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Be eel lela me eee PlaccRaen ch te Dh politicas da memoria eh Notas 138 Theodor W. Adorno, *Cultyral, Griticism and Society”, P bridge, MA, MIT Press, 1981. W. G. Sebald, On the Natural History of Destruction, Nova York, Random, House 2003, p. 10 [Guerra aérea e literatura, com um ensaio sobre Alfred Andersch, trad. do original almio, Luft. isms, trad, Samuel ¢ Shierry Weber, Caine krieg und Literatur, por Carlos Abbenseth ¢ Frederico Figueiredo, Sig. Paiplog Companhia das Kies. tras, 2011. TW. Adorno, “What does coming, 10 terms with the past 1 HES ar Geoffrey, Hatimiut(Org.), Bithurg in Moral and Political Perspective, Bloominggor Ligliattt University Prégse 1 986° T. W, Adorno, Negative Dialectics, Nova York, Goagituath, 1999, p. 362 [iakérica » Marco Antonio Casanova, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2009} gatiayrial, Para alguns dos principais textos desse debatty ver Lense Ith ef ul, Aesthetics anil Polities, Lon- dres, New Left Books, 1977. fi Ver a contribuigio de Herbert Marcuse para Robert Paull Wolff, Bassiiigton Moore Jr. ¢ Herbert Marcuse, Critique of Pure Tolerance, Boston, Beacon Press, 19694 Critica da tolenincia pura, trad Ruy Jungmann, Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1970]. 5 James E. Young, The Texture of Memory: Holocaust Memorials and Mewtiig, New Haven, Yale University Press, 1993. Andreas Huyssen Acultura da memoria. em um impasse: memariais em Berlim_e Nova York No decorrer das duas tiltimas décadas, a cultura da memoria ¢ a politica da memoria tornaram-se verdadciramente transnacionais, se nao globais. Da Africa do Sul a Argentina ¢ ao Chile, da Bosnia ¢ do Kosovo a Ruanda, o trauma histérico ¢ as violagdes dos direitos humanos despontaram como loci privilegiados da comemoragio publica no trabalho de arquitetos, académicos, pintores ¢ escritores. Criaram-se Comissdes da Verdade ¢, em paises como Argentina e Chile, 0 tribunais tornaram-se atuantes nos tiltimos tempos, aps um periodo prolongado de siléncio stado do periodo da Guerra Fria, Com crescente frequéncia, as nagées tém-se voltado para seu passado mais sombrio ¢ amitide reprimido. Algumas delas, como o Japio e a Turquia, deparam com pressdes internacionais cada v ‘obre o terrorismo de , mais intensas para enfrentar sua histéria. Depois da queda do Muro de Berlim, a politica global dos memoriais cris- talizou-se, na década de 1990, em torno de trés grandes fatores: 0 discurso sobre o Holocausto e debates piiblicos mais intensos sobre 0 50° e 0 60° ani- versarios de eventos relacionados com a Segunda Guerra Mundial; as transi- des para a democracia, apés 0 colapso dos regimes de terrorismo de Estado na América Latina e do apartheid na Africa do Sul; ea recorréncia da limpeza étnica c do genocidio, na atualidade, nos Béleas e em Ruanda. Essa dimensiio politica da comemoragio foi acompanhada, no Ocidente, por uma transigio mais generalizada da crenga dominante no futuro da modernizag&o para um investimento muito difundido no passado, através de ondas de nostalgia ¢ moda retrd. Para alguns, essa obsessio recente com a meméria marca uma planeja- necessidade crescente de historicidade num mundo de obsolescénci da, bem como no presente em eterna expansio da cultura de consumo, Outros temem que a ubiquidade do discurso sobre a meméria, no ptiblico ¢ na midia, ameace 0 conhecimento histérico objetivo, eliminando as barreiras entre pas- inte vivido. Na verdade, a propria memoria pode sados inventados e 0 pres tornar-se uma mercadoria a ser colocada em circulagéo por uma industria voraz da cultura, sempre em busca de novos floreados. Assim, muitos historiadores desconfiam desse surto de expansio da memé- ria. May a simples oposigio da boa histéria objetiva 4 meméria indigna de ‘Acoltura do memétia em unsimpasse: memoriaisem BerlimeNova York 139 toriadores da meiétia; como Pierre Nora e Jan Assmann.' Mais recentéijente, em seu incisivo ensaio intitulado “Quando terminou o Holocausto? Reflexdes sobre a objetividade historica”y Martin Jay recorrew ao extenso debate sobre a memoria ¢ o trauma para assi- nalar que as afirmagées de desfecho implicitas na historiografia objetiva, ba. scada em fatos, naufragam na propria natureza da experigneia trauimétiea, que nega a reconcilia confianga nao basta, como mostraram hi passada, portanto, € nao s6 indigna de confianga, como toda lembrangay mas também cria problemas metodolégicos fundamentai O discurso sobre a meméria veio para fi para os historiado .A\compreensiio,e teprésentagio de passados histéricos traumiticos eXige a cooperagio Gitre historiadores & aquilo que Carol Gluck, num feli neologismo, chamou de’memoriadres.? © que ainda precisamos, porém, é de uiita’reflexio histories