os Agricultores, e assim por diante. A Sabedoria R acional pertencem
também todas as Ciências, em que são iniciados os jovens nas escolas, e pelas
quais são em seguida iniciados na inteligência; e que também são chamados de
diversos nomes, por exemplo: Filosofia, Física, G eometria, M ecânica, M oral,
H istória e várias outras, pelas quais, como por portas, se entra nos racionais,
por meio das quais se forma a Sabedoria racional.
164 - M as à sabedoria moral nos homens pertencem todas as V irtudes morais
que concernem à vida e entram na vida, e também as V irtudes espirituais, que
afluem do Amor para com Deus e do Amor em relação ao próximo e se
reúnem nesses amores. As V irtudes que pertencem à sabedoria moral dos
homens são também de diversos nomes, e chamadas T emperança, Sobriedade,
Probidade, Benevolência, Amizade, M odéstia, Sinceridade, Cortesia,
Civilidade, e também Assiduidade, Destreza, H abilidade, M unificência,
Liberalidade, G enerosidade, V alor, Intrepidez, Prudência, além de muitas
outras. As V irtudes espirituais nos homens são o Amor da religião, a Caridade,
a V erdade, a Fé, a Consciência, a Inocência, e várias outras. Estas virtudes
espirituais e estas V irtudes morais, em geral, podem se referir ao amor e ao zelo
pela R eligião, pelo Bem público, pela Pátria, pelos Cidadãos, pelos Pais, pelo
Cônjuge e pelos Filhos. Em todas estas V irtudes dominam a Justiça e o
Julgamento; a Justiça pertence à Sabedoria moral, e o Julgamento à Sabedoria
racional.
136

165 - Se a conjunção da esposa com a Sabedoria racional do marido se faz por


dentro, é porque esta Sabedoria, é própria do Entendimento dos homens, e
sobe a uma luz na qual não estão as mulheres; é por isso que as mulheres não
falam por esta sabedoria,mas nas reuniões onde os homens discutem coisas que
são da alçada desta sabedoria, elas se calam e escutam somente; que entretanto
estas coisas vêm às esposas por dentro, isso é evidente pela maneira com que as
escutam, pelo fato de que elas as reconhecem em seu interior, e dão seu favor a
aquelas que elas ouvem dizer e têm ouvido dizer por seus maridos. M as se a
conjunção da esposa com a sabedoria moral do marido se faz por fora, é porque
as V irtudes desta sabedoria, quanto à maior parte, tem afinidade com virtudes
semelhantes das mulheres, e participa da V ontade intelectual do marido com a
qual a V ontade da esposa se une e faz um casamento; e como a esposa conhece
estas V irtudes no marido mais que o marido as conhece em si, se diz que a
conjunção da esposa com ela se faz por fora.
166 - V III. Por esta conjunção como fim foi dada à Esposa a percepção das
afeições do M arido,e também a maior prudência para as moderar.
Q ue as esposas conheçam as afeições de seus maridos e as moderem com
prudência, isso é também um dos arcanos do Amor Conjugal guardados
secretamente pelas esposas elas os conhecem por três sentidos, a vista, o ouvido
e o tato, e os moderam sem que seus maridos o saibam. O ra, pois que isso é
um dos arcanos das esposas não me é conveniente descobri-lo quanto às
circunstâncias; mas como é conveniente para as próprias esposas há, por esta
razão, em seguida aos Capítulos quatro M emoráveis, nos quais isso será
desvendado por elas mesmas; dois por três esposas que habitam no Palácio,
sobre o qual vi cair uma Chuva de ouro; e dois, por Sete esposas sentadas no
Bosque de rosas; se se ler estes M emoráveis, este arcano se apresentará
descoberto.
167 - IX . As esposas encerram em si esta percepção e a escondem dos M aridos
por motivos que são necessidades, a fim de que o amor conjugal, a amizade e a
confiança, e assim, a beatitude da coabitação, e a felicidade da vida, sejam
asseguradas.
Encerrar em si e esconder dos M aridos a percepção das afeições do marido, se
disse que isto são N ecessidades para as esposas, por que se elas desvendassem
estas afeições afastariam os maridos do leito, do quarto, e da casa; a razão é que
na maior parte dos homens, há profundamente neles uma frieza conjugal
proveniente de várias causas,que serão desvendadas no Capítulo sobre as causas
de frieza, de separações, e de divórcios, entre esposos; esta frieza, se as esposas,
desvendassem as afeições e as inclinações dos maridos, se lançaria de seu
refúgio, e gelaria primeiro os interiores da mente, em seguida o peito, e daí os
últimos do amor que são destinados a geração; todas estas cousas sendo
esfriadas, o amor conjugal seria banido ao ponto de não restar esperança
alguma de amizade, de confiança, e de beatitude de coabitação, e por
137

conseqüência de felicidade da vida; as esposas, entretanto se jactam


continuamente desta esperança. Descobrir que elas conhecem as afeições e as
inclinações do amor nos maridos, isso traz consigo a declaração e a divulgação
de seu próprio amor; e é notório que quanto mais, as esposas, abrem a boca
sobre este amor, tanto mais os homens se tornam frios, e desejam a separação.
Por isto se manifesta claramente a verdade deste Artigo, que as razões pelas
quais as esposas, encerram em si sua percepção, e a escondem de seus maridos,
são necessidades.
168 - X .Esta percepção é a sabedoria da esposa; e esta sabedoria não pode estar
no esposo,nem a sabedoria racional do esposo estar na esposa.
Isso é uma conseqüência da diferença que há entre o M asculino e o Feminino;
o M asculino é perceber pelo entendimento, e o Feminino perceber pelo amor;
além disso também, o Entendimento percebe as coisas que estão acima do
corpo,e fora do mundo,pois a vista racional e espiritual vai até lá; mas o Amor
não vai além do que sente; quando vai além deriva isso da conjunção,
estabelecida por criação, com o entendimento do homem; pois o entendimento
pertence à luz, e o amor ao calor; ora, as coisas que pertencem à luz são vistas
claramente e as que pertencem ao calor são sentidas. Por estas considerações é
evidente que em razão da diferença universal que há entre o masculino e o
feminino, a sabedoria da esposa não pode estar no esposo, nem a sabedoria do
esposo, na esposa a sabedoria moral do homem não pode também estar nas
mulheres,tanto quanto ela participa de sua sabedoria racional.
169 - X I. A esposa pelo amor, pensa continuamente na inclinação do esposo,
para ela,na intenção de se lhe conjuntar; é diferente no Esposo.
Isto é coerente com o que foi explicado acima, a saber, que a inclinação para
unir a si o Esposo é constante e perpétua na esposa; mas inconstante e
alternativa no esposo, ver n. 160; donde se segue que o pensamento da esposa;
é contínuo, a respeito da inclinação do marido para ela, na intenção de se lhe
conjuntar: o pensamento da esposa; a respeito do marido é descontinuado, é
verdade, pelos cuidados domésticos de que a esposa; é encarregada, mas
permanece sempre na afeição do seu amor, e esta afeição não se separa dos
pensamentos nas mulheres como se separa nos homens; mas eu relato estas
coisas como me tendo sido relatadas; ver os dois M emoráveis sobre as sete
Esposas sentadas em um Bosque de rosas,ns.293,294.
170 - X II. A Esposa se conjunta ao Esposo por aplicações aos desejos de sua
vontade.
Isto está no número das coisas bem conhecidas; por isso é inútil explicá-lo.
171 - X III.A Esposa é conjunta a seu Esposo pela Esfera de sua vida,que sai de
seu amor. De cada homem sai e se expande uma Esfera espiritual proveniente
das afeições do seu amor; ela o envolve e se introduz na Esfera natural que sai
do corpo, e estas duas Esferas se conjuntam; que uma Esfera natural aflui
138

continuamente do corpo, não somente do homem, mas também das bestas, e


mesmo das árvores, das frutas, das flores, e também dos metais, isso é
vulgarmente sabido; no M undo Espiritual acontece o mesmo; mas lá, as esferas
que afluem das coisas são espirituais, e as que emanam dos Espíritos e dos
Anjos são inteiramente espirituais, porque são as afeições do seu amor, e por
conseguinte suas percepções e seus pensamentos interiores; daí tira sua origem
toda simpatia e toda antipatia, e também toda conjunção e toda disjunção, e de
acordo com elas toda presença e toda ausência, pois o homogêneo ou o
concordante faz a conjunção e a presença, e o heterogêneo ou discordante faz a
disjunção e a ausência; por isso essas esferas fazem lá as distâncias; os efeitos
que estas esferas espirituais produzem no M undo natural são mesmo
conhecidas de algumas pessoas: as Inclinações dos esposos entre si não tem
também outra origem; as Esferas unânimes e concordantes os unem, e as
Esferas contrárias e discordantes os desunem; pois as esferas concordantes são
agradáveis e agradam, e as esferas discordantes são desagradáveis e desagradam.
Fui informado pelos Anjos, que estão em uma clara percepção destas esferas,
que não há no homem parte alguma no interior nem parte alguma no exterior,
que não se renove, o que se faz por soluções e reparações, e que daí vem a
esfera que aflui continuamente; os Anjos me disseram que esta esfera envolve o
homem pelo dorso e pelo peito, com tenuidade pelo dorso, mas com densidade
pelo peito; que a esfera que sai pelo peito se conjunta com a respiração; e que é
por isso que dois esposos cujos mentais (animi) e afeições não concordam se
deitam dorso a dorso no leito,e que,vice-versa,aqueles cujos mentais (animi) e
as afeições concordam, se voltam mutuamente um em face do outro. Eles me
disseram também que as esferas, porque saem de todas as partes do homem e
continuam ao longe em torno dele, conjuntam e disjuntam os esposos não
somente por fora, mas também por dentro; e que daí vêm todas as diferenças e
todas as variedades do Amor conjugal. Em último lugar eles me disseram que a
esfera do amor saindo de uma esposa, que é ternamente amada, é percebida no
céu como exalando um perfume doce, bem mais delicioso do que o que é
percebido por um recém-casado nos primeiros dias depois das núpcias. Destas
explicações resulta evidentemente a verdade desta asserção, que a esposa, é
conjunta a seu esposo pela Esfera de sua vida,que sai de seu amor.
172 - X IV . A Esposa é conjunta ao M arido pela apropriação das forças da
virtude do marido; mas isso se faz segundo seu mútuo amor espiritual.
Q ue assim seja, é ainda o que recolhi da boca dos Anjos; eles me disseram que
os prolíficos gastos pelos maridos são recebidos universalmente pelas esposas, e
se ajuntam à sua vida; e que assim as esposas, têm com seus maridos uma vida
unânime; e que em conseqüência se faz na realidade uma união das almas e
uma conjunção das mentes: eles me deram como razão, que no prolífico do
marido há sua alma, e também sua mente quanto aos interiores que foram
conjuntos à alma: acrescentaram que por criação foi provido para isso, a fim de
139

que a sabedoria, que constitui sua alma, seja apropriada à esposa, e que assim,
segundo as palavras do Senhor, eles se tornem uma só carne: além disso
também que foi provido a isso, a fim de que -o homem-esposo, depois da
concepção, não abandone a esposa, por alguma fantasia. T odavia, os anjos
acrescentaram que as aplicações e as apropriações da vida dos maridos pelas
esposas, se fazem segundo o amor conjugal, porque o amor, que é uma união
espiritual,conjunta; e também foi provido a isso por várias razões.
173 - X V . Assim a esposa, recebe em si a imagem de seu M arido e em
conseqüência percebe,vê e sente as afeições dele.
Das razões referidas acima resulta como fato, incontestável, que as esposas,
recebem em si as cousas que são próprias das almas e das mentes dos maridos, e
que por conseqüência de virgens elas se fazem esposas, As razões de que isso
resulta são: 1. Q ue a mulher foi criada do homem. 2. Q ue por conseguinte há
nela uma inclinação para se unir e como que a se reunir ao homem. 3. Q ue
desta união e por causa desta união com seu igual, a mulher nasce amor do
homem, e se torna cada vez mais amor do homem pelo casamento, porque
então emprega continuamente seus pensamentos em se conjuntar ao homem.
4. Q ue ela é conjunta, a seu único por aplicações aos desejos da vida deste
único. 5. Q ue eles são, conjuntos pelas esferas que os cercam, e que se unem
universalmente e singularmente segundo a qualidade do amor conjugal nas
esposas,e ao mesmo tempo segundo,a qualidade da sabedoria que o recebe nos
maridos. 6. Q ue eles são ainda conjunto pelas apropriações das forças dos
maridos pelas esposas. 7. Daí é evidente que alguma coisa do marido é
continuamente transferida para a esposa, e é inscrito nela como lhe
pertencendo. De todas estas considerações resulta que se forma na esposa uma
imagem do marido; imagem pela qual a esposa percebe, vê e sente em si as
cousas que estão no marido, e por conseguinte se percebe, se vê e se sente por
assim dizer ela mesma nela; ela percebe pela comunicação, vê pelo aspecto, e
sente pelo tato; que ela sente a recepção de seu amor pelo marido: pelo tato
com a palma da mão sobre as faces, sobre os braços e sobre o peito, é o que me
descobriram as três esposas no Palácio, e as sete esposas no Bosque de rosas; ver
os M emoráveis ns.208,293,294.
174 - X V I. H á Deveres próprios do Esposo, e Deveres próprios da Esposa; e a
Esposa não pode entrar nos deveres próprios do esposo, nem o esposo nos
deveres próprios da esposa,nem bem desempenhá-los um e outro.
Q ue haja deveres próprios do esposo, e deveres próprios da, Esposa; é inútil
ilustrar isso por uma enumeração desses deveres, pois são numerosos, e
variados; e cada um pode classificá-los numericamente segundo os gêneros e as
espécies,desde que se aplique a fazer-lhes a classificação. O s deveres pelos quais
as esposas se conjuntam principalmente com os M aridos, são os que concernem
a educação dos filhos de um e de outro sexo, e das meninas, até à idade em que
se casam.
140

175 - Q ue a Esposa; não possa entrar nos Deveres próprios do esposo, nem o
esposo, nos Deveres próprios da Esposa; é porque eles diferem como a
sabedoria e o amor desta sabedoria ou como o pensamento e a afeição deste
pensamento, ou como o entendimento e a vontade deste entendimento; nos
Deveres próprios dos homens o entendimento, o pensamento e a sabedoria
ocupam o primeiro lugar, mas nos Deveres próprios das esposas, é a vontade, a
afeição e o amor que ocupam o primeiro lugar; e a Esposa; desempenha seus
deveres pela vontade, a afeição e o amor, o esposo, desempenha os seus pelo
entendimento, o pensamento e a sabedoria; seus Deveres são portanto
diferentes por sua natureza, mas não obstante são susceptíveis de ser conjuntos
em série sucessiva. M uitos acreditam que as mulheres podem desempenhar os
deveres do homem, uma vez que desde a primeira idade elas sejam iniciadas
neles como os rapazes; elas podem, é verdade, ser iniciadas no seu exercício,
mas não no julgamento, de que depende interiormente a retidão dos deveres; e
por isso que estas mulheres que foram iniciadas nos deveres dos homens, são
obrigadas nas cousas de julgamento a consultar os homens, e então, segundo
seus conselhos, se são livres para agir, elas escolhem o que é favorável a seu
amor. Alguns também imaginam que as mulheres podem igualmente elevar a
penetração de seu entendimento na esfera da luz em que estão os homens, e
considerar as cousas na mesma elevação, opinião que formaram pelos escritos
de algumas M entes eruditas; mas estes escritos, examinados no M undo
espiritual em presença destas M entes,, achou-se que provinham, não do
julgamento nem da sabedoria, mas da imaginação e da eloqüência, e os escritos
que provêm destas duas fontes, têm pela elegância e a simetria do estilo, uma
aparência de sublimidade e de erudição, mas unicamente diante daqueles que
chamam sabedoria toda engenhosidade. Q ue os homens não possam entrar nos
deveres das mulheres, nem desempenhá-los convenientemente, é porque eles
não estão nas afeições das mulheres, que são inteiramente distintas das afeições
dos homens. Como as afeições e as percepções do sexo masculino foram assim
distinguidas por criação e por conseguinte por natureza, é por isso que nos
estatutos dos filhos de Israel havia também isto: "N ão haverá roupa de homem
sobre uma mulher, nem roupa de mulher sobre um homem, pois isso é
abominação". (Deut. X X II, 5). Era, porque no M undo espiritual todos são
vestidos segundo suas afeições; e as duas afeições, da mulher e do homem, não
podem ser unidas senão entre dois,e jamais em um só.
176 - X V II. Estes Deveres conforme o auxílio mútuo conjuntam também os
dois em um; e ao mesmo tempo constituem uma única casa.
Q ue os deveres do M arido se conjuntam sob alguma relação com os deveres da
Esposa, e que os deveres da Esposa se adjuntam aos deveres do marido, e que
estas conjunções e estas adjunções sejam um auxílio mútuo, e existem segundo
estes auxílios, são cousas conhecidas no mundo; mas os principais deveres que
aliam, consorciam e reúnem em um as almas e as vidas dos dois esposos,
141

concernem ao cuidado comum de educar os filhos; a respeito deste cuidado os


Deveres do marido e os Deveres da Esposa, são distintos e ao mesmo tempo se
conjugam; são distintos porque o cuidado de amamentar e de educar as
criancinhas ,de um e outro sexo, e também de instruir as meninas até a idade
em que são dadas e associadas a esposos, pertencem ao dever próprio da esposa,
enquanto que o cuidado de instruir os rapazes após a infância até à idade da
puberdade,e depois desta idade até que sejam capazes de se dirigir a si mesmos,
pertence ao dever próprio do marido; mas estes deveres se conjugam pelos
conselhos, pelos apoios e por vários outros auxílios mútuos. Q ue estes Deveres,
tanto conjuntos como distintos, ou tanto comuns como próprios, ligam em um
as mentes (animi) dos esposos, e que isso seja efetuado pelo Amor chamado
estorge, é bem sabido; que os Deveres, considerados em sua distinção e em sua
conjunção,constituem uma única Casa,é também sabido.
177 - X V III. O s dois Esposos segundo as conjunções acima mencionadas se
tornam cada vez mais um só homem.
Isto coincide com o conteúdo do Artigo V I, onde foi explicado que a
conjunção se faz progressivamente desde os primeiros dias do casamento, e que
naqueles que estão no Amor verdadeiramente conjugal, ela se faz cada vez mais
profundamente durante a eternidade; ver o n. 162. Eles se tornam um único
homem segundo o crescimento do Amor conjugal; e como este Amor nos Céus
é o amor real procedente da vida celeste e espiritual dos Anjos, é por isso que
dois Esposos lá são chamados dois quando são denominados M arido e esposa,
mas um quando são denominados Anjos.
178 - X IX . O s que estão no Amor verdadeiramente conjugal sentem que por
união eles são o homem,e como uma só carne.
Q ue seja assim, não é pela boca de qualquer habitante de uma terra, mas é pela
dos habitantes dos céus que isso deve ser confirmado, pois que entre os homens
das terras não há hoje o Amor verdadeiramente conjugal; e, além disso, os
homens estão envolvidos por um corpo grosseiro que abafa e absorve esta
sensação de que por união dois esposos são o homem e como uma só carne; e
além disso, aqueles que no M undo amam seu consorte só exteriormente e não
interiormente não querem ouvir falar nisso; eles pensam nisso mesmo segundo
a carne e com lascívia. É diferente entre os Anjos do Céu porque eles estão no
Amor conjugal espiritual e celeste e não envolvidos por um corpo grosseiro
como o dos homens na terra. Eu ouvi, dentre os que tinham vivido com suas
esposas durante séculos no Céu, atestar que se sentem assim unidos, o marido
com a esposa, e a esposa, com o marido, e cada um deles no outro,
mutuamente e reciprocamente, como também na carne, ainda que separados.
Como razão da raridade deste fenômeno nas terras eles davam esta, que a união
das almas e das mentes de dois esposos é sentida em sua carne, porque a alma
faz não somente os íntimos da cabeça, mas também os íntimos do corpo,
acontece o mesmo com a mente que fica no meio entre a alma e o corpo,
142

embora a mente apareça na cabeça, está entretanto, na realidade, também em


todo corpo; eles disseram que resulta daí que os atos, que a alma e a mente tem
intenção de fazer, decorrem no mesmo instante do corpo; além disso, resulta
daí também que depois de ter rejeitado o corpo no M undo precedente, são
mesmo homens perfeitos. O ra, como a Alma e a M ente se adjuntam
estreitamente à Carne do corpo para operar e produzir seus efeitos, segue-se
que a união da alma e da mente com o consorte é sentida também no corpo
como uma só carne. Q uando os Anjos faziam estas declarações, ouvi espíritos,
que estavam presentes, dizer que estavam aí coisas da sabedoria angélica, que
estavam acima da compreensão; mas estes espíritos eram racionais-naturais, e
não racionais-espirituais.
179 - X X . O Amor verdadeiramente conjugal considerado em si mesmo, é a
união das almas, a conjunção das mentes, e o esforço para conjunção no peito,
e em conseqüência no corpo. Q ue este amor seja a união das almas e a
conjunção das mentes, vê-se acima, n. 158; que seja o esforço para conjunção
no peito, é porque o Peito é como um Lugar onde se reúne a assembléia e
como um Palácio de rei,e o Corpo como uma Cidade populosa em torno. Se o
Peito é como um Lugar onde se reúne a assembléia, é porque todas as cousas
que pela alma e pela mente tem uma determinação no corpo, influem a
princípio no peito; se é como um Palácio de rei, é porque aí há o Coração e o
Pulmão, e por toda parte o coração reina pelo sangue, e o pulmão pela
respiração; que o Corpo seja como uma Cidade Populosa em torno, isso é
evidente. Q uando portanto as Almas e as M entes dos esposos foram unidos e
que o amor verdadeiramente conjugal os une segue-se que esta amável união
influi em seus peitos, e por estes em seus corpos, e produz o esforço para a
conjunção; e isso tanto mais que o amor conjugal determina o esforço para seus
últimos completarem seus deliciosos prazeres; e como o peito é o lugar onde
terminam os dois caminhos (vindo da mente e do corpo) vê-se claramente de
onde vem que o amor conjugal aí encontre a sede de seu delicado sentido.
180 - X X I. O s estados deste amor são à inocência, a Paz, a T ranqüilidade, a
Amizade íntima, a Plena Confiança, e o Deseja da alma (animus) e do coração
de fazer um ao outro toda sorte de bens; e os estados provenientes destes são a
Beatitude, a Satisfação, o Prazer, a V olúpia; e do gozo eterno de todas estas
coisas resulta a Felicidade celeste.Se todas estas coisas estão no Amor conjugal e
dele derivam, é porque este amor tem por origem o Casamento do bem e do
vero e que este Casamento procede do Senhor, e porque este Amor é tal que
quer comunicar alegrias a um e outro que ama de todo coração, e mesmo lh'as
transferir, e por esse meio achar as suas- portanto infinitamente mais o Divino
Amor,que está no Senhor,a respeito do homem, que Ele criou R eceptáculo do
Amor e da Sabedoria que procedem d'Ele; e pois Ele criou o H omem (H omo)
para a recepção, a saber, o H omem (V ir) para a recepção da Sabedoria, a
M ulher para a recepção do amor da sabedoria do homem, é por isso que pelos
143

íntimos infundiu nos homens (homines), o Amor conjugal para o qual pôde
transferir todas as causas da beatitude,da satisfação,do prazer e da volúpia, que
procedem unicamente de Seu Divino Amor por Sua Divina Sabedoria ao
mesmo tempo que a vida, e que influem, por conseqüência, naqueles que estão
no amor verdadeiramente conjugal porque só eles são recipientes. Fez-se
menção da Inocência, da Paz, da T ranqüilidade, da Amizade íntima, da plena
Confiança, e do Desejo da mente (animus) e do coração, de fazer um ao outro
toda sorte de bem, porque a Inocência e a Paz pertencem à alma, alma, a
T ranqüilidade à mente, a Amizade íntima ao peito, a plena confiança ao
coração, e que o Desejo da mente (animus) e do coração de fazer um ao outro
toda sorte de bem pertence ao corpo segundo as causas precedentes.
181 - X X II. Estas cousas não podem existir sendo no Casamento de um único
Esposo com uma única Esposa.
É o que se conclui de todas as causas que foram ditas até aqui, e é também o
que se torna uma conclusão para todas as que serão ditas em seguida; não há
portanto necessidade de uma explicação especial para as confirmar.
182 - Ao que precede serão acrescentados dois M emoráveis:
Primeiro M emorável: Algumas semanas depois, ouvi uma voz do Céu que me
disse: "Eis novamente uma Assembléia no Parnaso; aproxima-te; nós te
mostraremos o caminho". Aproximei-me, e quando cheguei perto, vi sobre o
H elicon alguém segurando uma trombeta com a qual anunciava e indicava a
Assembléia. E vi, como precedentemente espíritos subir da Cidade de Atenas e
dos arredores, e no meio deles três N oviços do M undo; todos três eram
Cristãos, um Padre, o outro Político, e o terceiro Filósofo; eram entretidos no
caminho por uma conversa sobre diversos assuntos, principalmente sobre os
Sábios Antigos, que eram designados por seus nomes; perguntaram se os
veriam; responderam-lhes que os veriam, e que se o quisessem, poderiam
apresentar-lhes saudações, visto que eram amáveis. Indagaram sobre
Demóstenes, Diógenes e Epícuro. Disseram-lhes: "Demóstenes não está aqui,
está perto de Platão; Diógenes, com os de sua escola, moram sob o H elicon,
porque ele considera as cousas mundanas como nada, e não se ocupa senão das
cousas celestes; Epícuro habita no ocidente sobre os confins, e não entra em
nosso meio, porque nós distinguimos entre as afeições boas e as afeições más, e
dizemos que as afeições boas estão com a sabedoria, e as afeições más contra a
sabedoria". Q uando subiram a colina do Parnaso, alguns guardas levaram-lhes
água da fonte em vasos de cristal, e disseram: "É a água da fonte que, segundo
as narrativas da antiguidade, o cavalo Pegaso tinha feito jorrar ferindo a terra,
com o casco de sua pata, e que foi em seguida consagrada às nove V irgens; ora,
pelo Cavalo alado, Pegaso, eles designavam o Entendimento do vero pelo qual
existe a Sabedoria; pelo casco de sua pata, as experiências pelas quais se adquire
a inteligência natural; e pelas N ove V irgens, os conhecimentos e as ciências de
todo gênero; estas cousas hoje são chamadas fábulas, mas eram
144

correspondências; segundo as quais se exprimiam os homens da antiguidade".


O s que acompanhavam os três recém-vindos lhes disseram: "Q ue isso não vos
espante, os guardas foram instruídos para falar assim; e nós, por beber da água
da fonte entendemos ser instruídos nos veros, e nos bens por meio dos veros, e
assim ter a sabedoria". Em seguida eles entraram no Paladium, e com eles os
três N oviços do M undo, O Padre, o Político e o Filósóofo; e então os que
estavam coroa dos de louro, e sentados perto das mesas, perguntaram: "Q ue há
de novo na T erra?" Eles responderam: "H á de novo, que um homem pretende
conversar com os Anjos, e ter a vista aberta para o M undo espiritual, como, a
tem aberta para o M undo natural; e conta várias cousas novas, entre outras
estas: Q ue o homem vive homem depois da morte, como viveu
precedentemente no M undo; que vê, ouve, fala como antes no M undo; que é
vestido e coberto de ornamentos como antes no M undo; que tem fome e sede,
come e bebe como antes no M undo; que goza da delícia conjugal como antes
no M undo; que dorme e se acorda como antes no M undo; que há lá terras e
lagos, montanhas e colinas, planícies e vales, fontes e rios, jardins e bosques;
que lá há também palácios e casas, cidades e vilas, como no M undo natural;
que lá há também escrituras e livros, empregos e comércio, pedras preciosas,
ouro e prata; que, em uma palavra, há lá, em geral e em particular, todas as
coisas que estão na terra; e que, nos céus, elas são infinitamente mais perfeitas,
com a única diferença de que todas as cousas que estão no M undo espiritual
são de origem espiritual e por conseguinte espirituais, porque procedem do Sol
espiritual que é puro Amor, em quanto que todas as cousas que estão no
M undo natural são de origem natural e por conseguinte naturais e materiais,
porque procedem do Sol natural que é puro fogo; que em uma palavra o
homem depois da morte é perfeitamente homem, e mesmo mais perfeitamente
homem que antes no M undo; pois antes no M undo ele estava em um corpo
material,em quanto que no M undo espiritual ele está em um corpo espiritual".
Depois que eles assim falaram, os Sábios antigos lhes perguntaram o que se
pensa disso sobre a terra. O s três disseram: "Q uanto a nós, sabemos que isso é
verdade, pois que estamos aqui, e que visitamos tudo e tudo examinamos;
diremos portanto como se falou e como se raciocinou sobre isso na terra". E
então o Padre disse: "Logo que os que são de nossa ordem ouviram essas
narrativas, eles as trataram de visões, e em seguida de ficções, depois disseram
que ele tinha visto fantasmas e enfim hesitaram, e disseram: Acreditai se
quiserdes; quanto a nós, até ao presente temos ensinado que o homem, depois
da morte, não estará em um corpo antes do dia do julgamento final". E
perguntou-se ao Padre se não havia entre eles alguns homens Inteligentes que
pudessem -lhes demonstrar e lhes fazer reconhecer esta verdade, que o homem
vive homem depois da morte". O Padre respondeu: "H á quem demonstre, mas
não o crêem; os que o demonstram dizem que é contra a sã razão crer que o
homem não vive homem antes do dia do julgamento final, e que Alma
esperando esse dia, está sem corpo; o que é então a Alma, e onde está ela
145

durante esse tempo? Será um sopro, ou um vento que esvoaça no ar, ou um ser
encerrado no centro da terra? O nde é o seu Alguma parte (Pu)? Será que as
Almas de Adão e Eva, e de todos que viveram depois deles, há mais de seis mil
anos ou sessenta séculos, esvoaçam ainda no U niverso, ou são mantidas
encerradas no centro da terra, e esperam o julgamento final? O que há de mais
penoso e de mais miserável do que tal espera? A sua sorte não poderia ser
comparada à sorte dos que estão na prisão com ferros, nas mãos e nos pés? Se
tal fosse a sorte que espera o homem depois da morte, não seria melhor nascer
asno do que nascer homem? N ão é também contra a razão crer que a alma
pode ser de novo revestida com seu corpo? O corpo não foi roído pelos vermes,
pelos ratos, pelos peixes? E ossos queimados ao sol ou reduzidos a pó poderiam
reentrar nesse novo corpo? Como matérias cadaverosas e infectas se juntariam e
se uniriam às, almas? A estes raciocínios, os que os ouvem, nada respondem de
razoável, mas ficam presos à sua fé. Q uando à reunião de todos os mortos
saindo dos túmulos no dia do julgamento final, dizem: Isso é obra da
O nipotência; e quando falam na O nipotência e na Fé, a razão é banida; e posso
dizer que então a sã razão é como nada,e para alguns deles como um espectro e
podem mesmo dizer à sã razão: "T u desarrazoas". A estas palavras, os Sábios da
G récia disseram: "Estes paradoxos não se dissipam por si mesmos como
contraditórios? E entretanto hoje no M undo não podem ser dissipados pela sã
razão; que se pode crer de mais paradoxal do que o que é contado do
Julgamento Final, que o U niverso perecerá, e que então as estrelas do céu
cairão sobre a terra, que é menor do que as estrelas; e que os corpos dos
homens então, ou cadáveres, ou múmias trituradas pelos homens, ou reduzidos
a nada, serão reunidas às suas almas? N ós, quando estávamos no M undo,,
acreditávamos na imortalidade das almas dos homens pelas induções que a
razão nos fornecida; e além disso designávamos para os bem-aventurados
lugares que chamávamos Campos Elísios; e acreditávamos que essas almas eram
efígies ou formas humanas, mas tênues porque eram espirituais". Depois de
terem assim falado, voltaram-se para o segundo recém-vindo, que no M undo
havia sido político; este confessou que não tinha acreditado na vida depois da
morte, e que a respeito das cousas de que ouviu falar tinha pensado que eram
ficções e invenções: "M editando sobre esta vida futura, eu dizia: T udo que
pertence ao homem não está estendido morto no tumulto? Seus olhos não estão
aí, como pode ele ver? Seus ouvidos não estão aí, como pode ele ouvir? De
onde tiraria uma boca para falar? Se alguma co,usa do homem vivesse depois da
morte, seria outra cousa senão um espectro? Como um espectro pode comer e
beber, e como pode gozar a delícia conjugal? O nde obteria roupas, uma casa,
alimentos e o resto? E os espectros que são efígies aéreas, aparecem como se
existissem e entretanto não existem. Eu tinha no M undo estes pensamentos e
outros semelhantes sobre a vida dos homens depois da morte; mas agora que vi
tudo, e tudo toquei com as minhas mãos, estou convencido, pelos próprios
sentidos, de que sou homem como no M undo, a ponto de não saber outra
146

cousa senão que vivo como vivia, com a diferença de que agora minha razão é
mais sã; muitas vezes tenho tido vergonha dos meus pensamentos anteriores".
O Filósofo contou sobre ele as mesmas cousas, com esta diferença entretanto,
que havia classificado estas novidades, que ouviu dizer sobre a vida depois da
morte,no número das opiniões e das hipóteses que tinha recolhido dos Antigos
e dos M odernos. O s Sophi estavam estupefatos com o que acabavam de ouvir;
e os que eram da Escola de Sócrates disseram que por estas N ovidades da terra,
eles percebiam que os interiores das mentes humanas tinham sido
progressivamente fechados, e que agora no M undo a fé do falso brilha como a
verdade, e a engenhosidade extravagante como a sabedoria, e que a luz da
sabedoria, desde os tempos em que eles viviam no M undo tinha baixado dos
interiores do Cérebro para a boca abaixo do nariz, onde esta luz se mostra
diante dos olhos como brilho do lábio, e por conseguinte a linguagem da boca
como sabedoria. Depois de ter ouvido estas cousas, um dos discípulos desta
escola disse: "Q uão estúpidas são hoje as mentes dos habitantes da terra!" O h!
se tivéssemos aqui Discípulos de Demócrito e de H eráclito, dos quais uns riem
de tudo,e os outros se lamentam por tudo,quantos risos e quantas lamentações
ouviríamos!" Esta sessão da Assembléia tendo sido suspensa, deram aos três
N oviços da terra sinais de sua autoridade; eram lâminas de cobre sobre as quais
H ieróglifos estavam gravados; e os N oviços se retiraram com estas lâminas.
183 - Segundo M emorável: Apareceu-me na plaga oriental um B osque de
palmeiras e de loureiros dispostos em curvas de hélices; aproximei-me e entrei,
e percorri aléas que me fizeram fazer a volta de algumas destas curvas, e ao fim
das aléas vi um Jardim que ocupava o meio do Bosque; havia uma pequena
ponte que fazia separação, e lá uma porta do lado do Bosque; e uma porta do
lado do Jardim; aproximei-me e as portas foram abertas pelo guardião;
perguntei-lhe qual era o nome do Jardim, e ele disse: "Adramandoni, isto é, a
delícia do amor conjugal". Entrei, e eis, oliveiras e entre as oliveiras cepas
subiam e pendiam, e em baixo delas e entre elas arbustos, floridos. N o meio do
Jardim havia um círculo de grama, sobre o qual estavam sentados maridos e
esposas, e também rapazes e virgens, dois a dois; e no meio do círculo, um
terreno elevado onde uma fonte lançava água para o alto só pela força de sua
nascente. Q uando cheguei perto do círculo, vi dois Anjos,, vestidos de púrpura
e escarlata, que falavam com os que estavam sentados sobre a grama, e falavam
da origem do Amor conjugal e de suas delícias; e como este amor era o assunto
da palestra, havia atenção ávida, e plena recepção, e em conseqüência exaltação
como pelo fogo do amor no discurso dos anjos. Eis em suma, o que recolhi de
sua palestra: falaram a princípio da dificuldade de descobrir e da dificuldade de
perceber a origem do amor conjugal, porque esta O rigem é Divino-Celeste,
pois é o Divino, Amor, a Divina Sabedoria e o Divino U so, que procedem, os
três, como um Senhor, e em conseqüência influem como um nas almas dos
homens, e pelas almas nos suas mentes, e daí nas afeições e nos pensamentos
interiores, por eles nos desejos que provêm do corpo, e por estes desejos pelo
147

peito na R egião genital, onde todos os derivados da primeira origem estão


juntos, e constituem com os sucessivos o amor conjugal. Em seguida os Anjos
disseram:"Procedamos agora por perguntas e respostas, pois a percepção de um
assunto, recebido só pelo ouvido, influi, é verdade, mas não permanece, a não
ser que aquele que escuta pense assim por si mesmo, e não faça perguntas".
Então alguns desta Assembléia Conjugal disseram aos Anjos: "O uvimos que a
O rigem do Amor conjugal é Divino-Celeste, porque vem do Senhor pelo
influxo nas almas dos homens; e que, como vem do Senhor, é o Amor, a
Sabedoria e o U so, que são três essências fazendo juntas uma única Essência
Divina,e que cousa alguma que não seja da Essência Divina não pode proceder
d'Ele, nem influir no íntimo do homem, que é chamado sua alma; e que estes
três descendo no corpo são mudados em cousas análogas e correspondentes;
agora, pois, perguntaremos primeiro o que é entendido pelo terceiro Essencial
procedente Divino,que é chamado U so".O s Anjos responderam: “O Amor e a
Sabedoria sem o U so são unicamente idéias abstratas do pensamento, que
também, depois de ter permanecido algum tempo na mente, passam como
sopros; mas estes, dois são recolhidos no uso e aí se tornam este um, que é
chamado o real; o amor não pode ficar sem agir, pois o amor é o ativo mesmo
da vida; a sabedoria também não pode existir nem subsistir, senão pelo amor e
com o amor quando ele age, e o ato é o uso; portanto nós definimos o uso
assim: Fazer o bem do amor pela Sabedoria; o U so é o B em mesmo. Pois que
estes três,o Amor,a Sabedoria,e o U so,influem nas almas dos homens pode-se
ver porque se diz que todo bem vem de Deus; pois tudo que é feito do amor
pela sabedoria é chamado bem, e o uso é também o que foi feito. -0 que é o
amor sem a sabedoria, senão uma espécie de loucura? e o que é o amor com a
sabedoria sem o uso, senão um sopro da mente? M as o amor e a sabedoria com
o uso não somente fazem o homem, mas também são o homem; e mesmo, o
que talvez vos, admirará, eles propagam o homem; pois, na semente do
homem, há sua alma em perfeita forma humana, velada de substâncias dentre
as mais puras da natureza, pelas quais é formado o corpo no útero da mãe; este
U so é o U so supremo e final do Divino Amor pela Divina Sabedoria". Por fim
os Anjos disseram: "A nossa conclusão será esta: T oda frutificação, vem
originariamente de um influxo do amor, da sabedoria e do uso do Senhor nas
almas dos homens, de um influxo ainda mais mediato nos íntimos dos vegetais;
e todas estas coisas se fazem nos últimos pelos primeiros. Q ue as frutificações,
as propagações e as prolificações sejam continuações da criação, isso é evidente;
pois uma criação não pode ser feita senão do Divino Amor pela Divina
Sabedoria no Divino U so; é por isso que todas as cousas no U niverso são
procriadas e formadas pelo uso, no uso e para o uso. Em seguida os que
estavam sentados sobre leitos de grama perguntaram aos Anjos donde vinham
as delícias do Amor conjugal, que são inúmeras e inefáveis. O s Anjos
responderam:"Elas vêm dos U sos do amor e da sabedoria, e pode-se vê-lo, pelo
fato de que quanto mais alguém ama tornar-se sábio para um uso, tanto mais
148

está na veia e na força do amor conjugal; e que quanto mais está nesta veia e
nesta força, tanto mais está nas delícias; o uso faz isso, porque o amor e a
sabedoria se deleitam nele, e brincam, por assim dizer como crianças; e à
medida que crescem, se conjuntam. alegremente, o que acontece como por
noivados, núpcias, casamentos e propagações, e isso continuamente com
variedade durante a eternidade: estas coisas acontecem entre o amor e a
sabedoria interiormente no uso; todavia, estas delícias em seus princípios são
não perceptíveis; mas tornam-se de mais em mais perceptíveis, à medida que
descem daí por graus, e entram no corpo; entram por graus da alma nos
interiores da mente do homem, e dos interiores em seus exteriores, e destes no
peito, e do peito na região genital; estes jogos núpcias celestes na Alma não são
em coisa alguma percebidos pelo homem, mas se insinuam de lá nos interiores
da mente sob uma espécie de paz e de inocência, e nos exteriores da mente sob
uma espécie de beatitude, de satisfação e de prazer, mas no peito sob uma
espécie de delícia de íntima amizade, e na região genital, pelo influxo contínuo
vindo da alma com o sentido mesmo do amor conjugal, como delícia das
delícias.Estes jogos núpcias do amor e da sabedoria no uso na Alma,avançando
para o peito, permanecem e se fixam de uma maneira sensível sob uma
variedade infinita de delícias; e, em razão da admirável comunicação do peito
com a região genital, as delícias aí se tornam as delícias do amor conjugal, as
quais foram elevadas acima de todas as delícias, que existem no Céu e no
M undo, porque o U so do amor conjugal é o mais eminente de todos os usos,
pois por ele existe a procriação do G ênero H umano, e pelo G ênero H umano, o
Céu Angélico". O s Anjos acrescentaram que aqueles que não estão pelo Senhor
no amor da sabedoria para o U so, não sabem cousa alguma concernente à
variedade das delícias inumeráveis que pertencem ao amor verdadeiramente
conjugal; com efeito aqueles que não amam estar na sabedoria pelas verdades
reais, mas que amam estar na loucura pelos falsos, e que por esta loucura de
algum amor fazem maus usos, o caminho para a alma foi fechado, de onde
resulta que estes jogos celestes do amor e da sabedoria na alma, cada vez mais
interceptados, cessam, e ao mesmo tempo que eles o amor conjugal em sua
veia, seu poder e suas delícias". Então os que escutavam disseram que
percebiam que o amor conjugal é segundo o amor de se tornar sábio para fazer
usos pelo Senhor. O s Anjos responderam que isso era assim. E então sobre as
cabeças de alguns apareceram coroas de flores, e eles perguntaram: "Por que
isso?" O s Anjos disseram "Porque eles compreenderam mais profundamente".
E então saíram do Jardim,e estes no meio deles.
149

Da mudança de estado da vida


nos homens e nas mulheres pelo
casamento

184 - O que é entendido pelos estados da vida e pelas mudanças de estado é


bem conhecido dos Eruditos e dos Sábios, mas não é conhecido pelos
ignorantes e pelos simples, é preciso portanto dizer primeiro alguma cousa a
respeito. O Estado da vida do homem é sua Q ualidade; e como há em cada
homem duas faculdades que constituem a vida, e que são chamados o
Entendimento e a V ontade,o estado da vida do homem é sua qualidade quanto
ao Entendimento e quanto à V ontade, daí é evidente que pelas M udanças de
estado da vida, entende-se as mudanças de qualidade quanto às cousas que
pertencem à vontade.Q ue todo homem,quanto ao que pertence a uma e outra
faculdade, seja continuamente mudado, mas com uma diferença de variedades
antes do casamento e depois do casamento, é isso que se trata de demonstrar
nesta Seção,o que será feito nesta ordem:I.O Estado da vida do homem desde
a infância até ao fim da vida, e em seguida na eternidade é continuamente
mudado. II. Igualmente a forma interna, que é a de seu Espírito. III. Estas
mudanças são umas nos H omens e outras nas M ulheres, pois que por criação
os H omens são formas da ciência, da inteligência e da sabedoria, e as M ulheres
são Formas do amor destas cousas nos homens. IV . N os H omens há elevação
da mente em uma luz superior, e nas M ulheres elevação do mental em um
calor superior; e a M ulher sente as delícias de seu calor na luz do H omem. V .
O s Estados da vida são uns para os homens e para as mulheres antes do
casamento, e outros depois do casamento. V I. O s Estados da vida depois do
casamento nos esposos são mudados e se sucedem segundo as conjunções de
seus mentais pelo amor conjugal. V II. O s Casamentos também introduzem
outras formas nas almas e nas mentes dos Esposos. V III. A M ulher é
efetivamente formada Esposa do homem segundo, a descrição do Livro da
Criação.IX .Esta formação se faz da parte da Esposa por meios secretos, e isso é
entendido pelo fato da mulher ter sido criada enquanto o homem dormia. X .
Esta Formação da parte da Esposa se faz pela conjunção de sua vontade com a
vontade interna do Esposo. X I. O fim disso, é que à vontade de um e a do
outro se tornem uma única V ontade,e que assim sejam os dois um só H omem.
X II. Esta formação da parte da Esposa se faz pela apropriação das afeições do
M arido. X III. Esta Formação da parte da Esposa se faz pela recepção das
propagações da alma do M arido, com a delícia tirando sua fonte do fato dela
150

querer ser o Amor da sabedoria de seu marido. X IV . Assim uma V irgem é


transformada em Esposa, e um M ancebo em M arido. X V . N o Casamento de
um homem com uma Esposa entre os quais existe o amor verdadeiramente
conjugal, a Esposa se torna cada vez mais Esposa e G M arido cada vez mais
M arido. X V I. Do mesmo modo também progressivamente suas formas se
aperfeiçoam e se enobrecem pelo interior. X V II. O s filhos nascidos de dois
esposos que estão no amor verdadeiramente conjugal, herdam de seus Pais o
Conjugal do bem e do vero, donde lhes vêm a Inclinação e a Faculdade, se é
um filho, para perceber as cousas que pertencem à sabedoria, e se é uma filha,
para amar as cousas que a sabedoria ensina. X V III. Isso acontece, porque a
alma da criança vem do Pai, e o invólucro dessa alma vem da M ãe. Segue agora
a explicação destes Artigos.
185 – I.O Estado da vida do,homem desde a infância até ao fim de sua vida, e
em, seguida na eternidade, é continuamente mudado. O s Estados comuns da
vida do homem são chamados, Infância, Juventude, Adolescência, V irilidade e
V elhice; que cada homem, cuja vida é demorada no M undo, passa
sucessivamente de uma idade para outra, assim do primeiro ao último, isso é
sabido; as transições destas idades não são aparentes, a não ser por meio de
espaços de tempo decorridos; que entretanto elas sejam progressivas de
momento a momento, assim continuamente, a razão a vê; pois dá~se com o
homem como com a árvore, que a cada pequeno espaço de tempo, mesmo o
menor, desde que a semente foi lançada na terra, cresce e aumenta; estas
progressões momentâneas são também M udanças de estado, pois a subseqüente
acrescenta à antecedente alguma cousa que aperfeiçoa o estado. As M udanças
que se fazem nos Internos do homem são mais perfeitamente contínuas que as
que se fazem nos Externos; e isso porque os Internos do homem, pelos quais
são entendidas as cousas que pertencem a sua M ente ou a seu Espírito, foram
elevadas acima dos Externos em um grau superior, e que nos Internos, que
estão com um grau superior, se fazem milhares no mesmo instante em que não
se faz mais que uma nos Externos. As M udanças, que se fazem nos Internos,
são mudanças de estado da vontade quanto às afeições, e mudanças de estado
do entendimento quanto aos pensamentos; estas mudanças sucessivas de estado
das afeições e dos pensamentos são o que é especialmente entendido na
Proposição. Q ue estas mudanças de estado destas duas vidas ou faculdades
sejam perpétuas, desde a infância no homem até ao fim de sua vida, e em
seguida na eternidade, é porque não há fim para a ciência, e com mais forte
razão para a inteligência, e com bem mais forte razão para a sabedoria; pois em
sua extensão há infinidade e eternidade pelo Infinito e o Eterno de que
procedem. Daí vem este princípio filosófico dos antigos que tudo é divisível ao
infinito; é preciso acrescentar que igualmente tudo é multiplicável ao infinito.
O s Anjos afirmam que pelo Senhor eles são aperfeiçoados em sabedoria
eternamente, o que é também ao infinito, porque o eterno é o infinito do
tempo.
151

186 - II.Igualmente a Forma interna do homem que é a do seu espírito.


Se esta forma é continuamente mudada do mesmo modo que é mudado o
estado da vida do homem,é porque coisa alguma existe senão em uma forma, e
o estado reveste esta forma; é portanto a mesma cousa, quer se diga que o
estado da vida do homem é mudado, quer se diga que sua forma é mudada.
T odas as afeições e todos os pensamentos do homem estão em formas, pois as
formas são seus objetos- se as afeições e os pensamentos não estivessem em
objetos, que foram formados, haveria também crânios vazios de miolos; o que
seria a mesma cousa que supor a vista sem o olho, a audição sem o ouvido, e o
paladar sem a língua; sabe-se que o olho, o ouvido e a língua são os objetos
destes sentidos,e que estes objetos são formas.Q ue no homem o estado da vida
seja, continuamente mudado, e por conseguinte a forma, é porque é uma
verdade que ensinaram e que ensinam ainda os sábios, que não existem
identidade absoluta entre duas cousas nem com mais forte razão entre muitas;
como não há duas faces humanas que sejam iguais, nem com mais forte razão
muitas; dá-se o mesmo com os sucessivos, não há um estado da vida que seja o
mesmo que o precedente; donde resulta que há no homem uma perpétua
mudança de estado da vida, e por conseqüência também uma perpétua
mudança de forma, principalmente de seus internos. M as como estas
considerações nada ensinam a respeito dos casamentos, mas unicamente
preparam o caminho para os conhecimentos que os concernem; além disso
também, como não são mais que pesquisas filosóficas do entendimento, que
são de difícil percepção para algumas pessoas, será por conseqüência passado
adiante sem nada mais acrescentar.
187 - III. Estas mudanças são umas nos H omens e outras nas M ulheres, pois
que por criação os H omens são Formas da ciência, da inteligência e da
sabedoria,e as M ulheres formas do amor destas coisas nos homens.
Q ue os homens tenham sido criados Formas do entendimento, e que as
M ulheres tenham sido criadas Formas do amor do entendimento dos homens,
vê-se explicado no n. 90. Q ue as mudanças de estado, que se sucedem nos
homens e nas mulheres desde a infância até à idade madura, sejam para renovar
as formas,a forma intelectual nos homens,e a forma voluntária nas mulheres, é
uma conseqüência disso; daí, é evidente que as mudanças de estado são umas
nos homens, e outras nas mulheres; em uns e outros, entretanto, a, forma
externa que pertence ao corpo é renovada segundo o renovamento da forma
interna, que pertence à mente, pois a mente age no corpo, e não vice-versa; eis
porque as Crianças no Céu se tornam homens em estatura e em beleza segundo
os acréscimos da inteligência neles, de modo completamente diferente das
crianças na terra,porque estas são envolvidas com um corpo material, como, os
animais; há entretanto conformidade nisto, que a princípio elas crescem. na
inclinação para as cousas que agradam os sentidos do seu corpo, depois pouco a
pouco para as que afetam o sentido interno cogitativo, e de grau em grau, para
152

as que enchem de afeição a vontade; e quando estão a meio caminho entre à


idade madura e a que não o é, chega a inclinação conjugal, que é a da jovem
pelo jovem, e do jovem pela jovem; e como nos Céus, do mesmo modo que
nas terras, as jovens escondem, por uma prudência inata, suas inclinações para
o casamento, os jovens não sabem outra cousa senão que são eles que afetam
com amor as jovens, e isso também lhes aparece por conseguinte da incitação
masculina; mas esta incitação neles vem também do influxo do amor
procedente do belo Sexo, influxo de que se tratará especialmente em outra
parte. Por estas explicações vê-se a verdade desta Proposição, que as mudanças
de estado são umas nos homens e outras nas mulheres, pois que por criação os
homens são formas de ciência, de inteligência e de sabedoria, e as mulheres
formas do amor destas cousas nos homens.
188 - IV . N os H omens há elevação da mente em uma luz superior, e nas
M ulheres elevação da mente em um,calor superior; e a M ulher sente as delícias
de seu calor na luz do H omem.
Pela luz na qual se elevam os homens, é entendida a inteligência e a sabedoria,
porque a Luz espiritual, que procede do Sol do M undo espiritual, Sol que em
sua essência é Amor, faz uma mesma, cousa ou faz um com a inteligência e a
sabedoria; e pelo calor no qual se elevam as mulheres, é entendido o amor
conjugal porque o calor espiritual, que procede do Sol do M undo espiritual, é
em sua essência o amor, e nas mulheres é o amor conjuntando-se com a
inteligência e a sabedoria nos homens. Amor que em seu complexo é chamado
amor conjugal, e por determinação se torna esse amor. Foi dito elevação em
uma luz superior e em um calor superior, porque é a elevação na luz e no calor
onde estão os anjos dos céus superiores; há também elevação atual como de um
nevoeiro no ar, e da região inferior do ar à região superior, e desta ao éter; por
isso a elevação, a uma luz superior nos homens é a elevação a uma inteligência
superior, e desta à sabedoria, na qual há também uma elevação de mais em
mais superior; mas a elevação a um calor superior nas mulheres é a elevação a
um amor conjugal mais casto e mais puro, e continuamente para o conjugal,
que por criação é mantido escondido em seus íntimos. Estas elevações,
consideradas em si mesmas, são aberturas da mente; pois a M ente humana é
distinguida em R egiões, como o M undo o é em R egiões quanto às Atmosferas,
das quais a mais baixa é aquosa; uma mais elevada, aérea; uma ainda mais
elevada, etérea, acima da qual há também a suprema; em regiões semelhantes é
elevada a M ente do homem, conforme é aberta, nos homens pela, sabedoria, e
nas mulheres pelo amor verdadeiramente conjugal.
189 - Foi dito que a M ulher sente as delícias de seu calor na luz do homem,
isso é entendido neste sentido, que a mulher sente as delícias de seu, amor na
sabedoria do homem,porque a sabedoria é o receptáculo,e por toda parte onde
o amor encontra um receptáculo que lhe corresponde, está em seus prazeres e
em suas delícias; mas não é entendido que o calor com sua luz se deleita fora de
153

formas, mas é dentro de formas; e o calor espiritual com a luz espiritual aí se


deleita tanto mais quanto mais estas formas pela sabedoria e o amor são vitais e
por conseqüência aptas a receber.Isto pode ser ilustrado de alguma forma pelos
jogos, assim chamados, do calor com a luz nos vegetais; fora dos vegetais há
apenas uma simples conjunção do calor e da luz, mas dentro há como um jogo
entre eles, porque aí estão em formas e receptáculos, pois os atravessam por
admiráveis meandros, e aí nos íntimos aspiram aos frutos do uso, e exalam
também seus encantos ao longe no ar, que enchem com um odor suave; ora as
delícias do calor espiritual com a luz espiritual têm lugar de uma maneira ainda
mais marcante nas formas humanas, em que este calor é o amor conjugal e esta
luz é a sabedoria.
190 - V . O s Estados da vida são uns para os homens e para as mulheres antes
do Casamento,e outros depois do Casamento.
Antes do Casamento em um e outro sexo há dois estados, um antes da
inclinação ao casamento e outro depois; as mudanças de um e outro estado, e
por conseguinte as formações da mente,procedem em ordem sucessiva segundo
seus contínuos acréscimos; mas não é aqui o lugar para descrever estas
mudanças pois elas são varia das e diversas nos objetos; as inclinações na mente,
e se tornam cada vez mais sensitivas no corpo; mas seus estados após o
casamento são estados de conjunção e também de prolificação; que estes estados
diferem dos precedentes como os efeitos diferem das intenções,isso é evidente.
191 - V I. O s Estados da vida após o casamento nos esposos são mudados
segundo as conjunções de suas mentes pelo amor conjugal.
Q ue as mudanças e as sucessões de estado após o casamento, em um e no
outro, o marido e a esposa, sejam segundo o amor conjugal neles, assim, ou
conjuntivo ou disjuntivo das mentes, é porque o amor conjugal é não somente
variado, mas também diverso nos esposos; variado, naqueles que se amam
interiormente, pois neles há por vezes intermitências, não obstante
permanecerem por dentro constantemente em seu calor; mas é diverso nos
esposos que não se amam, senão exteriormente, nestes não é por causas
semelhantes que há às vezes intermitências, mas é por alternativos de frio e de
calor: a razão destas diferenças é que nestes o corpo ocupa o primeiro lugar, e
seu ardor se espalha em torno, e arrasta à comunhão com ele os inferiores do
mental; mas entre os que se amam interiormente a mente ocupa o primeiro
lugar e leva o corpo à comunhão com ela. Parece que o amor sobe do corpo à
alma, pois logo que o corpo apreende os atrativos, ele entra pelos olhos,, como
por portas na mente, e assim pela vista, como vestíbulo, nos pensamentos e
imediatamente na alma; mas entretanto acontece que ele desce da mente, e age
nos inferiores segundo sua disposição; é por isso que uma mente lasciva age
lascivamente, e uma mente casta castamente, e esta dispõe o corpo, mas aquela
é disposta pelo corpo.
154

192 - V II. O s Casamentos também introduzem outras formas nas almas e nas
mentes dos Esposos.
Q ue os casamentos introduzem outras formas nas almas e nas mentes, não se
pode notar no M undo natural, porque as almas e as mentes aí estão envolvidas
por um corpo material, através do qual a mente raramente se faz ver; e, além
disso, os homens deste século, muito mais que os antigos, aprendem desde a
infância a introduzir em suas faces uma fisionomia pela qual escondem
profundamente as afeições da mente; é isto que faz com que não se possa
discernir quais são as formas das mentes antes do casamento, e quais elas são
após o casamento: que entretanto as, formas das almas e das mentes sejam após
os casamentos outras que não eram antes, é o que se torna bem manifesto pelas
mesmas no M undo espiritual; pois são então: Espíritos e Anjos, os quais não
são outra cousa que M entes e Almas em forma humana, desprendidos dos
despojos que tinham sido compostos de elementos aquosos e terrestres, e de
vapores emanados desses elementos e espalhados de todos os lados no ar; estes
despojos sendo rejeitados,as formas das mentes são vistas tais quais tinham sido
no interior de seus corpos; e então é bem evidente que são umas, nos que
vivem no casamento,e outras nos que não vivem nele. Em geral os esposos têm
uma beleza interior de fisionomia, pois o esposo tira da esposa o gracioso rubor
de seu amor, e a esposa tira do esposo a brilhante brancura de sua sabedoria;
pois lá os dois esposos são unidos quanto às almas; e, além disso, em um e
outro se manifesta a plenitude humana; isso acontece no Céu, porque não há
Casamentos em outra parte; abaixo do Céu só há uniões conubiais, que se
formam e se rompem.
193 - V III. A M ulher é na realidade formada Esposa segundo a descrição do
Livro da Criação. N este Livro se diz que a mulher foi criada de uma costela do
marido; e que, quando ela foi levada ao homem, ele disse: "Esta é osso dos
meus ossos e carne da minha carne; e será chamada Ischah (Esposa), porque de
Isch (0 M arido, vir) foi tomada". (Cap. 11, 21, 22, 23); na Palavra, por uma
Costela do peito, não é significada, no sentido espiritual, outra coisa senão a
V erdade natural; este vero é significado pelas costelas que o urso carregava
entre os dentes (Daniel, V II, 5); pois pelos ursos são significados os que lêem a
Palavra no sentido natural, e vêem os veros sem o entendimento; pelo Peito do
homem é entendido este essencial e o próprio que é distinguido do peito da
mulher; que seja a sabedoria, vê-se acima, n. 187; pois o vero sustenta a
sabedoria,como a costela sustenta o peito; é isto que é significado, porque é no
Peito que todas as cousas do homem estão como em seu centro. Por isso, é
evidente que a mulher foi criada do homem pela transferência da própria
sabedoria deste, isto é, pelo vero, natural; que o amor deste vero tenha sido
transferido do homem para a mulher, para se tornar amor conjugal; e que isso
tenha sido feito para que no homem houvesse não o amor de si, mas o amor da
esposa; esta, pelo seu caráter inato não pode fazer outra cousa senão
155

transformar no homem o amor de si em amor do homem por ela mesma, e fui


informado que isso se faz pelo amor mesmo da esposa, sem que o esposo o
saiba, nem a esposa, também daí vem que alguém, que está no fasto da própria
inteligência pelo amor de si, jamais pode amar sua esposa de uma maneira
verdadeiramente conjugal. Q uando este arcano da criação da mulher do
homem é compreendido, pode-se ver que a mulher é igualmente como que
criada ou formada do homem no casamento, e que isso é feito pela esposa, ou
antes por meio da esposa pelo Senhor, que infundiu nas mulheres as incli-
nações para agir assim; pois a esposa recebe em si a imagem do esposo; por isso
ela se apropria de suas afeições, ver acima n. 183; e por isso ela conjunta a
vontade interna do esposo com a sua,assim como será mostrado; e também por
isso ela se apropria as produções (propagines) da alma do esposo, como será
mostrado também. Por estas explicações é evidente que, conforme a descrição
interiormente entendida do Livro da Criação, a mulher é formada esposa pelas
cousas que tira do marido e do peito do marido,e que ela inscreve em si.
194 - IX . Esta Formação se faz da parte da Esposa por meios secretos, e isso é
entendido por ter sido a mulher criada enquanto o homem dormia.
Lê-se no Livro da Criação que Jehovah Deus fez cair um sono pesado sobre
Adão, para que dormisse, e então tirou uma de suas costelas, e a erigiu em
mulher, (Cap. II, 21, 22). Q ue pelo entorpecimento e o sono do homem, seja
significada sua completa ignorância de que a esposa é formada e como que
criada dele, isso é evidente pelo que foi mostrado, no Capítulo precedente, e
também neste sobre a prudência e a circunspecção impressa nas esposas para
nada divulgar de seu amor nem da apropriação das afeições da vida do marido,
nem por conseqüência da transcrição da sabedoria nelas; que isso se faça da
parte da esposa, com o desconhecimento e como que durante o sono do
marido, assim por meios secretos, isso é evidente pelo que foi explicado acima,
ns.166,167,168,e seguintes; onde é mesmo ilustrado que a prudência de agir
assim foi implantada nas mulheres por criação e conseqüentemente de
nascença, por motivos, que são necessidades, a fim de que o amor conjugal, a
amizade e a confiança, e assim a beatitude da coabitação e a felicidade da vida,
sejam asseguradas; é por isso que a fim de que isso se faça segundo as regras, foi
determinado ao marido que deixasse pai e mãe e se unisse à sua esposa,
(G ênesis 11, 24, M ateus X IX , 4, 5); pelo pai e a mãe que o marido deixará, é
entendido no sentido espiritual o próprio da vontade e o próprio do
entendimento, ora o próprio da vontade do homem é de se amar, e o próprio
de seu entendimento é de amar a sua sabedoria, e por unir-se é entendido se
votar ao amor da esposa; que estes dois Próprios sejam males mortais para o
marido se permanecerem nele, e que o amor destes dois próprios seja mudado
em amor conjugal,conforme o marido se une à esposa,isto é, recebe o amor da
esposa, vê-se acima, n. 193 e em outros lugares. Q ue por dormir, seja
significado estar na ignorância e na inconsciência; pelo pai e a mãe, os dois
156

próprios do homem, um da vontade e o outro do entendimento; e que por


unir-se, votar-se ao amor de alguém, pode-se confirmá-lo suficientemente por
passagens em várias partes da Palavra,mas não é aqui o lugar (apropriado).
195 - X . Esta Formação da parte da Esposa se faz pela conjunção de sua
vontade com a vontade interna do esposo.
Q ue no esposo haja a sabedoria racional e a sabedoria moral, e que a esposa se
conjunte com as coisas que pertencem à sabedoria moral no esposo, vê-se nos
ns. 163, 164, 165; as cousas que pertencem a sabedoria racional constituem o
entendimento do esposo, e as que pertencem a sabedoria moral constituem sua
vontade; a esposa se conjunta com as que constituem a vontade do esposo:
dizer que a esposa se conjunta, ou dizer que ela conjunta a sua vontade à do
esposo,é a mesma cousa, porque a esposa nasce voluntária, e por conseguinte o
que ela faz, o faz pela vontade. Se se diz "com a vontade interna do esposo", é
porque a vontade do esposo tem sua sede em seu entendimento, e o intelectual
do homem é o íntimo da mulher, segundo o que foi exposto concernente à
formação da mulher pelo homem, acima, n. 32, e várias vezes depois; os
homens têm também uma vontade externa, mas esta participa muitas vezes do
fingimento e da dissimulação; a esposa a distingue claramente, mas não se
conjunta com ela,a não ser por fingimento ou para fazer um jogo.
196 - X I. O fim disso é que à vontade de um e a do outro se tornem uma só
V ontade,e assim sejam os dois um só H omem.
Com efeito, aquele que se conjunta à vontade de um outro se conjunta
também a seu entendimento; pois o entendimento considerado em si mesmo,
nada mais é que o ministro e o servidor da vontade; que assim seja, vê-se bem
claramente pela afeição do amor, pelo fato dela levar o entendimento a pensar
como lhe agrada; toda afeição do amor é uma propriedade da vontade; pois o
que o homem ama, ele o quer também; segue-se daí que aquele que se
conjunta com a vontade do homem se conjunta com todo o homem; daí vem
que foi implantado no amor da esposa unir a vontade do marido à sua vontade,
pois assim a esposa se torna o objeto do marido, e o marido o objeto da esposa;
assim os dois são um só homem.
197 - X II.Esta formação da parte da Esposa se faz pela apropriação das afeições
do marido. Este faz um com os dois Artigos que precedem, porque as afeições
pertencem à vontade; pois as afeições, que não são mais que derivações do
amor, formam a vontade, e a fazem e a compõem; mas nos homens elas estão
no entendimento,e nas mulheres na vontade.
198 - X III. Esta formação da parte da Esposa se faz pela recepção das
propagações da alma do marido, com a delícia, tirando sua fonte do fato da
esposa querer ser o amor da sabedoria do marido.
Isto coincide com o que foi explicado acima, ns. 172, 173; por isso uma maior
explicação é inútil. As delícias conjugais nas esposas tiram sua origem do fato
157

delas quererem ser um com os maridos, como o Bem é um com o V ero no


Casamento espiritual; que o Amor Conjugal descende deste Casamento, é o
que foi mostrado no Capítulo, que trata especialmente deste assunto; daí,
pode-se ver, como em efígie, que a esposa se conjunta ao esposo do mesmo
modo que o bem se conjunta ao vero, e que o esposo reciprocamente se
conjunta à esposa segundo a recepção do amor da esposa nele, do mesmo modo
que o vero se conjunta reciprocamente ao bem segundo a recepção do bem
nele; e assim o amor da esposa se forma pela sabedoria do esposo, do mesmo
modo que o bem se forma pelo vero; pois o vero é a forma do bem. De acordo
com isso, é ainda evidente que as delícias conjugais na esposa vêm
principalmente dela querer ser um com o marido,por conseqüência dela querer
ser o amor da sabedoria de seu marido; pois então ela sente as delícias de seu
calor na luz do homem,conforme a explicação dada no Artigo IV ,n.188.
199 - X IV . Assim uma virgem é transformada em esposa, e um rapaz em
marido.
Isto decorre, como conseqüência do que foi dito acima neste Capítulo e no
Capítulo precedente sobre a Conjunção dos Esposos em uma só carne. Se a
V irgem se torna ou é tornada esposa, é porque na esposa há cousas tomadas do
marido,e assim acessórios, que não estavam antes nela como virgem; se o rapaz
se torna ou é tornado marido,é porque no marido há coisas tomadas da esposa,
que exaltam a receptividade do amor e da sabedoria nele, e que não estavam
antes nele como rapaz; mas que isso acontece nos que estão no amor
verdadeiramente conjugal; que seja entre aqueles que sentem que pela união
são homens, e como uma só carne, vê-se no Capítulo, precedente, n. 178. Por
isto é evidente que o virginal é mudado naquilo que participa da esposa nas
mulheres, e o juvenil em marital nos homens. Q ue assim seja, é o de que tive
confirmação no M undo espiritual por esta experiência. Alguns maridos diziam
que a conjunção com uma mulher antes do casamento é semelhante a
conjunção com uma esposa depois do casamento. As esposas, tendo ouvido
estas palavras, ficaram muito indignadas, e disseram: "N ão há absolutamente
semelhança alguma,existe entre elas uma diferença como entre o quimérico e o
real". O s maridos replicaram: "N ão sois vós mulheres como antes". As esposas
responderam com uma voz mais elevada: "N ós somos, não mulheres, mas
esposas; vós estais em um amor quimérico, e não em um amor real; é por isso
que falais como insensatos". Então os maridos disseram: "Se ,não sois mulheres
(faminae), sois pelo menos mulheres casadas (mulieres) ". E elas responderam:
"N os primeiros tempos do casamento nós éramos mulheres casadas, mas agora
nós somos esposas (uxores) ".
200 - X V .N o Casamento de um homem com uma esposa,entre os quais existe
o amor verdadeiramente conjugal, a Esposa se torna cada vez mais esposa, e o
M arido cada vez mais marido.
Q ue o amor verdadeiramente conjugal conjunta cada vez mais os dois em um
158

só homem, vê-se acima, ns. 178, 179; e como a esposa se torna esposa pela
conjunção com o marido e segundo esta conjunção, dá-se o mesmo com o
marido em relação à esposa; e como o amor verdadeiramente conjugal dura
eternamente, segue-se que a esposa se torna cada vez mais esposa e o marido
cada vez mais marido; a razão mesma disso, é que no casamento de amor
verdadeiramente conjugal um e outro se tornam cada vez mais homem interior,
pois este amor abre os interiores de suas mentes, e conforme estes interiores são
abertos o homem se torna cada vez mais homem, e tornar-se mais homem, é na
esposa tornar-se mais esposa, e no marido tornar-se mais marido. O uvi dizer
pelos Anjos que a esposa se torna cada vez mais esposa, conforme o marido se
torna cada vez mais marido, mas não do mesmo modo vice-versa; porque
acontece raramente, para não dizer nunca, que uma esposa, casta não ame seu
marido, mas acontece que o retorno do amor falta da parte do marido, e este
retorno falta porque não há uma elevação da sabedoria que, unicamente, recebe
o amor da esposa, sobre esta sabedoria ver ns. 130, 163, 164, 165. M as eles
diziam isso dos casamentos nas terras.
201 - X V I. Do mesmo modo também sucessivamente suas formas se
aperfeiçoam e se enobrecem pelo interior.
H á forma humana muito perfeita e muito nobre, quando duas formas se
tornam pelo casamento uma única forma, assim quando duas carnes se tornam
uma só carne, segundo a criação; que então a M ente do esposo seja elevada a
uma luz superior, e a M ente da esposa, a um calor superior, e que então eles
cresçam, floresçam e frutifiquem como as árvores na estação da primavera,
vê-se acima, ns. 188, 189. Q ue do enobrecimento desta forma nasçam frutos
nobres,espirituais nos Céus,naturais nas terras,ver-se-á no Artigo seguinte.
202 - X V II. As Crianças nascidas de dois esposos que estão no amor
verdadeiramente conjugal, recebem de seus Pais o Conjugal do bem e do vero,
de onde lhes vêm a inclinação e a faculdade, se é um filho, para perceber as
cousas que pertencem à sabedoria, e se é uma filha, para amar as cousas que a
sabedoria ensina.
Q ue as crianças recebem dos pais as Inclinações para as cousas que pertenceram
ao amor e à vida dos pais, isso é muito conhecido em geral pelas histórias e em
particular pelas experiências; mas que não recebam deles ou não herdem deles
as afeições mesmas, nem por conseqüência suas vidas, mas unicamente as
inclinações e também as faculdades que as concernem, é o que foi posto em
evidência no M undo espiritual pelos sábios, de que se falou nos dois
M emoráveis referidos acima. Q ue pelas inclinações inatas, se não forem
quebradas, os descendentes sejam levados às afeições, aos pensamentos, às
expressões de linguagem e a vidas semelhantes às de seus pais, vê-se bem
claramente pela nação Judaica, pois hoje os judeus são semelhantes a seus Pais
no Egito,no deserto,na terra de Canaan, e no tempo do Senhor; e pelo fato de
que não somente são a si mesmos pela mente, mas ainda pela face; quem é que
159

à primeira vista não conhece um Judeu? Dá-se o mesmo com as outras raças.
Dai pode-se infalivelmente concluir que as crianças nascem com as inclinações
para cousas semelhantes àquelas para as quais os seus pais se inclinavam. M as a
fim de que os pensamentos e os atos não se continuem, é da Providência
Divina que as inclinações más possam ser retificadas; e para isso mesmo foi
implantado uma faculdade pela qual há eficácia na correção dos costumes pelos
pais e pelos professores, e mais tarde por si mesmo, quando se atingiu a idade
adulta.
203 - Foi dito, que as crianças recebem dos pais o Conjugal do bem e do vero,
porque este conjugal foi posto por criação na alma de cada um, pois é isso que
influi do Senhor no homem, e faz sua vida humana: mas este Conjugal passa
para as cousas que seguem desde a alma até aos últimos do corpo; mas em uns e
nos outros é mudado no caminho pelo homem mesmo de diversas maneiras, e
por vezes no oposto, que é chamado Conjugal ou Conubial do mal e do falso;
quando isso acontece, a M ente é fechada por baixo, e por vezes torcida como
uma espiral em sentido inverso; mas em alguns não é fechada, permanece meio
aberta por cima, e em alguns outros é aberta: é deste conjugal e daquele que as
crianças recebem dos pais as inclinações, de uma maneira os filhos e de uma
outra maneira as filhas:que isso venha do conjugal,é porque o amor conjugal é
o amor fundamental de todos os amores,como foi demonstrado acima,n.65.
204 - Se as crianças nascidas dos que estão no Amor verdadeiramente conjugal
recebem as inclinações e as faculdades, se é um filho, para perceber as cousas
que pertencem à sabedoria, e se é uma filha, para amar as cousas que a
sabedoria ensina, é porque o Conjugal do bem e do vero foi implantado, por
criação na alma de cada um e também nas cousas que derivam da alma; pois já
foi mostrado que este Conjugal enche o U niverso desde os primeiros até aos
últimos, e desde o homem até o verme; e foi também mostrado acima que a
faculdade para abrir os inferiores do mental até à conjunção com seus
superiores que estão na luz e no calor do céu, foi posto por criação em cada
homem; daí é evidente que a habilidade e a facilidade para conjuntar o bem ao
vero, e o vero ao bem por conseqüência a tornar-se sábio, são recebidos de
nascença em herança por aqueles que nasceram de um tal casamento, mais de
que por todos os, outros; que por conseqüência dá-se também o mesmo com a
habilidade e a facilidade de se compenetrar das coisas que pertencem à Igreja e
ao Céu; que o Amor conjugal tenha sido conjunto com estas cousas, é o que já
foi mostrado várias vezes.Por estas explicações a razão vê claramente o fim pelo
qual o Senhor Criador proveu e provê ainda aos Casamentos de amor
verdadeiramente conjugal.
205 - Fui informado pelos Anjos que aqueles que viveram nos tempos
antiqüíssimos vivem hoje nos Céus, distinguidos por casa, famílias e nações, do
mesmo modo que viviam nas terras, e que apenas falta algum em uma casa; e
que a razão disso é que entre eles havia o Amor verdadeiramente conjugal, e
160

que por conseguinte os filhos herdavam inclinações, para o Conjugal do bem e


do vero, e que eram facilmente iniciados cada vez mais interiormente por seus
pais por meio da educação, e introduzidos em seguida pelo Senhor como por si
mesmos,quando chegavam à idade do discernimento.
206 - X V III. Isso acontece assim, porque a alma da criança vem do pai, e o
invólucro dessa alma vem da mãe.
Q ue a alma vem do pai, nenhum homem sábio o põe em dúvida: é mesmo o
que se vê claramente pelas mentes (animi) e também pelas faces que são tipos
destas mentes, nos descendentes que procedem de pais de família em uma série
regular; pois o pai revém como efígie, senão nos filhos, ao menos em um dos
netos e bisnetos; e isso acontece, porque a alma constitui o íntimo do homem,
e este íntimo pode ser velado na primeira geração, mas não obstante se mostrar
e se revelar nas gerações seguintes. Q ue a alma vem do pai, e seu invólucro, da
mãe,é o que pode ser ilustrado por analogias no R eino vegetal, no qual a T erra
ou o H úmus é a mãe comum; esta recebe as sementes como em um útero, e
lhes dá o invólucro; e mesmo as concebe de algum modo, as carrega, as
engendra e as cria, como a mãe (faz com) suas progenituras provenientes do
pai.
207 - Ao que precede ajuntarei dois M emoráveis:
Primeiro M emorável: Algum tempo depois, dirigi o olhar para a Cidade de
Atenas, da qual se disse alguma cousa em um M emorável precedente, e ouvi,
proveniente de lá, um clamor extraordinário; havia nesse barulho alguma cousa
do riso, no riso alguma cousa da indignação, e na indignação alguma cousa da
tristeza; entretanto, nem por isso esse clamor era dissonante, mas havia
consonância, porque não era um som com um outro, mas era um som dentro
do outro; no M undo espiritual percebe-se distintamente no som a variedade e a
mistura das afeições. Perguntei de longe o que era; e me disseram: "chegou
uma mensagem do lugar onde aparecem primeiro os recém-vindos no M undo
Cristão, dizendo que lá tinham sabido de três recém-vindos, que no M undo de
onde chegaram acreditavam com todos os outros, que os que gozassem da
ventura e da felicidade depois da morte estariam em um repouso completo sem
trabalho algum, e que como as administrações, os empregos e as ocupações são
trabalhos, haveria repouso em relação a esses encargos; e como estes três
acabam de ser trazidos pelo nosso Emissário, e estão à parte e esperam,
elevou-se um clamor e depois de se ter deliberado a respeito,decidiu-se que eles
seriam introduzidos, não no Paladium sobre o Parnaso, como os precedentes,
mas no grande Auditório, para aí tornar conhecidas as suas N ovidades do
M undo Cristão; e alguns de nós fomos designados para introduzi-los com
solenidade". Como eu estava em espírito, e como para os espíritos as distâncias
são conforme os estados de suas afeições; e como então eu tinha a afeição de
vê-los e de ouvi-los, eu me vi lá presente, e os vi introduzir e os ouvi falar. O s
mais Antigos ou os mais Sábios se assentaram no Auditório dos lados, e todos
161

os outros estavam no,meio; e diante destes havia um estrado; foi para aí que os
três recém-vindos com a mensagem, acompanhados solenemente pelos mais
jovens foram conduzidos passando pelo meio do Auditório; e quando se fez
silêncio, eles foram saudados por um dos mais Antigos, e este lhes perguntou:
"Q ue há de novo na terra?" E eles disseram: "H á muitas N ovidades; mas diz,
por favor sobre qual assunto".E o Antigo respondeu:"Q ue há de novo na terra
a respeito de nosso mundo e do Céu?" E eles responderam: "Chegando
recentemente a este M undo, soubemos que aqui e no Céu há Administrações,
Cargos, Funções, Comércios, Estudo de ciências e O cupações admiráveis; e
entretanto tínhamos acreditado que após a nossa emigração ou translação do
M undo natural para o M undo espiritual, entraríamos em um repouso eterno
sem trabalho algum; ora, que são as funções senão trabalhos?" O Antigo, lhes
disse: "Será que por um repouso eterno sem trabalho algum entendestes uma
eterna ociosidade, na qual estaríeis continuamente assentados e deitados,
aspirando as delícias pelo peito, e sorvendo as alegrias pela boca?" A estas
palavras, os três R ecém-vindos sorrindo levemente disseram que se tinham
figurado alguma cousa semelhante; e então lhes foi dada esta resposta: “O que
têm as alegrias e as delícias, e por conseguinte a felicidade, de comum com a
ociosidade? Pela ociosidade a mente se abate e não se expande, ou antes o
homem cai em um estado de morte e não é vivificado; suponha-se alguém
sentado em completa ociosidade, com os braços cruzados, os olhos abaixados
ou levantados, e suponha-se que esteja ao mesmo tempo cercado de uma
atmosfera de alegria, não se apoderaria de sua cabeça e de seu corpo, um
amolecimento profundo, a expansão vital da face não se extinguiria, e por fim,
as fibras se relaxando, não cambalharia ele cada vez mais, até cair por terra? O
que é que mantém em expansão e em tensão o sistema de todo o corpo, a não
ser a contenção da mente (animus)? E de onde vem a contenção desta mente, a
não ser das cousas a administrar e das ocupações, quando a gente se entrega a
elas com prazer? Por isso vos ensinarei uma N ovidade do Céu, é que lá há
administrações, ministérios, tribunais grandes e pequenos, e também profissões
e ocupações". Q uando estes três recém-vindos souberam que no Céu havia
T ribunais, grandes e pequenos, disseram: "Por que estes tribunais? Será que
todos no Céu não são inspirados e conduzidos por Deus, e não sabem por
conseguinte o que é justo e direito? Por que então há necessidade de juízes?" E
o Sábio antigo respondeu:"N este M undo nos ensinam e nós aprendemos o que
é o bem e o vero, e também o que é o justo e o eqüitativo, como no M undo
natural, e nós o aprendemos não imediatamente de Deus, mas mediatamente
pelos outros; e todo Anjo do mesmo modo que todo homem,pensa o vero e faz
o bem como por si mesmo; e isso é, conforme o estado do Anjo, misturado e
não puro; e entre os Anjos há também simples e sábios; e os sábios devem
julgar, quando os simples por simplicidade e por ignorância estão na dúvida
sobre o justo ou dele se afastam. M as vós, pois que sois recentemente chegados
a este M undo, segui-me à nossa cidade, se isso vos agrada, e nós vos
162

mostraremos tudo". E saíram do Auditório, e alguns dos Antigos os


acompanharam também; e a princípio entraram em uma vasta B iblioteca que
era,segundo as ciências,dividida em Bibliotecas menores: os três recém-vindos,
vendo tantos livros, ficaram muito admirados, e disseram: "H á também livros
neste M undo!onde se obtém o pergaminho e o papel? de onde tirais as penas e
a tinta?" O s Anjos lhes responderam: "N ós percebemos que acreditáveis, no
M undo de onde viestes, que este M undo é vazio, porque é espiritual; e se
acreditáveis isso, é parque mantivestes a respeito do espiritual uma idéia
abstrata no material; e o que é abstrato do material vos parecia como nada,
assim como vazio; e entretanto aqui está a plenitude de todas as cousas; aqui
todas as cousas são Substanciais e não materiais, e as cousas materiais tiram sua
origem das substanciais; nós que estamos aqui somos homens espirituais,
porque somos substanciais e não materiais; daí vem que aqui há em sua
perfeição todas as coisas que estão no M undo natural,mesmo livros e escritas, e
muitas outras coisas ainda". Q uando os três recém-vindos ouviram falar de
co,usas Substanciais, pensaram que isso devia ser assim, tanto porque tinham
visto os Livros escritos, como porque tinham ouvido esta sentença, que as
matérias vêm origirináriamente das substâncias. A fim de que fossem ainda
mais confirmadas nestas verdades, foram conduzidos às M oradas dos
escreventes que copiavam exemplares de obras compostas pelos sábios da
cidade, e eles examinaram as escritas, e ficaram admirados de as ver tão nítidas
e tão brilhantes. Em seguida foram conduzidos aos M useus, G inásios e
Colégios, e aos lugares onde se realizavam seus Jogos Literários, alguns dos
quais eram chamados jogos dos H elicônides, outros jogos dos Parsassides;
outros, jogos dos Ateneides; e outros, jogos das V irgens da fonte; disseram-lhes
que estes são assim chamados, porque as V irgens significam as afeições das
ciências, e que cada um tem inteligência segundo a afeição das ciências; os
Jogos assim chamados eram exercícios e lutas espirituais. Em seguida foram
conduzidos na cidade às casas dos G overnadores, dos Administradores e de seus
Funcionários, e por estes às obras maravilhosas que são executadas de uma
maneira espiritual por artistas. Depois que viram tudo, o Sábio antigo
conversou de novo com eles sobre o R epouso eterno do trabalho, em que
entram aqueles que gozam da beatitude e da felicidade depois da morte, e lhes
disse: “O R epouso eterno não é a ociosidade, porque da ociosidade resultam,
para a mente, e por conseguinte para o corpo, o langor, o entorpecimento, o
estupor, e o amolecimento, e isso é a morte e não a vida, e ainda menos a vida
eterna,em que estão os Anjos do Céu; por isso o R epouso eterno é um repouso
que expulsa estes inconvenientes e faz com que o homem viva; e não é outra
coisa senão o que eleva a mente; é portanto um estudo e uma obra pelos quais a
mente é excitada,vivificada e alegrada; e isso se faz segundo o uso pelo qual, no
qual e para o qual se opera; daí vem que todo o Céu é considerado pelo Senhor
como o continente dos usos; e cada Anjo é Anjo segundo o uso que faz; o
prazer do uso o leva como uma corrente favorável arrasta o navio, e faz que
163

esteja em uma paz eterna, e no repouso da paz; é assim que é entendido, o


repouso eterno do trabalho. Q ue o Anjo seja vivificado segundo o estudo da
mente pelo uso, isso é bem evidente em que cada Anjo tem o Amor conjugal
com sua força, sua potência e suas delícias, segundo o estudo do uso real em
que está". Depois que estes três recém-vindos foram confirmados sobre este
ponto, que o repouso eterno é, não a ociosidade, mas o prazer de fazer alguma
cousa que seja para o uso, algumas V irgens vieram com bordados e filé, obras
de suas mãos, e lhes fizeram presente disso; e quando estes espíritos noviços se
retiraram, as V irgens cantaram uma ode, pela qual exprimiam com uma
melodia angélica a afeição das obras do uso com seus encantos.
208 - Segundo M emorável: Como eu estava em meditação sobre os arcanos do
Amor conjugal escondidos nas esposas, a Chuva de ouro, que foi descrito
acima, apareceu de novo; e eu me lembrava que ela caía sobre um Palácio no
oriente, onde viviam três Amores Conjugais, isto é, três casais de esposos, que
se amavam ternamente; desde que a vi, achando-me como convidado pela
doçura da meditação sobre este amor, eu me apressei em ir para esse lugar, e
enquanto me aproximava, esta chuva de ouro tornou-se de púrpura, em
seguida escarlata, e quando cheguei perto, estava brilhando como o orvalho;
bati, e a porta foi aberta; e disse ao porteiro: "Anuncia aos M aridos que aquele
que já veio com um anjo se apresenta de novo, pedindo que lhe seja permitido
entrar para uma palestra". E o porteiro voltou com o consentimento dos
maridos, e eu entrei; e os três M aridos com suas Esposas estavam reunidos no
H ypetro; e, tendo-os saudado, eles me retribuíram a saudação com
benevolência; e perguntei às Esposas, se esta pomba branca tinha depois
reaparecido na janela; elas disseram: "H oje mesmo; e também estendeu as asas;
por isso, auguramos a tua presença e que tu, nos solicitarias que te
descobríssemos ainda um arcano do amor conjugal.E repliquei: "Por que dizeis
um? e entretanto vim aqui para saber muitos". E elas responderam: "São
arcanos, e alguns ultrapassam de tal modo a vossa sabedoria, que o
entendimento de vosso pensamento não os pode apreender; vós vos gloriais
diante de nós de vossa sabedoria; mas nós não nos gloriamos diante de vós da
nossa, e entretanto a nossa ultrapassa a vossa, porque entra em vossas
inclinações e em vossas afeições, e as vê, as percebe e as sente; vós não sabeis
absolutamente cousa alguma das inclinações e das afeições de vosso amor, ,e
entretanto é por elas e segundo elas que vosso entendimento pensa, por
conseqüência é por elas e segundo elas que sois sábios; e entretanto as esposas as
conhecem tão bem em seus maridos, que vêem em suas faces, e as ouvem pelo
som de sua linguagem, e mesmo as palpam sobre seu peito, seus braços e suas
faces: mas nós, por um zelo de amor por vossa felicidade e ao mesmo tempo
pela nossa, fingimos não conhecê-las, e entretanto as moderamos com tanta
prudência, que seguimos tudo que é do agrado, do bel-prazer e da vontade de
nossos maridos, permitindo-as e suportando-as, e mudando-lhes somente a
direção se é possível, mas jamais forçando-as". Fiz esta pergunta: "Donde vos
164

vem esta sabedoria?" Elas responderam: "Ela é impressa em nós por criação e
daí por nascença; nossos maridos assemelham-na ao instinto; mas nós dizemos
que ela vem da Divina Providência, a fim de que os homens sejam tornados
felizes por suas esposas; aprendemos com os nossos maridos, que o Senhor quer
que o homem masculino aja pelo livre segundo a razão, e que para isso o
Senhor M esmo modera pelo interior o livre do homem concernente às
inclinações e as afeições, e o modera pelo exterior por meio de sua esposa, e
assim forma o H omem com sua Esposa um Anjo do Céu; e, além disso, o
Amor muda sua essência, e não se torna este Amor se é constrangido. M as
vamos falar mais abertamente; nós somos levadas a isso, isto é, à prudência de
moderar as inclinações e as afeições de nossos maridos, de tal maneira, que lhes
pareça que agem pelo livre segundo a razão, e isso, porque encontramos as
nossas delícias em seu amor, não amamos cousa alguma mais do que vê-los
achar suas delícias nas nossas, que, se, forem pouco estimadas por eles, se
embotam também em nós". Q uando assim falaram, uma das esposas entrou no
quarto de dormir, e voltando disse: "A minha pomba bate ainda as asas; é um
sinal de que podemos desvendar ainda mais arcanos". E disseram: "T emos
observado diversas mudanças das inclinações e das afeições dos homens; por
exemplo, que os maridos se tornam frios para as esposas, quando pensam
cousas vãs contra o Senhor e a Igreja; que se tornam frios quando estão no fasto
da própria inteligência; que se tornam frios quando encaram as outras mulheres
com cobiça; que se tornam frios quando seu amor é notado pelas esposas, sem
falar de vários outros casos; e que o frio que se apodera deles é de diversos
gêneros; notamos isso porque o sentimento se retira de seus olhos, de seus
ouvidos e de seu corpo na presença de nossos sentimentos. Por estas poucas
observações podes ver que sabemos mais que os homens, se isso vai bem para
eles, ou se vai mal; se estão frios para as esposas, isso vai mal para eles, mas se
estão quentes para as esposas, isso vai bem para eles; é por isso que as esposas
estão continuamente ocupadas em achar meios para que os maridos se tornem
quentes e não frios para elas, e elas se ocupam disso com uma perspicácia
impenetrável para os maridos". Depois que pronunciaram estas palavras,
ouviu-se uma espécie de gemido da pomba; e então as esposas disseram: "Isto é
um índice de que nós desejamos desvendar arcanos mais profundos, que
entretanto não nos é permitido descobrir; revelarás, talvez, aos homens os que
ouvistes?" E respondi: "É minha intenção; que prejuízo pode resultar daí?"
Depois de terem falado entre si as esposas disseram: "R evela, se o queres; nós
não ignoramos qual é lias esposas o, poder de persuasão; elas dirão a seus
maridos: Este homem graceja, são fábulas, ele brinca com as aparências e as
futilidades habituais dos maridos; não o acrediteis; sabemos que vós sois os
Amores,e que nós somos as O bediências; revela portanto,se queres; os maridos
darão sempre atenção, não às palavras que saem da tua boca, mas às que saem
da boca de suas esposas com beijos".
165

