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Prof.

ANDERSON PINHO

FILOSOFIA
PARA O
ENEM
2015
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SUMÁRIO Maquiavel e o dilema do príncipe.....................................24


Capítulo 7 – Formação e consolidação do Estado...26

CONSIDERAÇÕES INICIAIS...................................02 Thomas Hobbes e a mecânica do Estado........................29

UNIDADE I – FILOSOFIA ANTIGA......................03 Questões...............................................................................30

Capítulo 1 – Origem da Filosofia..................................03 Capítulo 8 – Empirismo e Racionalismo..................33

Contexto histórico..............................................................03 Descartes e o Grande Racionalismo.................................33

O Mito..................................................................................04 Francis Bacon – Conhecimento (empírico) é poder.......35

A pólis e o surgimento da Filosofia...................................04 Isaac Newton e o Grande Relógio Celeste.......................36

Pré-socráticos – Os primeiros filósofos...........................05 Questões...............................................................................37

Capítulo 2 – Filosofia Clássica......................................07 Capítulo XX – Iluminismo............................................39

Atenas em questão..............................................................07 Iluminismo na Inglaterra....................................................39

Os Pluralistas.......................................................................09 John Locke: empirismo e liberalismo..................39

Sofistas..................................................................................10 George Berkeley....................................................41

Sócrates................................................................................10 David Hume e o poder do hábito........................42

Platão....................................................................................11 Adam Smith e o livre mercado.............................43

Aristóteles............................................................................13 Iluminismo na França.........................................................44

Capítulo 3 – Filosofia Helenística................................16 Voltaire e a tolerância............................................44

Contexto histórico - Alexandre o Grande.......................16 Montesquieu e os três poderes............................44

Epicurismo..........................................................................17 Rousseau e a vontade geral...................................45

Estoicismo...........................................................................17 Enciclopédia...........................................................46

Ceticismo/Pirronismo.......................................................17 Iluminismo na Alemanha...................................................46

Cinismo................................................................................17 Immanuel Kant......................................................46

Questões...............................................................................17 Questões...............................................................................49
GABARITO.......................................................................51

UNIDADE 2 – FILOSOFIA MEDIEVAL...............20 Curta nossa FAN PAGE

Capítulo 4 – A Patrística e Santo Agostinho..............20 https://www.facebook.com/profandersonpinho

Capítulo 5 – Escolástica e São Tomás de Aquino....21 Inscreva-se em nosso canal:


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UNIDADE 3 – FILOSOFIA MODERNA...............22 Adquira nosso curso:

Capítulo 6 – Renascimento............................................22 https://www.andersonpinho.com.br

Contexto histórico..............................................................22 Bons estudos e até mais!!!

Galileu Galilei e o início da ciência experimental..........24


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CONSIDERAÇÕES INICIAIS Nesse e-book vamos ver como as respostas às


perguntas formuladas sobre os problemas de sociedades
tão distintas da nossa podem nos ajudar a superar muitos
dos nossos problemas atuais.
Sobre o ENEM.
E para isso não podemos estudar o pensamento
de determinado filósofo dissociado de seu ambiente
Que o ENEM não é um vestibular tradicional
social, alheio à sua história. Somente com a consciência
você já está cabeludo de saber. Ele não aborda os
de que todo grande pensador formula suas teorias a partir
conteúdos das disciplinas como fins em si mesmos. O
de seu meio social e dentro de seu contexto histórico,
que o Ministério da Educação quer saber é se você
podemos entender melhor todo e qualquer filósofo.
consegue compreender, avaliar e ter um posicionamento
crítico sobre a realidade que o rodeia. Todos nós temos uma história, mas somente
tendo consciência da teia, dos enredos das diversas
Para isso, mais do que testar sua decoreba, o
histórias das instituições que nos cercam e que formam o
governo quer saber se você tem as competências e
contexto em que nossa própria história vai se desenrolar,
habilidades necessárias para entender o seu contexto
é que poderemos tomar consciência dela e, por
sócio-histórico-cultural, fundamentado nos conteúdos
conseguinte, de nós mesmos.
adquiridos no ensino médio. Ele quer saber se você é um
cidadão crítico e consciente. Pelo menos, essa é a ideia. Dessa maneira, vamos fazer uma viajem
histórico-filosófica das ideias que formaram a nossa
Mas para se ter uma compreensão desse nível
sociedade e suas instituições para que posamos assim,
sobre a realidade é necessário uma visão, não
compreendermos como e por que nossa situação atual
multidisciplinar, mas interdisciplinar e
chegou a ser o que é hoje. Somente dessa maneira
contextualizada sobre a mesma. Esses são os conceitos
teremos um melhor embasamento para fazermos
chaves desse exame.
julgamentos sobre o sentido de alguma coisa.
Tanto é que não há no edital o conteúdo das
Creio que abordar o conhecimento filosófico
disciplinas da Área de Humanas divididos da forma
dessa maneira seja a melhor forma para você desenvolver
tradicional em Português, Literatura, História, Geografia,
as competências e habilidades exigidas pelo ENEM.
Filosofia e Sociologia. Linguagens, Códigos e suas
Tecnologias e Ciências Humanas e suas Tecnologias são Por que estudar por esse e-book? Ele é voltado
a forma que esses conteúdos aparecem. E isto é assim
para que se possa, por meio dos conhecimentos dessas especificamente para o ENEM, abordando os conteúdos
disciplinas, ter uma visão da realidade como um todo como o edital exige. Esse material está escrito em
inter-relacionado e contextualizado.
linguagem fácil, prática, direta, e bem descontraída. Além
Por isso, o estudo de Filosofia é tão importante
de trazer, divididas por assunto, todas as questões de
para esse exame, mas contraditoriamente relegado a um
segundo plano, seja nos colégios ou nos cursinhos filosofia que já caíram no ENEM.
preparatórios.
Não é sem propósito que a Filosofia vem
ganhando destaque nesse exame, a ponto de ter 18
questões com conteúdo filosófico na última prova. Isso
equivale a 40% da prova de Ciências Humanas, e 10% de
todo o ENEM.
A Filosofia é a única disciplina que nos possibilita
ter uma visão de conjunto interdisciplinar sobre a nossa
realidade. E não estou falando aqui do estudo de mais
uma disciplina escolar em que se tem de aprender mais
conteúdos dissociados de nossa vivencia diária.
Não é a simples leitura do pensamento de
determinado filósofo que viveu numa época totalmente
diferente da nossa e que por isso não pode nos dar
nenhuma lição para os nossos problemas atuais.
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IDADE 1 – FILOSOFIA ANTIGA CONTEXTO HISTÓRICO


Na antiguidade a região conhecida como Grécia
não era um estado unificado, com poder centralizado,
CAPÍTULO 1 – ORIGEM DA FILOSOFIA governo único, e suas cidades-estados (póleis) obedecendo
a esse poder. Era na verdade, uma região que por suas
Para uma melhor compreensão da matéria, é
peculiaridades históricas e geográficas abrigava povos de
importante deixar bem claro que é um erro chamar as
origem, costumes e crenças comuns, unidos por uma
póleis gregas de cidades-estados, dentre tantos motivos
mesma língua.
destacarei apenas dois. O primeiro é a imprecisão
histórica; o termo cidade é romano (civitas em latim), e o
Estado é invenção da modernidade, ainda não existindo
nesse tempo.
Alguns podem retrucar e argumentar que isso não
tem importância. Para eles eu destaco o segundo
motivo, que é a carga de preconceitos que esses termos
carregam. E quando uso o termo preconceito não estou
usando-o de forma pejorativa, mas em seu sentido literal,
isto é, de ideias preconcebidas, sem reflexão.
Quando se fala em “cidade” imaginamos nossas
formas de aglomeração humana em um mesmo espaço,
uma arena em que cada indivíduo procura o seu bem, se
dar bem sem prejudicar a busca do bem do outro, estejam A história desse povo na antiguidade é dividida
esses bens correlacionados ou não. O termo “bem”, aqui, em quatro períodos. A sua formação se dá pela união das
não está sendo usado no sentido metafísico, mas no civilizações Cretense e Micênica no período que ficou
sentido de propriedade mesmo, seja ele (bem) posses convencionado chamar de pré-homérico (Secs. XX a
materiais, fama, dinheiro ou poder. XII a. C.), cujo fim ocorre com a invasão dórica que
ocasionou a primeira diáspora grega, quando eles
Noutra vertente, quando usamos o termo ocuparam todas as áreas banhadas pelo mar Egeu na
“estado” vem à nossa cabeça um poder exterior a nós que forma de pequenos núcleos rurais.
por meio de um governo, quer se intrometer em nossas
vidas, quer seja positivando/regulando nossas relações Começa a partir de então o período
sociais, quer seja tributanto nossos salários ou negócios, homérico (Secs. XII a VIII a. C.), que leva esse nome
quer seja ditando quando, onde, e como será gasto nossas por causa das obras do grande poeta Homero, que nos
riquezas. conta, por meio da Ilíada e Odisseia, como foi essa época.
Quando se fala em estado, temos um governo, Os pequenos núcleos
uma sociedade civil (organizada ou não) e uma rurais deram origem aos genos
democracia representativa. Uns que comandam e outros que, comandado por um pater,
que são comandados. eram formados por pessoas que
acreditavam ser de uma mesma
Como veremos a seguir, a Grécia, melhor descendência. Apesar de terem
dizendo, a Atenas da época clássica, gerou uma forma de um líder, a terra era de
organização da vida humana que serviu de base durante propriedade de todos.
esses milênios para nossas sociedades. Mas é importante
deixar claro que usar o termo “cidade-estado” para Nesse período, houve um grande
designar essa forma de organização político-social dos aumento populacional que não foi acompanhado pela
gregos é uma monstruosidade que precisa ser corrigida produção de alimentos, pois haviam poucas terras férteis.
pelos manuais do ensino médio. Muitos genos se dividiram, houve disputas e
distribuição desigual de terras que passaram a ser
Continuar com isso é permanecer no erro de propriedade privada. Foi um período de turbulência e
olhar o outro pelo nosso umbigo, querer entender suas muitas pessoas ficaram marginalizadas.
formas de expressão a partir das nossas. Esse tipo de
pensamento é que causa discórdia e não aceitação do Desse modo, a sociedade, que era essencialmente
outro, o que gera guerras e mais guerras. agrária e patriarcal, ficou estruturada da seguinte forma:

