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FRANCIS FUKUYAMA
ORDEM POLÍTICA
E DECADÊNCIA
POLÍTICA
Da Revolução Industrial
à Globalização da Democracia
Tr a d u ç ã o
M I G U E L M ATA
4 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
CAPÍTULOS 7
ÍNDICE
Parte I: O Estado
1. O que é o desenvolvimento político? 37
2. As dimensões do desenvolvimento 60
3. A burocracia 76
4. A Prússia constrói um Estado 94
5. A corrupção 115
6. O berço da Democracia 133
$,WiOLDHRHTXLOtEULRGHEDL[DFRQÀDQoD 152
8. Patrocinato e reforma 177
9. A América inventa o clientelismo 190
2ÀPGRVLVWHPDGHGHVSRMRV 211
2VFDPLQKRVGHIHUURDVÁRUHVWDVHDFRQVWUXomRGR(VWDGR
americano 233
12. A construção de nações 260
13. Bom governo e mau governo 277
Agradecimentos 743
%LEOLRJUDÀD 745
Índice remissivo 777
CAPÍTULOS 9
$HQHUJLDQRH[HFXWLYRpXPGRVHOHPHQWRVSULQFLSDLVQDGHÀ-
nição do bom governo. É essencial para a proteção da comunidade
contra ataques externos e é igualmente essencial para a administra-
omRÀUPHGDVOHLV«8PDH[HFXomRWtELDQmRSDVVDGHXPVLQyQLPR
de uma execução má e um governo mal executado, independen-
WHPHQWHGRTXHVHMDHPWHRULDpQHFHVVDULDPHQWHQDSUiWLFDXP
mau governo.
– Alexander Hamilton
Introdução
O D E S E N V O LV I M E N T O
DAS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS
AT É À R E V O L U Ç Ã O F R A N C E S A
1
Ver, por exemplo, Peter J. Wallison, Bad History, Worse Policy: How a False Narrative
About the Financial Crisis Led to the Dodd-Frank Act (Washington, D.C., American Enter-
prise Institute, 2013).
14 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
2
Anat Admati e Martin Hellwig, The Banker’s New Clothes: What’s Wrong with Banking
and What to Do About It (Princeton, Princeton University Press, 2013).
3
Para um relato mais abrangente sobre o modo como a política afetou a regulação
EDQFiULDGHSRLVGDFULVHÀQDQFHLUDYHU6LPRQ-RKQVRQH-DPHV.ZDN13 Bankers: The Wall
Street Takeover and the Next Financial Meltdown (Nova Iorque, Pantheon, 2010).
INTRODUÇÃO 15
O problema do governo
4
Samuel P. Huntington, Political Order in Changing Societies. (New Haven, Yale Univer-
sity Press, 2006), p. 12.
INTRODUÇÃO 17
* As Origens da Ordem Política (Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2012). (N. do T.)
18 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
Animais sociais
A emergência do Estado
O primado do Direito
A responsabilização democrática
2~OWLPRGRVWUrVFRQMXQWRVGHLQVWLWXLo}HVDVXUJLUIRLDUHVSRQ-
sabilização democrática. O mecanismo central de responsabiliza-
ção, o parlamento, evoluiu a partir da instituição feudal dos estados,
conhecida por cortes, dieta, tribunal soberano, zemskiy sobor, ou, na
Inglaterra, parlamento. Estas instituições representavam as elites da
sociedade – a alta nobreza, a pequena aristocracia e, em alguns casos,
a burguesia das cidades independentes. No âmbito do direito feu-
dal, os monarcas, caso pretendessem lançar impostos, eram obriga-
24 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
5
Na Grã-Bretanha, travou-se um combate prolongado similar no século XIX e no prin-
cípio do século XX, com a questão fundamental a ser a classe e não a raça. Talvez pelo facto
de o princípio da igualdade estar articulado de forma menos inequívoca (a Grã-Bretanha
não tem nenhum equivalente à Declaração de Direitos e continua a ser uma monarquia
constitucional), demorou muito mais tempo do que nos Estados Unidos a estabelecer o
sufrágio eleitoral masculino universal.
* Um dos líderes do Partido Democrata. (N. do T.)
** Aprovada em 1868. (N. do T.)
INTRODUÇÃO 27
A Revolução Francesa
6
Edmund Burke, 5HÁHFWLRQVRQWKH5HYROXWLRQLQ)UDQFH (Stanford, Stanford University
Press, 2001); Alexis de Tocqueville, The Old Regime and the Revolution, Vol. I (Chicago,
University of Chicago Press, 1999); François Furet, Interpreting the French Revolution
(Cambridge, Cambridge University Press, 1981).
28 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
7
Para uma visão geral destes acontecimentos, ver Georges Lefebvre, The Coming of
the French Revolution, 1789 (Princeton, Princeton University Press, 1947).
INTRODUÇÃO 29
GHSRLVGDVXDGHUURWDHP:DWHUORRDÀUPRXTXHR&yGLJR&LYLOUH-
presentava uma vitória maior do que todas as que tinha obtido no
campo de batalha e, em muitos aspetos, tinha razão8.