U niversais concernentes aos


casamentos

209 - H á sobre o casamento um grande número de cousas que, se fossem


tratados em particular fariam deste opúsculo um grosso volume; pois pode-se
tratar em particular da Semelhança e da Dessemelhanças entre esposos; da
Elevação do amor conjugal natural ao amor conjugal espiritual, e de sua
Conjunção; do Crescimento de um e do Decrescimento de outro; das
V ariedades e das Diversidades de um e de outro; da Inteligência dos esposos; da
Esfera conjugal universal procedente do, Céu, e de sua Esfera oposta
proveniente do Inferno; de seu Influxo, e de sua R ecepção; de muitas outras
cousas, que se fossem expostas em detalhe, fariam desta O bra um volume de
uma tal extensão, que fatigaria o leitor; por esta razão, e para evitar uma inútil
prolixidade, estas particularidades serão resumidas em U niversais concernentes
aos Casamentos. M as estes serão, como o que precede, divididos em Artigos, a
saber:I.O Sentido próprio do amor conjugal é o sentido do T ato. II. N aqueles
que estão no Amor verdadeiramente conjugal a faculdade de se tornar sábio
cresce; mas naqueles que não estão no amor verdadeiramente conjugal decresce.
III. N aqueles que estão no Amor verdadeiramente conjugal a felicidade da
coabitação cresce, mas nos que não estão no amor conjugal decresce. IV . N os
que estão no Amor verdadeiramente conjugal a Conjunção das mentes cresce, e
com ela a Amizade; mas nos que não estão no amor conjugal uma e outra
decresce. V . O s que estão no Amor verdadeiramente conjugal querem
continuamente ser um só homem; mas aqueles que não estão no amor conjugal
querem ser dois. V I. Aqueles que estão no Amor verdadeiramente conjugal
encaram o eterno no casamento; e o contrário nos que não estão no amor
conjugal. V II. O Amor conjugal reside nas Esposas castas, contudo o seu amor
depende dos M aridos.V III.As Esposas amam os laços do casamento,desde que
os H omens amem estes laços. IX . A Inteligência das mulheres é em si mesma
modesta,elegante,pacífica,flexível,mole,terna; mas a Inteligência dos homens
é em si mesma grave, áspera, ousada, amiga da licença. X . As Esposas não estão
como os homens em uma excitação,mas há nelas um estado de preparação para
a recepção. X I. H á abundância nos homens segundo o amor de propagar os
veros de sua sabedoria, e segundo o amor de fazer usos. X II. As determinações
estão no bel-prazer do marido. X III. H á uma Esfera conjugal que influi do
Senhor pelo Céu em todas e em cada uma das cousas do U niverso até seus
últimos. X IV . Esta Esfera é recebida pelo Sexo feminino, e transmitida por ele
ao Sexo masculino,e não vice-versa.X V .Aí onde está o Amor verdadeiramente
166

conjugal esta Esfera é recebida pela Esposa, e não é recebida pelo M arido senão
por meio da esposa. X V I. Aí onde não está o Amor conjugal, esta Esfera é
recebida, é verdade, pela esposa, mas não pelo marido por meio da esposa.
X V II. O Amor verdadeiramente conjugal pode existir em um dos esposos, e
não ao mesmo tempo no outro. X V III. H á diversas semelhanças, e diversas
dessemelhanças, tanto internas como externas, nos esposos. X IX . As diversas
semelhanças podem ser conjuntas, mas não com as dessemelhanças. X X . O
Senhor provê a semelhanças para aqueles que desejam o Amor verdadeiramente
conjugal,se não for nas terras,será nos Céus.X X I. O homem, conforme a falta
de amor conjugal e a perda deste amor,se aproxima da natureza da besta.Segue
agora a explicação destes Artigos.
210 - I.O sentido próprio do amor conjugal é o sentido do T ato.
Cada amor tem seu sentido; o amor de ver, procedente do amor de
compreender, tem o sentido da vista, e os encantos deste sentido são as
simetrias e as belezas; o amor de ouvir, procedente do amor de escutar e de
obedecer, tem seu, sentido no ouvido, e os encantos deste sentido são as
harmonias; o amor de conhecer as coisas que flutuam no ar em torno de si,
procedente do amor de perceber, tem o sentido do olfato, e os encantos deste
sentido são as exalações odoríferas; o amor de se alimentar, procedente do amor
de ser imbuído de bens e de veros,tem o sentido do paladar, e os prazeres deste
sentido são os manjares delicados; o amor de conhecer os objetos, procedente
do amor de ver em torno de si e de se garantir, tem o sentido do tato, e seus
encantos são as impressões agradáveis. Se o amor de se conjuntar com seu
semelhante, procedente do amor de unir o bem e o vero, tem o Sentido do
tato, é porque este sentido é comum a todos os outros sentidos, e por
conseguinte participa de alguma cousa deles; é bem sabido que este amor põe
em comunicação com ele todos os sentidos acima mencionados, e se aplica os
seus encantos. Q ue o Sentido do tato tenha sido consagrado ao amor conjugal,
e que seja o seu sentido próprio, isso é evidente por todo seu jogo e pela
elevação de sua finura para o que há de mais delicado; mas deixa-se aos amantes
tirar mais amplas deduções deste assunto.
211 - II. N aqueles que estão no amor verdadeiramente conjugal à faculdade de
se tornar sábio aumenta; mas nos que não estão no amor conjugal decresce. Se
a faculdade de se tornar sábio aumenta nos que estão no Amor verdadeiramente
conjugal é porque este Amor está nos esposos pela sabedoria, e segundo a
sabedoria, como foi plenamente provado nos Capítulos que precedem; além
disso também, porque o sentido deste Amor é o tato, e este sentido é comum a
todos os sentidos, e cheio também de delícias; por conseguinte este amor abre
os interiores da mente, como abre os interiores dos sentidos, e com eles as
partes orgânicas de todo corpo; segue-se que aqueles que estão neste amor nada
amam mais do que se tornarem sábios; pois o homem se torna sábio, tanto
quanto os interiores da sua mente são abertos; com efeito, por esta abertura os
167

pensamentos do entendimento são elevados a uma luz superior, e as afeições da


vontade a um calor superior; ora, a luz superior é a sabedoria, e G calor
superior é o amor desta sabedoria; as delícias espirituais conjuntas às delícias
naturais que experimentam os que estão no Amor verdadeiramente conjugal,
constituem a amabilidade, e por conseguinte a faculdade de se tornar sábio.
Segue-se daí que os Anjos tem o Amor conjugal segundo a sabedoria, e também
os acréscimos deste amor e ao mesmo tempo de suas delícias segundos
acréscimos de sua sabedoria; e que as progenituras espirituais, que nascem de
seus casamentos, são coisas pertencentes à sabedoria pelo pai, e cousas
pertencentes ao amor pela mãe, cousas que eles amam com um estorge
espiritual; este amor se ajunta a seu amor conjugal e o eleva continuamente, e
os conjunta.
212 - O contrário acontece nos que não estão em amor conjugal algum em
razão de não estarem em amor algum da sabedoria; estes não se casam senão
por um fim de lascívia, e neste fim há mesmo o amor de se tornar insensato;
com efeito,todo fim,considerado em si mesmo,é um amor, e a lascívia em sua
origem espiritual é uma loucura; por loucura entende-se o delírio da mente
pelos falsos, e o delírio a um alto grau é o delírio da mente pelos veros
falsificados ao ponto de crer-se que são a sabedoria. Q ue estes sejam contra o
amor conjugal, se dá disso uma confirmação ou uma prova manifesta no
M undo espiritual; lá, ao primeiro odor do amor conjugal, eles fogem para
cavernas, e fecham suas portas; e se as portas são abertas, eles extravagam como
os loucos no M undo.
213 - III. N os que estão no Amor verdadeiramente conjugal a felicidade da
coabitação aumenta; mas nos que não estão, no amor conjugal ela decresce. Se
a felicidade da coabitação cresce nos que estão no amor verdadeiramente
conjugal, é porque eles se amam mutuamente por todos os sentidos; a esposa
não vê cousa alguma mais amável do que o esposo, e o esposo não vê cousa
alguma mais amável que a esposa; mais ainda, um e outro não ouvem, não
sentem e não tocam cousa alguma mais amável; daí resulta para eles a felicidade
da coabitação na casa, no quarto e na cama. Q ue assim, seja, vós maridos,
podeis ter a confirmação pelas primeiras delícias do casamento, que estão em
sua plenitude, por que então só a esposa em todo o sexo é amada. Q ue seja o
contrário nos que não estão em amor conjugal algum,isso é notório.
214 - IV . Aqueles que estão no Amor verdadeiramente conjugal à conjunção
das mentes aumenta e com ela a Amizade, mas nos que não estão no amor
conjugal uma e outra decrescem.
Q ue a conjunção das mentes nos que estão no amor verdadeiramente conjugal
aumenta, é o que foi demonstrado no Capítulo onde se tratou da conjunção
das almas e das mentes pelo casamento, conjunção que é entendida pelas
palavras do Senhor, que eles não são mais dois mas uma só carne, ver ns. 156 a
181. M as esta conjunção aumenta conforme a amizade se conjunta ao amor,
168

porque a amizade é como a face desse amor, e é também como a sua


vestimenta, pois não somente se adjunta ao amor como vestimenta, mas
também se conjunta a ele como face; o amor que precede a amizade é
semelhante ao amor do sexo, que se vai depois do desejo satisfeito, mas o amor
conjunta à amizade permanece depois do desejo satisfeito, e também se afirma;
entra mesmo interiormente no peito, a amizade o introduz, e o torna
verdadeiramente conjugal; e então este amor torna mesmo conjugal esta sua
amizade, que difere muito da amizade de qualquer outro amor, pois é plena.
Q ue o contrário aconteça nos que não estão no amor conjugal, isso é sabido;
neles a primeira amizade, que foi insinuada na época dos esponsais, e em
seguida nos primeiros dias depois das núpcias, se retira cada vez mais dos
interiores da mente, e daí sucessivamente enfim até à epiderme; e naqueles que
pensam nas separações, ela se afasta inteiramente; mas nos que não pensam nas
separações o amor permanece nos externos mas nos internos,ele é frio.
215 - V . O s que estão no Amor verdadeiramente conjugal querem
continuamente ser um só homem; mas os que não estão no amor conjugal
querem ser dois.
O Amor conjugal em sua essência não é outra cousa senão a vontade ou o
desejo de que dois sejam um, isto é, de que duas vidas se tornem uma única
vida; esta vontade é o perpétuo, esforço deste amor, de onde decorrem todos os
seus efeitos; que o esforço seja a essência mesma do movimento, e que a
vontade seja o esforço vivo no homem, isto é confirmado pelas pesquisas dos
filósofos, e é evidente também para aqueles que fazem uso de uma razão
esclarecida; segue-se daí que aqueles que estão no amor verdadeiramente
conjugal estão continuamente em esforço, isto é, querem ser um só homem.
Q ue seja o contrário nos que não estão no amor conjugal, eles mesmos o,
sabem muito bem; como eles se acreditam continuamente dois pela desunião
das almas e das mentes, por isso não compreendem também o que é entendido
pelas palavras do Senhor:"não são mais dois,mas uma só carne". (M ateus X IX ,
6).
216 - V I. O s que estão no Amor verdadeiramente conjugal consideram o
eterno no casamento,dá-se o contrário nos que não estão no amor conjugal.
Se os que estão no amor verdadeiramente conjugal consideram o eterno, é
porque neste amor há a eternidade, e sua eternidade vem de que este amor na
esposa, e a sabedoria no marido, crescem eternamente, e neste crescimento ou
progressão os esposos entram cada vez mais profundamente nas beatitudes do
Céu, que estão encerradas em sua sabedoria e ao mesmo tempo no amor desta
sabedoria; se portanto a idéia do eterno fosse arrancada, ou que por algum
acontecimento fosse apagada de suas mentes seria como se eles mesmos fossem
precipitados do Céu. Q ual é no Céu o estado dos Esposos, quando a idéia do
eterno escapa de suas mentes, e a idéia do temporal aí cai em seu lugar, eu o vi
claramente por esta experiência: U m dia, por permissão dada, dois esposos
169

descidos do Céu estavam comigo, e então a idéia do eterno concernente ao


casamento lhes foi tirada por um certo impostor que falava com astúcia;
imediatamente depois dela ter sido tirada, eles começaram a se lamentar,
dizendo que não podiam mais viver, e que sentiam um desgosto como jamais
tinham experimentado antes; isso tendo sido percebido no Céu pelos Anjos
seus companheiros, o impostor foi afastado e precipitado; depois,
imediatamente reveio a eles a idéia do eterno pela qual experimentaram a
alegria do coração e se abraçaram mutuamente com a maior ternura. Além
disso,ouvi dois esposos que a respeito de seu casamento sustentavam ora a idéia
do eterno, ora a idéia do temporal; a razão disso, é que havia neles uma
dessemelhança interna; quando estavam na idéia do eterno, regozijavam-se
entre si; mas quando estavam na idéia do temporário, diziam: "N ão há mais
casamento". E a esposa: "N ão sou mais uma esposa, sou uma concubina". E o
marido:"N ão sou mais um marido,sou um debochado". Por isso quando a sua
dessemelhança interna lhes foi descoberta, o homem deixou a mulher, e a
mulher deixou o homem; e em seguida, como um e outro tinham tido a idéia
do eterno concernente ao casamento, cada um deles se consociou com seu par
semelhante.Por estes dois exemplos pode-se ver claramente que os que estão no
amor verdadeiramente conjugal consideram o eterno, e que se esta idéia se
escapa dos íntimos do pensamento, eles são desunidos quanto ao amor
conjugal, embora não o sejam ao mesma tempo quanto à amizade, pois esta
habita nos externos, mas aquele nos internos. Dá-se o mesmo nos casamentos
sobre a terra; aí, os esposos, quando se amam ternamente, pensam na
eternidade concernente à sua aliança,e não pensam de modo algum em seu fim
pela morte; e se pensam nisso, sofrem até que sejam reanimados com a
esperança pelo pensamento de sua continuação depois do falecimento.
216 - (bis) - V II. O Amor Conjugal reside nas Esposas castas, mas entretanto
seu amor depende dos M aridos.
Isso provém das esposas nascerem amores, e por conseguinte ter sido impresso
nelas querer ser um com os maridos, e delas alimentarem continuamente seu
amor com este pensamento de sua vontade; por isso renunciar ao esforço de se
unir a seus maridos, seria renunciar a elas mesmas; não se dá o mesmo com os
maridos; como não nasceram amores, mas são recipientes deste amor que vem
das esposas, resulta que, quanto mais o recebem, tanto mais as esposas entram
com seu amor, mas quanto mais não o recebem, tanto mais as esposas se
mantêm de fora com seu amor, e esperam: mas isso acontece com as esposas
castas; não se dá o mesmo com as que não são castas. V ê-se, por isso, que o
amor conjugal reside nas esposas,mas seu amor depende dos maridos.
217 - V III. As Esposas amam os laços do casamento, desde que os homens
amem esses laços.
Isto resulta do que foi dito no Artigo precedente: acrescente-se que as esposas
pelo ínsito querem ser esposas, e ser chamadas esposas; e para elas um nome de
170

respeito e de honra; por isso elas amam os laços do casamento: e como as


esposas castas querem ser esposas não apenas de nome,
mas também de fato, e isso se dá por uma ligação cada vez mais estreita com os
maridos, por isso elas amam os laços do casamento pela afirmação de sua
aliança, e isso tanto mais quanto mais há reciprocidade de amor da parte dos
maridos,ou o que é o mesmo,conforme os homens amam estes laços.
218 - IX . A Inteligência das mulheres é em si mesma modesta, elegante,
pacífica,flexível,mole,tenra; e a inteligência dos homens é em si mesma grave,
áspera,rigorosa,ousada,amiga da licença.
Q ue tais sejam as mulheres, e que tais sejam os homens, isso é bem evidente
pelo corpo,a face,o tom de voz, a linguagem, os gestos, e os costumes de uns e
de outros; pelos Corpos, porque há dureza na pele e na carne dos homens, e há
moleza nas das mulheres; pela Face, porque ela é mais dura, mais rígida, mais
rude,mais amarela,além disso coberta de barba,assim menos bela nos homens,
enquanto que nas mulheres, é mais doce, mais flexível, mais tenra, mais
brilhante e por conseguinte mais bela; pelo T om de V oz, porque nos homens é
rude, e delicada nas mulheres; pela Linguagem, porque nos homens é amiga da
licença e animada, enquanto que nas mulheres é modesta e pacífica; pelos
G estos, porque nos homens são mais fortes e mais firmes e nas mulheres são
mais leves e mais fracos; pelos Costumes, porque nos homens são mais livres e
nas mulheres são mais elegantes. Q uanto, desde o nascimento, o gênio dos
homens difere do gênio das mulheres, é o que se tornou evidente para mim,
vendo meninos e meninas em suas reuniões; observei-os algumas vezes por uma
janela em uma grande cidade, dando para uma praça, onde mais de uma
vintena se reuniam todos os dias; aí, os meninos, de acordo com o caráter que
tinham de nascença, brincavam em tumulto, gritando, lutando, se batendo, se
jogando, pedras, enquanto que as meninas ficavam pacificamente sentadas às
portas das casas, umas brincando com criancinhas, outras vestindo bonecas,
outras cosendo retalhos de fazenda, outras se beijando; e, o que me admirava,
elas olhavam sempre com olhar gracioso os meninos, cujos brinquedos eram
tão barulhentos. Por isto, pude ver claramente que o homem nasce
entendimento, e a mulher amor, e quais são o entendimento e o amor em seus
princípios; e assim qual seria o entendimento do homem em sua progressão
sem a conjunção com o amor feminino,e mais tarde com o amor conjugal.
219 - X .As Esposas não estão como os homens em uma excitação, mas há nelas
um estado de preparação para a recepção.
Q ue nos homens há seminação e por conseguinte excitação,e que nas mulheres
não há excitação porque não há seminação, isso é evidente; mas que nas
mulheres há um estado de preparação para a recepção e assim para à concepção,
eu o relato pelo que aprendi; mas não é permitido descrever qual é este estado
nas mulheres, e mesmo ele só é conhecido por elas mesmas; mas se seu amor,
171

quando elas estão neste estado, está no seu prazer, ou no desprazer, como
algumas o dizem, é o que não foi divulgado por elas, o que só é conhecido em
geral, é que não é permitido ao marido dizer a esposa que ele pode e não quer,
pois por isso é notavelmente ferido o estado de recepção, que é preparado
segundo o estado de potência do marido.
220 - X I. H á abundância nos homens segundo o amor de propagar os veros de
sua sabedoria,e segundo o amor de fazer usos.
Q ue assim seja,é um dos arcanos que eram conhecidos dos Antigos, e que hoje
estão inteiramente perdidos; os Antigos sabiam que todas e cada uma das
cousas que se fazem no corpo, se fazem segundo uma origem espiritual, por
exemplo, que as ações decorrem da vontade que em si mesma é espiritual; que
as palavras decorrem do pensamento que também é espiritual; que a vista
natural vem da vista espiritual que é a do entendimento; que o ouvido natural
vem do ouvido espiritual que é a atenção do entendimento e ao mesmo tempo
da acomodação da vontade; que o olfato natural vem do olfato espiritual, que é
a percepção,e assim por diante; que semelhantemente a seminação viril vem de
uma origem espiritual, os Antigos o viram; de vários ensinamentos, não
somente da razão mas também da experiência, tinham concluído que ela vem
dos veros de que se compõe o entendimento; e diziam que do casamento
espiritual, que é o do bem e do vero, e que influi em todas e cada uma das
coisas do U niverso, não é recebido pelos machos nada mais que o vero e o que
se refere ao vero; e que isso avançando no corpo é formado em semente; e que
é daí que as sementes entendidas espiritualmente são os veros; que, quanto à
formação, a alma masculina, sendo intelectual, é por conseqüência o vero, pois
o intelectual não é outra cousa, é por isso que quando a alma desce, o vero
desce também; que isso acontece porque a alma, que é o íntimo do homem e
de todo animal, e que em sua essência é espiritual, por um esforço de
propagação implantado nela, segue na descida e quer se procriar, e que quando
isso se faz, a alma inteira se forma, se envolve e se torna semente; e que isso
pode ser feito milhares e milhares de vezes, porque a alma é uma substância
espiritual, para a qual há, não extensão, mas impleção (impletion), e da qual
não se tomam partes,mas há produção do todo, sem a menor perda deste todo;
daí resulta que ela está plenamente nos menores receptáculos, que são as
sementes, do mesmo modo que está em seu receptáculo maior, que é o corpo.
U ma vez pois que o V ero da alma é a origem da semente, segue-se que há
abundância nos homens segundo o amor de propagar os veros de sua sabedoria:
se há também abundância segundo o amor de fazer usos, é porque os usos são
bens que produzem veros. N o M undo também, alguns sabem que há
abundância nos homens ativos, e não nos ociosos. Perguntei como pela alma
viril é propagada a alma feminina, e recebi como resposta, que é pelo bem
intelectual, porque este bem em sua essência é o vero; pois o entendimento
pode pensar que tal cousa é o bem, que assim é verdade que esta cousa é o
172

bem; é diferente com a vontade, ela não pensa nem o bem nem o vero, mas os
ama e os faz: é por isso que na Palavra pelos filhos são significados os veros, e
pelas filhas os bens,como se vê acima,n.120; e que pela semente,na Palavra, é
significado o vero,ver no Apocalipse R evelado n.565.
221 - X II.As determinações estão no bel-prazer do marido.
Isto resulta de que a abundância, de que se acaba de falar, está nos homens, e
varia neles tanto segundo os estados da sua mente como segundo os estados de
seu corpo; pois o entendimento não é tão constante em seus pensamentos como
a vontade em suas afeições; com efeito,é levado ora ao alto, ora para baixo, está
ora em um estado sereno e claro, ora em um estado turbulento e obscuro, ora
em objetos agradáveis, ora em objetos desagradáveis; e como a mente, quando
age, está também no corpo, segue-se que o corpo tem estados semelhantes; daí
vem que o marido ora se afasta do amor conjugal e ora se aproxima dele, e que
a abundância no primeiro estado é retirada; e no segundo é restabelecida. São
estas as razões pelas quais as determinações devem ser deixadas ao bel-prazer do
marido; daí vem que as esposas, pela sabedoria impressa nelas, jamais dão
qualquer advertência sobre tais assuntos.
222 - X III. H á uma esfera conjugal que influi do Senhor pelo Céu em todas e
cada uma das coisas do U niverso até seus últimos.
Q ue do Senhor procedem o Amor e a Sabedoria, ou o que é a mesma cousa, o
Bem e o V ero, isso foi mostrado acima em um Capítulo, sobre este assunto;
estes dois no casamento procedem continuamente do Senhor, porque são Ele
M esmo, e porque todas as coisas são por Ele; e as coisas que procedem d'Ele
enchem o U niverso, pois sem isso nada do que existe, subsistiria. H á várias
esferas que procedem d'Ele, por exemplo: A Esfera de conservação do U niverso
criado, a Esfera de proteção do bem e do vero contra o mal e o falso, a Esfera
da reformação e da regeneração, a Esfera da inocência e da paz, a Esfera da
misericórdia e da graça, além de várias outras; mas a Esfera universal de todas é
a Esfera conjugal, porque esta é também, a Esfera de propagação, por
conseqüência a Esfera sobreeminente de conservação do U niverso criado pelas
gerações sucessivas. Q ue esta Esfera conjugal enche o U niverso, e o percorre
desde os primeiros até os últimos, isso é evidente pelo que foi precedentemente
mostrado, pelo fato de que há Casamentos nos Céus, e os casamentos mais
perfeitos no T erceiro Céu ou Céu Supremo, e que além dos que estão nos
homens,há em todos os seres do R eino animal nas terras, até nos vermes; e que
além disso, há em todos os seres do R eino vegetal desde as oliveiras e as
palmeiras até às menores ervas. Q ue esta Esfera seja mais universal que a esfera
do calor e da luz que procedem do Sol de nosso M undo, a razão Pode se
convencer disso porque ela opera também na ausência do calor deste sol no
inverno, e na ausência de sua luz, como na noite, principalmente nos homens;
se ela opera assim, é porque -Procede do Sol do Céu Angélico, e que por
conseguinte há igualdade constante de calor e de luz, isto. é, conjunção do bem
173

e do vero, pois ela está em uma primavera contínua; as mudanças do bem e do


vero, ou de seu calor e de sua luz, não são variações, como são nas terras as
variações produzidas pelas mudanças do calor e da luz provenientes do sol
natural,mas estas mudanças têm lá sua origem nos seres que as recebem.
223 - X IV . Esta Esfera é recebida pelo Sexo feminino, e transmitida por ele ao
Sexo masculino.
Q ue no Sexo masculino não haja conjugal algum, mas que este amor esteja
unicamente no Sexo feminino,e seja transmitido por ele ao Sexo masculino, eu
o provei por uma experiência, referida acima, n. 161, com a qual concorda esta
razão, que a Forma masculina é a forma intelectual, e a Forma feminina a
forma voluntária; e a forma intelectual não pode por si mesma se aquecer com
o calor conjugal; mas pode se aquecer com o calor conjuntivo de alguém em
quem este calor foi implantado por criação; por conseqüência não pode receber
este amor senão pela forma voluntária da mulher, cuja forma lhe é adjunta,
porque esta é também a forma do amor. Esta mesma proposição poderia ser
confirmada ainda mais pelo Casamento do bem e do vero; e, perante o homem
natural, pelo Casamento do coração e do pulmão, porque o coração
corresponde ao amor,e o pulmão ao entendimento; mas como o conhecimento
destes assuntos falta à maior parte dos homens, a confirmação por estes
casamentos lançaria mais sombra do que luz. Da translação desta Esfera do
Sexo feminino para o Sexo masculino resulta que a M ente é abrasada mesmo só
pelo pensamento sobre o sexo; que por conseguinte haja também formação
propagativa, e assim excitação, é isso uma conseqüência; pois se nas terras o
calor não se aproxima da luz, nada aí tem vigor, e nada aí é excitado a produzir
fruto.
224 - X V .O nde existe o amor verdadeiramente conjugal, esta Esfera é recebida
pela Esposa,e não é recebida pelo M arido sendo por meio da esposa.
Q ue esta esfera, nos que estão no amor verdadeiramente conjugal, não seja
recebida pelo marido senão por meio da esposa, é hoje um arcano, e entretanto
em si não é um arcano, porque o noivo e o recém-casado podem sabê-lo; tudo
o que procede da noiva e da recém-casada não afeta de uma maneira conjugal,
sem que então aconteça o mesmo com o que procede de outras pessoas do sexo?
A mesma cousa acontece com os que vivem juntos no amor verdadeiramente
conjugal; e como a esfera da vida cerca a cada um, tanto o homem como a
mulher, com densidade no peito, e com pouca densidade no dorso, vê-se
claramente donde vem que os maridos que amam apaixonadamente suas
esposas se voltam para elas,e durante o dia as olham com ar de satisfação, e que
vice-versa, os que não amam suas esposas se desviam delas, e durante o dia as
olham com ar de desdém. Pela recepção, por parte do marido, da esfera
conjugal unicamente por meio da esposa, se conhece o amor verdadeiramente
conjugal,e é ele distinguido do amor conjugal bastardo,falso e frio.
174

225 - X V I.O nde não existe o Amor conjugal, esta Esfera é recebida, é verdade,
pela esposa,mas não pelo marido por meio da esposa.
Em sua origem esta esfera conjugal que influi no U niverso é Divina; em sua
progressão no céu entre os Anjos, ela é celeste e espiritual; nos homens natural;
nas bestas e nos pássaros, animal; nos vermes, puramente corporal; nos vegetais
é privada de vida; e além disso em cada um dos seres, ela varia segundo suas
formas. O ra, como esta Esfera é recebida imediatamente pelo Sexo feminino, e
mediatamente pelo Sexo masculino, e como é recebida segundo as formas,
segue-se que esta Esfera, que conta em sua origem pode ser mudada em uma
Esfera não santa nos seres, e mesmo mais ainda em uma Esfera oposta; a Esfera
oposta é chamada Esfera de prostituição em tais mulheres, e Esfera escortatória
em tais homens; e como tais homens e tais mulheres estão no Inferno, é do
inferno,que vem esta esfera; mas também para esta esfera há muita variedade, e
por conseguinte ela é de várias espécies; mas tal espécie é atraída e apreendida
por tal homem, porque lhe convém, e se conforma e corresponde ao seu
caráter. Por estas explicações pode-se ver que o marido que não ama sua esposa
recebe esta Esfera de outra, parte que não de sua esposa; e acontece entretanto
que ela é inspirada também pela esposa, mas com desconhecimento do marido,
e quando ele se aquece.
226 - X V II.O Amor conjugal pode existir em um dos esposos e não ao mesmo
tempo no outro.
Com efeito, um pode desejar de todo coração um casamento casto; enquanto
que o outro não sabe o que é o casto; um pode amar as cousas que pertencem a
Igreja, enquanto que o outro ama as que pertencem ao mundo só; um pode
quanto à mente estar no Céu, o outro quanto à sua estar no inferno; daí o
amor conjugal pode estar em um, e não estar no outro; suas mentes, porque
estão voltadas em sentidos contrários, estão interiormente em colisão entre si, e
se não o estão exteriormente, todavia acontece que o que não está no amor
conjugal considera o que está ligada à sua sorte como uma velha fastidiosa; e
assim de resto.
227 - X V III. H á diversas semelhanças e diversas dessemelhanças, tanto internas
como externas,entre os esposos.
É notório que entre os esposos há semelhanças e há dessemelhanças e que as
externas se manifestam, mas não as internas, a não ser aos esposos mesmos
depois de algum tempo de coabitação e aos outros por indícios; mas é inútil
enumerá-las para as fazer conhecer, porque a enumeração e a descrição das
variedades poderia encher muitas páginas. As semelhanças podem em parte ser
deduzidas e concluídas das dessemelhanças pelas quais o amor conjugal é
mudado em frieza, e de que se tratará no, Capítulo seguinte. As semelhanças e
as dessemelhanças tiram em geral sua origem das inclinações inatas (connatae),
variadas pela educação, pelas sociedades e pelas persuasões de que se está
175

imbuído .
228 - X IX . As diversas semelhanças podem ser conjuntas, mas não com as
dessemelhanças.
As variedades das semelhanças, são em grande número, e diferem mais ou
menos; mas entretanto as que diferem podem com o tempo ser conjuntas por
diversas coisas, especialmente por acomodações aos desejos, pelos deveres
mútuos, as delicadezas, a abstenção de atos não-castos, o amor comum dos
filhos, e o cuidado de sua educação; mas principalmente pelas conformidades
nas coisas da Igreja; pois pelas coisas da Igreja se faz uma conjunção das
semelhanças que diferem interiormente; pelas outras coisas não há conjunção
senão pelas semelhanças que diferem exteriormente. M as com as
dessemelhanças não pode se fazer conjunção porque são antipáticas.
229 - X X . O Senhor provê semelhanças para os que desejam o Amor
verdadeiramente conjugal,e se não for nas terras erá nos Céus.
A razão disso, é que é provido pelo Senhor a todos os casamentos de amor
verdadeiramente conjugal; que estes casamentos vêm do Senhor, vê-se acima,
ns. 130, 131; mas como é provido nos céus, é o que ouvi descrever desta
maneira pelos Anjos: A Divina Providência do Senhor é singularíssima e
universalíssima a respeito dos casamentos e nos casamentos, porque todos os
prazeres do Céu decorrem dos prazeres do amor conjugal, como águas doces
jorrando do manancial de uma fonte; e é por isso que é provido a que nasçam
Pares conjugais; e estes são, sob os auspícios do Senhor, continuamente
educados para seu casamento, sem que o rapaz e a moça nada saibam; e depois
do tempo exigido, ela então V irgem núbil, e ele M ancebo apto ao casamento,
se encontram em alguma parte como, por acaso, e se examinam mutuamente, e
em seguida como por uma espécie de instinto conhecem que são adequados, e
por uma sorte de ditame interior pensam em si mesmos, o mancebo: "Esta é a
minha"; e a moça: "Este é o meu"; e depois que este pensamento residiu algum
tempo nas mentes de um e de outro, eles se dirigem a palavra de propósito
deliberado, e se prometem um ao outro. Foi dito como por acaso, como por
uma sorte de instinto, com por uma sorte de ditame, e entende-se pela Divina
Providência, porque ela aparece assim quando não é conhecida; pois o Senhor
abre as semelhanças internas,a fim de que se vejam.
230 - X X I. O homem segundo a falta de amor conjugal e a perda deste amor,
se aproxima da natureza da besta.
A razão disso, é que, quanto mais o homem está no amor conjugal, tanto mais
é espiritual, e quanto mais é espiritual, tanto mais é homem; pois o homem
nasce para a vida depois da morte, e ele a atinge porque tem uma alma
espiritual, e o homem pode ser elevado a esta vida pela faculdade de seu
entendimento; se então sua vontade, pela faculdade que também lhe foi dada, é
elevada ao mesmo tempo, depois da morte ele vive a vida do Céu. É o
176

contrário, se está em um amor oposto ao amor conjugal; pois quanto mais aí


está, tanto mais é natural, e o homem puramente natural é semelhante à besta
quanto às cobiças, aos apetites e a seus prazeres, com a única diferença de que
tem a faculdade de elevar o entendimento, à luz da sabedoria, e também de
elevar a vontade ao calor do amor celeste; estas faculdades não são tiradas de
homem algum; é por isso que, o homem puramente natural, embora seja
semelhante à besta quanto às cobiças, aos apetites e a seus prazeres, vive
entretanto depois da morte, mas em um estado que corresponde à sua vida
passada no mundo. Por estas explicações, pode-se ver que o homem, segundo a
falta de amor conjugal, se aproxima da natureza da besta. Isto parece poder ser
contraditado, pelo fato de haver falta de amor conjugal e perda deste amor
naqueles que entretanto são homens; mas não se trata aqui senão daqueles que,
pelo amor escortatório, não fazem caso algum do amor conjugal, e que estão
assim na falta de amor conjugal,e na perda deste amor.
231 - Ao que precede serão acrescentados T rês M emoráveis:
Primeiro M emorável: U m dia, ouvi grandes gritos que saíam dos infernos
como através das águas; um à esquerda: "Ó como são justos!" outro à direita:
"Ó como são Eruditos!" e um terceiro por trás: "Ó como são Sábios!", e como
me viesse ao pensamento, se no Inferno havia também Justos, Eruditos e
Sábios, fui afetado pelo desejo de ver se os havia realmente; e me foi dito do
Céu: "T u verás e ouvirás"; e saí da casa em espírito, e vi diante de mim uma
Abertura; aproximei-me dela, e olhei; e eis, uma escada pela qual desci, e,
quando cheguei em baixo, vi planícies cobertas de arbustos entremeados de
espinheiros e de urtigas; e perguntei se era o Inferno; disseram-me "É a T erra
inferior,que fica imediatamente acima do Inferno"; e então avancei em direção
aos G ritos seguindo a ordem; para o primeiro G rito: "Ó como são Justos!" e vi
uma Assembléia dos que no M undo tinham sido Juízes de amizades e de
presentes; em seguida para o segundo G rito: "Ó como são Eruditos!" e vi uma
Assembléia dos que no M undo tinham sido R aciocinadores; e enfim para o
terceiro G rito: "Ó como são Sábios!" e vi uma Assembléia dos que no mundo
tinham sido Confirmadores; mas destes voltei para a primeira Assembléia onde
estavam os Juízes de amizade e de presentes que eram proclamados justos; e vi
sobre o lado uma espécie de Anfiteatro constituído de tijolos, e coberto de
telhas pretas; e me foi dito que era ali o seu T ribunal; chegava-se lá por três
entradas do lado do setentrião, e três do lado ocidental, mas não havia
nenhuma do lado meridional nem do lado oriental, índice de que seus
Julgamentos não eram julgamentos, de Justiça, mas eram arbitrários. N o meio
do Anfiteatro vi uma lareira, onde servidores encarregados deste cuidado
jogavam tochas sulfurosas e betuminosas, cujos clarões projetando-se sobre os
muros rebocados de novo apresentavam imagens pintadas de pássaros da tarde e
da noite; mas esta lareira, e por conseguinte as vibrações da luz nas formas
destas imagens, eram representações, de seus Julgamentos, porque eles podiam
177

disfarçar o fundo de toda questão, e revestí-lo de formas segundo o favor. M eia


hora depois vi entrar, em vestes compridas e mantos, Anciãos e M oços, que
depois de tirarem seus gorros, se colocaram em Assentos perto das M esas para
proferir Julgamentos; e escutei, e percebi com que esperteza e com que
sagacidade, tendo em vista a amizade, eles faziam pender e virar os julgamentos
em aparências de justiça, e isso a ponto deles mesmos verem o injusto como
justo, e vice-versa o justo como injusto; as persuasões sobre o justo e o injusto
se mostravam como tais pelas suas faces,e eram ouvidas como tais pelos sons de
sua linguagem; então me foi dada do Céu uma ilustração pela qual percebi se
cada uma das cousas era conforme ou não conforme com o direito; e vi com
que esperteza eles velavam o injusto, e lhe davam a aparência do justo, e com
que habilidade escolhiam entre as leis as que eram favoráveis e punham de lado
por meio de raciocínios astuciosos todas as outras. Depois dos julgamentos, as
Sentenças eram levadas aos clientes, amigos e adeptos, e estes -Para os
recompensar por seus favores, gritavam ao longo dos caminhos: "Ó , como são
justos.' Ó como são justos!" Depois disso falei deles com os Anjos do Céu, e
lhes contei em parte o que tinha visto e ouvido; e os Anjos me disseram: "T ais
juizes parecem aos outros ter um entendimento de uma penetração muito sutil,
,quando entretanto não vêem a menor cousa do justo e do eqüitativo; se retiras,
a amizade por uma das partes, eles ficam mudos nos julgamentos como
estátuas, e dizem somente: Concordo, filio-me à opinião deste ou daquele; e
isso porque todos os seus julgamentos são estabelecidos sobre prevenções, e a
prevenção junta ao favor segue a cousa desde o começo até ao fim; assim eles
não vêem senão o que é favorável ao amigo; quanto a tudo que lhe é contrário,
eles põem de lado; e se de novo se trata disso, eles o envolvem com raciocínios
como a aranha envolve com fios a sua presa, e o aniquilam; daí vem que se não
seguem a teia de sua prevenção, nada vêem do direito; foi examinado se eles
podiam ver alguma cousa dele, e achou-se que não o podiam; os habitantes do
teu M undo ficarão admirados, de que seja assim; mas diz-lhes que isso é uma
verdade reconhecida incontestável pelos Anjos do Céu. Como aqueles nada
vêem de justo, nós os consideramos, no Céu, não como homens, mas como
monstros, cujas cabeças constituem as coisas que são da amizade, os peitos, as
que são da injustiça, os pés as que são da confirmação, e as plantas dos pés as
que são de justiça, as quais eles derrubam e calcam com os pés, se não são
favoráveis ao amigo. M as quais eles nos aparecem no Céu, tu o vais ver, pois o
seu fim está próximo".E eis que imediatamente o solo se entreabriu, e as mesas
caíram sobre as mesas, e eles foram afundados com todo o Anfiteatro; e
lançados em cavernas,e encarcerados; e então me foi dito:"Q ueres vê-los lá?" E
eis que eles foram vistos quanto à face como de aço polido, quanto ao corpo
desde o pescoço até aos lombos como estátuas de pedra vestidas de peles de
leopardo, e quanto aos pés como cobras: e vi os Livros de Lei, que tinham
colocado sobre as M esas, mudados em Cartas de Jogar; e então, em lugar de
julgar, lhes foi dado por emprego preparar vermelhão de arrebique para ser
178

posto no rasto das prostitutas e transformá-las assim em belezas.


Depois que vi essas cousas, quis ir para as duas outras Assembléias, onde, em
uma estavam puros R aciocinadores, e na outra puros Confirmadores; e então
me foi dito:"R epousa um pouco; Anjos da Sociedade mais próxima acima deles
te serão dados por companheiros; por eles o Senhor te dará a luz, e tu verás
cousas surpreendentes".
232 - Segundo M emorável: Pouco tempo depois, ouvi de novo da T erra
inferior estas exclamações que já se tinham feito ouvir: "Ó como são Eruditos!
Ó como são Eruditos!" e olhei de todos os lados para ver que Anjos estavam
presentes; e eis que eram Anjos que, no Céu estavam imediatamente acima
daqueles a respeito dos quais se gritava:"Ó como são Eruditos!" Conversei com
eles sobre este G rito, e eles me disseram: "Estes Eruditos são dos que
raciocinando procuram somente se uma cousa é ou não é, e que pensam
raramente que ela é de tal maneira; assim são como ventos que sopram e
passam; e como cascas em torno de árvores que não têm medula; ou como
cascas em torno de amêndoas sem núcleo; ou como a superfície de frutos sem
polpa; pois suas M entes estão sem julgamento interior,e não estão unidas senão
aos Sentidos do corpo; é por isso que, se os sentidos mesmos não julgam, eles
nada podem concluir; em uma palavra, eles são puramente sensuais, e nós os
chamamos R aciocinadores; são chamados R aciocinadores, porque jamais
concluem coisa alguma, mas se apoderam de tudo que ouvem, e discutem se a
cousa é, contradizendo-se continuamente; não amam nada mais do que atacar
as próprias verdades,e assim as fazem em pedaços submetendo-as a debates, são
eles que se acreditam no M undo mais eruditos que todos os outros". Depois de
ter recebido estas informações, pedi aos Anjos que me conduzissem a eles; e
conduzíram-me a uma Cavidade,de onde degraus conduziam à terra inferior, e
descemos, e seguimos o G rito: "Ó como são Eruditos!" e eis que eram algumas
centenas que se mantinham de pé em um mesmo lugar, batendo com os pés na
terra, a princípio, admirado disso, perguntei porque eles ficavam assim de pé,
batendo a terra com os pés, e acrescentei: "Podem assim fazer com os pés uma
escavação no solo". A essas palavras os Anjos sorriam e disseram: "Eles
aparecem mantendo-se assim de pé, porque, sobre não importa que assunto,
eles não pensam absolutamente que a cousa é assim, mas perguntam
unicamente se a cousa é, e discutem; e quando o pensamento não vai mais
longe, eles perecem somente calcar e pilar com os pés um torrão de terra, sem
avançar". M as então aproximei-me da Assembléia; e eis que eles me pareceram
como homens de bom aspecto e decentemente vestidos; e os Anjos disseram:
"Eles aparecem assim em sua própria luz, mas quando a luz influi do Céu, as
faces mudam e as vestes também". É o que aconteceu; e então eles apareceram
com as faces lívidas, cobertos de sacos pretos; mas esta luz tendo sido retirada,
foram vistos como antes. Pouco depois falei a alguns da assembléia, e disse:
"O uvi a multidão que vos cerca gritar: "Ó como, são Eruditos! Q ue me seja
179

pois permitido discorrer convosco sobre assuntos que são da mais profunda
Erudição"; e eles responderam:"Diz o que te agrada e nós te satisfaremos"; e eu
fiz esta pergunta: "Q ual deve ser a R eligião pela qual o homem é salvo?", e eles
disseram:"N ós dividiremos a questão em várias outras, e antes de ter concluído
sobre estas não podemos dar resposta; é preciso primeiro por em discussão: 1.
se uma R eligião é alguma cousa; 2.se há salvação ou não; 3. se há uma R eligião
que seja mais eficaz do que uma outra; 4. se há um Céu e um Inferno; 5. se há
uma vida eterna depois da morte; além de muitos outros pontos". E pedi que
tratassem do primeiro ponto: Se uma R eligião é alguma cousa? E eles se
puseram a discutir este ponto por uma multidão de argumentos: H á uma
R eligião, e o que se chama assim é alguma cousa? E lhes pedi para relatá-la à
Assembléia, e eles o fizeram, e a resposta comum foi que esta Proposição exigia
tão numerosas pesquisas, que não, poderia ser resolvida em uma sessão. "M as,
perguntei, poderia sê-lo em um ano.?" E um deles me disse que não o poderia
ser em cem anos; e eu disse:"Esperando isso estais sem religião"; ele respondeu:
"N ão deve primeiro ser demonstrado se há uma R eligião, e se o que é chamado
R eligião é alguma coisa? Se há uma ela será também para os sábios; se não há, o
que é chamado religião será unicamente para o vulgo; sabe-se que a R eligião é
chamada Ligação; mas pergunta-se para quem é esta ligação; se é unicamente
para o vulgo, não é em si mesma alguma cousa; se é também para os sábios, ela
é alguma cousa". Depois de ter ouvido esta resposta, eu lhes disse "V ós nada
tendes de Eruditos, pois não podeis senão pensar se uma cousa é, ou não é, e
examiná-la em um ou outro sentido; quem é que se pode tornar Erudito, a não
ser que saiba alguma cousa com certeza, e avance nessa cousa, como um
homem avança passo a passo e sucessivamente na sabedoria? De outro modo,
não tocais nem mesmo com um dedo as verdades, mas as afastais cada vez mais
da vista; raciocinar somente se uma cousa é ou não é,não é raciocinar sobre um
boné sem jamais pô-lo na cabeça, ou sobre um sapato sem calçá-lo? Q ue
segue-se daí, senão que não sabeis se, seja o que for, existe, nem mesmo se há
uma salvação, se há uma vida eterna depois da morte, se uma R eligião, vale
mais do que uma outra, se há um Céu e um Inferno; vós nada podeis pensar
sobre esses assuntos, enquanto vos detiverdes no primeiro passo, e aí bateis a
areia, sem levar um pé adiante do outro e sem avançar. T omai cuidado para
que vossas M entes, enquanto se mantém assim fora do julgamento, não se
endureçam interiormente, e não se tornem estátuas de sal, e vós, amigos da
esposa de Loth". Depois de ter assim falado, fui embora; e eles, em sua
indignação, jogaram pedras atrás de mim; e então me apareceram como
estátuas de pedra, nas quais não há cousa alguma de razão humana. E indaguei
dos Anjos sobre a sorte destes espíritos; e eles me disseram: "A sua sorte é serem
precipitados no profundo, e aí em um deserto e serem reduzidos a carregar
fardos, e então, como nada podem dizer conforme a razão, balbuciam e falam
de cousas frívolas; e aí,de longe,aparecem como asnos carregando suas cargas.
233 - T erceiro M emorável: Em seguida um Anjo me disse: "Segue-me para o
180

lugar onde se grita: "Ó como são sábios!" e disse: "V erás prodígios de homens;
verás faces e corpos, que são de homens, e entretanto não são de homens"; e eu
disse: "São de bestas?" R espondeu: "N ão são de bestas, mas são de homens-
bestas,pois eles são tais,que não podem de modo algum ver se o vero é vero ou
não, e entretanto, podem fazer que tudo o que querem seja vero; estes, entre
nós, são chamados Confirmadores". E seguimos o G rito, e chegamos ao lugar;
e eis, uma Assembléia de homens, e em torno da Assembléia uma multidão, e
na multidão algumas pessoas de distinção, que, tendo ouvido que eles
confirmavam tudo que diziam, e que, por uma aquiescência tão manifesta, lhes
eram favoráveis, se voltaram e disseram: ''Ó como são sábios!" M as o Anjo me
disse: "N ão vamos para perto deles, mas chamemos um da Assembléia": e
chamamos um, e nos retiramos com ele à parte, e falamos de diversas cousas; e
ele confirmava todas essas cousas, a ponto de aparecerem absolutamente como
verdadeiras; e lhe perguntamos se ele podia também confirmar as cousas
contrárias; e ele disse que o podia tão bem como para as precedentes; então
disse abertamente e do fundo do coração: “O que é o vero? Será que na
natureza das cousas há outro vero que não seja o que o homem faz vero? Diz
tudo que te agrada,e eu farei que seja vero",e eu disse:"Faz vero isto, que a Fé
é o todo da Igreja"; e ele o fez com tanta destreza e habilidade, que os Eruditos
que estavam em torno ficaram admirados e aplaudiram: depois, lhe pedi para
fazer vero, que a Caridade é o todo da Igreja; e ele o fez; e em seguida, que a
Caridade não pertence em cousa alguma à Igreja, e envolveu uma e outra
proposição e as ornou com aparências, de sorte que os assistentes se olhavam
entre si, e diziam: "N ão está aí um Sábio?" E eu disse: "N ão sabes que bem
viver é a Caridade, e que bem crer é a Fé? N ão é que aquele que vive bem,
também crê bem, e que assim a fé pertence à caridade, e a caridade à fé? N ão
vês que isso é vero? Ele respondeu: "Farei isso vero, e verei"; e o fez, e disse:
"agora eu vejo"; mas pouco depois ele fez que o contrário fosse vero, e então
disse: "V ejo também que isso é vero"; a essas palavras, sorrimos e dissemos:
"N ão estão aí cousas contrárias? Como dois contrários podem ser vistos veros?"
A isso ele respondeu muito indignado: "V ós estais no erro, um e outro é vero,
pois que não há vero senão o que o homem faz vero". Perto de lá estava
alguém, que no M undo tinha sido Embaixador de primeira classe; ficou
admirado do que acabava de ouvir, e disse: "R econheço que há alguma cousa
semelhante no M undo,mas não obstante,tu desarrazoas; faz,se podes, que seja
vero que a Luz é O bscuridade, e que a obscuridade é a Luz"; e ele respondeu:
"Eu o farei facilmente; o que é a Luz e a O bscuridade, senão um Estado do
O lhos? N ão é que a luz é mudada em sombra quando o olho acaba de ser
exposto aos raios do sol? Q uem não sabe que então o olho é modificado, e que
em conseqüência a luz aparece como sombra; e que vice-versa, quando o estado
do olho volta, esta sombra aparece como luz? A Coruja não vê na obscuridade
da noite como uma luz do dia,e a luz do dia como uma obscuridade de noite; e
então o sol mesmo como um globo opaco e sombrio? Se o homem tivesse os
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olhos como a coruja, que chamaria ele luz, e que chamaria obscuridade? Então,
o que é a luz, senão um estado do olho e se é somente um estado do, olho a
Luz não é a O bscuridade,e a O bscuridade a Luz? Portanto um é vero e o outro
é vero". Em seguida o Embaixador pediu ao Confirmador para fazer vero isto,
que o corvo é branco, e não preto; e ele respondeu: "Eu o farei ainda
facilmente; e disse:"T oma uma agulha ou uma faca,e abre as asas e as penas do
corvo, não são elas brancas por dentro? Depois afasta as asas e as penas, e
examina o Corvo pela pele, não é ele branco? O que é o preto que o cerca,
senão uma sombra pela qual, não se deve julgar a cor do Corvo. Q ue ,o preto
não seja senão a sombra, consulta aqueles que possuem a Ciência da ótica, e
eles to dirão; ou antes, pulveriza uma pedra preta, ou o vidro preto e veras que
seu pó é branco?" M as, respondeu o Embaixador: "N ão é que o Corvo aparece
preto diante da vista?" “O que! replicou o Confirmador, tu queres, tu que és
um homem, pensar alguma cousa pela aparência! podes dizer, é verdade, pela
aparência, que o Corvo é preto, mas não o podes pensar; assim, por exemplo
podes dizer, pela aparência, que o Sol se levanta, sobe, desce e se deita, mas
como tu és um homem, não podes pensá-lo, pois o Sol permanece imóvel, e a
T erra gira; dá-se o mesmo com o Corvo, uma aparência, é uma aparência; diz
tudo que quiseres, o, corvo é inteiramente branco; e branqueia também
quando se torna velho, é o que eu vi". Em seguida lhe pedimos para dizer do
fundo do coração se estava brincando,ou se acreditava que não há vero senão o
que o homem faz vero; e ele respondeu: Juro que o creio". Depois disso o
Embaixador lhe fez esta pergunta: "Podes fazer vero isto, que és louco?" e ele
disse: "Eu o poderia, mas não o quero; quem é que não é louco?" Depois desta
conversa, este Confirmador universal foi enviado aos Anjos, a fim de que
examinassem o que ele era; e, depois de o terem examinado, disseram que ele
não possuía nem mesmo um grão de entendimento, porque tudo que está
acima do racional estava fechado nele, e que nele não havia aberto senão o que
está abaixo do racional; acima do R acional está a Luz celeste, e abaixo do
R acional está a Luz natural, e no, homem esta é tal que ele pode confirmar
tudo que lhe agrada; mas se a Luz celeste não influi na Luz natural, o homem
não vê se o que é vero é vero, nem por conseqüência também se o que é falsa é
falso; ora, ver um e outro depende da luz celeste na luz natural; e a luz celeste
vem do Deus do Céu, que é o Senhor; é por isto que este confirmador
universal não é nem homem nem besta; mas é besta-homem. Perguntei ao
Anjo qual era a sorte destes confirmadores,e se podiam estar com os vivos, pois
que a vida está no homem pela Luz celeste, e seu entendimento vem desta luz;
e ele me disse que estes confirmadores, quando estão sós, não podem pensar
cousa alguma, nem por conseqüência dizer coisa alguma, mas ficam de pé
mudos como máquinas, e como que mergulhados em um profundo sono, mas
despertam desde que alguma coisa atinja seus ouvidos; e acrescentou que tais se
tornam aqueles que são intimamente maus; a luz celeste não, pode influir neles
pela porta superior, mas influi unicamente pelo M undo algum espiritual, de
182

onde lhes vem a faculdade de confirmar. Depois destas explicações ouvi uma
voz vinda dos Anjos que o haviam examinado, dizendo: "Faz de tudo que
ouviste uma Conclusão geral":e fiz esta:"Poder confirmar tudo que agrada não
é obra de um homem inteligente, mas poder ver que o que é vero é vero e o
que é falso é falso, e confirmá-lo, é obra de um homem inteligente". Dirigi em
seguida meu olhar para a Assembléia onde estavam os Confirmadores; e em
torno deles a multidão gritava: "Ó como são sábios!" e eis que uma nuvem
sombria os envolveu, e na N uvem voavam corujas e morcegos; e me foi dito:
"As corujas e os morcegos que voam na nuvem preta são correspondências e
por conseguinte aparências dos pensamentos destes Confirmadores; pois as
confirmações das falsidades, ao ponto de aparecerem como verdades, são
representadas neste M undo sob formas de pássaros noturnos, cujos olhos são
iluminados por dentro por uma luz quimérica, pela qual vêem os objetos nas
trevas como em uma luz; uma tal luz quimérica espiritual está naqueles que
confirmam os falsos a ponto, de vê-lo: como veros, e em seguida, de dizê-los e
crê-los como veros; todos estes estão na visão posterior, e não estão em vista
alguma anterior.
183

Das causas das frieza,das


separações e dos divórcios nos
casamentos
234 - T ratando aqui das Causas das Frieza nos Casamentos, tratarei também ao
mesmo tempo das Causas das Separações e dos Divórcios, por que elas são
ligadas umas às outras; com efeito, as Separações não vêm de outra parte senão
das Frieza nascidas sucessivamente depois do Casamento, ou de causas
descobertas depois do Casamento e das quais vem também a frieza; quanto aos
divórcios, vêm dos Adultérios, porque os adultérios são inteiramente opostos
aos Casamentos e os opostos introduzem a frieza, senão nos dois esposos, ao
menos em um deles. Eis a razão pela qual as Causas das frieza, das separações e
dos divórcios serão postas juntas em um único Capítulo. M as as ligações das
causas entre si serão mais claramente discernidas, se vistas em série; sua série é
esta: I. H á um Calor espiritual, e há uma Frieza espiritual; o Calor espiritual é
o amor, e a Frieza espiritual é a privação desse amor. II. A Frieza espiritual nos
Casamentos é a desunião das almas e a disjunção das mentes, donde nascem a
Indiferença, a Discórdia, o Desprezo, o Desgosto, a Aversão, em conseqüência
dos quais, em muitos, há enfim Separação quanto ao leito, ao quarto e a casa.
III. As Causas das frieza em suas sucessões são em grande número, algumas são
Internas, outras Externas e outras Acidentais. IV . As Causas internas das frieza
vêm da R eligião. V . A Primeira das causas é a rejeição da R eligião por um ou
pelo outro.V I.A Segunda,é quando um tem R eligião, e o outro não tem. V II.
A T erceira é quando um é de uma R eligião, e o outro é de uma outra. V III. A
Q uarta, a falsidade imbuída da R eligião. IX . São estas as Causas da frieza
interna, mas não ao mesmo tempo externa, entre muitos. X . H á também várias
Causas externas de frieza; e a Primeira é a dessemelhança das mentes (animi) e
dos costumes. X I. A Segunda, é que um crê que o Amor Conjugal é o mesmo
que o Amor escortatório, com a única diferença de que este, pela lei, é ilícito,
enquanto que aquele é lícito. X II. A T erceira, é a rivalidade de preeminência
entre os esposos.X III.A Q uarta é a falta de determinação para qualquer estudo
ou para qualquer ocupação, de onde resulta uma cupidez vaga. X IV . A Q uinta
é a desigualdade de estado e de condição nos Externos. X V . H á também certas
Causas de separação. X V I. A primeira destas causas é um V ício do mental.
X V II.A Segunda é um V ício do corpo. X V III. A T erceira é a Impotência antes
do casamento.X IX .O Adultério é a causa do Divórcio. X X . H á também várias
Causas acidentais, e a Primeira dessas causas é o comum que resulta de que há
continuamente permissão. X X I. A Segunda é que a coabitação com o cônjuge,
pela aliança e a lei, parece forçada e não livre. X X II. A T erceira é a afirmação
184

da parte da esposa, e propósitos sobre o amor por ela. X X III. A Q uarta é o


pensamento do marido, dia e noite, que sua esposa quer; e de outro lado, o
pensamento da esposa,que seu marido não quer. X X IV . Conforme a frieza está
na mente, está também no corpo; e segundo os acréscimos desta frieza, os
externos do corpo também são fechados. Segue agora a Explicação destes
Artigos.
235 - I.H á um Calor espiritual, e há uma Frieza espiritual; o Calor espiritual é
o Amor,e a Frieza espiritual é a privação deste amor.
O Calor espiritual não vem de outra parte senão do Sol do mundo espiritual;
pois lá há um Sol procedente do Senhor que está no seu meio; e como procede
do Senhor, esse Sol é em sua existência o puro Amor; este Sol diante dos Anjos
aparece ígneo, absolutamente como aparece o Sol de nosso M undo diante dos
homens; e aparece ígneo porque o Amor é o fogo espiritual: deste Sol
procedem um Calor e uma Luz; mas este Sol é o puro Amor, o calor que dele
procede é em sua essência o amor, e a luz que dele procede é em sua essência a
sabedoria; por aí se vê claramente de onde vem o calor espiritual, e que este
calor é o amor. Será também exposto em poucas palavras de onde vem a Frieza
espiritual; ela vem do Sol do M undo natural, e de seu calor e de sua luz; o Sol
do M undo natural foi criado, a fim de que seu calor e sua luz recebam em si o
calor e a luz espirituais, e que por meio de atmosferas os levem até aos últimos
na terra, para que produzam os efeitos dos fins, os quais pertencem ao Senhor
em Seu Sol, e também para que envolvam os espirituais com vestes adequadas,
isto é, de materiais, para operar os fins últimos na natureza; estas cousas
acontecem quando o calor espiritual foi ajuntado ao calor natural: mas o
contrário acontece,quando o calor natural está separado do calor espiritual; isso
acontece naqueles que amam os naturais e rejeitam os espirituais; nestes o calor
espiritual se torna frieza. Se estes dois amores, que por criação estão de acordo,
se tornam assim opostos, é porque então o calor-amor se torna calor-servo, e
vice-versa; e para que isto não aconteça,o calor espiritual, que por sua origem é
o amor se retira; e então nessas pessoas o calor espiritual esfria, porque se torna
oposto: por estas explicações vê-se claramente o que é a frieza espiritual, e que
esta frieza é a privação do calor espiritual. N o que acaba de ser dito, pelo calor
é entendido o amor, porque este calor, vivendo nas pessoas é sentido como
amor.Aprendi,no M undo espiritual,que os Espíritos inteiramente naturais são
tomados de um frio íntimo quando se põem ao lado de um Anjo que está em
um estado de amor; e que se dá o mesmo com os espíritos do inferno, quando,
o calor influi do Céu sobre eles e que entretanto, entre si, quando o calor do
céu se retirou eles ardem com um grande calor.
236 - II. A Frieza espiritual nos Casamentos é a desunião das almas, e a
disjunção das mentes,de onde nascem a indiferença, a discórdia, o desespero, o
desgosto, a aversão em conseqüência cia dos quais, em muitos, há enfim
separação quando ao leito,ao quarto e à casa.
185

Q ue seja isso o que acontece entre os esposos, quando seu primitivo amor se
afasta e se torna frieza, isso é muito conhecido, para que precise de explicação.
A razão, é que a frieza conjugal reside acima de todas as outras frieza nas
mentes humanos; pois o conjugal mesmo está inscrito na alma, para este fim
que uma alma seja propagada por uma alma, e a alma do pai nos filhos; daí
vem que esta frieza aí começa,e decorre sucessivamente nas cousas que seguem,
e as infecta, e assim muda as alegrias e os prazeres do amor primitivo em
tristezas e desprazeres.
237 - III. As Causas das frieza em suas sucessões são em grande número,
algumas,são Internas,e outras Externas,e outras Acidentais.
Q ue as causas das frieza nos casamentos sejam em grande número, sabe-se no
mundo; sabe-se também que têm sua origem em muitas causas externas; mas
não se sabe que as origens das causas estão profundamente escondidas nos
internos, e que daí elas derivam para as causas que seguem até que apareçam
nos externos. A fim de que se saiba portanto que as causas externas, não são
causas em si mesmos, mas são derivadas de causas em si mesmas que como
acaba de ser dito, estão nos íntimos, as causas por conseqüência são a princípio
distinguidas geralmente em Internas e Externas, e são em seguida examinadas
particularmente.
238 - IV .As Causas internas de frieza vêm da R eligião.
Q ue a origem mesma do amor conjugal reside nos íntimos do homem, isto é,
em sua Alma, todo homem está convencido disso por estas únicas
considerações, a saber, que a Alma da criança vem do pai, e que isso é
conhecido pela semelhança de inclinações e de afeições, e também pela
semelhança comum das faces que se perpetua do pai na posteridade mesmo a
mais afastada; além disso, pela faculdade propagativa gravada nas almas por
criação; e além disso pelo análogo nos seres do reino vegetal, em que nos
íntimos das germinações está escondida à propagação da semente mesma, e por
conseqüência do todo, quer seja uma árvore, ou um arbusto, ou uma planta.
Esta força propagativa ou plástica nas sementes deste reino, e nas almas do
outro reino,não vem de outra parte senão da Esfera conjugal, que é a do bem e
do vero,e que emana e influi continuamente do Senhor Criador e Conservador
do U niverso,ver acima,ns.222 a 225; e do esforço destes dois,o bem e o vero,
lá, para se conjuntar em um; é deste esforço conjugal, que tem sua sede nas
almas, que existe originariamente o amor conjugal: que este mesmo casamento,
donde procede esta Esfera U niversal, faça a Igreja no homem, é o que foi
suficientemente mostrado no Capítulo sobre o Casamento do Bem e do V er-o,
e várias vezes em outros lugares; por aí, diante da razão, é de todo evidência
que a origem da Igreja e a origem do amor conjugal estão em uma mesma
morada, e que estão continuamente abraçadas; mas sobre este assunto, ver
maiores detalhes, acima n. 130, onde foi demonstrado que o amor conjugal é
segundo o estado da Igreja no homem, assim depende da religião, pois que a
186

religião constitui este estado. O homem foi criado desse modo, a fim de que
possa se tornar cada vez mais interior, e ser assim cada vez mais introduzido ou
elevado para esse casamento, e por conseqüência no amor verdadeiramente
conjugal, e isso a ponto de perceber G estado de beatitude: que o único meio
de introdução ou de elevação seja a R eligião, vê-se claramente pelo que foi dito
acima, que a origem da Igreja e a origem do amor conjugal estão em uma
morada, e aí estão em um mútuo abraço, e que por conseguinte não podem
deixar de estar conjuntos.
239 - Do que acaba de ser dito, segue-se que, onde não há R eligião, aí não há
também amor conjugal; e que, onde não há este amor, aí há frieza; que a frieza
conjugal seja a privação deste amor, vê-se acima, n. 235. Por conseqüência a
frieza conjugal é também a privação do estado de Igreja, ou de R eligião. U ma
confirmação assaz evidente de que a cousa é assim pode ser tirada da ignorância
geral hoje em dia sobre o amor verdadeiramente conjugal. Q uem é, hoje, que
sabe, e quem é hoje, que quer reconhecer, e quem é hoje que não se admirará
que o amor conjugal tira daí sua origem? M as isso vem unicamente de que,
ainda que haja religião, não há entretanto veros da religião; e o que é uma
religião sem veros? Q ue não haja veros, é o que foi plenamente demonstrado
no Apocalipse R evelado; ver também neste T ratado o M emorável n.566.
240 - V . A primeira das causas internas de frieza é a rejeição da R eligião por
um ou por outro esposo.
N aqueles que repelem de face para o occiput, ou do peito para o dorso, as
cousas santas da Igreja, não há amor algum bom; se algum se apresenta no
corpo, não há, entretanto, nenhum no espírito; em tais homens os bens se
colocam por fora dos males, e os cobrem como uma roupa brilhante de ouro,
cobre um corpo gangrenado; os males que residem no interior e estão cobertos,
são em geral ódios, e por conseqüência guerras intestinas contra todo espiritual;
pois todas as cousas da Igreja que eles rejeitam são em si mesmas espirituais; e
como o amor verdadeiramente conjugal é o amor fundamental de todos os
amores espirituais; como foi mostrado acima, é evidente que há contra ele um
ódio intrínseco,e que neles o amor intrínseco ou próprio é em favor do oposto,
que é o amor do adultério; eles,portanto,mais que os outros escarnecerão desta
verdade de que cada um tem o amor conjugal segundo o estado da Igreja; e
mesmo talvez riam à bandeiras despregadas só ao nome de amor
verdadeiramente conjugal; mas seja; que se lhes perdoe entretanto, porque a
respeito dos enlaçamentos nos casamentos, pensar outra cousa diferente do que
pensam dos enlaçamentos nas escortações, isso lhes é tão impossível como o é a
um camelo passar pelo buraco de uma agulha. Esses, que são assim,
experimentam quanto ao amor conjugal mais frieza que todos os outros; se são
ligados a suas esposas, não é senão por algumas das causas externas,
mencionadas acima n. 153, que retêm e ligam. N eles os interiores, que
pertencem à alma e por conseguinte à mente, são cada vez mais fechados, e no
187

corpo obstruídos, e então o amor do sexo torna-se vil também, ou cai em uma
extravagante lascívia nos interiores de seu corpo, e por conseguinte nos ínfimos
de seu pensamento; são eles que também, são entendidos no M emorável n. 79;
que o leiam,se isso lhes agrada.
241 - V I.A Segunda das causas internas de frieza,é quando um tem R eligião, e
o outro não a tem.
Isto vem de que suas almas não podem deixar de estar em desacordo; pois a
alma de um está aberta para a recepção do amor conjugal, mas a outra está
fechada para a recepção desse amor; a alma está fechada naquele que não tem
religião, e está aberta naquele que tem religião; por conseguinte coabitação
alguma não é possível; e quando o amor conjugal é banido, a frieza vem, mas
para aquele dos esposos que não tem religião; esta frieza não é dissipada senão
pela recepção de uma religião conforme a do outro, se esta é verdadeira; de
outro modo, no esposo que não tem religião alguma, segue-se uma frieza que
desce da alma ao corpo até a pele, donde resulta que enfim ele não suporta
olhar diretamente em face o outro esposo, nem lhe falar respirando o mesmo
ar, ou de outro modo que não seja com um tom seco, nem tocá-lo com a mão,
e apenas de costas sem fazer menção, das loucuras que, por esta frieza, se
insinuam nos pensamentos,e que eles não divulgam: o que é causa de que esses
casamentos se rompam por si mesmos:além disso,sabe-se que o ímpio despreza
seu consorte; e todos os que não têm religião são ímpios.
242 - V II. A T erceira das coisas internas de frieza, é quando um é de uma
R eligião,e o outro de uma outra.
A razão disso, é que neles o bem não pode ser conjunto com seu vero
correspondente, pois a esposa é o bem do vero do marido, e o marido é o vero
do bem da esposa, como foi mostrado acima; de duas almas eles não podem ser
feitos uma só alma; por conseguinte a fonte deste amor está fechada; uma vez
fechada,chega-se a um conjugal que tem sua sede acima, e que é o conjugal do
bem com um outro vero que não o seu ou do vero com um outro bem que não
o seu,entre os quais não existe amor concordante; daí, naquele dos esposos que
está nos falsos da religião, começa uma frieza, que se torna tanto mais intensa
quanto mais difere de princípios com o outro esposo. U m dia, em uma grande
cidade, percorri as ruas para encontrar um alojamento, e entrei em uma casa
onde moravam esposos de religiões diferentes; então, como eu nada sabia a
respeito, os anjos, dirigindo-me a palavra, disseram: "N ão podemos morar
contigo nesta casa porque os esposos são de religiões discordantes". Eles
percebiam isso pela desunião interna de suas almas.
243 - V III.A Q uarta das causas internas é a falsidade dá R eligião.
É porque a falsidade nas cousas espirituais ou arrebata a religião, ou a mácula;
arrebata naqueles em quem as verdades reais foram falsificadas; a macula
naqueles em que há, é verdade, falsidades, mas não verdades reais, as quais por
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conseqüência não foram falsificadas; nestes pode haver bens com os quais estes
falsos podem ser conjuntos pelo Senhor por meio de aplicações, pois estes falsos
são como diversos tons discordantes, que, por arranjos e combinações hábeis,
são postos em harmonia, de onde vem mesmo o atrativo do canto; neles pode
haver algum amor conjugal, mas naqueles que falsificaram em si os veros reais
da Igreja não o pode haver: destes vem à ignorância que reina a respeito do
Amor verdadeiramente conjugal, ou a dúvida negativa de que este amor possa
existir; e deles vem também esta extravagância que se apodera das mentes de
muitos,a saber,que os adultérios não são males da religião.
244 - IX . As Causas expostas acima são causas de frieza interna, mas não ao
mesmo tempo externa em muitos.
Se as causas até aqui indicadas e confirmadas, que são causas de frieza nos
internos, produzissem uma semelhante frieza nos externos; se fariam tantas
separações quantas frieza internas houvesse; e há tantas destas frieza quantos
casamentos há -entre pessoas que estão a os falsos de religião, ou em religiões
diferentes, ou que não têm religião alguma, e de que se acaba de falar; e
entretanto é notório que um grande número de pessoas coabitam como amores
e como amizades mútuas, mas de onde isso provém nos que estão em frieza
interna, é o que será dito no Capítulo seguinte, concernente as Causas de uma
aparência de amor,de amizade e de bons ofícios entre esposos. H á várias causas
que conjuntam as mentes (animi),mas que entretanto não conjuntam as almas;
entre estas causas há algumas daqueles de que se falou no n. 183, mas acontece
que a frieza está sempre profundamente escondida no interior, e é aqui e ali,
notada e sentida neles as afeições se afastam de uma parte e de outra, mas os
pensamentos, quando se manifestam na linguagem e nas maneiras se
aproximam pela aparência de amizade e de bons ofícios; por isso, esses não
sabem coisa alguma dos encantos e dos prazeres, nem, com mais forte razão,
cousa alguma da felicidade e da beatitude do Amor verdadeiramente conjugal;
tudo isso para eles é apenas nada mais que fábulas. São do número dos que dão
as origens do amor conjugal as mesmas causas, que lhe atribuíam os nove das
Assembléias de sábios reunidas de diversos reinos; ver acima os M emoráveis ns.
193 a 114.
245 - Contra as cousas confirmadas acima, pode-se fazer esta objeção, que
entretanto a alma é propagada pelo pai, ainda que não tenha sido conjunta à
alma da mãe, e mesmo ainda que a frieza que aí reside faça separação. M as se
almas ou progenituras são contudo propagadas, é porque o entendimento, do
marido não está fechado, e o que é mais, pode ser elevado à luz em que está a
alma; mas o amor de sua vontade não é elevado ao calor correspondente à luz,
aí, senão pela vida que de natural se faz espiritual; daí vem que a alma é
entretanto propagada; mas na descida, quando se torna semente, é velada por
cousas que pertencem a seu amor natural; daí brota o mal hereditário. A estas
explicações acrescentarei um arcano que vem do Céu, a saber, que entre as
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almas disjuntas de duas pessoas, sobretudo de dois esposos se faz uma


conjunção em um amor médio, e que de outro modo às concepções não se
daria. Além disso, quanto à frieza conjugal e ao lugar onde tem a sua sede,
ver-se-á no último M emorável deste Capítulo, n. 270, que é na região suprema
da mente.
246 - X . H á também várias causas externas de frieza, e a Primeira é a
dessemelhança das mentes (animi).
H á semelhanças e dessemelhanças internas, e as há externas; as internas não
tiram sua origem senão da R eligião; pois esta é implantada nas almas, e pelas
almas passa dos pais aos filhos como suprema inclinação, com efeito, a alma de
cada homem tira a vida do casamento do bem e do vero, e deste casamento
vem a Igreja; e como a Igreja é diversa e diferente nas Partes do G lobo, é
também por isso que as almas de todos os homens são diversas e diferentes; daí
vêm, portanto, as semelhanças e as dessemelhanças internas, e de acordo com
elas as conjunções conjugais de que se tratou. Q uanto às semelhanças e as
dessemelhanças externas, vêm não das almas, mas das mentes (animi); pelas
M entes (Animi) são entendidas as afeições e por conseguinte as inclinações
externas, que são insinuadas principalmente após o nascimento pela Educação,
pelas Sociedades, e conseqüentemente pelos H ábitos; com efeito, se diz,
"minha intenção (animus) é fazer tal ou tal cousa"; por isso é percebido que é a
afeição e a inclinação por esta cousa; as persuasões tomadas referentes a tal ou
qual gênero de vida,costumam também formar estas mentes (animi) daí vêm às
inclinações para contrair casamentos mesmo com pessoas não apropriadas, e
também a se recusar aos casamentos com pessoas apropriadas; mas entretanto
estes casamentos após um certo tempo de coabitação variam segundo as
semelhanças e as dessemelhanças contraídas por herança e ao mesmo tempo
pela educação; e as dessemelhanças conduzem à frieza. Dá-se o mesmo com as
dessemelhanças de costumes; por exemplo um homem grosseiro com uma
mulher polida, ou uma mulher grosseira com um homem polido; um homem
asseado com uma mulher desasseada; ou uma mulher asseada com um homem
desasseado; um homem ou uma mulher que gosta de querelas com uma mulher
ou um homem que ama a paz; em uma palavra, um homem imoral com uma
mulher moral, ou uma mulher imoral com um homem moral. O s casamentos
entre pessoas tão dessemelhantes parecem-se muito às conjunções de diversas
espécies de animais entre si, por exemplo, ovelhas e bodes, cervos e mulas,
galinhas e gansos, pássaros e aves de um gênero mais nobre, e mesmo cães e
gatos, que por causa das dessemelhanças não se consorciam; mas no gênero
humano as faces não indicam as dessemelhanças; mas os hábitos as manifestam,
é portanto daí que vêm as frieza.
247 - X I.A Segunda das causas externas de frieza,é que se acredite que o Amor
conjugal é o mesmo que o amor escortatório,com a única diferença que este de
acordo com a lei é ilícito,enquanto que o outro é lícito.
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Q ue daí venha a frieza, a razão o vê claramente; quando considera que o amor


escortatório é diametralmente oposto ao amor conjugal; quando, portanto, se
crê que o amor conjugal é um com o amor escortatório, estes dois amores
tornam-se, semelhantes na idéia e então a esposa é considerada como uma
prostituta, e o casamento como uma impudicícia; o homem mesmo é por isso
adúltero senão de corpo, ao menos de espírito: que daí decorra entre o homem
e sua mulher o desprezo, o desdém e a repugnância, e assim uma frieza
excessiva, é uma conseqüência inevitável; pois nada encerra mais em si a frieza
conjugal que o amor escortatório; e como o amor escortatório passa também
nessa frieza,ele pode,não sem razão,ser chamado a frieza conjugal mesma.
248 - X II. A T erceira das causas externas é a rivalidade de preeminência entre
os esposos.
A razão disso, é que o amor conjugaI põe no número de suas cousas principais
a união das vontades, e por conseguinte a liberdade do que agrada; a rivalidade
de preeminência ou a respeito do comando expulsa do casamento esta união e
esta liberdade; pois divide e partilha as vontades, e muda em servidão a
liberdade do que agrada: enquanto dura esta rivalidade, o espírito de um
medita violências contra o outro; se então suas mentes se abrissem e fossem
examinados pela vista espiritual, eles apareceriam Como combatendo com
punhais, e como se encarando ora com ódio, e ora com olhar favorável, com
ódio quando estão na violência da rivalidade, e com olhar favorável quando
tem a esperança de dominar, e quando estão no desejo libidinoso. Depois da
vitória de um sobre o outro,este combate se afasta dos externos, e se retira para
os internos do mental, e aí fica escondido com inquietação; daí vem à frieza
naquele que foi subjugado ou se tornou escravo, e também na esposa que ficou
vitoriosa ou se tornou senhora; se há também frieza nesta, é porque não há
mais amor conjugal, e a privação deste amor é a frieza, n. 234; em lugar do
amor conjugal, esta tem o calor proveniente da preeminência, mas este calor é
inteiramente discordante com o calor conjugal, não obstante, pode concordar
exteriormente por meio do desejo libidinoso. Após uma convenção tácita entre
eles, parece que o amor conjugal se tornou amizade; mas a diferença entre a
amizade conjugal e a amizade servil nos casamentos, é como a diferença entre a
luz e a sombra, entre um fogo vivo e um fogo fátuo, e mesmo como, entre um
homem carnudo e um homem que só tem os ossos e a pele
249 - X III. A Q uarta das causas externas da frieza é a falta de determinação
para qualquer estudo ou para qualquer ocupação, de onde resulta uma cupidez
vaga.
O homem foi criado para os usos, porque o uso é o continente do bem e do
vero, do casamento dos quais procede a criação, e também o amor conjugal,
como foi mostrado no Capítulo concernente do casamento. Por estudo e por
ocupação, entende-se toda aplicação aos usos; quando portanto o homem está
em algum estudo ou em alguma ocupação, esta no uso, sua mente é então
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limitada e circunscrita como por um círculo, dentro do qual é sucessivamente


coordenada em uma forma verdadeiramente humana, de onde, como de uma
casa, vê fora dela as diversas cobiças, e por uma razão sã interior as extermina;
por conseqüência, extermina também as loucuras bestiais do desejo libidinoso
da escortação; daí resulta que o calor conjugal fica melhor e por mais tempo
nestes do que nos outros. O contrário acontece aos que se dão à preguiça e à
ociosidade; o mental destes está sem limites e sem termo, e por conseguinte o
homem admite nele plenamente tudo que é inútil e frívolo que influi do
mundo e do corpo, e o leva ao amor; que então o amor conjugal seja mesmo
lançado no exílio, isso é evidente; pois pela preguiça e a ociosidade a mente se
torna estúpida e o corpo se entorpece, e o homem inteiro se torna insensível a
todo amor vital, principalmente ao amor Conjugal, de onde emanam como de
uma fonte, as atividades e as vivacidades da vida. M as neles a frieza conjugal é
diferente desta frieza nos outros; ela é, é verdade, uma privação do amor
conjugal,mas por falta.
250 - X IV . A Q uinta das causas externas é a desigualdade de estado e de
condição nos externos.
H á várias desigualdades de estado e de condição, que durante a coabitação,
destroem o amor conjugal começado antes das núpcias; mas podem ser
relacionadas as desigualdades quanto às Idades, quanto às Dignidades, e quanto
à O pulência. Q ue a desigualdade de Idades, como de um moço com uma
velha, e de uma moça com um velho, conduzam à frieza, nos casamentos, isso,
não precisa ser provado. Q ue a desigualdade de Dignidades produza um efeito
semelhante, como no casamento de um príncipe com uma criada, ou de uma
dama distinta com um criado, isso também é reconhecido sem que seja preciso
prová-lo. Q ue se dê o mesmo com a opulência, a não ser que a semelhança das
mentes (animi) e das maneiras, e a aplicação de um dos esposos às inclinações e
aos desejos naturais do outro, os consociem, isso é evidente. M as, em todos
estes casos, as complacências de um por causa da preeminência do estado e da
condição do outro, não conjugam senão servilmente, e esta conjunção é fria;
pois neles o conjugal pertence,não ao espírito nem ao coração,mas unicamente
à boca e ao nome,do que o inferior tira vaidade,e de que o,superior enrubesce
com vergonha.M as nos Céus não há desigualdades de idades, de dignidades ou
de opulência; quanto aos Anjos, todos estão lá na flor da juventude, e nela
permanecem eternamente,quanto às Dignidades,todos lá consideram os outros
segundo os usos que desempenham; os que são mais iminentes pela condição
consideram os outros como irmãs, e não põem a dignidade acima da excelência
do uso, mas colocam a excelência do uso acima da dignidade; e, além disso.,
quando as virgens são dadas em casamento, não se sabe de que camada social
elas descendem,pois lá ninguém conhece o pai que teve na terra, mas o Senhor
é o Pai de todos; quanto à O pulência dá-se o mesmo; lá, ela consiste nas
faculdades de tornar-se sábio, faculdades segundo as quais as riquezas lhes são
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dadas com suficiência. Como nos Céus são formados os casamentos vê-se
acima,n.229.
251 - X V .H á também certas Causas de Separação.
H á Separações de leito, e Separações de casa. H á várias causas de separação de
leito, e também várias causas de separação de casa; mas aqui se trata de causas
legítimas. Como as Causas de separação coincidem com as causas de
Concubinagem, de que se tratará na segunda Parte desta O bra, em um
Capítulo especial, o Leitor é enviado para aí, para que veja estas causas em sua
ordem.As causas legítimas de separação são as seguintes.
252 - X V I.A Primeira causa de legítima Separação:é um vício da mente.
É porque o amor conjugal é a conjunção das mentes; se portanto a mente de
um toma uma direção contrária à mente do outro, esta conjunção é rompida, e
por esta ruptura o amor desfalece. Pode-se ver, por sua enumeração, os vícios
que causam a separação; são, quanto à maior parte, estes: A mania, o frenesi, o
furor, a loucura efetiva e o idiotismo, a perda da memória, uma violenta,
moléstia histérica, uma extrema simplicidade ao ponto de não ter percepção
alguma do bem e do vero, uma excessiva obstinação a não obtemperar ao que é
justo e eqüitativo, um supremo prazer em não conversar e não falar senão de
cousas frívolas e insignificantes; um desejo desenfreado de divulgar os sacredos
da casa; além disso, também, de querelar, de enganar e de blasfemar; a falta de
cuidado pelos filhos, a intemperança, a luxúria, a excessiva prodigalidade, a
embriaguez, a falta de asseio, a impudicícia, a aplicação à magia, aos prestígios,
a impiedade, e várias outros vícios. Por causas legítimas, aqui, não se entendem
causas judiciárias, mas causa legítima para o outro esposo; as separações de casa
rara-mente se dão por decisão de juiz.
253 - X V II.A Segunda causa legítima de Separação é um vício do corpo.
Por vícios do corpo não se entendem as moléstias acidentais que sobrevêm a
um ou a outro dos esposos durante o casamento, e que se curam, mas
entendem-se as moléstias inerentes, que não passam; a patologia as faz
conhecer; há diversas espécies delas, por exemplo: as moléstias que infectam o
corpo inteiro, ao ponto do contágio se tornar funesto, tais são as febres
malignas e pestilências,as lepras, os males venéreos, as gangrenas, os cânceres, e
outros semelhantes. Além disso, as moléstias pelas quais todo o corpo é de tal
modo deprimido, que não admite mais consociabilidade, e pelas quais são
exalados eflúvios perniciosos e vapores prejudiciais, seja da superfície do corpo,
seja de seus interiores, especialmente do estômago e do pulmão: da superfície
do corpo: as varíolas malignas, as verrugas, as pústulas, a tísica escorbútica, os
dartros virulentos, sobretudo se a face foi danificada; do estômago: as
fermentações (rapports) infectas, fétidas, vis, acerbas; do pulmão: hálitos fortes
e corrompidos, provenientes de úlceras, de abscessos, ou de sangue viciado, ou
de uma linfa corrompida. Além dessas moléstias, há ainda outras de diferentes
193

nomes, como lipotimia, que é uma fraqueza total do corpo e uma falta de
forças; a paralisia, que é uma redução e um relaxamento das membranas e dos
ligamentos que servem ao movimento; certas moléstias crônicas que tiram sua
origem da perda da sensibilidade e da elasticidade dos nervos, ou de demasiada
espessura, tenacidade e acrimônia dos humores; a epilepsia; uma enfermidade
permanente proveniente de apoplexia; certas tísicas pelas quais o corpo se
consome; o sofrimento ilíaco, a afecção celíaca, as hérnias, e outras moléstias
deste gênero.
254 - X V III. A T erceira causa de legítima Separação é a impotência antes do
casamento.
Q ue seja isso uma causa de separação, é porque o fim do casamento é a
procriação de filhos, e que esta não é possível da parte do impotente; e como
eles o sabem de antemão., privam de propósito deliberado, os esposos da
esperança desta procriação, esperança que entretanto nutre e fortifica seu amor
conjugal.
255 - X IX .O Adultério é a causa do Divórcio.
H á várias razões, que estão na luz racional, e entretanto escondidas hoje; pela
luz racional pode-se ver que os Casamentos são santos, e que os Adultérios são
profanos, e que assim os Casamentos e os Adultérios são diametralmente
opostos entre si; e que, quando um oposto age contra seu oposto, um destrói o
outro até à última centelha da vida; é o que acontece ao amor conjugal, quando
um dos esposos por princípio confirmado, e assim de propósito deliberado,
comete Adultérios. N aqueles que tem algum conhecimento do Céu e do
Inferno, estas cousas vêm ainda mais a uma clara luz da razão; pois estes sabem
que os Casamentos são do Céu e vêm do Céu, e que os Adultérios são do
inferno, e vêm do inferno, e que o casamento e o adultério, não podem estar
conjuntos, do mesmo modo, que o Céu não pode estar conjunto com o
inferno, e que se forem conjuntos no homem imediatamente o Céu se retira, e
o inferno entra. Daí resulta portanto que o Adultério é a causa do Divórcio; é
por isso que o Senhor disse: "Q uem quer que repudie sua esposa, que não seja
por causa de Escortação, e se case com uma outra, comete adultério". (M ateus
X IX ,9); Ele disse:Se ele repudia e se casa com uma outra, sem ser por causa de
escortação, comete adultério, porque a repudiação por esta causa é a completa
separação das mentes, que é chamada Divórcio; mas as outras repudiaçães
provenientes de suas causas particulares são Separações, de que se acaba de falar
acima; depois destas separações, se o homem toma uma outra esposa comete
adultério; mas não depois do divórcio.
256 - X X . H á também várias causas acidentais de frieza, e a Primeira destas
causas é o Comum que resulta de haver continuamente permissão.
Q ue o Comum que resulta de haver continuamente permissão seja uma causa
acidental de frieza, é porque isso acontece aos que pensam lascivamente sobre o
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casamento e sobre a esposa, e não aos que pensam santamente sobre o


casamento, e em plena segurança sobre a esposa. Q ue pelo Comum que resulta
de haver continuamente permissão as alegrias se tornem mesmo indiferenças, e
também enfados, isso é evidente pelos jogos e os espetáculos, pelos concertos,
bailes, festins e outras cousas semelhantes, que em si mesmos são
divertimentos, porque são vivificações; dá-se o mesmo com as comunicações e
as ligações entre esposos, sobretudo entre aqueles que não afastaram do amor
que tem um pelo outro, o amor incasto do sexo; e quando pensam no comum
que resulta de haver continuamente permissão, pensam vãmente na ausência da
faculdade: que para estes o comum seja uma causa de frieza, o fato é evidente
por si mesmo; se diz que isto é acidental porque isso se junta à frieza intrínseca
como causa e se alinha do seu lado como razão. Para afastar a frieza que tira daí
a sua origem, as esposas por uma prudência inata nelas, fazem por diversas
resistências, com que este direito não seja um direito. M as é completamente
diferente naqueles que julgam castamente as esposas; e por isso que nos Anjos o
Comum que resulta de haver continuamente permissão é a delícia mesma da
alma, e é o continente de seu amor conjugal; pois eles estão continuamente no
prazer deste amor, e também nos últimos segundo a presença das mentes não
interrompida por preocupações, assim segundo o bel-prazer do julgamento nos
maridos.
257 - X X I. A Segunda das causas acidentais de frieza, é que a coabitação com o
cônjuge,pela aliança e a lei parece forçada e não livre.
Esta causa concerne unicamente àqueles em que o amor conjugal é frio nos
íntimos, e como se junta ao frio interior, se torna uma causa acessória ou
acidental; nestes é o amor extraconjugal que, pelo consentimento e o favor
deste consentimento, está intrinsecamente no calor, pois a frieza de um dos
dois amores é o calor do outro; se este calor não é sentido, aí está entretanto, e
mesmo no meio da frieza; se aí não estivesse mesmo então, não haveria
separação; é este calor que faz o constrangimento,o qual aumenta,conforme de
um lado a aliança pelo pacto, e a lei pelo justo são consideradas como laços que
não devem ser violados; a cousa se passa diferentemente, se de uma e de outra
parte eles são quebrados. O contrário acontece naqueles que abominam o amor
extraconjugal, e pensam que o amor conjugal é celeste e é o Céu, e mais ainda
se percebem isso, nestes, esta aliança com seus pactos, e esta lei com suas
sanções, foram inscritas em seus corações, e aí estão continuamente inscritas
cada vez mais; nestes o laço deste amor não é formado pela aliança contraída,
nem pela lei decretada, mas a aliança e a lei estão inscritas por criação no amor
mesmo em que e eles estão, é por estas que aqueles estão no mundo, mas não
vice-versa: daí resulta que tudo que pertence a este amor é sentido, como o
livre; não há livre alguma que não pertença ao amor; e ouvi dizer pelos Anjos
que o livre do amor verdadeiramente conjugal é o Livre supremo, porque este
amor é o amor dos amores.
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253 - X X II.A T erceira das causas acidentais de frieza,é a afirmação da parte da


esposa,e propósitos sobre o amor por ela.
Entre os anjos, no Céu, não há recusa nem repugnância alguma da parte dos
esposos, como, há em algumas nas terras; entre os anjos, no Céu, há também
propósitos sobre o amor da parte das esposas, e não silêncio como em algumas
nas terras; mas as causas dessas diferenças, não me é permitido referi-Ias,
porque isso não é conveniente para mim; mas pode-se vê-Ias relatadas pelas
esposas dos anjos, as quais as expõem livremente diante de seus maridos, em
quatro M emoráveis no fim dos Capítulos, por três esposas no Palácio sobre o
qual foi vista uma chuva de ouro, e por sete que estavam sentadas em um
Bosque de rosas; estes M emoráveis foram relatados a fim de que se veja a
descoberto todas as coisas que pertencem ao amor conjugal,de que se trata aqui
tanto em geral como em particular.
259 - X X III. A Q uarta das causas acidentais de frieza é o pensamento: do
marido, dia e noite, de que sua esposa quer e, de outro lado, o pensamento da
esposa,de que seu marido não quer.
Q ue isso seja uma causa da cessação do amor nas esposas, e que isso seja uma
causa da frieza nos maridos, é o que pode passar sem comentários. Com efeito,
que o marido esfrie até às extremidades,se,a respeito de sua esposa que ele tem
diante dos olhos durante o dia e a seu lado durante a noite, ele pensa que ela
deseja ou quer; e que,do seu lado,a esposa perde seu amor, se a respeito de seu
marido ela pensa que ele pode e não quer, estão aí coisas conhecidas dos
maridos que se dedicam aos arcanos relativos ao amor conjugal. Estas causas
também foram relatadas, a fim de que esta O bra seja completa, e que as
Delícias da sabedoria sobre o amor conjugal sejam plenamente expostas.
260 - X X IV . Conforme a frieza está na mente, está também no corpo; e
conforme o crescimento desta frieza, os externos do corpo são também
fechados.
Acredita-se hoje que a M ente do homem está na cabeça, e que nada há dela no
corpo, quando entretanto a Alma e a M ente não estão somente na cabeça, mas
também no corpo; com efeito, a Alma e a M ente são o homem, pois uma e
outra constituem o Espírito que vive depois da morte, e que está em uma
perfeita forma humana, como foi plenamente mostrado em nossos T ratados:
daí resulta que o homem, desde que pensa alguma cousa, pode no mesmo
instante pronunciá-la pela boca do corpo, e ao mesmo tempo exprimi-Ia pelo
gesto; e que, desde que quer alguma cousa, pode num instante fazê-la e
efetuá-la pelos membros do corpo; o que não aconteceria, se a Alma e a M ente
não estivessem juntos no corpo,e não constituíssem seu homem espiritual. Pois
que é assim, pode-se ver que, quando o Amor conjugal está na, M ente, é
semelhante a si mesmo no Corpo; e que pois que o Amor é calor, abre pelos
interiores os externos do corpo; mas que, vice-versa, a privação do amor, que é
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frieza, fecha, pelos interiores os externos do corpo; por aí vê-se claramente a


causa da faculdade que dura pela eternidade rios anjos, e a causa da falta de
faculdade,nos homens que estão na frieza.
261 - Ao que precede ajuntarei T rês M emoráveis:
Primeiro M emorável: N a Plaga setentrional superior perto do, O riente, no
M undo Espiritual, há lugares de instrução para as crianças, para os rapazes,
para os homens adultos, e também para os velhos; todos os que morrem na
infância são enviados para esses lugares, e sua educação se faz, no Céu; para lá
são enviados igualmente todos os recém-chegados do M undo, e que desejam
conhecimentos sobre o Céu e sobre o Inferno: esta R egião é perto do O riente,
a fim de que todos sejam instruídos pelo influxo procedente do Senhor; pois o
Senhor é o O riente, porque Ele está lá no Sol, que por Ele é puro Amor; daí, o
Calor deste Sol é em sua essência o Amor e a Luz que deles procede é em sua
essência a Sabedoria; estas cousas, o amor e a sabedoria procedentes deste Sol,
lhes são inspirados pelo Senhor, e são inspirados segundo a recepção, e a
recepção é segundo o amor de se tornar sábio. Depois do tempo de instrução,
os que se tornaram inteligentes são despedidos e chamados discípulos do
Senhor; são a princípio enviados daí para o O cidente, e os que não ficam nesta
plaga são enviados para o Sul, e alguns pelo, Sul para o O riente, e são
introduzidos nas Sociedades onde devem estar suas moradas. U m dia, quando
eu meditava sobre o Céu e sobre o Inferno, comecei a desejar um
conhecimento universal sobre o estado de um e do outro, sabendo que aquele
que conhece os universais pode em seguida apreender os singulares, porque
estes estão naqueles como as partes estão no comum. N esse desejo, dirigi os
olhos para esta R egião da plaga setentrional perto do O riente, onde estavam os
Lugares de Instrução; e, por um caminho que me foi aberto, fui para ali, e
entrei em um Colégio onde estavam rapazes; e me dirigi aos M estres principais
que instruíam, e lhes perguntei se eles conheciam os universais sobre o Céu e
sobre o Inferno; e eles responderam: "Conhecemos poucos deles; mas se
olharmos para o lado do O riente em direção ao Senhor, seremos ilustrados e
saberemos". E olharam do lado do O riente para o Senhor, e disseram: "H á três
U niversais do Inferno; mas os U niversais do Inferno são diametralmente
opostos aos U niversais do Céu; os U niversais do Inferno são estes três Amores:
o Amor de dominar pelo amor de si; o Amor de possuir os bens dos outros pelo
amor do mundo; e o Amor escortatório. O s U niversais do Céu que lhes são
opostos são estes três Amores: O Amor de dominar pelo amor do. uso; o Amor
de possuir os bens do mundo pelo amor de fazer usos com esses bens; e o Amor
verdadeiramente conjugal". Depois destas palavras e um voto de paz, fui
embora e voltei para casa. Q uando cheguei em casa, me foi dito do Céu:
"Examina estes três U niversais em cima e em baixo, e em seguida nós os
veremos em tua mão". Disseram-me: "Em tua mão", porque todas as cousas
que o homem examina pelo entendimento aparecem aos Anjos como inscritas
197

nas mãos.
262 - Imediatamente, examinei o Primeiro Amor universal do Inferno, que era
o Amor de dominar pelo amor de si, e em seguida, o Amor universal do Céu,
que lhe corresponde, isto é, o Amor de dominar pelo amor dos usos; com
efeito,não me foi permitido examinar um desses amores sem examinar o outro,
porque o Entendimento não percebe um sem o outro, pois eles são opostos;
por isso, para que um e outro sejam percebidos devem ser postos em oposição,
um contra o outro; pois uma face bela e regular brilha com esplendor quando
se lhe opõe uma face feia e disforme.Q uando tinha examinado bem o Amor de
dominar pelo amor de si, me foi dado perceber que este Amor era infernal no
grau supremo, e por conseguinte está nos que estão no Inferno mais profundo;
e que o Amor de dominar pelo amor dos usos era celeste no grau supremo, e
por conseguinte estava naqueles que estão no Céu supremo. Se o Amor de
dominar pelo amor de si é infernal no grau supremo, é porque dominar pelo
amor de si, é dominar pelo próprio; ora o próprio do homem é por nascimento
o mal mesmo, e o mal mesmo é diametralmente contra o Senhor; por isso
quanto mais se progride no mal, mais se nega Deus e as cousas santas da Igreja
e mais se adora a si mesmo e a natureza; que os que estão no mal examinem
isso em si mesmos, eu lhes peço, e verão; este amor também é tal que, se lhe
afrouxam as rédeas, o que acontece quando o impossível não lhe faz obstáculo,
tanto mais se lança de grau em grau, e até ao mais alto; e não se limita a isso,
mas se não há um grau mais elevado, se queixa e geme. Este Amor, nos
Políticos, sobe ao ponto de quererem ser R eis e Imperadores; e se fosse possível
dominar sobre o mundo inteiro, e ser chamados reis dos reis e imperadores dos
imperadores; e nos Eclesiásticos, este mesmo Amor sobe a um tal ponto, que
quereriam ser deuses, e tanto quanto possível, dominar sobre o Céu inteiro, e
ser chamados deuses dos deuses. Q ue nem uns nem outros reconhecem de
coração Deus algum, ver-se-á no que vai seguir. M as, ao contrário, os que
querem dominar pelo amor dos usos, querem dominar não por eles mesmos,
mas pelo Senhor, porque o Amor dos usos vêm do Senhor, e é o Senhor
M esmo; estes não consideram as dignidades senão como meios para fazer usos;
colocam os usos bem acima das dignidades,enquanto que os primeiros colocam
as dignidades bem acima dos usos.
263 - Enquanto meditava sobre este assunto, me foi dito por um Anjo da parte
do Senhor: "Agora, tu vais ver e depois de ver te confirmarás qual é este Amor
infernal". E então a terra se abriu de repente à esquerda, e vi subir do Inferno
um diabo com a, cabeça coberta por um boné enterrado na testa até aos olhos,
com a face cheia de pústulas como as de uma febre ardente, com os olhos
esbugalhados, o peito estufado em rombo; da boca lançava fumaça como uma
fornalha, seus lombos eram inteiramente ígneos; em vez de pés tinha
calcanhares ósseos sem carne, e de seu corpo se exalava um calor infecto e
imundo. Ao vê-lo fiquei apavorado, e lhe gritei: "N ão te aproximes; diz-me
198

donde és?" E ele respondeu com uma voz rouca: "Sou dos infernos e aí vivo
com duzentos outros em uma Sociedade que é a mais eminente de todas as
sociedades; lá somos todos imperadores de imperadores, reis de reis, duques de
duques, e príncipes de príncipes; lá ninguém é simplesmente imperador,
simplesmente rei, duque, príncipe; nós estamos lá sentados sobre tronos de
tronos,e daí enviamos nossas ordens sobre todo o globo, e, além". Então eu lhe
disse: "N ão vês que a fantasia da proeminência te faz desarrazoar?" Ele me
respondeu:"Como podes falar assim?" pois nós nos vemos a nós mesmos, como
tais, e também somos reconhecidos como tais pelos companheiros. A esta
resposta,não quis lhe dizer de novo:"T u desarrazoas"; porque a fantasia o fazia
desarrazoar: e me foi dado saber que este diabo, quando vivia no mundo, tinha
sido apenas intendente de uma casa; e que então se tinha ensoberbecido em seu
espírito, a ponto de desprezar todo o gênero humano comparando-o consigo, e
se comprazia na fantasia de que era mais capaz do que um rei, e mesmo mais
capaz do que um imperador; por este orgulho tinha ele negado Deus, e
considerado todas as coisas santas da Igreja como nada para ele, mas como de
alguma utilidade para a populança estúpida. Enfim eu lhe disse: "V ós que sois
lá duzentos, quanto tempo vos glorificais assim entre vós?" E disse:
"Eternamente; mas aqueles de nós que atormentam os outros, porque negam a
nossa proeminência, são engolidos, pois nos é permitido nos glorificarmos, mas
não fazer mal a quem quer que seja". Fiz-lhe ainda esta pergunta: "Sabes qual é
a sorte dos que são engolidos?" R espondeu-me. "Caem em uma espécie de
prisão, onde são chamados mais vis do que os vis, ou os mais vis; e trabalham".
Então disse a esse diabo:"T oma cuidado,portanto,para não seres engolido".
264 - Depois disso a terra se abriu de novo, mais à direita; e vi subir um outro
diabo, sobre cuja cabeça, havia uma espécie de T iara cercada de roscas de uma
espécie de cobra cuja cabeça brilhava no vértice; a sua face era coberta de lepra
desde a testa até ao queixo, e também uma e outra mão; seus lombos estavam
nus e enegrecidos como a fuligem da qual passou o fogo sombrio de uma
fornalha, e os calcanhares de seus pés eram como duas víboras: o primeiro
diabo tendo-o avistado se lançou de joelhos e o adorou:perguntei-lhe:"Por que
fazes isso?" Ele disse: "Este é o Deus do céu e da terra, e é onipotente". Então
disse ao outro diabo:"T u que dizes a isso?" R espondeu:"Q ue direi? todo poder
sobre o Céu e sobre o Inferno é meu: a sorte de todas as almas está na minha
mão". Perguntei-lhe de novo: "Como, este, que é imperador de imperadores,
pode se submeter assim? E tu, como podes receber sua adoração?" R espondeu:
"É, não obstante, meu servidor; o que é um imperador diante de um Deus?
T enho em minha destra o raio da excomunhão". E então eu lhe disse: "Como
podes desarrazoar assim? no M undo não eras mais que um cônego; e porque
foste atormentado pela fantasia de que tinhas as chaves, e por conseguinte o
poder de atar e de desatar, levaste o teu espírito a um tal grau de loucura, que
agora acreditas ser Deus mesmo". Indignado com estas palavras jurou que o
era, e que o Senhor não tem poder algum no Céu; pois, "acrescentou ele"
199

transferiu todo seu poder para nós; não temos senão que ordenar, e o Céu e o
Inferno obedecem respeitosamente; se enviamos alguém ao inferno, os diabos
imediatamente o recebem; do mesmo modo os Anjos recebem aquele que
enviamos ao Céu". Em seguida lhe perguntei: "Q uantos sois em vossa
sociedade?" Disse: "T rezentos, e todos lá somos deuses; mas eu sou deus dos
deuses".Depois disso a terra se abriu sob os pés de um e de outro, e eles caíram
profundamente em seus infernos; foi-me dado ver que sob seus infernos havia
prisões onde caíam aqueles que faziam mal aos outros; com efeito, no inferno a
fantasia de cada um lhe é deixada, e mesmo a mania de se glorificar, mas não é
permitido fazer mal a outrem; se lá eles são tais, é porque então o homem está
em seu espírito, e o espírito depois de ter sido separado do corpo, entra na
plena liberdade de agir segundo suas afeições e segundo os pensamentos que
delas provêm. Em seguida me foi permitido olhar seus infernos; e o inferno
onde estavam os imperadores de imperadores e os reis de reis estavam cheios de
coisas imundas, e os que o habitavam me pareceram como diversas bestas
ferozes, com olhos ameaçadores; do mesmo modo no outro inferno onde
estavam os deuses e o deus dos deuses, e neste vi voando em torno deles ferozes
aves noturnas, que são chamadas ochim e ijins; é assim que as imagens de suas
fantasias me foram apresentadas. Por aí vi claramente qual é o Amor de si nos
Políticos, e qual é o Amor de si nos eclesiásticos; que este consiste em querer
ser deuses, e aquele em querer ser imperadores; e que é assim que eles querem,
e também a isso que aspiram,tanto quanto os freios são soltos a seus amores.
265 - Em seguida foi aberto um Inferno, onde vi dois espíritos, um sentado em
um banco, e tendo os pés em uma cesta cheia de serpentes, que pareciam se
arrastar para cima pelo peito até ao pescoço; e outro sentado sobre um asno,
ígneo, aos lados do qual se arrastavam serpentes vermelhas, que elevavam o
pescoço e a cabeça e seguiam o cavaleiro. Disseram-me que eram Papas, que
declararam decaídos do, poder Imperadores, e os maltrataram com palavras e
ações em R oma, onde tinham vindo para lhes suplicar e adorá-los; mas que o
cesto em que estavam as serpentes, e o asno ígneo com as serpentes aos lados
eram representações de seu amor de dominar pelo amor de si, e que
semelhantes cousas não aparecem senão aos que olham de longe para este lugar.
H avia alguns cônegos presentes aos quais perguntei se eram realmente Papas.
Disseram que os conheciam e sabiam que o eram.
266 - Depois de ter visto e estes tristes e hediondos espetáculos, dirigi o olhar
em torno de mim, e vi não longe de mim dois Anjos de pé, e conversando um
com o outro, um estava vestido com uma vestimenta de lã resplandecente de
uma cor própria inflamada, e havia sobre esta vestimenta uma túnica de linho
de uma brancura deslumbrante; o outro tinha vestimenta semelhante em
escarlate, com uma tiara, cujo lado direito era enriquecido com alguns
carbúnculos; aproximei-me deles, e lhes dei a saudação de paz; e lhes fiz com
tom respeitoso esta pergunta: "Por que estais aqui em baixo?" R esponderam:
200