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1) Eupátridas = os paters e seus parentes mais coisas, e mesmo sem ter a tecnologia de que dispomos
próximos que detinham as maiores e melhores hoje, eles tinham a imaginação trabalhando a todo vapor.
terras;
2) Demiurgos = trabalhadores livres Com ela criaram diversas histórias que foram
3) Georgoi = pequenos proprietários de terras; passadas de forma oral por várias gerações. A palavra
4) Thetas = homens livres, mas marginalizados por grega mythos significa contar, narrar, conversar.
que sobraram na divisão e disputas por terras;
O mito é uma narrativa fantasiosa que visa dar
5) Escravos
uma explicação para a origem de determinada coisa, seja
Essa instabilidade gerou a necessidade de alguns ela o homem, o amor, a doença, o mundo, os deuses, etc.
genos se aliarem. Dessas alianças resultaram as fratrias,
Mas além disso, é também uma forma de
e da união destas, as tribos. O poder do pater passou a
justificação da estrutura social da época. Dito de outro
ser exercido por grupos de latifundiários bem nascidos
jeito, o mito é uma forma de ver não só o mundo natural,
conhecidos como eupátridas. Até que finalmente foram
como também de entender e aceitar a divisão e
formados os demos que tinha como líder o basileu
funcionamento da sociedade.
(rei), que era o mais fodão dos eupátridas.
Tanto é que os mitos se sustentam apenas na
Para sobreviver, muitos gregos tiveram que
autoridade de quem os conta. O poeta-rapsodo, tem
buscar terras férteis para o cultivo de alimentos. Eles se
autoridade inquestionável, seja porque recebeu a
lançaram ao mar à procura dessas regiões e se
narrativa de uma tradição oral respeitada, seja porque é
estabeleceram, além do Mar Egeu, por quase toda região
considerado alguém escolhido pelos deuses para receber
europeia banhada pelo Mar Mediterrâneo
uma revelação e passá-la aos outros. Esses devem receber
(principalmente no sul da península itálica e na região da
a informação como verdade inquestionável.
Sicília, que ficou conhecida como Magna Grécia),
adentrando também na região do Mar Negro fundando Desse modo, os mitos não dão espaço para
apoikias (novos demos - colônias) em todos esses questionamentos e nem reflexão, perpetuando a forma
territórios. Essa busca de novas terras foi Segunda de ver e entender tanto o mundo natural quanto o social.
Diáspora grega. Perceba que os grandes reis (basileu) são protegidos ou
escolhidos pelos deuses e os grandes guerreiros, como
Aquiles, possuem vínculos com eles. Você se atreveria a
discutir com eles, ou questionar sua autoridade? Fica
difícil, não é?
Os mitos sobre a origem do mundo são as
cosmogonias (cosmos = mundo ordenado + gonia =
gerar), já os que narram a origem dos deuses são as
teogonias (theos = seres divinos + gonia = gerar.
Admitem incoerências, contradições e são muito
limitados deixando vários questionamentos em aberto.
No entanto, sucessivos acontecimentos acabaram
derrubando muitas dessas explicações e uma nova forma
de ver o mundo (incluindo a sociedade) precisava ser
Foi basicamente nessa época que houve o criada.
ressurgimento da escrita entre os gregos, quando eles
adaptaram o alfabeto fenício à sua língua.
A Ilíada e a Odisseia descrevem vários aspectos A PÓLIS E O SURGIMENTO DA FILOSOFIA
da cultura e as diversas formas de relacionamento social
dessa época, e mais importante, influenciaram muito as Com a segunda diáspora, começa o período
várias gerações gregas que tiveram o guerreiro bom e arcaico (Sécs. VIII a VI a. C.), quando tivemos a
belo como um ideal de formação a ser alcançado. formação de vários demos espalhados por todo o
mediterrâneo, intensificando as trocas de mercadorias e
O MITO fazendo florescer novamente o comércio. É importante
destacar que nessa época surge a moeda como um meio
Antes mesmo do advento da Filosofia o homem de facilitar as transações comerciais.
tinha já possuía a curiosidade de saber sobre a origem das
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A partir daí, foi só questão de tempo para que os E esse tipo de discurso proporcionado pela
demos se unissem e formassem as póleis (eram mais de atividade política foi fundamental para o
1000), que foram governadas por conselhos de surgimento do discurso filosófico, que nasceu
eupátridas (proprietários de terras) dando início aos como diálogo. A palavra que sempre pode ser
regimes oligárquicos (governo de poucos). Eles debatida e questionada. Lembrem-se que no
desenvolveram leis, distribuíam a justiça, e ditavam a mito, a palavra era inquestionável.
divindade a ser cultuada.
Agora, com um número muito maior de póleis, e Nas póleis gregas não havia muita diferença de
várias delas sendo importantes centros comerciais e riqueza entre os cidadãos e a monarquia não era a forma
portos estratégicos para a navegação, a principal atividade de governo predominante entre eles.
econômica deixou de ser a agricultura, e o comércio passa
a ser o seu principal fator de desenvolvimento Todos eram responsáveis pela defesa da pólis,
econômico. então, não fazia sentido não terem participação na
tomada de decisões sobre os rumos da mesma. Foi assim
Esse desenvolvimento econômico proporcionou que nasceu a política na forma de democracia.
uma melhora significativa na qualidade de vida material
da população. A partir daí os gregos passaram a ter tempo Os gregos acreditavam que um homem livre que
para fazer algo além de comercializar, eles agora iriam vivia em pleno gozo de suas faculdades mentais e
pensar. corporais deveria viver em uma comunidade política que
se autodeterminava por leis que ela mesma criava por
A consolidação das póleis seguido de uma relativa meio do debate, e não por um homem (rei) ou alguma
estabilidade política e econômica, e um longo período de divindade.
prosperidade foi o terreno fértil para o nascimento da
Filosofia. Algumas invenções e atividades que se A vida na pólis era voltada para que eles
desenvolveram, ou foram criadas, juntamente com a polis desenvolvessem plenamente suas capacidades humanas,
foram cruciais para o seu surgimento. São elas: fruto de sua natureza. Cada cidadão era estimulado a
exercitar as virtudes e reprimir os vícios. E a justiça
 As navegações – ao desbravarem os mares os necessária para controlar esse lado ruim só pode ser
gregos iriam realmente descobrir se existiam os encontrada em uma comunidade bem ordenada, de
monstros e sereias que os mitos contavam. homens virtuosos, justos e livres, que governam a si
 A invenção do calendário – isso proporcionou mesmos, ou seja, na pólis.
aos gregos verem que as estações do ano não
Essa visão histórica da formação da sociedade
eram vontade dos deuses mas fenômenos
grega desde os núcleos rurais até a formação das póleis,
naturais que podiam ser previstos.
nos ajuda a entender não apenas o surgimento da
 A moeda – Você certamente sabe quanto custa filosofia, mas o por que dela ter sido uma invenção grega.
uma caneta, um caderno ou uma meia. Mas você Ela não foi um “milagre” repentino desse povo, mas o
sabe quanto vale um real? Sabe porque um real resultado de uma gestação que vinha acontecendo no
vale um real, e cem reais vale cem reais? Pois é, seio das transformações ocorridas na sociedade grega
esse é um exercício de abstração que requerem durante séculos.
cálculos complexo. Os gregos deixaram de trocar
as coisas e passaram a usar a moeda quando PRÉ-SOCRÁTICOS – OS PRIMEIROS
adquiriam essa capacidade de abstração. FILÓSOFOS
 A escrita alfabética – se eu desenhar um
homem e te mostrar, você vai saber que aquilo Tendo Sócrates como a grande referência na
representa um homem. Mas se eu te mostrar esse filosofia antiga, os historiadores consentiram em chamar
símbolo esse primeiro período filosófico de pré-socrático.
A política – Esse ponto é bastante importante
É de se ressaltar que essa convenção tem como
porque marca uma ruptura no modo de encarar a critério não apenas uma ordem cronológica, mas a linha
organização social. A pólis é um lugar onde os de investigação filosófica, pois ao tempo de Sócrates
homens decidem o seu próprio destino, e não ainda haviam pré-socráticos.
mais os deuses.
E esse governo dos homens só era possível Esses primeiros filósofos se preocuparam em
porque eles eram livres para criarem suas próprias tentar explicar a physis (natureza/mundo/universo) de
leis, que eram fruto do debate público, ou seja, da
palavra que era posta sob questionamento.
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uma forma racional (cosmologia), dando uma explicação Heráclito de Éfeso


diferente da dos mitos, que recorriam aos deuses. (535-475 a. C.), um dos filósofos
mais importantes desse período,
Diferentemente da explicação mítica que dizia atribuía ao fogo a origem das
que o universo havia sido criado do nada, para eles o coisas, já que para ele a
universo havia sido gerado de um princípio universal. E realidade/physis é uma eterna
descobrir essa arché seria a chave para entender todas as luta de contrários que tem esse
coisas. elemento como sua causa.
Eles acreditavam que a physis apesar de estar em Autor da famosa frase que caracteriza bem o seu
constante movimento (devir) possuía um elemento de pensamento: “Um homem não pode se banhar duas vezes no
permanência e que este seria o seu princípio originador, mesmo rio, porque na segunda vez o rio e o homem não serão os
seu fundamento, e explicaria a causa da mudança. mesmos.”
Dentre esses filósofos haviam os que acreditavam Para ele, o universo está em constante mudança,
que a arché era um único elemento, estes eram os tudo flui, tudo está em transformação constante. E isso é
monistas. Mais tardiamente, outros pré-socráticos assim porque todas as coisas possuem os oposto em
começaram a defender que eram vários, e ficaram constante guerra. O real é a mudança e a permanência é
conhecidos como pluralistas. ilusória.
Tales de Mileto (640-546 a. C.), Você já não é tão jovem quanto quando começou
que talvez tenha sido o primeiro a ler essas palavras, mas ainda é jovem, mas está
filósofo, e estava na lista dos sete envelhecendo, mas ainda é jovem, mas está
sábios da Grécia, acreditava que a envelhecendo, mas ainda é jovem, mas está
água era a origem de tudo. envelhecendo, mas ainda é jovem, mas está
envelhecendo.
Parmênides (510-470 a.
C.) de Eleia, rompe com os
Anaximandro (610-547 a. filósofos que o precederam na
C.) dizia que o princípio criador maneira de pensar o mundo. E
não poderia ser conhecido pelos por isso não se adequa a
sentidos, mas somente pelo classificação de monista ou
intelecto já que ele é o apeiron pluralista.
(indeterminado).
Ele afirmava que o
elemento de permanência, de
origem, de fundamento, das coisas/mundo (physis) não
pode ser encontrado na sua mutabilidade constante.
Anaxímenis (588-524 a. Melhor dizendo, não se pode encontrar o
C.) argumentava que o ar seria esse princípio (arché) imutável do universo na sua própria
princípio originador de tudo. mudança, ainda mais quando a investigação é conduzida
pelos sentidos.
Para ele a mudança seria apenas uma ilusão dos
sentidos, e o que é essencial nas coisas só pode ser
captado pelo pensamento. Por esse motivo, é que haviam
Pitágoras de Samos
tantas opiniões contrárias sobre o Ser das coisas, porque
(570-490 a. C.) creditava aos
os filósofos estavam trilhando um caminho errado que
números a origem de tudo, mas
só os levava à ilusão.
desde que entendidos como
harmonia e proporção. Ou seja, A mudança (devir) não existe, é uma ilusão dos
tudo na natureza é proporcional sentidos, Heráclito estava errado. “O Ser é e o não ser
e harmônico. não é”. O Ser é o Logos (razão), a permanência, é
imutável e sem contradições.

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Continuaremos a estudar os outros filósofos pré- Escolheram Sólon, um dos sete sábio da Grécia,
socráticos (pluralistas) quando adentrarmos no período que instituiu profundas reformas na sociedade. Dentre as
clássico, por que contextualizando-os socialmente quais podemos citar:
poderemos entender melhor suas teorias e a influência
delas em seu meio social.  Perdoou a dívida dos atenienses escravizados, e
acabou com a escravidão por dívidas;
 Limitou o tamanho da propriedade;
CAPÍTULO 2 – FILOSOFIA CLÁSSICA  Modificou o critério de classificação social, do
nascimento para a riqueza;
A maturação e desenvolvimento da filosofia  Com isso, modificou o critério para participação
clássica ocorre em Atenas devido a uma série de nos cargos públicos (magistraturas), permitindo
acontecimentos que passaremos a analisar a seguir. a participação dos comerciantes na política;
 Permitiu a participação de todos os atenienses na
É importante entendermos o contexto histórico Assembleia (Eclésia), mesmo o mais pobre;
para que as teorias filosóficas desse período possam fazer
 Criou a boulé, que era um conselho de 400
sentido, pois a Filosofia como construção humana está
membros escolhidos pela Eclésia, e que tinha a
limitada a seu tempo e contexto social, embora muitos
queria fazer parecer que não. função de criar projetos de leis para serem
votados por esta;
 Deu cidadania a todo aquele que contribuísse
com a pólis.
ATENAS EM QUESTÃO
Ficou decidido que, o que Sólon fizesse não
Atenas foi fundada pelos jônios na região da poderia ser modificado por 10 anos. Então, depois de
Ática. Inicialmente esteve sob o regime monárquico, e fazer essas reformas Sólon deixou Atenas, tanto para não
depois oligárquico. Era governada pelos Eupátridas perder sua vida, quanto para não usar de seu prestígio e
(bem nascidos), que além de possuírem as maiores e tornar-se um tirano.
melhores terras, ainda tinham como escravos outros
atenienses, que foram pequenos proprietários de terras Apesar de profundas, essas reformas trouxeram
que não conseguiram saldar suas dívidas. ainda mais tensões. E de toda insatisfação emergiu em
546 a. C. o primeiro tirano de Atenas, Pisístrato.
Sem um solo propício para agricultura, e com um
porto (Pireu) estrategicamente localizado no Nessa época o termo tirano não tinha toda a carga
Mediterrâneo, os Atenienses se lançaram ao mar. negativa que tem hoje, e designava apenas uma forma
Tornaram-se grandes marinheiros e desenvolveram o ilegítima de governo. Não é que o tirano fosse cruel e
comércio de forma significativa. mandasse cortar a cabeça de quem olhasse torto pra ele,
é que ele não chegou ao poder com o apoio dos que
O comércio enriqueceu muitos atenienses que detinham o poder.
não tinham o sangue azul dos eupátridas e estavam
doidos por participação política. A isso, some a Pisístrato foi até um bom governante, manteve
insatisfação dos escravizados por dívidas, dos inalteradas as leis de Sólon, construiu grandes obras,
potencialmente escravos, e ainda, rebeliões provocadas patrocinou as artes, os jogos e os festivais, e projetou
por estes. Pronto, o barril de pólvora estava cheio e Atenas como grande centro comercial e cultural da
prestes a explodir. Grécia.