Até essa altura, o direito francês fora uma manta de retalhos de
regras que variavam de região para região, algumas herdadas da tra-
dição do direito romano, outras do direito consuetudinário, e tam-
bém dos inúmeros acrescentos feitos durante séculos a partir de
fontes eclesiásticas, feudais, comerciais e seculares. Na misturada
daqui resultante, as leis eram frequentemente contraditórias ou am-
bíguas. O Código Napoleão substituiu tudo isto por um único tex-
to moderno, claro, escrito com elegância e extremamente conciso.
O Código Napoleão consolidou muitos dos ganhos da Revo-
lução ao eliminar da lei todas as distinções feudais de estatuto e
privilégio. Os cidadãos passaram a ter direitos e deveres iguais, cla-
UDPHQWHGHÀQLGRVex ante. O novo Código Civil consagrou os con-
ceitos modernos dos direitos patrimoniais: «o direito de cada um
usufruir e dispor da sua propriedade de forma absoluta, desde que
QmRVHMDXWLOL]DGDGHPRGRSURLELGRSHODOHLª$WHUUDIRLOLEHUWDGD
dos vínculos feudais e consuetudinários, o que abriu o caminho para
o desenvolvimento de uma economia de mercado. Os tribunais se-
nhoriais – isto é, os tribunais controlados pelos senhores, contra os
quais as queixas dos camponeses se acentuaram durante a Revolu-
ção –, foram abolidos e substituídos por um sistema uniforme de
magistrados civis. Os nascimentos e os matrimónios passaram a ter
GHVHUUHJLVWDGRVMXQWRGDVDXWRULGDGHVFLYLVHQmRGDVUHOLJLRVDV9.
O Código Napoleão foi imediatamente exportado para as regiões
sob ocupação francesa: a Bélgica, o Luxemburgo, os territórios ale-
mães a oeste do Reno, o Palatinado, a Prússia Renana, Genebra,
8
Napoleão insistiu num novo código em 1800, pouco depois de se apoderar do governo
revolucionário, em 18 de Brumário, e participou em muitas sessões do Conselho de Esta-
GRTXHVXSHUYLVLRQRXDVXDUHGDomR2FyGLJRIRLÀQDOPHQWHSURPXOJDGRHP&DUO-
Friedrich, «The Ideological and Philosophical Background», in Bernard Schwartz (ed.), The
Code Napoléon and the Common Law World (Nova Iorque, New York University Press, 1956).
9
Martyn Lyons, Napoleon Bonaparte and the Legacy of the French Revolution (Londres,
Macmillan, 1994), pp. 94-96.
30 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
10
Jean Limpens, «Territorial Expansion of the Code», in Schwartz, Código Napoleão.
11
Ver Tocqueville, The Old Regime, pp. 118–124.
'H&KDUOHV3DXOHWTXHSURS{VDVXDLPSOHPHQWDomR2QRPHRÀFLDOGRLPSRVWR
era «direito anual». (N. do T.)
INTRODUÇÃO 31
GHSRGHUHPVHUFRPSUDGRVHUDPWUDQVPLVVtYHLVDRVÀOKRVFRPR
herança. É óbvio que os detentores de cargos venais não estavam
minimamente interessados na administração pública impessoal
nem no bom governo; o que queriam era espremer os seus car-
gos ao máximo.
$SHVDUGHRVJRYHUQRVIUDQFHVHVGHÀQDLVGRVpFXORXVIII em-
preenderem dois grandes esforços para eliminar os detentores de
cargos venais, foram ambos derrotados, porque esta elite era demasia-
do poderosa e tinha muito a perder com uma reforma. A podridão
e a incapacidade de reforma do sistema foram fatores importan-
tes que conduziram à Revolução. Durante a Revolução todos os
detentores de cargos venais foram expropriados dos seus cargos,
HHPPXLWRVFDVRVGHFDSLWDGRV5HVROYLGRRSUREOHPDIRLÀQDO-
mente possível criar um novo Conselho de Estado, em 1799, que
foi colocado no vértice de um sistema burocrático verdadeira-
mente moderno.
O novo sistema administrativo não teria funcionado sem o siste-
ma educativo modernizado que foi criado para o apoiar. O Antigo
Regime tinha estabelecido várias escolas técnicas no século XVIII,
para formar engenheiros e outros especialistas, mas depois da re-
volução, em 1794, o governo revolucionário criou diversas Grandes
Escolas, como a Escola Normal Superior ou a Escola Politécnica,
FRPRREMHWLYRHVSHFtÀFRGHIRUPDUIXQFLRQiULRVS~EOLFRV(VWDV
escolas, antepassadas da Escola Nacional de Administração (ENA),
criada depois da Segunda Guerra Mundial, eram por sua vez ali-
mentadas por um sistema de liceus ou escolas secundárias de elite.