"Descemos do Céu para aqui por ordem do Senhor, para Conversarmos


contigo sobre a sorte feliz daqueles que querem dominar pelo amor dos usos;
nós somos adoradores do Senhor; eu, Príncipe de uma Sociedade; ele, Sumo
Sacerdote da mesma Sociedade". E o Príncipe disse que era o servidor de sua
Sociedade, porque a servia fazendo usos; e o outro disse que era o ministro da
Igreja,porque servia seus consociados fazendo-os conhecer as cousas santas para
os usos de suas almas; que estavam os dois nas alegrias perpétuas provenientes
da felicidade eterna pelo Senhor; e que nesta Sociedade tudo é resplandecente e
magnífico, resplandecente pelo ouro e pelas pedras preciosas, e magnífico pelos
palácios e pelos paraísos; e acrescentaram: "Isto provém de ser o nosso amor de
dominar procedente não do.amor de si, mas do amor dos usos; e como o amor
dos usos vem do Senhor, é por isso que todos os bons usos nos Céus
resplandecem e brilham com esplendor; e como em nossa Sociedade, estamos
todos nesse amor, é por isso que a atmosfera aí aparece da cor do ouro pela luz
que lá participa do inflamado do Sol, e o inflamado do Sol corresponde a este
amor". Depois que pronunciaram estas palavras, vi também em torno deles
uma semelhante esfera; e lhes disse mesmo, e lhes pedi para acrescentarem
alguma cousa mais ao que haviam dito do amor do uso; e eles continuaram,
dizendo: "As dignidades em que estamos, nós as ambicionamos, é verdade, mas
não foi por nenhum outro fim senão o de poder fazer usos mais plenamente e
estendê-los mais largamente; e somos mesmo cercados de honras, e as
aceitamos, não por nós, mas para o bem da Sociedade; pois os nossos confrades
e consociados que são do povo não sabem outra cousa senão que as honras de
nossas dignidades estão em nós, e que em conseqüência os usos que fazemos
são nossos; mas nós, sentimos diferentemente, sentimos que as honras das
dignidades estão fora de nós, e que são como vestimentas de que estamos
revestidos, mas os usos que desempenhamos procedem do amor dos usos em
nós pelo Senhor; e este amor recebe sua beatitude da comunicação com outros
por meio dos usos; e sabemos pela experiência que quanto mais fazemos os usos
pelo amor dos usos,tanto mais este amor cresce, e com o amor a sabedoria pela
qual se faz a comunicação; mas quanto mais retemos em nós os usos e não os
comunicamos, tanto mais perece a beatitude; e então o uso se torna como um
alimento encerrado no estômago, e que, não tendo sido dispersado aqui e ali,
não alimenta o corpo nem as partes do corpo, mas fica sem ser digerido, donde
resultam os vômitos; em uma palavra, todo o Céu não é senão o continente do
uso desde seus primeiros até seus últimos; o que é o uso senão o amor efetivo
do próximo? E o que é que mantém os Céus senão este amor?" Depois de ter
ouvido estas explicações, lhes fiz esta pergunta: "Como alguém pode saber se
faz os usos pelo amor de si ou pelo amor dos usos? T odo homem, quer seja
bom, quer seja mau, faz usos, e faz usos por um amor; suponhamos que no
M undo houvesse uma Sociedade inteiramente composta de diabos, e uma
Sociedade inteiramente composta de Anjos; creio que os diabos, em sua
sociedade,fariam pelo fogo do amor de si,e pelo esplendor de sua glória, tantos
201

usos como os Anjos na sua; quem pode, portanto,, saber de que Amor e de que
origem provém os usos?" A isto os dois Anjos responderam: "O s diabos fazem
os usos para eles mesmos e pela reputação, a fim de serem elevados as honras,
ou para adquirir riquezas, mas os Anjos fazem os usos, não por tais motivos,
mas pelos usos por amor dos usos; o homem não pode discernir estes usos, M as
o Senhor os discerne; quem quer que crê no Senhor e foge dos males como
pecados, faz os usos pelo Senhor; mas quem quer que não crê no Senhor e não
foge dos males como pecados, faz os usos por si mesmo e para si mesmo; é esta
a distinção entre os usos feitos pelos diabos e os usos feitos pelos Anjos". O s
dois Anjos, tendo assim falado, foram embora; e de longe foram vistos
transportados em um carro de fogo,como Elias,e elevados ao Céu.
267 - Segundo M emorável - Depois de um certo espaço de tempo, entrei em
um bosque, e aí andei meditando sobre os que estão na cobiça e em
conseqüência na fantasia de possuir as cousas que estão no mundo; e então, a
alguma distância de mim,vi dois Anjos que conversavam um com o O utro e às
vezes me olhavam; por isso aproximei-me, e quando me aproximava eles me
dirigiram a palavra, dizendo: "Percebemos em nós que meditas sobre um
assunto sobre o qual conversávamos, ou que conversávamos sobre um assunto
sobre o qual tu meditas, o que provêm de uma comunicação recíproca das
afeições". Em conseqüência, perguntei-lhes de que fadavam; responderam: "Da
Fantasia, da Cobiça e da Inteligência, e no momento daqueles que se deleitam
com a visão e a imaginação de possuir todas as cousas do M undo". E então lhes
pedi para pôr em evidência sua mente sobre estes três assuntos: as Cobiças, a
Fantasia e a Inteligência; e,tendo começado a falar,disseram:"Cada um está na
Cobiça interiormente por nascimento, mas na Inteligência exteriormente por
educação, e ninguém está na Inteligência, nem com mais forte razão na
Sabedoria, interiormente, assim quanto ao espírito, a não ser que o esteja pelo,
Senhor; pois todo homem é afastado da cobiça do mal, e mantido na
inteligência, conforme olha para o Senhor, e ao mesmo tempo conforme a
conjunção com o Senhor, sem isso o homem não é senão cobiça; mas contudo,
nos externos, ou quanto ao corpo, está na inteligência por educação; com
efeito, o homem cobiça as honras e as riquezas, ou a proeminência e a
opulência; e não adquire nem uma nem outra, a não ser que se mostre moral e
espiritual, por conseqüência inteligente e sábio; e aprende desde a infância a se
mostrar assim; é isso o que faz com que desde que vem entre os homens, ou
que entra na sociedade, ele volta, seu espírito e o afasta da cobiça; fala e age
segundo as cousas decentes e honestas que aprendeu na infância, e que retém
na memória do corpo; e toma cuidado sobretudo que não se manifeste coisa
alguma da loucura da cobiça em que está seu espírito; daí todo homem que não
é, inteiramente conduzido pelo Senhor, é dissimulado, trapaceiro, hipócrita,
assim homem em aparência,e não homem,contudo; pode-se dizer dele que sua
casca ou seu corpo é sábio, e sua amêndoa ou seu espírito é louco; que seu
externo é de um homem, e que seu interno é de uma besta; esses homens
202

olham pelo occiput para cima, e pelo sinciput para baixo; assim andam com a
cabeça inclinada para diante, e a face inclinada para a terra, como os que estão
atacados por uma violenta dor de cabeça; quando se despojam do corpo e se
tornam espíritos, e que então são libertados, tornam-se as loucuras de suas
cobiças; pois aqueles que estão no amor de si desejam ardentemente dominar
sobre o U niverso e mesmo estender-lhe os limites a fim de tornar maior a
dominação; jamais vêem barreiras; os que estão no amor do mundo desejam
ardentemente possuir tudo que ele encerra, e são presas da tristeza e da inveja,
se há tesouros na posse de outros; com receio portanto, de que aqueles que são
assim se tornem puramente cobiças, e assim deixem de ser homens, lhes foi
permitido, no M undo Espiritual, pensar pelo temor da perda da reputação, e
por conseguinte da perda da honra e do ganho, como também pelo temor da
lei e da pena que ela infringe; e lhes é também permitido aplicar sua mente em
algum estudo ou em alguma obra, pelo que são mantidos nos externos e assim
em um estado de inteligência, ainda que interiormente estejam no delírio e na
loucura''. Em seguida lhes perguntei se todos os que estão na cobiça, estão
também em sua fantasia, responderam que na fantasia de sua cobiça estão os
que pensam interiormente em si mesmos, e que se entregam demasiado à sua
imaginação falando, com eles mesmos; pois quase separam seu espírito da
ligação com o corpo, e inundam seu entendimento de visões, e se regozijam
loucamente como se possuíssem o U niverso; neste delírio é mergulhado depois
da morte o homem que destacou do corpo o seu espírito, e não quis abandonar
a delícia do seu delírio; pensando, pela religião, alguma coisa sobre os males e
os falsos, e não pensando de modo algum a respeito do amor desenfreado de si,
que é destrutivo do amor para com o Senhor, nem a respeito do amor
desenfreado do mundo,que é destrutivo do amor para com o próximo.
268 - Depois disto, sobreveio aos dois anjos e também a mim, o desejo de ver
aqueles que estão pelo amor do mundo na cobiça visionária ou fantasia de
possuir todas as riquezas; e percebemos que esse desejo nos era inspirado a fim
de que eles fossem conhecidos; Seus domicílios estavam sob a terra onde se
encontravam nossos pés, mas acima do inferno; por isso nos olhamos
reciprocamente e dissemos:"V amos".E vimos uma abertura, e nela unia escada
pela qual descemos; e nos foi dito que era preciso abordá-los pelo oriente, para
não entrar na névoa de sua fantasia, e não ser mergulhado na sombra, quanto
ao entendimento e também ao mesmo tempo quanto à vista; e eis que vimos
uma Casa construída de caniços, por isso cheia de fendas, no meio de um
nevoeiro que, como uma fumaça, efluía continuamente pelas fendas sobre três
lados da construção; entramos e vimos, cinqüenta personagens de um lado, e
cinqüenta de outro,sentados em bancos; e,voltando as costas para o oriente e o
sul, olhavam para o ocidente e para o setentrião; diante de cada um deles havia
uma mesa, e sobre a mesa bolsas estendidas, e em torno das bolsas grande
quantidade de peças de ouro.; e lhes dissemos: "Estão aí as riquezas de todos os
habitantes do M undo?" E responderam: "N ão de todos os habitantes do
203

M undo, mas de todos os do R eino". O som de sua voz era sibilante; eles
mesmos apareciam com uma face redonda, que reluzia como a concha de um
caracol; e a pupila do olho, em um plano verde, lançava como que relâmpagos,
o que provinha da luz da fantasia; ficamos de pé no meio deles, e dissemos:
"Acreditais possuir todas as riquezas do R eino?" E responderam: "N ós as
possuímos". Em seguida lhes perguntamos: "Q uem dentre vós?" Disseram:
"Cada um". E lhes dissemos: "Como, cada um! não sois em grande número?"
R esponderam: "Cada um de nós sabe que tudo o que tem é meu; e não é
permitido a nenhum pensar e ainda menos dizer: O que é meu não é teu; mas
é permitido pensar e dizer: O que é teu é meu". As peças de moeda sobre as
M esas apareciam como de ouro puro, mesmo diante de nós, mas quando
fizemos cair sobre elas a luz vinda do oriente, eram pequenos grãos de ouro,
que eles tornavam assim maiores pela reunião da fantasia comum; e diziam que
era preciso que cada um dos que entram trouxesse consigo um pouco de ouro,
que eles cortam em pedacinhos, e os pedacinhos em pequenos grãos, e pela
força unânime da fantasia, eles os estendiam em peças de moeda do maior
módulo; e então dissemos: "N ão nascestes homens racionais? De onde vos vem
essa loucura visionária?" Disseram: "Sabemos que é uma vaidade imaginária,
mas como,faz o prazer dos interiores de nossa mente, entramos aqui e achamos
nisto delícias como se possuíssemos tudo, entretanto não ficamos aqui senão
algumas horas, depois das quais saímos, e de cada vez então o, bom senso nos
volta; mas não obstante o nosso divertimento visionário volta alternativamente,
e faz com que sucessivamente reentremos e tornemos a sair; deste modo somos
alternativamente sábios e loucos. Sabemos também que uma sorte cruel espera
aqueles que pela astúcia tiram dos outros seus bens". Perguntamos qual era essa
sorte; disseram: "São engolidos e lançados nus em uma prisão infernal onde são
obrigados a trabalhar pela roupa e pelo alimento, e depois por algumas
pequenas peças de moeda, nas quais põem a alegria de seu coração; mas se
fazem mal a seus companheiros, são obrigados a dar uma parte dessa moeda
como multa.
269 - Depois disso, subimos desse inferno em direção, ao Sul, onde tínhamos
estado antes, e aí os Anjos contaram várias particularidades notáveis sobre
cobiça não visionária ou fantástica em que todo homem está de nascença.
"Q uando estes'', diziam eles, "estão nesta cobiça são como loucos, e entretanto
se vêem como soberanamente sábios; e de tempos em tempos são recolocados,
desta loucura, na, R acionalidade, que neles está nos externos; neste estado eles
vêem, reconhecem e confessam sua loucura, mas não obstante desejam
ardentemente passar de seu estado racional para seu estado de loucura, e nele se
lançam, por isso, como se passassem do constrangimento e do desprazer para o
livre e o prazer; assim é a cobiça, e não a inteligência, que os alegra
interiormente.H á três Amores universais, de que todo homem, por criação, foi
composto: o Amor do Próximo, que é também o Amor de fazer usos; o Amor
do M undo,que é também o Amor de possuir as riquezas; e o Amor de si, que é
204

também o Amor de dominar sobre os outros; o Amor do próximo ou de fazer


usos, é um Amor Espiritual; o Amor do M undo ou o Amor de possuir as
riquezas, é um Amor material; e o Amor de si ou o Amor de dominar sobre os
outros, é um Amor corporal; o homem é homem, quando o Amor do próximo
ou o Amor de fazer usos faz a Cabeça,quando o Amor do M undo faz o Corpo,
e o Amor de si faz os pés; mas se o Amor do M undo faz a Cabeça, o homem
não é homem senão como um corcunda; e se o Amor de si faz a Cabeça, ele é
como um homem que se mantém, não sobre os pés, mas sobre as palmas das
mãos, com a cabeça para baixo e as pernas para cima. Q uando o Amor do
próximo faz a Cabeça, e os dois outros fazem em ordem o Corpo e os Pés, este
homem, visto do Céu, aparece com uma face angélica, com um belo arco-íris
em torno da cabeça; mas se o Amor do M undo faz a Cabeça, o homem, visto
do Céu, aparece com uma face pálida com a de um morto, com um círculo
amarelo em torno da cabeça; e se o Amor de si faz a Cabeça, o homem, visto
do Céu, aparece com uma face negra com um círculo branco em torno da
cabeça". Então perguntei o que representavam os Círculos em torno das
cabeçasresponderam: "R epresentam a inteligência, o círculo branco em torno
da face negra representa que a inteligência do homem está nos externos ou em
torno dele,e que a loucura está nos internos ou nele; e mesmo o homem, que é
assim, é sábio quando. está no corpo, e louco quando está no espírito; e
nenhum homem é sábio no espírito,senão pelo Senhor,o que acontece quando
é engendrado de novo e criado pelo Senhor. Depois que assim falaram, a terra
se abriu à minha esquerda,e pela abertura vi subir um Diabo tendo um círculo
branco em torno da cabeça, e lhe perguntei: "Q uem és?" Disse: "Sou Lúcifer,
filho da aurora; e, como me fiz semelhante ao Altíssimo, fui precipitado".
T odavia, não era Lúcifer, mas acreditava sê-lo; e lhe disse: "Pois que foste
precipitado, como podes te elevar do Inferno?" E respondeu: "Lá sou Diabo,
mas aqui sou um Anjo de luz; não vês a minha cabeça cercada de uma esfera
luminosa; e mesmo se quiseres, verás que sou o mais moral entre os que são
espirituais; posso também pregar, e mesmo tenho pregado". Disse-lhe: "Como
pregaste?" R espondeu: "Contra os velhacos, contra os adúlteros e contra todos
os amores infernais; e até mesmo, então, eu Lúcifer, chamei Lúcifer Diabo, e
me maldisse, maldizendo-o; e, cumulado de louvores por isso, fui elevado até
ao Céu; daí vem ser eu chamado filho da aurora; e, o que a mim mesmo me
espanta, é que, quando estava no púlpito, pensava absolutamente que tudo o
que dizia era justo e bom; mas a causa me foi descoberta, é que eu estava nos
externos e então os externos tinham sido separados dos meus internos; e, ainda
que isso me tenha sido descoberto, eu não pude entretanto me mudar, porque,
por causa do meu fasto, não dirigi meus olhos para Deus". Fiz-lhe em seguida
esta pergunta: "Como pudeste falar assim, quando, tu mesmo és um velhaco,
um adúltero e um diabo?" R espondeu: "Sou outro quando me acho nos
externos ou no corpo, e outro quando estou nos internos ou no espírito; no
corpo, estou no entendimento; mas, no espírito, estou na vontade; ora, o
205

entendimento me leva para cima, mas à vontade me leva para baixo; e quando
estou no entendimento, um círculo branco cerca minha cabeça, mas quando o.
entendimento se submete inteiramente à vontade e que é todo dela, o que é a
nossa última sorte, o círculo enegrece e se dissipa; uma vez nesse estado, não
posso mais subir a esta luz". Em seguida falou do seu duplo estado, o estado
externo e o estado interno, com mais racionalidade que qualquer outro; mas de
repente, tendo visto os Anjos que estavam comigo, sua face e sua voz se
inflamaram, ele se tornou preto, mesmo quanto ao círculo que estava em torno
de sua cabeça, e caiu no inferno pela abertura pela qual tinha subido. O s que
estavam presentes tiraram do que acabavam de ver esta conclusão, que o
homem é tal qual é seu amor, e não tal qual é seu entendimento, pois que o
amor arrasta facilmente para seu lado o entendimento, e o submete. Então
perguntei aos Anjos de onde vinha para os diabos a racionalidade; e disseram
que vinha da glória do amor de si, pois o amor de si é cercado de glória, e a
glória eleva o entendimento até à luz do Céu, pois o entendimento em cada
homem é suscetível de ser elevado segundo os conhecimentos, mas a vontade
não pode ser elevada senão pela vida segundo os veros da Igreja e da R azão; daí
vem que os Ateus mesmos, que estão na glória do renome pelo amor de si, e
por conseguinte no fasto, da própria inteligência, gozam de uma racionalidade
mais sublime que muitos outros; mas é quando estão no pensamento do
entendimento, e não quando estão na afeição da vontade; e a afeição da
vontade possui o interno do homem; mas o pensamento do entendimento
possui o externo do homem. Por fim o Anjo nos deu o motivo pelo qual o
homem foi composto com estes três Amores, a saber, o amor do U so, o amor
do M undo, e o amor de Si; e a fim de que o homem pense por Deus, ainda
que absolutamente como por si mesmo; disse-nos que no homem os supremos
foram voltados para cima, para Deus, os médios para, fora, para o M undo, e os
ínfimos para baixo, para Si; e, como os ínfimos foram voltados para baixo, o
homem pensa absolutamente como por si mesmo, ainda que, entretanto, o seja
por Deus.
270 - T erceiro M emorável: U ma manhã, depois do sono, meu pensamento
mergulhou profundamente em alguns arcanos do amor conjugal, e por fim
neste: Em que região da M ente humana reside o Amor verdadeiramente
conjugal e por conseguinte em que região reside a Freiza conjugal? Eu sabia
que há três regiões na M ente humana, uma acima da outra, e que na região
mais baixa habita o amor natural, na superior o amor espiritual e na suprema o
amor celeste, e que em cada região, há o Casamento do bem e do vero; que,
como o bem pertence ao amor, e o vero à sabedoria, há, em cada região, o
Casamento do amor e da sabedoria, e que este casamento é o mesmo que o
casamento da vontade e do entendimento, pois que a vontade é o receptáculo
do amor, e o entendimento o da sabedoria. Enquanto estava na profundeza
deste pensamento, eis que vi dois Cisnes voarem para o setentrião, e
incontinente duas Aves do paraíso voarem para o sul, e também duas R olas
206

voarem para o oriente; e quando seguia com o olhar seu vôo, vi que os dois
Cisnes viravam sua marcha do setentrião para o oriente, e do mesmo modo as
duas Aves do paraíso, do sul para o oriente, e se juntavam às duas R olas no
oriente, e voavam juntas para um Palácio muito elevado, lá, em torno do qual
havia oliveiras,palmeiras e faias; nesse Palácio havia três ordens de janelas, uma
acima da outra; e quando as observava, vi os Cisnes voar no, palácio pelas
janelas abertas, na ordem mais baixa, as Aves do paraíso pelas janelas abertas na
ordem do meio,e as R olas pelas janelas abertas na ordem mais alta. Depois que
vi isso, um Anjo se apresentou e disse: "Compreendes o que vistes?" e eu
respondi: "U m pouco". Ele disse: "Este Palácio representa as habitações do
Amor Conjugal, tais quais são nas M entes humanas; sua parte mais elevada,
para a qual se retiraram as R olas, representa a região suprema da mente, onde
habita o amor conjugal no amor do bem com sua sabedoria; a parte média,
para a qual se retiraram as Aves do paraíso, representa a região média onde
habita o amor conjugal no amor do vero com sua inteligência; e a parte mais
baixa, para onde se retiraram os Cisnes, representa a região ínfima da mente,
onde habita o amor conjugal no amor do justo e do direito com sua ciência;
estes três pares de aves significam também estas cousas, o par de rolas o amor
conjugal na região suprema, o par de aves do paraíso o amor conjugal na região
média, e o par de cisnes o amor conjugal na região ínfima; as três espécies de
árvores em torno deste palácio, as oliveiras, palmeiras e faias, significam as
mesmas cousas. N ós, no Céu, chamamos Celeste a região suprema da mente,
Espiritual a região média, e N atural a região ínfima; e as percebemos como
habitações em uma casa, uma acima da outra, e como uma subida de uma a
outra por graus semelhantes aos degraus de uma escada; e em cada parte como
dois quartos, um para o amor, o outro para a sabedoria, e sobre a frente como
um Q uarto de dormir, onde o amor com sua sabedoria, ou o bem com seu
vero, ou, o que é a mesma cousa, onde à vontade com seu entendimento, se
consorciam no leito; neste Palácio são apresentados como em efígie todos os
arcanos do amor conjugal". Q uando ouvi estas explicações, ardendo com o
desejo de ver este Palácio,perguntei se,visto que era um palácio representativo,
era permitido a alguém entrar nele e velo. R espondeu: "Isso não é permitido
senão àqueles que estão no T erceiro Céu,porque para eles todo, R epresentativo
do amor e da sabedoria se torna real; aprendi com eles o que te relatei, e
também isto, que o Amor verdadeiramente conjugal habita na região suprema
no meio do amor mútuo, no quarto nupcial ou no apartamento da vontade, e
também no meio das percepções da sabedoria, no quarto nupcial ou
apartamento do entendimento, e que eles se consorciam em um leito no
Q uarto de dormir que está sobre a frente, e ao O riente". E perguntei: "Por que
dois Q uartos nupciais?" Ele disse: “O M arido está no Q uarto nupcial do
entendimento, e a Esposa no Q uarto nupcial da vontade". E perguntei:
"Q uando o Amor conjugal habita aí, onde está então a frieza conjugal?"
R espondeu: "Está também na região suprema, mas somente no Q uarto nupcial
207

do entendimento, estando fechado o Q uarto nupcial da vontade; pois o


entendimento com seus veros pode todas as vezes que lhe agradar, subir pela
escada em caracol à região suprema para seu Q uarto, nupcial, mas se a vontade
com o bem de seu amor não sobe ao mesmo tempo para o Q uarto nupcial
consociado, este quarto é fechado, e a frieza entra no outro, e está aí a Frieza
Conjugal. Q uando uma tal frieza existe em relação à esposa, o entendimento
olha da região suprema para baixo, para a região ínfima; e mesmo, se o temor
não o retém,desce para a aí se aquecer com um fogo ilícito".Depois de ter dito
estas cousas, queria ainda expor várias outras sobre o Amor conjugal, segundo
as efígies deste amor no Palácio; mas disse: "Chega por esta vez; examina
primeiro se estas estão acima do entendimento comum, se estão acima, de que
serviria dizer mais; mas se não estão acima,várias outras serão desvendadas".
208

Das causas de amor aparente,de


amizade aparente e de favor nos
casamentos

271 - U ma vez que se tratou das causas de Frieza e de Separações, a ordem


exige que se trate também das Causas de amor aparente, de amizade aparente e
de favor nos Casamentos; com efeito, sabe-se que, embora as frieza separem
hoje as mentes (animi) dos esposos, não obstante, eles coabitam e procriam, o
que não aconteceria, se não houvesse também amores aparentes e por vezes
semelhantes ao calor do amor real, ou imitando este calor; que estas aparências
sejam necessárias e úteis, e que sem elas as casas não subsistiriam, nem por
conseguinte as sociedades, ver-se-á em seguida. Além disso, algumas pessoas
conscienciosas podem ser atormentadas pela, idéia de que as dissidências das
mentes entre eles e seu consorte, e em conseqüência os afastamentos internos,
venham por sua culpa, e lhe sejam imputadas, e por isso sofrem mesmo em seu
coração; mas como não está em seu poder prevenir as dissidências internas; é
bastante para eles acalmar por amores aparentes e por favores estes tormentos
suscitados por sua consciência; por aí também pode voltar a amizade em que,
de seu lado, se esconde o amor conjugal, embora não exista do lado do outro.
M as este Capítulo, em razão da grande variedade do assunto, será, como os
precedentes, dividido em artigos. Eis estes artigos: I. N o M undo natural, quase
todos, podem ser conjuntos quanto às afeições externas, mas não quanto às
afeições internas, se estas diferem e aparecem. II. N o M undo espiritual, todos
são conjuntos segundo as afeições internas, mas não segundo as afeições
externas,a não ser que estas façam um com as afeições internas.III.As afeições,
segundo as quais os Casamentos (M atrimonia) são comumente contraídos no
M undo são externas. IV . M as se nelas não há afeições internas que conjuntem
as mentes, os laços do casamento são rompidos na casa. V . Entretanto os laços
do casamento no M undo devem durar até ao fim da vida de um dos esposos.
V I.N os Casamentos (M atrimonia) em que as afeições internas não conjungem,
há afeições externas que imitam as internas, e consorciam. V II. Daí, amor
aparente, ou amizade aparente, e favor entre os esposos. V III. Estas Aparências
são artifícios conjugais, que são louváveis, porque são úteis e necessários. IX .
Em um homem (homo) Espiritual conjunto a um N atural, estes artifícios
conjugais tiram sua sabedoria da justiça e do julgamento. X . Estes artifícios
conjugais nos homens naturais tiram sua sabedoria da prudência, por diversas
razões. X I. Servem para melhoramentos e para as conveniências. X II. Servem
para conservar a ordem nos negócios domésticos e para os auxílios mútuos.
X III. Servem para a harmonia no cuidado das criancinhas e na educação das
209

crianças.X IV .Servem para a paz na casa. X V . Servem à reputação fora de casa.


X V I. Servem para diversos favores que se espera do consorte ou de seus pais, e
assim por temor de perder esses favores. X V II. Servem para fazer desculpar os
defeitos e por conseguinte para evitar a desonra. X V III. Servem para as
reconciliações. X IX . Se na esposa o favor não cessa, quando cessa a faculdade
no marido, pode se formar uma amizade que imita a amizade conjugal quando
os esposos envelhecem. X X . H á diversas espécies de amor aparente e de
amizade aparente entre os esposos, dos quais um é subjugado, e por
conseguinte submetido ao outro. X X I. H á no M undo casamentos infernais
entre esposos que são interiormente inimigos encarniçados, e exteriormente
como amigos muito unidos.Segue agora a explicação destes artigos.
272 - I. N o M undo natural quase todos podem ser conjuntos quanto às
afeições externas, mas não quanto às afeições internas, se estas diferem e
aparecem.
A razão disso é que o homem, no M undo, é revestido de um corpo material, e
que este corpo é cheio de cobiças, as quais estão aí como a borra que se
precipita no fundo quando o mosto do vinho é clarificado; em tais cousas
consistem os materiais de que se compõem no M undo os corpos dos homens;
daí vem que as afeições internas, que pertencem à mente, não aparecem, e que
em muitos dentre eles transpira delas apenas um grão; pois, ou o corpo as
absorve e as envolve com sua borra ou, por uma dissimulação ensinada desde a
infância, as esconde profundamente fora da vista dos outros; e por isso se
coloca no estado de cada afeição que observa em um outro, e atrai a si essa
afeição,e assim se conjugam; se se conjugam é porque cada afeição traz consigo
seu prazer, e os prazeres ligam as mentes (animi). Seria de outro modo, se as
afeições internas, como as externas, aparecessem diante da vista na face e no
gesto, e diante do ouvido no som da linguagem, ou se seus prazeres fossem
sentidos pelas narinas ou cheirados, como acontece no M undo espiritual; se
então elas diferissem ao ponto, de ficarem em discórdia, separariam as mentes
(animi) uma da outra, e conforme a percepção da antipatia se retirariam para
longe. Por estas considerações, é evidente que no M undo natural quase todos
podem ser conjuntos quanto às afeições externas, mas não quanto às afeições
internas se estas diferem e aparecem.
273 - II. N o M undo espiritual todos são conjuntos segundo as afeições
internas, mas não segundo as afeições externas, a não ser que estas façam um
com as afeições internas.
A razão disso, é que então foi rejeitado o corpo material que podia receber e
manifestar as formas de todas as afeições, como acaba de ser dito, e que o
homem, despojado desse corpo, está nestas afeições internas que estavam
escondidas precedentemente; daí vem que, no M undo espiritual, as
homogeneidades e as heterogeneidades, ou as simpatias e as antipatias, são
somente são sentidas, mas mesmo aparecem nas faces, na linguagem e nos
210

gestos; lá, portanto, as semelhanças estão conjuntas, e as dessemelhanças estão


separadas; é por esta razão que todo o Céu foi disposto em ordem pelo Senhor
segundo todas as variedades das afeições do amor do bem e do vero, e que,
pelo. oposto, o Inferno foi disposto segundo todas as variedades das afeições do
amor do mal e do falso. Como os Anjos e os Espíritos têm afeições internas e
afeições externas, do mesmo modo que os homens no, M undo, e como as
afeições internas não podem,aí,ser escondidas pelas externas,elas transparecem
e se manifestam; daí, umas e outras neles, são levadas à semelhança e à
correspondência, depois do que as suas afeições internas são manifestadas pelas
externas nas faces, são percebidas nos sons da linguagem, e aparecem também
nos gestos e nas maneiras. Se os Anjos e os Espíritos têm afeições internas e
afeições externas,é porque eles têm uma mente e um corpo; ora as afeições e os
pensamentos que delas derivam pertencem à mente e as sensações com as
volúpias que delas derivam pertencem ao corpo. Acontece muitas vezes que
depois da morte os amigos se encontram, e se recordam de suas amizades no
M undo precedente, e então acreditam que vão viver unidos na amizade como
antes; mas quando esta união, que não provém senão das afeições externas, é
percebida no Céu, se faz uma separação segundo as afeições internas; e então
desta reunião de amigos uns são relegados para o setentrião, e outros para o
ocidente, e cada um a tais distâncias, que jamais se tornam a ver, e não se
conhecem mais; pois nos lugares de suas moradas, suas faces, que se tornam
efígies de suas afeições internas, são mudadas. Por estas explicações, é evidente
que, no M undo espiritual, todos são conjuntos segundo as afeições internas, e
não segundo as afeições externas.
274 - III. As afeições, segundo as quais os Casamentos (M atrimonia) são
comumente contraídos no M undo,são externas.
É porque as afeições internas são raramente consultadas; e se são consultadas, a
semelhança destas afeições não é vista na mulher, pois esta, por um talento que
possui de nascença, retira suas afeições internas para os mais profundos recessos
de sua mente. H á várias afeições externas que levam os homens a contrair
casamento; neste século a primeira afeição é a de aumentar seu patrimônio
pelas riquezas,tanto para se tornar rico,como para ter abundantemente o que é
necessário; a segunda é a aspiração às honras,seja para adquirir estima,seja para
aumentar o estado de sua fortuna; além destas afeições, há diversas seduções e
diversas cobiças; estas também não dão lugar ao exame das conformidades das
afeições internas. Pelo pouco que acaba de ser dito, é evidente que os
Casamentos são comumente contraídos no M undo, segundo as afeições
externas.
275 - IV . M as se nelas não há afeições internas que conjuntem as mentes, os
laços do casamento são rompidos na casa.
Se diz na casa, porque é em particular entre os dois esposos; isso acontece
quando os primeiros fogos, acesos no tempo dos esponsais, e inflamados pela
211

aproximação das núpcias, se extinguem, em seguida, progressivamente, por


causa da discordância das afeições internas, e se tornam enfim frieza; sabe-se
que então as afeições externas,que os tinham levado,um e outro ao casamento,
desaparecem ao ponto de que mesmo elas não se conjuntam mais. Q ue as frieza
nascem de diversas causas internas, externas e acidentais, que têm todas sua
origem na dessemelhança das inclinações internas, é o que foi confirmado no
Capítulo precedente. Por isso, vê-se claramente esta verdade, que se nas
afeições externas não há internas que conjuguem as mentes, os laços do
casamento são rompidos na casa.
276 - V . Entretanto os laços do Casamento no M undo devem durar até ao fim
da vida de um dos esposos.
Esta proposição é apresentada a fim de manifestar mais claramente diante da
razão a necessidade, a utilidade e a verdade de que o amor conjugal, quando
não é real, deve, não obstante, ser imitado ou se apresentar como se existisse
realmente; seria diferente, se os casamentos contraídos não devessem durar até
ao fim da vida, mas pudessem ser dissolvidos à vontade, como acontecia na
nação Israelita, que tinha reclamado para ela a liberdade de repudiar as esposas
por qualquer motivo, como se vê claramente por estas passagens em M ateus:
"O s Fariseus vieram a Jesus,e lhe disseram:É permitido a um homem repudiar
sua esposa por qualquer motivo que seja? E como, Jesus respondesse que não
era permitido repudiar uma esposa e tomar uma outra, senão por causa de
escortação, eles replicaram que entretanto M oisés tinha mandado que lhe desse
carta de divórcio,e a repudiasse; e os discípulos disseram:Se tal é a condição do
homem com a mulher, não convém casar", (M ateus X IX , 3 a 10). V isto,
portanto,que a aliança do casamento é uma aliança para a vida, segue-se que as
aparências de amor e de amizade entre esposos são necessidades. Q ue os
Casamentos contraídos devem durar no M undo até ao fim da vida, é pela Lei
Divina, e como é por esta lei, é também pela lei racional, por conseguinte pela
lei civil; pela Lei Divina, pois que não é permitido repudiar sua esposa e tomar
outra, a não ser por causa de escortação, como vimos acima; pela Lei racional,
porque esta Lei é fundada sobre a Lei espiritual, pois a Lei Divina e a Lei
racional são uma única Lei; por esta e aquela Lei juntas, ou por esta segundo
aquela, pode-se ver quanto haveria de enormidades, de destruições de
sociedades, de dissoluções de casamentos, ou de repudiaçães de esposas pelos
caprichos dos maridos,antes da morte.Estas enormidades e estas destruições de
sociedades podem ser vistas em muito grande quantidade nos M emoráveis
sobre a origem do Amor conjugal, discutida por uma reunião de Espíritos de
nove reinos, ns. 103 a 115; é inútil acrescentar-lhes outras razões. M as estas
Causas não impedem que as separações de que se falou acima, ns. 252, 253 e
254,sejam permitidas por causas especiais,e também as Concubinagens de que
se falará na Segunda Parte.
277 - V I. N ós Casamentos (M atrimonia) em que as afeições internas não
212

conjungem,há afeições externas que imitam as internas e consorciam.


Pelas afeições internas entendemos as inclinações mútuas que na mente de um
e de outro vêm do Céu; mas pelas afeições externas entende-se as inclinações
que na mente de um e de outro vêm do M undo; estas afeições ou estas
inclinações pertencem, é verdade, igualmente à mente, mas ocupam nela a
região inferior, enquanto que aquelas ocupam a região superior; todavia, como
umas e outras têm sua sede na mente, pudesse crer que são semelhantes, e que
concordam; mas ainda que não sejam semelhantes, podem entretanto aparecer
como semelhantes, mas em alguns elas existem como conveniências, e em
outros como, artifícios sedutores. Desde a primeira aliança do casamento existe
implantada nos dois esposos uma certa comunhão que, não obstante a
dissidência das mentes (animi), fica entretanto gravada, por exemplo, a
comunhão. de posses, e em grande número, uma comunhão de usos e de
diversas necessidades da casa e, por conseguinte também uma comunhão de
pensamentos e de certos segredos; há ainda a comunhão, do leito, e a
comunhão do amor aos filhos; além de várias outras que, porque foram
inscritas na aliança conjugal,o foram também nas mentes dos esposos. Daí vem
principalmente as afeições externas que se assemelham às afeições internas;
aquelas, ao contrário, que não fazem senão imitá-las, vem em parte da mesma
origem,e em parte de uma outra; mas falar-se-á de umas e outras no que segue.
278 - V II.Daí o amor aparente,a amizade aparente e o favor entre os esposos.
O s amores aparentes, as amizades aparentes e os favores entre os esposos são
uma conseqüência da aliança conjugal contraída para durar até ao fim da vida,
e uma conseqüência da comunhão conjugal inscrita, por conseguinte, nos
contraentes, da qual nascem as afeições externas que se assemelham às afeições
internas, como acaba de ser indicado; e além disso, estes amores, estas amizades
e estes favores vêm de coisas que são utilidades e necessidades, de onde existem
em parte as afeições externas conjuntivas, ou artifícios pelos quais o amor
externo aparece como amor interno, e a amizade externa como amizade
interna.
279 - V III. Estas Aparências são artifícios conjugais, que são louváveis porque
são úteis e necessários.
São chamadas artifícios porque existem entre aqueles cujas mentes estão em
dissidência, e por causa dessa dísssidência estão inteiramente na frieza; quando
portanto nos externos eles vivem em união, como devem e como convém,
então as ligações de sua coabitação podem ser chamadas de artifícios, mas
artifícios conjugais, os quais sendo louváveis por causa dos usos, são
inteiramente distintos dos artifícios hipócritas; pois por eles é provido a todos
estes bens que são enumerados abaixo, em ordem, desde o Artigo X I até ao
Artigo X X ; que sejam louváveis por causa das necessidades, é porque de outro
modo estes bens seriam banidos; e entretanto a coabitação foi determinada pela
213

aliança e pela lei, e as coabitações são por conseqüência um dever para um e


outro.
280 - IX . Em um homem Espiritual (homo) conjunto a um N atural, estes
artifícios tiram sua sabedoria da justiça e do julgamento.
Isto provém de que é com justiça e julgamento que o homem espiritual faz o
que faz; é por isso que ele considera estes artifícios não como separados de suas
afeições internas, mas como ligados com elas; com efeito, ele age seriamente, e
considera o aperfeiçoamento como fim, e se não o obtém, considera a
acomodação, para a ordem na casa, para a ajuda mútua, para o cuidado dos
filhos, para a paz e a tranqüilidade; é levado a isto pela justiça, e o faz com
julgamento. Se o homem espiritual coabita assim com um conjuge natural, é
porque o homem espiritual age espiritualmente mesmo com o homem natural.
281 - X . Estes artifícios conjugais nos homens naturais tiram sua sabedoria da
prudência. Entre dois esposos dos quais um é espiritual e o outro natural, (pelo
espiritual é entendido aquele que ama as cousas espirituais e assim tira sua
sabedoria do Senhor, e pelo natural é ntendido aquele que ama somente as
cousas naturais, e assim tira sua sabedoria dele mesmo), quando, os dois são
consociados pelo casamento, o amor conjugal no espiritual é calor, e no natural
é frieza; que o calor e a frieza não possam estar juntos, e que o calor não possa
aquecer aquele que está na frieza a não ser que primeiro esta seja dissipada, e
que a frieza não possa influir naquele que está no calor a não ser que primeiro
este seja afastado, isso é evidente; daí vem que não pode haver um amor
interior entre dois esposos dos quais um é espiritual e o outro natural, mas
pode haver da parte do esposo espiritual um amor que imite o amor interior,
como foi dito no Artigo precedente. M as entre dois esposos naturais o amor
interior não é possível, porque eles estão um e outro na frieza; se estão no calor
é pelo incasto; estes entretanto, podem, não obstante, com mentes (aními)
separadas, coabitar na mesma casa, e também compor suas faces como se
houvesse entre eles amor e amizade, qualquer que seja a discordância que exista
entre suas mentes. Entre eles, as afeições externas, que pela maior parte
concernem às riquezas e posses, ou à honra e às dignidades, podem, por assim
dizer se abrasar; e como este ardor introduz o temor da perda destas cousas,
resulta que os artifícios conjugais são para eles necessidades, as quais são
principalmente as referidas mais abaixo nos Artigos X V , X V I e X V II; as outras
causas enumeradas com estas podem ter alguma cousa de comum com as que
concernem ao homem espiritual, e de que se falou acima, n. 280, mas
unicamente se a prudência no homem natural tira da inteligência a sua
sabedoria.
282 - X I.São para os melhoramentos e para as conveniências.
Q ue os Artifícios conjugais, que são aparências de amor e de amizade entre os
esposos cujas mentes (animi) estão em dissidência, sejam para o melhoramento,
214

é porque o homem (homo) Espiritual, ligado por aliança matrimonial com um


cônjuge N atural, não tem outro objetivo senão o melhoramento da vida, o que
ele executa por conversas sábias e polidas, e por complacências que agradam o
gosto do outro; mas se isso nada produz, recorre às acomodações para a
conservação da ordem nos afazeres domésticos, para as ajudas mútuas, para as
criancinhas e as crianças, e para outras cousas semelhantes, pois as palavras e as
ações que procedem de um homem espiritual tiram sua sabedoria da justiça e
do julgamento, como foi mostrado acima, nº 280. T odavia, entre os esposos,
dos quais nem um nem outro é espiritual,ou que são os dois naturais, a mesma
cousa pode acontecer, mas para outros fins; se é para o melhoramento e para a
acomodação, o fim é ou para que o outro seja levado à semelhança de seus
costumes, e seja subordinado a seus desejos; ou para algum emprego a fim de
que se tornem úteis aos seus; ou para a paz dentro de casa, ou o bom nome no
exterior, ou pelos favores que se espera do consorte ou de seus país, além de
vários outros fins; mas estes fins, em alguns, procedem da prudência de sua
razão; em outros, de uma civilidade natural; em outros dos prazeres das cobiças
familiares desde o nascimento, e de que temem a perda; além de outros fins,
pelos quais os favores tomados pelo amor conjugal se tornam mais ou menos
fingidos.H á também favores como de amor conjugal fora da casa sem que haja
favor algum na casa, mas têm por fim a reputação de um e de outro, e se não a
têm por fim,são um jogo.
283 - X II. São para conservar a ordem nos negócios domésticos, e para a ajuda
mútua. Cada casa onde também há crianças, seus preceptores e criados, é uma
pequena sociedade a imitação da grande; ela também coexiste por todos eles,
como o comum pelas partes; e do mesmo modo que a salvação da grande
sociedade depende da ordem, da ordem também depende a salvação desta
pequena sociedade; do mesmo modo, portanto, que importa aos magistrados
velar e prover para que a ordem exista e seja conservada em uma sociedade
composta, do mesmo modo importa aos esposos agir assim em sua sociedade
particular; mas esta ordem não é possível, se o marido e a esposa estão em
dissidência quanto às mentes, pois por esta dissidência os conselhos e as ajudas
mútuas são dirigidos em sentidos diversos, e são divididos como as mentes, e
assim a forma da pequena sociedade é destruída; é por isso que, a fim de
conservar a ordem, e de prover pela ordem a si mesmo e ao mesmo tempo à
casa, ou à casa e ao mesmo tempo a si mesmo, para evitar uma decadência e
uma ruína completa, a necessidade exige que o patrão e a patroa estejam de
acordo e façam um; se isso não pode acontecer por causa da diferença de
mentes, não obstante para que haja vantagem, é preciso e mesmo, convém que
isso se faça por uma amizade conjugal representativa. Q ue daí se estabeleça nas
casas uma concórdia para as necessidades e para as-utilídades,isso é notório.
284 - X III. São para a harmonia no cuidado das criancinhas e na educação das
crianças. Q ue haja entre os esposos, por causa das criancinhas e das crianças,
215

artifícios conjugais, que são aparências de amor e de amizade, à imitação do


amor e da amizade verdadeiramente conjugais, isso é bem conhecido; o amor
comum por elas faz com que cada um dos esposos olhe para o outro com
bondade e favor; o amor das criancinhas e das crianças na mãe e no pai se
conjugam, como o coração e o pulmão no peito; este amor na mãe é como o
coração, e o amor para com elas no pai é como o pulmão; a razão desta
comparação é que o coração corresponde ao amor, e o pulmão ao
entendimento, e que o amor pela vontade está na mãe, e o amor pelo
entendimento no pai. N os homens espirituais há conjunção conjugal por este
amor pela justiça e o julgamento; pela justiça, porque a mãe as carregou em seu
seio, os deu à luz com dor, e em seguida com um cuidado infatigável, os
amamentou, os alimentou, os limpou, os vestiu e os educou, (e pelo
julgamento, porque o pai provê a sua instrução nos conhecimentos, na
inteligência e na sabedoria).(*)
285 - X IV .São para a paz na casa.
O s artifícios conjugais, ou as amizades externas para a paz e a tranqüilidade da
casa, estão principalmente nos maridos, por causa de sua característica natural,
porque o que eles fazem,o fazem pelo entendimento; e como é o entendimento
que pensa,ele trata de diferentes cousas que tornam a mente (animus) inquieta,
a confundem e a perturbam; se portanto na casa não houvesse tranqüilidade,
aconteceria que os espíritos vitais esmoreceriam, e que sua vida interior
expiraria, por assim dizer, e que assim a saúde de sua mente e de seu corpo se
alteraria; os temores dêstes perigos e de vários outros assediariam as mentes dos
maridos, se, para acalmar as perturbações de seu entendimento, não houvese
refúgio em casa junto das esposas; além disso, a paz e a tranqüilidade dão
serenidade às mentes, e as dispõem a receber com gratidão as benevolências
oferecidas pelas esposas, que empregam todos os seus cuidados para dissipar as
nuvens das mentes, que sua perspicácia as faz descobrir nos maridos; e, além
disso, esta paz e esta tranqüilidade dão encantos à sua presença; é portanto
evidente que a simulação de um amor como verdadeiramente conjugal para a
paz e a tranqüilidade na casa, é uma necessidade; acrescente-se a isso, que nas
esposas não há simulação como nos maridos; mas que se aparece alguma cousa
que se lhe assemelha, isso pertence ao amor real, porque as mulheres nasceram
amores do entendimento dos homens; é por isso que elas aceitam com bondade
os favores dos maridos,senão de boca ao menos de coração.

286 - X V .São para a reputação fora da casa.


As fortunas dos maridos dependem muito freqüentemente de sua reputação de
justiça,de sinceridade e de retidão; e esta reputação depende também da esposa
que conhece a vida familiar de seu marido; se portanto as dissidências de suas
mentes explodirem em inimizades abertas, em querelas, e em ameaças de ódio,
216

e se estas cousas fossem divulgadas pela esposa, por seus amigos e pelos criados,
seriam facilmente transformadas em histórias escandalosas, que imprimiriam a
desonra e a infâmia no nome do marido; para evitar tais desgraças, o marido
não tem outro meio senão simular favor em relação à esposa, ou de separar-se
quanto à casa.
(*) O que está colocado entre parêntesis foi acrescentado para suprir uma
omissão evidente, quer da parte do Autor, quer, antes, da parte do
T ipógrafo.
287 - X V I. São para diversos favores que se espera do consorte ou de seus pais;
e assim pelo temor de perder estes favores.
Isso acontece principalmente nos casamentos em que há diferença de estado e
de condição, ver acima o n. 250; por exemplo, se se esposa uma mulher muito
rica e esta encerra seu ouro em bolsas, ou suas riquezas em cofres, e mais ainda,
se ela pretende com audácia que é dever do marido sustentar a casa com seus
fundos e com seu rendimento; que por conseguinte haja aparências forçadas de
um amor como conjugal, isso é geralmente conhecido. A mesma cousa
acontece,quando se esposa uma mulher, cujos pais, parentes e amigos estão em
dignidades eminentes, em empregos lucrativos, em comércios vantajosos, e
podem tornar o estado do marido mais próspero; que em razão destas
vantagens haja também simulação de um amor como conjugal, isso é
geralmente conhecido. Q ue estas diversas simulações se dêem por temor de
perder estes favores,isso é evidente.
288 - X V II.São para fazer desculpar os defeitos,e por conseguinte para evitar a
desonra.
O s defeitos pelos quais os esposos temem a desonra são em grande número, uns
criminais,e outros não criminais; há defeitos da mente e defeitos do corpo mais
leves do que os que foram enumerados no Capítulo precedente, ns. 252 e 253,
os quais são causas de separação; aqui, portanto, são entendidos os defeitos
sobre os quais, por causa da desonra, o outro esposo guarda um profundo
silêncio; além destes defeitos, pode haver, em alguns, crimes fortuitos, que, se
fossem divulgados, seriam passíveis das penas da lei; sem falar do defeito da
faculdade de que os homens se vangloriam ordinariamente. Q ue as excusas
dêstes defeitos, para evitar a desonra, sejam causas de simulação de amor e
amizade com o cônjuge, vê-se claramente sem que haja necessidade de mais
confirmações.
289 - X V III.São para as reconciliações.
Q ue entre os esposos cujas mentes, por diversas causas, não estão de acordo, há
alternativamente desconfiança e confiança, desuniões e conjunções, assim
reconciliações que se realizam depois das separações, e que não são da mesma
maneira alternativas e transitórias.
217

290 - X IX .Se na espôsa o favor não cessa, quando cessa a faculdade no marido,
pode-se formar uma amizade que imita a amizade conjugal quando os esposos
envelhecem.
A principal causa da separação das mentes (animi) entre esposos, é a falta de
favor na esposa, quando cessa a faculdade no marido, e por conseguinte a falta
do amor; pois do mesmo modo que os calores se comunicam entre si, do
mesmo modo também as frieza; que pela falta de amor em um e outro a
amizade cessa, e que o favor cessa da mesma maneira, se não há temor de uma
ruína doméstica, isso é evidente pela razão e a experiência. Se, portanto, o
marido se imputa tacitamente a causa,e a espôsa persevera sempre em um casto
favor a seu respeito, pode resultar daí uma amizade, que, porque existe entre
esposos, aparece como um amor imitando o amor conjugal. Q ue haja entre
velhos esposos uma amizade que imita esse amor, a experiência o atesta pela
tranqüilidade, a segurança, a amabilidade e a afabilidade que existem em sua
companhia,suas ligações e sua sociedade.
291 - X X . H á diversas espécies de amor aparente entre esposos, dos quais um é
subjugado,e por conseguinte submetido ao outro.
Q ue depois que os primeiros tempos do casamento passaram, se elevam entre
os esposos rivalidades a respeito do direito e do poder; a respeito do direito
porque, segundo os estatutos do pacto de aliança, há igualdade, e para cada um
dignidade nos deveres de sua, função; e a respeito do poder, porque a
superioridade em todas as cousas da casa é reclamada pelos homens, por serem
homens, e porque a inferioridade é para as mulheres por serem mulheres, isto
está no número das cousas conhecidas no M undo de hoje. T ais rivalidades,
hoje muito freqüentes, não decorrem de outra parte senão da falta de
consciência a respeito do amor verdadeiramente conjugal, e da falta de
percepção do sentido das beatitudes deste amor; por esta ausência de
consciência e de percepção em lugar deste amor, há uma cupidez que lhe toma
a máscara; e, o amor real sendo rejeitado, decorre desta cupidez uma ambição
pelo poder; em alguns ela vem do prazer do amor de dominar, em outros foi
implantada antes do casamento por mulheres hábeis, e em outros é ignorada.
O s M aridos que estão nesta ambição, e que pelas alternativas de rivalidade,
obtêm o império, reduzem suas esposas, ou à posse de seu direito, ou à
submissão a seu capricho, ou à escravidão, cada um segundo o grau e o estado
qualificado desta ambição, gravada e escondida nele; mas se as Esposas estão
nesta ambição, e se depois de alternativas de rivalidade elas obtêm o império,
reduzem seus maridos ou a uma igualdade de direitos com elas, ou à submissão
a seu capricho, ou à escravidão; mas como nas esposas, depois que obtiveram a
faixa do império, permanece a cupídez que toma a máscara do amor conjugal,
cupidez refreada pela lei e pelo temor de uma separação legítima, se
estendessem seu poder além do que é permitido, é por isso que elas vivem em
consociação com os maridos. M as qual é o amor e qual é a amizade entre uma
218

esposa senhora e um marido escravo, depois também, entre um marido senhor


e uma esposa escrava, isso não pode ser descrito em poucas palavras; mais ainda
se suas diferenças fossem classificadas em espécies, e estas fossem enumeradas,
páginas não seriam suficientes; com efeito, elas são variadas e diversas, variadas
segundo a natureza da ambição nos maridos, variadas semelhantemente nas
esposas; e diversas, porque nos homens elas diferem das que estão nas
mulheres; com efeito, tais homens não estão em amizade alguma de amor, a
não ser em uma amizade louca; e tais esposas estão em uma amizade de amor
bastardo proveniente da cupidez.M as por que arte as esposas adquirem o poder
sobre os maridos,é o que será dito no artigo que vai em seguida.
292 - X X I. H á no M undo casamentos infernais entre esposos que são
interiormente inimigos encarniçados,e externamente como amigos unidos.
É-me proibido, é verdade, pelas esposas desta espécie, que estão no M undo
Espiritual,apresentar às claras estes casamentos; pois elas temem que ao mesmo
tempo seja divulgada a arte que empregam para obter o poder sobre os
maridos, arte que elas desejam excessivamente manter oculta; mas como sou
instigado pelos maridos, naquele mundo, a desvendar as causas de seu ódio
intestino e de uma espécie de furar excitado em seus corações contra as esposas
em razão de seus artifícios clandestinos, vou unicamente relatar as
particularidades seguintes: O s maridos diziam que sem o saber tinham
contraído em face das esposas um temor medonho, em virtude do qual não
podiam deixar de obedecer com inteira submissão às decisões delas, e de se
curvar aos seus caprichos com mais servilismo do que os criados, de sorte que
se tinham se tornado homens insignificantes; e que assim se tinham tornado em
face das esposas não somente os que não estavam investidos em dignidade
alguma, mas também os que tinham uma eminente, e mesmo bravos e ilustres
generais, e diziam que depois de ter concebido este terror, não tinham podido
ter a audácia de falar com as esposas de outro modo que não fosse com
amizade, e de lhes fazer outra cousa que não fosse o que lhes agrada, ainda que
em seu coração entretivessem contra elas um ódio mortal; e que além disso, as
esposas falavam e agiam sempre polidamente com eles, e escutavam com ar
submisso os pedidos que lhes faziam. O ra, como os maridos mesmos,
grandemente admirados, tinham desejado saber donde tinha podido nascer
uma tal antipatia em seus internos, e uma tal simpatia em aparência em seus
externos,tinham pedido as causas à mulheres que conheciam esta arte secreta; e
me disseram que souberam de sua boca que as mulheres escondem
profundamente em si a ciência pela qual elas se avantajam em submeter, se o
querem, os homens, ao jugo de seu império; e, que nas esposas sem educação,
isso é posto em execução por meio de censuras e de deferências que se sucedem
alternativamente; e em outras, por meio de olhares duros e continuamente
desagradáveis, e em outras do mesmo gênero, agindo de uma outra maneira;
mas nas esposas bem educadas,é por meio de vivas insistências em seus pedidos
219

sem jamais cessar de persistir, e de resistências teimosas contra os maridos se


sofrem maus tratos, apoiando-se sobre seu direito de igualdade estabelecido
pela lei,pela qual se obstinam audaciosamente; mais ainda,se são postas fora de
casa, elas aí voltam quando lhes apraz e continuam suas instâncias; pois sabem
que os maridos por sua natureza não podem de modo algum resistir à
persistência de suas esposas, e que depois de terem cedido, eles se submetem às
suas decisões; e que então as esposas,exercendo * império,se mostram polidas e
carinhosas para com os maridos; * causa real da dominação das esposas por esta
astúcia,é que o homem age pelo entendimento, e a mulher pela vontade, e que
a vontade,pode se obstinar,mas não o entendimento; me foi dito que as piores
desta espécie, que se dedicaram inteiramente à ambição de dominar, podem se
prender com tenacidade às suas instâncias até ao último esforço da vida. O uvi
também estas mulheres se desculparem de ter entrado no exercício desta arte;
diziam que não teriam entrado, se não tivessem previsto o soberano desprêzo e
o futuro abandono, e por conseguinte a sua perda, no caso em que viessem a
ser subjugadas pelos maridos, e que assim tinham tomado as armas por
necessidade; acrescentaram a isso um aviso para os maridos; era de deixarem às
esposas os seus direitos; e, quando lhes acontecem estarem nas frieza, não as
considerar como mais vis do que as criadas; diziam também que várias de seu
sexo não estão em estado de exercer esta arte por causa de uma timidez inata
(connata), mas acrescentei: "Por causa de uma modéstia inata". Pelo que acaba
de ser relatado, pode-se agora saber quais os casamentos que são entendidos
pelos casamentos infernais no M undo entre esposos que são interiormente
inimigos encarniçados,e exteriormente como amigos unidos.
293 - Ao que precede serão ajuntados dois M emoráveis.
Primeiro M emorável: U m dia, eu olhava por uma janela para o O riente, e vi
sete M ulheres sentadas sobre um canteiro de rosas perto de uma fonte,
bebendo água; eu tinha o olhar muito atento para ver o que faziam, e essa
tensão de minha vista as chocou, por isso uma delas me fez um convite por
aceno; e eu saí de casa, e me aproximei às pressas; e quando cheguei perto,
pergunteilhes com polidez donde elas eram; e disseram: "Somos Esposas, e
conversamos aqui sobre as Delícias do amor conjugal, e por numerosas
confirmações concluímos que estas delícias são também as delícias da
sabedoria". Esta resposta agradou de tal modo a minha mente (animus), que
me parecia estar em espírito, e por conseguinte em percepção, mais
interiormente e com mais ilustração do que jamais tinha estado antes. Por isso,
lhes disse: "Permiti-me fazer algumas perguntas sobre esses encantos". E elas
consentiram; e fiz esta pergunta: "Como vós, esposas, sabeis que as delícias do
amor conjugal são as mesmas que as delícias da sabedoria?" R esponderam: "N ós
o sabemos pela correspondência da sabedoria nos maridos com as delícias do
amor conjugal em nós; pois as delícias deste amor em nós são exaltadas e
diminuídas, e têm, absolutamente, sua qualidade segundo a sabedoria em
220

nossos maridos". Depois de ter ouvido sua resposta, fiz uma outra pergunta,
dizendo: "Sei que as palavras de doçura dos maridos e as palavras de alegria de
sua mente vos afetam e que vós sentis em todo o peito grandes delícias; mas
admiro-me de que digais que a sua sabedoria produz este efeito; dizei-me ao
menos o que é a sabedoria, e que sabedoria. A estas palavras as esposas
indignadas responderam: "T u imaginas que nós não sabemos o que é a
sabedoria, nem que sabedoria; e entretanto sobre ela em nossos maridos nós
refletimos continuamente, e cada dia, de sua boca, nós aprendemos, pois nós,
esposas, pensámos sobre o estado de nossos maridos desde a manhã até à noite;
quando muito haverá uma hora durante o dia de interrupção, ou em que o
nosso pensamento intuitivo se retira inteiramente deles, ou na qual está ausente
deles; do seu lado, os maridos no decorrer do dia, pensam muito pouco sobre o
nosso estado; daí vem que nós sabemos que sabedoria neles produz delícias em
nós; esta Sabedoria, os maridos chamam sabedoria espiritual-racional e
espiritual-moral; a Sabedoria espiritual-racional eles dizem que pertence ao
entendimento e aos conhecimentos, e a Sabedoria Espiritual-moral eles dizem
que pertence à vontade e à vida; mas eles conjugam as duas, e fazem delas uma
só e decidem que os encantos desta sabedoria são transferidos de suas mentes
como delícias para nosso peito, e do nosso para o seu peito, e assim voltam à
sabedoria, sua origem". E então perguntei: "Sabeis alguma cousa mais sobre a
sabedoria dos maridos que se torne delícias em vós?" Disseram: "Sim; há uma
sabedoria espiritual, e em conseqüência uma sab,edoria racional e uma
sabedoria moral; a sabedoria espiritual é reconhecer o Senhor Salvador por
Deus do Céu e da terra, e aquirir d'Ele os veros da Igreja, o que se faz pela
Palavra e pelas prédicas segundo a Palavra donde resulta a racionalidade
espiritual; e viver por Ele segundo estes veros, donde resulta a moralidade
espiritual; estas duas, a racionalidade espiritual e a moralidade espiritual, os
maridos chamam Sabedoria, que produz em geral o amor verdadeiramente
conjugal; aprendemos também com eles a causa, é que por esta sabedoria são
abertos os interiores de sua mente, e em conseqüência os interiores de seu
corpo, donde existe uma livre passagem desde os primeiros até aos últimos para
a veia do amor, e é do afluxo, da suficiência e da virtude desta veia que
depende e vive o amor conjugal. A sabedoria espiritual-racional e moral de
nossos maridos, especialmente quanto ao casamento tem por fim e por alvo
amar uma única esposa, e se despojar de toda cobiça pelas outras; e quanto
mais isso se dá, tanto mais este amor é exaltado quanto ao grau, e aperfeiçoado
quanto à qualidade, e tanto mais também sentimos em nós, de uma maneira
mais distinta e mais delicada, as delícias que correspondem aos prazeres das
afeições e aos encantos dos pensamentos de nossos maridos". Em seguida
perguntei se elas sabiam como se faz a comunicação. Disseram: "Em toda
conjunção por amor, deve haver ação, recepção e reação; o estado delicioso de
nosso amor é o agente ou a ação, o estado da sabedoria dos maridos é o
recipiente ou a recepção, e é também o reagente ou a reação segundo a
221

percepção; e esta reação é percebida por nós com delícias no peito segundo o
estado continuamente tenso e preparado para receber estas cousas, que, de
algum modo, são coerentes com a virtude nos maridos, por conseqüência
também com o estado extremo do amor em nós, e que dêle procede". Além
disso, disseram: "G uarda-te de entender pelas delícias, de que acabamos de
falar, as delícias finais deste amor; desta nós jamais dizemos alguma cousa, mas
falamos de nossas delícias peitorais, de que existe uma perpétua
correspondência com o estado da sabedoria de nos os maridos". Depois disso,
apareceu de longe como uma Pomba que voava com uma folha de árvore no
bico; mas quando se aproximou, em lugar de uma pomba, viu-se um menino
com um papel na mão; e avançou para nós, e apresentou m'o, e disse: "Lê-o
diante destas V irgens da fonte". E li isto: "Diz aos habitantes da terra com
quem estás, que há um amor verdadeiramente conjugal, cujas delícias são por
miríades; o mundo, até ao presente, conhece apenas algumas delas; mas as
conhecerá porque a Igreja noiva com o Senhor e se casa". E então fiz esta
pergunta: "Por que este menino vos chamou V irgens da fonte?" R esponderam:
"Somos chamadas V irgens quando estamos sentadas nesta fonte, porque somos
as afeições das verdades da sabedoria de nossos maridos, e a afeição do vero é
chamada V irgem; a fonte também significa o vero da sabedoria, e o canteiro de
rosas sobre o qual estamos sentadas significa as suas delícias". Então uma das
sete fez uma grinalda de rosas, e espargiu-a com a água da fonte, e a colocou
sobre o boné do menino em torno de sua cabecinha, e disse: "R ecebe as delícias
da inteligência; sabe que o boné significa a inteligência, e esta grinalda de rosas
as delícias". E o menino assim decorado, foi embora; e de longe foi visto de
novo como uma pomba que voava,mas com uma coroa sobre a cabeça.
294 - Segundo M emorável: Alguns dias depois, vi de novo estas sete Esposas
em um bosque de rosas, mas não no mesmo que antes; era um bosque de rosas
magníficas, como jamais tinha visto; era redondo, e as rosas formavam como
que um arco-íris; as rosas ou flores cor de púrpura compunham o círculo mais
exterior, outras amarelas cor de ouro o círculo mais próximo deste, outras de
cor azul celeste o círculo dentro deste, e o círculo mais interior era de uma
brilhante cor verde; e dentro deste bosque em arco-íris havia um pequeno lago
de água límpída. Estas sete Esposas, chamadas precedentemente V irgens da
fonte, que estavam sentadas neste bosque, tendo me visto na janela, me
chamaram de novo; e quando cheguei, disseram: "V iste jamais alguma cousa
mais bela na terra?" E eu disse: "Jamais". E elas disseram: "U ma tal maravilha é
criada em um instante pelo Senhor, e representa alguma cousa de novo na
terra, pois todo objeto criado pelo Senhor representa; mas este, o que
representa? descobre, se podes; nós descobrimos as delícias do amor conjugal".
T endo ouvido isto, disse: “O que! as delícias do amor conjugal, de que me
falastes tantas cousas com sabedoria,e também com eloqüência!Depois que vos
deixei, contei vossos discursos a esposas que moram em nossa região, e lhes
disse: Pelo que acabo de aprender, sei que há em vós, em vosso peito, delícias
222

tendo por fonte o vosso amor conjugal, delícias que podeis comunicar a vossos
maridos segundo sua sabedoria; e que por isso mesmo, olhais continuamente,
da manhã à noite, os vossos maridos com os olhos do vosso espírito, e estudais
como dobrar e dirigir suas mentes (animi) para a sabedoria, com a intenção de
colhêr estas delícias. R eferi também a elas o que entendeis pela sabedora, que é
a sabedoria espiritual racional e moral, e que quanto ao casamento, ela consiste
em amar uma única espôsa e despojar-se de toda cobiça pelas outras; mas então
as esposas de nossa região responderam rindo e dizendo: “O que é tudo isso?
estas palavras são frívolas; nós não sabemos o que é o amor conjugal; se há
algum amor conjugal em nossos maridos, todavia em nós não há nenhum; de
onde viriam então a nós essas delícias? M ais ainda quanto às delícias que
chamamos finais, às vezes nós as negamos violentamente, pois nos são
desagradáveis, pouco mais ou menos como as violações; e mesmo se prestares
atenção não verás sinal de um semelhante amor em nossas faces; assim vós
zombais ou gracejais, quando dizeis também, vós, com essas sete esposas, que
da manhã à noite pensamos em nossos maridos, e continuamente prestamos
atenção ao que lhes apraz e lhes é agradável, com o intuito de obter deles tais
delícias. Eis, de suas respostas as palavras que retive para vos relatar, porque
estão, em oposição e também em plena contradição, com as que, perto da
fonte, ouvi de vós e tão avidamente apreendi, e nas quais acreditei". A isso, as
esposas sentadas no bosque de rosas, responderam: "Amigo, tu não conheces a
sabedoria, nem a prudência das esposas, porque elas a escondem inteiramente
dos maridos, e a escondem com o único intuito de ser amadas; pois todo
homem, que é somente racional e moral naturalmente e não espiritualmente,
tem frieza por sua espôsa; esta frieza nele está escondida nos íntimos; a esposa
sábia e prudente nota-a perfeitamente bem e finamente, e esconde tanto mais o
seu amor conjugal,o recolhe em seu seio,e aí o encerra tão profundamente que
não se manifesta dêle a mínima parte na face, nem no som de sua voz, nem no
gesto; a razão disso, é que quanto mais ele se manifesta, tanto mais a frieza
conjugal do marido se espalha desde os íntimos de sua mente, onde reside, até
em seus últimos, e introduz no corpo um esfriamento total, e em conseqüência
vem um esforço para a separação de leito e de quarto". Então fiz esta pergunta:
"Donde vem uma tal frieza, chamada por vós frieza conjugal?" Elas
responderam: V em de sua loucura nas cousas espirituais; e quem é insensato
nas cousas espirituais tem intimamente frieza pela esposa, e internamente calor
pelas prostitutas; e como o amor conjugal e o amor escortatório são opostos
entre si, segue-se que o amor conjugal se torna frieza, quando o amor
escortatório é calor; e o marido, quando a frieza reina nele, não suporta da
parte da esposa, nenhum sentimento de amor, nem por conseqüência seu
hálito; é por isso que a esposa esconde com tanta sabedoria e prudência o seu
amor,e quanto mais o esconde,negando-o,e recusando-o,tanto mais o marido
se aquece e se reaviva pela esfera de prostituição que influi; daí vem que para a
esposa de um tal homem,não há delícias peitorais,como as há para nós,mas há
223

somente volúpias que da parte do marido devem ser chamadas volúpias da


loucura, porque são as volúpias do amor escortatório. T oda esposa casta ama
seu marido, mesmo quando ele é incasto; mas só a sabedoria é o recipiente de
seu amor, por isso a esposa emprega todos os seus esforços para transformar em
sabedoria a loucura do marido, isto é, para que ele não cobice outras além dela;
é o que ela faz por mil meios, tendo cuidado sobretudo que nenhum desses
meios seja descoberto pelo marido, pois ela sabe muito bem que o amor não
pode ser forçado; mas que é insinuado no livre; é por isso que foi dado às
mulheres conhecer pela vista, pelo ouvido e pelo tato, todo o estado da mente
(animua) de seu marido; mas, de outro lado, não foi dado aos maridos
conhecer nenhum estado da mente (animus) de suas esposas. A esposa casta
pode olhar para o marido com ar austero, falar-lhe com tom rude, e mesmo se
encolerisar e altercar com ele, e entretanto manter sempre em seu coração um
amor doce e terno por ele; mas que estes arrebatamentos e estes artifícios
tenham por fim a sabedoria e por conseguinte a recepção do amor no marido,
vê-se bem claramente pelo fato de que ela pode num instante se reconciliar;
além disso, estes meios de esconder o amor gravado em seu coração e em sua
medula,as esposas os empregam a fim de que a frieza conjugal nos maridos não
se espalhe e não extinga também o foco de seu calor escortatório, e assim em
lugar de madeira verde não faça dele um tronco seco". Depois que estas sete
esposas disseram estas cousas e várias outras semelhantes, seus maridos vieram,
tendo nas mãos cachos de uvas, das quais umas eram de um gosto delicado e
outras de um gosto muito desagradável; e as esposas disseram: "Por que
trouxestes também estas uvas más ou estes cachos de uvinha selvagem?" O s
maridos responderam "Porque em nossas almas, com as quais as vossas estão
unidas, nós percebemos que conversáveis com este homem sobre o amor
verdadeiramente conjugal, nisto que as suas delícias eram delícias da sabedoria,
e também sobre o amor escortatório, nisto que suas delícias eram as volúpias da
loucura; estas delícias são as uvas de um gosto muito desagradável ou cachos de
uvas selvagens; e aquelas são as uvas de um gosto delicado". E confirmaram o
discurso de suas esposas, ajuntando que nos externos as volúpias da loucura
parecem semelhantes às delícias dá sabedoria, mas não nos internos,
absolutamente como as boas uvas e as más uvas que tinham trazido; pois há,
tanto nos castos, como nos incastos, uma semelhante sabedoria nos externos,
mas é inteiramente dessemelhante nos internos". Depois disso, o menino veio
de novo com um papel na mão, e m'o apresentou, dizendo: "Lê". E li isto:
"Sabei que as delícias do amor conjugal sobem para o Céu supremo, e que em
caminho e nesse Céu elas se conjugam com as delícias de todos os amores
celestes, e entram assim em sua felicidade que dura eternamente; e isso, porque
as delícias deste amor são também as delícias da sabedoria.E sabei também,que
as volúpias do amor escortatório descem até ao inferno mais profundo, e que
em caminho e nesse inferno se conjugam com as volúpias de todos os amôres
infernais, e entram assim em sua infelicidade, que consiste nas misérias de
224

todos os prazeres do coração; e isso, porque as volúpias deste amor são também
as volúpias da loucura".Depois disso,os maridos se retiraram com suas esposas,
e acompanharam o menino até ao caminho de uma ascenção para o Céu e
conheceram que a Sociedade de onde foi enviado, era uma Sociedade do novo
Céu,com a qual a N ova Igreja nas terras deve ser conjunta.
225

Dos esponsais e das núpcias

295 - O assunto dos Esponsais e das N úpcias e também das Solenidades que as
acompanham, é tratado aqui principalmente pela razão do entendimento; pois
as cousas, que são escritas neste Livro, têm por fim que o leitor veja por seu
R acional as verdades, e dê assim o seu assentimento, pois desta maneira seu
espírito é convencido; e as cousas de que o espírito está convencido, obtêm um
lugar acima daquelas que, sem que a razão tenha sido consultada, entram pela
autoridade e a fé na autoridade; pois estas não entram na cabeça mais
profundamente do que na memória,e aí se misturam com as ilusões e os falsos,
assim estão abaixo dos racionais que pertencem ao entendimento; cada homem
pode, por estas, falar como que racionalmente, mas às avessas; pois pensa então
como anda o lagostim, com a vista seguindo a cauda; é diferente se é pelo
entendimento; quando é assim, a vista racional escolhe pela memória as cousas
que convém,pelas quais confirma a verdade considerada em si.É por esta razão
que, neste Capítulo, serão relatadas várias cousas, que são costumes recebidos;
por exemplo, que a escolha pertence ao homem; que os pais devem ser
consultados; que devem ser dadas prendas; que a aliança conjugal deve ser
contratada antes das núpcias; que ela deve ser consagrada pelo sacerdote, e que
devem ser celebradas núpcias; além de várias outras particularidades, que são
relatadas com este fim, que o homem por seu racional veja que tais cousas
foram inscritas no amor conjugal, como lhe sendo necessárias para estendê-lo e
completá-lo. O s Artigos em que é dividido este Capítulo são em sua ordem os
seguintes: I. A escolha pertence ao homem e não à mulher. II. É preciso que o
homem procure e peça a mulher em casamento, e não vice-versa. III. É preciso
que a mulher consulte seus pais, ou aos que lhes fazem as vezes, e que em
seguida delibere em si mesma antes de consentir. IV . Depois da declaração do
consentimento, prendas devem ser dadas. V . O consentimento deve ser
afirmado e estabelecido por esponsais solenes. V I. Pelos esponsais um e outro
são preparados para o amor conjugal. V II. Pelos esponsais a mente de um é
conjunta à metade do outro, a fim de que o casamento do espírito se faça antes
do casamento do corpo. V III. Isto acontece naqueles que pensam castamente a
respeito dos casamentos; é diferente naqueles que pensam incastamente. IX .
Durante o tempo dos esponsais não é permitido conjuntar-se corporalmente.
X . Q uando o tempo dos esponsais se completa, as núpcias devem ser feitas. X I.
Antes da celebração das núpcias, a Aliança conjugal deve ser contratada em
presença de testemunhas. X II. O Casamento deve ser consagrado por um
sacerdote. X III. As N úpcias devem ser celebradas com regozijo. X IV . Depois
226

das núpcias, o casamento do espírito se torna também o do corpo, e assim o o


casamento está completo. X V . T al é a ordem do Amor conjugal com seus
meios desde seu primeiro calor até sua primeira chama. X V I. O Amor
Conjugal precipitado sem ordem e sem meios de ordem queima as medulas e é
consumido. X V II. O s estados das mentes de um e de outro, procedendo em
uma ordem sucessiva, influem no estado do casamento, entretanto, de um
modo nos espirituais, e de outro modo nos naturais. X V III. H á uma ordem
sucessiva e uma ordem simultânea, e esta vem daquela e é segundo ela. Seguem
agora as explicações destes Artigos.

296 - I.A escolha pertence ao homem,e não à mulher.


É porque o homem nasceu para ser entendimento, e a mulher para ser amor; e
também, porque nos homens há comumente o amor do sexo, mas nas
mulheres o amor de um só do sexo; depois ainda, porque não é indecente para
os homens falar de amor, e de torná-lo público, mas isso é indecente para as
mulheres; não obstante,às mulheres pertence o direito de escolher um daqueles
que a procuram para casar. Q uanto ao que concerne à primeira razão, que a
escolha pertence aos homens,porque nasceram para o entendimento,é fundada
sobre o fato de que o entendimento pode ver claramente as cousas que convêm
e as que não convêm, fazer a sua distinção, e escolher com julgamento o que é
vantajoso; não se dá o mesmo com as mulheres, porque nasceram para o amor;
não há para elas a mesma claridade de luz, e por conseqüência suas
determinações ao casamento não procederam senão das inclinações de seu
amor; se há nelas a ciência de discernir entre homens e homens, o seu amor
entretanto é levado para as aparências. Q uanto à segunda razão, que a escolha
pertence aos homens e não às mulheres porque nos homens há comumente o
amor do sexo, e nas mulheres o amor de um só do sexo, é fundada sobre o fato
de que naqueles em quem há o amor do sexo têm uma livre circunspeção, e
também uma livre determinação; não se dá o mesmo com as mulheres em que
foi gravado o amor por um único do sexo; para ter a confirmação disso,
interroga, se te apraz, sobre o casamento monogâmico e sobre o casamento
poligâmico, os homens que encontrares, e encontrarás raramente algum que
não te responda em favor do casamento poligâmico,e é isso também o amor do
sexo; mas interroga as mulheres sobre esses casamentos, e quase todas, a
exceção das prostitutas, rejeitarão os casamentos poligamicos; segue-se daí que
as mulheres têm o amor de um único do sexo, assim o amor conjugal. Q uanto
à terceira razão, que não é indecente para os homens falar do amor e torná-lo
público, e que isso é indecente para as mulheres, é evidente por si mesmo;
segue-se daí portanto que a declaração pertence aos homens, e se a declaração
lhe pertence, pela mesma razão a escolha. Q ue às mulheres pertence o direito
da escolha entre seus pretendentes, isso é notório; mas esta espécie de escolha é
pouco extensa e limitada, enquanto que a escolha dos homens é extensa e
227

ilimitada.
297 - II.É preciso que o homem procure e peça a mulher em casamento, e não
vice-versa.
Isso é uma conseqüência resultante da escolha; e além disso, procurar e pedir as
mulheres em casamento é em si honesto e decente para os homens, mas não
para as mulheres; se as mulheres procurassem e pedissem, não sómente seriam
censuradas, mas depois do pedido seriam mesmo consideradas como vis, ou
depois do casamento como mulheres impudicas, com as quais não pode haver
senão coabitações frias e fastidiosas; por isso os casamentos seriam assim
mudados em cenas trágicas; de mais as mulheres se gloriam de que não cederam
às instâncias do pedido dos homens senão como vencidas. Q uem não prevê
que, se as mulheres procurassem os homens, raramente seriam aceitas, ou
seriam indignamente rejeitadas, ou seriam atraídas a ações lascivas, e mesmo
prostituiriam seu pudor? Além disso, nenhum amor do sexo é inato nos
homens, como foi provado acima, e sem este amor não há encanto interior da
vida; por isso para exaltar sua vida por este amor, pertence aos homens
conquistar as mulheres procurando-as com polidez, amabilidade e deferência, e
pedindo a elas esse doce acréscimo de sua vida. A beleza da face, do corpo e dos
costumes desse sexo, em comparação com o outro sexo, é um motivo a mais,
para a obrigação de agir assim.
298 - III. É preciso que a mulher consulte seus pais, ou aqueles que ocupam o
seu lugar,e que em seguida delibere em si mesma antes de consentir.
Se os pais devem ser consultados, é porque eles deliberam e dão conselhos com
julgamento, conhecimento e amor; com julgamento, porque estão em uma
idade avançada, e nessa idade se goza de julgamento, e se vê claramente o que
convém e o que não convém. Com conhecimento, tanto do pretendente como
da filha; quanto ao pretendente, tomam informações; quanto à filha eles a
conhecem; concluem portanto com discernimento sobre um e sobre o outro ao
mesmo tempo. Com amor, porque velam pelo bem da filha e provêm à sua
casa,o que é também velar e prover à sua própria casa e a si mesmo.
299 - Seria completamente diferente, se a filha, sem consultar os pais, ou os
que ocupam seu lugar, consentisse por si mesma no pedido do pretendente;
com efeito, ela não pode pesar com julgamento, conhecimento e amor, este
assunto de que depende a sua sorte futura; não o pode com julgamento, porque
o seu a respeito da vida conjugal está ainda na ignorância, e não em estado de
comparar as razões entre si, e de ver claramente os costumes dos homens por
seus gostos; nem com conhecimento, porque conhece pouca cousa além das
que se passam na casa de seus pais, e no de algumas companheiras; e não tem
habilidade para inquirir das cousas que são familiares e próprias ao seu
pretendente; nem com amor, porque o amor das donzelas em sua primeira
idade núbil, e também na segunda, obedece às cobiças que provêm dos
228

sentidos, e não ainda aos desejos que procedem de uma mente apurada. Se
entretanto a filha deve deliberar em si mesma sobre este assunto antes de
consentir, é a fim de que não seja levada contra sua vontade a se unir a um
marido que ela não amaria; pois desse modo não haveria consentimento do seu
lado, e entretanto o consentimento faz o casamento, e inicia o espírito no amor
conjugal; e um consentimento constrangido ou extorquido não inicia o
espírito, mas pode iniciar o corpo; e muda assim a castidade, que reside no
espírito, em um desejo libidinoso, pelo qual o amor conjugal é iniciado no seu
primeiro calor.
300 - IV .Depois da declaração do consentimento,prendas devem ser dadas.
Por prendas são entendidos os presentes que, depois do consentimento, são
confirmações, testemunhos, primeiros favores e alegrias. Estes presentes são
confirmações,porque são sinais dos consentimentos; também se diz, quando de
uma parte e de outra há consentimento para um negócio: Dá-me um penhor;
e, de duas pessoas que se prometeram em casamento e consolidaram suas
promessas com presentes, se diz que se empenharam, por conseqüência que
confirmaram. São T estemunhos, porque estas prendas são como contínuas
testemunhas oculares do amor mútuo, por conseguinte são também lembranças
sobretudo se são anéis, caixas de perfume e de objetos de prender que se usa
expostos aos olhos; há neles uma certa imagem representativa das mentes
(animi) do noivo e da noiva. Estas prendas são os Primeiros favores, porque o
amor conjugal promete um favor perpétuo, dos quais esses presentes são os
primeiros. Q ue sejam Alegrias do amor, isso é notório; pois à sua vista a mente
se regozija, e como o amor está neles, estes favores são mais queridos e mais
preciosos do que qualquer outro presente, é como se o coração estivesse neles.
Como estas prendas são afirmações do amor conjugal, é por isso que as dádivas
depois do consentimento também tinham sido admitidas entre os Antigos, e
quando eram aceitas, as partes eram declaradas noivos e noivas. M as é preciso
que se saiba, que se tem a liberdade de dar estes presentes antes ou depois do
ato dos esponsais; se for antes, são confirmações e testemunhos do
consentimento para os esponsais; se for depois,o são.para as núpcias.
301 - V . O consentimento deve ser afirmado e estabelecido por solenes
esponsais.
As razões dos esponsais são estas: 1. A fim de que depois dos esponsais as almas
dos noivos tenham mutuamente inclinação uma para a outra.2.A fim de que o
amor universal pelo sexo seja determinado para um só ou para uma só do sexo.
3. A fim de que as afeições interiores sejam mútuamente conhecidas e por
aplicações sejam conjuntas na alegria íntima do amor. 4. A fim de que os
espíritos de um e de outro entrem em casamento, e sejam cada vez mais
consociados.5.A fim de que assim o amor conjugal avance regularmente desde
seu primeiro calor até à chama nupeial; e por conseqüência. 6. A fim de que o
amor conjugal a partir de sua origem espiritual avance e cresça em uma ordem
229

justa. O estado dos esponsais ou noivado pode ser comparado ao estado da


primavera antes do verão, e os encantos intensos deste estado à floração das
árvores antes da frutificação. Como as iniciações e as progressões do amor
conjugal procedem em ordem por causa de seu influxo no amor efetivo, que
começa nas núpcias,é por isso que nos Céus há esponsais.
302 - V I.Pelos esponsais um e outro são preparados para o amor conjugal.
Q ue pelos esponsais a mente ou o espírito de um seja preparado para a união
com a mente ou espírito do outro, ou, o que é a mesma cousa, que o amor de
um seja preparado para a união com o amor do outro, vê-se pelos argumentos
referidos no Artigo precedente. Além desses argumentos, é de notar-se isto: N o
amor verdadeiramente conjugal foi inscrita esta ordem, que ele sobe e desce;
sobe do seu primeiro calor progressivamente para o alto do lado das almas com
um esforço para aí efetuar as conjunções, e isso por contínuas aberturas
interiores das mentes. e não há amor que provoque com mais intensidade estas
aberturas,e que abra os interiores das mentes com mais força e destreza, do que
o amor conjugal, pois a alma de um e do outro têm isto por fim; mas nos
mesmos momentos em que este amor sobe do lado das almas,ele desce também
do lado do corpo, e por isso se faz uma vestimenta. M as é preciso saber que o
amor conjugal é na sua descida tal qual é na altura a que sobe; se está na altura,
desce casto, mas se não está na altura, desce incasto; a razão disso é que os
inferiores da mente são incastos enquanto que seus superiores são castos; pois
os inferiores da mente são aderentes ao corpo, e os superiores se separam dele;
mas sobre este assunto, se falará mais acima, no n. 305. Por estas poucas
explicações é evidente que pelos esponsais a mente de um e de outro são
preparadas para o amor conjugal, ainda que de diversas maneiras segundo as
afeições.
303 - V II. Pelos esponsais a mente de um é conjunta à mente do outro, a fim
de que o casamento do espírito se faça antes do casamento do corpo.
Isto sendo a consequencia do que foi dito acima nos ns. 301 e 302, passar-se-á
adiante sem pedir à razão novas confirmações.
304 - V III. Isso se dá naqueles que pensam castamente; é diferente nos que
pensam incastamente.
N os castos, e são os que pensam sobre os casamentos segundo a religião, o
casamento do espírito precede, e o casamento dos corpos segue-se; e estes são
aqueles em quem o amor sobe do lado da alma, e desta altura por conseguinte
desce, ver acima n. 302; suas almas se separam do amor ilimitado do sexo, e se
ligam a um só ou a uma só, com o qual ou a qual visam uma união perpétua e
eterna, e suas beatitudes crescentes, como sustentáculo de uma esperança que
recreia continuamente suas mentes.M as é de outro modo nos incastos, e são os
que não pensam segundo a religião sobre os casamentos e sobre sua santidade;
nestes há um casamento do corpo, e não há casamento algum do espírito; se
230

alguma cousa do casamento do espírito aparece durante o estado de noivado,


acontece sempre que se isso sobe por uma elevação dos pensamentos sobre este
casamento, isso entretanto recai nas cobiças que pela carne estão na vontade; e
assim pelas cousas incastas que aí estão, isso se precipita no corpo, e macula os
últimos de seu amor com um ardor sedutor; da forma porque este ardor no
começo está cheio de fogo, da mesma forma cessa de repente de estar em fogo,
e passa a um frio de gelo, o que acelera a falta de (potência). O estado dos
esponsais nestes males serve a outra cousa que não seja encher suas cobiças e
idéias lascivas,e macular o conjugal do amor.
305 - IX . Durante o tempo do noivado não é permitido conjuntar-se
corporalmente; pois do contrário a ordem inscrita no amor conjugal perece.
Com efeito, há nas mentes humanas três regiões, das quais a suprema é
chamada celeste, a média espiritual, e a ínfima natural; nesta região ínfima
nasce o homem, mas à região acima, que é chamada espiritual, ele sobe pela
vida segundo os veros da religião, e à suprema pelo casamento do amor e da
sabedoria; na região ínfima,que é chamada natural,residem todas as cobiças do
mal, e todas as lascívias; mas na região acima, que é chamada espiritual, não há
cobiça alguma do mal nem lascívia alguma, pois o homem, quando renasce, é
introduzido nesta região pelo Senhor; e na região suprema, que é chamada
celeste, há a castidade conjugal em seu amor; o homem é elevado a esta região
pelo amor dos usos; e como os usos que procedem dos casamentos são os mais
eminentes, ele aí é elevado pelo amor verdadeiramente conjugal; por estas
explicações abreviadas podese ver que o amor conjugal, desde os primeiros
começos de seu calor, deve ser elevado da região ínfima a uma região superior,
para que se torne casto,e para que assim casto desça ao corpo pela região média
e pela região ínfima; quando isso acontece, esta região ínfima é purificada de
suas cousas incastas pelas castas que descem; por conseguinte o último deste
amor se torna casto também. Agora, se a ordem sucessiva deste amor é
apressada por conjunções do corpo antes do tempo, resulta daí que o homem
age pela região ínfima, que de nascença é incasta; que daí começa e nasce a
frieza pelo casamento, e a negligência com o desgosto pela esposa, isso é
notório. Entretanto há perigos diversos de acontecimentos resultantes de
conjunções precoces, depois, também, de uma espera demasiado longa, e de
uma aceleração demasiadamente grande do tempo do noivado; mas estes
acontecimentos por causa de seu grande número e de sua variedade
dificilmente podem ser expostos.
306 - X . Q uando o tempo do noivado está completo, as núpcias devem ser
feitas.
H á Solenidades que são unicamente formalidades, e há Solenidades que ao
mesmo tempo são também essenciais; entre estas estão as N úpcias. Q ue as
núpcias estejam no número das coisas essenciais que devem ser manifestadas
com solenidades e ser celebradas com formalidades, isto é confirmado pelas
231

razões seguintes:1.As N úpcias constituem o fim do estado anterior inaugurado


pelos esponsais, estado que foi principalmente o do espírito, e constitui o
começo do estado posterior a inaugurar-se pelo casamento, estado que é ao
mesmo tempo do espírito e do corpo; pois então o espírito entra no corpo e aí
age; é por isso que, nesse dia, os futuros deixam o estado e também o nome de
noivo e noiva, e tomam o estado e o nome de esposos, e partilham o mesmo
leito. 2. As N úpcias são a introdução e a entrada no novo estado, que consiste
em que a virgem se torna esposa, e o mancebo marido, e um e outro uma só
Carne, o que acontece quando o amor por meio dos últimos os une; que o
casamento muda, na realidade, a virgem em esposa, e o mancebo em marido,
isso foi demonstrado no que precede; em seguida também, que o casamento
une os dois em uma única forma humana, de sorte que não são mais dois, mas
uma só carne. 3. As N úpcias são a entrada para a completa separação do amor
do sexo de junto do amor conjugal, o que se dá quando por uma plena
faculdade de conjunção o amor de um se liga estreitamente ao amor do outro.
4. Parece que as N úpcias constituem apenas um interstício entre estes dois
estados, e que assim elas não são senão formalidades que podem ser omitidas;
mas entretanto há nelas também este essencial, que este novo estado, de que se
acaba de falar, deve então começar por um contrato de aliança, e que o
consentimento deve ser declarado em presença de testemunhas, e também ser
consagrado pelo sacerdote, além de várias outras cousas que estabelecem este
consentimento. Como nas núpcias há cousas essenciais e corno o casamento
não se torna legítimo senão depois das núpcias, por isso as núpcias são
celebradas também nos Céus; ver acima n.21,e em seguida nº 27 a 41.
307 - X I. Antes da celebração das núpcias, a aliança conjugal deve ser
contratada na presença de testemunhas.
É preciso que a aliança conjugal seja contratada antes que as núpcias sejam
celebradas,a fim de que os estatutos e as leis do amor verdadeiramente conjugal
sejam conhecidas, e que sejam lembradas depois das núpcias; além disso
também, a fim de que haja um laço que una estreitamente as mentes para um
casamento justo; pois depois dos primeiros tempos do casamento, o estado que
precede os esponsais volta às vezes, e neste estado a lembrança se perde, e é
substituída pelo esquecimento da aliança contraída; e mesmo pelas seduções de
cousas incastas em cousas incastas esta aliança é inteiramente esquecida, e se
então ela é relembrada à memória, torna-se objeto de reprovação; mas para
afastar estas transgressões, a sociedade mesma tomou esta aliança sob sua
proteção, e pronunciou penas contra os que a quebrarem. Em uma palavra, a
aliança antenupcial manifesta os estatutos sagrados do amor verdadeiramente
conjugal, os estabelece, e obriga os liber tinos a observá-la; acrescente-se a isso
que por esta aliança o direito de dar nascimento a filhos, e para os filhos o
direito de herdar os bens dos pais,se tornam legítimos.
308 - X II.O casamento deve ser consagrado pelo sacerdote.
232