Dracon em 620 a. C., tentou acalmar os ânimos Seus sucessores foram uns bocós e não souberam
tornando públicas por meio da escrita, as leis da pólis, se manter no poder, abrindo espaço novamente para
que antes eram conhecidas só pelos eupátridas. Não conflitos internos, quando Clístenes toma o poder em
adiantou muita coisa. 510 a. C.

Agora pasmem, em 594 a. C., os grupos


dominantes da época, decidiram eleger um homem sábio
para fazer reformas que pudessem colocar fim ao clima
de guerra que afligia a sociedade ateniense.

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Clístenes governou Inicialmente os recursos obtidos ficaram na ilha


Atenas de 510 a 507 a. C, e ousou de Delos (por isso o nome), mas com o tempo foram
muito ao dividir o território da transferidos para Atenas. Mesmo com o fim das ameaças
Ática em 10 tribos, e cada tribo externas a Liga permaneceu, e ninguém mais poderia dela
em 03 DEMOS. Com isso ele se desligar, pois Atenas logo interferia. O que antes não
queria acabar com a influência era obrigação, tornou-se submissão.
das tradicionais famílias
nobres aristocráticas. Dessa maneira, portanto, Atenas, sob a liderança
de um líder democrático, construiria com as riquezas dos
É claro que para ocupar cargos públicos ainda era outros a sua ERA DE OURO. Foi nessa época que a
necessário ter uma certa quantidade de riqueza, como cidade foi embelezada com grandes templos e obras
Sólon havia estipulado. Mas cada vez menos isso públicas. Só para se ter uma ideia, o Partenon, um dos
dependia da família a que se pertencia. maiores feitos de arquitetura da humanidade, foi erguido
nesta época.
A boulé (que criava projeto de lei) passou a ter
500 membros. Cada DEMO elegia 50, e cada tribo a
presidia sucessivamente durante o ano. Perceba o salto
qualitativo nesse regime de participação política que mais
tarde viária a ser chamado de DEMOCRACIA.
A Eclésia (assembleia popular) passou também a,
além de votar, discutir os projetos de lei. Provavelmente
a boulé tinha mais poderes que a Eclésia no início do
processo de construção desse novo regime, mas com o
tempo a situação se inverteu.
O OSTRACISMO foi uma instituição muito
famosa criada também por ele. Não era uma pena, mas
uma forma de defender o novo regime contra
levantes tirânicos. Se uma pessoa estava se tornando É inegável que toda a glória alcançada por Atenas
demasiadamente famosa, prestigiada, e influente, ela era teve como sustentação material a submissão das outras
banida da pólis por um período de 10 anos e depois póleis.
retornava como se nada tivesse acontecido.
No entanto, deve-se deixar bem claro que apesar
Pense bem. Num regime onde todos devem ser da relação dos atenienses com os outros fosse de
iguais, não deve haver essas grandes personalidades, hostilidade, entre eles, imperava os ideais mais nobres
senão, não haveria isonomia, que era a base do sistema. como igualdade, liberdade e justiça. Em virtude disso, a
As reformas de Clístenes no sistema político de forma de governo que tem por base esses ideais pôde
Atenas acabou influenciando toda a Grécia, e seu florescer em sua plenitude.
governo foi a transição entre o período arcaico e o Em Atenas o exercício da atividade política era
clássico. básico, algo comum na vida de seus habitantes. A
No período clássico (Sec. V ao IV a. C.), as participação na tomada de decisões dos assuntos que
Guerras Médicas (os medos faziam parte do povo Persa, dizem respeito à administração da pólis era a principal e
daí o nome) foram o pano de fundo para um maior mais nobre atividade que um homem livre poderia se
destaque de Atenas dentre todas as póleis gregas. Eles já dedicar.
estavam se sentido os maiorais por terem suas Foi nessa época que surgiu na cena política
instituições como modelo do que de melhor se poderia ateniense um grande orador, de família aristocrática, e
ter. Agora, iam colocar os músculos para trabalharem. excelente estrategista militar.
Diante dessas invasões as póleis gregas, Péricles (495 – 429 a.C.) liderou Atenas em seu
persuadidas por Atenas, fizeram uma aliança militar esplendor (não é à toa que esse século recebeu seu nome),
conhecida como Liga de Delos. Claro que isso tinha um quando na assembleia, juntamente com seus
custo, e que ninguém era obrigado a participar. No concidadãos, aprimorou o regime democrático a ponto
entanto, seria bom contar com uma certa segurança não de afirmar o seguinte em seu discurso fúnebre:
é mesmo?
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“Nosso regime político Para todos os cargo públicos uma pessoa só


não se propõe tomar como modelo as podia ser eleita uma única vez na vida, para dar
leis de outros: antes somos modelos oportunidade para outros participarem do poder. Na
que imitadores. Como tudo nesse boulé podia-se eleger duas vezes, e para estrategos podia
regime depende não de poucos, mas ser indefinidas vezes, isso por que esse cargo exigia
da maioria, seu nome é democracia. habilidades especiais de guerra.
Nela, enquanto no tocante às leis
todos são iguais para a solução de Somente podiam participar desses cargos os
suas divergências particulares, no homems filhos de pais atenienses maiores de 20 anos,
que se refere à atribuição de pois apenas eles eram considerados Zoôn politikons. Eram
honrarias o critério se baseia no membros de famílias aristocráticas, pequenos
mérito e não na categoria a que se proprietários de terras, comerciantes e artesãos.
pertence...”
Mas a sociedade ateniense não era formada
O primeiro cidadão ateniense instituiu a apenas por eles; haviam também os que eram excluidos
mistoforia, que era uma justa quantia em dinheiro para da cidadania. Nesse grupo temos os metecos, que eram
que mesmo o mais lascado dos homens livres pudesse os estrangeiros residentes ou não na pólis; as mulheres,
participar diretamente da administração da cidade. Agora, que serviam basicamente para cuidar da casa e
não precisava mais nem ser de família nobre, e nem ter reproduzir; e finalmente os escravos, que eram os
riqueza suficiente para ocupar determinado cargo. prisioneiros de guerra.

Tal salário era necessário porque esses gregos Não por coincidencia, os escravos começaram a
acreditavam que todos os cidadãos eram iguais aumentar quando a democracia estava em seu auge. Ora,
(isonomia) e por esta razão, tinham direito de se para haver tempo livre para os cidadãos se dedicarem à
expressar (isegoria) na assembleia, e de ter participação política alguem tinha que ficar trabalhando. Estimasse
no poder (isocracia). Para eles não havia outra maneira, que eles fossem ¼ da popolação, no máximo.
a única forma de DEMOCRACIA era a DIRETA.
Em Atenas não havia tratamento duro com os
Basicamente, a estrutura política estava escravos, não existiam pessoas acorrentadas andando
arquitetada da seguinte forma: pelas ruas, chicotadas e esquartejamentos em praça
pública. Pelo contrário, era muito comum os escravos
ASSEMBLÉIA – Conselho de cidadãos que serem libertados.
tomavam as decisões mais importantes da pólis. Eles se
reuniam no monte Pnyx (imagem abaixo). Claro que não Habitantes de outras póleis estranhavam quando
tinham essas cadeiras, mas olhe a vista que eles tinham da andavam nas ruas de Atenas e viam escravos andando na
acrópole. Imagine os atenienses tomando as decisões da rua como se fossem livres.
pólis com a vista das maravilhas que eles foram capazes
Nas fazendas e no mercado eles trabalhavam lado
de fazer. Era mesmo algo grandioso.
a lado com o seu senhor. Não há nenhum registro de
rebeliam de escravos em Atenas. A possibilidade de
conquista da liberdade que estava no horizonte,
abrandava a relação entre senhor e escravo.

OS PLURALISTAS
Nesse período a filosofia
continuou progredindo com os
filósofos pré-socrático. O próprio
Péricles tinha um desses sábios
como mestre, seu nome era
BOULÉ – Conselho de 500 cidadãos que Anaxágoras (499-428 a. C.). Ele
propunham as leis. defendia que o princípio gerador
de todas as coisas não é único, que
ESTRATEGO – 10 generais com mandatos de a physis era formada de várias partículas (sementes –
01 ano. espermatas) ordenadas por uma inteligência universal.

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Diferentemente dele, póleis vendendo seu conhecimento, pois não eram ricos
Empédocles (490-430 a. C.) para se manter no ócio intelectual.
acreditava que os elementos
água, terra, ar e fogo eram os Protágoras (480-410 a. C.) foi o primeiro e mais
princípios criadores, que ilustre dos sofistas. Nascido em Abdera, mudou-se para
formavam as coisas pela Atenas onde se tornou muito famoso e requisitado pelas
união e repulsão, pelo amor e famílias ricas.
ódio.
Defendia que não havia um conhecimento e uma
Demócrito (460-370 verdade absolutas sobre as coisas, e que o mundo era
a. C.) era contemporâneo de relativo ao que os homens percebiam dele. Daí sua
Sócrates, mas como o objeto famosa frase: “o homem é a medida de todas as coisas”.
de sua investigação ainda era
Sua doutrina relativista impossibilitava a
a physis, ele é considerado um
construção de um saber objetivo no qual se pudesse
pré-socrático.
chegar a critérios que estabelecessem e diferenciassem o
Segundo ele, o mundo verdadeiro do falso, o certo do errado. Tudo dependia de
é formado por partículas invisíveis e indivisíveis quem ou que grupo estava falando. As regras sociais, bem
chamadas átomos, que se chocavam ao acaso no vazio como a própria pólis são convenções, e como tal, mudam
para formar os corpos percebidos pelos nossos sentidos. de acordo com que as convencionou, sendo, portanto,
relativas.
Percebam que esses pré-socráticos do período
clássico, defendem não um, mas vários os elementos O maior crédito que se deve atribuir aos sofistas
criadores do universo. foi o de ter voltado o debate filosófico da cosmologia,
para a área do humano, da pólis, da ética, da política. Pois
Será coincidência eles defenderem isso no tempo foi por se contrapor a eles que Sócrates deu início ao
em que a constituição da pólis, ou seja, do mundo social, conhecimento filosófico herdado pelo ocidente.
dependesse de muitos e não de um só? Ou terá sido essa
forma de organização social fundamentada nessa nova
visão da constituição do universo?
SÓCRATES
Independentemente da resposta, o fato é que
Sócrates (470 – 399 a.
havia agora uma nova visão do mundo, seja ele físico ou
C.) foi um marco na filosofia
social, e em ambos não havia mais o predomínio de uma
grega. Não deixou nada escrito
arché que a tudo governava, mas, a relação entre vários
e o que sabemos de seu
elementos que regidos por leis constituíam o cosmos.
pensamento é o relatado por
No mundo da physis cabia aos homens seu discípulo Platão. Ele
descobrirem essas leis, no mundo da pólis cabia a eles nasceu em Atenas, foi
criarem-na. E essa atividade divina de criarem as leis, que contemporâneo de Péricles, e
trariam ordem ao caos, era feita no espaço público da crítico do regime democrático.
pólis, na ÁGORA (praça central onde se discutiam
Ele viveu na época da GUERRA DO
diversos assuntos), por meio da palavra, através do
PELOPONESO (431-404 a. C.), que foi motivada pela
discurso.
forma autoritária e abusiva com que Atenas tratava os
seus aliados.