sobre es hipertrofia da meméria em nossa época, algo Andlogo, ralyey, ¥ tentativarde Nietzsche de compreender a hipertrofia da historia né-séeulo XIX." Esta beth patente que o recente surto de expansio da meméria é 0 outro:lado da con- flanga decrescente no futuro das sociedades ocidentais. Comparados As pro- messas de progresso de uma época anterior, os atuais imaginrios do futuro sofrem de uma confianga anémica. Sem dtivida, depois de 1989, alguns cele- braram o fim da utopia ¢ da histéria, apenas para langar as fantasias neolibe- rais de globalizagio da década de 1990. Cinco anos depois do 11 de setembro, Porém, os horizontes escureceram ¢ as exuberantes promessas da globalizacio consistem, majoritariamente, em mercadorias danificadas, Embora os discur- sos sobre a meméria ainda estejam firmes e fortes, as vozes céticas dam da eficacia da memoria popular tém-se elevado, Porém, 3 praticas de memorializa que duvi- relagio entre as cdo a realidade do esquecimento continua a ser um pomo da discérdia. O paradoxo & que as propri as. priticas comemorativas podem participar dos processos destemporalizantes do consumo instantaneo, da produgio de lixo ¢ do esquecimento, que marcam nossa cultura. O debate Sobre o memorial do U1 de setembro talvez seja o melhor exemplo, até hoje, de como a memorializ, eo € 0 esquecimento podem entrar numa alianga es- Puiria, que tanto trai o passado quanto presente. [ cultura da meméria num impasse. o que quero dizer com a Esse paradoxo da meméria ¢ do esquecimento sempre teve sua melhor en- carnagio no meio constituide por monumentos © memoriais, Robert Musil acertou ao sugerir que nada ¢ to invisivel no meio urbano quanto um mont mento." Além disso, ha uma longa historia de monumentos que sao vandaliza- dos, derrubados ¢ ressuscitados, ¢ que tornam a desaparecer, Nada disso, & claro, inspira muita confianga na capacidade que alyuns dos grandes memo- 110 Andreas Huyssen ‘fio, a cura eo desfecho, A lembranga traumiitica da violencia” ridis “de hoje —-digamoS, 0 Monumiento 40s Judeus Assassinados da Europa, em Berlim, e 0 planejado memiorial'do 11 de setembro, em Nova York — tém de mantéf Viva a lembrafca’e'Visivel o passado na trama urbana. Durante al- gum tempo, o monumento de Berlim e o memorial de Nova York (uma vez Construido)-sctyirad como grandes pontos turisticos. Mas quem pode garantir sua Tongeyidade na mente popular, quando houver desaparecido 0 surto de expansa6 da meméria? Talvez as dificuldades que cercam o planejamento do niciorial do 11 de setembro ja indiquem que estamos nos aproximando desse ponto, Num momento em que se levantou apenas cerca de 1/3 da verba neces- ia para construir um projeto ja muito reduzido em sua escala, alguns nova- -iorquinos acreditam que o memorial jamais sera construido. Nao comparti- 2 opinidio, mas ndo posso negar que ela tem certa légica. tho es II Por diversas razdes, as discussdes sobre 0 memorial do 11 de setembro tem recorrido, vez por outra, a0 longo debate sobre o memorial de Berlim. Por isso, nao fiquei surpreso quando recentemente me pediram para comparar o local do World ‘Trade Center ¢ os projetos do seu memorial com 0 Monumento aos Judeus Assassinados da Europa, em Berlim. Minha primeira reagio foi negati- va, Comparar 0 monumento de Berlim ¢ 0 discurso de sua genealogia com 0 debate sobre 0 memorial do 11 de setembro, em Nova York, pareceu-me 0 exemplo de uma comparagio flagrantemente inoportuna, se é que comparacto pretende sugerir afinidade, semelhanga ¢ proximidade, Os eventos lembrados sio diferentes demais em tetmos de natureza, escala ¢ importincia histérica. Mas, quando aceitei o desafio de relacionar 0 monumento acabado de Berlim com os planos do memorial de Nova York, emergiu. uma perspectiva interes- sante, que talvez tenha uma significagio maior. O memorial de Berlim, a do ceticismo inicial generalizado, foi abragado por seus criticos e pelo piiblico. © memorial de Nova York, apesar das esperancas exuberantes de construcio de um geande monumento, j4 parece um fracasso desolador. E também isto que pretendo dizer com a cultura da meméria num impasse. / © monumento berlinense foi erigido pelos Nachgeborenen |descendentes] vitimas dos crimes dos nazistas contra dos perpetradores para comemora ieee a humanidade, que deram origem A convengio de 1948 sobre o genocdio rde, impulsionaram grande parte do discurso transnacional so 7 : Foi por isso que o debate na Alemanha, & ‘a repercussio internacional, mais ta direitos humanos em nossa époi parte sua importincia nacional, teve uma podero ; mento, o cia ¢ onumento. que também esti contida na dimensio curopeia do nome do mo Acoltura da meméria em um impasse: memoriaisem Berlime Nova York 141

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