É porque, considerados em si mesmos, os casamentos são espiriluais, e por


conseguinte santos; com eleitos, eles descendem do casamento celeste do bem e
do vero,e as cousas conjugais correspondem ao Divino Casamento do Senhor e
da Sua Igreja; e por conseqüência estas cousas procedem do Senhor M esmo, e
são segundo o estado da Igreja nos contraentes; ora, como a ordem eclesiástica
nas terras administra as coisas que no Senhor pertencem ao Sacerdócio, isto é, a
Seu amor,por conseqüência também as que pertencem à Sua Bênção, é preciso
que os casamentos sejam consagrados por seus ministros; e como então eles são
os chefes das testemunhas, é preciso que o consentimento da aliança também
seja ouvido,aceito,assegurado e assim consolidado por eles.
309 - X III.As N úpcias devem ser celebradas com regozijo.
A razão disso, é que o amor antenupcial, que era o amor do noivo e da noiva,
desce então aos seus corações; e que por expansão daí a todas as partes do
corpo, eles sentem as delícias do casamento pelas quais suas mentes pensam
cousas agradáveis,e se entregam também a regozijos tanto quanto é permitido e
decente; para que isso seja favorecido, importa que os regozijos de suas mentes
se façam em comunhão, e que assim eles mesmos sejam introduzidos nas
alegrias do amor conjugal.
310 - X IV . Depois das N úpcias, o casamento do espírito se orna também o do
corpo,e assim o casamento está completo.
T odas as cousas que são feitas no corpo pelo homem, influem de seu espiríto;
sabe-se,com efeito,que a boca não fala por si mesma, mas que é o pensamento
da mente que fala pela boca; assim também, as mãos não agem por si mesmas e
os pés não andam por si mesmos; mas é a vontade da mente que faz isso por
eles; que por conseqüência a mente fala por seu órgão, a que a mente age no
corpo por seus órgãos; daí é evidente que tal é a mente, tais são as palavras da
boca, e tais são as ações do corpo; segue-se daí, como conclusão, que a mente
por seu contínuo influxo dispõe o corpo para as atividades conformes e
sicrônicas com ela; é por isso que, considerados interiormente os corpos dos
homens não são mais do que formas das mentes organizadas exteriormente para
executar os desígnios da alma. Isso foi dito por antecipação, a fim de que se
perceba porque as mentes ou os espíritos devem primeiro ser unidos entre si
como por um casamento, antes que haja união dos corpos, quer dizer, que é a
fim de que os casamentos pertençam já ao espírito quando se tornarem
casamentos do corpo, por conseqüência a fim de que os esposos se amem
primeiro mentalmente no espírito,e em seguida no corpo.Agora,segundo estas
explicações, consideremos o casamento: Q uando o amor Conjugal conjunta as
mentes dos dois, e os forma para o casamento, então também conjunta e forma
seus corpos para este casamento; pois, como foi dito, a forma da mente é
também interiormente a forma do corpo, com a única diferença de que esta foi
exteriormente organizada para executar aquilo a que a forma interior do corpo
é determinada pela mente; mas a mente, formada pelo amor conjugal, está não
233

só interiormente em todo, o corpo, de todo lado, em qualquer lugar que seja,


mas além disso está interiormente nos órgãos destinados à geração; que em sua
região foram colocados abaixo de todas as outras regiões do corpo; nestes órgãos
são terminadas as formas da mente naqueles que estão unidos pelo amor
conjugal; por conseguinte as afeições e os pensamentos de suas mentes aí são
determinados; nisto diferem as atividades das mentes produzidas pelos outros
amores; os outros amores não vão até lá; a conclusão que se tira disso, é que tal
é o amor conjugal nas mentes ou nos espíritos de dois esposos, tal ele é
interiormente nestes órgãos que lhe pertencem. M as que o casamento do
espírito depois das núpcias se tornem também o casamento do corpo, e seja
assim o casamento completo, a cousa é evidente por si mesma; por
conseqüência, se um casamento no espírito é casto, e participa da santidade do
casamento, é casto também quando está completo no corpo; e
semelhantemente, se um casamento no espírito é incasto, é incasto também no
corpo.
311 - X V . T al é a ordem do amor conjugal com seus meios desde seu primeiro
calor até sua primeira chama.
Diz-se desde seu primeiro calor até sua primeira chama,porque o calor vital é o
amor, e porque o calor conjugal ou amor cresce progressivamente, e se torna
enfim como uma chama ou facho; diz-se até sua primeira chama, porque
entende-se o primeiro estado depois das núpcias, quando este amor está no
ardor. Em que se torna este amor, no casamento mesmo, depois desta chama,
isso foi descrito nos Capítulos que precedem; mas, nesta parte do T ratado, a
ordem deste amor foi exposta desde a primeira barreira de seu curso até este
primeiro termo. Q ue toda ordem avança dos primeiros para os últimos, e que
os últimos se tornam os primeiros da ordem que segue; assim também, que
todas as cousas de uma ordem média sejam os últimos da ordem anterior e os
primeiros da ordem posterior,e que assim os fins avançam continuamente pelas
causas para os efeitos, é o que pode ser suficientemente confirmado e ilustrado
diante da razão pelas coisas conhecidas e visíveis no M undo; mas como aqui se
trata unicamente da ordem em que o amor avança de sua primeira entrada para
seu tremo, estas confirmações e estas ilustrações são deixadas em silêncio, e
sobre este ponto se diz somente que tal é a ordem deste amor desde seu
primeiro calor até sua primeira chama, tal ele é mais freqüentemente, e se
encontra em sua progressão em seguida; pois nesta progressão ele se desenvolve
tal como foi nele o primeiro calor; se foi casto, seu casto é corroborado nas
progressões; mas se foi incasto, seu incasto aumenta avançando até que este
amor seja privado de todo o casto em que desde o tempo dos esponsais, estava
por fora,mas não por dentro.
312 - X V I. O amor conjugal precipitado sem ordem e sem os meios da ordem
queima a medula e é consumido.
É o que alguns dizem no Céu; e pela medula entendem os interiores da mente
234

e do corpo; se estes interiores são queimados, isto é, consumidos por um amor


conjugal precipitado, é porque este amor começa então pela chama, que corróe
e corrompe estes santuários nos quais, como em seus princípios, o amor
conjugal deve residir,e pelos quais deve começar; é o que acontece se o homem
e a mulher precipitam sem ordem o casamento, não voltando suas vistas para o
Senhor, não consultando a razão, rejeitando os esponsais, e não obedecendo
senão à carne; se este amor começa pelo ardor da carne, torna-se externo e não
interno, assim não conjugal; e pode ser chamado casca sem amêndoa ou carnal,
magro e seco, porque é privado de sua essência real. Sobre este assunto, ver
maiores detalhes acima,n.305.
313 - X V II. O s estados das mentes de um e de outro, procedendo na ordem
sucessiva, influem no estado do casamento; entretanto, de um modo nos
espirituais,e de outro modo nos naturais.
Q ue o último estado seja tal qual é a ordem sucessiva pela qual é formado e
existe, é uma regra que deve ser reconhecida como uma verdade no mundo
sábio; pois assim descobrese o que é o influxo, o que ele faz; pelo influxo é
entendido tudo o que precede, e compõe o seguinte, e pelos seguintes, em
ordem, o último; por exemplo, tudo o que precede no homem, e compõe o
seguinte, e pelos seguintes, em ordem, o último; por exemplo, tudo o que
precede no homem, e compõe sua sabedoria; ou tudo o que precede no
político,e compõe sua prudência; ou tudo o que precede no teólogo, e compõe
sua erudição; semelhantemente tudo o que procede da infância, e compõe um
homem; assim também, tudo o que procede em ordem da semente e do
rebento, e faz a árvore; semelhantemente tudo o que precede e procede no
noivo e na noiva, e faz seu casamento; assim é entendido o influxo. Q ue todas
as cousas que precedem nas mentes formam séries,e que as séries se ligam, uma
à outra, e uma após a outra, e compõem juntas o último, é o que é ainda mais
desconhecido no M undo; mas como é uma verdade no Céu, é referido aqui;
pois por ela descobre-se o que o influxo faz, e o que é o último, no qual as
séries acima mencionadas, sucessivamente formadas, coexistem. Por estas
explicações, pode-se ver que os estados da mente de um e de outro procedendo
em ordem sucessiva influem no estado do casamento; mas os esposos depois do
casamento, estão absolutamente na ignorância sobre os sucessivos que,
insinuados em suas mentes (animi) pelos antecedentes, aí residem; sempre
acontece entretanto, que são eles que dão a forma ao amor, conjugam e
constituem o estado de suas mentes, estado segundo o qual agem um em
relação ao outro. Q ue nos Espirituais seja segundo uma outra ordem, formado
um outro estado diferente dos N aturais, é porque os Espirituais procedem em
uma ordem justa e os N aturais procedem em uma ordem não justa; pois os
Espirituais dirigem suas vistas para o Senhor, e o Senhor provê à ordem e a
dirige; enquanto que os N aturais dirigem suas vistas para si mesmos, e por
conseguinte procedem em uma ordem invertida; por isso o estado do
235

casamento destes está internamente cheio de cousas incastas; e quanto mais há


cousas incastas, tanto mais há frieza, tanto mais há abstenções da vida íntima,
pelas quais a veia é fechada e a fonte esgotada.
314 - X V III. H á uma ordem sucessiva e uma ordem simultânea, e esta vem
daquela e é segundo ela.
Isto é referido como razão confirmativa do que precede.Q ue haja um sucessivo
e que haja um simultâneo, isso é sabido, mas que a ordem simultânea venha da
sucessiva e seja segundo a sucessiva, ignora-se; ora, é muito difícil apresentar à
percepção como os sucessivos se introduzem nos simultâneos, e que ordem eles
aí formam, porque entre os eruditos não há até ao presente idéia alguma que
sirva a lançar luz sobre este ponto; e como a primeira idéia concernente a este
arcano não pode ser sugerida em poucas palavras,e como apresentá-la aqui com
desenvolvimento, seria desviar as mentes de uma vista mais clara concernente
ao amor conjugal, bastará para ilustrar este ponto, apresentar sobre estas duas
ordens, e sucessiva e a simultânea, e sobre o influxo daquela nesta, o que foi
relatado abreviadamente na Doutrina da N ova Jerusalém sobre a Escritura
Santa,onde se lê o seguinte:"Existe no Céu e no M undo uma O rdem sucessiva
e uma O rdem simultânea; na O rdem sucessiva uma cousa segue depois da
outra,desde os supremos até aos ínfimos; mas na O rdem simultânea uma cousa
está perto da outra, desde os íntimos até aos extimos (externos). A O rdem
sucessiva é como uma Coluna com degraus desde os mais altos até aos mais
baixos; mas a ordem simultânea é como uma obra coerente desde o centro até à
superfície.A O rdem sucessiva se torna simutânea no último, desta maneira: O s
supremos da O rdem sucessiva se tornam os íntimos da O rdem simultânea, e os
ínfimos da O rdem sucessiva se tornam os externos da O rdem simultânea; é por
comparação, como uma coluna de degraus que, achatando-se, se torna um
corpo coerente em um plano. Assim o simultâneo é formado do sucessivo; e
isto, em todas e cada uma das cousas do M undo espiritual, e também em todas
e em cada uma das cousas no M undo natural", ver os ns. 38 e 65, desta
Doutrina, e várias outras cousas sobre este assunto na Sabedoria Angélica sobre
o Divino Amor e a Divina Sabedoria, nºs 205 a 229. Dá-se o mesmo com a
ordem sucessiva, conduzindo ao casamento, e com a ordem simultânea no
casamento, a saber, esta vem daquela, e é segundo ela. Aquele que conhece o
influxo da ordem sucessiva na ordem simultânea, pode compreender porque os
Anjos podem ver na mão do homem todos os pensamentos e as intenções de
sua mente, e porque as esposas sentem as afeições de seus maridos quando as
mãos dêstes estão sobre seu peito, cousa de que se faz menção algumas vezes
nos M emoráveis; a razão disto, é que as M ãos são os últimos do homem, nos
quais as cousas de que se tratou e concluiu em sua mente terminam, e aí
constituem o simultâneo; é por isso também que na Palavra se diz: "Isto foi
escrito nas mãos".
315 - Ao que precede ajuntarei três M emoráveis.
236

Primeiro M emorável: U m dia, não longe de mim, vi um M eteoro, vi uma


N uvem dividida em pequenas nuvens, algumas das quais eram azúis, e outras
opacas; e eu as vi como se chocando umas contra as outras; através destas
nuvens brilhantes, dispostas em estrias, raios que pareciam, ora pontudos como
espadas, ora rombudos como espadas quebradas; estas estrias ora se lançavam
para a frente, ora se dobravam sobre si mesmas, absolutamente como atletas,
assim estas nuvenzinhas de diversas cores pareciam combater umas contra as
outras; mas era um jogo. E como este M eteoro se apresentava não longe de
mim, levantei os olhos, e olhei atentamente, e vi crianças, jovens e velhos
entrarem em uma casa que era construída em mármore, e cujas fundações eram
de pórfiro; este fenômeno era acima desta casa; e então me dirigi a um dos que
entravam, e lhe perguntei o que havia lá; e ele me respondeu : "H á um
G inásio onde os jovens são iniciados em diversas cousas que concernem à
sabedoria". T endo ouvido esta resposta, entrei com eles; eu estava em espírito,
isto é, em um estado semelhante ao estado em que estavam os homens do
M undo espiritual, que são chamados Espíritos e Anjos; e eis que nesse G inásio
vi sobre a frente um púlpito; no meio bancos; sobre os lados, em torno,
cadeiras; e acima da entrada, uma O rquestra; o Púlpito era para os jovens que
deviam desta vez responder sobre um Problema que ia ser proposto; os bancos
eram para os auditores; as cadeiras dos lados, para os que precedentemente
tinham respondido com sabedoria, e a O rquestra para os Anciãos que deviam
ser árbitros e juízes; no meio da O rquestra havia uma T ribuna, onde estava
sentado um Sábio, que chamavam o G randeM estre, que propunha os
problemas sobre os quais,do Púlpito,deviam responder os jovens; e depois que
todos se tinham reunidos, o H omem da tribuna se levantou e disse:
''R espondei agora, peço-vos, sobre este Problema, e resolvei-o se puderdes: O
que é a Alma, e qual é a sua qualidade?" A esta proposição todos ficaram muito
admirados, e houve cochichos, e alguns da Assembléia, entre os que estavam
nos bancos, exclamaram: "Q uem dentre os homens, desde o século de Saturno
até ao nosso, pode por um pensamento da razão ver e conceber o que a Alma é
e, o que é mais, qual é a sua qualidade? Isto não está acima da esfera do
entendimento de todos?" M as a esta exclamação, responderam da O rquestra:
"Isto está, não acima do Entendimento, mas no Entendimento e diante dêle,
respondei, somente''. E os jovens escolhidos naquele dia, para subir ao Púlpito
e responder sobre o Problema, se levantaram; eram cinco, que tinham sido
examinados pelos Anciãos e achados providos de sagacidade, e estavam então
sentados sobre leitos aos lados do Púlpito, em seguida subiram ao púlpito na
ordem em que estavam sentados; e cada um deles,quando subia se revestia com
uma túnica de seda cor de opala, sobre a qual punha uma veste de fina lã
bordada de flores, e sobre a cabeça um boné em cuja copa havia uma rosácea
cercada de pequenas safiras. E vi subir assim vestido o Primeiro, que disse:
"Desde o dia da Criação, a ninguém foi revelado o que é a alma, nem qual é a
sua qualidade, isto é um arcano (que está) só nos tesouros de Deus; todavia, o
237

que foi descoberto, é que a Alma reside no homem como uma R ainha, mas
onde está a corte desta R ainha? Eruditos deram sobre este assunto suas
inspirações; alguns conjeturaram que está em um pequeno tubérculo, entre o
Cérebro e o Cerebelo,que se chama G lândula pineal; figuraram a sede da Alma
nesta glândula, pela razão de que todo homem é governado por estes dois
Cérebros, e é este tubérculo que os dispõe; o que dispõe à sua vontade os
cérebros, dispõe, portanto, de todo o homem, também da cabeça aos pés". E
acrescentou: "Isto por conseqüência pareceu verdadeiro ou verossímil a muitos
no M undo, mas foi, um século depois, rejeitado como ficção". Depois que
assim falou, tirou a veste, a túnica e o boné com que se revestiu o Segundo dos
jovens escolhidos, e este entrou no Púlpito; seu sentimento sobre a Alma foi
que "em todo o Céu e em todo o M undo se ignora o que é a Alma, e qual é a
sua qualidade; sabe-se que a Alma existe, e que ela está no homem; mas onde?
Procura-se adivinhar; o que há de certo, é que ela está na cabeça, pois que aí o
Entendimento pensa, e a V ontade tem a intenção, e sobre a frente, na face da
Cabeça, há os órgãos dos cinco Sentidos do homem; nada dá a vida a uns e aos
outros, senão a Alma que reside interiormente na Cabeça; mas onde tem ela a
sua Corte? N ão ousarei dizê-lo; entretanto tenho me inclinado ora para os que
lhe assinalam a sede nos três V entrículos do Cérebro,ora para os que a colocam
nos Corpos estriados; ora para os que a colocam na Substância medular de um
e de outro Cérebro; ora para os que a colocam na Substância cortical; ora para
os que a colocam na Dura-M ater; pois os sufrágios resultantes de confirmações
para cada uma destas sedes, não têm faltado. Para os três V entrículos do
Cérebro, os sufrágios provinham de que estes ventrículos são os receptáculos
dos espíritos animais e de todas as linfas do, Cérebro; para os Corpos estriados,
os sufrágios provinham de que estes corpos fazem a M edula pela qual saem os
nervos, e a M edula pela qual um e outro Cérebro se prolonga na Espinha, e de
uma e de outra emanam as fibras de que todo o Corpo foi tecido; para a
Substância medular de um e outro Cérebro, os sufrágios provinham de que ela
é a reunião e o conjunto de todas as fibras, que são os começos de todo
homem; para a Substância cortical, os sufrágios provinham de que lá estão os
fins primeiros e últimos,e por conseguinte os princípios de todas as fibras e por
conseqüência dos sentidos e dos movimentos; para a Dura-M ater, os sufrágios
provinham de que ela é o tegumento comum de um e outro Cérebro, e que
dai, por uma certa continuidade, ela se estende sobre o coração e sobre as
vísceras do corpo. Q uanto a mim, não me decidido mais por uma do que por
outra destas sedes; peço-vos que examineis e escolhais a que é preferível".
Depois que assim falou, desceu do Púlpito, e deu a túnica, a veste e o boné ao
T erceiro, que, subindo ao Púlpito se exprimiu nestes térmos: "Q ue posso eu,
um rapaz, em presença de um teorema tão sublime? Apelo para os eruditos que
estão sentados aqui dos lados; apelo para vós, Sábios, que estais na O rquestra; e
apelo mesmo para os Anjos do Céu supremo; há alguém que, pela sua luz
racional, possa formar uma idéia da Alma? Q uanto à sede da Alma no homem,
238

posso, como outros, fazer conjeturas; e conjeturo que é no Coração, e por


conseguinte no Sangue; e a minha conjetura é baseada sobre o fato de que o
coração por seu sangue governa o Corpo e a Cabeça; pois envia a todo o Corpo
uma grande artéria chamada Aorta, e a toda a Cabeça artérias chamadas
Carótidas; daí ser geralmente admitido que a Alma pelo Coração sustenta,
nutre, vivifica pelo sangue todo o íntimo orgânico do Corpo e da Cabeça; em
apoio a esta asserção acrescentaí que na Escritura Santa se diz muitas vezes da
Alma e do Corpo,por exemplo,que é preciso amar a Deus de toda a Alma e de
todo Coração; e que Deus criou no homem uma Alma nova e um coração
novo, (Deut. V I, 5; X , 12; X I, 13; X X V I, 16; Jeremias X X X II, 41; M ateus
X X II, 37; M arcos X II, 30; Lucas X , 27) e algures; e se diz abertamente que o
Sangue é a Alma da carne, (Levítico X V II, 11, 14)". Alguns depois de terem
ouvido estas citações, elevaram a voz, dizendo: "Bem! Bem!" Eram os
sacerdotes. Em seguida o Q uarto, tendo tomado as vestimentas deste, e tendo
entrado no Púlpito, disse: "T ambém suspeito que não haja pessoa alguma de
um gênio tão sutil e tão penetrante, que possa descobrir o que é a Alma, e qual
é a sua qualidade; por isso penso que para aquele que o quer perscrutar, a
sutileza de nada vale; mas entretanto desde minha infância permaneci na fé da
opinião em que estavam os Antigos, de que a Alma do homem está em todas e
em cada uma das partes do homem, e assim tanto na Cabeça e em cada uma de
suas partes, como no Corpo e em cada uma de suas partes, e que é uma
invenção frívola da parte dos M odernos assinalar à Alma uma sede em algum
lugar e não por toda parte; além disso,a Alma é uma substância espiritual a que
se aplica não a extensão, nem o lugar, mas a habitação e a impleção (*); e
mesmo quem é que não compreende a vida, quando se menciona a Alma? A
vida não está no todo e em cada parte?" Este sentimento foi aprovado por um
grande número no Auditório. Depois deste se levantou o Q uinto, e decorado
com as mesmas insígnias pronunciou do Púlpito estas palavras: "N ão me
detenho em dizer onde está a Alma, se está em alguma parte ou se está de todo
lado no todo; mas pelo que encontro em mim descobrirei um sentimento sobre
esta proposição: O que é a Alma, e qual é a sua qualidade? Q uando alguém
pensa na Alma, não pensa senão como alguma coisa de puro, que pode ser
assemelhado ao éter, ou ao ar ou ao vento, na qual há o vital segundo a
racionalidade que o homem possui a mais do que as bestas; fundei esta opinião
sobre o que se diz do homem, quando expira, que ele entrega o sopro ou que
entrega a Alma ou o espírito; daí também crer-se que a Alma que vive depois
da morte é um tal sopro em que há uma vida cogitativa que se chama Alma;
que outra cousa pode ser a Alma? M as como ouvi dizer da O rquestra que o
problema concernente à Alma, o que ela é, e qual é a sua qualidade, não está
acima do entendimento, mas que está no entendimento e diante dele, peço-vos
e suplico-vos que desvendem este eterno Arcano". E os Antigos na O rquestra
dirigiram os olhares para o G rande M estre que tinha proposto este problema, e
que compreendeu por seus sinais que desejavam que ele descesse e instruísse a
239

Assembléia; e imediatamente ele desceu da T ribuna, atravessou o Auditório e


subiu ao Púlpito; e lá, estendendo a mão, disse: "Escutai, peço-vos; quem não
crê que a Alma é a íntima e sutilíssima Essência do homem? M as uma Essência
sem Forma, que mais é senão um ser de razão? A Alma é portanto uma Forma;
mas que forma? É o que vou dizer.É a forma de todas as cousas que pertencem
ao amor e de todas as que pertencem à sabedoria; todas as que pertencem ao
amor são chamadas afeições, e todas as que pertencem à sabedoria são
chamadas percepções; as percepções provêm das afeições e assim fazem com elas
uma forma na qual cousas inúmeras estão em uma tal ordem, uma tal série, e
uma tal coerência, que podem ser chamadas um; e podem ser chamadas um,
porque para que assim sejam, nada pode ser tirado, e nada pode ser
acrescentado; o que é a Alma humana, senão uma tal forma? T odas as cousas
que pertencem ao Amor e todas as que pertencem à Sabedoria não são os
essenciais desta forma? E estes essenciais no homem estão na Alma, e pela Alma
na cabeça e no corpo; vás sois chamados Espíritos e Anjos, e crêstes no M undo
que os Espíritos e os Anjos eram como ventos ou éteres, e assim mentes
(mentes e animi), e agora vêdes claramente que sois verdadeiramente,
realmente, e na realidade homens, que no M undo vivestes e pensastes em um
corpo material, e que soube que não era o Corpo material que vive e pensa,
mas que é uma Substância espiritual nesse corpo, e chamou Alma esta
Substância de que não conhecíeis a forma, e entretanto vós a tendes visto agora
e a vêdes; todos vós sois Almas, sobre cuja imortalidade ouvistes, pensastes,
dissestes e escrevestes tantas coisas; e como sois formas do amor e da sabedoria
procedente de Deus, não podeis morrer durante a eternidade; a Alma é
portanto a forma humana da qual nada se pode tirar, e à qual nada pode ser
acrescentado, e ela é a forma íntima' de todas as formas do corpo inteiro; e
como as formas que estão por fora recebem da forma íntima a essência e a
forma, é por isso que vós, assim como apareceis diante de vós mesmos e diante
de nós, vós sois Almas; em uma palavra, a Alma é o homem mesmo, por que é
o homem íntimo; é por isso que a sua forma é plenamente e perfeitamente a
forma humana; entretanto ela não é a vida, mas é o mais próximo receptáculo
da vida procedente de Deus, e assim o habitáculo de Deus". Esta explicação foi
aplaudida pela maioria; mas alguns diziam: "N ós examinaremos". Eu então fui
para a minha casa; e eis sobre este G inásio, em lugar do primeiro M eteoro,
apareceu uma N uvem branca sem estrias ou sem raios combatendo entre si;
esta N uvem,atravessando o teto entrou e iluminou as paredes; e soube que eles
viam Escrituras,e entre outras também esta: l'Jehovah Deus soprou nas narinas
do homem uma Alma de V ida, e foi feito H omem e Alma vivente", (G ênesis
11,7).
(*) Impleção é um neologismo que significa o enchimento ou a
complementação.(N ota do T radutor.)
316 - Segundo M emorável. U m dia em que eu passeava gozando de um
240

repouso da mente (animus) e de uma doce paz da mente (mens), vi de longe


um Bosque no meio do qual havia um Pórtico que conduzia a um pequeno
Palácio; e vi virgens e mancebos, maridos e esposas que entravam;
aproximei-me também em espírito, e perguntei a uma espécie de guardião que
permanecia na entrada, se também me era permitido entrar. Ele me encarou; e
eu lhe disse: "Por que me olhas?" Ele respondeu: "Eu te olho para ver se o
prazer da paz, que está em tua face, tira alguma cousa do prazer do amor
conjugal; depois deste Pórtico há um pequeno Jardim, e no meio dêle uma
Casa, onde estão dois novos Esposos, que os seus amigos dos dois sexos vêm
visitar hoje, para lhes apresentar felicitações; os que eu deixo entrar, não os
conheço, mas me foi dito que eu os conheceria por suas faces, e que, se visse
nelas o prazer do Amor conjugal, eu os admitiria, e não os outros". T odos os
Anjos podem, pelas faces, ver os prazeres do coração dos outros; e o prazer
deste amor, que ele viu em minha face, era que eu meditava sobre o Amor
conjugal; esta meditação brilhava em meus olhos, e em conseqüência entrou
nos íntimos de minha face; por isso ele me disse que me era permitido entrar.
O Pórtico pelo qual entrei era composto de árvores frutíferas ligadas
mútuamente entre si pelos galhos que formavam de cada lado uma espaldeira
contínua; pelo Pórtico entrei no pequeno Jardim, cujos arbustos e flores
espalhavam um aroma agradável; os arbustos e as flores eram aos pares; soube
que tais jardins aparecem em volta das casas onde há e onde houve núpcias, e
que por isso são chamados Jardins nupciais. Em seguida entrei na casa, onde vi
os dois esposos que estavam de mãos dadas e que conversavam sobre o Amor
verdadeiramente conjugal; e então por suas faces me foi dado ver a imagem do
amor conjugal, e por sua conversa o vital desse amor. Depois que eu, com
várias outras pessoas, lhes apresentei meus votos e minhas felicitações, saí para
os Jardins nupciais, e vi à direita uma Companhia de mancebos, para a qual
acorriam todos os que saíam da casa; se todos para aí acorriam, era por esta
razão, que lá se conversava sobre o Amor conjugal, e uma tal conversa atrai as
mentes (animi) de todos por uma certa força oculta. O uvi então o Sábio que
falava sobre este ponto, e o que ouvi era em suma o seguinte: Q ue a Divina
Providência do Senhor é muito singular e em conseqüência muito universal a
respeito dos casamentos e nos casamentos nos Céus, porque todas as felicidades
do Céu decorrem dos prazeres do amor conjugal, como as águas doces
decorrem do veio doce de uma fonte; que em conseqüência é provido pelo
Senhor a que nasçam Pares Conjugais, e que eles sejam continuamente
educados ara o casamento sem que a menina e o menino nada saibam; que
depois de um certo tempo, ela se tendo tornado virgem núbil, e ele tendo se
tornado apto para o casamento, eles se encontram em alguma parte como por
acaso, e se vêem mútuamente; que então imediatamente, como por uma
espécie de instinto, conhecem que foram feitos um para o outro, e por uma
sorte de ditame interior pensam em si mesmos, o mancebo "esta é minha" e a
moça "este é meu"; que depois que este pensamento residiu durante algum
241

tempo nas mentes de um e de outro, eles se dirigem a palavra de propósito


deliberado e se prometem um ao outro. Foi dito como por acaso, e como por
instinto, e é entendido pela Divina Providência, porque a Divina Providência
aparece assim quando não é conhecida. Q ue nascem Pares conjugais, e que eles
sejam criados para o casamento, sem que um e outro o saiba, este Sábio o
confirmou pela semelhança conjugal visível nas faces de um e de outro; além
disso também pela união intima e eterna das mentes (animi) e dos mentais
(mentes), que não podem existir como acontece no Céu, sem que o Senhor o
tenha previsto e provido. Depois que o Sábio disse estas cousas, e que a
Companhia o aplaudiu, ele acrescentou, que nos muitosingulares no homem,
tanto macho como fêmea, há o Conjugal, mas que entretanto um é o Conjugal
no macho, e outro na fêmea; além disso, no Conjugal masculino há o
conjuntivo com o Conjugal feminino, e vice-versa, mesmo nos
muito-singulares; confirmou isso pelo casamento da vontade e do
entendimento em cada um, estas duas faculdades agindo juntas nos muito
singulares da mente e nos muito singulares do corpo, por onde se pode ver que
em cada substância, mesmo na menor, há o Conjugal; e isso se manifesta pelas
substâncias compostas que foram formadas de substâncias simples; por
exemplo,há dois olhos, duas orelhas, duas narinas, duas bochechas, dois lábios,
dois braços e duas mãos, dois lombos, dois pés, e no interior do homem dois
hemisférios do cérebro, dois ventrículos do coração, dois lóbulos do pulmão,
dois rins, dois testículos, e por toda parte onde não há dois, sempre há uma
divisão em dois; se são dois é porque um pertence à vontade e o outro ao
entendimento, que agem admiràvelmente neles para não apresentar senão um
só; por isso os dois olhos fazem uma única vista, as duas orelhas um só ouvido,
as duas narinas um só olfato, os dois lábios uma só linguagem, as duas mãos
um só trabalho,os dois pés uma só marcha,os dois hemisférios do cérebro uma
só habitação da mente, as duas câmaras do coração uma única vida do corpo
por meio do sangue, os dois lóbulos do pulmão uma só respiração, e assim por
diante; mas o masculino e o feminino, unidos por um amor verdadeiramente
conjugal, fazem uma só vida plenamente humana. Enquanto ele dizia essas
cousas, apareceu à direita um relâmpago que era vermelho, e à esquerda um
relâmpago que era de um branco brilhante; um e outro eram doces, e entravam
pelos olhos nas mentes, e as iluminavam também; e depois destes relâmpagos
houve também trovão, era um leve murmúrio que decorria do Céu angélico e
ia aumentando. Depois de ter visto e ouvido estes relâmpagos e este trovão, o
Sábio disse: "Isso é para mim um sinal e uma advertência para acrescentar ao
que acabo de dizer, estas explicações: A direita destes pares significa seu bem, e
a esquerda significa seu vero; isto vem do casamento do bem e do vero, que foi
inscrito no homem em seu comum e em cada um de seus singulares,e o bem se
refere à vontade e o vero ao entendimento, e os dois juntos a um; daí vem que
no Céu o olho direito é o bem da vista e o olho esquerdo é o seu vero; que a
orelha direita é o bem do ouvido,e a esquerda é o seu vero, que a mão direita é
242

o bem da força do homem, e a mão esquerda é o seu vero; e semelhantemente


para os outros pares; e como a Direita e a Esquerda têm estas significações, o
Senhor disse: "Se o teu olho direito te escandalizar, arranca-o"; e "se a tua mão
direita de escandalizar,corta-a",(M at.V ,29-30); por isto Ele entendia que se o
bem se torna mal, deve ser rejeitado; Ele disse também aos Discípulos para
lançar a rede do lado direito do barco, e quando a lançaram apanharam uma
grande quantidade de peixes, (João X X I, 6, 7); por isto Ele entendia que eles
deviam ensinar o bem da caridade,e que assim colheriam os homens". Q uando
ele disse estas cousas, os dois relâmpagos apareceram de novo, mas mais suaves
que a primeira vez, e parecia então que o relâmpago da esquerda tirava seu
branco brilhante do fogo rutilante do relâmpago da direita; vendo isto ele disse:
"Isto é um sinal do Céu para canfirmar meu discurso, pois o ígneo no Céu é o
bem, e o branco brilhante é o vero; e como paxeceu que o relâmpago da
esquerda tirava seu branco brilhante do fogo rutilante do relâmpago da direita,
é um sinal demonstrativo de que o branco brilhante da luz, ou a luz, não é
outra cousa senão o esplendor do fogo". Depois de ter ouvido estas palavras,
todos voltaram para suas, casas, abrazados pelo bem e o vero de uma alegria
produzida por estes relâmpagos e pela explicação que lhes tinha sido dada.
243

Dos casamentos reiterados

317 - É possível que se pergunte, se o amor conjugal, que é o de um único


marido com uma única esposa, pode, depois da morte de um dos esposos, ser
separado, ou transferido,. ou revestido; mais ainda, se os casamentos reiterados
têm alguma cousa de comum com a Poligamia, e por conseqüência se podem
ser chamados de sucessivas poligamias, sem falar de várias outras cousas que
costumam ajuntar escrúpulos sobre escrúpulos nos homens de um espírito
raciocinador; portanto a fim de que, os mestres em pesquisas curiosas, que
raciocinam na sombra sobre estes casamentos, vejam alguma luz, pensei que
seria apropriado apresentar sobre este assunto, a seu julgamento, os Artigos que
seguem: I. Depois da morte de um dos esposos, contrair um novo casamento
depende do precedente amor conjugal. II. Isso depende também do estado do
casamento em que os esposos viveram. III. Para aqueles em que não houver
amor verdadeiramente conjugal, não há nem obstáculo nem prejuízo em
contrair casamento de novo. IV . O s que viveram entre si no amor
verdadeiramente conjugal não querem casamento reiterado, a não ser por
motivos separados do amor conjugal. V . U m é o estado do casamento de um
mancebo com uma virgem, e outro o do casamento de um mancebo com uma
viúva. V I. U m também é o estado do casamento de um viúvo com uma
virgem, e outro o do casamento de um viúvo com uma viúva. V II. As
variedades e as diversidades destes casamentos, quanto ao amor e a seus
atributos, são inumeráveis. V III. O estado de viúva é mais lastimável que o de
viúvo.Seguem agora as explicações dos Artigos.
318 - I. Depois da morte de um dos esposos, contrair novo casamento,
depende do precedente amor conjugal.
O amor verdadeiramente conjugal é como uma balança na qual são pesadas as
inclinações a casamentos reiterados; quanto mais o amor conjugal precedente se
aproxima do amor verdadeiramente conjugal,tanto mais se afasta a inclinação a
casamentos reiterados; mas quanto mais o amor precedente se afasta deste
amor, tanto mais a inclinação a um outro casamento costuma aproximar-se; a
razão é evidente, é que o amor conjugal está em semelhante grau à conjunção
das mentes, a qual permanece na vida do corpo de um após o falecimento do
outro, e esta conjunção mantém a inclinação como uma balança em equilíbrio,
e faz um contrapêso, conforme a apropriação do verdadeiro amor; mas como
hoje raramente se aproximam deste amor, senão alguns passos, por isso a escala
do contrapêso de inclinação se eleva ordinariamente ao estado de equilíbrio, e
aí vacila e tende para o outro lado, isto é, para o casamento. O contrário
acontece naqueles cujo amor precedente no primeiro casamento afastou-se do
244

amor verdadeiramente conjugal; e isto, porque o afastamento deste amor é em


grau semelhante à disjunção das mentes, a qual também permanece na vida do
corpo de um após o falecimento do outro, e esta entra na vontade disjunta da
do outro, e forma a inclinação para uma nova conjunção, para a qual o
pensamento impulsionado pela inclinação da vontade traz a esperança de uma
coabitação mais unida, e por conseguinte mais agradável. Q ue as inclinações
para casamentos reiterados tiram sua origem do estado do amor precedente,
isso é conhecido, e a razão também o vê; com efeito, no amor verdadeiramente
conjugal, há o medo de sua perda, e depois da perda há uma dor, e esta dor e
este medo estão nos íntimos mesmos da mente; daí vem que, quanto mais há
este amor, tanto mais a alma se inclina pela vontade e o pensamento, isto é,
com a intenção de ficar no objeto com o qual e no qual tem estado; segue-se
daí que a mente é mantida em equilíbrio para um segundo casamento
conforme o grau de amor em que esteve no primeiro; vem daí que depois da
morte os mesmos se reúnem, e se amam mútuamente da mesma maneira que
no M undo; mas,como foi dito acima,este amor é raro hoje, e há poucos que o
alcançam com o dedo; e os que não o alcançam, e mais ainda os que se afastam
muito dele, esses, do mesmo modo que desejaram ardentemente a separação na
vida precedentemente passada juntos, vida que foi fria, desse mesmo modo
depois da morte desejam ardentemente uma conjunção, o homem com outra
mulher, e a mulher, com um outro homem; mas no que segue se dirá mais
sobre estes diversos casamentos.
319 - II. Depois da morte de um dos esposos, contrair de novo casamento
depende também do estado do casamento em que os esposos tinham vivido.
Pelo estado do casamento não é entendido aqui o estado do amor, de que se
falou no Artigo precedente, porque este estado de amor faz a inclinação interna
para o casamento ou pelo casamento, mas é entendido o estado do casamento
que faz a inclinação externa para ou pelo casamento, e este estado com estas
inclinações é múltiplo; por exemplo: 1. Se há filhos na casa, e é preciso
provê-los de uma nova mãe. 2. Se se deseja ainda muitos filhos. 3. Se a casa é
considerável, e há criados de um e outro sexo. 4. Se os negócios externos
afastam a mente do cuidado dos afazeres domésticos, e por isso há o temor de
desgraça e de ruína sem uma nova dona de casa. 5. Se o auxílio mútuo e o
dever o exigem; por exemplo, nos diversos negócios e trabalhos. 6. Além disso,
é o caráter do esposo, viúvo ou viúva, que decide se, depois do primeiro
casamento, pode ou não pode viver só ou sem uma nova companhia. 7. O
casamento precedente também, ou dá o mêdo pela vida conjugal, ou lhe é
favorável. 8. Fui informado de que o amor poligâmico, e o amor do sexo, além
disso o desejo libidinoso da defloração, e o desejo libidinoso da variedade,
induzem as mentes (animi) de alguns a desejar com ardor novos casamentos;
como também as mentes (animi) de alguns outros eram induzidas pelo temor
da lei e da perda da reputação se se entregassem à fornicação; além de vários
245

outros motivos,que empurram as inclinações externas para o casamento.


320 - III. Para aquele em quem não houve amor verdadeiramente conjugal,
não há nem obstáculo nem prejuízo em contrair de novo um casamento.
Para aquele em quem não houve amor conjugal não há laço algum espiritual ou
interno, mas há unicamente um laço natural ou externo; e se um laço interno
não contém o laço externo em sua ordem e em seu conteúdo, este não persiste
senão como faixa (echarpe) que, não sendo mantida por um nó, cai por terra
conforme o arremeço ou o vento; isto provém de que o natural tem sua origem
no espiritual, e de que em sua existência não é outra cousa senão uma reunião
maciça de espirituais; se portanto o natural é separado de seu espiritual que o
produz e por assim dizer o engendra,ele não é mais contido interiormente, mas
só o é exteriormente pelo espiritual que o cerca e o liga no comum, sem uni-lo
ou conservá-lo unido no singular; daí vem que o natural separado do espiritual
em dois esposos não faz conjunção alguma das mentes, nem por conseqüência
das vontades, mas faz unicamente uma conjunção de algumas afeições externas,
que são coerentes com os sentidos do corpo.Se para os que são tais não há nem
obstáculo nem prejuízo em contrair de novo um casamento, é porque os
essenciais do casamento não estiveram neles, e por conseguinte não há (desses
essenciais) neles nenhum depois da separação pela morte; é por isso que eles,
estão então em plena liberdade de ligar suas afeições sensuais, o viúvo com uma
mulher qualquer, e a viúva com quem quer que lhe agrade, desde que não haja
impedimento; eles mesmos não pensam a respeito dos casamentos senão de
uma maneira natural, e segundo as vantagens concernentes a diversas
necessidades e utilidades externas, que depois da morte de um deles podem ser
de novo restabelecidos por uma outra pessoa em lugar da precedente; e talvez
mesmo,se seus pensamentos interiores fossem claramente vistos,como o são no
M undo espiritual, não se encontraria neles distinção alguma entre as
conjunções conjugais e as copulações extraconjugais. Se lhes é permitido
contrair casamento de novo e de novo, é, como foi dito acima, porque as
conjunçoes unicamente naturais são dissolvidas por si mesmas e destruídas
depois da morte; pois pela morte as afeições externas seguem o corpo e são
sepultadas com ele, não permanecem senão as que são coerentes com as
internas. M as é preciso que se saiba que os casamentos interiormente
conjuntivos dificilmente podem ser introduzidos nas terras, porque o Senhor
não pode prover aí, como nos Céus, à escolha de semelhanças internas, pois
elas foram limitadas de muitas maneiras; por exemplo, pela igualdade de estado
e de condição, dentro do país, da cidade, e do burgo onde se mora, e aí
ordinariamente são os externos que ligam os futuros esposos, e não, por
conseguinte os internos, os quais não se mostram senão depois de algum tempo
de casamento, e não são conhecidos senão quando se misturam com os
externos.
321 - IV . O s que viveram entre si no amor verdadeiramente conjugal, não
246

querem casamentos reiterados, a não, ser por motivos separados do amor


conjugal.
Se os que viveram no amor verdadeiramente conjugal não querem, depois da
morte de seu cônjuge, contrair de novo casamento, eis as razões disso: 1. É que
estiveram unidos quanto às almas, e por conseguinte quanto às mentes, e esta
união,sendo espiritual,é uma adjunção atual da alma e da mente de um à alma
e à mente do outro, adjunção que não pode de modo algum ser dissolvida; que
tal seja a conjunção espiritual, isso já foi mostrado várias vezes. 2. É que
estiveram unidos quanto ao corpo pela recepção das propagações da alma do
marido por parte da esposa, e assim pela inserção de sua vida na dela, o que faz
com que a moça se torne esposa; e reciprocamente pela recepção do amor
conjugal da esposa por parte do marido, recepção que dispõe os interiores de
sua mente, e ao mesmo tempo os interiores e os exteriores de seu corpo, no
estado receptivo do amor e perceptivo da sabedoria, o que faz com que o
mancebo se torne marido, ver acima nº198. 3. É que a esfera do amor
procedente da esposa, e a esfera do entendimento procedente do marido,
efluem sem cessar, e aperfeiçoam as conjunções, e que essas esferas com suas
doces exalações estão em torno deles e os unem, ver também acima nº. 223. 4.
É que os esposos assim unidos no casamento pensam e aspiram a eternidade, e
que sobre esta idéia é fundada a sua felicidade eterna, ver nº. 216. 5. R esulta
destas diversas considerações que eles não são dois, mas são um só homem, isto
é, uma só carne. 6. U m tal um não pode ser dividido pela morte de um deles;
isto é bem manifesto diante da vista ocular do espírito. 7. A estas razões será
acrescentada esta nova informação; é que estes dois, depois da morte de um,
não podem entretanto ser separados, pois que o espírito do defunto ou da
defunta coabita sem cessar com o espírito daquele que sobreviveu, e isso até à
morte do sobrevivente, quando de novo se juntam e se reúnem, e se amam
mais ternamente do que antes, porque estão no M undo espiritual. Daí decorre
esta conseqüência irrefragável, que os que viveram no amor verdadeiramente
conjugal não querem casamento reiterado. O ra, se mais tarde contraem alguma
cousa de semelhante ao casamento, é por motivos separados do amor conjugal,
e estas razões são todas externas; por exemplo, se há filhos na casa e é preciso
prover a seu cuidado; se a casa é considerável, e há criados dos dois sexos; se as
ocupações do exterior afastam a mente das ocupações domésticas; se auxílios e
deveres mútuos são necessários e outras coisas semelhantes.
322 - V . U m é o estado do casamento de um mancebo com uma virgem, e
outro o do casamento de um mancebo com uma viúva.
Pelos estados do casamento entende-se os estados da vida de um e de outro, do
marido e da esposa, depois das núpcias, assim no casamento, tal qual é então a
coabitação, quer haja coabitação interna das almas e das mentes, o que na idéia
principal é a coabitação, quer não haja senão a coabitação externa das mentes
(animi), dos sentidos e dos corpos. O estado do casamento de um mancebo
247

com uma virgem é o estado inicial mesmo para o casamento real,pois entre eles
o amor conjugal pode proceder em sua ordem justa, desde o primeiro calor até
à primeira chama, e em seguida desde a primeira semente no mancebomarido,
e à primeira flor na virgem-esposa, e assim germinar, crescer e frutificar e se
introduzir mútuamente neles; se fosse de outro modo, o mancebo não seria
mancebo, e a virgem não seria virgem, senão na forma externa. M as entre um
mancebo e uma viúva, não há uma semelhante iniciação no casamento a partir
das primícias, nem uma semelhante progressão no casamento, pois que a viúva
dispõe mais de sua liberdade e de seu direito do que a virgem; é por isso que o
mancebo dirige suas carícias à esposa-viúva de um outro modo que à
esposa-virgem. M as nisto há muita variedade e diversidade, por isso não é
referido senão,este ponto comum.
323 - V I.U m também é o estado do casamento de um viúvo com uma virgem,
e outro o do casamento de um viúvo com uma viúva.
Com efeito, o viúvo já foi iniciado na vida conjugal, e a virgem deve ser
iniciada nela e entretanto o amor conjugal percebe e sente seu encanto e seu
prazer em uma mútua iniciação; em tudo que sobrevém o mancebo-marido e a
virgem-esposa percebem e sentem cousas sempre novas, pelas quais estão em
uma espécie de iniciação contínua, e por conseguinte em uma agradável
progressão; acontece diferentemente no estado do casamento de um viúvo com
uma virgem; há na virgem-esposa uma inclinação interna, mas no marido ela
passou; todavia há nisto muita variedade e diversidade; semelhantemente no
casamento entre um viúvo e uma viúva; é por isso que, além desta noção
comum nada mais será acrescentado em particular.
324 - V II. As variedades e as diversidades destes casamentos, quanto ao amor e
a seus atributos,são inumeráveis.
H á de todas as cousas uma variedade infinita, e há também uma diversidade
infinita; por V ariedades, aqui, entende-se as variedades entre as coisas que são
de um mesmo gênero ou de uma mesma espécie; além disso também entre os
gêneros,e entre as espécies; e por Diversidades, aqui, entende-se as diversidades
entre as coisas que estão no oposto; a nossa idéia sobre a distinção das
variedades e das diversidades pode ser ilustrada por isto: O Céu angélico, que é
coerente como um, está em uma variedade infinita, não há um só Anjo
absolutamente semelhante a um outro, nem quanto às almas e às mentes, nem
quanto às afeições, às percepções e por conseguinte aos pensamentos, nem
quanto às inclinações e por conseguinte às intenções, nem quanto ao som da
voz, à face, ao corpo, aos gestos, ao andar e a várias outras cousas; e entretanto,
ainda que haja miríades de miríades de Anjos, eles foram e são postos em
ordem pelo Senhor em uma única forma, em que há plenamente unanimidade
e concórdia, o que não seria possível se todos estes Anjos tão diferentes,
universal e singularmente, não fossem conduzidos por um Só. São estas as
cousas que entendemos aqui por V ariedades. M as por diversidades entendemos
248

os opostos destas variedades, os quais estão no inferno; pois lá todos e cada um,
são diametralmente opostos aos que estão no Céu; e o Inferno, que deles se
compõe, é contido como um pelas variedades entre eles absolutamente
contrárias às variedades do Céu, assim por diversidades perpétuas. Por estas
explicações, vê-se o que é percebido por variedade infinita, e o que é percebido
por diversidade infinita. Dá-se o mesmo com os Casamentos, a saber, que há
variedades infinitas naqueles que estão no Amor conjugal e variedades infinitas
entre os que estão no Amor escortatório; e assim há variedades infinitas
naqueles que estão no Amor conjugal e variedades infinitas entre os que estão
no Amor escortatório; e assim há diversidades infinitas entre estes e aqueles.
Destas primícias decorre esta conclusão, que as variedades e as diversidades nos
casamentos de todo gênero e de toda espécie quer de um mancebo e de uma
virgem, quer de um mancebo com uma viúva, quer de um viúvo com uma
virgem, quer de um viúvo com uma viúva, são inumeráveis; quem é que pode
dividir o infinito em números?
325 - V III.O estado de viúva é mais lastimável do que o de viúvo.
H á disso causas externas,e há causas internas; as causas externas estão à vista de
cada um, por exemplo: 1. A V iúva não pode prover para si e para sua casa às
necessidades da vida, nem dispor das cousas adquiridas como o pode o marido,
e como o podia ela antes pelo marido, e com o marido. 2. Ela não pode
também defender nem a si mesma nem à casa como é preciso; pois o marido,
quando ela era esposa, era seu sustentáculo e como que seu braço; e quando ela
mesma era seu próprio sustentáculo, contava contudo com seu marido. 3. Por
si mesma ela é irresoluta nas cousas que pertencem à sabedoria interior, e por
conseguinte à prudência. 4. A V iúva está sem recepção do amor em que está
como mulher, assim está em um estado estranho ao estado inato e introduzido
nela pelo casamento. Estas causas externas, que são naturais, também tiram sua
origem das causas internas que são espirituais, como todas as outras cousas do
mundo e do corpo, assim como foi mostrado acima, nº. 220; estas causas
externas naturais são percebidas pelas causas internas espirituais que procedem
do casamento do bem e do vero, e principalmente por estas: Q ue o bem não
pode prover a cousa alguma,nem dispor de cousa alguma, senão pelo vero; que
o bem não pode também se defender senão pelo vero, que por conseqüência o
vero é o sustentáculo e como que o braço do bem; que o bem sem o vero é
irresoluto, porque não tem a resolução, a sabedoria e a prudência senão pelo
vero.O ra,como o M arido por criação é o vero, e a Esposa por criação é o bem
desse vero, ou, o que é a mesma cousa, como o M arido por criação é o
entendimento, e a Esposa por criação é o amor desse entendimento, é evidente
que as causas externas ou naturais, que tornam mais lastimável a viuvez da
mulher, tem sua origem nas causas internas ou espirituais. Estas causas
espirituais são as que, juntas às causas naturais, são entendida na Palavra pelo
que é dito das viúvas em muitos lugares; ver o Apocalipse R evelado nº 764.
249

326 - Ao que precede ajuntarei dois M emoráveis.


Primeiro M emorável: Depois que o Problema sobre a Alma foi discutido e
resolvido no G inásio, vi sair em ordem os membros da Assembléia, e na frente
deles o G rão-M estre, depois dêle os Anciãos, no meio dos quais estavam os
cinco jovens que tinham respondido, e depois deles os outros; e depois que
saíram, retiraram-se para os lados em torno da casa, onde havia passeios
cercados de arbustos, e, tendo se reunido aí, se dividiram em pequenos grupos,
formando outras tantas companhias de jovens que discorriam juntos sobre
assuntos de sabedoria; em cada grupo havia um dos Sábios da O rquestra.
T endo-os visto do meu alojamento, torneí-me em espírito, e saí em espírito em
direção a eles, e me aproximei do G rão-M estre que tinha proposto o problema
sobre a Alma. Q uando este me viu, disse-me: "Estou muito admirado; desde
que te vi no caminho, te aproximando, ora caías sob a minha vista, e ora me
escapavas, ou ora eu te via, e de repente não te via mais; certamente não estás
no estado de vida dos nossos! A isto respondi sorrindo: "N ão sou nem um
bufão, nem um vertunno, mas estou alternadamente, ora na vossa luz e ora na
vossa sombra, por conseguinte estranho aqui e também indígena". A esta
resposta o G rão-M estre me encarou e me disse: "As tuas palavras são estranhas
e surpreendentes; diz o que és"; e eu disse: "Estou no M undo onde estivestes, e
de onde saistes,que é o M undo N atural, e estou também no M undo para onde
viestes e onde estais, que é chamado M undo Espiritual; daí vem que estou no
estado natural, e ao mesmo tempo no estado espiritual; no estado N atural com
os homens da terra, e no estado espiritual convosco, e quando estou no estado
natural, não sou visível por vós; mas quando estou no estado espiritual, me
torno visível; se sou assim, isso me foi dado pelo Senhor; quanto a ti, H omem
ilustrado,tu sabes que o homem do M undo natural não é o homem do M undo
espiritual, e vice-versa; por isso quando eu mergulhava meu espírito no corpo,
eu não era visível para ti, mas quando eu o retirava do corpo, me tornava
visível; tu ensinaste também no G inásio, que vós sois alma, e que as almas
vêem as almas, porque são formas humanas; sabes que vós não vos vistes, ou
não vistes as vossas almas em vossos corpos,quando estáveis no M undo natural;
e isso existe por causa da diferença que há entre o Espiritual e o N atural". Logo
que ouviu falar da diferença entre o Espiritual e o N atural, ele disse: "N ão é
como o que é mais puro e o que é menos puro? assim, o que é o Espiritual
senão um N atural mais puro?" E respondi: "T al não é a diferença; mas é como
a diferença entre o anterior e o posterior, entre os quais não há razão finita,
pois o anterior está no posterior como a causa no efeito, e o posterior vem do
anterior como o efeito vem da causa; é por isso que um não aparece ao outro".
Então o G rão-M estre disse: "M editei e refleti sobre esta diferença, mas em vão
até ao presente; oh! Como desejaria percebê-la!" Eu disse: "N ão somente
perceberás a diferença entre o Espiritual e o N atural, mas a verás mesmo". E
então lhe falei assim: "T u estás no estado espiritual quando estás entre os teus,
mas no estado natural quando estás comigo, pois com os teus falas a Língua
250

espiritual que é comum a todo espírito e a todo Anjo, mas comigo falas a
minha própria língua; pois todo Espírito e todo Anjo que fala com um homem
fala a língua própria desse homem,assim a língua francesa com um Francês, e a
inglêsa com um Inglês, a grega com um G rego, o árabe com um Arabe, e assim
por diante. Afim, portanto, de que conheças a diferença entre o Espiritual e o
N atural quanto às Línguas,faz assim:V olta para os teus, e lá pronuncia alguma
cousa, e retém as suas palavras e volta com essas palavras na memória, e
pronuncia-as diante de mim", e ele assim fez, e voltou para mim com essas
palavras na boca, e as pronunciou, e não compreendeu nenhuma delas; eram
palavras inteiramente estranhas desconhecidas, que não existem em Língua
alguma no M undo natural; por esta experiência várias vezes repetida, tornou-se
evidente para ele que todos no M undo Espiritual têm uma língua espiritual,
que nada tem de comum com Língua alguma do M undo natural, e que todo
homem depois da morte entra por si mesmo nesta Língua espiritual; ele fez
também ao mesmo tempo a experiência de que o som mesmo da Língua
espiritual difere de tal modo do som da Língua natural, que um som espiritual
mesmo elevado, não era de modo algum ouvido pelo homem natural, nem um
som natural pelo homem espiritual. Em seguida pedi ao G rão-M estre e aos que
o cercavam, que fossem para o meio dos seus, e escrevessem alguma sentença
sobre um papel e a lêssem; eles assim o fizeram, e voltaram com o Papel na
mão, mas quando quiseram lê-lo, não puderam compreender cousa alguma,
porque a Escritura não se compunha senão de algumas letras alfabéticas com
acentos em cima, das quais cada uma significava algum sentido da cousa; pois
que cada letra do alfabeto significa lá algum sentido,vê-se claramente por que o
Senhor é chamado o Alfa e o Ô mega; como estes repetidamente entravam,
escreviam e voltavam,descobriram que esta Escritura envolvia e continha coisas
inúmeras,que nenhuma Escritura natural jamais poderia exprimir; mas lhes foi
dito que isto é assim, porque o homem espiritual pensa coisas incompreensíveis
e inefáveis para o homem natural, e estas cousas não podem influir nem ser
postas em uma outra Escritura, nem em uma outra Língua. Então como os
assistentes não queriam compreender que o pensamento espiritual ultrapassa o
pensamento natural, a ponto de ser relativamente inefável, eu lhes disse: "Fazei
uma experiência; entra! em vossa Sociedade espiritual, e pensai uma coisa
qualquer, e retendê-la, e voltai e a exprimi diante de mim", e eles entraram,
pensaram, a retiveram, voltaram, mas quando quiseram exprimir a cousa
pensada, não puderam; com efeito, não encontraram idéia alguma do
pensamento natural adequada a uma única idéia do pensamento puramente
espiritual, assim palavra alguma para exprimi-la, pois as idéias do pensamento
tornamse as palavras da linguagem; e então reentravam e voltavam e se
confirmavam que as idéias espirituais eram absolutamente sobrenaturais,
inexprimíveis, inefáveis e incompreensíveis para o homem natural; e por que
são tão sobreeminentes, diziam que as idéias ou os pensamentos espirituais,
relativamente aos naturais, eram as idéias das idéias, e os pensamentos dos
251

pensamentos, que por isso mesmo, por elas eram expressas as qualidades das
qualidades e as afeições das afeições; que por conseguinte, os pensamentos
espirituais eram os começos e as origens dos pensamentos naturais; por isso
tornou-se ainda evidente que a sabedoria espiritual era a sabedoria da sabedoria,
por conseqüência não perceptível para sábio algum do M undo N atural. Então
lhes foi dito do T erceiro Céu,que há ainda uma sabedoria interior ou superior,
que é chamada celeste cuja relação com a sabedoria espiritual é semelhante à
relação desta com a sabedoria natural, e que estas sabedorias, em ordem
segundo os Céus,influem da Divina Sabedoria do Senhor,que é Infinita.
(*) Divindade romana que tinha a faculdade de mudar de forma. (N ota do
tradutor).
327 - Depois disso, disse aos assistentes: Por estes três ensinamentos da
experiência vêdes qual é a diferença entre o Espiritual e o N atural, e também a
razão pela qual o homem natural não é visível para o homem espiritual, nem o
homem Espiritual para o homem N atural, ainda que estejam consociados
quanto às afeições e aos pensamentos, e por conseguinte quanto às presenças;
daí vem que tu, G rão-M estre, no caminho, ora me vias, e ora não me vias".
Em seguida, uma voz vinda do Céu superior foi ouvida, dizendo ao
G rão-M estre: "Sobe aqui". E ele subiu, e voltou, e disse que, do mesmo modo
que ele,os Anjos não tinham conhecido antes, as diferenças entre o Espiritual e
o N atural, pela razão de que antes não tinha havido nenhum meio de
confrontação em um homem que estivesse ao mesmo tempo em um e outro
M undo, e que sem uma tal confrontação estas diferenças não podem ser
conhecidas.
328 - Em seguida nós nos retiramos e conversamos de novo sobre este assunto,
e eu disse: "Estas diferenças não vêm senão de que vós, que estais no M undo
espiritual, e por conseqüência sois espirituais, estais nos substanciais e não nos
materiais, e os substanciais são os começos dos materiais; vós estais nos
princípios, e assim nos singulares; mas nós estamos nos comuns; e assim como
os comuns não podem entrar nos particulares, assim também os naturais, que
são materiais, não podem entrar nos espirituais que são substanciais,
absolutamente da mesma forma que um cabo de navio não pode entrar ou
passar pelo buraco de uma agulha de coser, ou do mesmo modo que um nervo
não pode entrar ou ser introduzido em uma das fibras de que é composto, nem
uma fibra em uma das fibrilas de que é composta; isto é mesmo conhecido no
M undo, por isso os Eruditos concordam que há influxo, não do natural no
espiritual, mas do espiritual no natural. V em portanto daí a razão pela qual o
homem N atural não pode pensar as cousas que pensa o homem Espiritual, nem
por conseqüência as pronunciar; por isso Paulo chama inefáveis as que ele
ouviu do T erceiro Céu. Ajuntai a isso que, pensar espiritualmente, é pensar
sem o tempo e sem o espaço, e que pensar N aturalmente, é pensar com o
tempo e o espaço; pois a toda idéia do pensamento natural se liga alguma coisa
252

do tempo e do espaço; mas não a alguma idéia espiritual; isto vem de que o
M undo Espiritual não está, como o M undo N atural, no espaço e no tempo,
mas está na aparência do espaço e do tempo; nisto diferem também os
pensamentos e as percepções; é por isso que vós podeis pensar na Essência e na
O nipresença de Deus de toda a eternidade,isto é,em Deus antes da Criação do
M undo, porque pensais na Essência de Deus de toda eternidade sem o tempo,
e em Sua O nipresença sem o espaço, e assim apreendeis cousas que estão acima
das idéias naturais do homem"; e então contei que uma vez eu tinha pensado
na Essência e na O nipresença de Deus de toda a eternidade, isto é, em Deus
antes da Criação do M undo,e que,como eu ainda não tinha podido afastar das
idéias do meu pensamento os espaços e os tempos, tornei-me inquieto, porque
a idéia da N atureza entrou em lugar de Deus, mas me foi dito: "Afasta as idéias
do espaço e do tempo, e verás"; e me foi dado afastá-las, e vi; e desde esse
momento pude pensar em Deus de toda eternidade e de modo algum na
N atureza de toda eternidade, porque Deus está em todo tempo sem tempo, e
em todo espaço sem espaço, enquanto que a N atureza está em todo tempo no
tempo, e em todo espaço no espaço, e como a N atureza com seu tempo e seu
espaço precisou necessàriamente começar e nascer, mas não Deus que é sem o
tempo e sem o espaço; por isso a N atureza vem de Deus, não de toda a
eternidade, mas no tempo, isto é, ao mesmo tempo com seu tempo e seu
espaço.
329 - Depois que o G rão-M estre e os outros me deixaram, alguns rapazes, que
também tinham assistido aos exercícios do G inásio, me seguiram à casa, e aí
ficaram algum tempo perto de mim enquanto eu escrevia; e eis que viram
então uma traça que corria sobre meu papel, e muito admirados perguntaram o
que era este animalzinho tão ágil; e eu disse que se chamava traça e que eu ia
contar-lhes coisas admiráveis dele: e disse que em um ser vivo tão pequeno, há
tantos membros e vísceras quanto em um camelo; que assim, há cérebros, um
coração, canais pulmonares, os órgãos dos sentidos, dos movimentos e da
geração, um estômago, intestinos e muitas outras cousas; que cada parte é
tecida de fibras, de nervos, de vasos sangüíneos, de músculos, de tendões, de
membranas, e que cada uma dessas cousas é composta de cousas ainda mais
puras que escapam inteiramente à penetração de todo olhar. Eles então
disseram que, não obstante, este pequeno ser vivente não lhes parecia senão
como uma substância simples; e eu disse: "H á entretanto dentro dele coisas
inumeráveis; digo-vos isso a fim de que saibais que acontece o mesmo com
todo objeto que diante de vós aparece como sendo um, simples, e muito
pequeno, tanto em vossas ações como em vossas afeições e em vossos
pensamentos; posso vos assegurar que cada parcela de vosso pensamento e cada
gota de vossa afeição é divisível ao infinito; e que conforme as vossas idéias são
divisíveis,vós vos tornais sábios; sabei que tudo que é dividido, é cada vez mais
múltiplo, e não cada vez mais simples, porque o que é continuamente dividido
se aproxima cada vez mais do infinito, no qual todas as cousas são ao infinito
253

(infinitè); o que vos referi aqui é novo e não se ouviu dizer até ao presente".
Depois que lhes falei assim, os rapazes me deixaram para irem ao G rão-M estre,
e lhe pediram para propor como problema algum dia no G inásio,uma cousa de
que ainda não se ouviu falar. E ele disse: “O quê?" Eles responderam: "Q ue
tudo o que é dividido se torna cada vez mais múltiplo, e não cada vez mais
simples, porque isso o aproxima cada vez mais do infinito, no qual todas as
cousas estão ao infinito (infinitè)",E ele prometeu proposto,e disse: "V ejo isso,
porque percebi que uma única idéia natural é o continente de inúmeras idéias
espirituais; e também, que uma única idéia espiritual é o continente de
inúmeras idéias celestes; dai vem a diferença entre a Sabedoria Celeste, em que
estão os Anjos do T erceiro Céu, e a Sabedoria espiritual em que estão os Anjos
do Segundo Céu, e a diferença entre esta e a Sabedoria natural em que estão os
Anjos do último Céu e também os homens.
330 - Segundo M emorável. U m dia, ouvi maridos discutir de uma maneira
agradável, a respeito do sexo feminino, se uma mulher que ama
constantemente sua beleza, isto é, que se ama por causa de sua forma, pode
amar seu marido; decidiram a princípio entre si que há para as mulheres duas
belezas, uma natural, que é a da face e do corpo, e outra espiritual, que é a do
amor e dos costumes; decidiram também que estas duas belezas são muito
freqüentemente divididas no M undo natural, e que estão sempre reunidas no
M undo espiritual, pois a beleza no M undo espiritual 'é a forma do amor e dos
costumes; por isso, depois da morte, acontece muito freqüentemente que as
mulheres disformes se tornem belezas, e que mulheres belas se tornem
deformidades. Q uando os maridos discutiam a questão algumas esposas vieram
e disseram: "Admiti nossa presença; pois o que discutis, a ciência vô-lo ensina,
mas a nós a experiência o ensina; e mesmo vós tendes tão pouco conhecimento
do amor das esposas,que apenas sabeis alguma cousa dêle; será que sabeis que a
prudência da sabedoria das esposas consiste em esconder seu amor por seus
maridos no íntimo de seu peito, ou no meio do seu coração?" A discussão
começou e a Primeira Conclusão dos maridos foi que toda mulher quer parecer
bela de face e bela de costumes,porque nasceu afeição do amor,e a forma desta
afeição é a beleza; é por isso que a mulher, que não quer ser bela, não é uma
mulher que quer amar e ser amada, e por conseguinte não é verdadeiramente
mulher. Então as esposas disseram: "A beleza da mulher reside em uma doce
delicadeza, e por conseguinte em uma deliciosa sensação; daí vem o amor da
mulher pelo homem, e o amor do homem pela mulher; vós talvez não
compreendais isso". A Segunda Conclusão dos maridos foi que a mulher antes
do casamento quer ser bela para os homens; mas depois do casamento, se é
casta, quer ser bela para seu marido, e não para os homens". Depois disso as
esposas disseram: “O marido, depois de ter gozado a beleza natural da esposa,
não vê mais esta beleza,mas vê sua beleza espiritual,e por esta ele ama de novo,
lembra-se da beleza natural, mas sob um outro aspecto". A T erceira Conclusão
de sua discussão foi, que se a mulher, depois do casamento, quer igualmente
254

parecer bela como antes do casamento, ela ama os homens e não o marido,
porque a mulher que se ama por causa de sua beleza, quer cont1nuamente que
a sua beleza seja apreciada; e como esta beleza não aparece mais diante de seu
marido, assim como o dissestes, ela quer que seja apreciada pelos homens
diante dos quais aparece; que uma tal mulher tenha o amor do sexo e não o
amor de um único do sexo, isso é evidente". Depois disso as esposas guardaram
silêncio; entretanto disseram muito baixo: "Q ual é a mulher tão isenta de
vaidade, que não queira parecer bela também aos homens ao mesmo tempo
que parece ao marido?" Algumas esposas do Céu, que eram belas porque eram
afeições celestes, ouviam esta discussão, e confirmaram as três conclusões dos
maridos; mas acrescentaram: "Q ue elas amem sua beleza e seus atavios para
seus maridos e por seus maridos".
331 - Estas três esposas indignadas porque as três conclusões dos maridos
tinham sido confirmadas pelas esposas do Céu, disseram aos maridos: "V ós
indagastes se uma mulher que se ama por causa de sua beleza, ama seu marido;
nós, pois, por nossa vez, vamos examinar se um marido que se ama por causa
de sua inteligência, pode amar sua esposa; ficai presentes e escutai". E tiraram
esta Primeira Conclusão: U ma esposa ama seu marido não por causa de sua
face, mas por causa de sua inteligência no seu emprêgo e nos seus costumes;
sabei pois que a esposa se une com a inteligência do marido, e assim com o
marido; por isso se o marido se ama por causa de sua inteligência; ele a retira de
sua esposa para si mesmo, daí resulta a desunião e não a união; além disso,
amar a sua inteligência, é ser sábio por si mesmo, e isso é ser louco, é portanto
amar sua loucura".Depois disso os maridos disseram: "Pode ser que a esposa se
una com a força do marido?" A estas palavras as esposas sorriram, dizendo: "A
força não falta enquanto o marido ama a esposa segundo a inteligência; porém
ela falta,se for segundo a loucura; a inteligência consiste em amar a esposa só, e
a força não falta a este amor; compreendeis isso?". A Segunda Conclusão foi
esta: "N ós, mulheres, nascemos no amor da inteligência dos homens, por isso,
se os maridos amam a sua própria inteligência, a inteligência não pode ser
unida com seu amor real, que está na esposa, e se a inteligência do marido não
está unida com seu amor real,que está na esposa,a inteligência se torna loucura
pelo orgulho, e o amor conjugal se torna frieza; qual é portanto a mulher que
pode unir seu amor à frieza? E qual é o homem que pode unir a loucura do seu
orgulho ao amor da inteligência?" M as os maridos disseram: "Como o marido
será honrado pela esposa, se ele não exalta sua inteligência?" As esposas
responderam: "Ele o será pelo amor, porque o amor honra, a honra não pode
ser separada do amor, mas o amor pode ser separado da honra". Em seguida,
como T erceira Conclusão, deram esta: "Parece-vos que amais as vossas esposas,
e não vêdes que sois amados por vossas esposas, e que assim vós as amais em
retorno; e que vossa inteligência é o receptáculo; se portanto, amais a vossa
inteligência, em vós, ela se torna o receptáculo de vosso amor, e como o amor
do próprio não suporta um seu igual, jamais se torna conjugal, mas enquanto
255

tem força, permanece escortatório". Depois disso, os maridos guardaram


silêncio, entretanto diziam muito baixo: “O que é o Amor conjugal?" Alguns
M aridos, no Céu, ouviram esta discussão e confirmaram as três Conclusões das
esposas.
256

Da poligamia

332 - Se se procura a razão pela qual os casamentos poligâmicos foram


absolutamente condenados pelo mundo cristão, homem algum, qualquer que
seja o talento de que for dotado para ver engenhosamente as cousas, pode
descobrir com evidência, a não ser que antes tenha sido instruido em que há
um Amor verdadeiramente conjugal; que este Amor não pode existir sendo
entre dois; que ele não existe entre dois sendo pelo Senhor só; e que o Céu com
todas as suas felicidades foi inscrito neste Amor. A não ser que estes
conhecimentos precedam, e ponham por assim dizer a primeira pedra, a mente
se esforça em vão para tirar do entendimento algumas razões a que ela aquiesça,
e sobre as quais subsista, como uma casa sobre sua pedra ou sobre seu
fundamento, para deduzir dai a condenação da Poligamia pelo M undo Cristão.
Sabe-se que a instituição do Casamento monógamo foi fundada sobre estas
palavras do Senhor: "que quem quer que repudia sua esposa, a não ser por
causa de escortação, e se casa com outra, comete adultério; e que foi do
começo, ou da primeira instauração dos casamentos, que os dois se tornassem
uma só carne; e que o homem não deve separar o que Deus uniu", (M ateus
X IX , 3 a 11). M as ainda que o Senhor tenha ditado estas palavras segundo a
Lei Divina inscrita nos casamentos, todavia, se o Entendimento não pode
sustentar esta Lei Divina por algumas razões suas, pode entretanto, por formas
que lhe são habituais, e por interpretações de través, fazê-la dobrar, e levá-la a
uma obscura ambiguidade,e enfim à afirmativa negativa; na afirmativa, porque
isso é conforme uma vista racional destas palavras; é na negativa que cairá a
M ente humana, a não ser que antes tenha sido instruída nos conhecimentos
acima referidos, que devem servir ao entendimento para introdução em suas
razões; e estes conhecimentos são que há um Amor verdadeiramente conjugal;
que este Amor não pode existir senão entre dois; que não existe entre dois
senão pelo Senhor só; e que o Céu com todas as suas felicidades foi inscrito
neste Amor. M as estas cousas e várias outras particularidades sobre a
condenação da Poligamia pelo M undo Cristão, vão ser demonstradas em
ordem segundo os Artigos seguíntes: I. N ão é senão com uma única esposa que
pode haver Amor verdadeiramente conjugal, e por conseqüência, amizade
verdadeiramente conjugal, confiança, força, e uma conjunção das mentes de tal
modo que dois sejam uma só carne. II. Assim, não é senão com uma única
esposa que podem existir as beatitudes celestes, as felicidades espirituais e os
prazeres naturais aos quais foi provido desde o começo, para aqueles que estão
no Amor verdadeiramente conjugal. III. T odas estas cousas não podem existir
senão pelo Senhor só; elas não existem senão para aqueles que se dirigem a Ele,
257

vivem ao mesmo tempo segundo Seus preceitos. IV . Por conseqüência, o Amor


verdadeiramente conjugal,com suas felicidades,não pode existir senão naqueles
que estão na Igreja Cristã. V . Daí vem que não é permitido a um Cristão
casar-se senão com uma esposa. V I. Se um Cristão se casasse com várias
esposas, cometeria não somente um adultério natural, mas também um
adultério espiritual. V II. Foi permitido à N ação Israelita ter várias esposas,
porque nela não havia Igreja Cristã, e por conseguinte não podia haver Amor
verdadeiramente conjugal. V III. H oje é permitido aos M aometanos ter várias
esposas, porque eles não reconhecem o Senhor Jesus Cristo como um com
Jehovah,O Pai,nem por conseguinte como o Deus do Céu e da T erra, e assim
não podem receber o amor verdadeiramente conjugal. IX . O Céu dos
M aometanos é fora do Céu Cristão; é dividido em dois Céus, um inferior e
outro superior; e ao Céu superior não são elevados senão aqueles que
renunciam às concubinas e vivem com uma única esposa, e que reconhecem o
nosso Senhor como igual a Deus Pai, e como tendo recebido a dominação
sobre o Céu e a T erra. X . A Poligamia é uma lascívia. X I. N os polígamos não
pode haver nem castidade, nem pureza, nem santidade conjugal. X II. O s
polígamos enquanto permanecem polígamos, não podem se tornar espirituais.
X III. A Poligamia não é um pecado naqueles que vivem nela segundo a
religião. X IV . A Poligamia não é um pecado naqueles que vivem na ignorância
do Senhor. X V . Ainda que polígamos, aqueles que dentre eles reconhecem um
Deus, e que vivem pela religião segundo as leis civis da justiça, são salvos. X V I.
M as de uns e de outros nenhum pode ser consociado com os Anjos dos Céus
Cristãos.Segue agora a explicação dos Artigos.
333 - I. É só com uma única esposa que pode haver amor verdadeiramente
conjugal, confiança, força e uma conjunção das mentes de tal modo que dois
sejam uma só carne. Q ue o Amor verdadeiramente conjugal seja hoje tão raro,
que é geralmente desconhecido, é o que foi mostrado várias vezes acima; que
entretanto, ele existe na realidade, isso foi demonstrado em um Capítulo
especial, e por vezes, em seguida, nos Capítulos posteriores. Aliás quem é que
não sabe que existe um tal amor, que ultrapassa todos os outros amores em
excelência e em encanto, ao ponto que todos os outros amores são pouca coisa
em relação a ele? que ele esteja acima do amor à vida, as experiências o atestam:
N ão tem havido homens e não os há ainda que, para obter uma mulher que
desejam e pedem para noiva, se lançam de joelhos, a adoram como uma deusa,
e se submetem como muito vis escravos a todos os seus caprichos? Prova de que
este amor sobrepuja o amor de si. N ão tem havido e não há ainda homens que,
por uma mulher que desejam e pedem para noiva, consideram como nada as
riquezas e mesmos os tesouros, se os possuíssem, e que por isso os
prodigalizam? prova de que este amor sobrepuja o amor do mundo. N ão tem
havido e não há ainda homens que,por uma mulher que desejam e pedem para
noiva, fazem pouco caso de sua própria vida, e desejam ardentemente morrer,
se não obtêm o objeto de seus votos? Isso também é atestado por vários
258

combates de morte entre rivais; prova de que este amor sobrepuja o amor da
vida. N ão tem havido e não há ainda homens que, por uma mulher que
desejam e pedem para noiva, se tornaram e tornam loucos com uma recusa?
Q uem é que pelo começo deste amor em um grande número de homens, não
pode concluir racionalmente que este amor por sua essência, domina como
soberano sobre todo outro amor, e que a alma do homem está então neste
amor, e se promete beatitudes eternas com a mulher desejada e pedida? Q uem
é que pode ver,de qualquer lado que procure, outra cousa senão que o homem
consagrou sua alma e seu coração a uma só? Com efeito, quando um amante
está neste estado, se lhe oferecessem para escolher em todo o sexo a mais digna,
a mais rica e a mais bela,não desdenharia ele a opção,e não se prenderia àquela
que já escolheu; pois o seu coração é para ela? Estas observações são feitas a fim
de que se reconheça que existe um amor conjugal de uma tal sobreeminência, e
que ele existe quando uma só do sexo é amada unicamente. Q ual é o
entendimento que, quando considera com atenção o encadeamento das razões,
não possa concluir que, se pela alma ou pelos íntimos o amante persiste
constantemente no amor por esta mulher, obterá estas beatitudes eternas que se
prometeu antes do consentimento, e que se promete no consentimento? que as
obtém mesmo, se se dirige ao Senhor e por Ele vive a vida da religião, isso foi
mostrado acima; há um outro que entra na vida do homem pela região
superior,e aí implante as alegrias celestes internas, e as transporte às cousas que
seguem, e tanto mais, quando ao mesmo tempo dá também uma força
constante? Pelo fato de não haver um tal amor em si, nem neste ou naquele,
não se pode concluir que ele não existe e não pode existir.
334 - Pois que o amor verdadeiramente conjugal conjunta as almas e os
corações dos dois esposos, foi por conseqüência unido também com a amizade,
e por esta com a confiança, e torna conjugal uma e outra; assim elas
sobrepujam as outras amizades e as outras confianças, ao ponto que, como este
amor é o amor dos amores, do mesmo modo esta amizade é a amizade das
amizades, semelhantemente a confiança; que seja assim também com a força,
há para isso várias razoes, algumas das quais são desvendadas no Segundo
M emorável em seguida a este Capítulo; e desta força resulta a perseverança
deste amor. Q ue pelo amor verdadeiramente conjugal os dois esposos se
tornem uma só carne, isso foi mostrado em um capítulo especial, n. 156 (bis) a
183.
335 – II. Assim, não é sendo com uma única esposa que podem ter lugar as
beatitudes celestes, as felicidades espirituais, e os prazeres naturais, aos quais foi
provido desde o começo para aqueles que estão no verdadeiro amor conjugal.
Diz-se as beatitudes celestes, as felicidades espirituais, e os prazeres naturais,
porque a M ente humana foi distinguida em três R egiões,das quais a Suprema é
chamada celeste, a segunda espiritual, e a terceira natural; e estas três regiões
naqueles que estão no amor verdadeiramente conjugal se mantêm abertas, e o
259

influxo segue em ordem segundo as aberturas; ora, como os encantos deste


amor na região suprema são os mais eminentes, são percebidos como
beatitudes, e como na região média são menos eminentes, são percebidos como
felicidades,e enfim na região ínfima como prazeres; que estes encantos existem,
sejam percebidos e sejam sentidos,vêse pelos M emoráveis em que são descritos.
Q ue desde o começo tenha sido provido a todas as suas felicidades para aqueles
que estão no amor verdadeiramente conjugal, é porque a Infinidade de todas as
beatitudes está no Senhor,e Ele M esmo é o Divino Amor,e a essência do amor
é querer comunicar todos os seus bens a um outro que ele ama; eis porque o
Senhor criou este amor ao mesmo tempo que o homem, e inscreveu nele a
faculdade de receber e perceber estas cousas. Q ual é o homem assaz estúpido e
assaz insensato para não poder ver que existe um certo amor no qual o Senhor
pôs todas as beatitudes, todas as felicidades e todos os prazeres que é possível
por nele.
336 - III. T odas estas coisas não podem existir senão pelo Senhor só; e não
podem existir senão para aqueles que se dirigem a Ele, só, e vivem ao mesmo
tempo segundo Seus preceitos.
Isso foi demonstrado precedentemente em vários lugares; é preciso acrescentar
que todas estas beatitudes,estas felicidades e estes prazeres não podem ser dados
senão pelo Senhor, e que por conseqüência é preciso não dirigir-se a outro; a
que outro nos dirigiríamos, pois que tudo o que foi feito, foi feito por Ele,
(João 1, 3); pois que Ele M esmo é o Deus do Céu e da T erra, (M ateus
X X V III, 18); pois que jamais aspecto algum de Deus Pai foi visto, nem voz
alguma d'Ele foi ouvida senão por meio do Senhor, (João 1, 18; V , 37; X IV , 6
a 11)? Por estas passagens da Palavra e por muitas outras, vê-se que o
casamento do amor e da sabedoria, ou do bem e do vero, de onde os
casamentos tiram unicamente a sua origem,procede d'Ele só. Se este amor com
suas felicidades não é dado senão aos que se dirigem ao Senhor, é a
conseqüência do que acaba de ser dito; e se é dado aos que vivem segundo Seus
preceitos, é porque o Senhor foi conjunto com eles pelo amor, (João X IV , 21 a
24).
337 - IV . Por conseqüência o amor verdadeiramente conjugal com suas
felicidades,não pode existir senõo naqueles que são da Igreja Cristã.
Se o amor conjugal tal como foi descrito em seu Capítulo, nº. 57 a 73, e nos
Capítulos seguintes, por conseqüência tal como é em sua essência, não existe
senão nos que são da Igreja Cristã, é porque este amor vem do Senhor, só, e o
Senhor não é conhecido noutra parte ao ponto de se poder dirigir a Ele como
Deus; além disso também, porque este amor é segundo o estado da Igreja em
cada um, n. 130, e o estado real da Igreja não procede senão do Senhor só,
assim não está senão nos que o recebem d'Ele. Q ue estes dois pontos sejam os
começos, as introduções e as afirmações deste amor, isso foi estabelecido até
aqui por uma tal abundância de razões evidentes e concludentes, que é
260

absolutamente inútil acrescentar alguma cousa. Se entretanto o amor


verdadeiramente conjugal é tão raro no M undo Cristão, nºs. 58 e 59, é porque
há aí poucos que se dirigem ao Senhor, e porque entre este pequeno número
alguns, é verdade, têm da Igreja a crença, mas não têm a vida; além de várias
outras razões, que foram desvendadas no Apocalipse R evelado, onde o estado
da Igreja Cristã de hoje foi completamente descrito; mas não obstante subsiste
com força esta verdade, que não pode haver amor verdadeiramente conjugal,
senão naqueles que são da Igreja Cristã; é mesmo por isto que a Poligamia foi
nela absolutamente condenada; que isso venha também da Divina Providência
do Senhor,é o que vêem claramente os que pensam justo da Providência.
338 - V . Daí vem que não é permitido a um Cristão casar-se sendo com uma
única esposa. Isto resulta das proposições confirmadas nos Artigos precedentes;
é preciso acrescentar, que o Conjugal real foi inscrito nas mentes dos Cristãos
mais profundamente que nas mentes dos G entios que adotaram a Poligamia; e
que por conseguinte as mentes dos Cristãos são mais próprias a receber este
amor do que as mentes dos polígamos, pois este Conjugal foi inscrito nos
interiores da mente dos Cristãos, porque eles reconhecem o Senhor e Seu
Divino,e nos exteriores de sua mente pelas Leis civis.
339 - V I. Se um Cristão se casa com várias esposas, comete, não somente um
adultério natural,mas também um adultério espiritual.
Q ue um Cristão que se casa com várias esposas, comete um adultério natural,
isto está conforme com as palavras do Senhor, a saber; que não é permitido
repudiar a esposa, porque no começo foram criados para ser uma só carne; e
que aquele que repudia sua esposa sem justa cousa e toma uma outra comete
adultério, (M ateus X IX , 3-11); assim com mais forte razão, aquêle que não
repudia sua esposa, mas a retém e junta-lhe outra. Esta lei, dada pelo Senhor
sobre os casamentos, tira sua causa interna do casamento espiritual, pois tudo
que o Senhor pronunciou era em si espiritual; é o que é entendido por estas
expressões: "As palavras que vos enuncio, são espírito e são vida", (João V I,
63). O espiritual aí contido, é que pelo casamento poligâmico no M undo
Cristão, o Casamento do Senhor e da Igreja é profanado; semelhantemente o
casamento do bem e do vero; e além disso, a Palavra; e com a Palavra, a Igreja;
e a profanação destas cousas é um adultério espiritual. Q ue a profanação do
bem e do vero da Igreja fundada sobre a Palavra, corresponde ao adultério, e
que por conseguinte seja um adultério espiritual, e que seja o mesmo a
falsificação do bem e do vero, mas em grau menor, vê-se confirmado no
Apocalipse R evelado, nº 134. Q ue pelos casamentos poligâmicos entre Cristãos
o Casamento do Senhor e da Igreja seria profanado, é porque há uma
correspondência entre este Divino Casamento e os casamentos dos Cristãos, ver
acima nº 83 a 102, correspondência que é inteiramente destruída, quando uma
esposa é ajuntada a uma esposa, e quando a correspondência é destruída, o
homem esposo não é mais um Cristão. Q ue pelos casamentos poligâmicos
261

entre Cristãos, o Casamento do bem e do vero seja profanado, é porque deste


Casamento espiritual são derivados os casamentos nas terras; e os casamentos
dos Cristãos diferem dos casamentos das outras nações, em que, do mesmo
modo que o bem ama o vero, e o vero ama o bem, e são um, do mesmo modo
a esposa e o marido devem se amar mútuamente e ser um; se, portanto, um
Cristão ajuntasse uma esposa a uma esposa, romperia nele este casamento
espiritual, por conseguinte profanaria a origem de seu casamento, e cometeria
assim um Adultério espiritual; que os casamentos nas terras sejam derivados do
Casamento do bem e do vero, vê-se acima, nº 116 a 131. Q ue por um
casamento poligâmico o Cristão profanaria a Palavra e a Igreja, é porque a
Palavra, considerada em si mesma, é o Casamento do bem e do vero, e a Igreja
o é igualmente, tanto quanto é fundada sobre a Palavra; ver acima, nº. 128 a
131.O ra,pois que o homem Cristão,porque conhece o Senhor, tem a Palavra,
e a Igreja que procede do Senhor está nele pela Palavra, é evidente que ele tem,
mais do que um homem que não é Cristão, a faculdade de poder se regenerar,
e por conseguinte de se tornar espiritual, e também de adquirir o amor
verdadeiramente conjugal, pois estas coisas são coerentes. Pois que dentre os
Cristãos,os que tomam em casamento várias esposas cometem não somente um
adultério natural, mas também ao mesmo tempo um adultério espiritual,
segue-se que a condenação dos polígamos cristãos depois da morte é mais
rigorosa que a condenação dos que cometem somente um adultério natural;
tendo me informado do estado daqueles depois da morte, recebi como resposta
que o Céu é inteiramente fechado para eles, que eles aparecem no inferno
como estendidos em uma banheira de água quente; que é assim que aparecem
de longe, embora estejam sobre os pés e andem; que isso vem de um frenesi
intestino; e que alguns deles foram lançados em abismos que estão nos limites
dos M undos.
340 - V II. Foi permitido à N ação Israelita ter várias esposas, porque nela não
havia a Igreja Cristã, e por conseguinte não podia haver amor verdadeiramente
conjugal.
H á hoje pessoas cujos pensamentos estão suspensos a respeito da Instituição dos
casamentos monogâmicos ou de um único marido com uma única esposa, e
que discutem em si mesmos com o auxílio da razão, estimando que, visto que
os casamentos poligâmicos foram abertamente permitidos à N ação Israelita, e a
seus reis, e a David e a Salomão, deveriam ser também, em si mesmos,
permitidos aos Cristãos; mas esses não sabem distintamente nada da N ação
Israelita e das N ações Cristãs,nem dos internos e dos exernos da Igreja, nem da
mudança da Igreja de Externa em Interna pelo Senhor, nem por conseqüência
cousa alguma segundo um julgamento interior sobre os casamentos. Em geral,
é preciso ter como certo, que o homem nasceu natural para se tornar espiritual,
e que enquanto permanece natural, está como na noite e como no sono a
respeito dos espirituais, e que então não conhece nem mesmo a diferença entre
262

o homem Externo natural e o homem interno espiritual. Q ue na N ação


Israelita não houve Igreja Cristã, sabe-se pela Palavra, pois os Israelitas
esperavam, como esperam ainda, um M essias que os eleve acima de todas as
nações e de todos os povos do M undo; se, portanto, se lhes tivesse dito, e se se
lhes dissesse agora, que o R eino do M essias é sobre os Céus, e por conseguinte
sobre todas as nações, eles teriam posto isso e o poriam no número das
brincadeiras; é por isso que não somente não reconheceram o Cristo, ou o
M essias, nosso Senhor, quando veio ao M undo, mas também O tiraram do
M undo de uma maneira atroz; por isso, é evidente que nesta N ação não houve
Igreja Cristã, como não a há hoje; e aqueles em quem não há Igreja Cristã são
naturais no interno e no externo; e para eles a poligamia não é prejudicial, pois
está inscrita no homem natural; com efeito, estes homens não percebem sobre
o amor nos casamentos senão o que pertence ao desejo libidinoso; é o que
entendia o Senhor por estas palavras: "que M oisés por causa de sua dureza de
coração permitiu que repudiassem as esposas; mas que no começo não era
assim", (M ateus X IX , 8); Ele disse que M oisés permitiu, a fim de que se saiba
que não é o Senhor. M as que o Senhor tenha ensinado o homem Interno
espiritual, isso é notório por Seus preceitos, e pela ab-rogação dos R itos que
serviam unicamente para uso do homem N atural; por Seus preceitos sobre a
Ablução, que é a purificação do homem Interno, (M ateus X V , 17 a 20; X X III,
25, 26; M arcos V II, 14 a 23); sobre o Adultério, que é a cobiça da vontade,
(M ateus V ,28); sobre a repudiação das esposas,que é ilícita; sobre a Poligamia,
que não está de acordo com a Lei Divina, (M ateus X IX , 3 a 9); estas cousas, e
várias outras que concernem o homem interno espiritual, o Senhor as ensinou,
porque só Éle abre os internos das mentes humanas e as torna espirituais, as
introduz nos naturais, a fim de que estes também tirem daí uma essência
espiritual,o que acontece mesmo quando a gente se dirige a Ele,e vive segundo
Seus preceitos, que, em suma, consistem em crer n'Ele, em fugir dos males
porque são do diabo e vêm do diabo; depois, em fazer os bens porque são do
Senhor, e vêem d'Ele, e em fugir daqueles e fazer estes como por si mesmo, e
crer ao mesmo tempo que isso é feito pelo Senhor, por meio do homem. A
razão mesma pela qual o Senhor só abre o homem Interno espiritual, e o
introduz no homem Externo natural,é que todo homem pensa naturalmente, e
age naturalmente; e, por conseguinte, não poderia perceber cousa alguma
espiritual, nem receber nenhuma em seu natural, se Deus não tivesse tomado o
H umano N atural; e não o tivesse feito Divino também. Estas explicações
tornam agora evidente, esta verdade, que foi permitido à N ação Israelita ter
várias esposas,porque nela não havia Igreja Cristã.
341 - V II. H oje é permitido aos M aometanos ter várias esposas, porque eles
não conhecem o Senhor Jesus Cristo um com Jehovah, o Pai, nem por
conseguinte por Deus do Céu e da T erra, e assim não podem receber o amor
verdadeiramente conjugal.
263

O s M aometanos, segundo a religião que M aomé lhes deu, reconhecem que


Jesus Cristo é o Filho de Deus e muito grande Profeta, e que foi enviado ao
M undo por Deus Pai, para instruir os homens, mas não que Deus Pai e Ele
sejam uma única Pessoa, unidos como a alma e o corpo, segundo a fé de todos
os Cristãos conforme a confissão Atanasiana; por isso os sectários de M aomé
não puderam reconhecer nosso Senhor como um Deus de toda a eternidade,
mas o reconheceram como um homem natural perfeito, e como tal foi a
opinião de M aomé,e como tal é por conseguinte a opinião de seus discípulos, e
como reconheceram que Deus é um e que é este Deus que criou o U niverso,
não puderam fazer outra cousa senão excluir de seu culto o Senhor, e tanto
mais que declaram também que M aomé é um muito grande profeta; não
conhecem também o que o Senhor ensinou. É por esta razão que os interiores
de sua mente, que em si mesmos são espirituais, não puderam ser abertos; que
estes interiores não sejam abertos senão pelo Senhor só, acabamos de ver acima,
n. 340. Se eles são abertos pelo Senhor, quando Ele é reconhecido como Deus
do Céu e da T erra, e quando se dirigem a Ele, e naqueles que vivem segundo
Seus preceitos, a causa real é que de outro modo não há conjunção, e que sem
conjunção não há recepção; no homem há a presença do Senhor, e há
conjunção com o Senhor; dirigir-se a Ele faz a presença, e viver segundo Seus
preceitos faz a conjunção; a Sua presença só é sem a recepção, mas a presença e
ao mesmo tempo a conjunção estão com a recepção.Sobre este assunto referirei
do M undo espiritual uma cousa nova: Lá, cada um se acha presente pelo
pensamento que se tem dêle, mas ninguém é conjunto a um outro senão pela
afeição do amor, e a afeição do amor é insinuada por fazer o que o outro diz e
o que lhe agrada; isto, que é comum no M undo espiritual, tira sua origem do
Senhor, que está presente assim, e conjunta assim. Estas observações foram
feitas a fim de que se saiba porque foi permitido aos M aometanos ter várias
esposas, e que é porque o amor verdadeiramente conjugal, que existe somente
entre um único marido e uma única esposa, não lhes pode ser dado, pois que
pela religião eles não reconhecem o Senhor igual a Deus Pai, nem por
conseguinte como Deus do Céu e da T erra; que o amor conjugal em cada um
seja segundo o estado da Igreja, vê-se acima, n. 130, e um grande número de
vezes no que precede.
342 - IX .O Céu dos M aometanos está fora do Céu Cristão; é dividido em dois
Céus, um inferior e outro superior, e ao Céu superior não são elevados sendo
aqueles que renunciam às concubinas e vivem com uma única esposa, e que
reconhecem nosso Senhor como igual a Deus Pai, e como tendo recebido a
dominação sobre o Céu e a T erra. Antes de dizer alguma cousa de particular
sobre este Artigo, é importante falar antes da Divina Providência do Senhor a
respeito da origem da R eligião M aometana. Q ue esta religião tenha sido
recebida por mais R einos do que a R eligião Cristã, isso pode ser um escândalo
para aqueles que pensam na Divina Providência, e ao mesmo tempo crêem que
não se pode ser salvo senão quando se nasceu Cristão; mas a R eligião
264