SOFISTAS Um grupo de póleis cansada da tirania Ateniense,


sob a liderança de Esparta, formaram a Liga do
É também nesse contexto de valorização do Peloponeso, para enfrentá-la. Essa guerra foi o grande
humano, da palavra, de se expressar bem e de convencer motivo da decadência das póleis gregas, pois elas foram
o público por meio da oratória para se sair bem no se destruindo e abrindo espaço para que inimigos
cenário político, que surgiram os sofistas, um conjunto externos pudessem conquista-las.
de sábios que ensinavam retórica (arte de falar bem e
persuadir o público). Sócrátes participou de algumas batalhas, sendo
condecorado por bravura.
A palavra sofista vem do grego sophós e quer dizer
sábio. Eles eram homens que viviam viajando entre as
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O Oráculo de Delfos o celebrou como o mais perguntando: “será mesmo que vivemos uma
sábio dos homens por ele ter consciência de sua própria democracia, quando temos um regime político que
ignorância. permite a um bom orador ir à assembleia e fazer um
discurso bonito e pomposo que leve o povo a aprovar o
Ele travou um grande embate com os sofistas ao que ele quer sem o mínimo de reflexão?”, “será que é
dizer que estavam errados, que poderíamos sim obter um certo tratarmos nossos aliados com toda essa arrogância,
conhecimento objetivo, um saber verdadeiro. Sustentava e usando mais a força que a justiça em nossas relações?”,
que o homem poderia conhecer a essência das coisas e “será mesmo bom essa democracia onde qualquer um
que a primeira pergunta a ser respondida era qual a sua possa influir nos destinos da pólis, mesmo não tendo
própria essência. conhecimento do que seja bom e justo?”.
Para ele, a essência do homem é a sua alma, Entendem agora porque Sócrates era um perigo
entendida como consciência de si. É isso que distingue o a ser exterminado o mais rápido possível? Era um traidor,
homem dos outros animais. Não é à toa que ele instigava um corruptor da juventude.
seus discípulos a terem esse conhecimento, pois era isso
que os tornavam humanos. “Conhece-te a ti mesmo” A Guerra do Peloponeso durou 27 anos e
estava escrito no pórtico do oráculo que afirmou ser ele terminou com a vitória de Esparta, no entanto, acabou
o mais sábio dos homens. deixando as partes envolvidas enfraquecidas.
Mas essa consciência de si não era só o simples Desde a derrota de Atenas nessa guerra, o regime
saber de um eu individual. Era a consciência de que democrático ficou desacreditado pelos próprios
somos parte integrante de um conjunto de relações que ateniense, e muitos deles começaram a criticá-lo. Eles
formam um todo maior, e que por fazer parte desse todo argumentavam que em momentos cruciais da guerra,
é que temos o poder e o dever de conhecer sua essência. foram tomadas muitas decisões estúpidas por que foi
colocado para a maioria decidir, e isso levou à derrota de
Desse modo, temos o poder de ter essa Atenas.
consciência moral que nos guia na interação com nossos
semelhantes. Nessas relações só podemos agir O regime democrático ateniense foi substituído
conscientes se tivermos conhecimento da essência das por uma oligarquia comandada por 30 tiranos indicados
coisas, sejam elas o bem, a amizade, a virtude, ou até por Esparta. Nesse tempo ficou proibido o debate em
mesmo a democracia. público e o ensino de retórica. Mas, alguns anos depois a
democracia foi restaurada e Sócrates voltou a
O interessante é que Sócrates não trazia respostas importunar.
prontas. Por meio do diálogo, ele se posicionava como
um ignorante e começava a questionar as pessoas sobre Ele foi acusado e, por mais forte que fossem seus
o que eles pensavam saber, mostrando-lhes que nada argumentos de defesa, foi condenado, porque sua
sabiam, e que o que sabiam eram crenças que lhes foram condenação já era certa desde antes mesmo do
passadas como verdades sem nenhum tipo de reflexão julgamento começar. Bebeu cicuta mas não renunciou ao
crítica. E ao final, ele fazia a própria pessoa chegar à que disse. O cara era macho, que nem outro barbudo que
verdade. vocês ouvem falar desde criancinha.
Talvez se ele aparecesse com verdades prontas
não teria sido Sócrates, mas apenas mais um sabichão
metido a besta. No entanto, como ele fazia a pessoa ver PLATÃO
a verdade pro si própria, por meio da maiêutica, ele foi
Platão (427 – 347 a. C.) foi
o mais sábio dos homens e por isso um perigo para o
o maior discípulo de Sócrates, e
sistema.
era um homem de família
Ora, pensemos um pouco. No auge do aristocrática e influente na
imperialismo ateniense, quando eles eram tomados como política. Como todo jovem
modelos pelas outras pólis (como o próprio Péricles ateniense, era um entusiasta do
afirmou acima); quando eles tratavam seus “aliados” da regime democrático até conhecer
Liga de Delos como bem entendiam, usando os recursos seu mestre aos vinte anos de
da Liga para tornar Atenas a mais bela e poderosa pólis idade.
que já existira; quando eles estavam maravilhados com
Sob influência de Sócrates passou a ser também
seu regime político, que eles próprios criaram; vem um
crítico do regime, e depois de sua morte deixou de
cara e começa a botar caraminholas na cabeça dos jovens
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acreditar na possibilidade de uma vida justa e feliz. Platão afirma que somente pela dialética é
Deixou Atenas para fazer uma longa viagem, quando possível alcançar gradativamente o que é verdadeiro, e
voltou e fundou a Academia, onde pôde desenvolver suas passar das ilusões ao real. Importante deixar claro que a
teorias e repassá-las a seus vários discípulos. dialética Platônica é o que a etimologia da palavra sugere,
um diálogo crítico em busca da verdade que se passa do
Na busca de um conhecimento verdadeiro, senso comum ao conhecimento verdadeiro.
buscou um meio de contornar o beco sem saída deixado
por Heráclito e Parmênides. Grande parte de suas ideias Ele explica essa passagem do falso ao real pela
estão escritas em sua mais famosa obra, a República. alegoria do mito da caverna, ilustrada na figura abaixo.
Metafísica
O constante devir que Heráclito afirmava ser a
realidade foi chamado de mundo sensível (material)
por Platão. Esse mundo captado pelos sentidos, a causa
de nossos erros e ilusões, era uma cópia imperfeita do
mundo das ideias (inteligível), que correspondia à
permanência de Parmênides, um mundo captado apenas
pelo pensamento, e, portanto, perfeito.

Aqueles caras deitados no chão nasceram e


cresceram ali, e a única coisa que eles viam eram aquelas
sombras. Por nunca terem visto outra coisa, eles
julgavam que aquelas sombras eram os objetos
verdadeiros.
Só que um dia, um deles consegue se soltar e sair
da caverna. Lá fora, ele não consegue enxergar nada
Tudo que existe nesse mundo material é porque porque é quase cegado pela luz do sol. Aos poucos ele
tem sua ideia no mundo superior. Apesar da vai conseguindo ver as coisas e se dá conta que aquilo que
multiplicidade com que ela possa aparecer no mundo viam na caverna eram apenas as sombras, que eles
sensível, a ideia é uma só, indestrutível e eterna. Segundo tomavam por verdadeiro aquilo que era falso.
Platão, apesar de existirem Depois, ele volta para alertar os outros de sua
diferentes tipos de cavalo, a condição, mesmo sabendo que eles podem não acreditar
ideia de cavalo é uma só. no que ele estava dizendo. Alguns dizem que ele está
Quando pensamos em louco e outros decidem acompanhá-lo.
cavalo, pensamos a ideia e
não determinado cavalo. Política
Mas como foi que aconteceu essa cópia? Platão Platão não via a democracia como um bom
nos diz que foi um demiurgo (construtor) que plasmou regime, foi a democracia que matou o mais sábio dos
do mundo das ideias esse mundo imperfeito. Tudo que homens. E foi a democracia que levou Atenas à guerra e
existe nesse mundo em que vivemos, já existe no mundo à ruía. Como é que pessoas não instruídas sobre valores
superior das ideias. como o bem comum, amizade, virtudes, justiça, podem
governar? Já imaginou dar poder de governar àqueles
Seguindo esse raciocínio, a pólis deveria ser caras acorrentados na caverna que só veem sombras?
organizada de acordo com a pólis ideal, para que seus Seria um desastre. Como de fato foi.
cidadãos pudessem viver de acordo com o supremo bem
e a justiça. Por isso que ele defende que quem deve governar
a cidade são os filósofos, aqueles que saíram da caverna
Mas como fazer isso? Como conhecer esse (mundo sensível) e conheceram a realidade (mundo das
mundo ideal e verdadeiro para viver de acordo com o que ideias). Só eles possuem as virtudes e o conhecimento
é bom e justo nesse mundo de erros, se eu estou nesse necessário (as ideias) para dar à pólis uma estrutura bem
segundo e tudo que percebo vem dele? ordenada de forma que o bem e a justiça possam reger as
relações entre seus cidadãos.
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Esses filósofos não pertenceriam a classe social porta-voz dos gregos instruídos, pois era assim que ele se
alguma. Em, A República, ele apresenta um processo de considerava.
educação que começa aos 07 e vai até os 30 anos, sendo
que todos participam, independente da classe social e do Apesar de ter sido um dos maiores pensadores
sexo. Isso mesmo, Platão defendia que as mulheres que Atenas produziu, ele era um meteco, e como tal, sem
poderiam ser educadas para participar da vida pública. direitos políticos.

Platão entendia o homem como sendo corpo e De Estagira, na Macedônia, Aristóteles sai aos 18
alma. Esta, que antes era livre no mundo das ideias, anos para estudar na Academia de Platão em Atenas.
agora vive prisioneira no corpo, esquecendo-se de tudo Isso, provavelmente, uns 10 anos antes do domínio
que já havia contemplado. Ela seria composta por três macedônico sobre a Grécia. Com uma mente notável,
partes: a racional, representada pela inteligência; a permanece por lá durante 20 anos até a morte de Platão.
emotiva, representada pelas emoções; e a apetitiva,
Após a morte do mestre, a quem Aristóteles era
representada pelos desejos carnais de sobrevivência e
muito amigo e admirador, não vê mais motivos de
reprodução. Se livrar das emoções e desejos carnais era
continuar na academia e sai de Atenas para viajar por um
necessário para contemplar o mundo das ideias, porque
bom tempo.
eles não fazem parte daquele mundo.
Em 335 a. c., o rei Felipe II o chama para morar
Esse processo educacional, serviria para fazer a
em Pela, capital do império macedônico, e ser professor
alma atingir o mundo das ideias, ou seja, relembrar
de seu filho Alexandre, condição na qual permaneceu até
(processo de reminiscência da alma) do lugar de onde
este assumir o poder. Essa proximidade com a corte
veio. Por isso, só completariam todo o percurso
macedônica se dava pelo fato de Nicômaco, seu pai, ter
educacional aqueles que adquirissem e exercitassem as
sido o médico do rei Amintas, pai de Felipe.
virtudes necessárias a fazer com que a parte racional de
sua alma se sobrepusesse acima das partes emotiva e Aristóteles foi um grande pensador sistemático,
apetitiva que o deixa preso nesse mundo de aparências. que dividiu os saberes em:
Somente esses seriam filósofos.
Produtivos – que se destinam a produção das
Em uma pólis bem ordenada os seus habitantes coisas que são úteis aos homens. Ex: artes, arquitetura,
seriam divididos em três grupos, de acordo com suas carpintaria, etc.
virtudes, assim como a alma. Os que cuidam da
subsistência (agricultores, comerciantes, artesão, etc), os Práticos - que tratam das práticas que os homens
que a defendem (guerreiros), e os que a governam (os mantem entre si. Ex: política, ética, economia, etc.
filósofos). Cada um, ao exercitar suas virtudes,
desempenha um papel na sociedade, contribuindo como Teóricos – dispõem sobre os conhecimentos
podem para o seu bom funcionamento. contemplativos da realidade, das coisas que existem
independentes do homem. Ex: física, matemática,
astronomia, etc.