Estas inovações institucionais – a introdução de um novo códi-
go legal e de um sistema administrativo moderno – não são a mes-
PDFRLVDTXHGHPRFUDFLD1RHQWDQWRFXPSULUDPRXWURVREMHWLYRV
igualitários. A lei deixa de privilegiar certas classes que conseguem
manipular o sistema em benefício próprio; passa a tratar todos os
indivíduos de modo igual, em princípio, embora nem sempre na
SUiWLFD$SURSULHGDGHSULYDGDÀFDOLYUHGDVUHVWULo}HVIHXGDLVR
TXHSRVVLELOLWDRÁRUHVFLPHQWRGHXPDQRYDHPDLRUHFRQRPLD
32 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
de mercado. Além disso a lei não pode ser implementada sem uma
nova burocracia, que se liberta da bagagem de corrupção que acu-
mulou durante séculos. E combinados, a lei e o Estado administra-
tivo, funcionam, de várias formas, como um limite à arbitrariedade,
inclusivamente à dos líderes absolutistas. Em teoria, o soberano pos-
sui poderes ilimitados, mas é obrigado a exercê-los através de uma
burocracia que atua com base na lei. Um esquema que os alemães
designariam por Rechtsstaat. Este sistema tinha um carácter muito
diferente das ditaduras totalitárias que surgiram no século XX com
/HQLQH(VWDOLQHH0DRFXMDUHDOLGDGHHUDXP(VWDGRGHVSyWLFRVHP
restrições impostas pela lei ou pela responsabilização democrática.
Lançando as fundações
Par te I
O E S TA D O
36 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
O QUE É O DESENVOLVIMENTO POLÍTICO? 37
Capítulo 1
O Q U E É O D E S E N V O LV I M E N T O
POLÍTICO?
1
3DUDXPDSDQRUkPLFDGDVGHÀQLo}HVH[LVWHQWHVYHU5DFKHO.OHLQIHOG©&RPSHWLQJ
'HÀQLWLRQVRI WKH5XOHRI /DZªin Thomas Carothers (ed.), Promoting the Rule of Law
Abroad: In Search of Knowledge (Washington, D.C., Carnegie Endowment, 2006).
O QUE É O DESENVOLVIMENTO POLÍTICO? 39
Chegar à Dinamarca
2
S. N. Eisenstadt, Traditional Patrimonialism and Modern Neopatrimonialism (Beverly Hills,
Sage, 1973).
3
Douglass C. North, John Wallis, e Barry R. Weingast, Violence and Social Orders: A Con-
ceptual Framework for Interpreting Recorded Human History (Nova Iorque, Cambridge Universi-
ty Press, 2009).
4
Daron Acemoglu, e James A. Robinson, Why Nations Fail: The Origins of Power, Pros-
perity, and Poverty (Nova Iorque, Crown, 2012).
42 ORDEM POLÍTICA E DECADÊNCIA POLÍTICA
Decadência política
6HJXQGRDGHÀQLomRGH6DPXHO+XQWLQJWRQDVLQVWLWXLo}HVSROt-
ticas desenvolvem-se tornando-se mais complexas, adaptáveis, au-
tónomas e coerentes5. Mas também podem entrar em decadência.
As instituições são criadas em resposta a certas necessidades da so-
FLHGDGHWDLVFRPRWUDYDUXPDJXHUUDOLGDUFRPFRQÁLWRVHFRQyPL-
cos ou regular o comportamento social. Todavia, enquanto padrões
de comportamento recorrentes, também podem tornar-se rígidas e
não conseguirem adaptar-se quando as circunstâncias que as origi-
naram se alteram. O conservadorismo inerente ao comportamen-
WRKXPDQRWHQGHDGRWDUDVLQVWLWXLo}HVGHVLJQLÀFDGRHPRFLRQDO
depois de serem implementadas. Alguém que sugira abolir a Mo-
QDUTXLD,QJOHVDRXD&RQVWLWXLomR$PHULFDQDRXRLPSHUDGRUMD-
ponês e substituí-los por algo mais recente e melhor enfrenta uma
enorme e difícil batalha.
Além da inadaptação das instituições às novas circunstâncias,
existe uma segunda fonte de decadência política. A sociabilidade
natural humana assenta na seleção pelo parentesco e no altruísmo
5
3DUDGHÀQLo}HVGHVWHVWHUPRVYHU+XQWLQJWRQ Political Order in Changing So-
cieties, pp. 12-24, e Francis Fukuyama, As Origens da Ordem Política, pp. 659-660.
O QUE É O DESENVOLVIMENTO POLÍTICO? 43
6
O argumento de que as democracias se autocorrigem quando confrontadas com
GHVDÀRVFRORFDGRVSHODVHOLWHVVXUJHinter alia, in Mancur Olson, «Dictatorship, Demo-
cracy, and Development», American Political Science Review 87 (9), 1993, pp. 567-576; Nor-
th, Wallis, e Weingast, Violence and Social Orders; Acemoglu e Robinson, Why Nations Fail.
O QUE É O DESENVOLVIMENTO POLÍTICO? 45