M aometana não é um escândalo para aqueles que crêem que todas as cousas
vêm da Divina Providência; estes procuram em que a Divina Providência está
nela, e o acham: Está no fato da R eligião M aometana reconhecer nosso Senhor
como Filho de Deus, como o mais Sábio dos homens, e como o maior Profeta,
o qual veio ao M undo para instruir os homens; mas como fizeram do Alcorão o
único livro de sua religião, e como por conseguinte M aomé que o escreveu está
presente em seus pensamentos, e recebe deles um certo culto, por isso eles
pouco pensam em nosso Senhor. Para que se saiba plenamente que esta
R eligião foi suscitada pela Divina Providência do Senhor, a fim de destruir as
idolatrias de um grande número de nações,este assunto vai ser exposto em uma
certa ordem; em conseqüência se falará primeiro da origem das idolatrias. Antes
desta R eligião, o culto dos !dolos era comum sobre toda a terra; isto provém de
que as Igrejas antes do Advento do Senhor tinham sido todas Igrejas
representativas; tal tinha sido também a Igreja Israelita; nela, o tabernáculo, as
roupas de Aarão, os sacrifícios, todas as cousas do T emplo de Jerusalém, e
também os estatutos, eram representativos; e, entre os Antigos, havia a Ciência
das Correspondências, que é também a ciência das R epresentações, a ciência
mesma dos sábios, cultivada principalmente pelos Egípcios, daí os seus
H ieroglifos. Por esta ciência eles sabiam o que significavam os animais de todo
gênero, o que significavam as árvores de todo gênero, o que significavam as
montanhas, as colinas, os rios, as fontes, o que significavam o sol, a lua, as
estrêlas; por esta ciência tinham também conhecimento dos espirituais, que
eram representados, os quais eram daqueles que pertencem à sabedoria
espiritual dos Anjos, eram as origens das (coisas que representavam); ora, como
todo seu culto era um culto representativo, consistindo em puras
correspondências, é por isso que o celebravam sobre montanhas e colinas, e
também nos bosques,e voltavam suas faces para o sol nascente que adoravam; e
que além disso faziam imagens talhadas de cavalos, bois, novilhos, carneiros, e
mesmo de pássaros, peixes, serpentes, e as colocavam em suas casas e em outros
lugares em uma certa ordem segundo os espirituais da Igreja aos quais
correspondiam, ou que represen. tavam. Colocavam também semelhantes
objetos em seus T emplos, para trazer à sua lembrança as cousas santas do culto
que elas significavam. Depois desse tempo, quando a Ciência das
Correspondências foi obliterada, a sua posteridade começou a adorar estas
imagens talhadas como santas em si mesmas, não sabendo que seus
antepassados nada viam de santo nelas, mas que as consideravam unicamente
como representando, e por conseguinte significando coisas santas segundo sua
correspondência. Daí nasceram as idolatrias que encheram toda a terra, tanto
na Á sia com as ilhas adjacentes, como na Á frica e na Europa. A fim de que
todas essas idolatrias fossem extirpadas, aconteceu que, pela Divina Providência
do Senhor, elevou-se uma nova R eligião acomodada ao gênio dos O rientais, na
qual havia alguma cousa de um e outro T estamento da Palavra, e que ensina
que o Senhor velo ao M undo, e que È1e era o maior Profeta, o mais sábio de
265

todos, e o Filho de Deus; isso foi feito por M aomé, de quem esta R eligião tem
o nome de R eligião M aometana. Por isto, é evidente que esta R eligião foi
suscitada pela Divina Providência do Senhor, e acomodada, como foi dito, ao
gênio dos O rientais, a fim de destruir as idolatrias de tantas nações, e de lhes
dar algum conhecimento do Senhor, antes de irem para o M undo espiritual, o
que acontece depois da morte de cada um; esta R eligião não teria sido recebida
por tantos R einos, e não teria podido extirpar neles as idolatrias, se não tivesse
sido feita de maneira a se conformar com as suas idéias; sobretudo se a
Poligamia não tivesse sido permitida; é também por este motivo, que os
O rientais, sem esta permissão, se teriam entregue ainda com mais ardor que os
Europeus a vergonhosos adultérios,e teriam perecido.
343 - Se os M aometanos têm também um Céu, é porque todos aqueles que,
sobre o G lobo terrestre, reconhecem um Deus, e fogem, pela R eligião, dos
males como pecados contra Ele, são salvos. Q ue o Céu M aometano tenha sido
dividido em dois,um inferior e outro superior, é o que soube por eles mesmos;
além disso, que no Céu inferior eles vivem com várias mulheres, tanto esposas
como concubinas, como no M undo; mas que aqueles que renunciam às
concubinas e vivem com uma única esposa são elevados ao Céu superior; soube
também que lhes é impossível pensar em nosso Senhor como sendo um com
Deus Pai, mas que lhes é possível pensar que lhe é igual e que lhe foi dada
dominação sobre o Céu e sobre a T erra, porque é Seu Filho; é por isso que esta
fé está naqueles aos quais foi dado pelo Senhor subir a seu Céu superior.
344 - U m dia, me foi dado perceber qual é o calor do amor conjugal dos
polígamos; eu conversava com um que tinha feito a personagem de M aomé;
M aomé mesmo não se apresenta jamais, mas um substituto é posto em seu
lugar,a fim de que os recentemente chegados do M undo vejam por assim dizer
M aomé; este substituto, depois de uma conversação que tive com ele de longe,
me fez passar uma colher de ébano e outros objetos, que eram provas que
vinham dêle, e ao mesmo tempo foi aberta uma comunicação para o calor do
amor conjugal dos que estavam lá; e este calor foi percebido por mim como um
vapor fétido de banho quente; desde que o senti, eu me afastei, e a abertura das
comunicações foi fechada.
345 - X .A Poligamia é uma lascívia.
É porque o seu amor é dividido entre vários, e é o amor do sexo; é também o
amor do homem externo ou natural, e não por conseguinte o amor conjugal, o
único que é casto. Q ue o amor poligâmico seja um amor dividido entre vários,
isso é notório; ora, um amor dividido não é o amor conjugal, pois este é um
amor não divisível Proveniente de uma única pessoa do sexo; por conseguinte o
amor poligâmico é lascivo, e a Poligamia é uma lascívia. Q ue o amor
poligâmico seja o amor do sexo, é porque não difere daquele senão porque é
limitado ao número que o polígamo pode admitir, e porque a poligamia é
adstrita a observar certas leis estabelecidas para o bem público; além disso,
266

porque lhe é permitido acrescentar concubinas às esposas; e assim como é o


amor do sexo, é o amor da lascívia. Q ue o amor poligâmico seja o amor do
homem externo ou natural, é porque está gravado neste homem; ora, tudo o
que o homem natural faz por si mesmo é um mal, de que não pode ser retirado
senão por uma elevação ao homem interno espiritual, o que não é feito senão
pelo Senhor; e o mal que está no homem natural concernente ao sexo é a
escortação; mas como a escortação é a destruição da sociedade, em lugar da
escortação foi posta a sua semelhança, que é, a chamada poligamia; todo o mal
em que o homem nasce por seus pais é implantado em seu homem natural,mas
não é implantado mal algum em seu homem espiritual, porque o homem nasce
neste pelo Senhor. Por estas considerações e também por várias outras razões,
pode-se ver com evidência que a Poligamia é uma lascívia.
346 - X I. N os Polígamos não pode haver nem castidade, nem pureza, nem
santidade conjugais.
Isto resulta do que acaba de ser confirmado, e evidentemente do que foi
demonstrado no Capítulo do Casto e do não casto, principalmente onde foi
estabelecido que o casto, o puro e o santo, não se pode dizer senão dos
Casamentos monogâmicos, ou de um único marido com uma única esposa, nº
141; além disso também que o amor verdadeiramente conjugal é a castidade
mesma, e que por conseguinte todas as delícias deste amor, mesmo as últimas,
são castas, nºs. 143, 144. E, além disso, isto resulta do que foi referido no
Capítulo sobre o Amor verdadeiramente conjugal, a saber, que o amor
verdadeiramente conjugal, que é o amor de um único marido com uma única
esposa, por sua origem e por sua correspondência, é celeste, espiritual, santo, e
puro mais do que qualquer outro amor, n. 64, e seguintes. O ra, como a
castidade, a pureza e a santidade não existem senão no amor verdadeiramente
conjugal,segue-se que no amor poligâmico não pode haver nem castidade, nem
pureza,nem santidade.
347 - X II. O polígamo, enquanto permanece polígamo, não pode se tornar
espiritual.
T ornar-se espiritual, é ser elevado do natural, isto é, da luz e do calor do
M undo à luz e ao calor do Céu; ninguém sabe coisa alguma desta elevação a
não ser aquêle que é elevado; entretanto o homem natural não elevado não
percebe jamais outra cousa senão que foi elevado; e isto, porque assim como o
homem espiritual, pode elevar seu entendimento na luz do Céu, e pensar e
falar espiritualmente, da mesma forma o homem natural o pode; mas se ao
mesmo tempo a vontade não segue o entendimento na sua altura, não foi
entretanto elevado, pois não se mantém nessa elevação, mas depois de alguns
momentos se abaixa para sua vontade e aí estabelece seu posto; se diz a vontade,
e é entendido ao mesmo tempo o amor, porque a vontade é o receptáculo do
amor, pois o que o homem ama, ele o quer. Por estas poucas observações
pode-se ver que o polígamo, enquanto permanece polígamo, ou, o que é a
267

mesma cousa, o homem natural, enquanto permanece natural, não pode se


tornar espiritual.
348 - X III. A Poligamia não é um pecado, naqueles que vivem nela segundo a
religião.
T udo o que é contra a R eligião é reputado como sendo um pecado, porque isso
é contra Deus; e por outro lado tudo o que está com a R eligião é reputado
como não sendo pecado, porque isso está com Deus; ora, como a Poligamia
entre os filhos de Israel vinha da R eligião, e que se dá o mesmo hoje com os
M aometanos, ela não podia e não pode lhes ser imputada como pecado. Além
disso,a fim de que ela não seja para eles um pecado, eles permanecem naturais,
e não se tornam espirituais; e o homem natural não pode ver que haja algum
pecado nas cousas que pertencem a uma religião admitida; o homem espiritual
somente, o vê; é por esta razão que, embora segundo o Alcorão os maometanos
reconheçam nosso Senhor como Filho de Deus, não obstante, eles se dirigem
não a Ele, mas a M aomé; e assim permanecem naturais, e por conseguinte não
sabem que há algum mal, nem mesmo alguma lascívia na poligamia; por isso o
Senhor disse:"Se fôsseis cegos,não teríeis pecado; mas agora dizeis:N ós vemos;
por isso o vosso pecado permanece", (João IX , 41). Pois que a Poligamia não é
acusada de pecado, é por isso que depois da morte eles têm seus Céus, n. 242 e
têm alegrias segundo a sua vida.
349 - X IV . A Poligamia não é um pecado naqueles que estão na ignorância a
respeito do Senhor.
E porque o Amor verdadeiramente conjugal vem do Senhor só, e porque este
amor não pode ser dado pelo Senhor senão aos que O conhecem, O
reconhecem, crêem n'Ele, e vivem a vida que vem d'Ele; e aqueles a quem este
amor não pode ser dado não sabem outra cousa senão que o amor do sexo e o
amor conjugal são um; por conseguinte também a poligamia; que se ajunte a
isso que os Polígamos, que nada sabem do Senhor, permanecem naturais; pois
o homem se torna espiritual unicamente pelo Senhor, e ao homem natural não
é imputado como pecado o que está conforme às leis da R eligião e ao mesmo
tempo da Sociedade; aquêle também age conformemente à sua razão, e a razão
do homem natural está em uma plena obscuridade sobre o Amor
verdadeiramente conjugal; e este amor é por excelência espiritual; não obstante
a razão dos poligamos é instruída pela experiência que importa à paz pública e
privada que o desejo libidinoso da promiscuidade em geral seja restringido, e
seja deixado a cada um no interior de sua casa; daí vem a Poligamia.
350 - Sabe-se que o homem ao nascer é mais vil que a besta; todas as bestas
nascem nas ciências que correspondem ao amor de sua vida; pois desde que são
dadas à luz, ou desde que saem da casca, elas vêem, ouvem, andam, conhecem
seus alimentos, sua mãe, seus amigos e seus inimigos; e pouco tempo depois
conhecem o sexo, e sabem amar, e também criar seus filhotes; o homem só,
268

quando nasce, nada sabe de semelhante, pois cousa alguma da ciência nasce
com ele; é somente faculdade e inclinação para receber as cousas que pertencem
à ciência e ao amor, e se não as recebe pelos outros, fica mais vil que a besta.
Q ue o homem nasce assim, para este fim de não se atribuir cousa alguma, mas
que atribua aos outros, e enfim a Deus só, a totalidade da sabedoria e do amor
da sabedoria, e que em conseqüência possa se tornar a imagem de Deus, vê-se
no M emorável nº 132 a 136. Segue-se daí, que o homem, que não sabe pelos
outros que o Senhor veio ao M undo e que Éle é Deus, e que auferiu somente
alguns conhecimentos sobre a R eligião e sobre as leis de seu país, não está em
falta se sobre o amor conjugal não pensa mais do que sobre o amor do sexo, e
se crê que o amor poligâmico é o único amor conjugal; o Senhor conduz estes
em sua ignorância, e por Seu Auspício Divino retira providencialmente da
imputação da falta aqueles que pela R eligião fogem dos males como pecados,
com o objetivo de serem salvos; pois cada homem nasce para o Céu, e nem um
nasce para o inferno; e cada um vai para o Céu pelo Senhor, ou para o inferno
por si mesmo.
351 - X V . Embora Polígamos, aqueles que reconhecem um Deus, e vivem pela
R eligião segundo as leis civis da justiça,são salvos.
T odos aqueles que, sobre todo o G lobo terrestre, reconhecem um Deus, e
vivem pela R eligião segundo as leis civis da justiça são salvos; pelas leis civis da
justiça são entendidos os preceitos, tais como estão no Decálogo, a saber, que é
preciso não matar, não cometer adultério, não roubar, não dar falso
testemunho; estes preceitos são as leis civis da justiça em todos os R einos da
terra, pois sem eles um R eino não subsistiria. M as conformam a vida por eles,
uns pelo temor das penas da lei, outros por obediência civil, outros também
pela religião; e aqueles que conformam a sua vida por eles também pela religião
são salvos; isto provém de que então Deus está neles, e o homem em quem
Deus está, é salvo. Q uem é que não vê que nos filhos de Israel, depois que
partiram do Egito, havia no número de suas Leis, que é preciso não matar, não
cometer adultério, não roubar, não dar falso testemunho, pois que sem estas
leis, a sua comunidade ou sociedade não teria podido subsistir? E entretanto
estas mesmas Leis foram promulgadas por Jehovah Deus sobre a montanha do
Sinai com um M ilagre admirável; mas a causa de sua promulgação foi, que
estas mesmas Leis fossem assim feitas também leis da R eligião, e que assim eles
as observassem não somente para o bem da Sociedade, mas também por Deus.
Por estas con. siderações pode-se ver que os Pagãos, que reconhecem um Deus
e vivem segundo as Leis civis da justiça, são salvos; pois não é sua culpa se nada
sabem do Senhor, nem por conseguinte nada da castidade do casamento com
uma única esposa; com efeito, é contra a Justiça Divina, que aqueles que
reconhecem um Deus e vivem pela religião segundo as leis da justiça, que
consistem em fugir dos males porque são contra Deus, e fazer os bens porque
estão com Deus,sejam condenados.
269

352 - X V I. M as nem uns nem outros podem ser consociados com os Anjos nos
Céus Cristãos. É porque nos Céus Cristãos há a Luz celeste que é a Divina
V erdade, e o Calor celeste que é o Divino Amor; e estes dois desvendam quais
são os veros e os bens, além disso também quais são os males e os falsos; daí
vem que entre os Céus Cristãos e os Céus M aometanos não existe comunicação
alguma; dá-se o mesmo com o Céu dos G entios, se houvesse comunicação não
poderiam ser salvos senão aqueles que estivessem pelo Senhor na luz celeste e ao
mesmo tempo no calor celeste; e mesmos estes não poderiam ser salvos, se
houvesse conjunção dos Céus; pois por esta conjunção todos os Céus seriam
abalados, a ponto dos Anjos não poderem subsistir; com efeito, o incasto e o
lascivo influiriam dos M aometanos nos Céus Cristãos, o que não poderia ser
suportado aí; e o casto e o puro influiriam dos Cristãos no Céu M aometano, o
que não poderia de modo algum ser suportado aí; e então, pela comunicação e,
por conseguinte, pela conjunção, os Anjos Cristãos se tornariam naturais e
assim adúlteros, ou se permanecessem espirituais, sentiriam continuamente em
torno deles, o lascivo, que interceptaria toda beatitude de sua vida; alguma
cousa semelhante aconteceria ao Céu M aometano; pois os espirituais do Céu
Cristão os cercariam continuamente e os atormentariam, e arrebatariam todo
prazer de sua vida,e além disso insinuaria que a poligamia é um pecado,e desta
maneira, eles seriam sem cessar repreendidos. É por esta razão que todos os
Céus são absolutamente distintos, a fim de que entre eles não haja conjunções
senão pelo influxo da luz e do calor procedentes do Senhor pelo Sol, no meio
do qual Ele está; e este influxo ilustra e vivifica cada um segundo a recepção, e
a recepção é segundo a religião; esta comunicação existe, mas não é dos Céus
entre si.
353 - Ao que precede ajuntarei dois M emoráveis.
Primeiro M emorável. U m dia, eu me achava no meio de Anjos, e ouvi sua
conversação; a sua conversação era sobre a Inteligência e sobre a Sabedoria;
diziam que o homem não sente e não percebe outra coisa senão que elas estão
uma e outra nele, e que assim tudo o que pensa pelo entendimento e se propõe
pela vontade vem dêle, enquanto que, entretanto, do homem não vem a menor
cousa disso, exceto a faculdade de receber de Deus as cousas que pertencem ao
entendimento e à vontade; e, como todo homem por nascimento é inclinado a
se amar, então a fim de que o homem não pereça pelo amor de si e pelo fasto
da própria inteligência,foi provido por criação a que este amor do marido fosse
transferido para a esposa, e que por nascimento fosse implantado nesta o amor
da inteligência e da sabedoria de seu marido, e assim do marido; é por isso que
a esposa atrai a si continuamente o fasto da própria inteligência de seu marido,
e o extingue nele e o vivifica nela,e assim o muda em amor conjugal, e o enche
de encantos além de toda medida; foi provido a isso pelo Senhor, a fim de que
o fasto da própria inteligência não enfatue o marido, a ponto de crer ser
inteligente o sábio por si mesmo e não pelo Senhor, que assim queira comer da
270

árvore da ciência do bem e do mal, e em conseqüência se crer semelhante a


Deus, e também Deus, como a serpente, que era o amor da própria
inteligência, o disse e o persuadiu; é por isso que o homem, depois de ter
comido dela, foi expulsão do Paraíso, e o caminho para a Arvore da vida foi
guardado por um Q uerubim. O Paraíso, espiritualmente entendido, é a
inteligência; comer da árvore da vida, no sentido espiritual, é ser inteligente e
sábio pelo Senhor; e comer da árvore da ciência do bem e do mal, no sentido
espiritual,é ser inteligente e sábio por si mesmo.
354 - O s Anjos, tendo terminado esta conversação, se retiraram, e vieram dois
Sacerdotes com um H omem que no M undo tinha sido Embaixador de um
R eino, e eu lhes contei o que tinha ouvido dizer pelos Anjos. Desde que o
ouviram, se propuseram a discutir os três sobre a Inteligência e sobre a
Sabedoria, e em seguida sobre a Prudência, a fim de decidir se vinham de
Deus,ou do homem; a discussão era viva; todos três acreditavam igualmente de
coração que vinham do homem, porque estão no homem, e porque a
percepção mesma e a sensação mesma que é assim, o confirma; mas os dois
Sacerdotes, que estavam então no zêlo teológico, diziam que nada da
Inteligência nem a Sabedoria, nem por conseqüência da Prudência, vinha do
homem; ora, como o Embaixador retorquisse que assim nada do pensamento
também não vinha do homem, eles disseram que nada dêle vinha; mas como
foi percebido no Céu, que todos três tinham a mesma crença, foi dito ao
Embaixador:"T oma as vestes do sacerdote,e crê que és sacerdote,e então fala".
E ele as tomou, e se acreditou sacerdote, e então disse em alta voz, que nada da
Inteligência nem da Sabedoria, nem por conseqüência da Prudência, podia
existir senão por Deus; e o demonstrou com sua eloqüência habitual, cheia de
argumentos racionais; é comum no M undo espiritual, que um espírito se
imagine ser o personagem de que tem sobre si a vestimenta, pela razão de que
lá o entendimento reveste a cada um. Em seguida foi dito também do Céu aos
dois Sacerdotes: "T irai vossas vestimentas e, tomai vestimentas de M inistros
Políticos, e crêde que sois esses M inistros". E fizeram assim; e então pensaram
ao mesmo tempo por seus internos, e falaram segundo os argumentos que
tinham abraçado anteriormente pela própria inteligência. N esse momento
apareceu uma Arvore perto do caminho, e lhes foi dito: "É a Arvore da ciência
do bem e do mal; guardai-vos de comer dela". N ão obstante todos os três,
enfatuados pela própria inteligência, ardiam com o desejo de comer; e diziam
entre si: "Por que não? não é um bom fruto?" E se aproximaram e comeram
dela. Imediatamente todos os três, porque estavam em uma crença semelhante,
se tornaram amigos de coração, e tomaram juntos o caminho da própria
inteligência, que conduz ao Inferno; mas não obstante, eu os vi voltar, porque
não estavam ainda preparados.
355 - Segundo M emorável. N um dia em que eu olhava no M undo dos
espíritos, vi em um certo prado homens vestidos com roupas semelhantes às
271

dos homens do nosso M undo, pelo que soube que eram recém-vindos;
aproximei-me déles, e fiquei ao seu lado para ouvir o que diziam entre si;
falavam do Céu; e um deles, que tinha algum conhecimento, disse: "H á cousas
admiráveis que ninguém pode acreditar, a não ser que as tenha visto; por
exemplo, Jardins paradisíacos, Palácios magníficos construidos segundo as
regras da arquitetura, porque são obras da arte mesma, resplandecentes como
ouro, na frente dos quais há Colunas de prata, e sobre as colunas Formas
celestes feitas de pedras preciosas; além disso também, Casas de jaspe e de
safira, com magníficos pórticos Por onde entram os Anjos; e, no interior das
casas Decorações que nem a arte nem a palavra podem exprimir. Q uanto aos
Anjos mesmos, são de um e outro sexo; há mancebos e maridos, e há virgens e
esposas; virgens tão belas, que não há exemplo de uma tal beleza no M undo,
mas esposas ainda mais belas que aparecem como efígies do amor celeste, e seus
maridos como efígies da sabedoria celeste; e todos são jovens adolescentes; e, o
que é mais, lá não se sabe o que é um amor do sexo que não seja o amor
conjugal; e, o que vos maravilhará, os maridos estão na perpétua faculdade de
saboriar-lhe as delícias". Q uando estes Espíritos noviços souberam que lá, não
havia amor do sexo, além do amor conjugal, e que se estava em uma perpétua
faculdade de saborear-lhe as delícias, eles riram entre si e disseram: "T u nos
falas de coisas incríveis; uma tal faculdade não é possível, sem dúvida tu nos
contas fábulas". M as então um Anjo desceu inopinadamente do Céu, se
colocou no meio deles, e disse: "Escutai, eu vos peço; eu sou um Anjo do Céu;
e aí vivo com a minha Esposa há mil anos,e durante este tempo, na mesma flor
da idade em que me vêdes aqui; devo isso ao meu Amor conjugal para com
minha esposa; e posso afirmar que tenho tido e tenho esta perpétua faculdade;
e como percebo que acreditais que isso não é possível, vou vos falar disso
segundo razões conformes à luz de vosso entendimento: N ada sabeis do estado
primordial do homem, que é chamado por vós estado de integridade; neste
estado todos os interiores da mente estavam abertos até ao Senhor, e estavam
por conseguinte no casamento do amor e da sabedoria, ou do bem e do vero; e
como o bem do amor e o vero da sabedoria se amam perpetuamente, eles
querem perpètuamente ser unidos; e quando os interiores da mente foram
abertos, este amor espiritual conjugal, decorre livremente com seu perpétuo
esforço, e apresenta esta faculdade. A alma do homem mesma, porque está no
casamento do bem e do vero, está não sómente no perpétuo esforço desta
união, mas também no perpétuo esforço da frutificação e da produção de sua
semelhança; e quando os interiores do homem estão abertos, por este
casamento, a partir da alma e os interiores consideram continuamente o efeito
nos últimos como o fim para o qual existem, resulta dai que este perpétuo
esforço de frutificar e de produzir sua semelhança, esforço que pertence à alma,
se torna o esforço do corpo; e como o último da operação da alma no corpo
entre dois esposos está aí nos últimos do amor, e como estes últimos dependem
do estado da alma, vê-se claramente de onde lhes vem esta perpetuidade. Q ue
272

haja também uma perpétua frutificação é porque a Esfera U niversal para


engendrar e propagar os celestes que pertencem ao amor, e os espirituais que
pertencem à sabedoria, e por conseguinte os naturais que pertencem às
progenituras, procede do Senhor e enche o Céu inteiro e o M undo inteiro, e
esta Esfera celeste enche as almas de todos os homens e desce por suas mentes
ao corpo até aos últimos, e dá a força de engendrar; mas força não pode ser
dada senão àqueles em quem está aberta uma passagem da alma, pelos
superiores e os inferiores da mente, no corpo até a seus últimos, o que acontece
naqueles que se deixam reconduzir pelo Senhor ao estado primordial da
criação; posso afirmar que nestes mil anos jamais me faltou a faculdade, nem a
força, nem a virtude, e que absolutamente nada conheci da diminuição das
forças, pois que estas pelo contínuo influxo da Esfera U niversal acima
mencionada, são continuamente renovadas, e então rejuvenescem mesmo a
mente (animus), e não a entristecem como acontecem com os que lhe sofrem a
perda. Além disso, o Amor verdadeiramente conjugal é absolutamente como o
Calor da primavera, por cujo influxo tudo aspira germinar e frutificar; não há
além desse outro Calor em nosso Céu; por isso há lá entre os Esposos uma
primavera em seu perpétuo esforço, e é deste perpétuo esforço que vem esta
virtude.M as as frutificações entre nós,nos Céus,são diferentes das dos homens
nas terras; entre nós, são frutificações espirituais, que pertencem ao amor e à
sabedoria, ou ao bem e ao vero; a Esposa pela sabedoria do M arido recebe em
si o amor desta sabedoria,e o M arido pelo amor da sabedoria na Esposa, recebe
em si a sabedoria; e mesmo a Esposa é na realidade formada pelo amor da
sabedoria do M arido, o que se dá pelas recepções das propagações da alma do
M arido com a delícia proveniente dela querer ser o amor da sabedoria, de seu
M arido; assim de V irgem ela se torna Esposa, e semelhança; daí também o
amor com sua amizade intima na Esposa, e a sabedoria com sua felicidade no
M arido, crescem contInuamente, e isso pela eternidade; é este o estado dos
Anjos no Céu". Q uando o Anjo acabou de falar assim, olhou para os que
tinham chegado recentemente no M undo, e lhes disse: "V ós sabeis que quando
estivestes na virtude do amor, amastes as vossas esposas, e que depois da delícia
vós vos afastastes; mas não sabeis que nós, no Céu, não é segundo esta virtude
que amamos as esposas, mas que esta virtude em nós vem do amor, e como
amamos continuamente as esposas,ela é perpétua em nós; se portanto poderdes
inverter o estado, podereis compreender isso; aquêle que ama perpètuamente
sua esposa, não a ama com toda sua mente e com todo seu corpo? Pois, o amor
faz voltar todas as cousas da mente e todas as do corpo para o que ele ama, T
como isso é feito reciprocamente, ele conjunta os esposos a um tal ponto que
eles se tornam como um". Além disso, ele disse: "N ão vos falarei do Amor
conjugal implantado por criação nos machos e nas fêmeas, e dê sua inclinação
para uma legítima conjunção, nem da faculdade de prolificar nos machos, a
qual faz um com a faculdade de multiplicar a sabedoria pelo amor do vero;
nem do que faz com que, quanto mais o homem ama a sabedoria pelo amor da
273

sabedoria, ou o vero pelo bem, tanto mais está no amor verdadeiramente


conjugal e na virtude que o acompanha".
356 - Depois de ter dito estas cousas, o Anjo guardou silênciocio; e pelo
espírito do discurso do Anjo, os recém-vindos compreenderam que a perpétua
faculdade de saborear estas delícias é possível; e como esta idéia alegrou suas
mentes (animi), eles disseram: "O h! como é feliz o estado dos Anjos!
Percebemos que vós, nos Céus, permaneceis pela eternidade no estado de
adolescência, e por conseguinte na virtude desta idade; mas diz-nos, como
poderemos, nós também, gozar desta virtude?" E o Anjo respondeu: "Fugi dos
adultérios como infernais, e dirigi-vos ao Senhor, e vós a tereis''. E eles
disseram: "N ós os fugiremos assim, e nos dirigiremos ao Senhor". M as o Anjo
replicou: "N ão podeis fugir dos adultérios como males infernais, a não ser que
fujais igualmente dos outros males; porque os adultérios são o complexo de
todos os males; e, a menos que fujais deles, não podereis vos dirigir ao Senhor;
o Senhor não recebe outros". Depois disso, o Anjo se retirou, e estes novos
espíritos se foram tristes.
274

Do ciúme

357 - T rata-se aqui no Ciúme, porque ele pertence também ao Amor


Conjugal; mas há um Ciúme justo e um Ciúme injusto; um Ciúme justo existe
nos esposos que se amam mútuamente; neles, é um zêlo justo e prudente para
que seu amor conjugal não seja violado, e por conseguinte uma dor justa, se ele
é violado; mas Ciúme injusto existe naqueles que por natureza são suspeitosos,
e cuja mente está doente em conseqüência de um sangue vicioso e bilioso.
Além disso todo Ciúme é considerado por alguns como um vício, e
principalmente pelos escortadores que derramam censuras mesmo nos ciúmes
justos; a palavra Ciúme (Z elotypia) e derivada de Z eli T yprus (tipo de zêlo), e
há um tipo ou uma imagem de zelo justo, e um tipo ou uma imagem de zelo
injusto; mas estas distinções serão desenvolvidas no que vai seguir-se; isto será
nesta série:I.O Z elo,considerado em si mesmo, é como um fogo abrasador do
amor. II. O abrasamento ou a chama deste amor, que é um zelo, é um
abrasamento ou uma chama espiritual, tendo sua origem em uma infestação e
em um ataque dirigidos contra o amor. III. O Z elo, do homem é tal qual é seu
amor; assim, de uma espécie naquele cujo amor é bom, e de outra espécie
naquele cujo amor é mau.IV .O Z elo do amor bom e o Z elo do amor mau são
semelhantes nos externos, mas absolutamente diferentes nos internos. V . O
Z elo do amor bom encerra em seus internos o amor e a amizade; mas o Z elo do
amor mau encerra em seus internos o ódio e a vingança. V I. O Z elo do amor
conjugal é chamado ciúme. V II. O Ciúme é como um fogo abrasador contra
aqueles que infestam o amor com o conjuge, e é como um temor horrível da
perda deste amor.V III.H á Ciúme espiritual nos monógamos, e Ciúme natural
nos polígamos. IX . O Ciúme, nestes esposos que amam ternamente, é uma
justa dor, segundo uma razão sã, por medo que o amor conjugal seja dividido,
e assim pereça. X . O Ciúme, nos esposos que não se amam, existe por várias
causas; em alguns, ele vem de diversas moléstias da mente. X I. Em outros, não
há Ciúme algum, e também por diversas causas. X II. H á também Ciúme em
relação às amantes, mas não da mesma espécie que em relação às esposas. X III.
T ambém há ciúme entre os animais e entre os pássaros. X IV . O Ciúme nos
homens e nos maridos é diferente do Ciúme nas mulheres e nas esposas.
Segue-se agora a explicação destes Artigos,
358 - I.O Z elo considerado em si mesmo,é como o fogo arrasador do amor.
O que é o Ciúme não se pode conhecer, a menos que se conheça o que é o
zelo, pois o Ciúme é o zelo do amor conjugal. Q ue o Z elo seja como o fogo
abrasador do amor, é porque o Z elo pertence ao amor, e o amor é o calor
espiritual,e este calor na sua origem é como o fogo; quanto ao primeiro ponto,
275

que o zelo pertence ao amor, isso é notário; por estar zeloso e agir por zelo não
se entende outra coisa senão agir pela força do amor; mas como, quando existe,
ele se apresenta não como amor, mas como adversário e inimigo, afligindo e
combatendo o que fere o amor, resulta daí que pode também ser chamado
defensor e protetor do amor; pois todo amor é de tal natureza que explode em
indignação e em cólera, e mesmo em furor, quando é perturbado em seus
prazeres; se portanto o amor e sobretudo o amor dominante, é tocado, há
emoção da mente, e se esse toque fere, há arrebatamento; por isto, pode-se ver
que o Z elo não é o mais alto grau do amor, mas é o amor abrasado. O amor de
um e o amor correspondente do outro são como dois confederados; mas
quando o amor de um se eleva contra o amor do outro, se tornam como dois
inimigos; a razão disso,é que o amor é o ser da vida do homem, por isso aquele
que ataca o amor ataca a vida mesma; e então contra aquele que ataca há um
estado de arrebatamento, tal como é o estado de todo homem que um outro
procura matar. H á um arrebatamento semelhante em cada amor, mesmo no
amor mais pacífico, como se vê pelas galinhas, as patas e os pássaros de toda
espécie que se levantam sem medo e se lançam contra os que ferem seus filhotes
ou que tiram seu alimento; que haja cólera em algumas bestas e furor nas bestas
ferozes, se seus filhos são atacados, ou se sua presa é tomada, isso é conhecido.
Se se diz que o amor se abrasa como o fogo é porque o amor não é outra cousa
senão o calor espiritual, tirando sua origem do fogo do. Sol Angélico, que é
puro Amor; que o amor seja um calor como o do fogo, vê-se claramente pelo
calor dos corpos vivos, que não vem de outra parte senão do amor; além disso
também, pelo fato de que os homens se aquecem e se inflamam segundo as
exaltações do amor. Por estas considerações, é evidente que o zelo é como o
fogo abrasado do amor.
359 - II. O abrasamento ou a chama deste amor, que é um zelo, é um
abrasamento ou uma chama espiritual, tendo sua origem em uma infestação e
um ataque dirigido contra o amor.
Q ue o Z elo seja um abrasamento ou uma chama espiritual, vé-se claramente
pelo que foi dito acima; como o Amor no M undo espiritual, é um calor que
tem sua origem no Sol deste M undo, é por isso também que o amor aí aparece
de longe como uma chama; assim aparece o amor celeste nos Anjos do Céu;
assim também aparece o amor infernal nos espíritos do inferno; todavia, é
preciso que se saiba que esta chama não queima como a chama do M undo
natural.Se o Z elo tem também sua origem no ataque,dirigido contra o amor,é
porque o amor é o calor do vida em cada um; quando portanto o amor da vida
é atacado, o calorda vida se inflama, resiste, e se lança contra o agressor, e age
como inimigo por sua força e sua potência, do mesmo modo que a chama que
se lança do fogo contra aquele que o ataca; que este calor seja como um fogo,
vê-se pelos olhos, que faíscam, pela face que se inflama, além disso também
pelo som da voz e pelos gestos; o amor,porque é o calor da vida, age assim para
276

impedir a extinção de toda atividade, de toda vivacidade e de toda


perceptividade do prazer procedente de seu amor.
360 - V ai-se dizer como, quando é atacado, o amor se abrasa e explode em zélo
como o fogo se abrasa e explode em chama quando é atiçado; o amor reside na
vontade do homem; todavia, ele se inflama não na vontade mesma, mas no
entendimento; pois está na vontade como um fogo, e no entendimento como
unia chama; o amor na vontade nada sabe do que lhe concerne, porque aí nada
sente do que lhe pertence, e nada faz por si mesmo, mas isso acontece no
entendimento e no pensamento do entendimento, o que se dá por diversos
raciocínios, estes raciocínios são como pedaços de madeira que o fogo abrasa, e
que por isso se inflamam; são portanto como outros tantos alimentos, ou como
outros tantos materiais combustíveis de onde provém esta chama espiritual, que
é de uma grande variedade.
361 - A razão mesma pela qual o homem se inflama quando seu amor é
atacado, vai ser desvendada. A forma humana em seus íntimos é por criação a
forma do amor e da sabedoria; no homem estão todas as afeições do amor,e em
conseqüência todas as percepções da sabedoria, compostas em uma ordem
muito perfeita, de tal sorte que em conjunto façam uma unanimidade, e por
conseguinte um; elas são substanciais, pois as substâncias são seus sujeitos.
Portanto, uma vez que a forma humana é composta delas, é evidente que, se o
amor é atacado, toda esta forma, com todas e cada uma das cousas que a
constituem, é também atacada em um instante ou ao mesmo tempo; e como
por criação foi dado a todos os seres vivos querer permanecer em sua forma
ajuntamento comum o quer por cada uma das partes, e cada uma das partes o
quer pelo ajuntamento comum; por conseguinte quando o amor é atacado, ele
se defende por seu entendimento, e o entendimento se defende por cousas
racionais e por cousas imagmativas, pelas quais ele se representa o
acontecimento, sobretudo por aquelas que fazem um com o amor que é
atacado, se isso não se fizesse, toda essa forma, pela privação deste amor, seria
destruido. Daí vem que o amor, para resistir aos ataques, endurece as
substâncias de sua forma, e as iriça como em cristas, cheias de aguilhões, isto é,
ela se irrita; tal é a irritação do amor, que é chamada Z elo se portanto o amor
não tiver a faculdade de resistir, resultará daí a ansiedade e a dor, porque prevê
a extinção da vida interior com seus prazeres. M as, ao contrário, se o amor é
favorecido e linsonjeado, esta forma se relaxa, amolece, se dilata, e as
substâncias da forma se tornam doces,tenras,pacíficas e atraentes.
362 - III. O Z elo do homem é tal qual é seu amor; assim, de uma espécie
naquele cujo amor é bom,e de outra espécie naquele cujo amor é mau.
Pois que o Z elo pertence ao Amor, segue-se que ele é tal qual é o Amor; e
como há em geral dois amores, o amor do bem e do vero segundo o bem, e o
amor do mal e do falso segundo o mal, daí haver, em geral, o Z elo pelo bem e
conseqüentemente pelo falso. M as é preciso que se saiba que um e outro amor
277

são de uma variedade infinita; isso é bem evidenciado pelos Anjos do Céu e os
Espíritos do Inferno; uns e outros no M undo espiritual são formas de seu
amor, e entretanto não há um único Anjo do Céu absolutamente semelhante a
um outro; quanto à face, à linguagem, ao andar, aos gostos e aos costumes;
nem espírito algum do inferno semelhante a um outro, e mesmo não o pode
haver em toda eternidade, por mais multiplicados que sejam por miríades de
miríades; daí é evidente que os Amores são de uma variedade infinita, pois tais
são as suas formas; dá-se o mesmo com o Z elo, pois que o Z elo pertence ao
Amor,quer dizer,que o Z elo de um não pode ser absolutamente semelhante ao
Z elo de um outro ou ser o mesmo; em geral, há o Z elo do Amor bom e o Z elo
do Amor mau.
363 - IV . O Z elo do amor bom e o Z elo do amor mau são semelhantes nos
externos,mas absolutamente diferentes nos internos.
O Z elo nos externos se apresenta em cada um como cólera e arrebatamento;
pois é um amor abrasado e inflamado para se defender contra o violador, e para
repeli-lo. Se o Z elo do amor bom e o Z êlo do amor mau parecem semelhantes
nos externos, é porque o amor, quando está no Z elo, se abrasa em um e outro,
mas somente nos externos no homem bom, e tanto nos externos como nos
internos no homem mau; e quando os internos não são vistos, os Z elos
parecem semelhantes nos externos; mas que sejam absolutamente diferentes nos
internos, verses no Artigo que vai seguir-se. Q ue o Z elo se apresenta nos
externos como cólera e arrebatamento, pode-se vê-lo e compreendê-lo
examinando aqueles que agem e falam pelo Z elo; por exemplo, um sacerdote
quando prega com zelo, o tom de sua voz é elevado, veemente, agudo e áspero;
a sua f ace se inflama e se cobre de suor; ele se arrebata, bate no púlpito, e
evoca contra os pecadores o fogo do inferno; dá-se o mesmo com muitos
outros.
364 - Para que se tenha uma idéia distinta do Z elo, nos bons e do Z elo nos
maus, e da diferença dêstes Z elos, é necessário que se forme alguma idéia dos
Internos e dos Externos nos homens; para que se forme uma, seja para esse
propósito uma idéia popular, pois isto também é para o povo. Seja pois para
exemplo uma noz ou um fruto com caroço, e suas amêndoas; os internos nos
bons são como as amêndoas no interior em sua integridade e sua bondade,
cercadas de sua casca ordinária e nativa; mas é inteiramente diferente nos maus,
seus Interiores são como as amêndoas que não se pode comer por causa de seu
amargor,ou porque estão podres, ou porque estão bichadas, enquanto que seus
Externos são como as cascas das boas, ou semelhantes às cascas nativas, ou
brilhantes como conchas, ou coloridas como pedras de íris. Assim aparecem
seus externos, dentro dos quais estão escondidas os internos de que se acaba de
falar.Dá-se o mesmo com seus Z elos.
365 - V .O M odo amor bom encerra em seus internos o amor e a amizade; mas
o M o,do amor mau encerra em seus internos o ódio e a vingança.
278

Foi dito que o Z êlo nos externos se apresenta como cólera e arrebatamento,
tanto naqueles que estão em. um amor bom como nos que estão em um amor
mau; mas como os Internos são outros, outras também são estas cóleras e estes
arrebatamentos; e as diferenças são estas: 1. O Z elo do amor bom é como uma
chama celeste que jamais se lança contra um outro, mas somente se defende, e
se defende contra o mau, corno quando este se lança no fogo e se queima; mas
o Z elo do amor mau é como uma chama infernal, que se lança e se precipita, e
quer consumir o adversário. 2. O Z elo do amor bom se extingue e se adoça,
quando o adversário cessa de atacar; mas o Z elo do amor mau continua e não
se extingue.3.A razão disso,é que o Interno daquele que está no amor do bem
é em si doce, terno, amigável e benevolente; por isso quando o Externo para se
defender se exaspera, se crispa e se irrita, e assim age com dureza, é sempre
temperado pelo bem em que está seu interno; é diferente nos maus, neles o
Interno é inimigo, sem piedade, duro, respirando ódio e vingança, e se
alimentando com os prazeres que aí encontra; e, embora se reconcilie, estes
males estão sempre escondidos como fogos nos tições sob a cinza; e estes fogos
explodem se não neste M undo ao menos depois da morte.
366 - Como o Z elo nos externos,tanto no homem bom como no homem mau,
parecem semelhantes, e como o último sentido da Palavra consiste em
correspondências e aparências,se diz muito freqüentemente de Jehovah que Ele
se encoleriza, que se arrebata, que se vinga, que pune, que lança no inferno,
além de várias outras expressões que são aparências do Z elo nos externos; daí
vem também ser Ele chamado Ciumento (Z elotes); e entretanto não há n'Ele
cousa alguma da cólera, nem do arrebatamento, nem da vingança, pois Ele é a
M isericórdia M esma e a Clemência M esma, no qual não há cousa alguma
semelhante. M as sobre este assunto, ver maiores detalhes no T ratado do Céu e
do Inferno, ns. 545 a 550, e no Apocalipse R evelado nºs. 494, 398, 525, 754,
806.
367 - V I.O Z elo do Amor conjugal é chamado Ciúme.
O Z elo pelo Amor verdadeiramente conjugal é o Z elo dos Z elos, porque este
amor é o Amor dos amores, e porque seus prazeres, pelos quais também o Z elo
é excitado, são os prazeres dos prazeres; pois este Amor, como foi mostrado
acima, é a Cabeça de todos os amores; isto vem de que este Amor introduz na
esposa a forma do amor, e no marido a forma da sabedoria, e destas formas
unidas em um, não pode proceder outra cousa que não seja o que tem o sabor
da sabedoria e ao mesmo tempo do amor. Como o Z elo do Amor conjugal é o
Z elo dos Z elos por isso mesmo é chamado por um novo nome Ciúme
(Z elotypia),isto é,o tipo mesmo do Z elo.
368 - V II. O Ciúme é como um fogo abrasador contra aqueles que infestam o
Amor com a consorte,e é como um temor horrível da perda deste amor.
T rata-se aqui do Ciúme daqueles que estão em um amor Espiritual com o
279

consorte; no Artigo seguinte se tratará do Ciúme daqueles que estão em um


amor N atural; e depois disso do Ciúme daqueles que estão no Amor
verdadeiramente conjugal. N aqueles que estão em um amor espiritual, o
Ciúme é diverso, porque seu amor é diverso, pois não há jamais um único
amor, seja espiritual, seja natural, absolutamente semelhante em duas pessoas,
nem com mais forte razão em muitas.
Q ue o Ciúme espiritual, ou nos espirituais, seja como um fogo, abrasando-se
contra aqueles que infestam seu amor conjugal, é porque o princípio do amor
neles está nos internos de um e de outro, e de seu princípio seu amor segue os
derivados até aos últimos pelos quais, e também ao mesmo tempo pelos
primeiros, são mantidos em uma agradável cadeia os intermediários que
pertencem à mente e ao corpo. Como estes são espirituais em seu casamento
têm por fim a união, e na união o repouso espiritual e os encantos deste
repouso; ora, como rejeitaram de suas mentes (animi) a desunião, é por isso
que este Ciúme é como um fogo atiçado e se lançando contra aqueles que
infestam. Q ue seja também como um temor horrível, é porque seu amor
espiritual tende a que sejam um; se portanto existe um caso, ou sobrevenha
uma aparência de separação, resulta daí um temor cheio de horror, como se
duas partes unidas fossem despedaçadas. Esta descrição do Ciúme me foi dada
do Céu por aqueles que estão no amor conjugal espiritual; pois há um amor
conjugal natural, um amor conjugal espiritual, e um amor conjugal celeste;
quanto ao amor conjugal natural e ao amor conjugal celeste, e quanto ao
Ciúme dêstes amores,falar-se-á deles nos dois Artigos seguintes.
369 - V III. H á Ciúme espiritual nos monógamos, e Ciúme natural nos
polígamos.
Se há um Ciúme espiritual nos monógamos, é porque estes somente podem
receber o amor conjugal espiritual, como foi suficientemente mostrado acima;
se diz que há neles este ciúme, mas entende-se que ele pode estar aí; que ele
não esteja senão em um número muito pequeno no M undo Cristão, onde os
casamentos são monogâmicos, mas que entretanto possa aí estar, é o que foi
mesmo confirmado acima. Q ue o amor conjugal nos polígamos seja natural,
vê-se no Capítulo da Poligamia, nº 345 a 347; dá-se o mesmo com o Ciúme,
porque este segue o amor. O que é o ciúme nos polígamos, as narrações de
alguns homens que viram seus efeitos nos O rientais nô-lo ensinam; é que as
esposas e as concubinas são guardadas como cativas em prisões, e são privadas e
afastadas de toda comunicação com os homens; que nos apartamentos das
mulheres ou nos quar.tos de sua prisão, não é permitido entrar homem algum,
a não ser que seja acompanhado de um eunuco; que se observa com atenção se
alguma delas olha com olhar ou com ar lascivo para um transeunte; e que se se
percebe isso,a mulher é punida com pancadas,e se ela se entrega a atos lascivos
com algum homem Introduzido por astúcia no apartamento, ou fora dele, ela é
punida com a morte.
280

370 - Por estas narrações,foi mostrado com evidência o que é o fogo do Ciúme
de que se abrasa o amor conjugal polígamo, que explode em cólera e em
vingança, em cólera nos homens doces, e em vigança nos homens duros; e isso
acontece porque seu amor è natural, e não participa do espiritual; é uma
conseqüência do que foi mostrado no Capítulo da Poligamia, a saber, que a
Poligamia é uma lascívia, n. 345; e que o polígamo, enquanto permanece
polígamo, é natural e não pode se tornar espiritual, n. 347. M as outro é o
Ciúme nos monógamos naturais; o amor dêstes não se inflama assim contra as
mulheres, mas contra os violadores; contra eles se torna cólera, e contra elas
frieza; é de outro modo nos polígamos, cujo fogo do ciúme se abrasa também
com um furor de vingança; esta é mesmo uma das razões pelas quais as
concubinas e as esposas dos polígamos são em grande paxte libertadas depois da
morte, e são enviadas a serralhos não guardados para se dedicarem a diversas
cousas que são obras de mulheres.
371 - IX . O Ciúme, nestes esposos que se amam ternamente, é uma justa dor
segundo uma razão sã, pelo temor de que o amor conjugal seja dividido, e
assim pereça.
Em todo amor há medo e dor, há medo de que ele pereça, e dor se ele perece;
dá-se o mesmo com o amor conjugal; mas seu medo e sua dor são chamados
Z êlo ou Ciúme. Q ue este Z elo nos esposos que se amam ternamente seja justo,
e que venha de uma razão sã,é porque,ao mesmo tempo,é um temor da perda
da felicidade eterna, não somente para si, mas ainda para seu consorte, e
porque é também uma defesa contra o adultério; quanto ao primeiro ponto,
que é um justo temor da perda da felicidade eterna para si e para o consorte,
resulta de todas as cousas que foram relatadas até aqui sobre o amor
verdadeiramente conjugal, e destas, que por este amor há beatitude para suas
almas, felicidade para suas mentes, prazer para seus corações, e volúpia para
seus corpos, e como tudo isso permanece pela eternidade, eles temem pela
felicidade eterna de um e da outra. Q ue este Z elo seja uma justa defesa contra
o adultério, isso é evidente, em conseqüência é como um fogo que se abrasa
contra a violação e se defende contra ela. Por estas explicações é evidente que
aquele que ama ternamente o consorte, é ciumento também, mas justo e
sensato segundo a sabedoria do homem.
372 - Foi dito que no Amor conjugal foi implantado o temor de que seja
dividido,e a dor no caso em que pereça,e que seu Z êlo é como um fogo contra
a violação; um dia em que eu meditava sobre este assuunto, interroguei Anjos
zelosos sobre a sede do Ciúme; eles responderam que é no entendimento do
marido que recebe o amor da esposa, e lhe retribui amor por amor, e que a
qualidade do Ciúme está de acordo com a sabedoria do marido; disseram além
disso que o Ciúme tem alguma cousa de comum com a honra que existe
também no amor conjugal, pois aquêle que ama sua esposa também a honra.
Q uanto à residência do Z êlo no marido em seu entendimento, deram como
281

razão que o amor conjugal se defende pelo entendimento, como o bem pelo
vero; assim a esposa defende as cousas que são comuns com o homem, por seu
marido; e que é por isso que o Z elo é implantado nos homens, e pelos homens,
e por causa dos homens, nas mulheres. A minha pergunta em qual região da
mente nos homens reside o Ciúme, responderam: "Em sua Alma, porque é
também uma defesa contra os adultérios, e como os adultérios destróem
principalmente o amor conjugal, o entendimento do marido se endurece nos
perigos de violação,e se apresenta como se ferisse o adúltero com um chifre.
373 - X . O Ciúme nos esposos que não se amam, existe por várias coisas; em
alguns provém de diversas doenças da mente.
As causas pelas quais os esposos que não se amam mútuamente são Ciumentos
também, são principalmente a honra da força, o temor da difamação de seu
nome e também da esposa, e o mêdo de que os negócios domésticos caiam em
decadência. Q ue nos homens há a honra da força, isto é, que os homens
querem ser considerados em razão desta honra, isso é notório; pois enquanto
têm esta honra, têm a mente como elevada, e não andam com a cabeça
abaixada entre os homens e as mulheres; a esta honra se junta mesmo uma
reputação de coragem; ela também existe nos chefes militares mais do que nos
outros. Q uanto ao medo da difamação de seu nome e também da esposa, esta
causa tem coerência com a precedente; é preciso acrescentar que a coabitação
com uma prostituta e as práticas de deboche em uma casa, são infâmias. Q ue
em alguns haja ciúme por mêdo de que os negócios domésticos caiam em
decadência, é porque neste caso o marido é desdenhado, e os deveres e os
auxílios mútuos são suspensos; mas este Ciúme em alguns cessa com o tempo e
se torna nulo,e em outros é mudado em um puro fingimento de amor.
374 - Q ue em alguns o Ciúme venha de diversas doenças da mente, isso não é
ignorado no M undo; pois há ciumentos que pensam continuamente que suas
esposas são infiéis,e que as acreditam prostitutas por pouco que as ouçam ou as
vejam falar amigàvelmente a homens ou a respeito de homens; há vários vícios
da mente que produzem esta doença; o principal destes vícios é uma fantasia
suspeitosa que, se é alimentada por muito tempo, leva a mente para as
sociedades de espíritos semelhantes, de que dificilmente pode arrancar-se; ela se
afirma também no corpo, por isso que o serum, e por conseguinte o sangue, se
torna viscoso, tenaz, espesso, lento, acre; a falta de forças a aumenta mesmo,
pois faz com que a mente não possa ser elevada acima de suas suspeitas; com
efeito,a presença das forças eleva, e a ausência abate, pois esta ausência faz com
que a mente se acabrunhe, caia em desfalecimento e mirre; e então ele
mergulha cada vez mais nesta fantasia até cair no delírio, e em conseqüência
tem prazer em exprobações e,tanto quanto lhe é permitido,em injúrias.
375 - H á também grupos de regiões que são trabalhadas mais do que as outras
pela doença do Ciúme; nesses lugares, as esposas são encarceradas,
tirânicamente afastadas de toda conversaçâo com os homens, privadas de vê-los
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através de janelas,que são guarnecidas com grades estreitas, e são amedrontadas


com ameaças de morte se a suspeita alimentada contra elas fôr reconhecida
como bem fundada; além de várias outras durezas que as esposas ai sofrem da
parte de seus esposos ciumentos. M as há duas causas deste ciúme; uma é a
escravidão dos pensamentos e sua sufocação nas cousas espirituais da Igreja; a
outra é um desejo interior de vingança; quanto à primeira causa, a escravidão e
a sufocação dos pensamentos nas cousas espirituais da Igreja, o que ela faz pode
ser concluído do que foi demonstrado acima, que para cada um o Amor
conjugal está de acordo com o estado da Igreja nele, e que, como a Igreja vem
do Senhor, este Amor vem unicamente do Senhor, nºs 130 e 131; quando,
portanto, em lugar do Senhor, é a homens vivos e a homens mortos que nos
dirigimos e prestamos culto, segue-se dai que não há estado de Igreja com o
qual o Amor conjugal possa fazer um; e tanto menos quanto mais suas mentes
são levadas com terror a este culto por ameaças de uma horrível prisão; daí
acontece que os pensamentos, ao mesmo tempo que as palavras, são mantidos
violentamente escravizados e sufocados; uma vez sufocados, influem cousas que
são, ou contrárias à Igreja, ou quiméricas em favor da Igreja; daí não resulta
outra cousa senão o ardor pelas prostitutas, e o gelo pela esposa; é deste ardor e
deste gelo reunidos em uma mesma pessoa que decorre este fogo indomável do
Ciúme. Q uanto à segunda causa, o desejo interior de vingança, detém
interiormente o influxo do amor conjugal, absorve-o, devora-o, e muda-lhe o
prazer, que é celeste, em um prazer de vingança, que é infernal, e a mais
próxima determinação deste prazer é contra a esposa. Segundo a aparência,
resulta também que a malignidade da atmosfera, que aí é impregnada de
exalações virulentas da região ao redor, é uma causa suplementar
(succenturiata).
376 - X I.Em outros não há Ciúme algum,e também por diversas causas.
Se não há Ciúme algum, e se o Ciúme cessa, há para isso várias causas; não há
Ciúme principalmente naqueles que não estimam mais o amor conjugal do que
o amor escortatório, e que ao mesmo tempo estão sem glória, não fazendo caso
algum de sua reputação; estes assemelham-se muito aos maridos que prostituem
suas esposas. N ão há também Ciúme naqueles que o rejeitaram, porque se
confirmaram que ele infecta a mente (animus); que é em vão que a mulher é
vigiada; que vigiá-la é excitá-la; que por conseguinte é melhor fechar os olhos, e
não olhar mesmo pelo buraco da fechadura, com receio de descobrir alguma
cousa; alguns o rejeitaram por causa da ignorância ligada ao nome de Ciúme,
pensando que o homem que é homem nada teme; outros foram forçados a
rejeitá-lo, com medo de que os negócios domésticos venham a sofrer; além
disso também com medo de incorrer no descrédito público, se a esposa fosse
acusada de libertinagem de que é culpada. Além disso, o Ciúme se torna nulo
naqueles que,em razão de sua impotência, concedem toda liberdade às esposas,
a fim de ter filhos que sejam seus herdeiros; além disso também, em alguns por
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motivos de interêsse; e assim por diante. H á também casamentos escortatórios,


nos quais, por mútuo consentimento, dão-se, um ao outro, inteira liberdade de
intrigas amorosas,e entretanto se tratam com polidez quando se encontram.
377 - X II. H á também Ciúme em relação às amantes; mas não do mesmo
modo que em relação às esposas.
O Ciúme em relação às esposas tem sua fonte nos íntimos do homem; mas o
Ciúme em relação às amantes tem sua fonte nos externos; são portanto de um
gênero diferente; se o Ciúme em relação às esposas tem sua fonte nos íntimos, é
porque o Amor conjugal aí reside; e ele aí reside porque o casamento, por sua
eternidade estabelecida por uma aliança e também pela igualdade do direito
pelo qual um pertence ao outro, une as almas, e liga mais alto as mentes; este
laço e esta união, uma vez formados, permanecem indissolúveis, qualquer que
seja o amor,quente ou frio,que em seguida intervenha. V em daí que o convite
ao amor da parte da esposa esfria inteiramente o marido desde os íntimos até
aos últimos,enquanto que o convite ao amor da parte da amante não age assim
sobre seu amante. Ao Ciúme em relação à esposa se junta a ambição da
reputação em vista da honra; e este acessório do Ciúme não existe a respeito da
amante. M as, entretanto, um e outro Ciúme varia segundo a sede do amor
recebido da esposa e recebido da amante, e ao mesmo tempo segundo o estado
do julgamento do homem que recebe este amor.
378 - X III.T ambém há Ciúme nas bestas e nas aves.
Q ue haja Ciúme nas bestas ferozes, como leões, tigres, ursos, e vários outros,
quando têm filhotes, isso é conhecido; além disso, também nos touros, ainda
que não tenham bezerros; e,no mais alto grau,nos galos que combatem com os
rivais até à morte, pelas galinhas; se nestes há um tal Ciúme, é porque são
amorosos gloriosos, e a glória deste amor não suporta um igual; que sejam
amorosos gloriosos mais do que todo gênero e toda espécie de aves, vê-se por
seus gestos, seus movimentos de cabeça, seu andar, e o tom de sua voz. Q ue a
glória da honra nos maridos, tanto amorosos como não amorosos, introduz,
exalta e aguça o Ciúme,isso foi confirmado acima.
379 - X IV . O Ciúme nos homens e nos maridos é diferente do ciúme nas
mulheres e nas esposas.
M as estas diferenças não podem ser apresentadas distintamente, pois que um é
o Ciúme nos esposos que se amam espiritualmente, outro nos esposos que não
se amam senão naturalmente, outro nos esposos cujas mentes estão em
desacordo, e outro nos esposos dos quais um pôs o outro sob o jugo de sua
obediência. O s Ciúmes dos homens e os Ciúmes das mulheres, considerados
em si mesmos, são diversos, porque têm uma origem diferente; a origem dos
Ciúmes dos homens está no entendimento, mas a dos Ciúmes das mulheres
está na vontade aplicada ao entendimento de seu marido; é por isso que o
Ciúme do homem é como uma chama de arrebatamento e de cólera, mas o da
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mulher é como um fogo retido por um temor diverso, por um aspecto diverso,
sobre o marido,por uma consideração diversa por seu próprio amor, e por uma
prudência diversa para não descobrir pelo Ciúme este amor aos maridos;
diferem, porque as esposas são os amores, e os maridos são os recipientes desses
amores; e é prejudicial às esposas prodigalizar seu amor aos maridos, mas não é
do mesmo modo prejudicial aos recipientes prodigalizá-lo às esposas.T odavia,é
de modo diferente nos espirituais; neles o Ciúme do marido é transferido para
a esposa, do mesmo modo que oamor da esposa é transferido para o marido; é
por isso que de uma parte e de outra ele aparece semelhante contra os esforços
do violador; mas o Ciúme da esposa é inspirado ao marido contra os esforços
da prostituta violadora; é como uma dor que chora e que comove a
consciência.
380 - Acrescentarei dois M emoráveis:
Primeiro M emorável: U m dia estava muito admirado da imensa multidão de
homem que atribuem à N atureza a Criação, e conseqüentemente tudo o que
está abaixo do Sol e tudo o que está acima do Sol, dizendo, ao reconhecê-lo do
fundo do coração, quando vêem alguma cousa: "Isso não é da natureza?" E
quando se lhas pergunta porque atribuem isso à natureza e não a Deus, quando
entretanto dizem, por vezes, com a comunhão da Igreja, que Deus criou a
N atureza, e que por conseguinte poderiam tão bem dizer que as cousas que
vêem são de Deus, como dizer que são da N atureza; então respondem com um
tom de voz interno quase tácito: “O que é Deus, senão a N atureza?" T odos
esses se mostram gloriosos da persuasão de que o U niverso foi criado pela
N atureza, e desta loucura como de uma sabedoria, a ponto de considerarem
todos os que reconhecem a Criação do U niverso por Deus, como formigas que
rastejam sobre a terra e seguem o caminho batido, e alguns, como borboletas
que vôam no ar, chamando seus dogmas de sonhos, porque vêem o que eles
não vêem, dizendo: "Q uem viu Deus, e quem é que não vê a N atureza?"
Enquanto eu estava admirado da multidão destes homens, um Anjo apareceu
diante de mim sobre o lado e me disse: "Sobre o que meditas tu?" e respondi:
''Sobre a multidão dos que acreditam que a N atureza criou o U niverso"; e o
Anjo me disse: "T odo o Inferno é composto de tais homens, e eles são
chamados Satãs e Diabos; Satãs, os que se confirmaram pela N atureza, e por
conseguinte negam Deus; Diabos os que viveram nos crimes,e assim rejeitaram
de seus corações todo o reconhecimento de Deus; mas vou te conduzir a
G inásios situados na Plaga meridional-ocidental,onde residem os que são tais,e
que ainda não estão no Inferno"; e me tomou pela mão, e me conduziu; e vi
casinhas nas quais havia G inásios, e no meio delas, uma que era como o
Pretório de todas as outras; este pretório era construido de pedras de breu que
eram recobertas por lâminas como de vidro brilhantes como ouro e prata tais
como são as que se chamam vidros de M aria; e aqui e ali eram, recamadas com
conchas que brilhavam igualmente. Aproximamonos desta casa, e batemos à
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porta; e em breve alguém a abriu, e disse: "Sede bem-vindos"; e correu a uma


mesa, e trouxe quatro livros, e disse: "Estes livros são a sabedoria a que uma
multidão, de R einos aplaude hoje; a este Livro ou a esta Sabedoria aplaudem
numerosos homens na França; a este numerosos homens na Alemanha, a este
alguns na H olanda, e a este alguns na Inglaterra"; depois disse: "Se quizerdes
ver, farei com que estes quatro Livros brilhem a vossos olhos", e então exalou e
espalhou em torno a glória de sua reputação, e os Livros imediatamente
resplandeceram como de luz; mas esta luz diante de nossos olhos se dissipou
imediatamente; e então lhe perguntamos o que ele escrevia agora; e respondeu:
"N este momento tiro dos meus tesouros e exponho as cousas que pertencem à
sabedoria íntima, as quais em resumo são estas: I. A N atureza pertence à V ida,
ou a V ida à N atureza. II. O Centro pertence à Extensão, ou a Extensão
pertence ao Centro. III. Sobre o Centro da Extensão da N atureza e da V ida".
Depois de ter assim falado, assentou-se em uma poltrona perto da mesa; nós,
porém, percorremos seu G inásio que era espaçoso; havia sobre a mesa uma
V ela, porque lá não havia uma Luz do Sol, mas uma Luz noturna de lua; e, o
que me admirou,a vela parecia levada por toda parte e iluminar; mas como não
era espivitada,clareava pouco; e enquanto ele escrevia,víamos esvoaçar da mesa
para as paredes imagens de formas diferentes, que, nesta luz materna de lua,
pareciam como belas aves das índias, mas quando abrimos a porta, eis que estas
imagens, na Luz diurna do Sol, apareciam como pássaros noturnos cujas asas
são em forma de rede; de fato, eram verossimilhanças, que por confirmações
tinham se tornado ilusões, que haviam sido engenhosamente ligadas em série.
Depois de ter visto isto, aproximamo-nos da mesa, e lhe perguntamos o que
escrevia no momento; Ele disse: ''Sobre este Primeiro Ponto: A N atureza
pertence à V ida, ou a V ida pertence à N atureza"; e sobre este ponto disse que
podia confirmar um ou outro, e fazer com que um e outro fossem verdade;
mas como havia dentro dele alguma cousa escondida que ele temia, não ousava
confirmar senão esta proposição, que a N atureza pertence à V ida, isto é, vem
da V ida; e não a outra, que a V ida pertence à N atureza, isto é, vem da
N atureza. N ós lhe perguntamos com honestidade o que havia dentro dele
escondido que ele temia; respondeu que era de ser chamado N aturalista, e por
conseguinte ateu pelos Padres, e H omem de uma razão pouco sã pelos Leigos,
porque uns e outros ou crêem por uma fé cega, ou vêem pela vista daqueles
que confirmam esta fé. Então levado por uma sorte de indignação de zêlo pela
verdade, nós o interpelamos, dizendo: "Amigo, tu muito te enganas; a
sabedoria, que consiste em escrever com talento, te seduziu, e a glória da
reputação te induziu a confirmar o que tu não crês; não sabes que a M ente
humana pode se elevar acima dos sensuais, os quais são o que, nos
pensamentos, provém dos sentidos do corpo; e que, quando é elevado, vê em
cima as cousas que pertencem à V ida,e em baixo as que pertencem à N atureza?
O que é a V ida, senão o Amor e a Sabedoria, e o que é a N atureza, senão o
receptáculo pelo qual o Amor e a Sabedoria operam seus efeitos ou os usos?
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Será que a V ida e a N atureza podem ser de outro modo senão como o principal
e o instrumental? Será que a luz pode ser um com o olho, ou o som um com o
ouvido? De onde vêm os sentidos da vista e do ouvido, senão da V ida; e suas
formas,senão da natureza? O que é o corpo humano, senão um órgão da V ida?
T udo o que o compõe, em geral e em particular, não foi orgânicamente
formado para produzir as cousas que o Amor quer e que o Entendimento
pensa? O s órgãos do corpo não vêm da natureza; e o Amor e o Pensamento não
procedem da V ida? Estas cousas não são absolutamente distintas entre si? Eleva
ainda um pouco mais alto a perspicácia do teu gênio, e verás que é próprio da
V ida ser afetada e pensar, e que ser afetado pertence ao amor, que pensar
pertence à sabedoria, e que um e outro pertencem à vida; pois, como já foi
dito, o amor e a sabedoria são a vida; se elevares ainda um pouco mais alto a
faculdade de compreender,verás que o Amor e a Sabedoria não podem existir a
menos que sua origem esteja em alguma parte, e que sua origem é o Amor
M esmo e a Sabedoria M esma, e por conseguinte a V ida M esma; e estas cousas
são Deus de quem provém a N atureza". Em seguida lhe falamos do Segundo
ponto: O Centro pertence à Extensão, ou a Extensão pertence ao Centro e lhe
perguntamos porque tratou desta questão; respondeu: "Com o fim de concluir
sobre o Centro e a Extensão da N atureza e da V ida, assim sobre a origem de
uma e de outra" e quando lhe perguntamos qual era sua opinião sobre este
ponto; respondeu, como sobre o primeiro ponto, que podia confirmar uma ou
outra parte da proposição, mas que, com receio de perder sua reputação, Ele
confirmava que a Extensão pertence ao Centro, isto é, vem do Centro; ainda
que saiba, acrescentou ele, que antes do Sol houve alguma cousa, e que esta
alguma cousa estava por toda parte no U niverso, e confluiu por si mesma em
ordem, assim para o Centro. Então o interpelamos de novo com uma
indignação excitada pelo zelo, e lhe dissemos: "Amigo, tu és louco"; e logo que
ouviu estas palavras, recuou sua poltrona da mesa, e nos olhou com timidez; e
então prestou atenção, mas rindo; entretanto continuamos nestes termos: “O
que há de mais insensato que dizer que o Centro vem da Extensão, por teu
Centro entendemos o Sol, e por tua Extensão entendemos o U niverso, e que
assim o U niverso teria existido sem o Sol! N ão faz o Sol a N atureza e todas as
suas propriedades, que dependem unicamente do Calor e da Luz procedentes
do Sol pelas Atmosferas? O nde estaria a N atureza antes? De onde ela, vem,
porém, é o que diremos quando o terceiro ponto for discutido; as Atmosferas e
todas as cousas que estão sobre a terra não são como Superfícies, e o Sol não é
seu Centro? O que eram todas essas cousas antes do Sol? Poderiam elas existir?
A subsistência não é uma perpétua existência? Portanto, uma vez que a
subsistência de todas as coisas da N atureza vem do Sol, segue-se que a
existência de todas as coisas vem dele também; cada um o vê e o reconhece por
intuição; do mesmo modo que o posterior existe pelo anterior, não subsiste
também por ele? Se a superfície fosse o anterior, e o centro o posterior, o
anterior não subsistiria pelo posterior, o que entretanto é contra as leis da
287

O rdem? Como os psoteriores podem produzir os anteriores, ou os exteriores os


interiores, ou os mais grosseiros os mais puros? Em conseqüência como as
superfícies que constituem a Extensão podem produzir os centros? Q uem não
vê que isso é contra as leis da natureza? N ós te damos estes argumentos tirados
da análise da razão, para confirmar que a Extensão existe pelo Centro, e não
vice-versa, embora quem quer que pense justo o veja sem estes argumentos.
Disseste que a Extensão tinha por si mesma confluído para o Centro, assim
estaria fortuitamente em uma ordem de tal modo admirável e surpreendente,
que cada coisa é para uma outra, e que tudo em geral e em particular é para o
homem e para sua vida eterna; será que a N atureza pode por algum amor por
meio de alguma sabedoria prover a tais cousas? E pode ela com os homens fazer
os Anjos, e destes constituir o Céu, (e fazer com que os que aí estão vivam
eternamente?) Estabelece estas proposições e reflete, e então cairá a tua idéia da
existência da natureza pela natureza". Depois disso, nós lhes perguntamos o
que ele havia pensado, e o que pensava presentemente o T erceiro ponto: Sobre
o Centro e a Extensão da N atureza e da V ida; se acreditava que o Centro e a
Extensão da V ida fossem a mesma cousa que o Centro e a Extensão da
N atureza. R espondeu que estava em suspenso; que a princípio tinha pensado
que a atividade interior da N atureza era a V ida; e que o Amor e a Sabedoria,
que fazem essencialmente a vida do homem, provinham dela; e que o fogo do
Sol pelo calor e a luz, as atmosferas servindo de meios, a produzia; mas que,
agora, segundo o que acabava de ouvir sobre a vida eterna dos homens, estava
na Incerteza, e que esta incerteza levava sua mente ora para cima, ora para
baixo, quando era para cima, ele reconhecia um Centro de que não tinha tido
antes noção alguma, e quando era para baixo, via o Centro que tinha
acreditado ser único; que a V ida vem do Centro de que ele não tinha tido antes
noção alguma; que a N atureza vem do Centro que ele tinha acreditado antes
ser único; e que um e outro Centro tem uma Extensão em torno dele. A estas
palavras dissemos: "Está bem, desde que também, do Centro e da Extensão da
V ida, tu queiras considerar o Centro e a Extensão da N atureza, e não
vice-versa"; e lhe ensinamos que acima do Céu Angélico há um Sol que é puro
Amor, e por conseguinte ígneo como o Sol do mundo; que é pelo Calor que
procede deste Sol que os Anjos e os homens têm a V ontade e o Amor, e que é
pela Luz que eles têm o Entendimento e a Sabedoria, que as cousas que
pertencem à vida são chamadas Espirituais, e que as que procedem do Sol do
M undo, são os continentes da vida, e são chamadas N aturais; que a Extensão
do Centro da V ida é chamada M undo Espiritual, o qual subsiste por seu Sol, e
que a Extensão da N atureza é chamada M undo N atural, a qual subsiste por seu
Sol. O ra, como os Espaços e os T empos não podem se dizer do Amor e da
Sabedoria,e são substituídos pelos Estados,a Extensão em torno do Sol do Céu
Angélico, não é uma Extensão, mas está entretanto na Extensão do Sol N atural
e aí segundo as recepções nos indivíduos vivos, e as recepções são segundo as
for.mas". M as então ele perguntou de onde vinha o fogo do Sol do M undo ou
288

da N atureza; nós lhe respondemos que vem do Sol do Céu Angélico, que é não
um fogo, mas o Divino Amor procedendo Imediatamente de Deus, que é o
Amor M esmo; como ficasse admirado, nós lh'o demonstramos assim: o Amor
em sua essência é o fogo espiritual; é por isso que o fogo, no sentido espiritual
da Palavra, significa o amor; daí os Sacerdotes, nos T emplos, orarem para que
os corações sejam cheios do Fogo celeste, pelo qual entendem o amor; o fogo
do Altar e o fogo do Candelabro no T abernáculo, entre os Israelitas não
representava outra cousa senão o Divino Amor; o Calor do sangue, ou o Calor
vital dos homens e em geral dos animais, não tem outra origem senão o amor
que faz a sua vida; daí vem que o homem se aquece, se abrasa e se inflama,
quando seu amor é exaltado em zêlo, em cólera, e em arrebatamento; é por isso
que, pelo fato do Calor espiritual, que é o Amor, produzir nos homens um
calor natural, ao ponto de aquecer e de inflamar suas faces e seus membros, é
evidente que o Fogo do Sol natural não existe senão pelo Fogo do Sol espiritual
que é o Divino Amor. O ra, pois que a Extensão vem do Centro e não
vice-versa, como o dissemos acima, e como o Centro da vida, o qual é o Sol do
Céu Angélico, é o Divino Amor procedendo imediatamente de Deus, que está
no meio deste Sol; e pois que é dai que vem a Extensão deste Centro, Extensão
que é chamada M undo Espiritual, e que é por este Sol que existe o Sol do
M undo, e por este sua Extensão que é chamada M undo N atural, é evidente
que o U niverso foi criado por Deus só". Depois disso, fomos embora, e ele nos
acompanhou além do pórtico do seu G inásio,e conversou conosco sobre o Céu
e o Inferno e sobre o Divino auspício,com uma nova sagacidade de gênio.
381 - Segundo M emorável:U m dia, olhando em torno de mim no M undo dos
espíritos, vi de longe um Palácio cercado e como que assediado por uma
multidão de espíritos, e via também um grande número que acorria; admirado
disso, saí precipitadamente de casa, e perguntei a um dos que acorriam o que
havia naquele lugar. R espondeu: "T rês recém-vindos do M undo foram
elevados ao Céu,e viram lá cousam magníficas, e também V irgens e Esposas de
uma beleza admirável; e descendo do Céu, entraram neste Palácio, e contaram
o que tinham visto, e principalmente que essas belezas eram tais como jamais
viram seus olhos, e não podem ver, a não ser iluminados pela luz da aura
Celeste; diziam, falando deles mesmos que no M undo tinham sido O radores;
que eram do R eino da França,e eram dados à eloqüência,e que tinham agora o
desejo de falar sobre a O rigem da beleza. Como esta notícia se espalhou na
vizinhança, a multidão acorreu para ouví-los". T endo recebido esta resposta,
apressei-me também; e entrei,e vi esses três homens de pé no meio, vestidos de
vestes cor de safira, que, por causa de fios de ouro entremeados, brilhavam
como se fossem de ouro, conforme as mudanças de posição; estavam por traz
de uma espécie de tribuna, prontos para falar, e em breve um dos três subiu
sobre um patamar atrás da tribuna para falar sobre a O rigem da beleza do Sexo
feminino,e exprimiu-se assim:
289

382 - "A O rigem da beleza,que outra cousa é senão o Amor, que influindo nos
olhos das jovens, e os inflamando, se torna beleza? O Amor e a Beleza são
portanto a mesma cousa; pois pelo íntimo o Amor cora a face de uma virgem
núbil com uma espécie de chama, cuja transparência é a aurora e a púrpura de
sua vida; quem não sabe que esta chama envia raios em seus olhos, e deles
como centros se espalha no orbe da face, e também desce ao peito, e abrasa o
coração,e assim afeta aqueles que estão perto? Este calor é o amor,e esta luz é a
beleza do amor. O mundo inteiro afirma de comum acordo, que cada um é
amável e belo segundo seu amor; mas, entretanto, um é o amor do Sexo
masculino, e outro o amor do Sexo feminino; o amor masculino é o amor de
ser sábio, e o amor feminino é o amor de ser sábio no masculino; quanto mais,
portanto um jovem é o amor de ser sábio tanto mais é amável e belo aos olhos
de uma jovem, e quanto mais uma jovem é o amor da sabedoria de um jovem,
tanto mais é amável e bela aos olhos de um jovem; é por isso que, assim como
um amor vai ao encontro do amor de um outro e o beija, assim também fazem
as belezas.Concluo portanto que o amor forma as belezas à sua semelhança".
383 - Depois deste, o segundo se levantou para desvendar por um discurso
agradável a O rigem da beleza; e disse: "Acabo de ouvir dizer que o Amor é a
O rigem da beleza; mas não posso me filiar a esta opinião. Q ual é o homem que
sabe o que é o Amor? Q uem o contemplou por alguma idéia do pensamento?
Q uem o viu com os olhos? Dizei-me onde ele está. M as eu afirmo que a
Sabedoria é a O rigem da beleza, nas mulheres a sabedoria que se mantém
intimamente escondida e encerrada,nos H omens a sabe doria que se manifesta
e é aparente. De onde o homem é homem, senão pela sabedoria? Se não fosse
assim, o homem seria uma estátua ou quadro. A que uma moça presta atenção
em um rapaz senão em que grau ele é Sábio? E a que um rapaz presta atenção
em uma moça senão no grau da afeição que ela tem pela sabedoria? Pela
sabedoria entendo a moralidade real, porque esta é a sabedoria da vida; daí vem
que, quando, a sabedoria que se mantém escondida se aproxima e abraça a
sabedoria que se manifesta, o que acontece interiormente no espírito de um e
de outro, elas se ligam e se conjuntam mútuamente, e isso é chamado Amor, e
então elas se apresentam de uma parte e de outra como belezas. Em uma
palavra, a Sabedoria é como a luz ou o esplendor do fogo que toca os olhos; e,
conforme toca forma a beleza".
384 - Depois deste, levantou-se o terceiro, e exprimiu-se nestes termos: "N ão é
o Amor só, nem a Sabedoria só, que é a O rigem da beleza, mas é a união do
amor e da sabedoria; a união do amor com a sabedoria em um jovem, e a união
da sabedoria com o amor da sabedoria em uma jovem; pois a jovem ama a
sabedoria, não nela mesma, mas no jovem, e por conseguinte ela o vê como
beleza; e, quando o jovem vê isso na jovem, ele a vê como beleza; por isso o
amor pela sabedoria forma a beleza, e a sabedoria pelo, amor a recebe; que seja
assim, é o que se torna bem evidente no Céu; vi aí virgens e esposas, prestei
290

atenção à sua beleza, e a vi de um modo nas virgens e inteiramente de outro


modo nas esposas; nas virgens somente em seu brilho, mas esposas em seu
esplendor; vi a diferença como a do diamante que brilha na luz e do rubi que
ao mesmo tempo faísca como fogo. O que é a beleza senão a delícia da vista?
De onde vem a O rigem desta delícia, senão do jogo do amor e da sabedoria?
Este jogo dá brilho à vista, e este brilho é dardejado de olho a olho, e apresenta
a beleza. O que é que faz a beleza da face senão o rubor e a brancura, e sua
agradável mistura? O rubor não vem do amor, e a brancura não vem da
sabedoria? Pois o amor é rubor por seu fogo,e a sabedoria é branca por sua luz;
eu as vi claramente uma e outra nas faces de dois esposos no Céu, o rubor da
brancura na esposa, e a brancura do rubor no marido; e notei que
resplandeciam com seu olhar mútuo". Q uando o terceiro assim se exprimiu, a
Assembléia aplaudiu e exclamou: "Este é o vencedor". E então de repente uma
luz inflamada, que é também a luz do amor conjugal, encheu de esplendor a
casa e ao mesmo tempo de encanto os corações dos que estavam presentes.
291

Da conjunção do amor conjugal


com o amor dos filhos

385 - H á índices que mostram claramente que o Amor conjugal e o Amor dos
filhos, que é chamado Estorge, foram conjuntos; há também índices que
podem levar a crer que não foram conjuntos; pois o amor dos filhos existe nos
esposos que se amam de coração, e também nos esposos separados um do
outro, e às vezes é mais temo e mais forte nestes do que nos outros; mas que,
não obstante, o amor dos filhos foi conjunto à perpetuidade com o amor
conjugal,é o que se pode ver por sua origem,da qual influi; pois ainda que esta
origem varie nos que recebem, estes amores permanecem sempre inseparáveis,
absolutamente como o fim primeiro no fim último, que é o efeito; o fim
primeiro do amor conjugal, é a procriação de filhos, e o fim último que é o
efeito,são os filhos procriados; que o fim primeiro se transporte para o efeito, e
aí esteja como em seu começo, (primordium), e não se retire daí, pode-se vê-lo
pela intenção racional da progressão dos fins e das causas em sua ordem para os
efeitos; mas como os racionais de um grande número de homens não partem
senão dos efeitos, e vão dos efeitos a algumas conseqüências que daí resultam, e
não começam pelas causas,indo analiticamente das causas aos efeitos, assim por
diante, resulta que as cousas racionais da luz não podem deixar de tornar-se
cousas obscuras da nuvem; dai as desviações do vero, as quais têm sua fonte nas
aparências e nas ilusões. O ra, a fim de que se veja que o amor conjugal e o
amor dos filhos estão inteiramente conjuntos, ainda que exteriormente
desunidos,isso será mostrado nesta ordem:I.Duas Esferas universais procedem
do Senhor, para conservar o U niverso no estado criado; uma é a Esfera da
procriação,e a outra é a Esfera de proteção das cousas procriadas. II. Estas duas
Esferas universais fazem um com a Esfera do Amor conjugal e a Esfera do
Amor dos filhos. III. Estas duas Esferas influem universalmente em todas as
coisas do Céu e em todas as cousas do M undo, desde as primeiras até às
últimas. IV . A Esfera do amor dos filhos é Esfera da proteção e da sustentação
daqueles que não podem nem se proteger nem se sustentar a si mesmos.V .Esta
Esfera afeta tanto os maus como os bons,e dispõe cada um a amar, a proteger e
a sustentar sua progenitura segundo o próprio amor. V I. Esta Esfera afeta
principalmente o sexo feminino, assim as mães, mas por elas o sexo masculino
ou os pais.V II. Esta Esfera é também a esfera da inocência e da paz procedente
do Senhor. V III. A Esfera da inocência influi nos filhos, e por eles nos pais, e
os afeta. IX . Ela influi também nas almas dos pais, e se conjunta com a mesma
esfera nos filhos; e é insinuada principalmente pelo tato.X .N o mesmo grau em
292

que se retira a inocência nos filhos, a afeição e a conjunção diminuem também,


e isso sucessivamente até à separação. X I. O estado racional de inocência e de
paz nos pais em relação aos filhos,consiste em que por eles mesmos nada sabem
e nada podem, mas sabem e podem pelos outros, sobretudo pelo pai e pela
mãe; e este estado também se retira sucessivamente, à medida que eles sabem e
podem por eles mesmos e não pelos outros. X II. Esta Esfera avança, em
ordem, do fim pelas causas, nos efeitos, e faz períodos, pelos quais a Criação é
conservada no estado que foi previsto, e ao qual foi provido. X III. O Amor dos
filhos desce e não sobe. X IV . U m é o estado do amor nos esposos antes da
concepção, e outro após a concepção até ao nascimento. X V . O amor conjugal
é conjunto nos pais com o amor dos filhos por causas espirituais, e daí por
causas naturais. X V I. O amor das criancinhas e das crianças é um nos esposos
espirituais, e outro nos esposos naturais. X V II. N os espirituais este amor vem
do interior ou do anterior, mas nos naturais vem do exterior ou do posterior.
X V III. É daí que este amor está nos esposos que se amam mútuamente; e
também nos esposos que não se amam de modo algum.X IX .O amor dos filhos
permanece depois da morte, principalmente nas mulheres. X X . As Crianças são
criadas por elas sob os auspícios do Senhor, e crescem em estatura e em
inteligência como no M undo. X X I. Lá, é provido pelo Senhor a que nelas a
inocência da infância se torne a inocência da sabedoria e assim as crianças se
tornem anjos.Segue-se agora a explicação destes Artigos.
386 - I. Duas Esferas U niversais procedem do Senhor para conservar o
U niverso no estado criado; uma é a Esfera da procriação e a outra é a Esfera de
proteção das coisas procriadas.
O Divino procedente do Senhor é chamado Esfera, porque sai d'Ele, O cerca,
enche um e outro M undo, o Espiritual e o N atural, e opera os efeitos dos fins
que o Senhor predestinou na criação, e aos quais provê depois dela. T udo o
que aflui de um agente,e que o cerca,enche um e outro M undo, o Espiritual e
o N atural, e opera e do calor efluindo do solem torno dele, a esfera da vida
afluindo do homem em torno dêle,a esfera do perfume efluindo de uma planta
em torno dela, a esfera de atração afluindo do ímã em torno dele, e assim por
diante. M as as Esferas universais, de que se trata aqui, são do Senhor em torno
d'Ele, e procedem do Sol do M undo espiritual no meio do qual Ele mesmo
está; do Senhor por este Sol procede uma Esfera de calor e de luz, ou, o que é a
mesma coisa, uma Esfera de amor e de sabedoria para operar os fins que são os
usos; mas esta Esfera, segundo os usos, tem diferentes nomes; a Divina Esfera
que,por gerações sucessivas,provê a conservação do U niverso no estado criado,
é chamada Esfera de procriação; e a Divina Esfera que provê a conservaçao das
gerações em seus começos, e em seguida em suas progressões, é chamada Esfera
de proteção das cousas procriadas. Além destas duas Esferas, há várias outras
Esferas Divinas que são denominadas segundo os usos, assim. de outro modo,
ver acima nº 222. As operações dos usos por estas Esferas são a Divina
293

Providência.
387 - II.Estas duas Esferas universais fazem um com a Esfera do amor conjugal
e a Esfera do amor dos filhos.
Q ue a Esfera do amor conjugal faça um com a Esfera da procriação, isso é
evidente; pois a procriação é o fim, e o amor conjugal a causa média per quam
(pela qual o fim avança); ora, o fim e a causa nas cousas a efetuar e nos efeitos
fazem um; porque agem juntas. Q ue a Esfera do amor dos filhos faça um com
a Esfera da proteção das cousas procriadas, isso é ainda evidente, porque ela é o
fim procedente do fim anterior, que é a procriação, e o amor dos filhos é a sua
causa média per quam; com efeito, os fins avançam em série, um após outro, e
avançando o fim último se torna primeiro, e assim ulteriormente, até ao térmo
no qual se detêm ou cessam; mas sobre este assunto ver-se-á maiores detalhes
nas explicações do Artigo X II.
388 - III. Estas duas Esferas influem universalmente e singularmente em todas
as coisas do Céu e em todas as comas do M undo, desde os primeiros até aos
últimos.
Foi dito universalmente e singularmente, porque, quando se faz menção de
um universal, os singulares de que se compõem são entendidos ao mesmo
tempo; pois é por eles que ele existe e é neles que ele consiste, assim é por eles
que ele é denominado, como o comum pelas partes; se portanto retiras os
singulares, o universal fica unicamente uma palavra, e é como uma superfície
dentro da qual nada há; é por isso que, atribuir a Deus o governo do universal,
e tirar-lhe os singulares, é uma palavra vazia, e uma espécie de atribuição vã. A
comparação com o govêrno universal dos reis da terra não poderia ser admitida.
Portanto é por isso que se diz que estas Esferas influem universalmente e
singularmente.
389 - Se as Esferas de procriação e de proteção das cousas procriadas, ou as
Esferas do amor conjugal e do amor dos filhos, influem em todas as cousas do
Céu é em todas as do M undo, desde os primeiros até aos últimos, é porque
todas as cousas que procedem do Senhor, ou do Sol que existe por Ele, e no
qual Ele está, atravessam o U niverso criado até aos últimas de todas as coisas
que o compõem; a razão disso é que os Divinos, que, na progressão, são
chamados Celestes e Espirituais, são sem espaço e sem tempo; que a extensão
não se possa dizer dos espirituais, porque o espaço e o tempo não se lhes pode
aplicar, isso é notório; daí vem que tudo que procede do Senhor existe em um
instante dos primeiros nos últimos; que a Esfera do amor conjugal seja assim
universal, vê-se acima, nºs. 222 a 225. Q ue aconteça o mesmo com a Esfera do
amor aos filhos, isso é evidente por esse amor no Céu onde estão as crianças
vindas da terra, e por este amor no M undo entre os homens, entre as bestas,
entre as aves, entre as serpentes, entre os insetos; há também semelhanças deste
amor nos reinos vegetal e mineral; no vegetal, no fato das sementes serem
294

guardadas por envólucros como cueiros, e além disso, no fruto como em uma
casa, e serem alimentados com suco como se fosse leite; que haja alguma cousa
semelhante nos minerais, isso é evidente pelas matrizes e as gangas em que as
pedras preciosas e os metais preciosos são encerrados e guardados.
390 - Se a esfera de procriação e a esfera de proteção das coisas procriadas,
fazem um em uma série contínua, é porque o amor de procriar é continuado
no amor do procriado; qual é o amor de procriar, sabe-se por seu prazer, que é
sobreeminente e transcendente; nele está o estado de procriação nos homens, e
de uma maneira notável o estado de recepção nas mulheres; este supremo
prazer segue com seu amor até ao nascimento,e aí se ,completa.
391 - IV . A Esfera do amor dos filhos é a esfera da proteção e da sustentação
dos que não podem nem proteger-se nem sustentar-se a si mesmos.
Q ue as operações dos usos pelo Senhor por meio das esferas que procedem
d'Ele sejam a Divina Providência, isso foi dito acima, nº 386; é portanto a
Divina Providência, que é entendida pela esfera de proteção e de sustentação
dos que não podem nem proteger-se nem sustentar-se a si mesmos; com efeito,
é de criação que as coisas criadas devem ser conservadas, guardadas, protegidas
e sustentadas, de outro modo o U niverso cairia em ruína; mas como isso não
pode ser feito imediatamente pelo Senhor nos sêres vivos, aos quais foi deixado
o arbítrio, isso é feito mediatamente por seu amor implantado nos pais, nas
mães, nas amas; que seu amor seja o amor procedente, do Senhor neles, eles
não o sabem, porque não percebem o influxo, nem com mais forte razão a
ompresença do Senhor; mas quem não pode ver que isso pertence não à
natureza, mas à Divina Providência operando na natureza por meio da
natureza; e que um tal U niverso não pode existir senão por Deus por meio de
um Sol espiritual, que está no Centro do U niverso, e cuja operação, porque é
sem espaço e sem tempo, é instantânea e presente dos primeiros aos últimos?
Q uanto à maneira pela qual esta Divina operação, que é a Divina Providência
do Senhor,é recebida pelos seres animados,falar-se-á dela na continuação. Q ue
as mães e os pais protegem e sustentam os filhos, porque estes não podem nem
proteger-se nem sustentar-se a si mesmos,não é esta a causa deste amor, mas há
uma causa racionalmente derivada deste amor caindo no entendimento; pois o
homem, por esta causa só, sem um amor inspirado e inspirando esta causa, ou
sem uma lei e sem uma pena que o constranjam, não proveria aos filhos mais
do que uma estátua.
392 - V . Esta Esfera afeta tanto os maus como os bons, e dispõe cada um a
amar e proteger e a sustentar sua progenitura pelo próprio amor.
A experiência prova que o Amor dos filhos ou o Estorge existe tão bem nos
maus como nos bons, igualmente nas bestas mansas e nas bestas ferozes, e que,
mesmo, nos homens maus, como nas bestas ferozes, é por vezes, mais forte e
mais ardente; a razão disso, é que todo amor procedendo do Senhor e
295

influindo, é mudado no indivíduo em amor de sua vida, pois cada indivíduo


animado não sente outra coisa senão que é por ele mesmo que ama; com efeito,
ele não percebe o influxo; e quando também efetivamente se ama, faz o amor
dos filhos seu próprio amor, pois eles se vê como neles e os vê como em si, e
assim se vê unido a eles. Daí vem também que este amor nas bestas ferozes,
assim nos leões e nas leoas, nos ursos e nas ursas, nos leopardos machos e
fêmeas, nos lobos e na lobas, e em outros semelhantes, é mais violento que nos
cavalos,nos cervos, nos bodes, nos carneiros; e isso porque nessas bestas ferozes
há dominação sobre as bestas mansas, e por conseguinte amor de si
predominando; e este amor se ama na progenitura; é por isso que, como já foi
dito, o amor influindo, é mudado em um amor próprio. U ma tal mudança do
amor influindo em um amor próprio, e em conseqüência a proteção e a
sustentação das progenituras e dos filhotes pelos pais maus, vem da Divina
Providência do Senhor; pois de outro modo, não restaria do gênero humano
senão poucos indivíduos, e nem uma das bestas ferozes, que entretanto
desempenham um uso. Segundo estas considerações é evidente que cada um é
disposto a amar,a proteger e a sustentar sua progenitura,pelo próprio amor.
393 - V I. Esta Esfera afeta principalmente o sexo feminino, assim as mães, e
por elas o sexo masculino ou os pais.
Isto vem desta mesma origem, de que se falou acima, a saber, que a Esfera do
amor conjugal é recebida pelas mulheres, e é transferida por meio das mulheres
aos homens, por esta razão que as mulheres nascem amores do entendimento
dos homens, e o entendimento é recipiente; dá-se o mesmo com o amor dos
filhos,porque ele vem originàriamente do amor conjugal; que nas mães o amor
dos filhos seja muito terno, e que nos pais o seja menos, isso é notório. Q ue o
amor dos filhos tenha sido inscrito no amor conjugal em que nascem as
mulheres, vê-se claramente pela amável e social afeição das jovens pelas
crianças, e por suas bonecas que elas carregam, vestem, cobrem de beijos e
apertam contra o peito. N ão há uma tal afeição nos meninos. Parece que o
amor dos filhos nas mães vem de que, no útero, elas as alimentaram com seu
próprio sangue, e vem por conseguinte da apropriação de sua vida, e assim, de
uma união simpática; mas entretanto, não é essa a origem desse amor, pois que
se, à revelia da mãe, se substituísse depois do nascimento o seu filho por um
outro, ela o amaria com a mesma ternura como se fosse o seu; além disso, as
crianças, às vezes, são amadas por suas amas mais do que por suas mães.
Segue-se dai que este amor não tem outra origem que não seja o amor conjugal
gravado em cada mulher, ao qual foi adjunto o amor de conceber, amor cujo
prazer prepara a esposa para a recepção, é isto o primeiro deste amor, que, com
seu prazer depois do nascimento,passa plenamente para o filho.
394 - V II.Esta Esfera é também a esfera da inocência e da paz.
A Inocência e a Paz são os dois íntimos do Céu; são denominados íntimos,
porque procedem imediatamente do Senhor; pois o Senhor é a Inocência
296

mesma e a Paz mesma; pela Inocência o Senhor é chamado Cordeiro, e pela


Paz Ele diz: "A Paz eu vos deixo, a minha Paz eu vos dou", (João X IV , 27); e
também é entendida pela Paz com que os discípulos deviam saudar a cidade ou
a casa em que entrassem, e da qual se diz que a Paz viria sobre ela se fosse
digna, e que se não fosse digna, retornaria para eles, (M ateus X , 11 a 15); por
isso também o Senhor é chamado, Príncipe da Paz, (Isaías IX , 5 e 6). Se a
Inocência e a Paz são os íntimos do Céu, é também por esta razão, que a
Inocência é o ser de todo bem, e a Paz é a beatitude de todo prazer que
pertence ao bem; ver o T ratado do Céu e do Inferno, sobre o estado de
inocência dos Anjos no Céu, nº 276 a 283; e sobre o estado de Paz no Céu, nº
284 a 290.
395 - V III. A Esfera de inocência influi nas crianças, e por elas nos pais, e os
afeta.
Q ue as crianças sejam inocências, isso é sabido; mas que sua inocência influa
do Senhor, isso não é sabido; ela influi do Senhor porque Ee é a Inocência
M esma, como acaba de ser dito; e cousa alguma não pode influir senão de seu
princípio, porque não pode existir senão por este princípio que é o Isto
M esmo. M as qual é a inocência da infância, que afeta os pais, isso será dito em
poucas palavras: Ela se manifesta com brilho em sua face, por alguns de seus
gestos,e por sua primeira linguagem,e afeta; a inocência está neles, porque não
pensam pelo interior, pois não sabem ainda o que é o bem e o mal, nem o que
é o vero e falso, segundo os quais os homens pensam; por conseguinte eles não
têm nem prudência proveniente do próprio, nem resolução tomada por
deliberação, por conseguinte. mal algum por fim; não têm o próprio adquirido
pelo amor de si e do mundo; não se atribuem cousa alguma; todas as cousas
que recebem eles atribuem a seus pais; contentam-se com as menores coisas que
se lhes dá; não têm inquietação alguma sobre alimento e sobre roupas, nem
sobre o futuro; não dirigem suas vistas para o mundo, e por conseguinte não
desejam muitas cousas; amam ,seus pais, suas amas, e as crianças de sua idade,
com as quais brincam com inocência; deixam-se conduzir, ouvem e obedecem;
é isto a inocência da infância,que é a causa do amor chamado estorge.
396 - IX . Influi também nas almas, dos pais, e se conjunta com a mesma esfera
nas crianças; e é insinuada principalmente pelo tato.
A Inocência do Senhor influi nos Anjos do terceiro Céu, onde todos estão na
Inocência da sabedoria, e passa através dos Céus inferiores, mas, somente
através das inocências dos Anjos dêstes Céus, e assim imediatamente e
mediatamente nas crianças; elas são pouco mais que formas esculpidas, mas
entretanto capazes de receber a vida procedente do Senhor pelos Céus.
T odavia, se os pais não recebessem também este influxo em suas almas e nos
íntimos de suas mentes, seriam afetados em vão pela inocência dos filhos; é
preciso que haja em um outro alguma cousa adequada e homogénea pela qual
será feita a comunicação, e que fará a recepção, a afeição e por conseguinte a
297

conjunção; de outro modo seria como uma semente tenra caindo sobre um
calhau, ou como um cordeiro lançado contra um lobo; dai vem, portanto, que
a inocência, que ínfluí nas almas dos pais, se conjunta com a Inocência dos
filhos. Q ue esta conjunção se faça por meio dos sentidos do corpo, mas
principalmente pelo tato,nos pais,a experiência pode ensiná-lo; por exemplo, a
vista é inteiramente deleitada por sua presença, o ouvido por sua línguagem, o
olfato, por seu odor; que a comunicação e por conseguinte a conjunção das
inocências se faça principalmente pelo tato, vê-se claramente pelo encanto que
sentem carregando-as em seus braços, abraçando-as e beijando-as, sobretudo as
mães que sentem delícias pela aplicação de sua boca e de sua face sobre o seio, e
então ao mesmo tempo pelo contato de suas mãos; em geral pela sucção das
mamas e pelo aleitamento, e além disso pelo contacto de seu corpo nu, e por
um cuidado infatigável de enfaixá-las e limpá-las sobre seus joelhos. Q ue as
comunicações do amor e de suas delícias entre os esposos se façam pelo sentido
do tato, é o que já foi demonstrado algumas vezes; se as comunicações da
mente se fazem também por este sentido, é porque as mãos são os últimos do
homem, e os primeiros estão juntos nos últimos; por isso também todas as
cousas do corpo e todas as cousas da mente, que são intermediárias, estão
contidas em um encadeamento indissolúvel; daí vem que Jesus tocava as
crianças, (M ateus X IX , 13, 15; M arcos X , 13, 16); e que curava os doentes
pelo tato; e que os que O tocavam ficavam curados; é também por isso que as
iniciações no sacerdócio se fazem hoje pela imposição das mãos. Por estas
explicacões é evidente que a inocência dos pais e a inocência dos filhos vão ao
encontro uma da outra pelo tato, sobretudo pelo toque das mãos, e que assim
se conjuntam como por beijos.
397 - Q ue a Inocência produza também, pelos contactos, nas bestas e nas aves
semelhantes efeitos, como nos homens, isso é notário; se produz efeitos
semelhantes, é porque tudo o que procede do Senhor se espalha em um
instante pelo U niverso,ver acima nº 388 a 390; e como isso vai por graus e por
contínuas mediações, passa por conseguinte não somente até aos animais, .mas
mesmo além, até aos vegetais e aos minerais, nº 389; isso passa também à terra
mesma,que é a mãe de todos os vegetais e de todos os minerais; pois na estação
da primavera, ela está, em um estado preparado para receber as sementes como
em um útero; e, quando as recebeu, as concebe, por assim dizer, as aquece, as
protege, as faz brotar, as amamenta, as alimenta, as reveste, as cria, as conserva,
e por assim dizer, ama o que é produzido, e assim por diante. Pois que a Esfera
da procriação vai até aí, porque então não chegaria até aos animais de toda
espécie,até aos vermes? Q ue,do mesmo modo que a terra é a mãe comum Idos
vegetais, há também uma mãe comum das abelhas em cada ,colmeia, é o que a
observação demonstra.
398 - X .N o mesmo grau em que a inocência se retira nas crianças, a afeição e a
conjunção diminuem também,e isso sucessivamente até à separação.
298