ARISTÓTELES Metafísica

Juntamente com Platão, Segundo ele, enquanto os saberes particulares


Aristóteles (384 – 322 a. C.) é a refletem sobre os seres particulares sujeitos ao
grande referência da filosofia movimento (devir), existe um saber que reflete sobre
grega antiga que vai influenciar todos esses seres em conjunto, que estuda o que há de
na construção do mundo comum a todos eles, e que os estruturam em um todo
ocidental. Dante Alighieri dizia organizado.
que ele foi o mestre dos
mestres, e São Tomaz de Esse saber ele chamou de Filosofia Primeira, que
Aquino se referia a ele como mais tarde ficou conhecida como Metafísica (meta +
“o” filósofo. físico = além do físico). É ela que analisa os princípios e
a essência última do mundo, do universal, contida em
Ele foi o pensador que analisou todo o todos os seres. É ela que diz se o objeto (esse mundo que
pensamento grego e o melhorou; escreveu sobre quase nos rodeia) dos saberes particulares é real e verdadeiro.
tudo, de metafísica à biologia. Em resumo, ele foi “o
cara”. Por isso, devemos estudar Aristóteles como o Na sua investigação do que seja a realidade, afim
de fundar um conhecimento verdadeiro das coisas,
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Aristóteles superou Heráclito, Parmênides, e deu uma Esse conhecimento se dá, segundo ele, quando
resposta diferente da de Platão, criticando a posição de investigamos vários particulares até abstrairmos uma
seu mestre. essência comum a todos, na qual podemos generalizar
através do conceito geral/universal. Esse método de ir do
Para ele, esse mundo material que nos envolve e particular ao geral é a indução.
que é mutável, não é uma ilusão ou cópia imperfeita de
algo (Parmênides e Platão), mas também não é toda a Para Aristóteles, os seres se diferenciam pela
realidade (Heráclito). quantidade de movimento a que estão sujeitos, e a
depender dessa quantidade existe um conhecimento
A mudança não é algo que torne as coisas próprio ao seu estudo.
ilusórias ou imperfeitas, mas é na realidade a sua essência.
E se Parmênides e Platão dizem que não dá para De acordo com a metafísica aristotélica, todo ser
construir um conhecimento verdadeiro sobre ela, físico possui uma matéria de que é feito e uma forma que
Aristóteles afirma que eles estão errados, que dá para o individualiza. Essa matéria possui a capacidade de se
obter um conhecimento verdadeiro desse mundo, esse tornar algo diferente, de assumir outra forma,
conhecimento é a Física. atualizando-se. E é o movimento que lhe é inerente,
essencial, que faz acontecer essa mudança.
Crítico do dualismo platônico, ele não acreditava
que deveríamos conhecer primeiro um mundo intelectual Desse modo, os conceitos que Aristóteles
para só assim conhecermos o mundo material. desenvolveu em sua metafísica para entender a realidade
Aristóteles voltou a investigação filosófica para a matéria são:
afirmando que o ser (o real/inteligível) encontra-se nela,
na matéria, e que a possibilidade de compreensão e Matéria – é aquilo do que o ser é feito.
apreensão do real (ser) deve-se dar a partir dela. Essa
Forma – é o que o individualiza, tornando-o o
discordância com Platão ficou bem retratada na obra do
que ele é.
renascentista Rafael Sanzio.
Potência – é capacidade/possibilidade que a
matéria tem de mudar.
Ato – é a forma que ele está assumindo agora.
Substância – é a essência do ser, aquilo que o faz
ser o que é.
Acidente – são as características não essenciais
do ser, que, caso ele tenha ou não, não o impede de ser o
que ele é. Exemplo: grande/pequeno, amarelo/azul,
leve/pesado, etc.
Mas quais são as causas dessa mudança, do
movimento. Aristóteles diz que são quatro, a saber:
Causa material – refere-se à sua matéria. Uma
pedra nunca vai ser um homem adulto
Ele acreditava que existe uma ordem
(inteligência) regendo todos os seres (matéria). Cada Causa eficiente/motora – refere-se àquilo que
objeto que existe possui essa ordem dentro de si, que o age sobre a matéria para que ela adquira outra forma.
constitui, que o faz ser como ele é, e que pode fazer ele
se tornar algo melhor, sempre almejando uma finalidade. Causa formal – refere-se àquilo que a matéria
Ou seja, o inteligível está nas coisas e não separado tende a se tornar.
dela em um mundo exterior.
Causa final – refere-se ao propósito ao qual a
O que faz cada ser, ser o que é, Aristóteles matéria sofreu todo o movimento para se tornar o que é.
denominou de Substância/essência, e pelo fato do
Lembre-se sempre que no pensamento
homem ser dotado de consciência (racional), ele pode
conhecer a essência/substância das coisas. aristotélico, TODAS as coisas tem uma finalidade, tudo
tem um propósito e uma função. A causa final é a causa
mais importante de todas, é a inteligência (o logos)
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ordenando o mundo, e todos os seres estão sujeitos a ela, que dentre as formas corrompidas de governo, a
sejam eles animados ou inanimados. Tudo tem seu democracia é a melhor.
propósito e fim. Por essa razão é que o pensamento
aristotélico é chamando de teleológico (telos + lógico = Para compreendermos bem o pensamento
fim ordenado). aristotélico sobre a política e a ética é importantíssimo
sabermos que ele não entendia as duas separadamente.
E quando ele investiga a causa das causa ele se Isso porque ele, assim como os gregos instruidos, não
depara com o princípio causador de todas as causas, qual entendia um modo de ser, um comportamento do
seja, o Primeiro Motor Imóvel. Ele é ato puro, não sujeito ánthropos (homem) que não fosse o mesmo do zoôn
a nenhum tipo de movimento, é o incausado que é a politikon (animal político). Ser homem para ele era ser
causa de todas as causas. cidadão.
Política Tanto é que a palavra ética vem de ethos que de
forma abrangente quer dizer modo de ser, e a palavra
Assim como o próprio Platão percebeu mais política vem de polis + ética, ou seja, o modo de ser da
tarde que seu projeto de funcionamento de uma pólis pólis. Não existe comportamento racional/inteligível que
ideal governada por reis filósofos não era viável, não seja dentro da pólis.
Aristóteles também sabia que esse projeto nunca daria
certo. Segundo ele, um homem que não vivesse em
comunidade, ou era um deus, ou uma fera. E se vivesse
Tendo isso em mente, ele elaborou um projeto em comunidade que não fosse uma pólis, seria inferior.
político que fosse viável, e desenvolveu uma política para Por isso que um estrangeiro era inferior a um grego e era
o homem comum. Mas não entenda esse homem como legítimo que ele fosse escravizado. Por isso, Aristóteles
qualquer um. É o homem bem instruído, e de condenava a escravidão entre homens livres, por ser
determinadas posses, que o permitisse ter ócio suficiente contrário à natureza das coisas.
para se voltar aos estudos e à política.
Aí você pode pensar, mas não é todo mundo
Nessa linha de raciocínio, a polis que esse homem gente do mesmo jeito? Nananinanan, não. Vamos botar
habitaria seria a melhor possível. Ela teria sua os pingos nos ís. Aristóteles tinha em mente que todos
constituição como sendo um reflexo desse tipo de nós, gregos ou não, somos zoôn (animais), mas apenas os
homem. E como seria essa polis? que vivem numa comunidade política, numa pólis, são
zoôn polítikon, são ánthropos (ανθρώπου).
Para dar essa resposta, Aristóteles analisou 158
constituições diferentes, e definiu os tipos possíveis de Ora, nós vimos acima que o pensamento racional
governo conforme o quadro abaixo: surgiu com a pólis. A racionalidade, que é uma descoberta
grega, que era, portanto, grega, é uma racionalidade
BOM RUIM política, no sentido de comunitária, e o que faz o ánthropos
(homem) ser superior aos outros animais é justamente
UM MONARQUIA TIRANIA isso, ser racional. Mas ele só pode ser racional se fizer
parte dessa comunidade política que é a pólis, pois
somente nela, ele pode desenvolver a sua natureza
POUCOS ARISTOCRACIA OLIGARQUIA racional. E se é assim, a pólis também é algo natural ao
homem.
MUITOS REPÚBLICA DEMOCRACIA
As leis que regem a pólis são criações da palavra
(logos/razão), que não é mais ditada pelos deuses a um
sacerdote que a transmite aos homens. Ela é
A corrupção de um regime a outro, acontece
genuinamente humana, fruto do debate, da dialética,
quando quem governa se desvia do objetivo de atingir o
expressão do logos (razão) que organiza a pólis e reina
bem comum, e passa a governar de acordo com seus
sobre os homens, não todos os homens, mas sobre os
interesses.
gregos.
Quanto à melhor forma de governo, Aristóteles
É essa palavra (logos) que é o conhecimento do
diz que vai depender do tipo de povo. Segundo ele, existe
que é útil, do bem e do mal, do justo e do injusto; e viver
uma disposição natural em cada povo que o torna
de acordo com a justiça é viver a boa vida, permitida
propício a determinada forma de governo.
apenas na pólis. É isso que faz de um grego, um zoôn
Particularmente, ele prefere a monarquia, e argumenta

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(animal) politikon (superior), e somente este é ánthropos 323 a. C.) de apenas 18 anos, assume o poder e conquista
(ανθρώπου). os grandes domínios do Império Persa, expandindo o
poderio macedônico até a Índia.
Repito, tudo isso de que estamos falando foi
construído por eles, por isso, não é obra do homem em Alexandre foi
geral, mas dos gregos em particular. Aristóteles está educado nos costumes
falando para os gregos, ele está ensinando a eles, e não a gregos, teve Aristóteles como
todos os homens do planeta. E por que não? seu professor, e espalhou a
cultura grega por um
Por que ele acreditava que só os gregos eram vastíssimo território. A
capazes de entender o que ele estava dizendo, e é aqui expansão e mistura da cultura
que reside o preconceito que não é só de Aristóteles, mas grega com a dos povos
dos gregos em geral. orientais originou o que foi
conhecido de Helenismo.
Ética
Seu império não resistiu à sua morte, foi dividido
Como viver essa boa vida, que só era possível
entre seus generais, e foi conquistado pelos romanos. No
participando da pólis? Aristóteles deixou essa resposta
entanto, as cidades fundadas por ele continuaram
em sua obra Ética a Nicômaco. Como já vimos, ele
transmitindo a cultura grega pra diversos povos ao longo
concebia que tudo tem um fim, e não seria diferente com
de séculos. Como exemplo, podemos citar Alexandria no
as ações humanas, que devem ser realizadas objetivando
Egito, Pérgamo na Ásia Menor, e a Ilha de Rodes no Mar
atingir o bem supremo que é a eudaimonia, comumente
Egeu.
traduzida por felicidade.
Alexandria foi a que mais se destacou ao possuir
Não devemos entender essa felicidade como uma
a maior biblioteca do mundo de sua época, e por ter
emoção que temos quando algo bom nos acontece. Ela
formado uma escola com grandes pensadores.
está mais para um estado de plenitude, uma forma de
viver plena, voltada para o bem, para o saber, para a Abaixo, mapa indicando o tamanho da expansão
justiça, no aperfeiçoamento constante do caráter. E viver do Império Macedônico.
dessa forma não é possível sem as virtudes.
As virtudes são as qualidades do caráter que
nos permitem conseguir os bens necessários
(materiais e imateriais) para viver plenamente, ou seja,
ter uma vida feliz. E a principal delas é a phronesis, a
nossa conhecida prudência.
Ela é a sabedoria, o saber prático necessário, a
chave da felicidade, para viver moderadamente. É a
prudência que nos permite viver sem exageros e nem
deficiências, ou seja, no meio termo. É essa virtude que
nos permite saber como agir moderadamente em cada
situação particular.