Q ue o amor dos filhos ou o estorge, se retira dos pais, conforme a inocência se


retira dos filhos, e que nos homens ele se retira até à separação dos filhos fora
da casa, e nas bestas e nas aves até ao afastamento dos filhotes para fora de sua
presença, e até ao esquecimento de que são sua progenitura, isso é sabido; por
isso, como por um índice confirmado, também se pode ver que a inocência,
influindo de uma parte e de outra,produz o amor chamado estorge.
399 - X I. O estado racional de inocência e de paz nos pais a respeito dos filhos
consiste em que para eles estes nada sabem e nada podem, mas sabem e podem
pelos outros, sobretudo pelo pai e pela mãe, e este estado também se retira
sucessivamente à medida que sabem e podem por eles mesmos e não pelos
outros.
Q ue a Esfera do amor dos filhos seja a Esfera da proteção e da sustentação
daqueles que não podem nem se proteger nem se sustentar a eles mesmos, isso
foi mostrado acima em um Artigo especial, nº 391; que esta causa seja
unicamente uma causa racional no homem, mas não seja a causa mesma do
amor dos pais, também se fez menção-disso no mesmo Artigo. A causa
originária mesma deste amor é a inocência que procede do Senhor,a qual influi
sem o homem saber, e produz esta causa racional; é por isso que, à medida que
a primeira causa faz com que a gente se afaste deste amor, esta segunda causa o
faz também ao mesmo tempo, ou, o que é a mesma cousa, à medida que a
comunicação da inocência se retira, a razão persuasiva a acompanha também;
mas isso acontece somente no homem, a fim de que o que ele faz, o faça pelo
livre segundo a razão, e para que, pela razão, como por uma lei racional e ao
mesmo tempo moral, ele sustente sua progenitura adulta segundo as
necessidades e as utilidades. Esta segunda causa não existe para os animais
privados de razão; neles há somente a primeira causa,que para eles é o instinto.
400 - X II. A Esfera do amor da procriação avança, em ordem, do fim para as
causas nos efeitos, e faz períodos pelos quais a criação é conservada no estado
que foi previsto,e ao qual foi provido.
T odas as operações no U niverso avançam dos fins para as causas nos efeitos;
estes três são em si mesmos indivisíveis,ainda que nas idéias pareçam divididos;
todavia, o fim não é alguma cousa, se ao mesmo tempo o efeito para o qual se
tende não é visto, e um e outro não se tornam alguma cousa, se a causa mão
sustenta, não provê e não conjunta. U ma tal progressão foi inscrita em cada
homem no comum e em todo singular, absolutamente como a vontade, o
entendimento e a ação; todo fim pertence à vontade, toda causa ao
entendimento, e todo efeito à ação; semelhantemente, todo fim pertence ao
amor,toda causa per quam à sabedoria,e todo efeito ao uso; a razão disso é que
o receptáculo do amor é a vontade, o receptáculo da sabedoria é o
entendimento, e o receptáculo do uso é a ação; quando, portanto, as operações
no comum e no singular, no homem, vão da vontade pelo entendimento ao
ato, elas vão também amor pela sabedoria ao uso; mas pela sabedoria aqui é
299

entendido tudo o que pertence ao julgamento e ao pensamento; que estes três


sejam um no efeito, isso é evidente; que também façam um nas idéias antes do
efeito, percebe-se pelo fato de que só falta a terminação; pois na mente o fim
parte da vontade, e produz para ele uma causa no entendimento e se apresenta
a si mesmo uma intenção,e a Intenção é como um ato antes da terminação; daí
vem que a intenção é recebida como o ato pelo sábio, e também pelo Senhor
Q ual é o homem racional que não possa ver, ou, quando o ouve dizer, não
possa reconhecer, que estes três decorrem de alguma primeira causa, e que esta
causa consiste em que do Senhor Criador e Conservador do U niverso,
procedem continuamente o Amor, a Sabedoria e o U so, e estes três, como um?
Q ue se diga,se é possível,de que outra fonte isso pode vir.
401 - U ma semelhante progressão de fim pela causa ao efeito, pertence também
à Esfera de procriação, e à Esfera de proteção das cousas procriadas. O fim é aí
a V ontade ou o Amor de procriar, a causa média pela qual e na qual o fim se
conduz,é o Amor Conjugal,a série progressiva das causas eficientes é o amor, a
concepção e a gestação do embrião ou do feto a procriar, e o efeito é o feto
mesmo procriado; entretanto, embora o fim, a causa e o efeito marchem
sucessivamente como três, contudo no amor de procriar, e interiormente em
cada uma das causas, e no efeito mesmo, eles fazem um; são somente as causas
eficientes que marcham através do tempo,porque estão na natureza, o fim ou a
vontade, ou o amor, permanece continuamente o mesmo; pois os fins, na
natureza,marcham através do tempo sem o tempo, mas não podem se produzir
e se manifestar, antes que o efeito ou o uso exista e se torne agente; antes disso,
este amor não pode amar senão a progressão, mas não pode nem se afirmar
nem se fixar. Q ue exista períodos de tais progressões, e que por eles haja
conservação da criação no estado que foi provido, isso é notório. M as a série do
amor dos filhos, desde seu mais alto grau até ao mais baixo, assim até ao termo
no qual se detém ou cessa, é retrograda, pois que este amor é segundo o
decrescimento da inocência no indivíduo,e também em razão dos períodos.
402 - X III.O Amor dos filhos desce e não sobe.
Isto é, desce de geração em geração, ou dos filhos e das filhas aos netos e às
netas,e não sobe destes aos pais e às mães de família; isso é bem sabido.A causa
de seu crescimento nas descida é o amor de frutificar ou de produzir usos; e,
quanto ao gênero humano é o amor de se multiplicar; mas isso tira sua origem
unicamente do Senhor, visto que Ele M esmo, na multiplicação do gênero
humano, considera a conservação da Criação, e como fim último da Criação, o
Céu Angélico, que é composto unicamente do gênero humano; e como o Céu
Angélico é o fim dos fins, e por conseguinte o amor .dos amores do Senhor, é
por isso que nas almas dos homens foi implantado o amor não somente de
procriar, mas também de amar as cousas procriadas nas sucessões; daí vem
também que este amor é dado somente aos homens, e não a besta alguma, nem
a ave alguma. Q ue ete amor no homem desce acrescendo-se, é também pela
300

glória da honra, que igualmente se acresce nele segundo as alimentações; que o


amor da honra e da glória recebe em si o amor dos filhos, que influi do Senhor,
e o faça como seu,ver-se-á no Artigo X V I,adiante.
403 - X IV . U m é o estado do amor nos esposos antes da concepção, e outro é
ele depois da concepção,até ao nascimento.
Isto é apresentado aqui a fim de que se saiba que o amor de procriar, e em
conseqüência o Amor do que foi procriado, foram impressos no amor conjugal
nas mulheres, e que estes dois amores nelas são divididos, quando o fim, que é
o amor de procriar, começa sua progressão; que então o Amor estorge seja
transferido da esposa para o marido, e que então também o Amor de procriar,
que na mulher faz um com seu amor conjugal, isso é evidente por vários
indícios.
404 - X V . O Amor conjugal é conjunto nos pais com o amor dos filhos por
causas espirituais,e daí por causas naturais.
As causas espirituais são, que o G ênero H umano seja multiplicado, e que por
ele o Céu angélico seja aumentado, que assim nascem homens que se tomarão
Anjos, servindo ao Senhor fazendo usos no Céu, e também nas terras por suas
consociações com os homens; pois a cada homem foram, pelo Senhor,
associados Anjos com os quais há uma tal conjunção, que se fossem retirados, o
homem sucumbiria imediatamente.As causas naturais da conjunção destes dois
amores são, que nasçam homens que executem usos nas sociedades humanas, e
que aí sejam incorporados como membros. Q ue estas causas naturais e estas
causas espirituais pertençam ao amor dos filhos e ao amor conjugal, os esposos
mesmos o pensam também e por vezes o declaram, dizendo que enriqueceram
o Céu com tantos Anjos quantos descendentes tiveram, e que forneceram para
ornamento da Sociedade tantos servidores quantos filhos tiveram.
405 - X V I. O Amor das criancinhas e das crianças é um nos esposos espirituais
e outro nos esposos naturais.
N os esposos espirituais o amor das criancinhas é, quanto à aparência,
semelhante ao amor destas crianças nos esposos naturais; mas ele é interior e
por conseguinte mais terno, porque este amor vem da inocência e de uma mais
próxima percepção da inocência,e assim de uma mais presente percepção neles,
pois os espirituais são espirituais da forma como participam da inocência. M as
os pais espirituais, depois de terem provado a doçura da inocência em seus
filhinhos,amam seus filhos de modo inteiramente diferente dos pais e das mães
naturais; os espirituais amam os filhos segundo a inteligência espiritual e a vida
moral destes, assim os amam pelo seu temor a Deus e sua piedade efetiva ou
piedade da vida, e ao mesmo tempo por sua afeição e sua aplicação aos usos
servindo à Sociedade, assim por suas virtudes e suas boas obras; é
principalmente segundo o amor destas cousas que eles provêm e satisfazem as
necessidades de seus filhos; é por isso que se não vêem neles essas qualidades, se
301

desprendem deles, e não fazem por eles senão o que é de seu dever. N os pais e
mães naturais, o amor dos filhinhos vem também da inocência, é verdade, mas
esta inocência recebida por eles é enrolada em torno de seu próprio amor, e por
conseguinte é por este amor e ao mesmo tempo por esta inocência, que amam
seus filhinhos,que os beijam, os abraçam, os carregam, os apertam de encontro
ao peito,e os acariciam excessivamente, e que os consideram como fazendo um
só coração e uma só alma com eles; em seguida após o estado de sua infância
até à puberdade e além, quando a inocência não opera mais, eles os amam, não
pelo temor a Deus e a piedade efetiva ou piedade na vida, nem por alguma
inteligência racional e moral neles, e pouco olham, ou mal olham para suas
afeições internas, e por conseguinte para as suas virtudes e os seus bons
costumes, mas unicamente para as cousas externas, às quais são favoráveis; a
isso adjuntam, ligam e juntam seu amor; por conseguinte, fecham mesmo os
olhos a seus vícios,desculpando-os e favorecendo-os; a razão disso é que neles o
amor dessa progenitura é também o amor deles mesmos, e este amor se liga ao
indivíduo no exterior e não entra nele como ele mesmo não entra em si.
406 - A qualidade do amor das criancinhas e do amor das crianças nos esposos
espirituais, e a qualidade destes dois amores nos esposos naturais, são
claramente discernidas pelo estado deles depois da morte; com efeito, a maior
parte dos pais, quando chegam ao mundo dos espíritos, se recordam de seus
filhos que morreram antes deles, e por isso se encontram em presença uns doa
outros, e se reconhecem mutuamente. O s pais espirituais lançam somente suas
vistas sobre eles e se informam em que estado estão; e se regozijam se a sua
sorte é feliz, e se afligem se é infeliz; e após uma conversação, uma instrução e
um aviso sobre a vida moral-celeste, separam-se deles, e antes da separação lhes
ensinam que não devem mais se lembrar déles como Pais, porque o Senhor é o
único Pai para todos no Céu, segundo Suas palavras M ateus X X III, 9; e de
modo algum se lembrarão deles como filhos. Q uanto aos pais naturais, desde
que, depois da morte, se vêem vivos, e trazem à memória seus filhos que
morreram antes deles, e que segundo seu desejo ficam em presença uns dos
outros, se conjuntam imediatamente, se conservam ligados como feixes ligados
em conjunto e então o pai cont1nuamente acha prazer em vê-los e conversar
com eles; se se disser ao pai que alguns de seus filhos aí presentes são satanases,
e que prejudicaram aos bons, ele os retém, não obstante, grupados em torno de
si,ou em grupo diante de si; se ele mesmo vê que eles causam danos e cometem
más ações, não prestam atenção a isso, e não separa nenhum deles de si;
portanto para que um tal grupo perigoso não permaneça lá, são por necessidade
enviados juntos para o inferno, e lá o pai é encerrado diante dos filhos em uma
prisão,e os filhos são separados, e enviados cada um ao lugar que convém à sua
vida.
407 - Ao que precede ajuntarei uma cousa surpreendente, é que no M undo
espiritual, vi pais que encaravam com ódio, e como com furor, crianças
302

oferecidas a seus olhos, e com tantas ferocidade que, se pudessem, teriam


querido massacrá-las; mas desde que se lhes dizia, por artifício, que eram seus
próprios filhos, imediatamente seu furor e sua ferocidade cessavam, e eles os
amavam perdidamente. Este amor e este ódio estão juntos naqueles que, no
M undo, foram interiormente trapaceiros, e tinham feito de sua mente um
inimigo do Senhor.
408 - X V II. N os espirituais este amor vem do interior ou do anterior, mas nos
naturais vem do exterior ou do posterior.
Pensar e concluir pelo interno e o anterior, é pelos fins e as causas pensar e
concluir os efeitos; mas pensar e concluir pelo exterior e o posterior, é pelos
efeitos pensar e concluir as causas e os fins; esta progressão é contra a ordem,
mas aquela é segundo a ordem; pois pensar e concluir pelos fins e as causas, é
pelos bens e os veros, claramente vistos na região superior da mente, pensar e
concluir os efeitos na região inferior; a racionalidade humana mesma é tal por
criação; mas pensar e concluir pelos efeitos, é, pela região inferior da mente
onde estão os sensuais do corpo com suas aparências e suas ilusões, conjeturar
as causas e os fins o que em si não é outra cousa senão confirmar as falsidades e
as cobiças, e após a confirmação ver e crer que elas são verdades da sabedoria e
bondades do amor da sabedoria. Dá-se o mesmo com o amor das criancinhas e
das crianças nos espirituais e nos naturais; os espirituais as amam pelo interior,
assim segundo a ordem; mas os naturais as amam pelo posterior, assim contra a
ordem. Estas observações foram apresentadas somente para a confirmação do
Artigo precedente.
409 - X V III.É daí que este amor está nos esposos que se amam mutuamente, e
também nos esposos que não se amam de modo algum.
Por conseqüência nos naturais do mesmo modo que nos espirituais; mas nestes
há amor conjugal, enquanto que naqueles, ele não é mais que aparência e
fingimento. Se entretanto, o amor das criancinhas e o amor conjugal fazem
um, é porque em toda mulher foi implantado, por criação, o amor conjugal, e
ao mesmo tempo, com ele, o amor de procriar, que se fixa e acumula no filho
procriado, e é comunicado das mulheres aos homens; como foi dito acima; daí
vem que nas casas onde não existe o amor conjugal entre marido e esposa,
sempre há entretanto na esposa o amor de procriar, e por este amor alguma
conjunção externa com o marido. É por esta mesma causa, que mulheres
debochadas amam também seus filhos; pois o que foi implantado por criação
nas almas,e que concerne à propagação,é indelével e não pode ser extirpado.
410 - X IX . O amor dos filhos permanece depois da morte, principalmente nas
mulheres.
Desde que as crianças são resuseitadas, o que acontece imediatamente após a
sua morte, são elevadas ao Céu e dadas a Anjos do sexo feminino que, na vida
de seus corpos, no M undo, amaram as crianças, e ao mesmo tempo temeram a
303

Deus; como amaram todas as crianças com uma ternura maternal, as recebem
como suas,e as crianças então,como por sentimento inato, as amam do mesmo
modo que a suas mães; há em casa delas tantas crianças quantas desejam,
segundo o estorge espiritual. O Céu, onde estão as crianças, aparece sobre a
frente vis-a-vis da fronte,
na linha ou raio segundo o qual os Anjos olham diretamente o Senhor; lá está
situado este Céu, porque todas as crianças estão sob o auspício imediato do
Senhor; o Céu da inocência, que é o terceiro Céu, influi também sobre elas;
depois de passada esta primeira idade, são transportadas para um outro Céu,
onde são instruídas.
411 - X X . As crianças são criadas por elas sob, o auspício do Senhor, e crescem
em estatura e em inteligência como no M undo.
As crianças no Céu são educadas desta maneira: Aquela que é encarregada de as
educar lhes ensina a falar; sua primeira linguagem é unicamente um som de
afeição, no qual entretanto há alguma cousa do pensamento, pelo que o
humano no som é distinguido do som do animal; esta linguagem torna-se
gradativamente mais distinta, à medida que as idéias provenientes da afeíção
entram no pensamento; todas as suas afeições, que crescem também, procedem
da inocência; a princípio lhes são insinuadas cousas que aparecem diante dos
olhos, e que são agradáveis; e como estas cousas são de origem espiritual, nelas
influem ao mesmo tempo cousas que são do Céu, pelas quais os interiores de
sua mente são abertos. Em seguida, à medida em que são aperfeiçoadas em
inteligência, as crianças crescem em estatura, e são por isso vistas mais adultas
quanto à inteligência; a razão disso, é que a inteligência e a sabedoria são o
alimento espiritual mesmo; é por isso que estas cousas que alimentam suas
mentes, alimentam também seus corpos. M as as crianças no Céu não crescem
além da primeira juventude, aí param e aí permanecem eternamente; e quando
estão nessa idade, são dadas em casamento, ao que é provido pelo Senhor, e o
casamento é celebrado no Céu onde reside o mancebo, que imediatamente
segue a esposa ao seu Céu,ou à sua casa,se estão na mesma sociedade.Para que
eu tivesse inteira certeza de que as crianças crescem e aumentam em estatura do
mesmo modo que em inteligência, me foi permitido falar com algumas quando
ainda eram crianças, e mais tarde com as mesmas quando se tinham tornado
grandes, e eu vi mancebos de uma estatura semelhante à dos mancebos no
M undo.
412 - As crianças são instruídas principalmente por meio de R epresentativos
adequados e conforme ao seu gênio; e mal se poderia crer no M undo quanto
estes representativos são belos e ao mesmo tempo cheios de uma sabedoria
interior; é-me permitido referir aqui dois R epresentativos,pelos quais se poderá
julgar os outros. U m dia, representavam o Senhor subindo do sepulcro, e ao
mesmo tempo a união de Seu H umano com o Divino; primeiro apresentavam
a idéia do sepulcro, mas não ao mesmo tempo a idéia do Senhor, a não ser de
304

tal modo afastada, que mal se percebia que era o Senhor senão como de longe,
e isso porque a idéia do sepulcro encerra alguma cousa de fúnebre que eles
afastavam assim; em seguida introduziam com prudência no sepulcro uma
espécie de atmosfera que parecia todavia como ligeiramente aquosa, pela qual
significavam, também por meio de afastamento conveniente, a vida espiritual
no Batismo. Eu os vi em seguida representar a descida do Senhor para os que
estavam nas prisões, e Sua ascenção ao Céu com eles; e, o que era infantil, é
que faziam descer fios quase imperceptíveis, muito finos e muito flexíveis, com
os quais sustentavam o Senhor em Sua ascençâo, estando sempre em um santo
temor de que alguma parte de seu representativo não tocasse em alguma cousa
que não encerrasse o celeste. Além de outras representações, pelas quais são ao
mesmo tempo conduzidos aos conhecimentos do vero e às afeições do bem,
como por brinquedos conformes aos caracteres das crianças. As crianças são
levadas a estas cousas e a outras semelhantes pelo Senhor, por meio da
inocência que atravessa o terceiro Céu; e assim os espirituais são insinuados em
suas afeições e daí em seus tenros pensamentos, de maneira que estas crianças
não sabem outra cousa senão que fazem e pensam tais cousas por si mesmas;
por aí é iniciado o seu entendimento.
413 - X X I. Lá, é provido pelo Senhor a que a inocência da infância se torne a
inocência da sabedoria.
M uitas pessoas podem crer que as crianças permanecem crianças, e se tornam
Anjos imediatamente após a morte; mas é a inteligência e a sabedoria que fazem
o Anjo; é por isso que enquanto as crianças não as possuem, estão, é verdade,
entre os Anjos, mas não são Anjos; elas se tornam Anjos desde que se tornam
inteligentes e sábias. As crianças são conduzidas da inocência da infância à
inocência da sabedoria, isto é, da inocência externa à inocência interna; esta
inocência é o fim de toda sua instrução e de toda sua progressão; é por isso
que,, quando atingem a inocência da sabedoria, a inocência da infância, que
lhes tinha durante esse tempo, servido de plano, lhes é adjunta. V i representar
qual é a inocência da infância por alguma cousa de lenhosa, quase privada de
vida, e que é vivificada à medida em que as crianças se embebem de
conhecimentos do vero e da afeição do bem; e em seguida foi representada qual
é a inocência da sabedoria por uma criança viva e nua; os Anjos do terceiro
Céu, que estão pelo Senhor, mais que todos os outros, no estado de inocência,
aparecem como crianças num aos olhos dos espíritos que estão abaixo dos
Céus, e como são mais sábios que todos os outros, são também mais vivos; a
razão disso é que a inocência corresponde à infância e também à nudez; é por
isso que se diz de Adão e de sua esposa, quando estavam no estado de
inocência, que estavam nus e não se envergonhavam, mas que depois que
perderam seu estado de inocência, se envergonharam de sua nudez e se
esconderam, (G ênesis II, 25; III, 7, 10, 11); em uma palavra, quanto mais os
Anjos são sábios, tanto mais são inocentes. Q ual é a Inocência da sabedoria,
305

pode-se vê-lo de alguma forma, pela inocência da infância descrita acima, nº


395, desde que em lugar dos pais se ponha como Pai o Senhor, por Q uem são
conduzidas e a Q uem referem todas as cousas que recebem.
414 - T ive, a respeito da Inocência, diversas conversações com os Anjos, e eles
me disseram que a Inocência é o Ser de todo bem, e que o bem não é o bem
senão tanto quanto há nele inocência; e que a sabedoria,porque pertence à vida
e por conseguinte ao bem, não é a sabedoria senão tanto quanto participa da
inocência; semelhantemente o amor, a caridade e a fé; e que daí vem que
ninguém pode entrar no Céu, se não há nele a inocência; e que isto é
entendido por estas palavras do Senhor: "Deixai as criancinhas vir a mim e não
as impeçais, pois aos que são tais pertence o R eino dos Céus. Em verdade, vos
digo, que quem quer que não receber o R eino dos Céus como uma criancinha,
aí não entrará", (M ateus X , 14 e 15; Lucas X V III, 16 e 17); aí, como também
em outras paxtes da Palavra, pelas criancinhas são entendidos aqueles que estão
na inocência. A razão pela qual o bem não é o bem senão tanto quanto há
inocência nele, é que todo bem vem do Senhor e que a inocência é ser
conduzido por Ele.
415 - Ao que precede será acrescentado este M emorável: U ma manhã, ao
acordar, meditando em uma luz matinal e serena, antes da plena vigília, vi
através da janela, como um brilhante relâmpago, e imediatamente após ouvi
um retumbante trovão; como me perguntasse donde vinha isso, ouvi do Céu,
estas palavras: "São alguns espíritos que, não longe de ti, raciocinam com
encarniçamento sobre Deus e sobre a N atureza; a vibração da luz semelhante a
um relâmpago, e o abalo do ar semelhante a um trovão, são correspondências e
por conseguinte as aparências do combate e da colisão dos argumentos, de um
lado por Deus, e de outro lado pela N atureza". A causa deste combate
espiritual era esta: H avia no inferno alguns Satanases que tinham dito entre si:
"Q ue pena não nos ser permitido conversar com os Anjos do Céu! N ós lhes
demonstraríamos de uma maneira completa e absoluta que a N atureza é o que
eles chamam Deus de quem tudo procede, e que assim Deus é unicamente
uma palavra, a não ser que por Deus se entenda a N atureza". E como estes
Satanases tinham acreditado nisso de todo o seu coração e de toda a sua alma, e
também por isso tinham desejado conversar com os Anjos do Céu, lhes tinha
sido permitido subir da lama e das trevas do Inferno, e conversar com dois
Anjos que acabavam de descer do Céu; a cena se passava no M undo dos
espíritos,que fica no meio entre o Céu e o Inferno. Aí, os Satanases tendo visto
estes Anjos, acorreram com velocidades e gritaram com uma voz furiosa: "Sois
os Anjos do Céu com os quais nos é permitido encontrar para raciocinar sobre
Deus e sobre a N atureza? Sois chamados sábios porque reconheceis Deus; mas,
oh! Como sois simples! Q uem viu Deus? Q uem compreende o que é Deus?
Q uem concebe que Deus governe e possa governar o U niverso, e todas e cada
uma das coisas que ele encerra? Q uem reconhece, a exceção da populaça e do
306

vulgo, aquilo que não vê e não compreende? O que há de mais evidente senão
que a N atureza é tudo em tudo? Q uem viu com os olhos outra cousa que não
fosse a N atureza? Q uem ouviu com os ouvidos outra cousa que não fosse a
N atureza? Q uem cheirou com as narinas outra coisa que a N atureza? Q uem
saboreou com a língua outra cousa que não fosse a N atureza? Q uem sentiu
pelo tato outra cousa que não fosse a natureza? O s sentidos de nosso corpo não
são as únicas testemunhas das verdades? Q uem não pode por elas jurar que tal
cousa é de tal maneira? As vossas cabeças não estão na N atureza? De onde vem
o influxo dos pensamentos das cabeças, senão da N atureza? Se a N atureza fosse
retirada, poderíeis pensar alguma cousa?" Além de muitos outros argumentos
da mesma espécie. O s Anjos depois de os haverem escutado, responderam:
"Falais assim, porque sois internamente sensuais; nos Infernos, têm as idéias
dos pensamentos mergulhadas nos sentidos do corpo, e não podem elevar as
mentes acima destes sentidos, por isso nós vos perdoamos; a vida do mal e em
conseqüência a fé do falso fecharam os interiores de vossa mente, ao ponto de
em vós a elevação acima dos sensuais não ser possível, senão em um estado
afastado dos males da vida e dos falsos da fé; pois um Satanás pode, do mesmo
modo que um Anjo, compreender o vero quando o ouve pronunciar, mas não
o retém, porque o mal oblitera o vero e introduz o falso; mas percebemos que
vós, no momento, estais neste estado afastado, e que assim podeis compreender
o vero que nós percebemos; prestai pois atenção às palavras que vamos dizer".
E disseram: "Estivestes no M undo natural, e lá morrestes, e agora estais no
M undo espiritual; soubestes antes alguma cousa sobre a vida após a morte?
N ão,a negastes e não vos fizestes semelhantes às bestas? Soubestes antes alguma
cousa sobre o Céu e o Inferno,alguma cousa sobre a luz e o calor deste mundo?
Sobre o fato de que não estais mais dentro da N atureza, mas acima da
N atureza? Pois este M undo, e tudo que ele encerra, é espiritual, e os espirituais
estão acima dos naturais, a um tal ponto que a menor cousa da N atureza não
pode mesmo influir neste M undo; mas vós, porque acreditais a N atureza Deus
ou Deusa, acreditais também que a luz e o calor deste M undo são a luz e o
calor do M undo natural, quando entretanto não o são em cousa alguma; pois a
luz natural é aqui obscuridade, e o calor é aqui o frio; soubestes alguma cousa
do Sol deste M undo,de onde procedem a nossa Luz e o nosso Calor? Soubestes
que este Sol é puro Amor, e que o Sol do M undo natural é puro fogo?
Soubestes que o Sol do M undo, que é puro fogo, é aquilo pelo qual a N atureza
existe e subsiste, e que o Sol do Céu, que é puro Amor, é aquilo pelo qual
existe e subsiste a V ida mesma que é o Amor unido à Sabedoria; e que assim a
N atureza, que fazeis Deus ou Deusa, é inteiramente morta? Podeis, se vos fôr
dado um guarda, subir conosco ao Céu, e nós podemos, se nos fôr dado um
guarda, descer convosco ao Inferno, e vereis no Céu objetos magníficos e
resplandecentes, e no Inferno objetos disformes e imundos; estas diferenças
vêm de que nos Céus todos adoram a Deus, e que nos Infernos todos adoram a
N atureza; estes objetos magníficos e resplandecentes nos Céus são as
307

correspondências das afeições do bem e do vero, e estes objetos disformes e


imundos nos Infernos, são as correspondências das cobiças do mal e do falso.
Por todas estas considerações, conclui, agora, se é Deus ou a N atureza, que é
tudo em tudo".A isto estes Satanases responderam:"N o estado em que estamos
agora, podemos pelo que acabamos de ouvir concluir que é Deus, mas quando
o prazer do mal se apodera de nossas mentes, não vemos senão a natureza".
Estes dois Anjos e estes dois Satanases estavam não longe de mim, à direita, por
isso eu os vi e ouvi; e eis que vi em torno deles um grande número de Espíritos
que, no M undo natural, tinham sido célebres por sua erudição, e eu estava
admirado destes Espíritos ficarem ora perto dos Anjos, ora perto dos Satanases,
e se declaravam por aqueles perto dos quais estavam; e me foi dito: "As suas
mudanças de posição são mudanças de estado de suas mentes, que favorecem
ora um partido ora outro, pois são V ertunmos; e nós te diremos o mistério:
Lançamos nossas vistas sobre a terra em direção aos homens eruditos, que por
seu julgamento pensaram sobre Deus e sobre a N atureza; e sobre mil achamos
seiscentos pela N atureza e os outros por Deus, mas estes eram por Deus,
porque tinham falado d'Ele freqüentemente não por algum entendimento, mas
unicamente pelo que tinham ouvido dizer que a N atureza vem de Deus, e
porque uma linguagem habitual pela memória e a reminiscência, e não ao
mesmo tempo pelo pensamento e a inteligência, produz uma espécie de fé".
Depois disso,uma guarda foi dada aos Satanases, e eles subiram ao Céu com os
dois Anjos, e viram objetos magníficos e resplandecentes, e estando então na
ilustração pela luz do Céu, reconheceram que há um Deus, e que a N atureza
foi criada para servir de instrumento à vida que está em Deus e procede de
Deus,e que a N atureza em si mesma é morta, e que assim, por ela mesma, não
tem atividade alguma, mas que é posta em ação pela vida. Depois de ter visto e
percebido estas cousas, eles desceram; e quando desciam, o amor do mal
voltou, e fechou seu entendimento em cima e o abriu em baixo, e então acima
apareceu como um véu lançando relâmpagos de um fogo infernal; e logo que
seus pés tocaram a terra, o solo se entreabriu sob eles, e recaíram no meio dos
seus.
416 - Depois disso, estes dois Anjos, vendo-me perto deles, disseram de mim
aos que nos cercavam: "Sabemos que este homem escreveu sobre Deus e sobre
a N atureza, ouçamo-lo". E se aproximaram e pediram que as cousas que
tinham sido escritas sobre Deus e sobre a N atureza fossem lidas diante deles; e
eu li em conseqüência o que segue:"O s que crêem na Divina operação em cada
cousa da natureza, podem, por um grande número de fatos que vêem na
N atureza, se confirmar pelo Divino, tanto e mesmo mais do que os que se
confirmaram pela N atureza; aqules, com efeito, que se confirmaram pelo
Divino prestam atenção às M aravilhas que se percebe tanto na Produção dos
V egetais, como na dos Animais; nas Produções dos V egetais, no fato de que de
uma sementinha lançada em terra, sai uma raiz, pela raiz uma haste, e
sucessivamente ramos, folhas, flores, frutos, até novas sementes, absolutamente
308

como se a semente soubesse a ordem de sucessão, ou o processo pelo qual ela


deve se renovar. U m homem racional pode pensar que o Sol, que é puro fogo,
saiba isso, ou possa insinuar ao seu calor e à sua luz que façam tais cousas, e
que possa aí fornecer estas maravilhas e ter em vista o uso? Q uando o homem
cujo racional vê estas maravilhas e as examina atentamente, não pode fazer
outra cousa senão pensar que elas vêm d'Aquele cuja sabedoria é infinita, por
conseguinte de Deus; aqueles que reconhecem o Divino vêem também isso e o
pensam; mas aqueles que não o reconhecem, não o vêem, e não o pensam,
porque não o querem, e assim abaixam seu racional para o sensual que tira
todas as suas idéias das aparências em que estão os sentidos do corpo, e
confirmam suas ilusões, dizendo: N ão se vê o Sol operar estas cousas por seu
calor e por sua luz? O que não vemos, o que é? É alguma cousa? O s que se
confirmam pelo Divino prestam atenção às maravilhas que vêem nas Produções
dos Animais; e para não falar aqui senão nas que estão nos O vos, eles aí vêem o
filhote oculto em seu germe, ou começo, com tudo o que é necessário à
eclosão, e também com tudo concerne ao crescimento após à eclosão até que se
torne ave ou volátil na forma daquele que o engendrou; e,se se presta atenção à
forma, ela é tal que não se pode, se se pensa profundamente, deixar de ser
tomado de surprêsa, descobrindo que nos maiores como nos menores, nos
invisíveis como nos que são visíveis,isto é,nos menores insetos como nas aves e
nos maiores animais,há órgãos dos sentidos, que são a vista, o ouvido, o olfato,
o paladar, o tato; e os órgãos dos movimentos, que são os músculos, pois eles
voam e andam; além disso as vísceras em torno do coração e do pulmão, que
são postos em atividade pelo cérebro. Q ue vis insetos tenham também uma tal
organização, isso é sabido pela anatomia que foi descrita por alguns sábios,
sobretudo por Sw anmerdam em sua Bíblia da N atureza. Aqueles que atribuem
tudo à N atureza vêem, é verdade, tais cousas, mas pensam somente que elas
são,dizem que a N atureza as produz, e dizem isso, porque afastaram sua mente
de todo pensamento sobre o Divino; e aqueles que se afastaram de todo
pensamento sobre o Divino quando vêem maravilhas na natureza não podem
pensar nelas racionalmente, nem com mais forte razão, espiritualmente, mas
pensam nisso sensualmente e materialmente, e então pensam na N atureza pela
natureza, e não acima da natureza, da mesma maneira que os que estão no
inferno,diferindo das bestas unicamente pelo fato de gozarem da racionalidade,
isto é,porque podem compreender,e assim pensar de outro modo se quiserem.
Q uando aqueles que se afastaram de todo pensamento sobre o Divino vêem
maravilhas na N atureza e por isso se tornam sensuais, não pensam que a vista
do olho é tão grosseira que vê vários pequenos insetos como uma única cousa
obscura, e que entretanto cada pequenino inseto foi organizado para sentir e
para se mover, e que assim foi dotado de fibras e de vasos, e também de
pequenos corações, de canais pulmonares, de pequenas vísceras e cérebros, e
que estes órgãos foram tecidos das mais puras substâncias que estão na
natureza, e que estes tecidos correspondem a alguma cousa da vida, pela qual
309

suas partes mais sutis são distintamente postas em ação.Pois que a vista do olho
é tão grosseira, que um grande número destes insetos, como as partes inúmeras
que cada um encerra, aparecem como um pequeno ponto obscuro, e que
entretanto os que são sensuais pensam e julgam segundo esta vista, vê-se
claramente quanto sua mente se tornou espessa, e por conseguinte em que
obscuridade eles estão sobre as coisas espirituais.
417 - "Cada um pelas cousas visíveis na natureza pode se confirmar pelo
Divino, se quiser; e também se confirma aquele que pensa em Deus segundo a
V ida, por exemplo, quando vê os V oláteis do Céu; cada espécie conhece seus
alimentos e sabe onde estão, conhece seus semelhantes pelo som e pela vista, e
entre os outros, os que são amigos e os que são inimigos; formam casamentos,
conhecem o lugar do acasalamento, constroem ninhos com arte, aí põem seus
ovos, os chocam, sabem o tempo de incubação, quando acaba, fazem sair dos
ovos os filhotes que amam com ternura, aquecem-nos sob as asas,
preparam-lhes alimento, e lhes dão o biscate, e isto até que estejam em estado
de agir por si mesmos, e possam fazer como eles e procriar uma família para
perpetuar a raça. Q uem quer pensar no influxo Divino vindo pelo M undo
espiritual ao M undo natural, pode ver este influxo nestas ciências; pode
também, se quiser, dizer em seu coração: O Sol não pode dar tais ciências a
estes voláteis pelos raios de sua luz, pois o Sol de onde a N atureza se origina e
tira sua essência, é puro fogo, e por conseguinte os raios de sua luz são
absolutamente mortos; e assim pode-se concluir que tais cousas vêm do influxo
da Divina Sabedoria nos últimos na natureza.
418 - "Cada um pelas cousas visíveis na N atureza pode se confirmar pelo
Divino quando vê os V ermes que, pelo prazer de um certo amor, são levados e
aspiram a mudar seu estado terrestre em um estado que é análogo ao estado
celeste, e para isso se arrastam para lugares convenientes e se metem como em
um útero a fim de renascer, e aí se tornam crisálidas, aurélios, ninfas, e enfim
borboletas; e quando sofreram esta M etamorfose, e, segundo sua espécie, foram
decorados com asas magníficas, voam no ar como em seu céu, ai brincam
alegremente, e formam casamentos, põem ovos, e provêm à sua posteridade; e
então se alimentam com alimento agradável e doce que tiram das flores. Entre
os que se confirmam pelo Divino pelas coisas visíveis na natureza, há alguém
que não veja nestes seres, como vermes, uma espécie de imagem do estado
terrestre do homem, e nestes mesmos seres, como borboletas, uma espécie de
imagem do estado celeste? Aqueles, ao contrário, que se confirmam pela
N atureza, vêem, é verdade, estas maravilhas; mas, como rejeitaram para longe
de si, o estado celeste do homem, eles as chamam de puros instintos da
natureza.
419 - "Cada um pelas coisas visíveis na N atureza pode se confirmar pelo
Divino, quando presta atenção a tudo que se conhece das Abelhas. Elas sabem
das plantas e das flores recolher a cera, sugar o mel, construir células como
310

pequenas casas,e dispô-las em forma de cidade, com lugares pelos quais entram
e pelos quais saem; sentem de longe o perfume das flores e das plantas, de que
recolhem a cera para a casa e o mel para alimento; e, quando estão carregadas
disso, voam segundo a plaga para sua colmeia, assim elas provêm a sua
alimentação e à sua habitação para o inverno seguinte, como se tivessem
conhecimento disso e o previssem; também põem à sua testa como rainha uma
soberana, pela qual a raça será propagada, e constroem para ela uma espécie de
palácio acima de suas células, colocando guardas em torno; quando chega o
tempo da postura, a rainha, acompanhada da guarda vai de célula em célula e
põe ovos, que a tropa que a segue cerca de um embôço para que não seja
alterado pelo ar; daí para elas uma nova raça; mais tarde, quando esta geração
chegou à idade necessária para poder fazer os mesmos trabalhos, é expulsa da
colônia; o enxame expulso, primeiro se reúne, depois se forma em massa, a fim
de que a consociação não seja rompida, e em seguida voa em busca de um
domicílio; no outono, os zangões inúteis são também expulsos e privados de
suas asas, para que não voltem e consumam os alimentos, para cujo
aprovisionamento não cooperaram em cousa alguma; sem falar de vários outros
fatos notáveis; por isto pode-se ver que é em razão do uso, prestado por elas ao
G ênero H umano, que recebem do influxo pelo M undo espiritual uma forma
de govêrno,tal como existe entre os homens nas terras, e mesmo entre os Anjos
nos Céus. Q ual é o homem provido de uma razão sã, que não vê que tais
cousas nos insetos não vêm no M undo natural? O que é que o Sol, de onde
provém a N atureza, tem de comum com um governo semelhante e análogo ao
governo celeste? Por estas observações e outras semelhantes entre as bestas
brutas, aquele que reconhece e adora a natureza se confirma pela natureza,
enquanto que aquele que reconhece e adora a Deus se confirma pelo Divino,
pois o homem espiritual aí vê cousas espirituais, e o homem natural ai vê
cousas naturais,assim cada um segundo o que ele mesmo é. Q uanto ao que me
concerne, tais observações foram para mim testemunhos do influxo do
espiritual no natural, ou do M undo espiritual no M undo natural, assim
procedendo da Divina Sabedoria do Senhor. Q ue se examine agora se, a
respeito de alguma forma de govêrno, ou de alguma lei civil, ou de alguma
virtude moral, ou de alguma verdade espiritual, é possível pensar
analiticamente, a não ser que o Divino, pela Sua Sabedoria, influa pelo M undo
espiritual; quanto a mim, isso me foi e me é impossível; tenho notado, com
efeito, este influxo de uma maneira perceptível e sensível desde vinte e cinco
anos continuamente,falo portanto segundo um testemunho certo.
420 - "A N atureza pode ter por fim o uso, e dispor os usos em ordem e em
formas? Só o Sábio o pode; e não há senão Deus, em Q uem a Sabedoria é
infinita, que possa assim ordenar e formar o U niverso, que outro pode prever
para os homens o que é necessário à alimentação e ao vestuário, e prover isso; a
alimentação pelos frutos da terra, e pelos animais; ao vestuário por
estas.mesmas cousas e estes mesmos animais? N ão está no número das
311

maravilhas, que estes vis inseres, que se chamam bichos da seda, forneçam
vestuário e decorem com magnificência às mulheres e aos homens, desde as
rainhas e os réis até às camareiras e aos camareiras; e que estes vis insetos, que
se chamam abelhas, forneçam a cera para a luz que enche de esplendor os
T emplos e os Palácios? Estas cousas e muitas outras são provas existentes de que
o Senhor opera por Si M esmo pelo M undo espiritual todas as cousas que estão
na N atureza.
421 - "A isto devo acrescentar, que no M undo espiritual vi aqueles que, pelas
coisas visíveis no M undo se tinham confirmado pela N atureza até se tornaram
ateus; e que seu entendimento na luz espiritual me apareceu aberto por baixo,
mas fechado por cima; e isso,porque pelo pensamento eles olhavam para baixo,
para a terra, e não para cima, para o Céu; acima do sensual, que é o ínfimo do
entendimento, aparecia como um véu, em alguns brilhando por um fogo
infernal, em outros negro como a fuligem, e em outros lívido como um
cadáver. Q ue cada um se guarde, portanto, das confirmações pela N atureza;
mas que se confirme pelo Divino; os meios não faltam.
422 - "É verdade que alguns são desculpáveis de ter atribuido à N atureza certas
cousas visíveis; e isso porque nada souberam do Sol do M undo espiritual, onde
está o Senhor, nem do influxo que dele procede, nem cousa alguma desse
M undo e de seu estado, nem mesmo cousa alguma de sua presença no homem;
e que por conseguinte não puderam pensar senão que o espiritual era um
natural mais puro; que assim os Anjos estavam ou no éter ou nas estrelas; que a
respeito do Diabo, era ou. o mal do homem, ou, se existe efetivamente, estava
ou no ar ou nos lugares profundos, que as almas dos homens, depois da morte,
ficavam ou no íntimo da terra, ou em um não se sabe onde (ubi seu pu) até ao
dia do julgamento; e outras cousas semelhantes que a fantasia introduz por
ignorância do M undo espiritual e de seu Sol; é isto que torna desculpáveis
aqueles que acreditaram que a N atureza produz as cousas visíveis segundo um
ínsito, de criação; mas sempre acontece que aqueles que, por confirmações pela
N atureza, se fizeram ateus, não são desculpáveis, porque podiam se confirmar
pelo Divino; a ignorância desculpa, é verdade, mas não retira o falso
confirmado; pois este falso é coerente com o mal, e o mal é coerente com o
Inferno.
312

As volúpias da loucura sobre o


amor escortatório
*****************
313

Da oposição do amor
escortatório e do amor conjugal

423 - "Ao iniciar este assunto, é preciso primeiro declarar o que, neste
Capítulo, é entendido pelo Amor Escortatório: Por Amor Escortatório não é
entendido o Amor fornicatório que precede o casamento, nem o que o segue
após a morte de um dos esposos; nem a Concubinagem que se faz por causas
legitimas, justas e conscienciosas; não são entendidos também os gêneros leves
de Adultério, nem os gêneros graves, de que o homem se arrepende realmente,
pois estes não se tornam opostos ao Amor Conjugal, e aqueles não são opostos;
que não sejam opostos verse-á em seguida, quando se tratar de cada um destes
gêneros. M as, pelo Amor Escortatório oposto ao Amor Conjugal, é entendido
aquio Amor do Adultério, quando é tal que é considerado, não como pecado,
nem como mal e ação desonesta contra a razão, mas como permitido com
razão. Este Amor Escortatório faz não somente o Amor Conjugal semelhante a
ele, mas o derruba, o destrói, e por fim o toma em aversão. N este Capítulo, se
trata da oposição deste amor ao amor conjugal; que não se trata de um outro
amor, pode-se vê-lo pelos Capítulos seguintes sobre a Fornicação, a
Concubinagem e os diversos gêneros de Adultério". M as a fim de que esta
oposição seja posta em evidência diante da vista racional, ela vai ser
demonstrada nesta série: I. N ão se sabe qual é o Amor escortatório, a menos
que se saiba qual é o Amor conjugal.II.O Amor escortatório é oposto ao Amor
conjugal.III.O Amor escortatório é oposto ao Amor conjugal, como o homem
natural,considerado em si mesmo,é oposto,ao homem espiritual. IV . O Amor
escortatório é oposto ao Amor conjugal, como a conexão (connumbium) do
mal e do falso, é oposto ao casamento do bem e do vero. V . Daí, o Amor
escortatório é oposto ao Amor conjugal, como o Inferno é oposto ao Céu. V I.
A impureza do Inferno vem do Amor escortatório, e a pureza do Céu vem do
Amor conjugal. V II. Semelhantemente, na Igreja, a impureza e a pureza. V III.
O Amor escortatório faz cada vez mais o homem (homo) não homem (homo) e
não varão (vir); o Amor conjugal faz o homem cada vez mais homem (homo) e
varão (vir). IX . H á uma Esfera de amor escortatório e uma Esfera de amor
conjugal.X . A Esfera do amor escortatório sobe do Inferno, e a Esfera do amor
conjugal desce do Céu. X I. Estas duas Esferas se encontram uma com a outra
em um e outro M undo,mas não se conjuntam.X II.Entre estas duas Esferas há
um equilíbrio. X III. O homem pode se voltar para aquela que lhe agrada, mas
quanto mais se volta para uma,tanto mais se afasta da outra. X IV . U ma e outra
Esfera traz consigo prazeres. X V . O s prazeres do amor escortatório começam
pela carne, e pertencem à carne, mesmo no espírito; mas os prazeres do amor
314

conjugal começam no espírito, e pertencem ao espírito, mesmo na carne. X V I.


O s prazeres do amor escortatório são as volúpias da loucura, mas os prazeres do
amor conjugal são as delícias da sabedoria. Segue agora a Explicação dos
Artigos.
424 - I. N ão se sabe qual é o Amor escortatório, a menos que se saiba qual é o
Amor conjugal.
Por Amor escortatório é entendido o Amor do adultério que destrói o Amor
conjugal, como acima, nº 423. Q ue não se saiba qual é o Amor escortatório, a
menos que se saiba qual é o Amor conjugal, isso não tem necessidade de ser
demonstrado; é bastante ilustrá-lo por comparações; por exemplo: Q uem pode
conhecer o que é o mal e o falso, se não sabe o que é o bem e o vero? Q uem
pode conhecer o que é o incasto, o desonesto, o indecente, o feio, se não sabe o
que é o casto, o honesto, o decente e o belo? E quem pode discernir a loucura,
senão o que é sábio, ou aquele que sabe o que é a sabedoria? Além disso, quem
pode perceber com justeza os sons desarmoniosos, senão aquele que está bem
versado na ciência e no estudo dos números harmoniosos? Semelhantemente,
quem pode discernir claramente o que é o adultério, se não discerne claramente
o que é o casamento? E quem pode apresentar ao julgamento a impureza das
volúpias do amor escortatório, senão aquêle que primeiro apresentou a seu
julgamento a pureza do amor conjugal Agora que já terminei o T ratado das
Delícias da sabedoria sobre o Amor conjugal, passo pela inteligência adquirida
com isso,descrever as V olúpias da loucura sobre o Amor escortatório.
425 - II.O Amor escortatório é oposto ao Amor Conjugal.
N ão há no U niverso uma única cousa que não tenha seu oposto, e os opostos
são, um em relação ao outro, não relativos, mas contrários; os relativos existem
entre o máximo e o mínimo de uma mesma cousa, mas os contrários vêm do
oposto contra eles, e estes, uns em relação aos outros, são relativos, do mesmo
modo que aqueles; as relações, portanto, são também, elas mesmas, opostas.
Q ue todas as cousas, em geral e em particular, tenham seus opostos, isso é
evidente pela luz, pelo calor, pelos tempos do mundo, pelas afeições, as
percepções, as sensações, e muitas outras cousas; o oposto da luz é a
obscuridade, o oposto do calor é o frio; os opostos dos tempos do mundo são o
dia e a noite, o verão e o inverno; os opostos das afeições são os júbilos e as
aflições, as alegrias e as tristezas; os opostos das percepções são os bens e os
males, os veros e os falsos; e os opostos das sensações são os prazeres e os
desprazeres; daí se pode concluir com toda evidência, que o amor conjugal tem
seu oposto; que este oposto seja o adultério, cada um, se quiser, pode vê-lo
segundo todos os ensinamentos de uma razão sã; dizei, se puderdes, que outra
cousa é seu oposto; há mais, é que, como a sã razão pode por sua própria luz
ver claramente isso, ela estabeleceu leis, que são chamadas leis civis da justiça,
em favor dos casamentos e contra os adultérios. Para que se torne ainda mais
manifesto que o casamento e o adultério são opostos, é-me permitido relatar o
315

que vi muitas vezes no M undo espiritual: Q uando aqueles que, no M undo


natural, foram adúlteros segundo um princípio confirmado, percebem a esfera
do Amor conjugal decorrente do Céu, imediatamente fogem para cavernas e aí
se escondem, ou, se se obstinam contra ela, são tomados de furor e se tornam
como fúrias; se é assim, é porque no M undo espiritual tudo que é agradável ou
desagradável às afeições é percebido, e por vezes tão claramente como o odor é
percebido pelo olfato, pois não se tem aí um corpo natural que absorve estas
espécies de cousas. M as se a oposição, do amor escortatório e do amor conjugal
é ignorada por muitas pessoas no M undo natural, isso é devido aos prazeres da
carne que imitam, em aparência, os prazeres do Amor conjugal nos extremos, e
os que estão nos prazeres somente nada sabem desta oposição; e posso assegurar
que se dissesse que cada cousa tem seu oposto, e concluísse que o Amor
conjugal também tem o seu, os adúlteros responderiam que este Amor não tem
oposto, porque o Amor escortatório não se distingue dêle em sentido algum;
daí é ainda evidente que aquele que não sabe qual é o amor conjugal, não sabe
qual é o amor escortatório; e há mais, pelo amor escortatório não se sabe qual é
o amor conjugal, mas pelo amor conjugal sabe-se qual é o amor escortatório;
ninguém pelo mal conhece o bem, mas pelo bem conhece o mal; pois o mal
está na obscuridade,mas o bem está na luz.
426 - III. O Amor escortatório é oposto ao Amor conjugal, como o homem
natural,considerado em si mesmo,é oposto ao homem espiritual.
Q ue o homem natural e o homem espiritual sejam opostos um ao outro, ao
ponto de um não querer o que o outro quer, e de combaterem mesmo um
contra o outro, isso é sabido na Igreja, mas entretanto não foi explicado;
portanto vai ser dito o que separa o homem espiritual e o homem natural, e
excita este contra aquele. O homem natural, é aquele em que cada um, ao
crescer, é introduzido primeiro, o que se faz pelas ciências e pelos
conhecimentos,e pelos racionais do entendimento; o homem espiritual,porém,
é aquele em que se é introduzido pelo amor de fazer usos, amor que também é
chamado caridade; é por isso que, quanto mais alguém está na caridade, tanto
mais è espiritual, mas quanto mais não se está na caridade, tanto mais se é
natural, ainda mesmo que se tenha um gênio perspicaz e um julgamento sábio.
Q ue este homem, que é chamado natural, separado do homem espiritual,
qualquer que seja a sua elevação na luz da razão, põe-se, não obstante, sob a
direção de seus desejos libidinosos e a eles se entrega, vê-se claramente só por
sua tendência, pelo fato de lhe faltar caridade; e aquele que tem falta de
caridade se abandona a todas as lascívias do amor escortatório; é por isso que se
lhe dizem que este amor libidinoso é oposto ao casto Amor conjugal, e lhe
pedem para consultar sua luminosidade racional, ele não consulta entretanto
esta luminosidade senão em conjunção com o prazer do mal gravado de
nascença no homem N atural, o que faz concluir que sua razão nada vê de
contrário aos doces atrativos sensitivos de seu corpo; e depois de se ter
316

confirmado nisso, sua razão se admira de todas estas coisas doces que são ditas
do Amor conjugal; mais ainda, combate contra elas, como foi dito acima, e
triunfa; e, do mesmo modo que um vencedor após a carnificina destrói desde
os extremos até aos íntimos o campo do Amor conjugal nele; eis o que faz o
homem natural segundo seu Amor escortatório. Isto é dito para que se saiba de
onde vem a oposição de estes dois amores; pois como já foi mostrado em
muitos lugares, o Amor conjugal, considerado em si mesmo, é um Amor
espiritual, e o Amor escortatório, considerado em si mesmo, é um Amor
natural.
427 - IV . O Amor escortatório é oposto ao Amor conjugal, como a conexão
(connubium) do mal e do falso é oposta ao casamento do bem e do vero.
Q ue a origem do amor conjugal vem do casamento do bem e do vero, isso foi
demonstrado em seu próprio Capítulo, nº 83 a 102; segue-se daí, que a origem
do Amor escortatório vem da conexão (connubium) do mal e do falso, e que
por conseguinte estes dois amores são opostos como o mal é oposto ao bem, e o
falso do mal ao vero do bem; são os prazeres de de um e outro amor, que são
assim opostos, pois um Amor sem seus prazeres nada é. Q ue estes prazeres
sejam assim opostos uns aos outros, não se vê absolutamente; se não se vê é
porque o prazer do Amor do mal nos extremos assemelha-se ao prazer do amor
do bem; mas nos internos o prazer do amor do mal consiste em puras cobiças
do mal,o mal mesmo é a massa conglobada ou a aglomeração destas cobiças; ao
contrário, o prazer do amor do bem consiste em inumeráveis afeições do bem,
o bem mesmo é como o feixe unido destas afeições; este feixe e esta
aglomeração não são sentidos pelo homem senão como um único prazer; e uma
vez que o prazer do mal nos externos assemelha-se ao prazer do bem, como já
foi dito, é por isso também que o prazer do adultério assemelha-se ao prazer do
casamento; mas depois da morte, quando todos depõem os externos, e os
internos são postos a nu, é sensivelmente manifesto que o mal do adultério é o
aglomerado das cobiças do mal, e que o bem do casamento é o feixe das
afeições do bem,e assim eles são absolutamente opostos um ao outro.
428 - Q uanto ao que concerne à conexão (connubium) mesmo do mal e do
falso,é preciso que se saiba que o mal ama o falso, e quer que seja um com ele,
e mesmo se conjugam; que semelhantemente o bem ama o vero e quer que seja
um com ele, e mesmo se conjugam; daí é evidente que, como a origem
espiritual do casamento é o casamento do bem e do vero, do mesmo modo a
origem espiritual do adultério é a conexão (connubium) do mal e do falso; é daí
que esta conexão é entendida, no sentido espiritual da Palavra, pelos adultérios,
as escortações,e as prostituições, ver o Apocalipse R evalado, nº 134. É segundo
este princípio que aquele que está no mal e esposa o falso, ou que está no falso
e admite o mal na partilha de seu leito, confirma o adultério pela aliança que
contraiu, e o comete tanto quanto o ousa e o pode; ele o confirma segundo o
mal pelo falso, e o comete segundo o falso pelo mal; e assim vice-versa, aquele
317

que está no bem e esposa o vero, ou que está no vero e admite o bem em
comunidade de leito com ele, se confirma contra o adultério, e abraça a feliz
vida conjugal.
429 - V .Daí o Amor escortatório é oposto ao Amor conjugal como o Inferno é
oposto ao Céu.
T odos aqueles que estão no Inferno estão no connubium do mal e do falso, e
todos os que estão no Céu estão no casamento do bem e do vero; e como o
connubium do mal e do falso é também o adultério, como acaba de ser
mostrado, nºs 427, 428, o inferno é também este connubium; daí vem que
todos aí estão no desejo libidinoso, na lascívia e na impudicas do amor
escortatório, e que fogem e têm em horror as cousas castas e pudicas do amor
conjugal, ver acima, nº 428. Por estas considerações, pode-se ver que estes dois
amores,o escortatório e o conjugal, são opostos um ao outro, como o inferno é
posto ao Céu,e o Céu ao inferno.
430 - V I.A impureza do Inferno vem do Amor escortatório, e a pureza do Céu
vem do Amor conjugal.
T odo e inferno regurgita de impurezas,e sua origem universal é o impudico e o
obsceno Amor escortatório; em tais impurezas são mudados seus prazeres;
quem é que pode crer que no M undo espiritual, todo prazer do amor se
apresenta à vista sob diversas aparências, ao olfato sob diversos odores, e aos
olhos sob diversas formas de bestas e de aves? As Aparências sob as quais, no
inferno, os prazeres lascivos do Amor escortatório se apresentam à vista, são
estrumeiras e lamaçais; os odores, pelos quais se fazem sentir, são maus cheiros
e infecções; e as Formas de bestas e de aves, sob as quais se apresentam aos
olhos, são porcos, serpentes, e aves chamadas O chim e T ziim. É o contrário a
respeito dos castos prazeres do Amor conjugal no Céu; as Aparências, sob as
quais aí se apresentam à vista, são jardins e planícies floridas; os odores, pelos
quais se fazem sentir, são os doces perfumes das frutas e as suaves exalações das
flores; e as Formas de animais sob as quais se apresentam aos olhos, são
cordeiros, cabritos, rolinhas e aves do paraíso. Q ue os prazeres dos amores
sejam mudados em tais e semelhantes formas, é porque todas as cousas que
existem no M undo espiritual são correspondências; os internos das mentes dos
habitantes são mudados nestas correspondências, quando se transportam e se
tornam externos diante dos sentidos. M as é preciso que se saiba que há
variedades inúmeras de impurezas, em que são mudadas as lascívias das
escortações, quando passam para suas correspondências; e as variedades são
segundo os gêneros e as espécies de lascívias, que se podem ver nos Artigos
seguintes, onde se trata dos adultérios e de seus graus; todavia, tais impurezas
não saem dos prazeres daqueles que se arrependem, porque no M undo foram
lavados.
431 - V II.Semelhantemente,na Igreja,a impureza e a pureza.
318

A razão disso, é que a Igreja é o R eino do Senhor nas terras, correspondendo a


Seu R eino nos Céus; e por isto o Senhor conjunta estes reinos, a fim de que
façam um; distingue mesmo os que estão na Igreja, como distingue o Céu e o
Inferno; e os distingue segundo seus amores; os que estão nos amores
impudicos e obscenos do amor escortatório atraem a si espíritos semelhantes do
Inferno; mas os que estão nos pudicos e castos prazeres do amor conjugal são
associados pelo Senhor a Anjos semelhantes do Céu; quando estes Anjos no
homem ficam perto de adúlteros por confirmação e de propósito deliberado,
sentem estes maus cheiros de que se acaba de falar, nº 430, e se retiram um
pouco.É por causa da correspondência dos amores impuros com as estrumeiras
e os lodaçais, que foi ordenado aos filhos de Israel "para ter com eles uma pá
para cobrir seus excrementos, com receio de que Jehovah Deus, andando no
meio do teu acampamento, não veja a nudez da coisa, e se retire", (Deuter.
X X III, 13 e 14); isso foi ordenado porque o acampamento dos filhos de Israel
representava a Igreja e porque estas impurezas correspondiam às lascívias das
escortações; e por Jehovah Deus, andando no meio de seu acampamento era
significada a Sua presença com os Anjos; se as cobriam, era porque no inferno
todos os lugares onde habitam tropas de tais espíritos foram cobertos e
fechados, é por isso que foi dito também "com receio que Ele visse a nudez da
coisa''; que todos os lugares do Inferno são fechados, me foi permitido ver; e
quando eram abertos, o que acontecia quando um novo demônio aí entrava, se
exalava de lá um tal mau cheiro que me causava no ventre um peso doloroso; e,
o que é admirável, estes maus cheiros são para os habitantes tão agradáveis
como o são as esterqueiras para os porcos.Por estas considerações, vê-se como é
preciso entender que na Igreja a impureza vem do amor escortatório, e a pureza
vem do amor conjugal.
432 - V III. O Amor escortatório faz cada vez mais o homem (homo) não
homem (homo) e o varão não varão (vir), e o Amor conjugal faz o homem
(homo) cada vez mais homem (homo) e varão (vir).
Q ue o Amor conjugal faça o homem, é o que ilustram e confirmam todas as
cousas que foram demonstradas com luz diante da razão na Primeira Parte
deste T ratado sobre o Amor e as delícias de sua sabedoria; por exemplo: 1º.
Q ue aquele que está no Amor verdadeiramente conjugal se torna cada vez mais
espiritual, e quanto mais alguém é espiritual, tanto mais é homem (homo) . 2º.
Q ue se torna cada vez mais sábio,e quanto mais alguém é sábio,mais é homem
(homo). 3º. Q ue nele estão cada vez mais abertos os interiores da mente, de tal
modo que ele vê ou reconhece intuitivamente o Senhor, quanto mais alguém
está nesta vista ou neste reconhecimento, tanto mais é homem. 4º. Q ue se
torna cada vez mais moral e civil, porque há uma alma espiritual em sua
moralidade e em sua civilidade,e quanto mais alguém é moralmente civil,tanto
mais é homem.5º.Q ue se torna por isso um Anjo do Céu depois da morte; e o
Anjo por essência e por forma é homem,e por isso o homem real brilha em sua
319

face por sua linguagem e por seus costumes; por isto vê-se que o Amor conjugal
faz o homem (homo) cada vez mais homem (homo). Q ue seja o contrário para
os adúlteros, a oposição mesma do adultério e do casamento, de que se tratou
neste Capítulo, e de que ainda se trata, o prova claramente; por exemplo: 1º.
Pelo fato de que os adultérios não são espirituais, mas são extremamente
naturais; ora, o homem natural, separado do homem espiritual, é homem
unicamente quanto ao entendimento, mas não quanto à vontade; ele a
mergulha no corpo e nas cobiças da carne, e no mesmo instante o
entendimento o acompanha; que ele não seja senão um meio homem (homo),
ele mesmo pela razão de seu entendimento, se o eleva, pode vê-lo. 2º. Q ue os
adúlteros não são sábios em seus discursos e em seus gestos, senão quando estão
em sociedade com pessoas eminentes em dignidade, celebres pela erudição e de
costumes exemplares; porém, sós, em casa, eles são insensatos, considerando
como nada as cousas Divinas e as cousas Santas da Igreja, e maculando os
princípios morais da vida com cousas impudicas e incastas, é o que será
provado no Capítulo sobre os Adultérios; quem é que não vê que tais
saltimancos são homens somente quanto à figura externa,e não homens quanto
à forma interna? Q ue os adúlteros se tornam cada vez mais não homens, é o
que eu vi com os meus próprios olhos, no inferno, o que foi para mim uma
confirmação evidente; pois lá há demônios que, quando são vistos à luz do
Céu, aparecem como tendo a face coberta de pústulas, o corpo encurvado, a
voz rouca e os gestos de saltimbancos. "É preciso, porém, que se saiba que tais
são os adúlteros de propósito determinado e por confirmação, mas não os
adúlteros sem deliberação; pois há quatro gêneros de adúlteros, de que se
tratará no Capítulo concernente aos adultérios e seus graus; os adúlteros de
propósito determinado são aqueles que o são pelo desejo libidinoso da vontade;
os adúlteros por confirmação, aqueles que o são pela persuasão do
entendimento; os adúlteros por deliberação, aqueles que o são pelos atrativos
dos sentidos; e os adúlteros sem deliberação, aqueles que não têm a faculdade,
ou não têm a liberdade de consultar o entendimento. O s dois primeiros
gêneros de adúlteros são os que se tornam cada vez mais não homens; mas os
dois últimos gêneros tornam-se homens à medida em que se retiram de seus
erros; e em seguida se tornam sábios".
433 - Q ue o Amor conjugal faça o homem (homo) cada vez mais varão (vir),
isso também é ilustrado pelas coisas que foram referidas na Parte precedente
sobre o Amor conjugal e suas delícias, a saber, 1º Q ue a faculdade e a virtude,
que é chamada viril, acompanha a sabedoria, conforme esta é animada pelos
espirituais da Igreja, e por conseguinte reside no Amor conjugal; e que a
sabedoria deste Amor abre uma veia desde sua fonte na Alma, e assim dá vigor
à vida intelectual,que é a vida masculina mesma,e a torna continuamente feliz.
2º Q ue é por isso que os Anjos do Céu estão eternamente nesta faculdade,
segundo suas próprias palavras no M emorável, nºs 355, 356; que os
Antiquíssimos nos séculos do ouro e da prata, tinham estado também nesta
320

perpétua eficácia,porque amavam as carícias de suas esposas e tinham horror às


carícias das prostitutas, eu o soube de sua própria boca, ver os M emoráveis nºs
75, 76. Q ue esta suficiência espiritual esteja também no natural, que não
faltaria hoje aos que se dirigem ao Senhor, e que têm em abominação os
adultérios como infernais, isso me foi dito do Céu. M as o contrário acontece
aos Adúlteros de propósito determinado, aos Adúlteros por confirmação de que
se acaba de falar no fim do nº 432; que neles a faculdade e a virtude, que é
chamada viril, perde seu vigor até se tornar nula; e, que depois dela, comece a
frieza mesma pelo sexo, e que esta frieza seja seguida por uma espécie de
desdém que se aproxima do desgosto, isso é sabido, ainda que pouco
divulgacio. Q ue tais sejam estes Adúlteros no inferno, é o que ouvi dizer de
longe por sereias, que são desejos libidinosos de um amor gasto, e também, lá,
por debochados. Destas explicações resulta que o Amor escortatório faz o
homem (homo) cada vez mais não homem (homo) e não varão (vir), e que o
Amor conjugal faz o homem (homo) cada vez mais homem (homo) e varão
(vir).
434 - IX .H á uma Esfera de Amor escortatório e uma Esfera de Amor conjugal.
O que é entendido por Esfera, e que haja um grande número delas, e que as
que pertencem ao Amor e à Sabedoria procedem do Senhor,descem pelos Céus
angélicos ao M undo, e aí penetram até seus últimos, isso foi mostrado acima,
nºs 222 a 225 e 386 a 397. Q ue no U niverso não haja cousa alguma que não
tenha seu oposto, vê-se acima, nº 425; segue-se daí que, como há uma Esfera
de Amor conjugal, há também uma Esfera oposta, que é chamada a Esfera do
amor escortatório; com efeito, estas Esferas são opostas uma a outra, como o
amor do adultério é oposto ao amor do casamento; tratou-se dessa oposição nos
preliminares deste Capítulo.
435 - X . A Esfera do Amor escortatório sobe do Inferno, e a Esfera do Amor
conjugal desce do Céu.
Q ue a esfera conjugal desce do Céu, é o que foi mostrado nos lugares que
acabam de ser citados, nº 434. M as se a Esfera do amor escortatório sobe do
Inferno, é porque este amor vem do Inferno, nº 429. Esta Esfera se eleva das
impurezas em que são mudados os prazeres do adultério dos de um e outro
sexo que estão no inferno; sobre estas impurezas,ver acima,nºs 430 e 431.
436 - X I. Estas Esferas se encontram uma à outra em um e outro M undo, mas
não se conjuntam.
Por um e outro M undo é entendido o M undo espiritual e o M undo natural;
no M undo espiritual estas Esferas se encontram no M undo dos espíritos,
porque este M undo fica no meio entre o Céu e o Inferno; mas no M undo
natural elas se encontram no homem, no Plano racional que também fica no
meio entre o Céu e o Inferno; pois neste plano influi do alto o casamento do
bem e do vero, e influi de baixo o casamento do mal e do falso, este influi pelo
321

M undo,e aquele pelo Céu; segue-se daí que o R acional humano pode-se voltar
para um e outro lado, e receber o influxo; se o homem se volta para o bem,
recebe o influxo de cima, e então seu R acional é formado cada vez mais para a
recepção do Céu; mas se ele se volta para o mal, recebe este influxo de baixo, e
então seu R acional é formado cada vez mais para a recepção do Inferno. Se
estas duas Esferas não se conjuntam, é porque são opostas, não agem entre si
senão como inimigos,dos quais um ardendo com um ódio mortal ataca o outro
com furor,enquanto que o outro não está em ódio algum,mas está unicamente
animado pelo zêlo para se defender; por estas considerações é evidente que estas
duas Esferas se encontram apenas, mas não se conjuntam. O interstício
mediano que elas fazem existe de uma parte pelo mal do não falso e o falso do
não mal, e de outra parte pelo bem do não vero e o vero do não bem, que
podem,é verdade,se alcançar,mas não entretanto se conjuntar.
437 - X II. Entre estas duas Esferas há um equilíbrio, e o homem está nesse
equilíbrio.
O equilíbrio entre elas é um equilíbrio espiritual, porque é entre o bem e o
mal; por este equilíbrio o homem tem o livre arbítrio; neste livre e por meio
deste livre, o homem pensa e quer, e por conseguinte fala e age, como por si
mesmo; seu R acional está na opção e na escolha, seja que queira receber o bem,
seja que queira receber o mal, por conseqüência, seja que queira racionalmente
pelo livre se dispor para o amor conjugal, seja que queira racionalmente pelo
livre se dispor para o amor escortatório; se é para este, ele volta o occiput e o
dorso para o Senhor; se é para aquele, volta a fronte e o peito para o Senhor; se
se volta para o Senhor, a sua racionalidade e a sua libredade, não dirigidas pelo
Senhor, mas se volta o dorso para o Senhor, a sua racionalidade e a sua
liberdade são dirigidas pelo inferno.
438 - X III. O homem pode se voltar para a Esfera que lhe agrada, mas quanto
mais se volta para uma,tanto mais se afasta da outra.
O homem foi criado a fim de que, pelo livre segundo a razão, e absolutamente
como por si mesmo, ele faça o que faz; sem o livre e sem a razão, ele não seria
um homem,mas seria uma besta; pois não receberia cousa alguma influindo do
Céu sobre ele, e não se apropriaria de cousa alguma como sua e, por
conseguinte cousa alguma da vida eterna poderia ser inscrita nele; pois para que
uma cousa seja sua, deve ser inscrita nele como lhe pertencendo, e visto que
não existe livre algum para um lado, a não ser que exista um semelhante para o
outro lado, como não há balança a não ser que os pratos possam, de uma parte
e de outra, sair do equilíbrio, do mesmo modo se o homem não tem o livre
segundo a razão de aceder também ao mal, de ir assim da direita para a
esquerda e da esquerda para a direita, semelhantemente para a esfera infernal,
que é a esfera do adultério,como pra a Esfera celeste que é a do casamento.
439 - X IV .U ma e outra Esfera traz consigo prazeres.
322

Q uer dizer que uma e outra Esfera, a do amor escortatório que sobe do
Inferno, e a do amor conjugal que desce do Céu, afetam com prazeres o
homem (homo) que recebe. Isto resulta de que o último plano, no qual os
prazeres de um e de outro amor se terminam, e onde se realizam e se
completam, e que os apresenta a seu próprio sentimento, é o mesmo; daí
resulta que as carícias escortatórias e as carícias conjugais são percebidas
semelhantemente nos extremos, ainda que sejam absolutamente diferentes nos
internos; que por conseguinte elas sejam diferentes também nos extremos,é um
ponto não decidido segundo um sentido de diferença; pois as dessemelhanças
provenientes das diferenças nos extremos não são sentidas senão por aqueles
que estão no amor verdadeiramente conjugal; com efeito, o mal é conhecido
pelo bem,mas o bem não é conhecido pelo mal,do mesmo modo que um odor
doce não é discernido por uma narina a que se ligou um odor desagradável.
O uvi dizer pelos Anjos que eles díscernem nos extremos o lascivo do não
lascivo, como se diferencia um fogo de esterco ou de chifre queimado, pelo seu
mau cheiro, de um fogo de substâncias aromáticas ou de cinamomo pelo seu
odor agradável; e que isso provém da diferença dos prazeres internos que
entram nos prazeres externos e os compõem.
440 - X V . O s prazeres do amor escortatório começam pela carne, e pertencem
à carne mesmo no espírito; mas os prazeres do amor conjugal começam no
espírito e pertencem ao espírito,mesmo na carne.
Se os prazeres do amor escortatório começam pela carne, é porque os ardores
da carne são o seu começo; se estes prazeres infectam o espírito, e pertencem à
carne, mesmo no espírito, é porque a carne não sente as cousas que acontecem
na carne, mas é o espírito que as sente; dá-se com este sentido como com todos
os outros, assim não é o olho que vê e que discerne as diversas cousas nos
objetos, mas é o espírito; também não é o ouvido que ouve e que discerne a
harmonia das modulações no canto, e as concordâncias da articulação dos sons
na linguagem,mas ,é o espírito; e o espírito sente tudo segundo sua elevação na
sabedoria; o espírito que não foi elevado acima dos sensuais do corpo, e que
por conseguinte aí fica preso,não sente outros prazeres senão os que influem da
carne e do mundo pelos sentidos do corpo; ele os apreende, se deleita com eles
e os faz seus. O ra,como os começos do amor escortatório não são senão os
ardores e os pruridos da carne, é evidente que, no espírito, são sujos atrativos
que excitam e abrasam à medida que sobem e descem, e agem alternadamente.
Em geral, a cupidez da carne, considerada em si mesma, não é mais do que
cobiças aglomeradas do mal e do falso; daí vem este vero na Igreja, de que a
carne cobiça contra o espírito, isto é, contra o homem espiritual; segue-se
portanto que os prazeres da carne, quanto aos prazeres do amor escortatório,
não são mais do que efervescências de desejos libidinosos que no espírito se
tornam ebulições de impudicícias.
441 - M as os prazeres do amor conjugal nada têm de comum com os prazeres
323

imundos do amor escortatório; estes,é verdade, estão na carne de cada homem,


mas são separados e afastados, à medida que o espírito do homem é elevado
acima dos sensuais do corpo, e que desta altura vê suas aparências e suas ilusões
em.baixo; semelhantemente então percebe os prazeres carnais a principio como
prazeres aparentes e enganadores, depois como prazeres libidinosos e lascívias
de que é preciso fugir, sucessivamente como perigosos e prejudiciais à alma, e
enfim os sente como desagradáveis, ediondos e repugnantes; e neste grau em
que percebe e sente assim estes prazeres, percebe também no mesmo grau os
prazeres do amor conjugal como inocentes e castos, e enfim como deliciosos e
felizes. Se os prazeres do amor conjugal se tornam também prazeres do espírito
na carne,é porque depois que os prazeres do amor escortatório foram afastados,
como acaba de se dizer, o espírito que ficou livre deles, entra casto no corpo, e
enche com as delícias de sua beatitude o peito, e também, pelo peito, os
últimos deste amor no corpo; e por conseguinte o espírito com eles e eles com o
espírito,agem mais tarde em plena comunhão.
442 - X V I.O s prazeres do amor escortatório são as volúpias da loucura, mas os
prazeres do amor conjugal são as delícias da sabedoria.
Se os prazeres do amor escortatório são as volúpias da loucura, é porque não há
senão os homens naturais que estejam nesse amor, e o homem natural é
insensato nas cousas espirituais, pois é contra elas, e por isso mesmo abraça
somente os prazeres naturais, sensuais e corporais, porque o N atural é
distinguido em três graus; no grau supremo estão os homens naturais que pela
vista racional vêem as loucuras, e não obstante são arrastados pelos prazeres
destas loucuras, como um barco pela corrente de rio; no grau inferior estão os
homens naturais que so veem e julgam pelos sentidos do corpo, e que
desprezam e rejeitam como nada os racionais contrários às aparências e às
ilusões; no grau ínfimo estão os homens naturais que sem julgamento são
arrastados pelos ardores sedutores de seu corpo; são estes que são chamados
naturais-corporais; os precedentes são chamados naturais sensuais, e os
primeiros são chamados naturais. O Amor escortatório, suas loucuras e suas
volúpias,pertencem neles,a graus semelhantes.
443 - Se os prazeres do amor conjugal são as delícias da sabedoria,é porque não
há senão os homens espirituais que estejam neste amor, e o homem espiritual
está na sabedoria, e por conseguinte não abraça outros prazeres que não sejam
os que concordam com a sabedoria espiritual. Q uais são os prazeres do amor
escortatório, e quais são os prazeres do amor conjugal, podese vê-lo por
comparações com as casas; os prazeres do amor escortatório, com uma casa
cujas paredes brilham no exterior como conchas do mar, ou como pedras
transparentes chamadas selenitas, de uma falsa cor de ouro, enquanto que nos
apartamentos no interior das paredes há lixo e impurezas de toda espécie; mas
os prazeres do amor conjugal podem ser comparados a uma casa cujas paredes
brilham como ouro fino, e cujos apartamentos por dentro resplandecem como
324

escrínios cheios de diversas pedras preciosas.


444 - Ao que precede será acrescentado este M emorável.
Q uando terminei as meditações sobre o Amor conjugal e que comecei as
meditações sobre o Amor escortatório, súbitamente dois Anjos se apresentaram,
e disseram: "Percebemos e compreendemos as cousas que tu primeiro
meditavas, mas quanto a estas que meditas agora, nos escapam, e não as
percebemos; põe-nas de lado, portanto, pois não têm importância alguma".
M as eu respondi: "Este amor, sobre o qual medito agora não é de importância
nula, pois existe". Eles disseram, porém: "Como pode existir um Amor que
não, seja de criação? O Amor conjugal não é de criação? Este Amor não existe
entre dois que podem se tornar um? Como pode existir um amor que divide e
separa? Q ue mancebo pode amar uma outra virgem além daquela que lhe
retribui amor por amor? O amor de um não deve conhecer e reconhecer o
amor do outro? Desde que se encontram, estes dois amores não se conjuntam
por si mesmos? O Amor conjugal não é o único amor mútuo e recíproco? Se
não é recíproco,não ricocheta,e não se torna nulo?" Depois de ter ouvido estas
palavras perguntei aos dois Anjos de que sociedade do Céu eles eram, e eles
disseram:"Somos do Céu da Inocência; viemos ainda crianças para este M undo
celeste, e fomos educados sob os auspícios do Senhor, e depois que me tornei
mancebo, e que minha esposa, que está aqui comigo, se tornou donzela núbil,
nós nos tornamos noivos, e ficamos de acordo, e nos unimos sob as primeiras
impressões favoráveis; e como não tivemos conhecimentos de um outro amor
diferente do amor verdadeiramente nupcial e conjugal, é por isso que quando
as idéias do teu pensamento sobre um amor estranho, completamente oposto
ao nosso amor, nos foram comunicadas, nós não compreendemos cousa
alguma; por isso descemos, a fim de te perguntar porque meditas sobre estas
cousas não perceptíveis. Diz-nos pois, como um amor que não somente não é
de criação, mas que é mesmo contrário à criação pode existir. N ós
consideramos as cousas opostas à criação como objetos de que não se deve ter
em conta alguma". Q uando eles assim falaram, eu senti alegria no coração por
me ter sido dado conversar com Anjos de uma tal inocência, que ignoravam
inteiramente o que era a escortação; por isso tomei a palavra e os instruí,
dizendo:"N ão sabeis que há o bem e o mal, e que o bem é de criação, mas não
o mal, e que entretanto o mal, considerado em si mesmo, nada é, visto que
nada é do bem? Por criação existe o bem, e também o bem no grau máximo e
no grau mínimo, e quando este mínimo se torna nada, do outro lado surge o
mal; não existe portanto nem relação nem progressão do bem ao mal; mas há
relação e progressão do bem com um bem maior e um bem menor, e do mal
com um mal maior e um mal menor, pois eles são opostos em todas as cousas
em geral e em particular; e porque o bem e o mal são opostos, há um
intermediário e aí um equilíbrio, no qual o mal age contra o bem; mas como
ele não prevalece, permanece em esforço; todo homem é educado neste
325

equilíbrio, que, porque existe entre o bem e o mal, ou, o que é a mesma coisa,
entre o Céu e o Inferno, é um equilíbrio espiritual, o qual, naqueles que aí
estão, produz o Livre; por este equilíbrio o Senhor atrai todos os homens para
Ele, e retira do mal para o bem, e assim para o Céu, o homem que O segue
pelo livre; dá-se o mesmo, com o amor, principalmente o amor conjugal, e o
amor escortatório, este amor é o mal, e aquele é o bem; todo homem que
escuta a voz do Senhor, e pelo livre a segure, é introduzido pelo Senhor no
amor conjugal, e em todos os seus prazeres e em todas as suas felicidades; mas
aquele que não escuta e não segue, se introduz a si mesmo no amor
escortatório,e,a principio, em seus prazeres, em seguida em seus desprazeres, e
por fim em suas infelicidades". Depois que eu assim falei, estes dois Anjos,
fizeram esta pergunta: "Como o mal pôde existir, pois que por criação não
existe senão o bem? Para que uma cousa exista é preciso que tenha uma origem;
o bem não pode ser a origem do mal, porque o mal nada tem do bem, pois ele
é o privador e o destruidor do bem; todavia, entretanto, pois que existe e é
sentido, não é um nada, mas é alguma cousa; diz-nos pois de onde esta alguma
cousa existiu após nada". A isso respondi: "Este Arcano não pode ser aberto, a
não ser que se saiba que nada é bom senão Deus só, e que não há bem algum
que em si mesmo seja o bem, a não ser por Deus; é por isso que, aquele que
eleva seus olhos para Deus, e quer ser conduzido por Deus, está no bem; mas
aquele que se afasta de Deus, e quer ser conduzido por si mesmo, não esta no
bem, pois o bem que ele faz é, ou para ele mesmo, ou para o mundo, por
conseguinte, ou meritório, ou simulado ou hipócrita; daí é evidente que o
homem mesmo é a origem do mal, não porque esta origem tenha sido
implantada no homem por criação, mas ele mesmo implantou-a em si,
afastando-se de Deus para se voltar para si. Esta origem do mal não estava nem
Adão nem ,em sua esposa; mas quando a serpente disse: "no dia em que
comerdes da árvore da ciência do bem e do mal, sereis como Deus” (G ênesis
III, 5) e então eles se afastaram de Deus e se voltaram para si mesmos como
para um Deus, fizeram neles a origem do mal; comer desta árvore significava
crer que se sabe o bem e o mal e que se é sábio por si mesmo, e não por Deus".
M as então os dois Anjos disseram: "Como o homem pede se afastar de Deus, e
se voltar para si mesmo, quando entretanto o homem nada pode querer, nada
pensar, nem por conseguinte, nada fazer senão, por Deus? Por que Deus
permitiu isso?" Eu respondi, porém: “O homem foi criado de maneira que
tudo o que ele quer, pensa e faz, lhe aparece como nele, e assim como vindo
dele; o homem,sem esta aparência,não seria homem, pois não poderia receber,
reter,nem por assim dizer,se apropriar,cousa alguma do bem e do vero, ou do
amor e da sabedoria, donde segue-se que, sem esta aparência como viva, não
haveria para o homem conjunção com Deus, nem por conseguinte a vida
eterna; mas se por esta aparência ele introduz em si a crença de que quer, pensa
e por con. seguinte, faz o bem por si mesmo, e não pelo Senhor, ainda que seja
em toda aparência como por si mesmo, ele muda nele o bem em mal, e assim
326

faz nele a origem do mal; foi esse o pecado de Adão. M as vou expor este
assunto um pouco mais claramente: O Senhor olha para cada homem na
fronte, e este olhar passa ao occiput; sob a fronte está o Cérebro, e sob o
occiput o Cerebelo, este foi destinado ao amor e aos bens do amor; e aquele foi
destinado à sabedoria e aos veros da sabedoria; é por isso que aquele que de
fronte olha o Senhor recebe d'Ele a sabedoria,e por ela o amor; mas aquele que
olha por trás do Senhor recebe o amor e não a sabedoria, e o amor sem a
sabedoria é um amor que vem do homem e não do Senhor; e este amor,
porque se conjunta com os falsos, não reconhece Deus, mas se reconhece por
deus, e confirma isso tacitamente pela faculdade de compreender e de se tornar
sábio como por si mesmo implantada nele por criação; é por isso que este amor
é a origem do mal. Q ue assim seja, é o que pode ser demonstrado à vista: V ou
chamar aqui algum mau Espírito, que se tenha afastado de Deus, e lhe falarei
por trás ou ao occiput, e tu verás que as cousas que são ditas se mudam em
coisas contrárias". E chamei um mau Espírito; ele se apresentou, e eu lhe falei
por trás; dizendo:"Sabes alguma cousa concernente ao Inferno, à danação e aos
tormentos infernais?" E imediatamente, quando ele se voltou para mim,
perguntei-lhe o que tinha ouvido; respondeu: "O uvi estas palavras: Sabes
alguma cousa concernente ao Céu, à Salvação e à Felicidade celeste". E em
seguida, quando esta frase lhe foi dita por trás, ele disse que havia ouvido a
frase precedente. Depois estas palavras lhe foram ditas por trás: "N ão sabes que
os que estão no Inferno são loucos segundo os falsos?" E interrogado por mim
sobre o que havia ouvido, disse: "O uvi: N ão sabes que os que vivem no Céu
são sábios pelos veros?" E quando estas palavras lhe foram ditas, disse que havia
ouvido: "N ão sabes que os que estão no Inferno são loucos segundo os falsos?"
E assim por diante. Por estas experiências é bem evidente que quando a mente
se afasta do Senhor, volta-se para si mesma e então percebe os con. trários. "É
esta a razão, como o sabeis, pela qual no M undo espiritual não é permitido a
quem quer que seja ficar atrás de um outro,e lhe falar; pois desta maneira lhe é
inspirado um Amor ao qual, por causa do seu prazer, a própria inteligência é
favorável e obedece; mas como este amor vem do homem e não de Deus, é o
amor do mal ou o amor do falso. Além disso eu vos referirei alguma cousa
semelhante, a saber, que por vezes ouvi bens e veros cair do Céu no Inferno, e
na descida tinham sido progressivamente mudados em opostos, o bem em mal
e o vero em falso; a razão desta mudança é a mesma, é porque todos os que
estão no Inferno se afastam do Senhor".Depois de ter ouvido estas cousas,estes
dois Anjos me agradeceram e disseram: "Pois que agora meditas e escreves
sobre um amor oposto ao nosso Amor conjugal, e o que é oposto a este amor
entristece as nossas mentes, nós vamos embora". E quando me disseram: "Paz a
ti" eu lhes pedi para não falarem deste amor a seus irmãos e a suas irmãs no
Céu,porque isso feriria sua inocência.Q ue os que morrem crianças crescem no
Céu, e que, quando atingem a estatura em que estão os mancebos de dezoito
anos e as donzelas de quinze anos em nosso M undo, permanecem nessa
327

estatura, e que então seja provido pelo Senhor a casamentos para eles, além
disso, que tanto antes como depois do casamento eles ignoram completamente
o que é a escortação, e que ela pode existir, é o que posso afirmar
positivamente.
328

Da fornicação

444 (bis) - Por fornicação é entendido o ato libidinoso de um adolescente ou


de um mancebo com uma mulher prostituta, antes do casamento; mas o ato
libidinoso com uma mulher não prostituta, isto é, com uma virgem ou com a
esposa de outrem, não é uma. fornicação; com uma virgem é um ato de
corrupção (stuprum); com a esposa de outrem, é um adultério. Como estes
dois atos diferem da fornicação, nenhum homem racional o pode ver, a não ser
que examine com perspicácia o amor do Sexo em seus graus e em suas
diversidades, e de uma parte as cousas castas deste, amor, e de outras suas
cousas incastas, e que divida uma e outra parte em gêneros e em espécies, e
assim as distinga; de outro modo, na idéia de cada um não pode haver
diferença entre o mais e o menos casto, nem entre o mais e o menos incasto, e
sem estas distinções tôda relação perece, e com ela a perspicácia nas cousas de
julgamento, e o entendimento é envolvido com uma tal sombra, que não sabe
distinguir a Fornicação do Adultério, nem com mais forte razão as espécies
leves de fornicação das que são graves; semelhantemente para o Adultério;
assim mistura os males,, e de diversos males faz um único condimento, e de
diversos bens uma única massa. A fim de que, portanto, o Amor do sexo seja
distintamente conhecido quanto a esta parte pela qual se inclina e avança para o
amor escortatório inteiramente oposto ao amor conjugal, convém examinar-lhe
o começo, que é a fornicação, o que será feito nesta série: I. A Fornicação
pertence ao amor do sexo. II. Este amor nasce quando um rapaz começa a
pensar e a agir segundo seu próprio entendimento, e o som de sua voz, começa
a se tornar másculo. III. A Fornicação pertence ao homem natural. IV . A
Fornicação é um desejo libidinoso (líbido), mas não o desejo libidinoso do
adultério. V . Em alguns o amor do sexo não pode ser, sem dano, totalmente
impedido de se manifestar em fornicação. V I. É por isso que nas cidades
populosas, lugares de prostituição são tolerados. V II. O desejo libidinoso de
fornicar é leve, enquanto tem uma tendência para o amor conjugal, e prefere
esse amor. V III. O desejo libidinoso de fornicar é grave, quando tem uma
tendência ao adultério. IX . O desejo libidinoso de fornicar é mais grave,
conforme se volta para o desejo ardente das variedades, e para o desejo ardente
da defloração. X . A esfera do desejo libidinoso de fornicar, tal como é no
começo, fica no meio entre a esfera do amor escortatório e a esfera do amor
conjugal, e faz equilíbrio. X I. É preciso velar com cuidado para que o amor
conjugal não se perca por fornicações desordenadas e imoderadas. X II. Pois que
o conjugal de um marido com uma esposa é o T esouro da vida humana, e o
R eservatório da religião cristã. X III. N aqueles que, por diversas causas, não
podem contrair casamento, e que por causa de lubricidade de temperamento
329

não podem moderar os desejos libidinosos, este conjugal pode ser conservado,
se o amor vago do sexo é restringido a uma única amante. X IV . O Pelicato
(comércio com uma amante) é preferível a um vago desejo libidinoso, desde
que não seja formado com várias, nem com uma virgem ou uma moça intacta,
nem com uma mulher casada, e que seja mantido separado do amor conjugal.
Segue-se agora a explicação destes Artigos.
445 - I.A Fornicação pertence ao amor do sexo.
Diz-se que a fornicação pertence ao amor do sexo, porque a fornicação não é o
amor do sexo,mas vem deste amor; o amor do sexo é como uma fonte de onde
pode ser derivado o amor conjugal e o amor escortatório, e estes amores podem
ser derivados pela fornicação, e o podem ser sem ela; pois o amor do sexo está
em cada homem e, ou se manifesta, ou não se manifesta; se se manifesta com
uma prostituta antes do casamento, é chamado fornicação; se não se manifesta
antes que o seja com a espesa, é chamado casamento; se é com uma outra
mulher após o casamento é chamado adultério; é por isso que, como foi dito, o
amor do sexo é como uma fonte de onde pode decorrer tanto o amor casto
como o amor Incasto; mas com alguma precaução e alguma prudência, o amor
casto conjugal pode proceder pela fornicação, e por alguma imprudência,
procede pela fornicação o amor incasto ou escortatório, isso será exposto no
que segue. Q uem é que pode concluir que aquele que fornicou não é capaz de
ser casto no casamento?
446 - II. O Amor do sexo donde vem a fornicação, nasce quando um rapaz
começa a pensar e a agir por seu próprio entendimento, e o som de sua voz
começa a se tornar másculo.
Isto é acrescentado, a fim de que se conheça a origem do amor do sexo, e por
conseguinte a origem da fornicação, a saber, que esta origem tem lugar quando
o entendimento começa a se tornar por si mesmo racional, ou a discernir e a
prever pela própria razão as cousas que são vantajosas e úteis; a isto então serve
de plano o que na memória vem dos pais e dos professores; se faz nessa época
uma inversão na mente; ele não pensava antes senão pelas cousas introduzidas
na memória, meditando-as e obedecendo-as; depois, pensa sobre elas pela
razão; e então, sob a direção do amor, dispõe em uma nova ordem as cousas
colocadas na memória, e começa uma vida própria de uma maneira
conveniente a esta ordem, e sucessivamente, cada vez mais pensa segundo sua
razão e quer pelo livre. Q ue o amor do sexo siga a iniciação do próprio
entendimento, e progrida segundo seu vigor, isso é notório; é uma prova de
que este amor sobe conforme o entendimento sobe, e desce conforme o
entendimento desce; por subir é entendido subir na sabedoria, e por descer é
entendido descer na loucura; e a sabedoria consiste em restringir o amor do
sexo, e a loucura em deixá-lo estender-se; se ele se manifesta na fornicação, que
é o começo de sua atividade, deve ser moderado pelos princípios da
honestidade e da moralidade que foram implantados na memória e desta na
330

razão, e que devem ser implantados mais tarde na razão e desta na memória. Se
ao mesmo tempo que começa o entendimento próprio,a voz também começa a
se tornar máscula, é por que o entendimento pensa, e porque ele fala pelo
pensamento,o que prova que o entendimento faz o varão (vir), e faz também o
princípio másculo; que,por conseguinte, do modo por que seu entendimento é
elevado, desse mesmo modo ele se torna homem-varão (homo vir), e também
homem másculo (masculus vir),ver acima nºs 432,433.
447 - III. A fornicação pertence ao homem natural, da mesma maneira que o
amor do sexo que se se torna ativo antes do casamento,é chamado fornicação.
T odo homem nasce corporal, torna-se sensual, em seguida natural, e se então
não se detém, torna-se espiritual; se avança assim, é a fim de que sejam
formados Planos, sobre os quais se apóiam os superiores, como um palácio
sobre suas fundações; o último plano, com os planos erguidos acima, pode ser
comparado também a um humus,no qual,quando está preparado, são lançadas
sementes nobres. Q uanto ao que concerne especialmente ao Amor do sexo, ele
é também, a princípio corporal, pois começa pela carne, em seguida se torna
sensual, pois os cinco sentidos acham suas delícias em seu princípio comum,
depois se torna natural, semelhante ao mesmo amor nos animais, porque é o
amor vago do sexo; mas como o homem nasceu para se tornar espiritual, este
amor em seguida se torna natural-racional, e de natural-racional se torna
espiritual, e por fim espiritual-natural, e então este amor tornado espiritual
influi e age no amor racional, e por ele no amor sensual, e por este enfim neste
amor que está no corpo e na carne; e como esta é seu último plano, ele aí age
espiritualmente, e ao mesmo tempo racionalmente e sensualmente; e influi e
age assim sucessivamente quando o homem está em meditação a seu respeito,
mas simultâneamente quando está em seu último. Se a fornicação pertence ao
homem natural, é porque procede muito proximamente do amor natural do
sexo; e ela pode ser natural-racional, mas não espiritual; porque o amor do sexo
não pode se tornar espiritual antes de se tornar conjugal; e o amor do sexo de
natural que era torna-se espiritual, quando o homem se retira de um vago
desejo libidinoso,e se liga a uma única esposa,a cuja alma liga sua alma.
448 - IV . A fornicação é um desejo libidinoso (libido), mas não é o desejo
libidinoso do adultério.
Q ue a fornicação seja um desejo libidinoso, eis as razões: 1º Porque vem do
homem natural, e em tudo que vem dele há cobiça e desejo libidinoso, pois o
homem natural não é absolutamente senão o domicílio e o receptáculo das
cobiças e dos desejos libidinosos, pois todas as tendências viciosas herdadas dos
pais aí residem. 2º Porque o fornicador lança vagamente e indistintamente seus
olhares para o sexo,e não ainda para uma única pessoa do sexo,e enquanto está
neste estado, o desejo libidinoso o excita a fazer o que faz; mas à medida que
leva seus olhos para uma única e que ama conjuntar sua vida com a vida desta,
a cobiça se torna uma afeição casta, e o desejo libidinoso se torna um amor
331

humano.
449 - Q ue o desejo libidinoso da fornicação não seja o desejo libidinoso do
adultério, cada um o vê claramente pela percepção comum; qual é a lei, e qual
é o juiz, que imputa ao fornicador um crime semelhante ao adultério? Se isto é
visto pela percepção comum, é porque a fornicação não é oposta ao amor
conjugal, como o é o adultério; o amor conjugal pode estar interiormente
encerrado na fornicação, do mesmo modo que o espiritual pode estar no
natural; mais ainda, o espiritual é também, na realidade, desprendido do
natural, e quando foi desprendido, então o natural, o cerca como o labor cerca
a madeira, e como a bainha encerra a espada, e serve também ao espiritual de
defesa contra as violências. Por estas considerações, é evidente que o amor
natural, que é o amor pelo sexo, precede o amor espiritual, que é o amor por
uma única do sexo; ora, se a fornicação se produz pelo amor natural do sexo,
ela pode ser mesmo apagada, desde que o amor conjugal seja encarado,
desejado e procurado como bem principal. É inteiramente diferente o amor
libidinoso e obsceno do adultério, que é oposto ao amor conjugal e que é o seu
destruidor, como foi mostrado no Capítulo precedente sobre a oposição do
amor escortatório e do amor conjugal; é por isso que, se um adúltero de
propósito determinado ou por confirmação entra por diversas causas no leito
conjugal, o inverso acontece, o natural, com suas lascívias e suas obscenidades,
está escondido interiormente, e a aparência espiritual o vela exteriormente; por
isto, a razão pode ver que o desejo libidinoso de uma fornicação limitada é, em
relação ao desejo libidinoso do adultério,como é o primeiro calor relativamente
ao frio do meio do inverno nas regiões do norte.
450 - V . Em alguns o amor do sexo não pode ser, sem dano, totalmente
impedido de se manifestar em fornicações.
É inútil enumerar os danos que uma retenção demasiado grande do amor do
sexo pode causar e operar naqueles que por superabundância são atormentados
de efervescência; daí neles a origem de certas moléstias do corpo, e de certas
desordens da mente, sem falar de males desconhecidos que não devem ser
mencionados; é diferente naqueles para quem o amor do sexo é tão fraco, que
podem resistir aos esforços de seu desejo libidinoso; semelhantemente naqueles
a quem na juventude, sem prejuízo para sua fortuna mundana, assim sob os
primeiros auspícios favoráveis, é permitido contrair um casamento legítimo.
Como é isso o que acontece no Céu às crianças, quando chegam à idade
conjugal, é por isso que lá s-e ignora o que é a fornicação; mas não acontece o
mesmo na terra, onde os casamentos não podem ser contraídos senão quando o
tempo da juventude já passou, o que acontece a muitos nos governos em que é
preciso tempo para merecer um emprego, e adquirir as faculdades necessárias
para sustentar uma casa e uma família, e então somente, procurar para casar-se
uma esposa que possa convir.
451 - V I. É por isso que nas cidades populosas são tolerados lugares de
332

prostituição.
Isto é referido como confirmação do Artigo precedente; que são tolerados pelos
R eis, os M agistrados, e por conseguinte, pelos juízes, os inquisitores e pelo
povo,em Londres,em Amsterdão, em Paris, em V iena, em N ápoles, e também
em R oma, e além disso em muitos lugares, isso é notário; entre as causas pelas
quais são tolerados estão também as mencionadas acima.
452 - V II. O desejo libidinoso de fornicar é leve enquanto tem uma tendência
ao amor conjugal e prefere este amor.
H á graus de qualidades do mal, do mesmo modo que há graus de qualidades
do bem; é por isso que cada mal é mais leve e mais grave, do mesmo modo que
cada bem é melhor e mais excelente; dá-se o mesmo com a fornicação que,
porque é um desejo libidinoso, e pertence ao homem natural ainda não
purificado, é um mal; mas como todo homem pode ser purificado, é por isso
que este mal se torna mais leve quando se aproxima do estado purificado, pois
se apaga em proporção; assim, tanto quanto a tornearão se aproxima do amor
conjugal, que é o estado purificado do amor do sexo; que o mal da fornicação
seja tanto mais grave quanto mais se aproxima do amor do adultério, ver-se-á
no Artigo seguinte. Se a fornicação é leve enquanto tem uma tendência para o
amor conjugal, é porque então o homem, do estado incasto em que está, leva
sua vista para o estado casto; e que quanto mais prefere este, tanto mais aí está
também quanto ao entendimento; e quanto mais não somente o prefere, mas
ainda o ama com predileção, tanto mais aí está também quanto à vontade,
assim quanto ao homem interno; e então, a fornicação, se contudo persiste, é
para ele uma necessidade, de que examina bem em si as causas. H á duas razões
que fazem com que a fornicação, naqueles que preferem e amam com
predileção o estado conjugal, seja leve; a primeira, é que para eles a vida
conjugal é o desígnio, a intenção ou o fim; a segunda, é que neles separam o
mal do bem. Q uanto ao Primeiro Ponto, que para eles a vida conjugal é o
desígnio, a intenção ou o fim: É porque o homem é homem tal qual é em seu
desígnio, em sua intenção ou em seu fim, e tal ele é também diante do Senhor
e diante dos anjos, e mesmo tal é consíderado pelos Sábios no mundo; pois a
intenção é a alma de todas as ações e faz no mundo as inculpações e as escusas,
e após a morte as imputações. Q uanto ao Segundo Ponto, que aqueles que
preferem o amor conjugal ao desejo libidinoso da fornicação, separam o mal do
bem: É porque assim eles separam o incasto do casto; e aqueles que os separam
pela percepção e pela intenção, antes de estarem no bem ou no casto, são
também separados e purificados do mal deste desejo libidinoso,quando chegam
ao estado conjugal.Q ue não seja o mesmo para aqueles que, na fornicação, têm
uma tendência ao adultério,vai-se ver no Artigo seguinte.
453 - V III. O desejo libidinoso de fornicar é grave, enquanto tem uma
tendência ao adultério.
333

T odos aqueles que não crêem que os adultérios são pecados, e que pensam a
respeito dos casamentos as mesmas cousas que a respeito dos adultérios, com a
única diferença do lícito e do ilícito, têm uma tendência ao adultério no desejo
libidinoso da fornicação; estes também fazem de todos os males um só mal, e
misturam todos como imundícies com a comida no mesmo prato, e como a
borra com o vinho no mesmo copo, e comem e bebem assim; agem do mesmo
modo com o amor do sexo, com a fornicação, com o pelicato, com o adultério
menos grave,grave e mais grave,e mesmo com a ação de desonrar uma donzela
ou a defloração; que se acrescente a isto que, não somente misturam todas estas
causas, mas os misturam também com os casamentos, e maculam a estes com
uma semelhante noção; mas àqueles, que não fazem mesmo diferença entre
estas coisas e os casamentos, após relações vagas com o sexo, sobrevêm frieza,
repugnâncias e desgostos, a princípio pela consorte, em seguida pelas outras, e
enfim pelo sexo. É bem evidente que neles não há desígnio, nem intenção ou
fim do bem ou do casto, para que sejam desculpados, nem de separação do mal
de junto do bem, ou do incasto de junto do casto, para que sejam purificados,
como há naqueles que têm, pela fornicação, uma tendência ao amor conjugal e
o preferem, e de que se falou no Artigo precedente, nº 452. É-me permitido
confirmar o que precede por esta nova informação do Céu: Encontrei vários
espíritos que, no M undo, tinham vivido nos externos do mesmo modo que
outros, vestindose com luxo, alimentando-se com requinte, negociando como
os outros com proveito, freqüentando espetáculos, gracejando sobre assuntos
amorosos como se fosse por um desejo libidinoso, e fazendo várias outras ações
semelhantes, e entretanto os Anjos consideravam em uns estas ações como
males de pecado, e em outros não as consideravam como males e declaravam
estes inocentes, e aqueles culpados; interrogados porque decidiam assim, pois
que as ações eram semelhantes, responderam que examinavam a todos segundo
o desígnio, a intenção e o fim, e por isso os distinguiam; e que é por isso que
desculpam ou condenam àqueles que o fim desculpa ou condena, porque o fim
do bem está em todos no Céu, e o fim do mal em todos no Inferno; e que é
isso, e não outra cousa, que é entendido pelas palavras do Senhor: "N ão
julgueis,a fim de que não sejais condenados",(M ateus V II,1).
454 - IX .O desejo libidinoso de fornicar é mais grave,conforme se volta para o
desejo ardente das variedades e para o desejo ardente da defloração.
A razão disto, é que estes dois desejos ardentes são acessórios do adultério;
assim eles o tornam mais grave; com efeito, há adultérios pouco graves,
adultérios graves, e adultérios mais graves, e cada um destes adultérios é
considerado segundo a oposição ao amor conjugal; e, por conseguinte, segundo
a destruição deste amor; que o desejo ardente das variedades e o desejo ardente
da defloração, reforçados por atos, devastem o amor conjugal, e o mergulhem
como no fundo do mar,ver-se-á quando se tratar desses dois assuntos.
455 - X .A Esfera do desejo libidinoso de fornicar tal como é no começo fica no
334

meio entre a esfera do amor escortatório e a esfera do amor conjugal e faz


equilíbrio.
N o Capítulo precedente, tratou-se destas duas esferas, a do Amor escortatório e
a do Amor conjugal, e foi mostrado que a esfera do Amor escortatório sobe do
Inferno, e que a esfera do Amor conjugal desce do Céu, nº 435; que estas duas
esferas se encontram uma com a outra em um e outro M undo, mas não se
conjuntam, nº 436; que entre estas duas esferas há um equilíbrio, nº 437; que
o homem pode se voltar para a esfera que lhe agrada, mas quanto mais se volta
para uma, tanto mais se afasta da outra, n. 438; depois, o que é entendida, por
esferas, nº 434; e pelas passagens que aí são citadas. Se a esfera do desejo
libidinoso de fornicar fica no meio entre estas duas esferas, e faz equilíbrio, é
porque quando se está nesta esfera, pode-se voltar para a esfera do amor
conjugal, isto é, para este amor, e também para a esfera do amor do adultério,
isto é, para o amor do adultério; mas se é para o amor conjugal, voIta-se para o
Céu, e se é para o amor do adultério, volta-se para o Inferno; um e outro está
no arbítrio, no bel-prazer e na vontade do homem, a fim de que ele possa agir
livremente segundo a razão, e não por instinto; por conseguinte, a fim de que
seja um homem e se aproprie do influxo, e não uma besta que não se apropria
de cous a alguma. Diz-se o desejo libidinoso da fornicação tal qual é no
começo, porque então está em um estado que fica no meio; quem é que não
sabe que tudo o que o homem faz no começo vem de uma cobiça, porque isso
vem do homem natural? E quem é que não sabe que esta cobiça não é
imputada, quando de natural ela se torna espiritual? Dá-se o mesmo com o
desejo libidinoso da fornicação,quando o amor do homem se torna conjugal.
456 - X I. É preciso velar com cuidado para que o amor conjugal não se perca
por fornicações imoderadas e desordenadas.
Pelas fornicações imoderadas e desordenadas, pelas quais se perde o amor
conjugal, entende-se fornicações nas quais não somente são debilitadas as
forças, mas também são suprimidas todas as delicadezas do amor conjugal; pois
de sua licença desenfreada nascem não somente as debilidades e por
conseguinte a falta de potência, mas também as impurezas e as impudicícias,
pelas quais o amor conjugal não pode ser nem percebido nem sentido em sua
pureza e em sua castidade,nem por conseguinte em sua doçura e nas delícias de
sua flor; sem falar dos prejuízos para o corpo e para a mente, e dos engodos
ilícitos que não somente despojam o amor conjugal de seus prazeres deliciosos,
mas também o suprimem e o mudam em frieza, e assim em desgosto; tais
fornicações são violentos excessos pelos quais os brincos conjugais são
transformados em cenas trágicas; com efeito, as fornicações imoderadas e
desordenadas são como incêndios que se elevam dos extremos, e queimam o
corpo, torrificam as fibras, corrompem o sangue, e viciam os racionais da
mente; pois elas se lançam como um fogo que sai das fundações de uma casa e a
consome inteiramente. O s pais devem prover a que isso não aconteça, porque
335

um rapaz, levado pelo desejo libidinoso, não pode ainda por sua razão impor a
si mesmo um freio.
457 - X II. Pois que o conjugal de um marido com uma espôsa é o T esouro da
vida humana,e o R eservatório da religião,cristã.
Estão aqui duas cousas que foram demonstradas universalmente e
singularmente, em toda a Parte precedente sobre o Amor conjugal e sobre as
delícias de sua sabedoria. Q ue seja o T esouro da vida humana, é porque a vida
do homem é tal qual é nele este amor, pois ele faz o íntimo de sua vida; com
efeito, ele é a vida de sua sabedoria coabitando com seu amor, e do amor
coabitando com sua sabedoria, e por conseguinte é a vida das delícias de um e
de outro; em uma palavra, é uma alma vivente por este amor; daí vem que o
conjugal de um marido com uma esposa seja chamado o T esouro da vida
humana.Isto é confirmado pelas proposições acima,que com uma única esposa
há uma amizade verdadeiramente conjugal, confiança, força, porque há união
das mentes, nºs 333 e 334; que neste conjugal e por este conjugal há as
beatitudes celestes, as felicidades espirituais, e por conseguinte os prazeres
naturais aos quais foi provido desde o começo para os que estão no amor
verdadeiramente conjugal, nº 335; que este amor é o amor fundamental de
todos os amores celestes e espirituais, e por conseguinte de todos os amores
naturais,e que nele foram reunidos todos os contentamentos e todas as alegrias,
desde as primeiras até às últimas,nº 65 a 69; e que considerado em sua origem,
ele seja o jogo da sabedoria e do amor,é o que foi plenamente demonstrado nas
Delícias da Sabedoria sobre o Amor conjugal, que formam a Primeira Parte
desta O bra.
458 - Q ue este Amor seja o R eservatório da R eligião Cristã, é porque esta
religião faz um e coabita com este amor; com efeito, foi demonstrado que neste
amor não entram e não podem entrar senão aqueles que se dirigem ao Senhor,
e que amam os veros de sua Igreja e praticam seus bens, ns. 70 e 71; que este
amor vem do Senhor só, e por conseguinte existe naqueles que são da R eligião
Cristã,nºs 131,335,336; que este amor é segundo o estado da Igreja, porque é
segundo os estados da sabedoria no homem, nº 130. Q ue estas coisas sejam
assim, isto foi confirmado em todo o Capítulo sobre a Correspondência deste
amor com o Casamento do Senhor e da Igreja, nº 116 a 131; e no Capítulo
sobre a O rigem deste amor pelo Casamento do bem e do vero,nº 83 a 102.
459 - X III. N aqueles que, por diversas causas, não podem ainda contrair
casamento, e que por causa da lubricidade (de temperamento) não podem
moderar os desejos libidinosos, este conjugal pode ser conservado, se o amor
vago do sexo for restringido a uma única amante.
Q ue o desejo libidinoso imoderado e desordenado não possa ser retido por
aqueles que não lúbricos, a razão o vê, e a experiência o ensina; portanto, a fim
de que este desejo imoderado e desordenado seja refreado naqueles que são
336

atormentados de efervescência, e que por várias causas não podem precipitar e


avançar seu casamento, e a fim de que seja levado a uma certa moderação e a
uma certa ordem, não se apresenta outro refúgio, e por assim dizer outro asilo,
senão a ligação com uma mulher, que em francês é chamada maitresse. Q ue
nos reinos onde as formas de governo são multiplicadas, muitos jovens não
podem contrair casamento senão quando sua juventude já passou, porque é
preciso primeiro merecer empregos e adquirir meios para sustentar uma casa e
uma família, somente então procurar uma esposa que seja conveniente, é uma
cousa conhecida; e entretanto, na idade que precede, a fonte da virtude viril
não pode, senão em um número muito pequeno, ser mantida fechada e
reservada para a esposa; importa, é verdade, que ela seja reservada, mas se, por
causa da violência desenfreada do desejo libidinoso, não o pode ser, pede-se um
meio termo, a fim de poder durante esse tempo, impedir que o amor conjugal
pereça. Q ue seja o Pelicato (relação com uma única amante), as considerações
seguintes o persuadem: I. Pelo Pelicato as fornicações indistintamente
desordenadas são refreadas e limitadas, e assim se introduz um estado mais
restrito, que é menos afastado da vida conjugal. II. O ardor venéreo, no
começo efervescente e como que escaldante, é aplacado e adoçado, e assim o
lascivo da lubricidade de temperamento, que é medonho, é moderado por
alguma cousa que é como que o análogo do casamento. III. Pelo Pelicato as
forças não são prodigalizadas, e não é contraído enfraquecimento, como pelas
satiríases vagas e ilimitadas. IV . Por ele também, as moléstias contagiosas do
corpo e os frenesis da mente são evitados. V . Por ele igualmente, o homem se
guarda dos adultérios que são o comércio carnal com as esposas, e das
corrupções que são as violações das donzelas; sem falar dos atos criminosos que
não se devem mencionar; com efeito, um rapaz, quando está na idade da
puberdade, não pensa que os adultérios e os atos de corrupção sejam outra
cousa diferente das fornicações, por conseqüência pensa que um é a mesma
cousa que o outro; não sabe também resistir por sua razão às instigações de
certas pessoas do sexo, que estudaram com cuidado os artifícios das cortesãs;
mas no pelicato que é uma fornicação menos desordenada e menos prejudicial
à saúde,ele pode aprender e ver as diferenças. V I. Pelo Pelicato não há também
mais acesso aos quatro gêneros de desejo libidinoso que são no supremo grau
destrutivos do amor conjugal, os quais são o desejo libidinoso da defloração, o
desejo libidinoso das variedades, o desejo libidinoso da violação, o desejo
libidinoso de seduzir os inocentes; desejos de que se falará no que segue. M as o
que acaba de ser dito não é para aqueles que podem moderar o ardor do desejo
libidinoso; nem para aqueles que logo que atingem a juventude, podem
contrair casamento, e oferecer à sua esposa e empregar com ela as primícias de
sua força.
460 - X IV . O Pelicato é preferível a um vago desejo libidinoso, desde que não
seja formado com várias amantes, nem com uma virgem ou donzela intacta,
nem com uma mulher casada,e que seja mantido separado do amor conjugal.
337

Q uando e com quem o Pelicato é preferível a um vago desejo libidinoso, é o


que acaba de ser apontado a dedo. I. Q ue o Pelicato não deve se fazer senão
com uma única pessoa, é porque com várias há uma poligamia que põe o
homem no estado inteiramente natural,e o precipita no estado sensual, a ponto
de não poder ser elevado ao estado espiritual, onde deve estar o amor conjugal;
ver nºs 338 e 339. II. Q ue não deve se fazer com uma virgem ou donzela
intacta,é porque o amor conjugal nas mulheres faz um com sua virgindade; daí
vem a castidade, a pureza e a santidade deste amor; é por isso que prometer e
entregar a um homem esta virgindade, é dar um certificado de que se amará
eternamente; uma donzela não pode portanto concedê-la por nenhum
consentimento racional, a não ser que seja com promessa de aliança conjugal;
esta virgindade é também a coroa de sua honra; é por isso que arrebatar esta
virgindade sem a aliança do casamento,e em seguida abandonar esta donzela, é,
de uma donzela que pode se tornar uma noiva e uma casta esposa, fazer uma
prostituta, ou privar um outro homem de seus direitos; e um e outro é
pernicioso; é por isso que aquele que toma uma donzela por amante, pode, é
verdade,coabitar com ela,e assim iniciá-la na amizade do amor, mas entretanto
com a intenção constante de que ela seja ou se torne sua esposa, se ela não se
entregar a outros. III. Q ue o Pelicato não deve se fazer com uma mulher
casada, é porque é um adultério, isso é evidente. IV . Q ue o amor do Pelicato
deve ser mantido separado do amor conjugal, é porque estes amores são
distintos, e não devem por conseguinte ser misturados; com efeito, o amor do
pelicato é um amor incasto, natural e externo; mas o amor do casamento é
casto, espiritual e interno; o amor do pelicato distingue as almas dos dois, e
conjunta unicamente os sensuais do corpo; mas o amor do casamento une as
almas, e também pela união das almas os sensuais do corpo, a ponto de que de
dois eles se tornam como um, isto é, uma só carne. V . O amor do pelicato
entra unicamente no entendimento, e nas cousas que dependem do
entendimento; mas o amor do casamento entra também na vontade e nas coisas
que dependem da vontade,por conseguinte em todas e em cada uma das cousas
do homem; é por isso que, se o amor do pelicato se torna amor do casamento,
o homem não pode, por direito algum, se retirar sem violação da união
conjugal; se se retira,e toma uma outra mulher,o amor conjugal perece em sua
rutura. É preciso que se saiba que o amor do pelicato é mantido separado do
amor conjugal, por isso que o homem não promete casamento à sua amante, e
não a induz a esperança alguma de casamento. É melhor entretanto acender de
princípio a chama do amor do sexo com uma espesa.
461 - Ao que precede ajuntarei este M emorável:
U m dia eu conversava com um Espírito noviço que, quando estava no M undo
tinha meditado muito sobre o Céu e sobre o Inferno; por Espíritos noviços são
entendidos os homens recentemente falecidos, que, porque são então homens
espirituais, são chamados Espíritos. Este desde que entrou no M undo
338

espiritual, começou a meditar, como antes, sobre o Céu e sobre o Inferno; e se


sentia alegre quando era sobre o Céu, e triste quando era sobre o Inferno.
Q uando verificou que estava no M undo espiritual, perguntou imediatamente
onde estava o Céu e onde estava o Inferno, e também o que era o Céu e o
Inferno, e qual era um e outro; e responderam-lhe: “O Céu está acima da tua
cabeça, e o Inferno está sob teus pés; pois agora estás no M undo dos espíritos,
que fica no meio entre o Céu e o Inferno; mas o que é o Céu e qual é ele, e o
que é o Inferno e qual é ele, não podemos te dizer em poucas palavras". E
então como ardia com o desejo de conhecer, lançou-se de joelhos, e pediu a
Deus com fervor, a fim de ser instruído; e eis que um Anjo apareceu à sua
direita, o levantou e lhe disse: "Suplicaste a fim de ser instruído sobre o Céu e
sobre o Inferno,Procura e aprende o que é o Prazer, e saberás". E depois de ter
assim falado o Anjo foi arrebatado. Então o Espírito noviço disse consigo
mesmo: "Q ue significam estas palavras: Procura e aprende o que é o prazer, e
saberás o que é o Céu e o que é o Inferno, e quais são eles?" Pouco depois,
deixando este lugar, foi para todo lado; e dirigindo-se aos que encontrava lhes
dizia: "Peço-te que me digas, por favor, o que é o Prazer". E uns diziam: "Q ue
pergunta nos fazes tu? Q uem ignora o que é o prazer? N ão é o contentamento e
a alegria? U m prazer é portanto um prazer, um tanto quanto o outro, não
conhecemos diferença". O utros diziam: “O Prazer é o riso da mente, pois
quando a mente ri, a face está prazenteira, a linguagem alegre, o gesto
agradável, e o homem todo está no prazer". O utros porém, diziam: “O prazer
não é outra coisa senão estar em festa, e comer manjares deliciosos, beber e
embriagar-se com um vinho generoso, e então conversar sobre cousas diversas,
e sobretudo a respeito dos brinquedos de V ênus e Cupido". Depois de ter
ouvido estas palavras,o Espírito noviço indignado, disse consigo mesmo: "Estas
respostas são grosseiras e incivis; estes prazeres não são o Céu nem o Inferno;
que pena não poder encontrar sábios!" E deixou estes Espíritos, e foi a procura
de espíritos sábios; e então foi visto por um Espírito angélico, que lhe disse:
"Percebo que estás inflamado pelo desejo de saber o que é o U niversal do Céu e
o U niversal do Inferno e como isso é o Prazer, eu te conduzirei sobre uma
Colina, onde se reúnem cada dia aqueles que escrutam os Efeitos, aqueles que
procuram as Causas, e aqueles que examinam os Fins; há três Assembléias, e os
que escrutam os Efeitos são chamados os Espíritos das ciências, e abstratamente
as Ciências, os que procuram as causas são chamados os Espíritos da
inteligência, e abstratamente as Inteligências, e os que examinam os Fins são
chamados os Espíritos da sabedoria, e abstratamente as Sabedorias; diretamente
acima deles, no Céu, há Anjos que pelos fins vêem as causas, e pelas causas os
efeitos; e por meio dêstes Anjos que estas três Assembléias têm a ilustração".
Então, tomando o Espírito noviço pela mão, ele o conduziu à Colina, e para a
Assembléia composta daqueles que examinam os Fins, e são chamados as
Sabedorias.O Espírito noviço lhes disse: "Perdoa-me por ter subido até vós; eis
a razão disso: Desde minha juventude, tenho meditado sobre o Céu e sobre o
339

Inferno, e cheguei há pouco a este M undo; e alguns, que então me foram


associados, me disseram que aqui o Céu está acima da minha cabeça, e o
Inferno sob meus pés; mas não me disseram o que é o Céu e o Inferno, nem
quais são eles; por isso tendo me tornado inquieto em conseqüência de um
pensamento constante sobre este assunto, orei a Deus; e então um Anjo se
apresentou e me disse: "Procura e aprende o que é o Prazer, e saberás; tenho
procurado mas em vão até ao presente; peço portanto que me ensineis, se isso
vos agrada, o que é o Prazer". A esse pedido os da Sabedoria responderam: "O
Prazer é o tudo da vida para todos no Céu, e o tudo da vida para todos no
Inferno; para aqueles que estão no Céu, é o Prazer do bem e do vero; mas para
aqueles que estão no Inferno, é o Prazer do mal e do falso; pois todo prazer
pertence ao Amor,e o Amor é o Ser da vida do homem; é por isso que, como o
homem é homem segundo a qualidade de seu Amor, do mesmo modo ele é
homem segundo a qualidade de seu Prazer; a atividade do Amor faz a sensação
do prazer; sua atividade no Céu é com a sabedoria; e sua atividade no Inferno é
com a loucura; uma e outra fixa o Prazer em seus objetos; ora, os Céus e os
Infernos estão em Prazeres opostos, porque estão em Amores opostos, os Céus
no Amor e por conseguinte no Prazer de bem fazer, e os Infernos no Amor e
por conseguinte no Prazer de mal fazer; se portanto conheces o que é o Prazer,
conhecerás o que é o Céu e o Inferno, e qual é um e outro. M as procura e
aprende ainda o que é o Prazer com aqueles que procuram as causas e que são
chamados Inteligências; eles estão aqui à direita". E ele se retirou, e foi, e disse
a causa de sua vinda, e lhes pediu para lhe ensinar o que é o Prazer, e eles,
encantados com sua questão, lhe disseram: "É uma verdade que aquele que
conhece o Prazer conhece-o que é o Céu e o Inferno, e qual é um e outro; a
vontade pela qual o homem é homem, não é excitada um só instante, se não o
é pelo Prazer; pois a V ontade, considerada em si mesma, não é outra coisa
senão a afeição de algum amor,assim de um prazer,pois que o que faz querer é
alguma coisa que agrada, que é agradável e encanta; e como a V erdade leva o
Entendimento a pensar, não existe a menor cousa da idéia de um pensamento,
a não ser pelo influxo do prazer da vontade; se é assim, é porque o Senhor põe
em ação por Ele M esmo, por meio de Seu influxo todas as cousas da alma, e
todas as da mente nos Anjos, nos Espíritos, e nos homens; e as põe em ação
pelo influxo do amor e da sabedoria, e este influxo é a atividade mesma, de
onde procede todo prazer, que em sua origem é chamado beatitude, ventura e
felicidade, e em sua derivação, prazer, encanto e agrado, e em um sentido
universal, Bem. M as os Espíritos do Inferno mudam em si todas as coisas, por
conseguinte também o Bem em M al, e o V ero em Falso, persistindo o Prazer
continuamente; pois sem a permanência do Prazer eles não teriam V ontade, e
nem Sensação, assim vida alguma; por aí vê-se claramente o que é o prazer do
inferno, qual ele é e donde vem". Depois de ter ouvido estas explicações ele foi
conduzido para a terceira Assembléia, onde estavam aqueles que escrutam os
Efeitos, e que são chamados Ciências; estes lhe disseram: "Desce à T erra
340

inferior, e sobe à T erra superior, tu perceberás e sentirás nesta os prazeres dos


Anjos do Céu, e naquela os prazeres dos espíritos do Inferno". M as eis que
então, a uma certa distância deles, se abriu o Solo, e pela abertura subiram três
diabos que pareciam em fogo pelo prazer de seu amor; e como os que estavam
consociados com o Espírito noviço percebiam que estes três diabos tinham
subido do Inferno segundo uma Previsão, exclamaram: "N ão vos aproximeis de
mais perto; mas do lugar onde estais, contai-nos alguma cousa de vossos
prazeres".E eles responderam:"Sabei que cada um,quer seja bom ou mau, está
em seu Prazer; o Bom, no prazer de seu bem; e o M au, no prazer de seu mal".
E lhes perguntaram: “O que é o vosso Prazer?" Disseram que eram os Prazeres
de cometer escortação, de se vingar, de roubar, de blasfemar; e perguntaram de
novo: "Q uais são esses Prazeres?" Disseram: "Eles são sentidos pelos outros
como fedores de escrementos,e como infecções de cadáveres, e como odores de
urina infecta". E lhes perguntaram: "Estas coisas são portanto agradáveis para
vós?" R esponderam: "M uito agradáveis". E lhes disseram: "Então, sois como
bestas imundas que vivem em semelhantes porcarias". R esponderam: "Se o
somos, nós o somos; mas estes odores são as delícias de nossas narinas". E lhes
perguntaram: "Q ue tendes ainda a contar?" Disseram: "É permitido a cada um
de nós estar em seu Prazer, mesmo no mais imundo, como o chamam, desde
que não infeste os bons Espíritos nem os Anjos; mas como pelo nosso prazer
não podemos fazer outra coisa senão infestá-los, temos sido lançados em
calabouços, onde sofremos cruelmente; ser privados e retirados de nossos
prazeres nesses calabouços, é o que se e chama o tormento do Inferno; é
também uma dor interior". Então lhes perguntaram: "Por que infestastes os
bons?" Disseram: "N ão podemos deixar de fazê-lo; é como um furor que se
apodera de nós, quando vemos um Anjo, e sentimos a Esfera Divina em torno
dele". A esta resposta lhes foi dito: "Assim, sois também como as bestas
ferozes". E pouco depois, quando estes diabos viram o Espírito noviço com os
Anjos, foram tomados de um furor que apareceu como um fogo de ódio; por
isso,com receio de que causassem danos, eles foram remergulhados no Inferno.
Em seguida apareceram Anjos que pelos fins viam as causas, e pelas causas os
efeitos, e que estavam no Céu acima destas três Assembléias, e foram vistos em
uma luz brilhante que, desenvolvendo-se por sinuosidades em espiral, trazia
com ela uma grinalda de flores em forma redonda,e a colocaram sobre a cabeça
do Espírito noviço; e então desta luz saiu uma voz que lhe disse: "Esta coroa de
Louro te é dada porque, desde a juventude tens meditado sobre o Céu e o
Inferno".
341

Da concubinagem

462 - N o Capítulo precedente, em que se tratou da Fornicação, tratou-se


também do Pelicato, e por este termo entendeu-se a conjunção contraída entre
um homem celibatário e uma mulher; mas aqui por Concubinagem é
entendida a conjunção semelhantemente contraída entre um homem casado e
uma mulher; aqueles que não distinguem os gêneros servem-se indistintamente
destes dois termos, como tendo o mesmo alcance, e por conseguinte a mesma
significação; mas como são dois gêneros, e como o termo de Pelicato convém
ao primeiro, porque uma amante (pellex) é uma cortesã, e o termo
Concubinagem ao segundo, porque uma concubina é uma companheira de
leito por substituição, é por isso que, por causa da distinção, o acordo
antenupcial com uma mulher é significado por Pelicato, e o acordo pós-nupcial
por Concubinagem. T rata-se aqui da Concubinagem por causa da ordem; pois
pela ordem se descobre qual é de uma parte o Casamento, e qual é de outra
parte o Adultério.Q ue o Casamento e qual é de outra parte o Adultério. Q ue o
Casamento e o Adultério sejam opostos, é o de que se tratou a princípio na
Capítulo sobre sua oposição; e quanto são opostos e de que maneira o são, é o
que não pode ser mostrado senão pelos intermediários que intervêm, no
número dos quais está também a Concubinagem; mas como há dois gêneros de
Concubinagem, e como eles devem ser absolutamente distinguidos, por isto
esta Seção, como as precedentes, será dividida em Artigos, o que terá lugar
nesta ordem:I.H á dois gêneros de Concubinagem,que diferem muito entre si;
um conjuntamente com a esposa, o outro separadamente de esposa. II. A
Concubinagem conjuntamente com a esposa não é de modo algum permitida
aos Cristãos, e é detestável. III. É uma Poligamia que foi condenada, e deve ser
condenada pelo M undo Cristão. IV . É uma escortação pela qual o Conjugal,
que é a mais preciosa Jóia da vida Cristã, é destruída. V . A Concubinagem
separadamente da esposa, quando se faz por causas legitimas, justas e
verdadeiramente conscienciosas, não é ilícita. V I. As causas legítimas desta
concubinagem são as causas legítimas do divórcio,quando entretanto a esposa é
retida em casa.V II.As causas justas desta Concubinagem são as causas justas de
separação de leito.V III. As causas conscienciosas desta Concubinagem são reais
ou não reais. IX . As causas conscienciosas reais são as que não são fundadas
sobre o justo. X I. O s que estão nesta Concubinagem por causas legítimas,
justas e conscienciosas reais, podem estar ao mesmo tempo no amor conjugal.
X II. Enquanto esta Concubinagem persiste, a conjunção atual com a esposa
não é permitida.Segue-se agora a explicação destes Artigos.
463 - I. H á dois gêneros de Concubinagem, que diferem muito entre si; uma
conjuntamente com a esposa,a outra separadamente da esposa.
342

Q ue haja dois gêneros de Concubinagem que diferem muito entre si; que um
destes gêneros consiste em ajuntar por substituição uma companheira de leito,
e viver conjuntamente e ao mesmo tempo com ela e com a esposa; que o outro
gênero consiste, após uma legítima e justa separação da esposa, em tomar em
seu lugar uma mulher para companheira de leito; e que estes dois gêneros de
Concubinagem diferem tanto um do outro, quanto uma roupa suja difere de
uma roupa lavada, é o que podem ver os que examinam as coisas claramente e
distintamente, mas não os que as vêem confusamente e indistintamente; e
mesmo os que estão no amor conjugal podem vê-lo, mas não os que estão no
amor do adultério; estes estão na noite em relação à todas derivações do amor
do sexo, mas aqueles estão no dia em relação a essas derivações; não obstante,
os que estão no adultério podem ver estas derivações e suas diferenças, não, é
verdade, nelas por eles, mas pelos outros quando ouvem falar disso, pois a
faculdade de elevar seu entendimento existe nos adúlteros semelhante à que há
no esposo casto, mas o adúltero, depois de ter reconhecidos as diferenças de
que ouviu falar pelos outros, as apaga sempre de sua lembrança, quando
mergulha seu entendimento em sua impura vontade; com efeito, o casto e o
incasto, o que é sensato e o que é insensato não podem estar juntos; mas
podem ser distinguidos pelo entendimento separado. U m dia, no M undo
Espiritual, perguntei aos que não tinham considerado os adultérios como
pecados, se conheciam uma diferença entre a fornicação, o pelicato, os dois
gêneros de concubinagem, e os graus de adultério; responderam que um era
como o outro; perguntei-lhes também se o casamento também era o mesmo;
olharam em torno se não havia algum membro do Clero, e não tendo visto
nenhum, disseram, que o casamento, considerado em si mesmo, era
semelhante. Foi diferente com os que, nas idéias de seu pensamento, tinham
considerado os adultérios como pecados; estes disseram que nas idéias
interiores, que pertencem à percepção, tinham visto as diferenças, mas que
ainda não se tinham aplicado a discerni-las, e a fazer-lhes a distinção; posso
afirmar que estas diferenças, até às mais minuciosas, são percebidas pelos Anjos
do Céu. Portanto, a fim de que seja bem manifesto que há dois gêneros de
Concubinagem opostos entre si, um pelo qual é destruido o amor conjugal, o
outro pelo qual ele não é destruido, o gênero condenável vai ser descrito
primeiro e,em seguida,o outro,que não é prejudicial.
464 - II. A Concubinagem conjuntamente com a esposa, não é absolutamente
permitida aos Cristãos,e é detestável.
Se não é permitida, é porque é contra a aliança conjugal; e, se é detestável, é
porque é contra a religião; e, o que é contra a religião, é ao mesmo tempo
contra a aliança conjugal, é contra o Senhor; é por isso que, desde que alguém,
sem causa conscienciosa real, junta uma concubina à esposa, o Céu lhe é
fechado, e não é mais contado pelos Anjos no número dos cristãos; desde esse
instante também, ele despreza as cousas que pertencem à Igreja e à R eligião, e
343

em seguida não levanta mais a face acima da natureza, mas se volta para ela
como para uma deidade, que é favorável a seu desejo libidinoso, e de seu
influxo em seguida seu espírito recebe a animação; a causa interior desta
apostasia é desvendada no que segue. Q ue esta concubinagem seja detestável,
este homem mesmo não o vê, porque depois que o Céu lhe foi fechado, ele se
tornou loucura espiritual; mas uma esposa casta o vê claramente, porque ela é
amor conjugal, e este amor tem desgosto por uma tal concubinagem; é por isso
que, muitas dentre estas se recusam em seguida à conjunção atual com seus
maridos, como uma cousa que macularia sua castidade pelo contágio do desejo
libidinoso aderente aos maridos proveniente das cortesãs.
465 - III. É uma poligamia que foi condenada e deve ser condenada pelo
M undo Cristão.
Q ue a Concubinagem simultânea ou conjunta com a esposa seja uma
Poligamia, ainda que não reconhecida, porque não é nem declarada nem por
conseguinte mencionada assim por lei alguma, cada um o vê, mesmo aquele
que não tem perspicácia; pois uma mulher de empréstimo e participando do
leito conjugal é como uma esposa; que a poligamia tenha sido condenada e
deve ser condenada no M undo Cristão, é o que foi demonstrado no Capítulo
sobre a Poligamia, especialmente nestes Artigos: não é permitido a um cristão
casar-se com uma segunda esposa, nº 338; se um Cristão se casa com várias
esposas, comete não somente um adultério natural, mas também um adultério
espiritual, nº 339; isso foi permitido à nação Israelita, porque nela não havia
Igreja Cristã, nº 340. Por estas explicações, é evidente que juntar uma
concubina à esposa, e partilhar seu leito com uma e com outra, é uma infame
poligamia.
466 - IV . É uma escortação pela qual o conjugal, que é a mais preciosa Jóia da
vida cristã,é destruido.
Q ue seja uma escortação mais oposta ao amor conjugal, que a escoriação
comum, que é chamada simples adultério, que prive absolutamente de toda
faculdade e de toda inclinação para a vida conjugal, que está no Cristão de
nascença, é o que pode ser provado por sólidos argumentos diante da razão do
homem sábio. Q uanto ao primeiro Ponto, que a concubinagem simultânea ou
conjunta com a esposa, é uma escortação mais oposta ao amor conjugal que a
escortação comum, que é chamada simples adultério, pode-se ver por estas
considerações; que na escoriação comum, ou adultério simples, não há um
amor análogo ao amor conjugal, pois é somente um ardor da carne, que esfria
imediatamente, e por vezes não deixa após si vestígios de amor pela mulher; é
por isso que, se esta lascívia efervescente não se dá por propósito determinado,
ou por confirmação, e se o adúltero se arrepende, ela não diminui senão muito
pouco o amor conjugal; é muito diferente com a escortação poligâmica, há nela
um amor análogo ao amor conjugal, pois não esfria, não se dissipa, e não se
reduz a nada após a efervescência como o precedente; mas permanece, se
344

renova e se afirma, e arrebata outro tanto do amor devido à esposa, e em lugar


deste amor introduz a frieza por ela; com efeito, o homem considera então
como agradável a concubina por causa do livre da vontade, porque, se lhe
apraz, se retira, o que é inato no homem natural, e isso sendo por conseguinte
agradável, sustenta este amor; e além disso, pelos atrativos, há com a concubina
uma união mais próxima do que com a esposa; e, vice-versa, não considera a
esposa como agradável por causa da obrigação em que está de coabitar com ela
por causa da aliança contraída para a vida, o que ele percebe então como mais
constrangedor em razão do livre em que está em relação à outra; que o amor
pela esposa esfrie, e que ela mesma se tome um objeto vil, no mesmo grau em
que o amor por uma cortesã se aquece e que esta é estimada, isto é evidente.
Q uanto ao segundo Ponto, que a concubinagem simultânea ou conjunta com a
esposa priva o marido de toda faculdade e de toda inclinação à vida conjugal,
que está nos cristãos de nascença, pode-se ver por estas considerações; que,
quanto mais o amor pela esposa é transformado em amor pela concubina, tanto
mais é retirado, esgotado e reduzido a nada pela esposa, como acaba de ser
mostrado acima; que isso se faça pelo fechamento dos interiores da mente do
marido, e pela abertura dos inferiores dessa mente, pode-se vê-lo pela sede da
inclinação nos Cristãos para amar uma única pessoa do sexo, pelo fato de que
esta inclinação está nos íntimos da mente,e que esta sede pode ser fechada, mas
não pode ser extirpada; se a inclinação para amar uma única pessoa do sexo, e
também a faculdade de receber este amor, foram implantadas nos Cristãos de
nascença, é porque este amor vem do Senhor só, e se tornou cousa da religião;
ora,no Cristianismo, o Divino do Senhor é reconhecido e adorado, e a religião
é fundada sobre a Palavra do Senhor; daí vem que este amor é enxertado e
também transplantado de geração em geração; foi dito que este Conjugal
Cristão perece pela escortação poligâmica, mas é entendido que no polígamo
cristão ele é fechado e interceptado, mas não obstante suscetível de ressuscitar
em seus descendentes, como acontece pela semelhança do avô e do bisavô se
reproduzindo nos netos e nos bisnetos; daí resulta que este Conjugal é chamado
a mais preciosa Jóia da vida Cristã, e acima, nºs 457 e 458, o T esouro da vida
humana e o R eservatório da R eligião Cristã. Q ue este Conjugal seja destruído
pela escortação poligâmica no cristão que a ela se entrega, vê-se manifestamente
em que o Cristão não pode do mesmo modo que o polígamo maometano,amar
a concubina e a esposa; mas quanto mais ama a concubina, ou se aquece por
ela, tanto mais não ama a esposa, ou esfria por ela; e, o que é mais detestável,
tanto mais reconhece de coração o Senhor apenas como um homem natural e
Filho de M aria,e não ao mesmo tempo como filho de Deus,e tanto mais ainda
considera a religião como nada. M as é preciso que se saiba que isso acontece
àqueles que ajuntam uma concubina à esposa, e se conjuntam efetivamente
com uma e com a outra, e de modo algum aqueles que, por causas legítimas,
justas e conscienciosas, se separam, e quanto ao amor efetivo se disjuntam da
esposa, e tomam uma mulher de empréstimo; é deste gênero de conuebinagem
345

que vai se tratar agora.


467 - V . A Concubinagem separadamente da esposa, quando se dá por causas
legítimas,justas e verdadeiramente conscienciosas,não é ilícita.
Q uais as causas entendidas por legítimas, quais as justas e quais as
verdadeiramente conscienciosas, é o que vai ser dito em ordem; é feita aqui, de
antemão, uma simples menção das causas, a fim de que esta concubinagem, de
que se trata a seguir,seja distinguida da Concubinagem precedente.
468 - V I. As causas legítimas desta Concubinagem são as causas legítimas de
divórcio,quando entretanto a esposa é retida em casa.
Por divórcio é entendida a anulação da aliança conjugal, e por conseguinte a
separação completa e após esta separação a inteira liberdade de tomar uma
outra esposa; a única causa desta total separação ou do divórcio é a escortação,
segundo o preceito do Senhor (M ateus X IX , 9). A esta mesma causa se referem
também as obscenidades manifestas que tiram todo pudor, e que enchem e
infestam a casa com intrigas criminosas, pelas quais se estabelece uma
impudícia escortatória que torna toda a mente dissoluta. A estas cousas pode-se
juntar uma maliciosa deserção que envolve uma escortação, e faz que a esposa
cometa adultério, e em conseqüência é repudiada (M ateus V , 22). Estas três
causas,porque são causas legitimas de divórcio,a primeira e a terceira perante o
juiz público,e a segunda perante o marido juiz,são também causas legítimas de
concubinagem,mas quando a esposa adúltera é retida na casa. Se a escortação é
a única causa de divórcio,é porque ela é diametralmente oposta à vida do amor
conjugal,e a destrói até à extinção,ver acima nº 255.
469 - Q ue não obstante numerosos maridos retêm em casa sua esposa adúltera,
as causas são estas: 1. O marido teme empenhar-se em um processo com a
esposa, acusá-la de adultério, e assim manifestar em público seu crime; pois se
as testemunhas oculares ou provas equivalentes a estas testemunhas não
estabelecerem a convicção, ele será coberto de sarcasmos, indiretamente nas
reuniões de homens, e abertamente nas reuniões de mulheres. 2. T eme
também as astuciosas justificações deste adultério, e mesmo seu patrocínio por
parte dos juizes, e por conseguinte a difamação de seu nome. 3. Além disso, os
usos domésticos oferecem vantagens que dissuadem de fazer separação da casa;
por exemplo, se há filhos em relação aos quais o amor, mesmo de uma mãe
adúltera, é um amor maternal; se deveres, mútuos, que não podem ser
divididos, intervêm e conjuntam; se, do lado paterno e do lado materno, a
esposa tem parentes e protetores dos quais se possa esperar a fortuna; se, no
começo, entreteve com ela agradáveis intimidades; e se ela, depois de se ter
tornado adúltera, sabe habilmente, por uma acariciante jovialidade e por
fingida urbanidade, aplacar o marido, a fim de não ser inculpada; além de
outros motivos que, sendo em si mesmos causas legítimas de divórcio, são
também causas legítimas de concubinagem; pois as causas que fazem reter a
346

esposa na casa não anulam a causa do divórcio, quando esta cometeu


escortação; qual é o homem, a não ser que seja vil, que possa conservar os
direitos do leito conjugal e partilhar sua cama com uma esposa adúltera? Se isso
acontece aqui e ali,nenhuma conclusão pode ser tirada daí.
470 - V II. As causas justas desta Concubinagem são as causas justas da
separação de leito.
H á causas legítimas de separação, e há causas justas; as causas legítimas são
estabelecidas por decisões dos juizes, e as causas justas por decisões que o
marido só pronuncia; as causas de separação de leito, e também de separação de
casa, tanto legitimas como justas, foram enumeradas abreviadamente, acima,
nºs 252 e 253; entre elas,os V ícios do corpo; são as moléstias pelas quais todo o
corpo está de tal modo infectado que o contágio pode ser fatal; tais são as
Febres malignas e pestilenciais, as Lepras, os M ales venéreos, os Cânceres;
depois as M oléstias pelas quais todo o corpo é de tal modo abatido que não
pode mais existir consociabilidade, e pelas quais são exa.lados eflúvios
prejudiciais, e vapores nocivos, seja da superfície do corpo, seja de suas partes
interiores, especialmente do Estômago e do Pulmão; da superfície do corpo, as
V aríolas malignas, as V errugas, as Pústulas; a T ísica escorbútica, os Dartros,
sobretudo se a face foi maculada; do Estômago, os Arrotos constantemente
infectos, fedorentos e desagradáveis; do Pulmão, os H álitos fétidos e pútridos
provenientes de apostemas, de úlceras ou de abscessos, ou de um vício do
sangue ou do serum. Além destas M oléstias, há outras de diferentes nomes,
como Lipotimia, que é um completo langor do corpo, e uma falta de forças; a
Paralisia,que é uma redução e um relachamento dos membros e dos ligamentos
que servem ao movimento; a Epilepsia, a enfermidade permanente proveniente
da Apoplexia; certas M oléstias crônicas; a Paixão ilíaca, a H érnia, além de
outras moléstias que a Patologia faz conhecer. O s V ícios da M ente, que são
causas justas de separação de leito e de casa, são, por exemplo, a M ania, o
Frenesi, o T ransporte furioso, a Loucura efetiva e a Imbecilidade, a perda da
memória, e outras semelhantes. Q ue estas causas sejam causas justas de
concubinagem,porque são causas justas de separação,a razão o vê sem ajuda de
um juiz.
471 - V III. As causas conscienciosas desta Concubinagem são reais ou não
reais.
Pois que, além das causas justas, que são justas causas de separação, e que por
conseguinte se tornam justas causas de concubinagem, há também causas
conscienciosas que dependem do julgamento e da justiça do marido; deve-se
também, por conseguinte, fazer menção delas; mas como os julgamentos de
justiça podem ser pervertidos, e ser mudados por confirmações em aparências
do justo, é por isso que estas causas são distinguidas em causas conscienciosas
reais e em causas conscienciosas não reais,e que são descritas separadamente.
347

472 - IX .As causas conscienciosas reais são as que estão fundadas no justo.Para
conhecer as causas que são causas conscienciosas reais, é bastante enumerar
algumas; por exemplo, a falta de estorge, e por conseguinte a apatia em relação
aos filhos; a intemperança, a embriaguez, a falta de asseio, a impudicícia; o
desejo imoderado de divulgar os segredos da casa, de disputar, de bater, de se
vingar, de fazer mal, de roubar, de enganar; uma dessemelhança interna de
onde resulta a antipatia; uma impudente exigência do dever conjugal, pela qual
o marido se torna frio como a pedra; a aplicação a atos de magia e a sortilégios,
uma excessiva impiedade; e outros vícios semelhantes.
473 - H á também causas menos graves, que são causas conscienciosas reais, e
que separam do leito, mas não entretanto, da casa; a cessação da prolificação na
esposa em razão de uma idade avançada, e por conseguinte a repugnância e a
tergiversação para o amor atual, persistindo sempre o ardor no marido; além de
casos semelhantes, nos quais o julgamento racional vê o justo, e que não ferem
a consciência.
474 - X . As causas conscienciosas não reais são as que não estão fundadas sobre
o justo,ainda que o estejam sobre a aparência do justo.
Estas causas são conhecidas pelas causas conscienciosas reais acima enumeradas,
e, se não são bem examinadas, podem aparecer como justas, e contudo são
injustas; por exemplo, os tempos de abstinência exigidos após os partos, as
indisposições transitórias das esposas,o prejuízo que daí resulta para o prolífico,
as poligamias permitidas aos Israelitas, e outras causas semelhantes que, pela
justiça, não têm valor algum; estas são imaginadas pelos maridos após frieza
contraídas,quando desejos libidinosos incastos os privaram do amor conjugal, e
os infatuaram com a idéia da semelhança deste amor com o amor escortatório;
estes,para se porem ao abrigo da difamação quando entram em concubinagem,
dão como legítimas e reais estas causas bastardas e capciosas, e mesmo
ordinariamente espalham mentiras a respeito da esposa, que segundo o favor
obtêm mesmo o assentimento e a aprovação dos concidadãos amigos.
475 - X I. O s que estão na Concubinagem por causas legítimas, justas e
conscienciosas reais,podem estar ao mesmo tempo no amor conjugal.
Diz-se que eles podem estar ao mesmo tempo no amor conjugal, e é entendido
que podem manter este amor encerrado neles; pois na pessoa em que está, este
amor não perece, mas repousa. Se o amor conjugal nos que preferem o
casamento à concubinagem, e que entram na Concubinagem pelas causas
acima mencionadas, é conservado, eis a razão: É que esta concubinagem não
repugna ao amor conjugal; que ela não é uma separação deste amor; que é
somente um véu que o cobre; que este véu é tirado após a morte. I. Esta
Concubinagem não repugna o amor conjugal. É a conseqüência do que foi
acima demonstrado, que esta concubinagem, quando se faz por causas
legítimas, justas e conscienciosas reais, não é ilícita, nº 467 a 473 - II. Esta
348

concubinagem não é uma separação do amor conjugal. Com efeito, quando


causas legítimas, ou justas, ou conscienciosas reais, sobrevêm, persuadem,
constrangem,o amor conjugal não é separado com o casamento, mas é somente
interrompido, e o amor interrompido e não separado, permanece na pessoa;
dá-se com isso como com um homem que exerce um emprêgo que ama, e de
que é afastado pelas sociedades, ou pelos espetáculos, ou pelas viagens; o amor
de seu emprego entretanto não é perdido; ou como se dá com um homem que
gosta de um vinho generoso; quando bebe um menos bom, não perde por isso
seu gosto pelo vinho generoso. III. Esta concubinagem é somente um véu que
cobre o amor conjugal. É porque o amor da concubinagem é natural, e o amor
do casamento, espiritual; e o amor natural vela o amor espiritual quando este é
interceptado; que assim seja, aquêle que ama não o sabe, porque o amor
espiritual é sentido não por ele mesmo, mas pelo amor natural, e é sentido
como um prazer no qual está uma beatitude que vem do Céu; mas o amor
natural é sentido por ele mesmo unicamente como um prazer. IV . Este véu é
tirado depois da morte.É porque então o natural do homem se torna espiritual,
e que em lugar de um corpo material ele goza de um corpo substancial, no qual
o prazer natural pelo espiritual é sentido em sua proeminência; que assim seja,
é o que aprendi pela comunicação com alguns no M undo espiritual, e lá
mesmo pelos R eis que no M undo tinham estado na Concubinagem por causas
conscienciosas reais.
476 - X II. Enquanto dura esta Concubinagem, a conjunção atual com a esposa
não é permitida.
É porque então o Amor conjugal, que em si mesmo é espiritual, casto, puro e
santo, se torna natural, é maculado, não tem mais vigor, e assim perece; é por
isso que, a fim de que este amor seja conservado, é útil que a concubinagem
por causas conscienciosas reais, nºs 472 e 473, se faça com uma só e não com
duas ao mesmo tempo.
477 - Ao que precede ajuntarei este M emorável:
O uvi um certo espírito, um rapaz, recentemente vindo do mundo, jactandose
de suas escortações, e procurando conquistar louvores, porque ultrapassava os
outros em potência viril; no meio dessas gabolices insolentes, ele sustentava
estes propósitos: “O que há de mais triste do que aprisionar seu amor, e viver
só com uma única mulher? E o que há de mais delicioso do que dar toda
liberdade ao amor? Q uem é que não se cansa de uma só, e não é reposto em
vigor por várias? O que há de mais agradável do que a liberdade sem reserva, a
variedade, as deplorações, as peças pregadas aos maridos, e as hipocrisias
escortatórias? N ão é exato que as cousas obtidas por astúcias, por fraudes e por
furtos deleitam os íntimos da mente?" O uvindo estes propósitos os que estavam
presentes, disseram: "N ão fala assim; tu não sabes onde estás; mal acabas de
chegar; há sob os teus pés o Inferno, e acima da tua cabeça o Céu; estás agora
em um M undo que fica no meio entre o Céu e o Inferno, e que é chamado
349

M undo dos Espíritos; aqui chegam, e aqui são recebidos todos os que saem do
mundo; são examinados quanto à sua qualidade,e são preparados,os maus para
o Inferno,e os bons para o Céu; talvez te lembres ainda de ter ouvido dizer, no
M undo, pelos sacerdotes, que os escortadores e as prostitutas são precipitados
no Inferno, e que os esposos castos são elevados ao Céu". A estas palavras, este
espírito noviço se pôs a rir, dizendo: “O que é o Céu, e o que é o Inferno? O
Céu,não é onde cada um é livre, e não é livre aquele a quem é permitido amar
tantas mulheres quantos lhe apraz? E o Inferno não é onde cada um é escravo, e
não é escravo aquele que é obrigado a ficar ligado a uma só?" M as um certo
Anjo, olhando do Céu para baixo, ouviu o que ele dizia, e o interrompeu com
receio que fosse mais adiante para profanar os casamentos; e lhe disse "Sobe
aqui, e eu te mostrarei ao vivo o que é o Céu, e o que é o Inferno, e qual é o
inferno para os escortadores confirmados". E lhe mostrou o caminho, e este
subiu; e depois que foi admitido, foi a princípio conduzido a um jardim
paradisíaco, onde estavam árvores de frutas e flores, cuja beleza, encanto e
perfume enchiam as mentes (animi) com as delícias da vida; desde que as viu
foi tomado de uma grande admiração; mas ele estava então na vista externa, tal
como a tinha no M undo, quando via cousas semelhantes, e nesta vista ele era
racional; mas na vista interna, na qual a escortação era o principal e ocupava
cada ponto do pensamento, ele não era racional; por isso a vista externa foi
fechada, e a vista interna foi aberta; desde que foi aberta ele disse: “O que vejo
agora? N ão é palha e madeira seca? E o que é que é que sinto agora? N ão é mau
cheiro? O nde estão pois estes objetos paradisíacos?" E o Anjo disse: "Estão
muito perto e presentes, mas não aparecem diante de tua vista interna, que é
escortatória; pois esta vista muda as cousas celestes em infernais, e não vê senão
os opostos; há em cada homem uma mente interna e uma mente externa, por
conseqüência, uma vista interna e uma vista externa; nos maus a mente interna
é insensata, e a mente externa é sábia, mas nos bons a mente interna é sábia, e
também, por ela, a mente externa; e como é a mente, assim o homem no
M undo Espiritual vê os objetos". Depois disso o Anjo pelo poder que lhe foi
dado, lhe fechou a vista interna e abriu a externa, e o conduziu pelas portas
para o ponto central das habitações; e este espírito viu magníficos palácios de
alabastro e de diversas pedras preciosas, e perto destes palácios pórticos e
colunas em torno, superpostas e carregadas de ornamentos e de decorações
admiráveis; quando os viu, ficou grandemente admirado, e disse: “O que é que
vejo? V ejo objetos magníficos em sua magnificência mesma, e obras de
arquitetura em sua arte mesma". M as então o Anjo lhe fechou de novo a vista
externa, e lhe abriu a interna, que era má, porque era imundamente
escortatória; imediatamente este espírito exclamou, dizendo: “O que seja agora?
O nde estão pois estes palácios e estes objetos magníficos? V ejo ruínas
escombros e lugares cheios de cavernas". M as pouco depois foi reposto no
externo, e introduzido em um destes palácios; e viu as decorações das portas,
das janelas, das paredes e dos tetos, principalmente dos móveis sobre os quais e
350

em torno dos quais estavam formas celestes em ouro e em pedras preciosas, que
não podem ser descritas por linguagem alguma, nem desenhadas por arte
alguma, pois estavam acima das idéias da linguagem, e acima das noções de
arte. V endo estas cousas, ele exclamou de novo, dizendo: "Estão aí objetos
maravilhosos que o olho jamais viu". M as então sua vista interna foi aberta,
tendo sido fechada a vista externa, como antes; e lhe foi perguntado o que via
naquele momento; e ele respondeu que não via senão pardieiros, aqui de junco,
ali de palha, e lá em tições. Depois foi ainda reposto no estado externo da
mente, e diante dele foram trazidas V irgens que eram belezas, porque eram
imagens da afeição celeste; e estas, com a doce voz de sua afeição, lhe dirigiram
a palavra,e então,pelo que viu e ouviu,sua face foi mudada,e ele voltou por si
mesmo para seus internos, que eram escortatórios; e como estes internos não
suportam coisa alguma do amor celeste, e que vice-versa, não são suportados
pelo amor celeste, resultou que de uma parte e de outro, desapareceram; as
virgens da presença do homem, e o homem da presença das virgens. Depois
disso, o Anjo lhe ensinou de onde provinham as mudanças de estado de suas
vistas, dizendo-lhe: "Percebo que no M undo, de onde vens, foste duplo, um
nos internos e outro nos externos; que nos externos foste um homem civil,
moral e racional, mas que nos internos não foste nem civil, nem moral, nem
racional, porque eras escortador e adúltero; ora, tais pessoas, quando lhes é
permitido subir ao Céu, e que aí são mantidos em seus externos, podem ver aí
as cousas celestes, mas quando seus internos são abertos, em lugar das cousas
celestes, eles vêem as coisas infernais. Entretanto, fica sabendo que aqui, em
cada um, sucessivamente são fechados os externos e abertos os internos, e que
se é assim preparado para o Céu ou para o Inferno; e como o mal da escortação
macula mais do que todo outro mal os internos da mente, é impossível que não
seja levado para as cousas,impuras de seu amor,e estas cousas estão no inferno,
onde as cavernas espalham odores de escrementos. Q uem é que não pode, pela
razão, saber que no M undo espiritual o incasto e o lascivo são impuros e
imundos, e que assim nada corrompe e suja mais o homem, e nada introduz
mais nele o infernal. G uarda-te pois de te gloriares daqui por diante de tua
escortação, porque és nela mais másculo do que os outros; eu te predigo que te
tornarás fraco, ao ponto de saber apenas onde está a tua força máscula; uma tal
sorte espera aqueles que se gloriam de sua potência escortatória". Depois de
ouvir estas palavras, ele desceu e voltou ao M undo dos Espíritos e para seus
primeiros companheiros, e conversou com eles com modéstia e castidade, mas
não foi por muito tempo.
351

Dos adultérios,de seus gêneros e


de seus graus

478 - Q uem quer que não julgue o Adultério senão pelos externos, não pode
saber que há algum mal neste ato, pois nos externos ele é semelhante ao
Casamento; estes juízes externos quando se lhes fala dos internos, e se lhes diz
que os Externos tiram dos Internos, seu bem e seu mal, dizem em si mesmos:
“O que são os Internos? Q uem os vê? N ão é isso elevar-se acima da esfera da
inteligência de quem quer que seja?" Estes assemelham-se aos que aceitam todo
pretenso bem por um bem real voluntário, e que decidem da sabedoria de um
homem pela elegância de sua conversação,ou que julgam o mesmo pela riqueza
de seus hábitos e a magnificência de suas equipagens, e não pela sua disposição
interna que pertence ao julgamento proveniente da afeição do bem; esta
maneira de julgar assemelha-se ainda ao julgamento que se proferisse sobre o
fruto de uma árvore, e sobre alguns alimentos, unicamente pela vista e o tato, e
não sobre sua bondade pelo sabor e o conhecimento; assim fazem aqueles que
não querem perceber cousa alguma dos internos do homem; daí esta loucura de
muitos homens hoje, que nada vêem de mal nos adultérios, e que mesmo
conjuntam no mesmo leito os casamentos e os adultérios, isto é, os fazem
absolutamente semelhantes; e isso, unicamente por causa da aparência de
similitude nos externos. Q ue assim seja, eu adquiri a convicção por esta prova
da experiência: U m dia, Anjos convocaram algumas centenas de espíritos
dentre os que tinham sido afamados na Europa por seu gênio, sua erudição e
sua sabedoria; foram interrogados sobre a diferença entre o Casamento e o
Adultério, e e foram convidados a examinar as razões que seu entendimento
apresentasse; e, depois do exame, todos, a exceção de dez, responderam que só
a lei civil estabelece uma diferença em vista de um certo interêsse, diferença
que se pode, é verdade, conhecer, mas não obstante acomodar por meio da
prudência civil; em seguida lhes foi perguntado se viam algum bem no
casamento, e algum mal no adultério; responderam que não viam nem mal
racional nem bem racional. Fizeram-lhes esta pergunta: "V êdes aí algum
pecado?" Disseram: "O nde estaria este pecado? O fato não é o mesmo?" O s
Anjos ficaram admirados destas respostas, e exclamaram: “O h! qual é a
estupidez do século, e quão grande é ela!" O uvindo esta exclamação, estas
centenas de sábios se voltaram e disseram entre si, rindo: "É isto estupidez? H á
alguma sabedoria que possa convencer que amar a esposa de um outro mereça a
danação eterna?" M as que o Adultério seja um mal espiritual, e
conseqüentemente um mal moral e um mal civil, e diametralmente contrário à
sabedoria da razão; mais ainda, que o amor do adultério venha do inferno e
352

para aí retorne,e que o amor do casamento venha do Céu e para aí retorne, é o


que foi demonstrado no Primeiro Capítulo desta Parte, concernente à
O posição do amor escortatório e do amor conjugal. M as como todos os males,
do mesmo modo que todos os bens, têm latitude e altitude, e que seus gêneros
são segundo a latitude e seus graus segundo a altitude, por isso, a fim de que os
adultérios sejam conhecidos quanto a uma e outra dimensão, eles serão
divididos primeiro em seus gêneros, e em seguida em seus graus, o que se fará
nesta série: I. H á três gêneros de adultérios, o Simples, o Duplo e o T riplo. II.
O Adultério simples é o de um homem celibatário com a esposa de um outro,
ou o de uma mulher não casada com o marido de uma outra. III. O Adultério
duplo é o de um marido com a esposa de um outro, ou de uma esposa com o
marido de uma outra. IV . O Adultério triplo é com os consangüíneos. V . H á
para os adultérios quatro graus, segundo os quais se fazem suas denominações,
suas inculpações, e depois da morte suas imputações. V I. O s Adultérios do
primeiro grau são os adultérios de ignorância, os quais são cometidos por
aqueles que não podem ainda ou que não podem de modo algum consultar o
entendimento, nem por conseguinte os reprimir. V II. O s Adultérios cometidos
por eles são leves.V III. O s Adultérios do segundo grau são adultérios do desejo
libidinoso, os quais são cometidos por aqueles que, é verdade, podem consultar
o entendimento, mas que por causas contingentes não o podem nesses
momentos. IX . O s Adultérios cometidos por eles são imputáveis, conforme na
continuação o entendimento os favoreça ou não os favoreça. X . O s Adultérios
do terceiro grau são os adultérios da razão, os quais são cometidos por aqueles
que confirmam pelo entendimento que não são males de pecado. X I. O s
Adultérios cometidos por eles são graves, e são imputados segundo as
confirmações. X II. O s Adultérios do quarto grau são os adultérios da vontade,
os quais são cometidos por aqueles que os consideram como lícitos e agradáveis,
e que não acreditam que sejam de tal importância que se deva consultar o
entendimento a seu respeito. X III. O s adultérios cometidos por eles são muito
graves, e lhes são imputados como males de propósito determinado, e
permanecem neles como delitos. X IV . O s Adultérios do terceiro e do quarto
grau são males de pecado, segundo a quantidade e a qualidade do
entendimento e da vontade neles, quer sejam cometidos em ato, quer não
sejam cometidos em ato. X V . O s Adultérios por propósito determinado da
vontade e os adultérios por confirmação do entendimento, tornam os homens
naturais, sensuais e corporais. X V I. Ao ponto de enfim rejeitarem para longe
deles todas as cousas da Igreja e da R eligião. X V II. Entretanto, eles gozam
sempre da racionalidade humana como os outros. X V III. M as servem-se desta
racionalidade quando estão nos externos, e abusam dela quando estão nos
Internos.Segue-se agora a explicação destes Artigos.
479 - I.H á três gêneros de adultério,o Simples,o Duplo e o T riplo.
T odas e cada uma das cousas que o Criador do U niverso criou, Ele as
353

distinguiu em gêneros, e cada gênero em espécies, e dividiu cada espécie, e


igualmente cada divisão, e assim por diante; e isso, a fim de que na variedade
perpétua das qualidades exista uma imagem do Infinito; assim o Criador do
U niverso distinguiu os bens e seus veros, e igualmente os males e seus falsos,
depois que nasceram. Q ue tenha distinguido em gêneros, espécies e diferenças
todas e cada uma das cousas no M undo espiritual, e que tenha reunido no Céu
todos os bens e todos os veros, e no Inferno todos os males e todos os falsos, e
que tenha disposto estes diametralmente contra aqueles, pode-se vê-lo pelo que
foi mostrado no T ratado do Céu e do Inferno publicado em Londres em 1758.
Q ue do mesmo modo também, no M undo natural, tenha distinguido e
distinga os bens e os veros, os males e os falsos nos homens, assim os homens
mesmos, isso pode ser conhecido por sua sorte depois da morte, pelo fato do
Céu ser para os bons, e o Inferno para os maus. O ra, pois que todas as cousas
que pertencem ao bem, e todas as cousas que pertencem ao mal, foram
distinguidas em gêneros, espécies, e assim por diante, por isso os Casamentos
foram distinguidos da mesma maneira, e semelhantemente seus opostos, que
são os Adultérios.
480 - II. O Adultério simples é o de um homem celibatário com a esposa de
um outro,ou de uma mulher não casada com o marido de uma outra.
Aqui, e no que segue, por Adultério entende-se uma escortação oposta ao
casamento; é oposta porque viola a aliança de vida contraída entre os esposos, e
faz em pedaços o seu amor, macula-o, e pára a união começada no tempo dos
esponsais e afirmada no começo do casamento; pois o Amor conjugal do
marido com uma única esposa une as almas após o compromisso e a aliança; o
adultério não rompe esta união, porque ela não pode ser rompida, mas a
detém,como aquele que fecha uma fonte em sua nascente,e assim a corrente, e
enche de águas sujas e pútridas a cisterna; do mesmo modo o amor conjugal,
cuja origem é a união das almas, é coberto de lama e fechado pelo adultério; e,
quando foi coberto de lama, de baixo se eleva o amor do adultério, que, à
medida que cresce, se torna carnal, e este amor se insurge contra o amor
conjugal e o destrói; daí a oposição do adultério e do casamento.
481 - A fim de que, de novo se conheça qual é a estupidez deste século, pelo
fato dos seus sábios não verem pecado algum no Adultério, como foi
descoberto pelos Anjos,acima,nº 478,acrescentarei aqui este M emorável:
"H avia certos Espíritos que, por um hábito contraído na vida do corpo, me
infestavam com uma habilidade particular, e isso por um influxo muito doce,
quase ondulante, tal como costuma ser o influxo dos espíritos probos; mas
percebi que havia neles astúcia e outras cousas semelhantes, no intuito de
seduzir e enganar; por fim dirigi a palavra a um deles, que, como me foi dito,
tinha sido general do exército quando vivia no M undo; e como percebi que
havia lascívia nas idéias do seu pensamento, conversei com ele na linguagem
espiritual com representativos, linguagem que exprime plenamente o que se
354

sente; e muitas coisas em um momento; ele me disse que na vida do corpo, no


M undo precedente, tinha considerado como nada os Adultérios; mas me foi
permitido dizer-lhe que os Adultérios são abomináveis, ainda que aos olhos
daqueles que os cometem, pareça, por causa do prazer que encontram neles e
do persuasivo que daí provém, que não são tais, e que são mesmo lícitos; que
ele podia também sabê-lo pelo fato dos Casamentos serem os V iveiros do
G ênero humano, e por isso mesmo os V iveiros do R eino Celeste, e que por
conseguinte não devem ser violados, mas ser considerados como santos; depois,
como ele deve saber, pois que está no M undo espiritual e no estado de
percepção, que o Amor conjugal desce do Senhor pelo Céu, e que deste amor,
como de um pai,deriva o amor mútuo que é o fundamento do Céu; e pelo fato
de que os Adúlteros, por pouco que se aproximem das Sociedades celestes,
sentem o odor infecto que está neles, e se precipitam daí para o Inferno; que
pelo menos teria podido saber que violar os casamentos, é agir contra as leis
Divinas, contra as leis civis de todos os reinos, e também contra a luz real da
razão, e assim contra o direito das gentes, porque é agir não sómente contra a
ordem Divina, mas ainda contra a ordem humana; disse-lhe além disso muitas
outras coisas. M as ele me respondeu que não tinha pensado nessas, cousas na
vida precedente; queria por meio de raciocínios examinar se era assim; mas lhe
foi dito que a verdade não admite os raciocínios, pois eles tomam a defesa dos
prazeres da carne contra os prazeres do espírito, e a carne ignora quais são os
prazeres do espírito; e que ele devia primeiro levar seu pensamento sobre as
cousas que acabavam de ser ditas, porque elas são veros; ou sobre este
princípio, muito conhecido no M undo, que ninguém deve fazer a outro o que
não quer que outro lhe faça; e assim, se alguém tivesse seduzido desta maneira
sua esposa, que ele amasse como acontece no começo de todo casamento,
então, quando estivesse, por causa disso, em estado de arrebatamento, não teria
ele, se falasse segundo esse estado, tido também os adúlteros em abominação, e
então, pois que goza de uma grande capacidade, não seria ele, mais que
qualquer outro, confirmado contra estas ações até ao ponto de as condenar
como infernais, e como G eneral de exército, e vivendo com bravos, não teria
ele,a fim de que isso não fosse para ele um opróbrio, ou matado o adúltero, ou
expulsado de casa a esposa prostituída?"
482 - III. O Adultério duplo é o de um marido com a esposa de um outro, ou
de uma esposa com o marido de uma outra.
Este Adultério é chamado duplo, porque é cometido por dois, e porque dos
dois lados a aliança do casamento foi violada: por isso ele é duas vezes mais
grave que o precedente. Foi dito acima, nº 480, que o Amor conjugal de um
marido com uma única esposa une as almas após o compromisso e a aliança, e
que esta união é este Amor mesmo em sua origem, e que ela é fechada e
suspensa pelo adultério, como a nascente e a corrente de uma fonte; que as
almas dos dois se unem, quando o amor do sexo é restringido a uma única do
355

sexo, o que acontece quando uma donzela se dá inteiramente a um mancebo


por uma aliança, e que reciprocamente por esta aliança o mancebo se dá
inteiramente à donzela, é o que é bem evidente nisto que as vidas de um e de
outro se unem, por conseguinte as almas, pois que estas são os princípios da
vida; esta união das almas é possível somente nos Casamentos monogâmicos,
ou de um único marido com uma única esposa, mas não nos Casamentos
poligâmicos, ou de um marido com várias esposas, porque nestes o Amor é
dividido, e naqueles é unido; se em sua sede suprema o Amor conjugal é
espiritual, santo, puro, é que por sua origem a alma de cada homem é celeste;
por isso recebe ela do Senhor imediatamente o influxo, pois recebe d'Ele o
casamento do amor e da sabedoria, ou do bem e do vero, e este influxo o faz
homem e o distingue das bestas. Desta união das almas, o Amor conjugal, que
está em sua santidade e em sua pureza espirituais, decorre na vida de todo o
corpo, e o enche de prazeres deliciosos, durante todo o tempo em que a sua
veia permanece aberta, o que acontece naqueles que pelo Senhor se tornam
espirituais. Q ue não haja nenhuma outra cousa senão o adultério, que fecha e
suspende esta sede do amor conjugal, esta origem ou fonte, e sua veia, isso é
evidente pelas palavras do Senhor, que é somente por causa do adultério que é
permitido repudiar a esposa, e tomar uma outra, (M ateus X IX , 4 a 9); depois
por estas, que aquele que se casa com uma repudiada comete adultério, (vers.
9). Q uando esta pura e santa fonte é fechada, ela fica, como foi dito acima,
cercada de imundícies, como uma pedra preciosa cercada de lixo, ou como pão
cercado de vômitos, imundícies que são inteiramente opostas à pureza e à
santidade desta fonte ou do Amor conjugal; desta oposição resulta a frieza
conjugal,e segundo esta frieza existe a atração lasciva do amor escortatório, que
se consuma por si mesmo; que seja isso um mal de pecado, é porque o santo é
coberto e assim a sua veia no corpo é obstruída, e em seu lugar sucede o
profano, e sua vela no corpo é aberta; por conseguinte, de celeste, o homem se
torna infernal.
483 - Ao que precede ajuntarei algumas particularidades do M undo espiritual,
que são dignas de ser relatadas: "O uvi dizer aí que alguns homens casados são
abrasados pelo desejo libidinoso de cometer escortação com mulheres intactas
ou virgens; outros com mulheres defloradas ou prostituídas; outros, com
mulheres casadas ou esposas; outros, com mulheres de raça nobre; ou. tros,
com mulheres de baixa extração; que assim seja, tive a confirmação nesse
M undo por vários espíritos de diversos reinos. Q uando meditava sobre a
variedade destes desejos libidinosos, perguntei se há quem encontre todo prazer
com as esposas dos outros sem sentir prazer algum com as mulheres que não
são casadas; a fim, portanto, de que eu conhecesse que os há, me foram
trazidos, de um certo reino, vários que foram constrangidos a falar segundo seu
desejo libidinoso.Estes disseram que sua única volúpia e seu único prazer era, e
é ainda, cometer adultério com as esposas dos outros; que lançavam os olhos
sobre belas mulheres, e as compravam por alto preço segundo sua opulência, e
356

que ordinariamente tratavam do preço com elas. Perguntei porque não


compravam mulheres não casadas; responderam que consideravam isso como
uma cousa comum, vil em si mesma, não produzindo prazer algum. Perguntei
se essas esposas voltavam em seguida para seus maridos e viviam com eles;
responderam que não voltavam, ou que viviam friamente com eles, porque se
tinham tornado prostitutas. Em seguida lhes perguntei sèriamente, se jamais
tinham pensado, ou se pensavam presentemente que isso é um duplo adultério,
porque o cometem estando eles mesmos casados,e que um tal adultério despoja
o homem de todo bem espiritual; mas a estas palavras a maior parte daqueles
que estavam presentes, se puseram a rir, dizendo: "O que é o bem espiritual?"
Entretanto, eu insisti, dizendo: "O que há de mais detestável do que misturar
sua alma com a alma do marido em sua esposa!N ão sabeis que na semente há a
alma do homem? Então eles se afastaram e disseram baixo entre si: "Q ue
prejuízo causa isso?" Enfim, disse "Ainda que não temais as leis Divinas, não
temeis as leis civis?" R esponderam:"N ão; tememos somente certos membros da
ordem eclesiástica, mas diante deles, escondemos isso, e se não o podemos
esconder, agimos polidamente com eles". Em seguida eu os vi divididos em
grupos,e entre estes,alguns lançados no inferno.
484 - IV .O Adultério triplo é com os consangüíneos.
Este adultério é chamado triplo, porque é três vezes mais grave do que os dois
precedentes. Q uais são os Consangüíneos, ou os R estos da carne, dos quais é
preciso não se aproximar, vê-se enumerados Levitico X V III, 6 a 17. As razões
pelas quais estes Adultérios são três vezes mais graves do que os dois acima
mencionados, são internas e externas; as razões internas procedem da
correspondência destes adultérios com a violação do casamento espiritual, que é
o do Senhor e da Igreja, e por conseguinte do bem e do vero; as razões externas
são que é preciso velar para que o homem não se torne como besta; mas não é
aqui o momento de desvendar mais estas razões.
485 - V . H á para os adultérios quatro graus, segundo os quais se fazem suas
denominações,suas inculpações,e depois da morte,suas imputações.
Estes graus não são gêneros, mas entram em cada gênero, e constituem as
diferenças entre um maior e um menor mal, ou um maior e um menor bem;
aqui, por exemplo, se o Adultério de cada gênero, em razão de circunstâncias e
de contingências, deve ser reputado mais leve ou mais grave; que as
circunstâncias e as contingências variam cada coisa, isso é notório. M as
entretanto de uma forma são consideradas as cousas pelo homem segundo sua
luz racional; de outra forma pelo juiz segundo a lei, e de outra forma pelo
Senhor segundo o estado da mente do homem; é por isso que se diz,
denominações, inculpações, e após a morte, imputações; pois pelo homem
segundo sua luz racional se fazem as denominações, pelo juiz segundo a lei as
inculpações, pelo Senhor segundo o estado da mente do homem se fazem as
imputações; que estas três cousas diferem muito entre si, pode-se ver sem uma
357

exposição; com efeito, o homem pela convicção racional segundo as


circunstâncias e as contingências, pode absolver alguém que o juiz, assentado
em sua cátedra, não pode absolver segundo a lei; e o juiz, também pode
absolver alguém, que depois da morte é condenado; e isso, porque o juiz
estabelece a sua sentença segundo os fatos, mas cada um depois da morte é
julgado segundo as intenções da vontade e do entendimento que resulta da
vontade, e segundo as confirmações do entendimento e da vontade que resulta
do entendimento; estas intenções e estas confirmações, o juiz não as vê; mas
não obstante, um e outro julgamento é justo, um em razão do bem da
sociedade civil,o outro em razão do bem da sociedade celeste.
486 - V I. O s Adultérios do primeiro grau são os adultérios de ignorância, os
quais são cometidos por aqueles que não podem de todo consultar o
entendimento,nem por conseguinte os reprimir.
T odos os males, por conseguinte também os Adultérios, considerados em si
mesmos,pertencem ao mesmo tempo ao homem Interno e ao homem Externo;
o homem Interno os tem em intenção, e o homem Externo os faz; tal é
portanto o homem interno nos atos que são feitos pelo homem externo, tais são
os atos considerados em si mesmos; mas como o homem interno não se
manifesta com sua intenção diante do homem, cada um deve ser julgado no
tribunal dos homens pelos fatos e as palavras conforme a lei estabelece e
conforme as previsões desta lei; o sentido interior da lei deve também ser
pesado maduramente pelo juiz. Exemplos vão, porém, ilustrar este assunto: Se
porventura o adultério é cometido por um adolescente que não sabe ainda que
o adultério é um mal maior que a fornicação; se, semelhantemente, é cometido
por um homem de uma extrema simplicidade; se o é por um homem que uma
moléstia privou da penetração do julgamento; ou por um homem que, como
acontece a alguns, está por vezes no delírio, e está então no estado em que se
encontram aqueles que estão em um delírio real; além disso também, se está em
uma embriaguez que participa da loucura, e assim por diante; que então o
homem interno, ou a mente, não esteja presente no homem externo a não ser,
apenas, como o está em um homem irracional, isso é evidente; os adultérios
destes são denominados pelo homem racional segundo as circunstâncias;
entretanto, por este mesmo homem racional como juiz, aquele que comete
adultério é inculpado e punido de acordo com a lei; mas depois da morte estes
adultérios são imputados segundo a presença, a qualidade e a faculdade do
entendimento na vontade daquele que os cometeram.
487 - V II.O s Adultérios cometidos por eles são leves.
Pelo que acaba de ser dito acima, nº 486, vê-se isso sem confirmação ulterior;
com efeito, sabe-se que a qualidade de toda ação, em geral, a qualidade de toda
cousa, depende das circunstâncias, e que estas atenuam ou agravam: mas os
adultérios deste grau são leves nos primeiros tempos em que não cometidos; e
também permanecem leves enquanto no curso seguinte de sua vida,este ou esta
358

que os cometeu se abstém deles por estes motivos, que são males contra Deus,
ou que são males contra o próximo, ou que são males contra o bem da cidade,
e, por um outro deste motivos, porque são males contra a razão; ao contrário,
são postos também no número dos adultérios graves se não se abstém deles por
um destes motivos mencionados; assim, isto está conforme com a Lei Divina,
Ezequiel X V III, 21, 22, 24 e algures. M as estes adultérios não podem ser
perdoados e desculpados, ou ser denominados e julgados pelo homem, como
leves ou graves, segundo estas circunstâncias, porque elas não se manifestam
diante dele,e mesmo não são da competência de seu julgamento; é por isso que
se entende que é depois da morte que são assim reputados e imputados.
488 - V III. O s Adultérios do segundo grau são os adultérios do desejo
libidinoso, os quais são cometidos por aqueles que, é verdade, podem consultar
o entendimento, mas que por causas contingentes não o podem nesses
momentos. N o homem que de natural se torna espiritual, há no começo duas
cousas que combatem uma, contra a outra, as quais são comumente chamadas
o espírito, e a carne; e como o amor do casamento pertence ao espírito, e o
amor do adultério pertence à carne, se trava por isso, então, um combate entre
estes dois amores; se o amor do casamento é vencedor, ele doma e subjuga o
amor do adultério, o que se dá por um afastamento; mas se acontece que o
desejo libidinoso da carne seja excitado a um ardor além daquilo que o espírito
pode reprimir pela razão, resulta daí que o estado é ínvertido, e que o ardor do
desejo libidinoso espalha seduções no espírito, a ponto dele não ser mais senhor
de sua razão, nem de si mesmo; isto é entendido pelos adultérios do segundo
grau, os quais são cometidos por aqueles que, é verdade, podem consultar o
entendimento, mas que por causas contingentes, não o podem nesses
momentos. V ejamos exemplos para ilustração: Se uma esposa prostituída cativa
por astúcia a mente (animus) de um homem, atraindo-o ao leito, e o
inflamando ao ponto déle não ser mais senhor de seu julgamento; e mais ainda,
se então mesmo ela lhe expõe a vergonha que daí resultaria se ele não
consentisse; semelhantemente,se uma esposa prostituída emprega prestígios, ou
por estimulantes inflama, um homem ao ponto do ardor da carne tirar do
entendimento o livre da razão; do mesmo modo se um por sedutoras
solicitações leva a esposa de um outro ao ponto de sua vontade abrasada não ser
mais senhora de si mesma, além de outros casos semelhantes. Q ue estas
contingências e outras do mesmo gênero atenuam a gravidade do adultério, e
voltam para um lado mais suave as denominações de condenação contra o
homem seduzido ou da mulher seduzida,a razão é favorável a esse sentimento e
a ele aquiesce.A imputação deste grau de Adultério é tratada no que segue.
489 - IX . O s Adultérios cometidos por eles são imputáveis conforme, na
continuação,o entendimento os favoreça ou não os favoreça.
Q uanto mais o entendimento favorece os males, tanto mais o homem se
apropria deles e os faz seus; o favor é o consentimento, e o consentimento
359

introduz na mente o estado de amor por eles; dá-se o mesmo com os adultérios
que no começo são feitos sem o consentimento do entendimento, e que são
favorecidos; o contrário acontece, se na continuação eles não são favorecidos; a
razão disso, é que os males ou os adultérios, que são feitos na favorecidos. Por
imputação é entendida aqui a acusação (incusa-cegueira do entendimento, são
feitos segundo a cobiça do corpo; assemelham-se pouco mais ou menos aos
instintos, tal como são estes nas bestas; no homem, é verdade, o entendimento
está presente quando eles são feitos, mas está em uma força passiva ou morta, e
não em uma força ativa ou viva; destas explicações resulta evidentemente, que
tais adultérios não são imputados senão tanto quanto, na continuação, eles são
favorecidos ou não são favorecidos. Por imputação é entendida aqui a acusação
incusatio) depois da morte, e por conseguinte o julgamento (judicatio), que se
faz segundo o estado de espírito do homem; mas não é entendida a inculpação
pelo homem diante do juiz, isto se faz não segundo o estado de espírito do
homem, mas segundo o estado do corpo na ação; se não houvesse uma
diferença, após a morte seriam absolvidos aqueles que são absolvidos no
M undo, e seriam condenados aqueles que aqui são condenados, e assim não
haveria para estes esperança alguma,de salvação.
490 - X . O s Adultérios do terceiro grau são os adultérios da razão, os quais são
cometidos por aqueles que confirmam pelo entendimento que não são males de
pecado.
T odo homem sabe que existe uma vontade e um entendimento; pois, quando
fala,diz:"Eu quero isto"; e "Eu compreendo isto"; todavia, não faz, entretanto,
distincão, mas faz um a mesma coisa que o outro; e isso, porque reflete
unicamente sobre as cousas que pertencem ao pensamento pelo entendimento,
e não nas que pertencem ao amor pela vontade, pois estas não se apresentam à
luz como aquelas. Entretanto, aquele que não faz distinção entre a V ontade e o
Entendimento, não pode fazer distinção entre os males e os bens, e por
conseguinte não pode absolutamente saber cousa alguma sobre a culpa do
pecado.M as quem é que não sabe que o bem e o vero são duas cousas distintas,
como o amor e a sabedoria? E quem é que, quando está na luz racional, não
pode concluir daí que há no homem duas cousas que os recebem distintamente
e se aplicam a eles, e que uma é a V ontade e a outra o Entendimento, pela
razão de que o que a V ontade recebe e reproduz é chamado Bem, e o que o
Entendimento recebe é chamado V erdade, pois o que a V ontade ama e faz é
chamado Bem, e o que o Entendimento percebe e pensa é chamado V erdade?
Agora,como tratou-se do Casamento do bem e do vero na Primeira Parte desta
O bra, e como aí foi relatado sobre a V ontade e o Entendimento e sobre
diversos atributos e predicados de um e de outro, um grande número de cousas
que, como presumo, são percebidas mesmo por aqueles que não tinham
pensado distintamente cousa alguma sobre o entendimento e a vontade, pois a
razão humana é tal, que compreende os veros por sua luz, ainda que antes não
360

os tenha distinguido; por isso, para que as diferenças do entendimento e da


vontade sejam mais claramente percebidas, apresentarei aqui algumas
particularidades, a fim de que se saiba quais são os Adultérios da razão ou do
entendimento, e em seguida quais são os Adultérios da vontade; que as
proposições seguintes sirvam de conhecimento sobre este assunto: I. A vontade
só nada faz por si mesma, mas tudo o que ela faz, o faz pelo entendimento. II.
Por outro lado também,o Entendimento só nada faz por si mesmo, mas tudo o
que faz, o faz segundo a vontade. III. A V ontade influi no entendimento, e o
Entendimento não influi na vontade; mas o entendimento ensina o que é o
bem e o mal, e consulta a vontade a fim de escolher entre os dois e fazer o que
lhe agrada. IV . Depois disso se faz uma dupla conjunção, uma na qual a
vontade age por dentro e o entendimento por fora; a outra na qual o
entendimento age por dentro e a vontade por fora; assim os Adultérios da
razão, de que se trata aqui, são distinguidos dos Adultérios da vontade, de que
se tratará mais adiante; são distinguidos, porque um é mais grave do que o
outro; pois o Adultério da razão é menos grave do que o Adultério da vontade;
e isto, porque no Adultério da razão o entendimento age por dentro e a
vontade por fora, enquanto que no Adultério da vontade, a vontade age por
dentro e o entendimento por fora; ora, a vontade é o homem mesmo, e o
entendimento é o homem segundo a vontade, e o que age por dentro domina
sobre o que age por fora.
491 - X I. O s Adultérios cometidos por eles são graves, e são imputados
segundo as confirmações.
O entendimento só confirma,e quando ele confirma,atrai a vontade para o seu
partido, e a coloca em torno de si, e assim a constrange à condescendência; as
confirmações se fazem pelos raciocínios que a M ente se esforça por tirar seja da
região superior, seja da região inferior; se é da região superior que comunica
com o Céu, ele confirma os casamentos e condena os adultérios; mas se é da
região inferior,que comunica com o M undo, confirma os adultérios e despreza
os casamentos. Cada um pode confirmar o mal do mesmo modo que o bem,
semelhantemente o falso e o vero, e a confirmação do mal é percebida com
mais delícias do que a confirmação do bem, e a confirmação do falso aparece
com mais lucidez do que a confirmação do vero; a razão disso, é que a
confirmação do mal e do falso tira seus raciocínios dos prazeres das volúpias,
das aparências e das ilusões dos sentidos do corpo, enquanto que a confirmação
do bem e do vero tira suas razões da região acima dos sensuais do corpo. O ra,
pois que os males e os falsos podem ser confirmados do mesmo modo que os
bens e os veros,e pois que o entendimento que confirma arrasta a vontade para
seu partido, e que a vontade com o entendimento formam a mente, seguese
que a forma da mente humana é, segundo as confirmações, voltada para o Céu
se suas confirmações são pelos casamentos, mas voltadas para o inferno se são
para os adultérios; e tal é a forma da mente do homem, tal é o espírito do
361

homem, por conseguinte tal é o homem. Por estas explicações, vê-se portanto
que os Adultérios deste grau são imputados depois da morte segundo as
confirmações.
492 - X II. O s Adultérios do quarto grau são os adultérios da vontade, os quais
são cometidos por aqueles que os consideram como lícitos e agradáveis e que
não acreditam, que sejam de uma tal importância que se deva consultar o
entendimento a,seu respeito.
Estes Adultérios são distinguidos dos precedentes por suas origens; a origem
destes adultérios vem da vontade depravada nascida com o homem, ou do mal
hereditário ao qual o homem, após ter entrado na posse do seu julgamento,
obedeceu cegamente, não julgando de modo algum a seu respeito, se eram ou
não eram males, por isso se diz que não acreditam que sejam de uma tal
importância que se deva consultar o entendimento a seu respeito. Q uanto à
origem dos adultérios que são chamados adultérios da razão, eles vêm de um
entendimento pervertido,e são cometidos por aqueles que confirmam que estes
adultérios não são males de pecado; nestes é o Entendimento que ocupa o
primeiro lugar; naqueles é a V ontade. Estas duas diferenças não se manifestam
a homem algum no M undo natural, mas são claramente vistas pelos Anjos no
M undo espiritual; neste M undo espiritual todos são em geral distinguidos
segundo os males que jorram originariamente da vontade ou do entendimento,
e que são aceitos e apropriados; são também separados segundo estes males no
inferno; lá, os que são mais pelo entendimento, habitam a parte anterior, e são
chamados Satanases; mas os que são mais pela vontade, habitam a parte
posterior, e são chamados Diabos; é em razão desta diferença universal, que na
Palavra se faz menção de Satanás e do Diabo. N estes maus, e também nos
adúlteros que são chamados satanases, o entendimento ocupa o primeiro lugar;
naqueles que são chamados diabos, a vontade ocupa o primeiro lugar. M as
expor estas diferenças a ponto do entendimento as ver, isso não é possível, a
menos que se conheça antes as diferenças da vontade e do entendimento, e
também a menos que se faça uma descrição da formação da mente segundo a
vontade pelo entendimento, e de sua formação segundo o entendimento pela
vontade; o conhecimento destes assuntos dará luz para que as diferenças acima
mencionadas sejam vistas pela razão; mas isso é um trabalho que formaria um
volume.
493 - X III. O s Adultérios cometidos por eles são muito graves, e lhes são
imputados como males de propósito determinado.
Se são muito graves, e mais graves que os precedentes, é porque neles, a
vontade ocupa o primeiro lugar, enquanto que o entendimento o ocupa nos
precedentes, e porque a vida do homem pertence essencialmente à vontade, e
formalmente a seu entendimento; a razão disso é que a vontade faz um com o
amor, e o amor é a essência da vida do homem, e se forma no entendimento
por cousas que concordam; também o entendimento, considerado em si
362

mesmo,não é outra cousa senão a forma da vontade; e como o amor pertence à


vontade, e a sabedoria pertence ao entendimento, é por isso que a sabedoria
não é outra cousa senão a forma do amor, e que o vero não é outra cousa senão
a forma do bem. O que decorre da essência mesma da vida do homem, assim o
que decorre de sua vontade, ou de seu amor, é principalmente chamado
propósito determinado (propositum); mas o que decorre da forma de sua vida,
assim o que decorre do entendimento e do pensamento do entendimento, é
chamado intenção; o delito (reatus) por isso se diz principalmente da vontade;
dai dizer-se que o reatus do mal em cada um vem da herança, mas que o mal
vem do homem. É por isso que estes adultérios do quarto grau são imputados
como males de propósito determinado,e permanecem como delitos.
494 - X IV . O s Adultérios do terceiro e do quarto grau são males de pecado,
segundo a quantidade e a qualidade do entendimento e da vontade neles, quer
sejam cometidos em,ato,quer não sejam cometidos em ato.
Q ue os adultérios da razão ou do entendimento, que são do terceiro grau, e os
adultérios da vontade,que são do quarto grau,sejam graves, e em conseqüência
males do pecado, segundo a qualidade do entendimento e da vontade neles, é o
que se pode ver pelo comentário que é feito acima, nºs 490 a 493; isto vem de
que o homem é homem pela V ontade e o Entendimento; pois por estes dois
existem não somente todas as cousas que se fazem na M ente,mas ainda todas as
que se fazem no Corpo; quem é que não sabe que o corpo não age por si
mesmo,mas que a vontade age pelo corpo; além disso também, que a boca não
fala por si mesma, mas que o pensamento fala pela boca? Por isso, se a vontade
fosse retirada, no mesmo instante a ação se deteria; e se o pensamento fosse
retirado, no mesmo instante se deteria a linguagem da boca; daí é evidente que
os adultérios que são cometidos em atos, são graves segundo a quantidade e a
qualidade do entendimento e da vontade neles; que sejam igualmente graves se
não são cometidos em atos, vê-se por estas palavras do Senhor: "Foi dito pelos
antigos: não, cometerás adultério. M as eu vos digo que se alguém olhar para a
mulher de outro para a cobiçar, já cometeu adultério com ela em seu coração",
(M ateus V , 27 e 28); cometer adultério pelo coração, é pela vontade. H á várias
causas que fazem com que um adultério não seja adultério, em ato, e que não
obstante o é pela vontade e pelo entendimento; com efeito, há os que se abstêm
dos adultérios quanto ao ato, por medo da lei civil e das penas que ela infringe;
por medo da perda da reputação, e por conseguinte da honra; por medo das
moléstias que dele resultam; por medo de querelas em casa por parte da esposa,
e por conseguinte da perda da tranqüilidade da vida; por medo da vingança do
marido ou de algum parente, por conseguinte também por medo de ser batido
pelos criados; por indigência ou por avareza; por fraqueza proveniente ou de
moléstia, ou de abuso, ou da idade, ou de impotência, e por conseguinte por
vergonha; se alguém por estes motivos e por outros semelhantes, se abstém dos
adultérios em ato, e entretanto pela vontade e pelo entendimento seja por eles,
363

não é menos adúltero por isso; pois não crê menos que não sejam pecados, e os
torna diante de Deus não ilícitos em seu espírito, e assim em espírito ele os
comete, embora não no corpo no M undo; por isso depois da morte, quando se
torna espírito,fala abertamente em seu favor.
495 - X V .O s Adultérios por propósito determinado da vontade, e os adultérios
por confirmação do entendimento, tornam os homens naturais, sensuais e
corporais.
O homem é homem, e é distinguido da besta, por isto que a sua mente foi
distinguida em três regiões, tantos quantos Céus há, e porque pode ser elevado
da região ínfima à região superior, e também desta à suprema, e assim tornar-se
Anjo de um Céu,e mesmo do T erceiro; é para este fim que foi dada ao homem
a faculdade de elevar o entendimento até lá; mas se o amor de sua vontade não
é elevado ao mesmo tempo, ele não se torna espiritual, mas permanece natural;
não obstante ele retém a faculdade de elevar o entendimento; a razão pela qual
retém esta faculdade, é a fim de que possa ser reformado, pois é reformado por
meio do entendimento, o que se dá pelos conhecimentos do bem e do vero, e
por uma intuição racional segundo esses conhecimentos; se os examina
racionalmente, e a eles conforma sua vida, então o amor da vontade é ao
mesmo tempo elevado, e neste grau o homem é aperfeiçoado, e o homem se
torna cada vez mais um homem. É diferente, se não vive segundo os
conhecimentos do bem e do vero, então o amor de sua vontade permanece
natural, e seu entendimento, por alternativas, se torna espiritual; pois ele de
tempos em tempos se eleva como uma águia, e vê em baixo o que está abaixo
de seu amor; quando o vê, voa para aí descendo e se conjunta com isso; se
portanto as cobiças da carne pertencem a seu amor, ele se lança de sua altura
para elas, e na conjunção com elas encontra seu prazer no dela; e de novo, na
busca de renome, a, fim de ser acreditado sábio, se eleva ao alto, e assim por
saltos de tempos em tempos,como acaba de ser dito.Se os adúlteros do terceiro
e do quarto grau, isto é, aqueles que se fizeram adúlteros por propósito
determinado da vontade e por confirmação do entendimento, são
completamente naturais, e se tornam progressivamente sensuais e corporais, é
porque mergulharam o amor de sua vontade e ao mesmo seu entendimento nas
impurezas do amor escortatório,e se deleitaram com isso, do mesmo modo que
as aves e as bestas imundas se deleitam na podridão e nos excrementos como
coisas deliciosas e apetitosas, pois os eflúvios que se elevam de sua carne
enchem com sua escória o habitáculo da mente, e fazem com que a vontade
nada sinta de mais delicioso nem de mais desejável; são estes que depois da
morte, se tornam espíritos corporais, e é deles que jorram as impurezas do
Inferno e da Igreja,de que se falou acima,nºs 430 e 431.
496 - H á três graus do homem natural; no Primeiro estão aqueles que amam o
M undo, pondo seu coração nas riquezas; estes são propriamente entendidos
pelos naturais; no Segundo grau estão aqueles que só amam os prazeres dos
364

sentidos, pondo seu coração nas luxúrias e nas volúpias de todo gênero; estes
são própriamente entendidos pelos sensuais; no T erceiro grau estão aqueles que
só amam a si mesmos, pondo seus corações na procura da honra; estes são
propriamente entendidos pelos Corporais; a razão disso, é que eles mergulham
no corpo todas as cousas da vontade e por conseguinte do entendimento, e que
por trás dos outros, eles olham para si mesmos e amam unicamente seus
próprios; mas os Sensuais mergulham todas as cousas da vontade, e por
conseguinte do entendimento, nos atrativos e nas ilusões dos sentidos,
abandonando-se a eles só; e os N aturais espalham pelo M undo todas as cousas
da vontade e do entendimento, adquirindo riquezas com avareza e fraude, e
não vendo neles e para elas outro uso senão o da posse. O s Adultérios acima
mencionados fazem os homens cair nestes graus degenerados, um neste, outro
naquele, cada um segundo o prazer que lhe agrada, de que se forma seu gênio
particular.
497 - X V I. Chega a um ponto que por fim, rejeitam para longe deles todas as
cousas da Igreja e da R eligião.
Se os Adúlteros por propósito determinado e por confirmação rejeitam para
longe deles todas as cousas da Igreja e da R eligião, é porque o amor do
casamento e o amor do adultério são opostos, nº 425, e porque o amor do
casamento faz um com a Igreja e com a R eligião, ver nº 130, e em outros
lugares, aqui e ali, na Primeira Parte; daí o amor do adultério, como sendo
oposto, faz um com as coisas que são contra a Igreja. Se estes adultérios
rejeitam para longe deles todas as coisas da Igreja e da R eligião, é porque o
amor do casamento é oposto ao amor adultério, como o casamento do bem e
do vero é oposto à conexão (connubium) do mal e do falso, nºs 427 e 428; e o
casamento do bem e do vero é a Igreja, enquanto que o (connubium) do mal e
do falso é a AntiIgreja. Se estes adultérios rejeitam para longe deles todas as
cousas da Igreja e da R eligião, é porque o amor do casamento e o amor do
adultério são opostos como o Céu e o Inferno,nº 429; e no Céu está o amor de
todas as cousas da Igreja, enquanto que no Inferno está o ódio contra todas as
cousas da Igreja. Se estes adultérios rejeitam para longe deles todas as cousas da
Igreja e da R eligião, é também porque seus prazeres começam pela carne e
pertencem à carne mesmo no espírito, nºs 440 e 441; e a carne é contra o
espírito, isto é, contra os espirituais na Igreja; aí também os prazeres do amor
escortatório serem chamados V olúpias da loucura. Se desejais demonstrações,
dirigi-vos, eu vos peço, àqueles que sabeis estar em tais adultérios, e
perguntai-lhes em segredo o que pensam de Deus, da Igreja e da vida eterna, e
ouvireis. A verdadeira causa é que assim como o amor conjugal abre os
interiores da mente, e desse modo os eleva acima dos sentidos do corpo até à
luz e ao calor do Céu, assim também, por outro lado, o amor do adultério
fecha os interiores da mente,e mergulha a mente mesma, quanto à vontade, no
corpo até em todas as cobiças da carne; e quanto mais profundamente aí
365

mergulha mais se afasta do Céu.