CAPÍTULO 3 – FILOSOFIA HELENISTICA


CONTEXTO HISTÓRICO - ALEXANDRE O Alexandre com suas expansão promove
GRANDE gradualmente a queda da pólis. Ele dá início ao primeiro
projeto de globalização, com a convivência de povos de
Enfraquecidos pela Guerra do Peloponeso, os diferentes costumes vivendo sob um mesmo território e
gregos não resistiram ao ataque macedônico na domínio.
BATALHA DE QUERONEIA (338 a. C.) e
sucumbiram diante do rei Felipe II. Esse novo mundo que Alexandre estava criando
requeria um novo homem, que deixaria de ser um
O domínio macedônico não ficou só na Grécia. cidadão da pólis para ser um cidadão do mundo, da
Com a morte do rei Felipe II, seu filho Alexandre (336 – cosmopólis, ou seja, um cosmopolita.

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Dessa maneira, todo aquele corpo teórico Cinismo


sustentado pelos filósofos gregos, que concebia a pólis
como sendo o único lugar onde o homem poderia Figura emblemática do cinismo é Diógines de
exercitar suas virtudes e fazer florescer suas Sínope (400-325 a. C.), mais conhecido como Diógines o
potencialidades, foi perdendo sentido, pois a pólis estava cão. Ele viveu em Atenas de acordo com o que
deixando de existir em seu formato original. acreditava, morando em um barril e comendo apenas o
os outros lhe davam, pois o cinismo pregava que as
Essas mudanças na forma de ver o mundo pessoas deveriam viver da forma mais simples possível,
colocava novas questões que não podiam ser respondidas como um cão, desprezando todas as convenções sociais.
pelos escritos filosóficos já existentes.
Tudo que era natural deveria ser feito aos olhos
É nesse contexto que surgem novas correntes de de todos, e considerava coisas tolas a riqueza, fama,
pensamento filosóficas, como respostas às novas poder, e honras.
questões postas por essas transformações.
Em busca de uma pessoa que não fosse corrupta,
Epicurismo ele andava com uma lanterna interpelando a todos que
encontrava.
Fundada por Epicuro (341 – 271 a. C), o
epicurismo ensinava que os homens devem se libertar Certa vez o imperador Alexandre foi ao seu
dos medos e viver uma vida voltada para os simples encontro e disse que lhe daria qualquer coisa que ele
prazeres (hedonismo), como beber quando se tem sede, pedisse, quando então, Diógenes pediu apenas que eles
comer quando se tem fome, aproveitar a presença dos saísse da frente do sol, pois estava impedindo-o de
amigos e familiares. Tudo com moderação. receber sua luminosidade.
Estes prazeres seriam entendidos como a
superação dos desejos estimulados em sociedade, como QUESTÕES
a busca por fama, riqueza e poder. A felicidade seria,
portanto, essa libertação dos desejos e prazeres, com o 1. (2012)
objetivo de se levar uma vida serena e simples, própria de TEXTO I
um sábio. Anaxímenes de Mileto disse que o ar é o elemento
originário de tudo o que existe, existiu e existirá, e que
Estoicismo outras coisas provêm de sua descendência. Quando o ar
se dilata, transforma-se em fogo, ao passo que os ventos
Outra doutrina foi a de Zenão de Cício (336 –
são ar condensado. As nuvens formam-se a partir do ar
263 a. C.), que ficou conhecida por estoicismo. Segundo
por feltragem e, ainda mais condensadas, transformam-
ela, o homem deveria viver indiferente aos problemas da
se em água. A água, quando mais condensada,
vida. Teria que desprezar totalmente qualquer tipo de
transforma-se em terra, e quando condensada ao máximo
prazer, pois os entendia como a causa dos males.
possível, transforma-se em pedras.
BURNET, J. A aurora da filosofia grega . Rio de
Para esse filósofo, o homem deveria dedicar-se Janeiro: PUC-Rio, 2006 (adaptado).
apenas à sabedoria sobre a ordem do cosmo para viver
de acordo com ele, pois o homem não pertence a lugar TEXTO II
nenhum, mas ao mundo. Basílio Magno, filósofo medieval, escreveu:
“Deus, como criador de todas as coisas, está no princípio
Ceticismo do mundo e dos tempos. Quão parcas de conteúdo se
Pirro de Élida (360-270 a.C.) foi o maior nome nos apresentam, em face desta concepção, as
dessa corrente filosófica. Ele tirou suas conclusões especulações contraditórias dos filósofos, para os quais o
depois de participar das expedições de Alexandre o mundo se origina, ou de algum dos quatro elementos,
Grande, onde percebeu, ao ter contato com diversas como ensinam os Jônios, ou dos átomos, como julga
culturas, que não há como se ter conhecimento do que Demócrito. Na verdade, dão impressão de quererem
seja verdadeiro ou falso, e que a maior sabedoria que o ancorar o mundo numa teia de aranha.”
GILSON, E.: BOEHNER, P. Historia da
homem poderia alcançar é a aceitação desse fato. E negar Filosofia Crista. São Paulo: Vozes, 1991 (adaptado).
isso é a causa de todos os males e infelicidades.
Filósofos dos diversos tempos históricos desenvolveram
teses para explicar a origem do universo, a partir de uma
explicação racional. As teses de Anaxímenes, filósofo

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grego antigo, e de Basílio, filósofo medieval, têm em No centro da imagem o filósofo Platão é retratado
comum na sua fundamentação teorias que apontando para o alto. Esse gesto significa que o
conhecimento se encontra em uma instância na qual o
a) eram baseadas nas ciências da natureza. homem descobre a
b) refutavam as teorias de filósofos da religião.
c) tinham origem nos mitos das civilizações antigas. A) suspensão do juízo como reveladora da verdade.
d) postulavam um princípio originário para o mundo. B) realidade inteligível por meio do método dialético.
e) defendiam que Deus é o princípio de todas as coisas. C) salvação da condição mortal pelo poder de Deus.
D) essências das coisas sensíveis no intelecto divino.
E) ordem intrínseca ao mundo por meio da sensibilidade.
2. (2012) Para Platão, o que havia de verdadeiro em
Parmênides era que o objeto de conhecimento é um objeto
de razão e não de sensação, e era preciso estabelecer uma 4. (2009.2) Segundo Aristóteles, “na cidade com o
relação entre objeto racional e objeto sensível ou material melhor conjunto de normas e naquela dotada de homens
que privilegiasse o primeiro em detrimento do segundo. absolutamente justos, os cidadãos não devem viver uma
Lenta, mas irresistivelmente, a Doutrina das Ideias vida de trabalho trivial ou de negócios — esses tipos de
formava-se em sua mente. vida são desprezíveis e incompatíveis com as qualidades
ZINGANO, M. Platão e Aristóteles: o fascínio da
filosofia. São Paulo: Odysseus, 2012 (adaptado). morais —, tampouco devem ser agricultores os
aspirantes a cidadania, pois o lazer é indispensável ao
O texto faz referência à relação entre razão e sensação, desenvolvimento das qualidades morais e a pratica das
um aspecto essencial da Doutrina das Ideias de Platão atividades políticas”.
VAN ACKER, T. Grécia. A vida cotidiana na
(427 a.C.-346 a.C.). De acordo com o texto, como Platão cidade-Estado. São Paulo: Atual, 1994.
se situa diante dessa relação?
O trecho, retirado da obra Política, de Aristóteles,
A) Estabelecendo um abismo intransponível entre as permite compreender que a cidadania
duas.
B) Privilegiando os sentidos e subordinando o A) possui uma dimensão histórica que deve ser criticada,
conhecimento a eles. pois é condenável que os políticos de qualquer época
C) Atendo-se à posição de Parmênides de que razão e fiquem entregues a ociosidade, enquanto o resto dos
sensação são inseparáveis. cidadãos tem de trabalhar.
D) Afirmando que a razão é capaz de gerar B) era entendida como uma dignidade própria dos grupos
conhecimento, mas a sensação não. sociais superiores, fruto de uma concepção política
E) Rejeitando a posição de Parmênides de que a sensação profundamente hierarquizada da sociedade.
é superior à razão. C) estava vinculada, na Grécia Antiga, a uma percepção
política democrática, que levava todos os habitantes da
3. (2014)
pólis a participarem da vida cívica.
D) tinha profundas conexões com a justiça, razão pela
qual o tempo livre dos cidadãos deveria ser dedicado as
atividades vinculadas aos tribunais.
E) vivida pelos atenienses era, de fato, restrita aqueles que
se dedicavam a política e que tinham tempo para resolver
os problemas da cidade.

5. (2013) A felicidade é, portanto, a melhor, a mais nobre


e a mais aprazível coisa do mundo, e esses atributos não
devem estar separados como na inscrição existente em
Delfos “das coisas, a mais nobre é a mais justa, e a melhor
é a saúde; porém a mais doce é ter o que amamos”. Todos
estes atributos estão presentes nas mais excelentes
atividades, e entre essas a melhor, nós a identificamos
como felicidade.
ARISTOTELES. A Politica. São Paulo: Cia das Letras, 2010.

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Ao reconhecer na felicidade a reunião dos mais No fragmento da obra filosófica de Epicuro, o homem
excelentes atributos, Aristóteles a identifica como tem como fim
a) busca por bens materiais e títulos de nobreza.
b) plenitude espiritual e ascese pessoal. A) alcançar o prazer moderado e a felicidade.
c) finalidade das ações e condutas humanas. B) valorizar os deveres e as obrigações sociais.
d) conhecimento de verdades imutáveis e perfeitas. C) aceitar o sofrimento e o rigorismo da vida com
e) expressão do sucesso individual e reconhecimento resignação.
público. D) refletir sobre os valores e as normas dadas pela
divindade.
E) defender a indiferença e a impossibilidade de se atingir
6. (2014)
o saber.
TEXTO I
Olhamos o homem alheio às atividades públicas
8. (2014) Compreende-se assim o alcance de uma
não como alguém que cuida apenas de seus próprios
reivindicação que surge desde o nascimento da cidade na
interesse, mas como um inútil; nós, cidadãos atenienses,
Grécia antiga: a redação das leis. Ao escrevê-las, não se
decidimos as questões públicas por nós mesmos na faz mais que assegurar-lhes permanência e fixidez. As leis
crença de que não é o debate que é o empecilho para à
tornam-se bem comum, regra geral, suscetível de ser
ação, e sim o fato de não se estar esclarecido pelo debate
aplicada a todos da mesma maneira.
antes de chegar a hora da ação.
VERNANT, J. P. As origens do pensamento grego. Rio de Janeiro: Bertrand
TUCÍDIDES. História da guerra do Peloponeso. Brasília: UnB, 1987 (adaptado). Brasil, 1992 (adaptado).