498 - X V II.Entretanto gozam sempre da racionalidade como os outros.
Q ue o homem natural, o sensual e o corporal sejam racionais quanto ao
entendimento do mesmo modo que o homem espiritual é aquilo de que tive a
prova pelos satanases e os diabos, que tinham subido do Inferno por permissão,
e conversado com espíritos angélicos no M undo dos espíritos; mas como o
amor da vontade faz o homem, e este amor força o entendimento a consentir,
por isso aqueles que são tais não são racionais senão em um estado afastado do
amor da vontade; mas quando voltam de novo a este amor, se tornam mais
insensatos do que bestas ferozes. Aliás, sem a faculdade de elevar o
entendimento acima do amor da vontade, o homem não seria homem, seria
uma besta, pois, a besta não goza dessa faculdade; conseqüentemente nada
poderia escolher, nem fazer por escolha o que é bem e o que é vantajoso, e
assim não poderia ser reformado, nem ser conduzido ao Céu, nem viver
eternamente. Daí vem que os Adúlteros por propósito determinado e por
confirmação,ainda que sejam inteiramente naturais,sensuais e corporais gozam
entretanto, como os outros, da faculdade de compreender, ou da racionalidade;
mas quando estão no desejo libidinoso do adultério, e segundo este desejo
pensam e falam, não gozam desta racionalidade, porque então a carne age
contra o espírito,e não o espírito contra a carne.M as é preciso que se saiba que
estes, por fim, depois da morte, tornam-se estúpidos, não que a faculdade de
ser sábio lhes seja tirada, mas eles não querem ser sábios, porque a sabedoria
lhes causa desprazer.
499 - X V III. M as eles se servem desta racionalidade quando estão nos externos
e abusam dela quando estão nos internos.
Estão nos externos quando falam fora de sua casa e em uma reunião, mas estão
nos internos quando estão em casa ou consigo mesmos; se queres fazer a
experiência, apodera-te de algum desses, por exemplo de algum da ordem dos
jesuítas, e faz com que ele fale em uma R eunião, ou que ele pregue em um
T emplo sobre Deus,sobre as cousas santas da Igreja,e sobre o Céu e o Inferno;
e ouvindo-o tu o acharás cheio de zelo racional, mais do que qualquer outro;
talvez te leve a soltar gemidos e a derramar lágrimas por causa da salvação; mas
leva-o à tua casa, eleva-o acima das outras O rdens, chama-o Pai da sabedoria, e
faz dele um amigo,a ponto dele te abrir o coração,e ouvirás então o que te dirá
sobre Deus, sobre as cousas santas da Igreja e sobre o Céu e o Inferno, a saber,
que são fantasias e quimeras, e por conseguinte laços inventados para as almas,
pelos quais grandes e pequenos, ricos e pobres são presos e garroteados, e são
mantidos sob o jugo de sua dominação. Q ue isto baste para ilustração daquilo
que é entendido quando se diz que os homens naturais, até os homens
corporais, gozam de racionalidade humana como os outros, mas que se servem
dela quando estão nos externos, e abusam dela quando estão nos internos. A
conclusão a tirar daí, é que é preciso não julgar uma pessoa pela sabedoria de
366

sua boca,mas julgá-la ao mesmo tempo pela sabedoria de sua vida.


500 - Ao que precede ajuntarei este M emorável:
U m dia, no M undo dos Espíritos, ouvi um grande tumulto; eram milhares de
espíritos reunidos que gritavam: "Q ue sejam punidos! Q ue sejam punidos!"
Aproximei-me de mais perto, e indaguei do que era. U m espírito separado
desta grande Assembléia, me disse: "Estão arrebatados de cólera contra três
sacerdotes, que andam por aqui e por ali, e pregam por toda parte contra os
adultérios, dizendo que os adúlteros não reconhecem Deus; que o Céu lhes foi
fechado, e o, Inferno aberto; e que no Inferno, são diabos imundos, porque aí
aparecem de longe como porcos rolando na lama, e que os Anjos do Céu os
têm em abominação!" Perguntei onde estavam estes três sacerdotes, e porque
davam a seu respeito tão grandes gritos. R espondeu: "Estes três sacerdotes estão
no meio deles sob a guarda de satélites, e os que estão reunidos são daqueles
que acreditam que os adultérios não são pecados, e que dizem que os adúlteros
reconhecem Deus, do mesmo modo que aqueles que se ligam a suas esposas;
todos estes vieram do M undo Cristão; e Anjos foram ver quantos havia entre
eles que acreditavam que os adultérios são pecados, e sobre mil não
encontraram cem". Então ele me disse que estes novecentos falam assim dos
adultérios: "Q uem não sabe que o prazer do adultério está muito acima do
prazer do casamento; que os adúlteros estão em um calor perpétuo, e por
conseguinte em uma alegria, uma aptidão e uma vida ativa, muito mais do que
aqueles que vivem com uma única mulher; que ao contrário, o amor com uma
esposa esfria, e por vezes ao ponto de que por fim mal dá com ela uma palavra
de conversa e de sociabilidade que tenha vida, enquanto que é diferente com a
cortesã; que o estado definhante da vida com uma esposa, estado que resulta da
falta de potência,é reparado e reanimado pelas escortações? E aquilo que repara
e reanima não vale mais do que aquilo que torna definhante? O que é o
casamento senão uma escortação permitida? Q uem vê aí uma diferença? Pode o
amor ser constrangido? E entretanto o amor com uma esposa é constrangido
por uma aliança e pelas leis. O amor com a consorte não é o amor do sexo? E
este amor é tão universal, que existe mesmo nas aves e nas bestas? O que é o
amor conjugal senão o amor do sexo? E o amor do sexo é livre com toda
mulher. Se as leis civis são contra os adultérios, é porque os legisladores
acreditaram que o bem público o exigia; e entretanto os legisladores e os juizes
cometem algumas vezes o adultério, e dizem entre si: Q ue aquele que está sem
pecado atire a primeira pedra. Só os simples e os homens religiosos é que
acreditam que os adultérios são pecados; não se dá o mesmo com os homens
inteligentes que consideram,como nós,os adultérios segundo a luz da natureza.
N ão nascem filhos dos adultérios do mesmo modo que dos casamentos? E os
bastardos não são hábeis e capazes para desempenhar cargos do mesmo modo
que os legítimos? E além disso, ele provê a famílias que de outro modo seriam
estéries; não está ai uma vantagem e não um prejuízo? Em que é prejudicial a
367

uma esposa admitir vários rivais? E em que isto prejudica ao marido? Se há


desonra para o marido, é uma opinião privada fundada sobre uma pura
fantasia. Se o adultério é contra as leis e os estatutos da Igreja, é pela O rdem
Eclesiástica por causa do poder,mas o que é que a teologia e o espiritual têm de
comum com uma delícia puramente corporal e carnal? N ão há padres e monges
que são adúlteros? Será que por isso não podem reconhecer nem adorar a Deus?
Por que, portanto, estes três Sacerdotes pregam que os adúlteros não
reconhecem Deus? N ão podemos tolerar tais blasfêmias; que sejam pois
julgados e punidos". Depois disso vi que chamavam Juizes, aos quais pediram
que fossem pronunciadas penas contra eles; mas os Juizes disseram: "Isto não é
de nossa competência; pois se trata do reconhecimento de Deus, e do pecado, e
por conseguinte da salvação e da danação; a sentença sobre tais assuntos virá do
Céu; mas vos daremos um conselho sobre a maneira de saber se estes três
Sacerdotes pregaram verdades: H á três Lugares que nós, Juízes, conhecemos,
onde tais assuntos são examinados e revelados de uma maneira singular: O
Primeiro é onde é aberto a todos um caminho para o Céu; mas quando se
chega ao Céu, percebe-se o que se é quanto ao R econhecimento de Deus; o
Segundo lugar, é onde também é aberto um caminho para o Céu; mas
ninguém pode entrar nesse caminho, senão aquele que tem em si o Céu; e o
T erceiro lugar,é onde há um caminho para o Inferno,e os que amam as cousas
infernais entram neste caminho espontaneamente, porque é por seu prazer;
nós, Juízes, enviamos para esses lugares todos aqueles que reclamam de nós um
julgamento a respeito do Céu e do Inferno". Depois de ter ouvido estas
palavras, aqueles que estavam reunidos, disseram: "V amos a esses lugares". E
quando chegaram ao Primeiro, onde está aberto a todos um caminho para o
Céu, imediatamente houve obscuridade; por isso alguns deles acenderam
tochas, e as levaram na frente; os juizes que estavam com eles lhes disseram:
"Isto acontece a todos que vêm a este Primeiro lugar, mas à medida que se
aproximam o fogo das tochas se torna mais fraco, e no lugar mesmo é extinto
pela luz do Céu que influi, o que é um sinal de que se chegou; isto provém de
que a princípio o Céu para eles está fechado, e que em seguida é aberto". E
chegaram nesse lugar, e as tochas tendo se apagado por si mesmas, eles viram
um caminho dirigindo-se obliquamente para cima, para o Céu; os que estavam
no arrebatamento da cólera contra os três Sacerdotes ai entraram; entre os
primeiros estavam os adúlteros por propósito determinado, depois deles os
adúlteros por confirmação; e ao subir os primeiros exclamaram: "Segui-nos". E
os que seguiam, gritavam: "Apressai-vos". E os apressavam. Depois de pouco
tempo, quando estavam todos dentro de uma Sociedade celeste, apareceu um
abismo entre eles e os Anjos; e a Luz do Céu, influindo, acima deste abismo,
em seus olhos, abriu os interiores de suas mentes, o que os forçou a falar como
pensavam interiormente; e então lhes foi perguntado pelos Anjos, se
reconheciam que há um Deus. O s primeiros, que eram Adúlteros por
propósito determinado da vontade, responderam: "O que é Deus?" E se
368

olharam uns aos outros, e disseram: "Q uem de vós o viu?" O s segundos, que
eram Adúlteros por confirmação do entendimento, disseram: "N ão pertence
tudo à natureza? O que há acima dela, a não ser o Sol?" E então os Anjos lhes
disseram: "R etirai-vos de perto de nós; agora, percebeis, vós mesmos, que não
há em vós reconhecimento de Deus; quando descerdes os interiores de vossas
mentes se fecharão, e os exteriores se abrirão, e então podereis falar contra os
interiores, e dizer que há um Deus; ficai certos de que, desde que um homem
se torna efetivamente adúltero, o Céu lhe é fechado, e o Céu estando fechado,
Deus não é reconhecido; aprendei a causa:T udo que é imundo no inferno vem
dos adultérios, e isso cheira mal no Céu como a lama podre das ruas". Depois
que ouviram estas coisas, voltaram, e desceram por três caminhos; e quando
chegaram em baixo, os primeiros e os seguindos apoiando-se mútuamente,
diziam: "Lá os Sacerdotes venceram; mas sabemos que nós, do mesmo modo
que eles, podemos falar de Deus; e quando dizemos que Ele existe, não é que
O reconhecemos? O s Interiores e os Exteriores da mente, de que os Anjos
falaram, são invenções. M as vamos ao segundo Lugar designado pelos Juizes,
onde o caminho para o Céu é aberto aos que têm o Céu em si; assim aos que
devem ir para o Céu". E quando se aproximaram, saiu do Céu uma voz:
"Fechai as portas, Adúlteros estão perto daqui". E imediatamente as portas
foram fechadas; e guardas, tendo bastões na mão os expulsaram; e libertaram
dentre as mãos daqueles que os guardavam os três Sacerdotes, contra os quais o
tumulto tinha sido excitado, e os introduziram no Céu; e no momento em que
a Porta foi aberta para os Sacerdotes, o prazer do casamento se exalou do Céu
sobre os rebeldes; e esse prazer, sendo casto e puro, quase os privou da
respiração; temendo pois cair em desfalecimento por sufocação, eles se
apressaram em ir para o terceiro Lugar,e respeito do qual os Juizes haviam dito
que daí partia um caminho para o Inferno; e então de lá se exalou o prazer do
adultério, o que fez com que aqueles que eram adúlteros por propósito
determinado, e aqueles que o eram por confirmação, fossem de tal modo
vivificados,que desceram quase saltando,e mergulharam na lama como porcos.
369

Do prazer libidinoso da
defloraçao

501 - O s Desejos libidinosos de que se trata nos quatro Capítulos seguintes são
não somente desejos libidinosos de adultério, mas são mais graves do que eles,
pois que não existem senão pelos adultérios, pois a pessoa é apanhada por eles
quando já se desgostou dos adultérios; assim o Desejo libidinoso da defloração,
de que se trata em primeiro lugar,o qual não pode começar antes em ninguém;
semelhantemente o Desejo libidinoso de variedades, o Desejo libidinoso do
estupro, e o Desejo libidinoso de seduzir os inocentes, de que se trata em
seguida. São chamados desejos libidinosos, porque tanto e tal é o Desejo
libidinoso por estes atos, tanto é tal é a apropriação que se faz deles. Q uanto ao
que concerne especialmente ao Desejo libidinoso da defloração, a fim de que
haja convicção evidente de que é uma infâmia, isso vai ser manifestado em
ordem nos Artigos seguintes: I. Do estado da virgem ou da mulher intacta
antes do casamento e depois do casamento. II. A V irgindade é a coroa da
castidade, e o penhor do amor conjugal. III. A defloração sem intento de
casamento é uma infâmia de bandido. IV . A sorte daqueles que confirmaram
em si que o desejo libidinoso da defloração não é um mal de pecado é dura
depois da morte.Segue a explicação dos Artigos.
502 - I. Do estado da V irgem ou da mulher intacta antes do casamento e
depois do casamento.
Q ual é o estado de uma virgem antes que tenha sido instruída nas diversas
particularidades do facho conjugal, é o que me foi manifestado no M undo
espiritual por esposas, que tinham saído do M undo natural em sua infância, e
tinham recebido sua educação no Céu. Elas me disseram que, desde que
chegaram ao estado núbil, tinham, vendo casais de esposos, começado a amar a
vida conjugal, mas com o único objetivo de serem chamadas esposas, e de
viverem em sociedade de amizade e de confiança com um único homem, e
também de se tornarem senhoras de si mesmas, deixando a casa da obediência;
elas me disseram também, que a respeito do casamento tinham prensado
maiormente na beatitude da amizade e da confiança mútuas com um homem
que partilharia sua sorte, e de modo algum nas delícias de nenhuma chama;
mas que seu estado virginal tinha sido mudado depois das núpcias, em um
novo estado,de que nada tinham sabido antes; e declararam que este estado era
o estado de expansão de todas as coisas da vida de seus corpos, das primeiras às
últimas, para receber os dons de seu marido, e para uni-los à sua vida, a fim de
se tornarem assim o amor do marido e esposa; que este estado tinha começado
no momento da defloração, e que depois desta defloração a chama do amor
370

tinha se acendido só para o, marido, e que tinham sentido as delícias celestes


desta expansão; e que, como cada esposa foi introduzida neste estado pelo
marido, e este estado vem dele, e por conseguinte é para ele nela, ela não pode
amar senão a ele só. Por estas declarações foi manifestado qual é o estado das
virgens no Céu antes do casamento e após o casamento; que na terra haja um
semelhante estado para as virgens e as esposas que são unidas pelos primeiros
laços felizes, isso não é desconhecido; que virgem pode conhecer este novo
estado antes de estar nele? Perguntai e ouvireis; é diferente para aquelas que em
conseqüência de instrução procuraram os atrativos do prazer.
503 - II.A V irgindade é a coroa da castidade e o penhor do amor conjugal.
A V irgindade é chamada coroa da castidade, porque ela coroa a castidade do
casamento, e porque é também a marca da castidade; por isso a noiva leva nas
núpcias uma coroa na cabeça; ela é também a marca da santidade do
casamento; pois a noiva pela flor da virgindade se dá e se consagra inteiramente
ao noivo então marido, e o marido, por sua vez, se dá e se consagra
inteiramente à noiva então esposa.A V irgindade também é chamada penhor do
amor conjugal, porque pertence à aliança, e porque há aliança para que o amor
os una em um só homem, ou em uma só carne. O s maridos mesmos, antes das
núpcias, consideram também a virgindade da noiva como a coroa de sua
castidade, e como o penhor do amor conjugal, e enfim como o objeto desejável
mesmo, pelo qual devem começar e se perpetuar as delícias deste amor. Por
estas considerações e as cousas que precedem, vê-se que depois que o cinto foi
tirado, e a virgindade sacrificada, a virgem se torna espôsa, e que se não se
torna esposa torna-se prostituta; pois o novo estado, em que é então
introduzida, é o estado do amor por seu marido, e se não é por seu marido, é
um estado de desejo libidinoso.
504 - III. A defloração sem intuito de casamento é uma infâmia de bandido.
Certos adúlteros têm um ardente desejo de deflorar virgens, e por conseguinte
meninas na idade da inocência; eles as atraem a tais atos, ou pelas persuasões de
alcoviteiras, ou por presentes que lhes dão, ou por promessas de casamento; e
estes homens após a defloração as abandonam, e procuram outras e ainda
outras; acrescente-se a isso, que eles encontram prazer, não com as antigas, mas
com novas continuamente, e que este desejo libidinoso aumenta até tornar-se o
principal prazer de sua carne. Acrescentam ainda a isso esta perfídia, é que, por
diversos artifícios, solicitam de donzelas a ponto de casar-se, ou imediatamente
após as núpcias, que lhes ofereçam as primícias do casamento que, desta
maneira enxovalham porcamente. O uvi dizer também que, quando este ardor
com sua potência lhes falta, eles se gloriam do número de virgindades como de
outros tantos velos de ouro de Jasão. Esta infâmia que é o crime da corrupção,
(stuprum), tendo começado na idade da força, e sendo em seguida corroborada
por gabolices, fica enraizada, e por conseqüência impressa após a morte. O que
é esta infâmia, vê-se pelo que foi dito acima, que a virgindade é a coroa da
371

castidade, o penhor do futuro amor conjugal, e que a virgem consagra a sua


alma e a sua vida àquele a quem consagra sua virgindade; é também sobre ela
que são fundadas a amizade conjugal e a segurança desta amizade; e além disso,
a mulher deflorada por tais homens,depois que esta porta do amor conjugal foi
quebrada, despe-se de todo pudor, e torna-se uma prostituta, e é este bandido
que é também a causa disso. Se após se ter entregue a estas satiríases e a estas
profanações de castidades, estes mesmos bandidos voltam suas idéias para o
casamento, não cogitam em sua mente outra cousa senão na virgindade de sua
futura esposa; e, quando a tomaram, desdenham o leito e o quarto de dormir;
mais ainda, com exceção das donzelas, eles desprezam todo o sexo feminino; e
como tais homens são violadores do casamento, e desprezadores do sexo
feminino, e por conseqüência ladrões espirituais, é evidente que a N emesis
Divina os persegue.
505 - IV . A sorte dos que confirmaram em si que o desejo libidinoso da
defloração não é um mal de pecado,é dura depois da morte.
A sua sorte é esta: Depois que passaram no M undo dos espíritos o primeiro
tempo, que é um tempo de modéstia e de moralidade, porque estão em
companhia de espíritos angélicos, são imediatamente, de seus externos,
introduzidos em seus internos, e então nas cobiças que os tinham seduzido no
M undo; e são introduzidos em suas cobiças, a fim de que apareça em que grau
estiveram; e, se é em um grau fraco, a fim de que saiam deles depois de aí
terem sido introduzidos, e se envergonhem disso. M as aqueles que tinham
estado neste pernicioso desejo libidinoso, ao ponto de aí achar uma suprema
delícia, e que se gloriam destes roubos como de despojos opimos; não se
deixam afastar dele; por isso são abandonados a seu livre, e imediatamente
andam por todo lado e procuram lugares de prostituição, e desde que estes lhes
são indicados, eles aí entram; estes lugares estão dos lados do inferno; mas
como aí não encontram senão prostitutas, vão embora, e indagam onde há
virgens, e então são conduzidos para cortesãs que, por uma fantasia, podem se
dar uma beleza sobreminente e o brilho florido da juventude, e pretendem ser
virgens, junto das quais ardem de desejo, da mesma maneira que no M undo;
em conseqüência fazem um ajuste com elas; mas quando estão ao ponto de
executar esse ajuste, a fantasia introduzida pelo Céu é retirada, e então estas
virgens aparecem em sua deformidade monstruosas e crestadas; entretanto são
forçados a se ligar a elas durante algum tempo; estas cortesãs são chamadas
Sereias. M as se por tais fascinações não se deixam afastar deste extravagante
desejo libidinoso, são lançados em um Inferno que está nos limites do sul e do
ocidente sob o Inferno das prostitutas mais astuciosas, e aí são associados aos
seus semelhantes. Foi-me permitido ver este Inferno, e me foi dito que havia lá
muita gente de nobre extração e dos mais opulentos; mas como haviam sido
tais no M undo, toda lembrança de sua extração e das dignidades que possuíam
por sua opulência lhes é tirada, e introduzem em si uma persuasão de ter sido
372

vis escravos, e indignos por conseguinte de toda honra. Entre si, é verdade,
aparecem como homens, mas aos olhos daqueles a quem é permitido olhar este
inferno, aparecem como M acacos com uma face medonha em lugar de uma
agradável, e um ar hediondo em lugar de um ar alegre; caminham com os rins
contraídos,e por conseguinte são curvados, com a parte superior inclinada para
a frente como se fossem cair, e cheiram mal; desdenham o sexo e se afastam
daquelas que vêem, pois não têm desejo algum por elas. T ais apareciam eles de
perto, mas de longe aparecem como Cães de estimação ou Cães pequenos de
prazer,e ouve-se também como uma espécie de latido no som de sua voz.
373

Do desejo libidinoso de
variedades

506 - Pelo desejo libidinoso de variedades, de que se trata aqui, não é


entendido o desejo libidinoso de fornicação, de que se tratou em um Capítulo
particular; este embora costume ser confuso e vago, não conduz entretanto ao
desejo libidinoso de variedades, a não ser que ultrapasse os limites, e que o
fornicador considere o número e se vanglorie dele pela cupidez; esta idéia faz o
começo deste desejo libidinoso, mas em que ele se torna em sua progressão não
se pode percebê-lo distintamente senão em uma certa série, como esta que vai
seguir: I. Pelo desejo libidinoso de variedades é entendido o desejo libidinoso
de uma escortação inteiramente dissoluta. II. Este Desejo libidinoso é um amor
e ao mesmo tempo um desdém pelo sexo. III. Este Desejo libidinoso aniquila
inteiramente o amor conjugal em si. IV . A sorte daqueles que se abandonam a
este desejo libidinoso é miserável depois da morte, porque neles não há o
íntimo da vida.A explicação destes Artigos vai seguir-se.
507 - I.Pelo Desejo libidinoso de variedades é entendido o desejo libidinoso de
uma escortação inteiramente dissoluta.
Este desejo libidinoso se insinua naqueles que na juventude relaxaram os laços
da pudicícia, e que tiveram à sua disposição uma chusma de mulheres
debochadas,sobretudo se a opulência para satisfazer os pedidos de dinheiro não
faltava; eles semeiam e enraízam em si este desejo libidinoso por escortações
desordenadas e ilimitadas por pensamentos de nenhum pudor sobre o Amor do
sexo feminino, e por confirmações de que os Adultérios não são males, e não
são de modo algum pecados. Este Desejo libidinoso neles, em sua progressão,
aumenta ao ponto de cobiçarem as mulheres do mundo inteiro, e as querem
por grupos, e cada dia uma nova. Como este desejo libidinoso se lança para
fora do amor comum do sexo, implantado em cada homem, e inteiramente
fora do amor de uma única pessoa do sexo, que é o amor conjugal, e se lança
nos exteriores do coração como uma delícia de amor separado destes dois
amores, e entretanto derivado deles, por isso ele se enraíza nas cutículas tão
profundamente, que fica no tato, depois que as forças enfraqueceram. Estes
consideram como nada os adultérios; por isso em seus pensamentos,
consideram todo o sexo feminino como uma prostituta comum, e assim
misturam a impudicícia e a pudicícia, e por esta mistura se tornam insensatos.
Por estas explicações vê-se claramente o que é entendido pelo Desejo libidinoso
de variedades, a saber, que é o Desejo libidinoso de uma escortação
374

inteiramente dissoluta.

508 - II. Este Desejo libidinoso é um amor e ao mesmo tempo um desdém


pelo sexo.
H á neles um amor pelo sexo, porque é do sexo que vem a variedade; e há um
desdém pelo sexo, porque depois da posse, eles rejeitam a mulher e dirigem seu
desejo a outras. Este obsceno desejo libidinoso se abrasa por uma mulher nova,
e depois do ardor esfria para ela; e o frio é um desdém. Q ue este desejo
libidinoso seja um amor e ao mesmo tempo um desdém pelo sexo, é o que
pode ser ilustrado desta maneira: Suponha-se à esquerda grande número de
mulheres de que tiveram a posse, e à direita grande número de mulheres que
não possuíram; não olhariam eles para estas com amor e para aquelas com
desdém? E entretanto umas e outras são do sexo.
509 - III.Este desejo libidinoso aniquila inteiramente o amor conjugal em si.
É porque este desejo libidinoso é inteiramente oposto ao amor conjugal, e de
tal modo oposto, que não somente o faz em pedaços, mas mesmo, por assim
dizer, o reduz a pó; pois o amor conjugal é por uma única do sexo, enquanto
que este desejo libidinoso não se detém em uma só, mas após uma hora ou um
dia, tem por ela tanta frieza quanto ardor tinha antes; e como a frieza é um
desdém,este desdém por uma coabitação e uma morada constrangidas aumenta
até excitar o desgosto, e assim o amor conjugal é consumido a ponto de não
restar dele e menor cousa. Por isto pode-se ver que este desejo libidinoso é
mortal para o amor conjugal; e que,como o amor conjugal faz o íntimo da vida
do homem, ele é mortal para a vida do homem; e que este desejo libidinoso
pelas intercepções e fechamentos sucessivos dos interiores da mente, se torna
enfim cutâneo, e assim inteiramente sedutor, permanecendo sempre a
faculdade de compreender ou a racionalidade.
510 - IV . A sorte (daqueles que se abandonam a este desejo libidinoso) é
miserável após a morte,porque neles não há o íntimo da vida.
Cada um possui a excelência da vida segundo seu amor conjugal, pois esta
excelência se conjuga com a vida da esposa, e se exalta pela conjunção; mas
como naqueles de que se trata não resta cousa alguma do amor conjugal, nem
por conseguinte cousa alguma do íntimo da vida, é por isso que a sua sorte
depois da morte é miserável. Depois do período de tempo passado em seus
externos, no qual falam racionalmente e agem civilmente, estes são postos em
seus internos, e então em um semelhante desejo libidinoso e em seus prazeres,
no mesmo grau em que tinham estado no M undo; pois cada um depois da
morte é introduzido no mesmo estado de vida de que se tinha apropriado, a
fim de que seja afastado dele; com efeito, ninguém pode ser afastado de seu
mal, a não ser que antes tenha, sido introduzido nele; de outro modo o mal se
fecharia,macularia os interiores da mente e se espalharia como uma peste, e em
375

seguida romperia as barreiras, e devastaria os externos que pertencem ao corpo.


É por esta razão que lhes é aberto, sobre o lado do inferno, lugares de deboche,
onde estão prostitutas com as quais têm a faculdade de variar seu desejo
libidinoso,mas isso lhes é permitido com uma só por dia,e lhes é interdito, sob
uma certa pena, com várias no mesmo dia. Em seguida, depois de exame, é
reconhecido que este desejo libidinoso, está de tal forma enraizado, que não
podem ser afastados dele, são conduzidos para um certo lugar, situado
imediatamente acima do inferno que lhes foi destinado, e então aparecem a eles
mesmos como se caíssem em desfalecimento, e aos outros como se afundassem
com o rosto voltado para cima; e o solo se abre realmente também sob seu
dorso, e eles são engulidos e caem no Inferno onde estão seus semelhantes;
assim são recolhidos junto aos seus; aparecem entre si como homens o que lhes
é concedido, a fim de que não sejam para seus companheiros objetos de terror,
mas a uma certa distância são vistos com a face constantemente branca, como
se não houvesse senão a pele; e isso, porque neles não há vida espiritual, que
cada um possui segundo o conjugal impresso nele. Sua linguagem é seca, aguda
e triste; quando têm fome,se lamentam,e suas lamentações são ouvidas como o
frémito de um som particular; têm as vestes rasgadas, seus calções sungados
acima do ventre em torno do peito, porque não têm lombos, mas na região do
baixo ventre começam os calcanhares de seus pés; isto provém de que os
lombos nos homens correspondem ao amor conjugal,e este amor não existe em
tais homens. Diziam que desdenhavam o sexo porque não têm potência
alguma. Entretanto, entre si, podem raciocinar sobre diversos assuntos como
segundo a racionalidade; mas como são cutâneos,raciocinam segundo as ilusões
dos sentidos. Este inferno está na plaga ocidental do lado do setentrião. O ra,
estes mesmos homens,vistos de longe, aparecem não como homens, nem como
monstros, mas como gelatina. T odavia, é preciso que se saiba que tais se
tornam aqueles que se imbuíram deste desejo libidinosos, a um tal grau que
fizeram em pedaços e aniquilaram neles o Conjugal humano .
376

Do desejo libidinoso da violaçao

511 - Pelo Desejo libidinoso da violação não é entendido o Desejo libidinoso


da defloração; este desejo é uma violação de virgindades, e não de virgens,
quando a defloração se faz com consentimento; mas o desejo libidinoso da
violação, de que se trata aqui, se amortece diante do consentimento, e se
inflama pela recusa; é um ardor de violar as mulheres, quaisquer que sejam,
que se neguem absolutamente e que resistam impetuosamente, quer sejam
virgens, ou viúvas, ou esposas; tais homens são como bandidos e piratas, que
acham prazer nas cousas arrebatadas e pilhadas, e não nas que são dadas ou
justamente adquiridas; são também como malfeitores que desejam àvidamente
o que é ilícito e proibido, e desprezam o que é lícito e permitido; estes
violadores têm em absoluta aversão o consentimento, e são inflamados pela
resistência, e se percebem que ela não é interna, imediatamente o ardor de seu
desejo libidinoso se extingue, como o fogo quando se lança água em cima. É
bem sabido que as esposas não se submetem espontaneamente à disposição de
seus maridos quanto aos últimos efeitos do amor, e que por prudência resistem
como resistiriam a violações, com o fim de tirar aos maridos o frio que vem do
comum quando a coisa é sempre permitida, e que vem também da idéia, de
lascívia de sua parte; e estas resistências, ainda que inflamem, não são contudo
as causas deste desejo libidinoso,mas o são de seu começo; a causa deste desejo,
é que depois que o amor conjugal e também o amor escortatório, se gastaram
pelos exercícios, eles querem, para que sejam restabelecidos, ser inflamados por
meio de resistências absolutas; este desejo libidinoso, assim começado, aumenta
em seguida; e, à medida que aumenta, despreza e rompe todos os limites do
amor do sexo, e se extingue a si mesmo; e de lascivo, corporal e carnal, o amor
se torna cartilaginoso e ósseo, e então pelos priósteos, que gozam de uma
sensibilidade aguda, tornam-se agudos. Entretanto, este desejo libidinoso é
raro, porque não existe senão naqueles que entraram no casamento, e então se
entregaram a escortações até ao ponto delas se tornarem insípidas; além desta
causa natural deste desejo libidinoso, há também uma causa espiritual, de que
se dirá alguma cousa em seguida.
512 - A sua sorte depois da morte é esta: Então estes violadores se separam
espontâneamente daqueles que estão no amor limitado do sexo, e
completamente daqueles que estão no amor conjugal; por conseguinte
separam-se do Céu; em seguida são enviados para prostitutas muito astuciosas,
que não somente por persuasão, mas mesmo por uma perfeita imitação, tal
como é nas atrizes, podem fingir e representar como se fossem castidades
377

mesmas; estas prostitutas distinguem muito bem os que estão neste desejo
libidinoso; diante deles falam da castidade e de seu grande valor; e quando os
violadores se aproximam e as tocam, elas se indignam e fogem, como
aterrorizadas, para um gabinete onde há um beliche e um leito, e fecham
ligeiramente a porta atrás delas, e se deitam; e em seguida por sua arte inspiram
ao violador um desejo desenfreado de sacudir a porta, de se lançar no gabinete
e de as assaltar; quando isso acontece, a prostituta, levantando-se sobre os pés,
começa a combater contra o violador com as mãos e as unhas, arranhando-lhe a
face, rasgando-lhe as roupas, gritando com uma voz furibunda pelas prostitutas
suas companheiras, como se fossem suas criadas, para ser socorrida, e abrindo a
janela e gritando: Ladrão! Bandido! Assassino! E quando o violador está em
disposição, ela se lamenta e derrama lágrimas; e após a violação, se lança por
terra, solta uivos e clama contra a infâmia; e então com tom grave o ameaça de
trabalhar pela sua perda, se ele não expia a violação por uma grande
recompensa. Q uando estão nestas cenas de V ênus, aparecem ao longe como
gatos que, antes do acasalamento, combatem quase da mesma maneira,
correndo para lá e para cá e soltando gritos penetrantes. Após alguns combates
do mesmo gênero em lugares maus, são retirados de lá, e transferidos para uma
caverna, onde são constrangidos a algum trabalho; mas como cheiram mal,
porque fizeram em pedaços o Conjugal que é a mais preciosa Jóia da vida
humana, são relagados para os confins da Plaga ocidental, onde, a uma certa
distância, aparecem magros como se não tivessem senão a pele sobre os ossos,
mas de longe conio panteras. Q uando me foi permitido vê-los de mais perto,
fiquei admirado de que, alguns deles tinham livros nas mãos e liam; e me foi
dito que era porque, no M undo, tinham falado de diversas coisas concernentes
aos espirituais da Igreja, e entretanto as haviam maculado por adultérios
levados até a estes extremos, e que tal era a correspondência deste desejo
libidinoso com a violação do Casamento espiritual. M as é de notar-se que há
poucos que estejam neste desejo libidinoso. É certo que as mulheres, porque
não convém que elas prostituam o amor, resistem de tempos em tempos, e que
a resistência dá vigor; contudo isto não vem de nenhum desejo libidinoso de
violação.
378

Do desejo libidinoso de seduzir


inocentes

513 - O Desejo libidinoso de seduzir Inocentes não é o Desejo libidinoso de


defloração,nem o Desejo libidinoso de violação, mas é particular e singular por
si mesmo; existe principalmente nos velhacos. As mulheres que lhes parecem
como inocentes são as que consideram o mal da escortação como um pecado
enorme, e que por conseguinte se dedicam à castidade e ao mesmo tempo à
piedade; eles se inflamam por elas; nas regiões onde reina a R eligião
Católica-R omana, há virgens votadas à vida monástica; como as acreditam,
mais que as outras, inocências piedosas, as encaram como os objetos apetitosos
e delicados de seu desejo libidinoso. Para estas ou aquelas, como são velhacos,
inventam primeiramente artifícios; e em seguida, depois que se imbuíram de
seu gênio, eles os exercem sem se afastar do pudor, como se este lhes fosse
natural; estes artifícios são principalmente simulações de inocência, de amor, de
castidade e de piedade; por estas simulações e por outras astúcias, entram em
sua amizade interior e em seguida em seu amor, e por diversas persuasões, e ao
mesmo tempo por diversas insinuações, de espiritual eles o tornam amor
natural, e em seguida amor carnal por irritações no corporal, e então as
possuem à vontade; quando atingiram seu fim, regozijam-se de todo coração, e
zombam daquelas que violaram.
514 - A sorte destes sedutores depois da morte é triste, pois que esta sedução é
não somente uma impiedade, mas também uma malignidade; depois que
passaram o primeiro período, que é nos externos, nos quais, mais que muitos
outros, têm hábitos elegantes e uma conversação agradável, são levados ao
segundo período de sua vida, que é nos internos, nos quais seu desejo
libidinoso é posto em liberdade e começa seu jogo; e então são primeiramente
enviados para mulheres que fizeram voto de castidade; e perto delas é
examinado até que ponto sua cobiça é maligna, a fim de que não sejam
julgados sem estar convencidos; quando sentem a castidade destas mulheres, a
sua velhacaria começa a agir, e a maquinar suas manhas; mas como isso é em
vão, afastam-se delas. Em seguida são introduzidos junto de mulheres de uma
inocência real; quando se esforçam igualmente para enganá-las, são fortemente
punidos por uma força dada a essas mulheres,pois elas lhes produzem nas mãos
e nos pés um peso de entorpecimento, do mesmo modo que no pescoço, e
enfim fazem que sintam como um desfalecimento; quando sofrem esses
tormentos, fogem para longe delas. Depois disso, lhes é aberto um caminho
para um certo grupo de prostitutas, que tinham aprendido a fingir hàbilmente
379

a inocência; e primeiramente elas zombam deles entre si, por fim depois de
diversas promessas elas se deixam violar. Depois de algumas cenas semelhantes
sobrevém o terceiro período, que é o do julgamento; e então convencidos, eles
são tragados, e reunidos aos seus semelhantes no Inferno, que é na Plaga
setentrional, e aí aparecem de longe como doninhas, mas se estão cheios de
velhacaria, são transportados daí para o Inferno dos velhacos, que é na Plaga
ocidental, profundamente para trás; aí aparecem de longe como serpentes de
diversas espécies, e os mais velhacos como víboras; mas neste Inferno mesmo,
para o qual me foi permitido olhar, eles me pareceram lívidos com uma face de
cal; e como puras cobiças, não gostam de falar; e, se falam, cochicham e
murmuram diversas cousas que não são ouvidas senão por seus companheiros
ao lado deles; mas em breve, quer sentados, quer de pé, eles se tornam
invisíveis, e esvoaçam na caverna como fantasmas; pois estão então na fantasia,
e a fantasia parece voar; depois do vôo repousam, e então, o que é de admirar,
não se conhecem mais uns aos outros; isto provém deles estarem na velhacaria,
e a velhacaria não se fia em outro, e assim se subtraem. Q uando estes sentem
alguma cousa do Amor conjugal, fogem para subterrâneos e se escondem; são
também sem amor ao sexo, e são as impotências mesmas; são chamados G ênios
infernais.
380

Da correspondência das
escortações com a violaçao do
casamento espiritual

515 - Eu deveria antes de tudo, falar aqui da Correspondência, dizer o que é;


mas este assunto não pertence propriamente a esta O bra. O ra, quanto ao que é
a Correpondência, vê-se sumàriamente acima, nºs 76 e 342, e plenamente no
Apocalipse R evelado, desde o começo até ao fim, a saber, que há
correspondência entre o sentido natural e o sentido espiritual da Palavra. Q ue
na Palavra há um sentido natural e um sentido espiritual, e entre eles
correspondência, isso foi demonstrado na Doutrina da N ova Jerusalém sobre a
Escritura Santa,nº 5 a 26.
516 - Pelo Casamento espiritual é entendido o Casamento do Senhor e da
Igreja,de que se falou acima,ns.116 a 131; e por conseguinte o Casamento do
bem e do vero, ver também, ns. 83 a 102; e pois que o Casamento espiritual é
o Casamento do Senhor e da Igreja, e por conseguinte o Casamento do bem e
do vero está em todos e cada uma das coisas da Palavra, é a violação da Palavra
que é entendida aqui pela violação do Casamento espiritual; pois a Igreja existe
pela Palavra, e a Palavra é o Senhor, porque Ele é o Divino B em e o Divino
V ero nela; que a Palavra seja este Casamento, vê-se plenamente confirmado na
Doutrina da N ova Jerusalém sobre a Escritura Santa,nº 80 a 90.
517 - Pois que, portanto, a violação do casamento espiritual, é a violação da
Palavra, é evidente que esta violação é a adulteração do bem e a falsificação do
vero; pois o casamento espiritual é o casamento do bem e do vero, como já foi
foi dito; segue-se dai que,quando o bem da Palavra é adulterado, e o seu vero é
falsificado, este Casamento é violado. Pelo que vai seguirse pode-se entrever
como e por quem se faz esta violação.
518 - M ais acima, quando se tratou do Casamento do Senhor e da Igreja, nº
116 e seguintes, e do Casamento do Bem e do V ero, nº 83 e seguintes, foi
demonstrado que este Casamento corresponde aos Casamentos nas terras,
donde segue-se que a violação deste Casamento corresponde às escortações e
aos adultérios; que assim seja, isso é bem manifesto pela Palavra mesma, visto
que pelas escortações e pelos adultérios aí são significadas as falsificações do
vero e as adulterações do bem, como se pode ver com evidência por numerosas
passagens da Palavra referidas no Apocalipse R evelado,nº 134.
519 - A violação da Palavra se faz por aqueles que adulteram os bens e os veros
381

na Igreja Cristã, e aqueles que agem assim são os que separam o vero do bem e
o bem do vero, além disso aqueles que tomam e confirmam as aparências do
vero e as ilusões por veros reais, como também aqueles que sabem os veros da
doutrina pela Palavra, e vivem mal, além de outros da mesma espécie. Estas
V iolações da Palavra e da Igreja correspondem aos G raus proibidos,
enumerados no Levítico,Capítulo X V III.
520 - Como o N atural e o Espiritual em cada homem estão em coerência como
a alma e o corpo, pois o homem sem o espiritual que influi em seu natural e o
vivifica, não é homem, segue-se que aquêle que está no Casamento espiritual
está também em um Casamento natural feliz; e que, por outro lado, aquêle que
está no adultério espiritual está também no Adultério natural, vice-versa. O ra,
como todos os que estão no Inferno estão na Conexão (Connubium) do mal e
do falso, e que está aí o Adultério espiritual mesmo, e como todos aqueles que
estão no Céu estão no Casamento do bem e do vero, e está aí o Casamento
mesmo, é por isso que o Inferno inteiro é chamado Adultério, e que o Céu
inteiro é chamado Casamento.
521 - Ao que precede ajuntarei este M emorável:
A vista me foi aberta, e vi uma Floresta espessa, e nela uma tropa de Sátiros; os
Sátiros quanto ao peito eram peludos, e quanto aos pés uns como B ezerros,
outros como Panteras e outros como Lobos; e em lugar de dedos nas plantas
dos pés, tinham garras de bestas selvagens; corriam de todos os lados como
bestas ferozes, gritando: "O nde estão as mulheres?" E então apareceram
prostitutas que os esperavam; estas também tinham diversas conformações
monstruosas e os Sátiros correram e se apoderaram delas, levando-as para uma
Caverna que estava profundamente sob a terra no meio da floresta; e em torno
da caverna sobre a terra estava estendida uma grande serpente enrolada em
espiral, que soprava um veneno na caverna; sobre os galhos da floresta, acima
da serpente,grasnavam e crucitavam sinistras aves noturnas. M as os Sátiros e as
Prostitutas não viam estas cousas, porque eram correspondências de sua lascívia
e assim aparências que ordinariamente são vistas de longe. Em seguida saíram
da caverna e entraram em uma cabana baixa, que era um lugar de prostituição;
e então, separados das prostitutas, tiveram entre si conversações que ouvi
atentamente; pois, no M undo espiritual, a linguagem pode ser ouvida a
distância como se se estivesse presente, pois que a extensão do espaço aí é
unicamente uma aparência; eles falavam dos Casamentos, da N atureza e da
R eligião. Aqueles que apareciam quanto, aos pés como bezerros falaram dos
Casamentos,dizendo:"O que são os Casamentos, senão Adultérios permitidos?
E o que há de mais doce do que do que as hipocrisias escortatórias?". A estas
palavras os outros deram gargalhadas aplaudindo com as mãos. O s Sátiros que
apareciam quanto aos pés como panteras, falaram da N atureza, e disseram: "H á
outra cousa além da natureza? Q ue diferença existe entre o homem e a besta,
exceto que o homem pode falar de uma maneira articulada, e a besta de uma
382

maneira sonora? N ão é do calor que vem a vida, e da luz que vem o


entendimento,em um e outro operando a N atureza?" A estas palavras os outros
exclamaram: "Bem! Falastes com julgamento". Aqueles que apareciam quanto
aos pés como lobos, falaram da R eligião, dizendo: "O que é Deus ou o Divino,
senão o íntimo da natureza operando? O que é a R eligião, senão uma invenção
para enganar e prender o vulgo?" A isto os outros exclamaram: "Bravos!"
Alguns minutos depois, eles saíram precipitadamente; e lançando-se para fora,
viram que de longe eu os observava com olhar atento; irritados com isso,
saíram da floresta correndo, e aceleraram sua corrida em direção a mim com ar
ameaçador; e me disseram: "Por que estás ai e escutas o que dizemos em voz
baixa?" E respondi: "Por que não? Q uem me impede? Era uma tagarelice entre
vós". E contei o que tinha ouvido; imediatamente suas mentes (animi) se
acalmaram; era por medo de que o que acabavam de dizer fosse divulgado; e
então começaram a falar com modéstia, e a agir com pudor; conheci por isso
que não tinham pertencido à classe baixa do povo, mas que tinham sido de
uma linhagem mais distinta; e então lhes contei que os havia visto na Floresta
como Sátiros; vinte como Sátiros-bezerros; seis como Sátiros-pantera, e quatro
como Sátiros-lobos; eram em número de trinta; isto os admirou, pois eles
mesmos não se tinham visto senão como homens,do mesmo modo que se viam
então perto de mim; e lhes fiz saber que tinham aparecido assim de longe
segundo o desejo libidinoso da escortação, e que esta forma de Sátiro era a
forma do adultério dissoluto, e não a forma da pessoa; dei-lhes esta razão, que
cada cobiça má apresenta uma semelhança dela mesma em uma certa forma,
que é percebida,não por aqueles que estão nessa cobiça,mas por aqueles que se
mantêm à distância; e disse:"Para que fiqueis convencidos,enviai alguns de vós
a essa Floresta, e vós, ficai aqui, e observai". E o fizeram, e enviaram dois dos
seus; e perto da Cabana, que era um lugar de prostituição, eles os viram
absolutamente como Sátiros; e quando voltaram, os saudaram com o nome de
Sátiros, e disseram: "O h!que cousa divertida!" Como os visse rir, entretive-me
com eles sobre diversos assuntos, e lhes contei que tinha visto também
Adúlteros como porcos; e então me lembrei da Fábula de U lisses e de Circe; em
que esta espalhou sobre os companheiros e os servidores de U lisses suco de
ervas venenosas e os tocou com uma vara mágica, e os transformou em porcos,
sem dúvida em adúlteros; pois ela não podia por artifício algum, mudar alguém
em porco. Q uando tinham rido muito destas coisas e outras do mesmo gênero,
eu lhes perguntei se sabiam de que R einos tinham sido no M undo; disseram
que tinham pertencido a diversos R einos, e mencionaram a Itália, a Polônia, a
Alemanha, a Inglaterra, a Suécia; e perguntei se entre eles viam alguém da
H olanda, e disseram: "N inguém". Depois disso, voltei a conversação para
cousas sérias e lhes perguntei se tinham jamais pensado que o Adultério fosse
um pecado; responderam: "O que é um pecado? N ão sabemos o que é".
Perguntei-lhes se tinham jamais se lembrado de que o Adultério fosse contrário
ao sexto preceito do Decálogo; responderam: "O que é o Decálogo? N ão é o
383

Catecismo? Q ue temos nós, homens, a ver com esse livrinho para crianças?"
Perguntei-lhes se jamais tinham pensado alguma cousa a respeito do Inferno;
responderam: "Q uem subiu de lá e deu notícias dele?" Perguntei-lhes se no
M undo tinham pensado alguma cousa a respeito da vida depois da morte;
disseram:"A mesma cousa que se pensa das bestas,e às vezes a mesma coisa que
se pensa.dos fantasmas,que,se exalam dos cadáveres e se dissipam''; enfim lhes
perguntei se não tinham ouvido sacerdotes dizer alguma cousa sobre estes
diversos assuntos; responderam: "Prestamos atenção somente ao som de sua
linguagem e não ao assunto; e, o que é isso?". Admirado destas respostas, lhes
disse: "V oltai a face e dirigi vossos olhos para o meio da Floresta, onde está a
caverna, na qual entrastes". E eles se voltaram e viram esta grande Serpente
enrolada em espiral em torno da caverna e soprando seu veneno, e também as
aves sinistras acima dela nos galhos; e lhes disse:"Q ue vêdes?" M as, tomados de
terror nada responderam; e lhes disse: "N ão vistes alguma cousa terrível? Sabei
que é o representativo do adultério na infâmia de seu desejo libidinoso". Então,
de repente, se apresentou um Anjo; era um sacerdote; e abriu na Plaga
ocidental um Inferno,no qual são por fim reunidos aqueles que são tais, e disse
“O lhai para aquele lugar". E eles viram um pântano como que de fogo; e aí
reconheceram alguns dos seus amigos do M undo, que os convidavam para ir
com eles.T endo visto e ouvido estas cousas, eles se desviaram, e se retiraram da
minha presença e se afastaram da Floresta; mas observava a sua marcha, e vi
que fingiam se retirar,mas que por voltas retornavam à Floresta.
522 - Depois disso, voltei para casa, e no dia seguinte, tendo me lembrado
destas tristes cenas, dirigi os olhos para esta mesma Floresta, e vi que tinha
desaparecido, e que em seu lugar havia uma Planície arenosa, no meio da qual
estava um Pântano, onde se achavam algumas serpentes vermelhas. M as
algumas semanas depois, quando dirigi de novo os olhos para lá, vi ao lado
direito uma terra em alqueive, e sobre ela alguns Cultivadores; e de novo, após
algumas semanas vi que este Alqueive tinha se tornado uma T erra cultivada
cercada de arbustos; e ouvi então uma voz do Céu: "Entra no teu quarto de
dormir,e fecha a porta,e aplica-te à obra começada sobre o Apocalipse; e leva-a
ao fim em dois anos".
384

Da imputaçao de um e outro
amor,o escortatório e o conjugal

523 - O Senhor disse: "N ão julgueis, a fim de que não sejais condenados",
(M ateus V II, 1); por estas palavras não é de modo algum entendido o
julgamento sobre a vida moral e civil de alguém no M undo, mas o julgamento
sobre a vida espiritual e celeste; quem não vê que se não fosse permitido julgar
da vida moral daqueles com que habitamos no M undo, a sociedade pereceria?
O que seria da sociedade, se não houvesse julgamentos públicos, e se não fosse
permitido a cada um julgar o outro? M as julgar qual é a sua mente interior ou
sua alma, assim qual é seu estado espiritual, e por conseguinte a sua sorte
depois da morte, isso não é permitido, porque isso só é conhecido pelo Senhor,
e o Senhor não o revela senão após a morte do homem, a fim de que cada um
faça segundo o livre aquilo que faz,e a fim e que por este livre o, bem ou o mal
seja dele e assim esteja nele, e que por conseguinte viva estando em si e sendo
seu pela eternidade; se os interiores da mente, escondidos no M undo, são
revelados depois da morte, é porque isso é importante e vantajoso para as
sociedades nas quais então o homem entra, pois todos nessas sociedades são
espirituais; que sejam então revelados, vê-se claramente por estas palavras do,
Senhor: "N ada há de encoberto que não deva ser revelado, nem escondido que
não deva ser conhecido; todas as cousas que tiverdes dito nas trevas serão
ouvidas na luz; e aquilo que tiverdes falado ao ouvido nos gabinetes será
publicado sobre os telhados", (Lucas X II, 2 e 3). U m julgamento comum, tal
como este: "Se és nos internos tal como te mostras nos externos, serás salvo; ou
ainda, serás condenado"; é permitido; mas um julgamento singular tal como
este: "És tal nos internos, portanto serás salvo, ou ainda, serás condenado",
não é permitido. O julgamento sobre a vida espiritual do homem, ou sobre a
vida interna da alma, é entendido pela imputação de que se trata aqui. Q ue
homem conhece aquele que é Escortador de coração, e aquele que é Esposo de
coração? E entretanto, as coisas que se pensa no coração, que são as que se
propõe a vontade, julgam a cada um. M as este assunto vai ser desenvolvido
nesta ordem: I. A cada um, depois da morte, é imputado o mal em que está;
semelhantemente o bem.II.A transferência do bem de uma pessoa para outra é
impossível.III.A Imputação,se por ela se entende uma tal transferência, é uma
palavra vã. IV . O mal é imputado a cada um segundo a qualidade de sua
vontade, e segundo a qualidade de seu entendimento; semelhantemente o bem.
V . Assim a cada um é imputado o Amor escortatório. V I. Igualmente o Amor
385

conjugal.Segue-se agora a explicação destes Artigos.


524 - I. A cada um, depois da morte, é imputado o mal em que está,
semelhantemente o bem.
Para que este artigo seja apresentado com alguma evidência, será examinado
por subdivisões desta ordem: 1º Cada um tem uma vida que lhe é própria. 2º
Depois da morte, a vida de cada um permanece. 3º Então ao M au é imputado
o mal de sua vida, e ao Bom é imputado o bem de sua vida. Primeiramente:
Cada um tem, uma vida que lhe é própria, por conseguinte distinta da vida de
um outro; isso é sabido; existe, com efeito, uma variedade perpétua, e não há
cousa alguma que seja a mesma que uma outra; daí, cada um tem o seu
próprio; é o que se vê claramente pelas faces dos homens, não existe face que
seja absolutamente semelhante a uma outra face, e não o pode haver em tôda a
eternidade; e isso porque não há duas mentes (animi) semelhantes, e porque as
faces dependem das mentes (animi); com efeito, a face é, como se disse, o tipo
da mente,e a mente (animus) tira da vida sua origem e sua forma. Se o homem
não tivesse uma vida que lhe é própria, como tem uma mente (animus) e uma
face que lhe são próprias, não teria depois da morte uma vida distinta da vida
de um outro; e mesmo, não teria também o Céu, pois o Céu consiste em
perpétuas variedades (ex aliis perpetuis); sua forma é unicamente composta de
variedades de almas e de mentes dispostas em uma tal ordem que fazem um, e
fazem um segundo o U m, cuja V ida está em todas e cada uma das variedades,
como a alma está no homem; se isso não fosse assim, o Céu seria dissipado,
porque a forma seria dissolvida. O U m pelo Q ual a vida está em todas e cada
uma das variedades, e pelo Q ual a forma tem coerência, é o Senhor. Em geral,
toda forma é composta de cousas variadas, e é tal qual é a coordenação
harmônica destas cousas, e sua disposição para ser um; tal é a forma humana,
que é composta de tantos membros, vísceras e órgãos, não sente alguma cousa
nele e dele senão como sendo um. Segundamente: Depois da morte, a vida de
cada um permanece. Isso é sabido na Igreja pela Palavra, e por estas passagens
da Palavra:“O Filho do H omem deve vir,e então dará a cada um segundo suas
obras", (M ateus X V I, 27). "V i os livros abertos, e todos foram julgados
segundo suas obras",(Apoc.X X ,12 e 13)."N o dia do julgamento, Deus dará a
cada um segundo suas obras" (R omanos 11, 6; 11 Coríntios V , 10). As obras,
segundo as quais será dado a cada um, são a vida, porque é a vida que as faz, e
porque elas são segundo a vida. Como me foi permitido, durante vários anos,
estar na companhia dos Anjos, e falar (no M undo espiritual) com aqueles que
chegavam do M undo, posso atestar com certeza que cada um aí é examinado
sobre a qualidade de sua vida, e que a vida que contraiu no M undo lhe fica
pela eternidade; falei com aqueles que tinham vivido há Séculos, e cuja vida me
era conhecida pela H istória, e reconheci que tinham uma vida semelhante à
discrição histórica; soube também pelos Anjos que a vida de quem quer que
seja não pode ser mudada depois da morte, porque foi organizada segundo seu
386

amor, e por conseguinte segundo as obras; e que se fosse mudada, a


organização seria dissolvida, o que jamais pode acontecer; além disso também,
que a mudança de organização se dá unicamente no corpo material, e não é, de
modo algum, possível no corpo espiritual depois que o corpo material foi
rejeitado. T erceiramente: Então ao M au é imputado o, mal de sua vida, e ao
Bom é imputado o bem de sua vida. A imputação do mal não é uma acusação,
nem uma censura, nem uma inculpação, nem um julgamento, como no
M undo; mas o mal mesmo faz isso; com efeito, os maus por seus livres
separam-se dos bons, porque não podem estar juntos; os prazeres do amor do
mal têm em aversão os prazeres do amor do bem, e os prazeres se exalam de
cada um como os odores se exalam de todo vegetal sobre a terra; pois não são
nem absorvidos nem escondidos pelo corpo material como antes; mas efluem
livremente de seus amores na atmosfera espiritual (aura); e como o mal aí é
sentido como em seu odor, é este mal que acusa, censura, inculpa e julga, não
diante de um juiz, mas diante de quem quer que esteja no bem; e é isto que é
entendido por Imputação; além disso, o M au escolhe companheiros com quem
possa viver em seu prazer, e como tem em aversão o prazer do bem, ele se
dirige por si mesmo para os seus no inferno. A Imputação do bem se faz da
mesma maneira; isto acontece com aqueles que no M undo reconheceram que
todo bem neles vem do Senhor, e que nada do bem vem deles; depois que estes
foram preparados, são enviados aos prazeres interiores de seu bem, e então lhes
é aberto um caminho para o Céu em direção à Sociedade onde os prazeres são.
homogéneos com os seus; isto é feito pelo Senhor.
525 - II.A transferência do bem de uma pessoa para outra é impossível.
A evidência deste Artigo pode também ser vista por subdivisões nesta ordem:1º
T odo homem nasce no mal.2º É introduzido no bem pelo Senhor por meio da
regeneração. 3º Isto é feito por meio da vida segundo os preceitos do Senhor.
4º É por isso que o bem, quando foi assim implantado, não pode ser
transferido. Primeiramente: T odo homem nasce no mal. Isto é conhecido na
Igreja. Diz-se que esse mal vem de Adão por herança; mas vem dos pais; é de
seus pais que cada um tira um caráter que é a inclinação; que seja assim,a razão
e a experiência nos dão a convicção; pois existe quanto às faces, aos gênios e aos
costumes, semelhanças entre os pais e seus filhos imediatos e os descendentes
destes; por aí muitas pessoas reconhecem as famílias e julgam também de suas
mentes (animi); por isso, os males que os pais mesmos contraíram, e que
introduziram por transmissão em seus descendentes, são aqueles nos quais os
homens nascem; se se acredita que o débito de Adão foi inscrito em todo
gênero humano,é porque há poucos que reflitam em si sobre algum mal, e que
por conseguinte o conhecem; é por isso que presumem que está tão
profundamente escondido que só aparece diante de Deus. Segundamente: O
homem é introduzido no bem pelo Senhor por meio da regeneração. Q ue haja
uma regeneração, e que ninguém possa entrar no Céu a menos que seja
387

regeneração, vê-se claramente pelas palavras do Senhor em João, cap. III, 3, 5;


que a R egeneração seja a purificação dos males,e assim a renovação da vida, é o
que não pode ser desconhecido no M undo Cristão; pois a razão o vê também
quando reconhece que todos nascem no mal, e que o mal não pode ser nem
lavado, nem apagado, como uma mancha pelo sabão e pela água, mas o é pela
resipescência.T erceiramente:O homem é introduzido no bem pelo Senhor par
meio da vida segundo os preceitos do Senhor. H á cinco preceitos da
regeneração, vêmo-los explicados acima, nº 82; no número destes preceitos
estão estes: É preciso fugir dos males, porque são do diabo e vêm do diabo; é
preciso fazer os bens,porque são de Deus e vêm de Deus; é preciso se dirigir ao
Senhor, para que Ele nos leve a fazê-los; que cada um se consulte e examine se
o bem pode vir ao homem de outra parte; e se o bem não lhe vem, não há para
ele salvação. Em quarto lugar: O bem, quando foi assim implantado, não pode
ser transferido; por transferência é entendida a transferência do bem de um
para outro.Do que acaba de ser dito,segue-se que o homem pela regeneração é
inteiramente renovado quanto ao espírito,e que isso se faz pela vida segundo os
preceitos do Senhor. Q uem não vê que esta renovação não pode se fazer senão
pela sucessão do tempo? Isso quase não difere do caso de uma árvore que pela
semente se enraíza, cresce e chega à perfeição sucessivamente; aqueles que
percebem a regeneração de outro modo nada sabem sobre o estado do homem,
nem sabem cousa alguma sobre o mal e o bem; ignoram que o bem e o mal são
absolutamente opostos, e que o bem não pode ser implantado senão à medida
que o mal é afastado; não sabem tampouco que enquanto alguém está no mal,
tem em aversão o bem que em si é o bem; se portanto de um fosse transferido
para alguém que está no mal,seria como se um cordeiro fosse lançado diante de
um lobo, ou como se uma pérola fosse presa às narinas de um porco; por estas
considerações,é evidente que a transferência é impossível.
526 - III. A imputação, se por ela é entendida uma tal transferência é uma
palavra vã.
Q ue o mal em que cada um está, lhe seja imputado depois da morte, e
semelhantemente o bem,é o que foi demonstrado acima, nº 524; por aí vê-se o
que é entendido por imputação; se por imputação, entende-se a transferência
do bem para alguém que está no mal, é uma palavra vã, porque esta imputação
é impossível, como foi também demonstrado acima, nº 525. N o M undo, os
méritos podem ser como que transferidos pelos homens, isto é, pode-se fazer
bem aos filhos por causa dos pais, ou aos amigos de alguém em consideração a
este; mas o bem do mérito em suas almas, pode somente ser adjunto
exteriormente.Coisa semelhante não pode se dar nos homens quanto à sua vida
espiritual; esta, como foi mostrado mais acima, deve ser implantada, e se não é
implantada por uma vida segundo os preceitos do Senhor, acima referidos, o
homem permanece no mal em que nasceu; antes que isso tenha sido feito, nem
um bem pode atingir esse homem; se o atinge, imediatamente é repercutido e
388

ricocheta como uma bola elástica que cai sobre uma pedra, ou é engulido como
um diamante lançado em um pântano. O homem não reformado quanto ao
espírito é como uma pantera, ou como um mocho, e pode ser comparado à
sarça espinhosa e à urtiga; mas o homem regenerado é como uma ovelha ou
como uma pomba, e pode ser comparado à oliveira e à cepa de vinha; peço-vos
por favor, que penseis como é possível que um homem-pantera seja convertido
em homem-ovelha, ou um mocho em pomba, ou uma sarça espinhosa em
oliveira, ou a urtiga em cepa de vinha, por qualquer imputação, se por
imputação entende-se uma transferência; para que a conversão se faça, não é
preciso que antes a ferocidade da pantera e do mocho, ou a nocibilidade da
sarça espinhosa e da urtiga, sejam retiradas e que assim o verdadeiramente
humano e o não nocivo sejam implantados? Q uanto à maneira pela qual isso se
faz,o Senhor o ensina também em João X V ,1 a 7.
527 - IV . O mal e o bem é imputado a cada um segundo a qualidade de sua
vontade,e segundo a qualidade de seu entendimento.
Sabe-se que há duas coisas que fazem a vida do homem, a V ontade e o
Entendimento, e que todas as cousas que são feitas pelo homem são feitas por
sua vontade e por seu entendimento, e que sem estes dois agentes o homem
não teria ação, nem linguagem diferentemente de uma máquina; daí é evidente
que tais são a vontade e o entendimento do homem, tal é o homem; além disso
também, a ação do homem é em si mesma tal qual é a afeição de sua vontade
que produz esta ação, e a linguagem do homem é em si mesma tal qual é o
pensamento de seu entendimento que produz esta linguagem; é por isso que
muitos homens podem agir e falar da mesma maneira, e entretanto agem e
falam de uma maneira diferente, um por uma vontade e um entendimento
maus, o outro por uma vontade e um entendimento bons. V ê-se por aí o que é
entendido pelas Ações ou as obras, segundo as quais cada um será julgado, a
saber, que é a vontade e o entendimento, que por conseguinte pelas obras más
são entendidas as obras de uma vontade má, de qualquer maneira que elas
sejam apresentadas nos externos, e que pelas obras boas são entendidas as obras
de uma vontade boa, ainda que nos externos se apresentem semelhantes às
obras do homem mau. T odas as coisas que são feitas pela vontade interior do
homem,são feitas de propósito determinado, pois que esta vontade se propõe o
que faz por sua intenção; e todas as coisas que são feitas pelo entendimento, são
feitas por confirmação, pois que o entendimento confirma; por isto, pode-se
ver que o mal ou o bem é imputado a cada um segundo a qualidade de seu
entendimento a seu respeito. Posso confirmar isso pela narração seguinte: N o
M undo espiritual encontrei vários Espíritos que no M undo natural tinham
vivido do mesmo modo que outros, vestindo-se com luxo, alimentando-se com
requinte, negociando como os outros com proveito, freqüentando espetáculos,
gracejando sobre assuntos amorosos como que por um desejo libidinoso, e
fazendo várias outras ações semelhantes; e entretanto os Anjos consideravam
389

em uns estas ações como males de pecado, e em outros eles não as imputavam
como males, e declaravam estes inocentes, e aqueles culpados; interrogados
porque decidiam assim, pois que as ações eram semelhantes, responderam que
os examinavam, a todos, segundo o propósito determinado, a intenção ou o
fim, e por isso os distinguiam; e que é por isso que eles mesmos desculpam ou
condenam aqueles que o fim desculpa ou condena, porque o fim do bem está
em todos no Céu,e o fim do mal em todos no Inferno.
528 - As explicações precedentes será acrescentada esta observação: Diz-se na
Igreja que ninguém pode cumprir a lei, e que isto é tanto mais impossível
porque aqueles que prevarica contra um só dos preceitos do Decálogo prevarica
contra todos; mas esta fórmula de linguagem não significa o que parece
significar, pois eis como deve ser entendida: Aquele que por propósito
determinado ou por confirmação age contra um só preceito, age contra todos
os outros, porque agir por propósito determinado ou por confirmação, é negar
absolutamente que seja um pecado agir assim, e aquele que nega que seja um
pecado, considera como de pouca importância agir contra todos os outros
preceitos; quem não sabe que aquele que é adúltero, não é por isso homicida,
ladrão, falso testemunha, nem o quer ser? M as aquele que é adúltero por
propósito determinado e por confirmação considera como de pouca
importância tudo o que é proibido pela religião,assim os homicídios, os roubos
e os falsos testemunhos; e se se abstém deles não é porque sejam pecados, mas é
porque teme a lei e a desonra; que os adúlteros por propósito determinado e
por confirmação consideram como nada as cousas santas da Igreja e da
R eligião, vê-se acima, nº 490 a 493, e nos dois M emoráveis, nºs 500, 521 e
523; é o mesmo se alguém por propósito determinado ou por confirmação age
contra outro preceito do Decálogo, ele age também contra todos os outros
porque não considera cousa alguma como pecado.
529 - Dá-se o mesmo com aqueles que estão no bem pelo Senhor; se estes pela
vontade e o entendimento ou por propósito determinado e por confirmação se
abstêm de um único mal, porque é um pecado, eles se abstêm de todos, e com
mais forte razão se se abstêm de vários males; com efeito, desde que um
homem, por propósito determinado ou por confirmação, se abstém de algum
mal,porque é um pecado,é mantido pelo Senhor no propósito determinado de
ser abster de todos os outros; é por isso que, se por ignorância, ou porque
alguma cobiça do corpo predomina ele faz o mal, este mal não obstante, não
lhe é imputado, porque não se propôs fazê-lo, e não o confirma em si. O
homem entra neste propósito determinado, se se examina uma ou duas vezes
por ano, e se se arrepende do mal que descobre em si; é inteiramente diferente
naquele que jamais se examina. Por estas explicações, vê-se claramente qual é
aquele a quem o pecado não é imputado,e qual é aquele a quem é imputado.
530 - V .Assim a cada um é imputado o amor escortatório.
A saber, não segundo os fatos tal como se apresentam nos externos diante dos
390

homens, nem tal como se apresentam diante de um Juiz, mas tal como se
apresentam nos internos diante do Senhor, e pelo Senhor, diante dos Anjos,
isto é, segundo a qualidade da vontade e a qualidade do entendimento do
homem nestes fatos. H á no M undo diversas circunstâncias que mitigam e
excusam os crimes, e há as que os agravam e os põem a cargo daqueles que os
cometem; mas todavia as imputações depois da morte se fazem, não segundo as
circunstâncias que são circunstâncias externas do fato, mas segundo as
circunstâncias internas da mente; e estas são consideradas segundo o estado da
Igreja em cada um; seja, por exemplo, um homem ímpio por vontade e por
entendimento, isto é, que não tem nem temor a Deus, nem amor ao próximo,
nem por conseguinte respeito por santidade alguma da Igreja; este homem
depois da morte torna-se culpado de todos os crimes que cometeu no corpo, e
não tem lembrança alguma de suas boas ações, pois que seu coração, de onde
estas cousas decorreram,como de uma fonte,tinha em aversão o Céu e tinha se
voltado para o Inferno, e que os atos decorrem do lugar de habitação do
coração de cada um; para que isto seja compreendido, referirei um arcano: O
Céu é distinguido em inumeráveis Sociedades; semelhantemente o Inferno
segundo o oposto; e a M ente de cada homem, segundo sua vontade, e por
conseguinte segundo seu entendimento, habita na realidade em uma destas
Sociedades, e se propõe e pensa as mesmas cousas que aqueles que compõem
esta sociedade; se a M ente está em alguma sociedade do Céu, ela se propõe e
pensa então as mesmas cousas que aqueles que são dessa sociedade; se está em
alguma sociedade do Inferno, ela se propõe e pensa também as mesmas cousas
que aqueles que compõem essa sociedade; mas em todo o tempo que o homem
vive no M undo, ele passa de uma Sociedade para uma outra segundo as
mudanças das afeições de sua vontade e por conseguinte dos pensamentos de
sua mente; mas depois da morte suas peregrinações são reunidas, e após sua
reunião em um, lhe é designado um lugar, se ele é mau, no Inferno; se é bom
no Céu. O ra, como em todos no Inferno há a vontade do mal, é por ela que
todos aí são considerados; e como em todos no Céu há a vontade do bem,é por
ela que todos lá são considerados; é por isso que depois da morte as imputações
se fazem segundo a qualidade da vontade e do entendimento de cada um.
Dá-se o mesmo com as Escortações, quer sejam Fornicações ou Pelicatos, ou
Concubinagens ou Adultérios,pois que são imputados a cada um, não segundo
os fatos,mas segundo o estado da mente nos fatos; pois os fatos seguem o corpo
na sepultura,mas a mente ressuscita.
531 - V I.Assim a cada um é imputado o amor conjugal.
H á Casamentos em que o amor conjugal não se mostra, e entretanto ai está; há
Casamentos em que o amor conjugal se mostra, e entretanto aí não está. H á
para um e outro caso várias causas, que se pode conhecer em parte pelo que foi
relatado sobre o Amor verdadeiramente conjugal, nº 57 a 73; depois, sobre as
causas de Frieza e de Separação, nº 234 a 260; e sobre as causas de amor
391

aparente e de amizade aparente nos casamentos, nº 281 a 292; mas aparências


nos externos não concluem cousa alguma a respeito da Imputação; a única
cousa que conclui, é o Conjugal, porque se estabelece na vontade de alguém e
aí é conservado, qualquer que seja o estado do casamento em que está o
homem; este Conjugal é como uma balança com a qual este amor é pesado;
pois o Conjugal de um marido com uma esposa é o T esouro da vida humana, e
o R eservatório da R eligião Cristã, como foi mostrado acima, nºs 457 e 458; e
pois que é assim, este Amor pode estar em um dos dois esposos e não ao
mesmo tempo no outro; e este Amor pode estar escondido profundamente de
mais para que o homem mesmo descubra alguma cousa dele; pode também
estar inscrito em um progresso sucessivo da vida; e isto, porque este Amor em
sua marcha acompanha a R eligião; e a R eligião, porque é o Casamento do
Senhor e da Igreja, é a iniciação e a inoculação deste Amor; é por isto que o
Amor conjugal é imputado a cada um, depois da morte, segundo sua vida
espiritual-racional,e que para aquele a quem este Amor é imputado, é provido,
após seu falecimento, um Casamento no Céu, qualquer que tenha sido para ele
o Casamento no M undo. Destas considerações resulta portanto esta observação
final, que não se deve, segundo as aparências dos casamentos, nem segundo as
aparências das escortações, concluir a respeito de quem quer que seja, que o
Amor conjugal está nele, ou que não está nele; é por isso que: "N ão julgueis, a
fim de que não sejais condenado",(M ateus V II,1).
532 - Ao que precede ajuntarei este M emorável:
U m dia fui elevado, quanto ao espírito, ao Céu Angélico e lá introduzido em
uma Sociedade; e então alguns dos sábios desta Sociedade se aproximaram de
mim,e me disseram:"Q ue há de novo na terra?" Disse-lhes: "H á isto de N ovo,
que o Senhor revelou Arcanos que, em excelência, ultrapassam os Arcanos
revelados desde o começo da Igreja até ao presente". Perguntaram quais eram
estes Arcanos; eu disse: "Ei-los: I. N a Palavra há em todas e cada uma de suas
cousas um Sentido espiritual correspondente ao Sentido natural, e por este
Sentido há conjunção dos homens da Igreja com o Senhor, e também
consociação com os Anjos; e a Santidade da Palavra reside neste Sentido. II. As
correspondências de que se compõe o Sentido espiritual da Palavra, foram
descobertas". O s Anjos perguntaram se os habitantes do G lobo sabiam antes
alguma cousa das Correspondências. Disse que não sabiam absolutamente
nada, e que elas tinham permanecido escondidas desde milhares de anos, a
saber,desde o tempo de Job; e que entre os que viveram nesse tempo, e antes, a
Ciência das Correspondências era a Ciência das ciências, de onde lhes vinha a
sabedoria,porque era,o conhecimento das cousas Espirituais que pertencem ao
Céu e por conseguinte à Igreja; mas que esta Ciência, tendo sido mudada em
Idolatria, foi obliterada e perdida, segundo a Divina Providência do Senhor, ao
ponto de ninguém ver mais traço algum dela; mas que entretanto ela acaba de
ser desvendada pelo Senhor, a fim de que faça uma conjunção dos homens da
392

Igreja com Ele mesmo, e uma consociação com os Anjos; e elas se fazem pela
Palavra, na qual todas e cada uma das cousas são Correspondências. O s Anjos
ficaram cheios de alegria porque aprouve ao Senhor revelar este grande Arcano,
tão profundamente escondido durante milhares de anos; e disseram que isto
tinha sido feito, a fim de que a Igreja Cristã, que é fundada sobre a Palavra, e
que está agora no seu fim, reviva de novo, e tire seu espírito do Senhor pelo
Céu. Eles se informaram se por esta Ciência foi desvendado hoje o que
significa o Batismo, e o que significa a Santa Ceia, sobre os quais até ao
presente pensouse cousas tão diversas; e respondi que issso tinha sido
desvendado. III.Em seguida disse que hoje foram feitas revelações pelo Senhor
sobre a V ida dos homens depois da morte. O s Anjos disseram: "Q ue revelações
sobre a vida depois da morte? Q uem não sabe que o homem vive depois da
morte?" R espondi: "Sabe-se e não se sabe; se diz que é, não o homem, mas a
alma do homem,e que esta vive como espírito; e do espírito formam uma idéia
como do vento ou do éter, e se acredita, que ela não vive como homem senão
depois do dia do Julgamento Final, e que então as cousas corporais, que se
deixou no M undo, embora comidas pelos vermes, os ratos e os peixes, serão
reunidas e de novo, restabelecidas em forma de corpo, e que os homens
ressuscitam assim". O s Anjos disseram: "Como? Q uem é que não sabe que o
homem vive como homem depois da morte, com esta única diferença, que
então vive como homem espiritual, e que o homem espiritual vê o homem
espiritual como o homem natural vê o homem natural, e que não se conhece
nisso uma única diferença, exceto que se está em um estado mais perfeito". IV .
O s Anjos fizeram esta pergunta: "Q ue se sabe sobre o nosso M undo, e sobre o
Céu e o Inferno?". R espondi que não se sabe cousa alguma; mas que hoje foi
desvendado pelo Senhor qual é o M undo em que os Anjos e os Espíritos vivem,
assim qual é o Céu e qual é o Inferno; mais ainda, que os Anjos e os Espíritos
estão em conjunção com os homens, além de várias M aravilhas sobre estes
assuntos. O s Anjos se regozijaram porque aprouve ao Senhor fazer estas
revelações, a fim de que o homem não esteja mais pela ignorância na incerteza
sobre sua Imortalidade. V . Além disso, eu lhes disse: "Foi revelado hoje pelo
Senhor, que em vosso M undo há um outro Sol que não o nosso; que o Sol de
vosso M undo é puro Amor, e o Sol do nosso M undo puro fogo; que é por isso
que tudo o que procede de vosso Sol, pois que é puro Amor, participa da V ida,
e que tudo o que procede do nosso,pois que ele é puro fogo, nada tem da vida;
e que daí vem a diferença que, ignorada até então, foi agora revelada. Estas
revelações fizeram saber de onde vem a Luz que ilumina de sabedoria o
entendimento humano, e de onde vem o Calor que abrasa de amor a vontade
humana. V I . Além disso, foi desvendado que há T rês graus da vida, e que por
conseguinte há três Céus; que a mente humana foi distinguida nestes três
G raus e que por conseguinte o homem corresponde aos três Céus". O s Anjos
disseram: "Será que não se sabia isso antes?" R espondi que se tinha
conhecimento dos G raus entre o mais e o menos, mas que nada se sabia dos
393

G raus entre o anterior e o posterior.V II.O s Anjos perguntaram se tinham sido


reveladas outras coisas além dessas. R espondi que tinham sido reveladas várias,
a saber: Sobre o Julgamento Final; sobre o Senhor, que é o Deus do Céu e da
T erra, que só há um Deus, em Pessoa e em Essência, em quem está a Divina
T rindade,e que este Deus é o Senhor; depois, sobre a N ova Igreja que deve ser
instaurada por Ele, e sobre a Doutrina desta Igreja; sobre a Santidade da
Escritura Santa; que o Apocalipse também foi revelado, o qual não o podia ser,
mesmo quanto a um único pequeno versículo, senão pelo Senhor; e além disso
sobre os H abitantes dos Planetas e sobre as T erras no U niverso; além de muitas
narrações M emoráveis e M aravilhosas do M undo espiritual, pelas quais várias
cousas que pertencem à sabedoria foram desvendadas do Céu.
533 - O s Anjos ficaram muito satisfeitos com tudo que acabavam de ouvir, mas
percebiam tristeza em mim; e me perguntaram de onde me vinha essa tristeza;
disse-lhe "De que estes Arcanos hoje revelados pelo Senhor, ainda que em
excelência ultrapassem os Conhecimentos divulgados até este dia, são
entretanto considerados na T erra como não tendo importância alguma". O s
Anjos ficaram admirados, e pediram ao Senhor que lhes fosse permitido dirigir
seus olhos sobre o M undo; e os dirigiram e eis que não havia senão trevas; e
lhes foi dito que escrevessem estes Arcanos sobre um papel, e que o Papel seria
lançado sobre a T erra, e que eles veriam um prodígio; e foi feito assim, e eis
que o Papel sobre o qual estes Arcanos tinham sido escritos, foi lançado do
Céu, e em seu trajemos enquanto estava ainda no M undo espiritual, ele
brilhava como uma estrela; mas logo que penetrou no M undo natural a luz
desapareceu; e à medida que cala, se obscurecia; e, quando foi enviado pelos
Anjos às Assembléias onde estavam sábios e eruditos dentre os Eclesiásticos e os
Leigos, foi ouvido da parte de vários um murmúrio no meio do qual se
distinguiam estas palavras: “O que é isto? É alguma coisa? Q ue nos importa
que saibamos estas cousas, ou que não as saibamos? N ão são produções do
cérebro?" E parecia que alguns tomavam o Papel, e o dobravam, o enrolavam e
o desenrolavam entre os dedos para apagar a Escritura; e também parecia que
outros o rasgavam, e que outros queriam pisá-lo aos pés; mas eram impedidos
pelo Senhor de cometer esta ação culpável; e foi ordenado aos Anjos para retirar
este Papel e para guardá-o; e como os Anjos se tinham tornado tristes, e
pensavam "Até quando isto durará?" lhes foi dito: "Até um tempo, e tempos, e
a metade de um tempo".(Apoc.X II,14).
534 - Em seguida eu disse aos Anjos que tinha ainda sido revelada alguma coisa
no M undo pelo Senhor; eles perguntaram o que era; respondi que era sobre o
Amor verdadeiramente conjugal, e sobre suas delícias celestes; os Anjos
disseram: "Q uem não sabe que as delícias do Amor conjugal ultrapassam as
delícias de todos os outros amores? E quem não pode ver que em um certo
amor foram reunidas todas as beatitudes,todas as felicidades e todos os prazeres
que possam jamais dar dados pelo Senhor,e que o receptáculo dessas cousas é o
394

Amor verdadeiramente Conjugal, que pode em um sentido pleno, recebê-las e


percebê-las?" R espondi: "O s homens não sabem isso, porque não se dirigem ao
Senhor, e não vivem segundo Seus preceitos, fugindo dos males como pecados,
e fazendo os bens; ora, o Amor verdadeiramente Conjugal com suas delícias
vem unicamente do Senhor, e é dado aos que vivem segundo Seus preceitos;
assim é dado aos que são recebidos na N ova Igreja do Senhor, entendida no
Apocalipse pela N ova Jerusalém". A isto, acrescentei: "Duvido que no M undo
de hoje se queira crer que este Amor em si mesmo seja um Amor espiritual e
que por conseguinte venha da R eligião; e isso porque não se conserva dle senão
uma idéia corporal". Então eles me disseram: "Escreve sobre este amor, e segue
a revelação; e em seguida o Livro escrito sobre este amor será enviado do Céu
por nós, e nós veremos se as coisas que ele conterá serão recebidas, e ao mesmo
tempo se sequer reconhecer que este Amor é segundo a R eligião no homem,
espiritual nos espirituais, natural nos naturais e inteiramente carnal nos
adúlteros".
535 - Depois disso, ouvi sair dos lugares inferiores um murmúrio hostil, e ao
mesmo tempo estas palavras: "Faz milagres e nós creremos". E perguntei se não
estavam aí M ilagres; e foi respondido: "N ão; não há aí M ilagres". E eu lhes
disse: "Q ue M ilagres quereis, pois?" E eles disseram: "M anifesta e revela as
cousas futuras e nós aí teremos fé". R espondi, porém: "T ais revelações não são
dadas do Céu, porque quanto mais o homem conhece o futuro, tanto mais sua
razão e seu entendimento, com a prudência e a sabedoria, caem na inação, se
entorpecem e se destróem". E fiz esta outra pergunta: "Q ue outros milagres
farei?" E então exclamaram: "Faz semelhantes aos de M oisés no Egito". E
respondi: "T alvez que vendo-os, endurecereis vossos corações como Faraó e os
Egípcios". E foi respondido: "N ão". M as de novo, eu disse: "Assegurai-me que
não dançareis em torno do Bezerro de ouro, e não o adorareis, como os
descendentes de Jacob o fizeram,um mês após terem visto toda a M ontanha do
Sinai em fogo, e ter ouvido Jehovah M esmo falar do meio do fogo; assim, após
o M ilagre que era o maior de todos". O B ezerro de ouro no sentido espiritual é
a V olúpia da carne. E foi respondido dos lugares inferiores: "N ós não seremos
como os descendentes de Jacob". M as então ouvi que lhes era dito do Céu: "Se
não crêdes em M oisés e nos Profetas, isto é, na Palavra do Senhor, não crereis
depois dos milagres mais do que os filhos de Jacob no deserto, nem mais do
que creram, quando viram com seus próprios olhos os M ilagres feitos pelo
Senhor M esmo quando estava no M undo.

FIM

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