Para o autor, a reivindicação atendida na Grécia antiga,


TEXTO II ainda vigente no mundo contemporâneo, buscava
Um cidadão integral pode ser definido por nada garantir o seguinte princípio:
mais anda menos que pelo direito de administrar justiça
e exercer funções públicas; algumas destas, todavia, são A) Isonomia – igualdade de tratamento aos cidadãos.
limitadas quanto ao tempo de exercício, de tal modo que B) Transparência – acesso às informações
não podem de forma alguma ser exercidas duas vezes governamentais.
pela mesma pessoa, ou somente podem sê-lo depois de C) Tripartição – separação entre os poderes políticos
certos intervalos de tempo prefixados. estatais.
D) Equiparação – Igualdade de gênero na participação
ARISTÓTELES. Política. Brasília: UnB, 1985. política.
E) Elegibilidade – permissão para candidatura aos cargos
Comparando os textos I e II, tanto para Tucidides (no públicos.
século V a.C.) quanto para Aristóteles (no século IV a.C.),
a cidadania era definida pelo(a)

A) prestígio social.
B) acúmulo de riqueza.
C) participação política.
D) local de nascimento.
E) grupo de parentesco.

7. (2014) Alguns dos desejos são naturais e necessários;


outros, naturais e não necessários; outros, nem naturais
nem necessários, mas nascidos de vã opinião. Os desejos
que não nos trazem dor se não satisfeitos não são
necessários, mas o seu impulso pode ser facilmente
desfeito, quando é difícil obter sua satisfação ou parecem
geradores de dano.
EPICURO DE SAMOS. Doutrinas principais. In: SANSON, V.F. Textos de
filosofia. Rio de Janeiro: Eduff, 1974.

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UNIDADE 2 – FILOSOFIA MEDIEVAL Depois de passar por uma


grande crise existencial na qual se
perguntava pelo sentido da vida,
Agostinho (354 – 430) se converteu
CONTEXTO HISTÓRICO – A QUEDA DE
ao cristianismo e passou a ser um
ROMA
grande pregador. Essa crise está
Antes da queda, numa tentativa desesperada de descrita em sua obra autobiográfica
salvar o Império Romano, em 380 o imperador Teodósio As Confissões.
torna o cristianismo, que já era a seita religiosa com o
Ele acreditava e pregava que o homem bom é
maior número de seguidores, a religião oficial.
aquele voltado para o seu interior na procura de Deus e
O Império caiu, mas a Igreja Católica (do grego em busca de sua salvação, pois já nascera desgraçado,
καθολικος /katholikos = universal) Apostólica, e agora, fruto do pecado original de Adão e Eva.
Romana emergiu e se tornou a maior instituição do Não via como antagônicas fé e razão, mas
mundo (até hoje). afirmava que para se compreender era necessário crer,
Em um cenário de fragmentação, a Igreja surgia subordinando, portanto, a razão à fé.
como um elemento de união, crescendo no vácuo que foi Apropriou-se de muitos elementos da filosofia
deixado pelo desaparecimento do império. Ponte entre o platônica para fundamentar sua explicação da doutrina
homem e Deus, ela teria a última palavra (a única) sobre cristã. Muitos autores afirmam que Santo Agostinho
como deveria ser a vida de seu rebanho e sobre o que era cristianizou Platão.
o bem e o mal, o certo e o errado, o justo e o injusto.
Seria, portanto, a dona da mente e, por conseguinte, dos Assim como Platão julgava o intelecto superior à
corpos das pessoas. matéria, Santo Agostinho pregava a superioridade da
alma ante o corpo, e sendo a alma um presente de Deus,
Poderosa não apenas do ponto de vista espiritual, devíamos nos voltar inteiramente à Ele.
mas também político, ninguém melhor do que ela para
dizer como Deus queria que a sociedade fosse Contemporâneo do declínio do Império
organizada, legitimando assim, uma sociedade Romano, Agostinho respondeu à acusação de que fora o
hierarquizada, desigual e sem mobilidade social. cristianismo o culpado pela queda, e pôs a culpa no
Definida pelo critério de sangue, quem nascia nobre paganismo.
morria nobre, quem nascia servo, morria servo.
Sua resposta veio na obra Cidade de Deus,
Por esses tempos o pensamento filosófico entrou onde, segundo ele, há a cidade espiritual de Deus e a
de férias, pois os homes letrados, com raras exceções, cidade material dos homens. Elas não coexistem
eram os sacerdotes da igreja. Eles centralizaram o ensino separadamente, mas no plano de nossa existência a
em torno de si nos mosteiros, e posteriormente nas depender de nossa vontade de viver uma vida de pecado
universidades. Desenvolveram o pensamento teológico, na cidade terrena dos homens, ou se voltar para deus e
no entanto, não conseguiram fugir do estudo dos grandes viver em sua graça como um de seus servos.
filósofos.
Percebam que a boa vida não é mais aquela
Nesse período inicial de expansão da doutrina voltada para o desenvolvimento da racionalidade humana
católica, os sábios da igreja tinham que deixar a fé cristã dentro de uma comunidade política, cujo Bem era
bem palatável aos olhos das classes mais cultas que encontrado por meio da razão e ensinado por meio de
conheciam bem os textos filosóficos. Esse movimento um processo educacional virtuoso, como teorizaram os
ficou conhecido como PATRÍSTICA por ter sido gregos.
protagonizado pelos padres, e teve como seu principal
expoente o africano Aureliano Agostinho. Agora, o conhecimento do bem não dependia
mais de uma instrução racional, mas apenas da vontade
individual de cada um, por meio do livre-arbítrio, de
viver uma vida voltada para Deus. E a compreensão de
CAPÍTULO 4 - A PATRÍSTICA E SANTO como vivê-la é obra da graça divina que ilumina o
AGOSTINHO coração de quem estiver aberto para isso.
O primeiro grande doutor da igreja foi o cara
mais cachaceiro e raparigueiro que existia na cidade de
Tagaste, uma província romana no norte da África.
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Mas quem dizia o que era ter uma vida voltada 2. Causa eficiente – não podendo ser causa de
para Deus? E ainda, quais pessoas viviam dessa maneira? sua própria existência, os seres tiveram uma
Um xero no olho para quem respondeu: a Igreja. causa primeira que é Deus.
3. Contingente e necessário – sendo os seres
Mas aí meu amigo, deu no que deu. contingentes, isto é, não podendo ser eles a
causa de sua própria existência, existe algo
necessário, que é a causa da existência de
CAPÍTULO 5 - A ESCOLÁSTICA E SÃO TOMÁS todas as coisas.
DE AQUINO 4. Graus de perfeição – os seres existem em
graus diferentes de perfeição, mas somente
No século VIII, o imperador franco Carlos Deus é a perfeição máxima.
Magno começou a estimular e difundir o ensino ao 5. Causa final – para que haja ordem, tudo no
construir escolas que seriam dirigidas pela Igreja, mundo tem uma finalidade, tem um
retirando dos mosteiros o monopólio do ensino. propósito, seja uma pedra ou o homem. E o
que rege a finalidade de tudo é Deus, a
A cultura greco-romana passa a ser divulgada nos inteligência ordenadora.
moldes romanos, ou seja, passa a ser ensinado gramática,
retórica, e dialética (trivium), além de geometria, Ética
aritmética, astronomia e música (quadrivium), todas elas, é
claro, sob um viés teológico. O primeiro motor de Aristóteles, que era a causa
de tudo, o puro ato, São Tomás o transforma em Deus,
Essa nova fase do pensamento da Igreja é que tudo criou (a causa de tudo). Assim como Aristóteles
chamado de escolástica e tem como principal expoente entendia que a felicidade poderia ser alcançada e vivida
Tomás de Aquino. na pólis, São Tomás também entende que ela pode ser
vivida ainda nesse mundo, mas a felicidade que ele
Natural de Nápoles na Itália, Tomás de Aquino defende é uma felicidade mais alta, o conhecimento de
(1225 – 1274) foi ordenado monge dominicano e estudou como Deus é em si mesmo.
na universidade de sua cidade natal
e na de Bolonha. Mais tarde Política
tornou-se professor da maior
universidade europeia daquela Na época dele os reinos já estavam fortalecidos,
época, a de Paris. pois as cruzadas haviam deixados os nobres senhores
feudais empobrecidos e dependentes de um poder mais
Se Santo Agostinho centralizado. Com isso, ele pôde desenvolver teorias
cristianizou Platão, Tomaz de sobres as leis internacionais, aquelas que regulam as
Aquino cristianizou Aristóteles ao relações entre os reinos, e sobre a melhor forma de
usar sua teoria filosófica para governo. Não preciso nem dizer que era a monarquia,
explicar a fé e até mesmo a existência de Deus. A não é mesmo?!!!
influência de seu pensamento penetrou toda a Europa a
ponto dele ser considerado o conselheiro dos Ele entendia que os reinos, orientados pela Igreja,
conselheiros dos reis. Ou seja, o mestre dos mestres. Sua guiavam seus súditos até certo pondo, quando então a
obra principal foi a Suma Teológica. Igreja os orientavam para a felicidade eterna.

Se em Santo Agostinho o lema era “crer para O pensamento de São Tomás de Aquino, por ser
entender”, aqui é “entender para crer”. Apesar de dar o que de melhor a Igreja produziu na idade média,
uma valorizada na razão, ele também a entendia como a influenciou suas ações durante séculos. Foi o que os
serviço da fé. jesuítas, responsáveis pela educação dos jovens,
ensinaram nos mosteiros, escolas e universidades. E foi
Prova racional da existência de Deus sobre o seu aporte teórico que caíram as críticas de
cientistas renascentistas como Galileu, e filósofos como
São Tomás desenvolve a teoria das cinco vias Descartes e Thomas Hobbes.
para explicar racionalmente a existência de Deus.
1. Movimento – Todo o movimento existente
no mundo é causado por Deus.

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UNIDADE 3 – FILOSOFIA MODERNA Percebam que nessas ricas cidades a visão de


mundo feudal (teocêntrica) fundamentada pela Igreja não
tinha muito espaço. Não é que todo mundo ficou ateu
nas cidades, mas é que a interpretação de mundo passa a
CAPÍTULO 6 - RENASCIMENTO
se dar a partir do homem, já que ele, realmente era um
CONTEXTO HISTÓRICO – ROMPIMENTO pecador, mas também fora feito à imagem e semelhança
COM O ANTIGO E O NASCIMENTO DO de Deus, do criador. E por ter algo de divino, a criatura
(MUNDO) MODERNO mais perfeita criada por Deus, ele poderia também criar
maravilhas.
A ruptura com o sistema feudal não aconteceu da
noite para o dia. Foi um processo lento e gradual de O homem passaria a olhar o mundo desde então,
transformações no mundo e no pensamento que não mais a partir de Deus, mas a partir de si mesmo. O
aconteciam ainda na (baixa) Idade Média. Se ainda hoje centro das coisas agora era o homem
existem resquícios desse tempo, imagine durante essa (antropocentrismo). Por isso que os pensadores desse
passagem. tempo ficaram conhecidos como humanistas.

A ponte entre esses dois mundos foi o Eles estavam no século XIII, onde poderiam
Renascimento, que começou ainda no século XIV e se encontrar fundamentos para essas suas ideias? Isso
estendeu até o século XVI. Foi ele o combustível mesmo, eles tiveram que recuar mais de 1.000 anos para
intelectual que justificou o abandono de uma forma encontrar nos gregos antigos algo parecido com o que
(ultra)passada de ver a si mesmo e ao mundo, e deu novas estava acontecendo com eles. E não foi muito difícil fazer
cores, formas e respostas ao que já estava acontecendo e isso, já que eles estavam, onde mesmo? Exatamente, no
ao que ainda estava por vir. Por isso, é ele que passaremos centro do que fora o maior império do mundo, o mesmo
a estudar agora. que conquistou os gregos e mesclou a cultura deles com
a sua, preservando vários de seus escritos.
Enquanto os grandes reinos estavam sendo
criados, porque a situação estava um caos e precisava-se Os homens do renascimento foram buscar nos
de um poder forte para controlá-la, na Península Itálica, gregos e romanos antigos inspiração para louvarem o ser
onde se encontravam as principais rotas comerciais, humano. Isso mesmo, “inspiração”. Eles não estavam
cidades muito ricas ficavam cada vez mais ricas devido ao querendo simplesmente copiá-los, prova disso é que
intenso comércio com o oriente. diferentemente dos antigos que contemplavam a
natureza, os renascentistas queriam conhecê-la para
As mais ricas cidades foram Gênova, Veneza e dominá-la.
Florença, comandadas por ricas famílias de comerciantes
e banqueiros, e onde um grande número de pessoas de Não bastava um pensamento contemplativo, eles
todos os lugares passavam por lá e, além de comerciarem, queria um saber ativo que lhes permitissem ciar coisas.
trocavam ideias e experiências de vida, ampliando os
O homem renascentista que rompeu com as
horizontes de seus habitantes.
imposições da sociedade feudal, agora queria romper
Nessas cidades, uma nova ordem social era também com as imposições que a natureza lhe impunha.
criada. Lá os homens faziam seus destinos por conta Descobrir seus mistérios para usá-los a seu favor era algo
própria, eram senhores de si, construtores de seu novo muito rentável e promissor.
mundo. Este, era muito diferente daquele existente no
Pergunte aos navegadores que tinham que
campo, onde imperavam as regras sociais feudais
desbravar os mares, aos mineradores que tinham que
sustentadas pela visão teocêntrica (Deus no centro de
encontrar metais preciosos para cunhar moedas.
tudo) imposta pela Igreja.
Pergunte aos estudantes de medicina que queriam
Esses homens não aceitavam a imobilidade conhecer melhor o corpo humano para trata-lo melhor,
social, em que um servo morreria servo, quando homens e aos engenheiros que queriam descobrir novas formas
pobres podiam ficar ricos e melhorar de via. Eles não de construir armas para guerrear com mais facilidade.
aceitavam ter uma vida de penitências quando se poderia
Essa vontade de obter um conhecimento que os
aproveitar os prazeres que a vida tem a oferecer. Eles não
ajudassem em questões práticas (o embrião do
aceitavam que a busca pelo lucro fosse um pecado
conhecimento científico), se refletiu em todos os ramos
mortal, enquanto que esse lucro lhes proporcionava
da cultura, desde a política até as artes. Mas havia algo
mudar para uma vida melhor, na medida de seu próprio
que os impedia em progredir, e que infelizmente também
esforço pessoal.
estava lá junto deles na Península Itálica.
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Era a Igreja com seus ensinamentos escolásticos,


principalmente Santo Tomas de Aquino e Aristóteles,
que ensinavam um conhecimento baseado na pura
contemplação e que vinha sendo transmitido à gerações
pela tradição, que era indiscutível.
Para a Igreja, esses desgraçados que já haviam
rompido com a organização social que ela havia dito que
era a única correta, pois reflexo da vontade de Deus,
agora querem descobrir os segredos do corpo humano,
da natureza, e do universo. Mas ela já havia dito tudo que
tinha para ser dito.
Essa vontade de conhecer era uma blasfêmia
tamanha que só poderia ser purificada pelo fogo da
Inquisição do Santo Ofício. “Ousem questionar o que
dissemos e sofrerão as consequências”, era o aviso que a
Igreja havia dado.
Mas as famílias ricas ousaram, e, conhecidos
como mecenas, financiaram vários artistas e cientistas,
que com sua arte e invenções iam firmando os valores
burgueses na nova sociedade.
Nas artes eram usados conhecimentos Rafael Sanzio (1483 – 1520) – o “pintor da
científicos e matemáticos, e nelas se destacaram grandes madonas”. Veja só uma de suas obras mais famosas. A
nomes na Península Itálica, tais como: Escola de Atenas representa os maiores pensadores da
grécia antiga, tendo Platão e Aristótels ao centro.
Leonardo da Vince (1452 – 1519) – grande
gênio da época interessou-se por tudo, engenharia,

astronomia, pintura, escultura, filosofia, física, música,


etc. Seus traços sempre valorizaram as formas humanas
e suas invenções militares ajudaram os homens daquela
época a se matarem com mais eficiência. Ele também
dissecava corpos nas horas vagas, e seus desenhos Nas ciências como a biologia, física,
ajudaram a entender melhor o funcionamento do corpo matemática, astronomia, tivemos grandes nomes que
humano. enfrentaram os dogmas (verdades indiscutíveis) da Igreja.
Nicolau Cpérnico (1473 – 1543) desafiou a teoria
Michelangelo Buonaroti (1475 – 1564) – foi geocênctrica (terra no centro do universo) defendida por
considerado o gigante do renascimento. As suas duas Aristóteles e epla Igreja, e propôs o modelo heliocentrico
maiores obras, o teto da Capela Sistina e o Davi, foram (sol no centro).
relacionadas a temas cristãos. Mas olhe só a imagem que
há por trás de Deus no momento da criação. Você
consegue reconhecer? E o Davi, qual a diferença com as
esculturas dos deuses e heróis gregos?

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GALILEU GALIEI E O INÍCIO DA CIÊNCIA Aristóteles. Qualquer pessoa podeira ver isso pelo
EXPERIMENTAL telescópio e atestar que Galileu estava com a razão.
Também na Itália, Óbivio que a Igreja não ficou parada de braços
Galileu Galilei (1564 – cruzados. A inquisição caiu em cima de Galileu e ele teve
1642) conseguiu se impor de dizer que suas teorias eram apenas suposições
como um grande matemático (hipóteses).
e inventor. Ele era estudante
de medicina e abandonou o Apesar disso, a Igreja não conseguiu conter a
curso, para desgosto da Revolução Científica que Galileu havia começado, e
família, no intuito de se muitos foram os estudiosos que deram prosseguimento a
aprofundar nos estudos de seus estudos, sendo Isaac Newton quem aperfeiçou o
matemática, que era sua sistema.
grande paixão.
E o movimento renascentista não ficou só na
Galileu, contrariando os ensinamentos formais Peninsula Itálica, ele se espalhou por toda a Europa. Na
da Igreja predominantes nas escolas e universidades de França tivemos Rabelais (1490 – 1553) e Montaigne
seu tempo, acreditava que era possível explicar o universo (1533 – 1592), na Inglaterra, Willian Sheakespeare
através da matemática, e dedicou sua vida a provar que (1564 – 1616), na Espanha, Miguel de Cervantes (1547
estava certo. – 1616), nos Paises Baixos, Erasmo de Rotterdam
(1466 – 1536).
Não fosse por Galileu, talvez você não teria que
responder 45 questões de matemática, um quarto da Ém importante destacar que talvez a principal
prova. Mas também se não fosse por ele, talvez você não invenção dessa época, sem a qual nada disso poderia ter
estivesse lendo esse mateiral agora, pois provavelmente acontecido, tenha sido a imprensa (1454) do alemão
não haveria a tecnologia necessária por fazer ele chegar Gutemberg. Ela possibilitou a reprodução rápida e barata
até você. dos livros já produzidos e dos que estavam sendo
escritos.
Atraves de seus estudos de astronomia Galileu
chegou às mesmas conclusões de Copérnico sobre a Ela foi também um importante instrumento
posição da terra no sistema solar, sustentano um sistema contra a centralização do saber com o clero, já que antes
heliocentrico (sol no centro), contrariando a posição dela os livros eram copiados pelos monges de capa a
geocentrica (terra no centro) da Igreja. capa. Imagine quanto tempo levaria para copiar a
quantidade de livros que circulou pela Europa nesse
Além disso, fez algo tempo.
revolucionário. Desenvolveu o
telescópio. Pronto, a Igreja Essas foram grandes realizações dos homens, que
ficou doida. Agora, qualquer ainda continuaram no campo da política com a criação
pessoa poderia olhar por aquele dos Estados Nacionais. Diferentemente dos reis feudais,
negócio e ver com os próprios esses novos Reis teriam tanto poder que alguns deles
olhos as estrelas e a lua. desafiaram até o representante de deus na terra, o Papa.

Esse foi o grande passo


para o conhecimento experimental. Veja que um MAQUIAVEL E O DILEMA DO PRÍNCIPE
indivíduo, por meios dos sentidos, pôde sozinho desafiar
As transformações
os conhecimentos contemplativos sustentados por todo
sofridas pelo poder político não
o clero da Igreja.
passaram despercebidas pelos
Além de desbancar Aristóteles com relação à renascentistas, e a principal, e
queda dos corpos, por meio de seus cálculos matemáticos mais significativa personalidade
e suas experiencias na torre de Pisa, ele também provou nesse campo foi o florentino
que as esferas celestes não eram perfeitas como o filosofo Nicolau Maquiavel (1469 – 1527).
grego sustentava.
Ele assumiu um
Ele viu com seu telescópio as crateras lunares, e cargo importante no governo de
o extraordinário era que não se tratava apenas de uma Florença depois que a família Médici foi afastada do
disputa de opiniões, a palavra de Galileu contra a de controle da cidade. Trabalhava como diplomata fazendo

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várias viagens aos grandes reinos que haviam se Chegado ao poder, é preciso saber como se
unificado, e não se conformava com o estado de guerra manter nele. Para isso, é melhor ser temido do que
que se encontrava a Península Itálica. amado. Maquiavel tinha uma visão pessimista sobre o
homem, acreditava que ele é um bicho escroto, que
Na época de Maquiavel as cidades mais quando tá tudo bem, todo mundo é seu amigo, mas “na
expressivas dessa região eram: a sua Florença, Milão, hora do vamos ver” todo mundo lhe vira as costas.
Nápoles, e Veneza. Apesar de seu forte comércio elas
eram frágeis politicamente e totalmente vulneráveis a Não existe essa de bem comum. Os indivíduos
ataques externos. Na época dele era a coisa mais comum vivem em constante conflito em sociedade, e não dá pra
uma cidade invadir e dominar outra, por isso a sua agradar todo mundo. Para manter a lealdade de todos é
preocupação. melhor que eles o temam, pois assim é mais fácil de
obedecerem e se manterem fiéis. É até bom de vez em
Além disso, Maquiavel acreditava que a região quando esfolar um infeliz para que todos vejam que o
italiana só teria a ganhar se fosse unificada. Mas como príncipe não está para brincadeira.
fazer isso? Essa é a pergunta central de O Príncipe (1515),
a sua grande obra prima que iria mudar totalmente o Para o leitor superficial de Maquiavel, O Príncipe o
modo dos homens ocidentais enxergarem a política. torna, sem sombra de dúvidas, um dos escritores mais
sem escrúpulos de todos os tempos. Essa é a
Maquiavel é considerado o pai da ciência interpretação possível para quem analisa essa obra fora
política moderna porque não escreveu um tratado de seu contexto histórico.
teórico de como deveria ser o governo ideal. Desde os
gregos até sua época, todos fizeram isso. Maquiavel escreveu essa obra, quando os Médici
retornaram ao poder e ele foi posto para fora da cena
Sua preocupação não era como deveria ser a política. Ele a dedicou a Lorenzo de Médici, o único
política, mas sim em como ela é realmente praticada. homem que poderia, aos olhos dele, unificar a Itália e lhe
Com isso em mente, tendo como fundamento empírico trazer de volta o brilho e esplendor da Roma republicana
as lições que a história havia dado e como se anterior à ditadura de Júlio César.
comportavam os grandes políticos de sua época, ele
escreveu um manual de como construir um estado Maquiavel era um republicano, e não escreveu
forte e como se manter no poder para governá-lo. um obra para um governante que quisesse se perpetuar
no poder de forma absoluta e despótica. Ele tinha um
Para isso ele entendia que o príncipe deveria ser sonho, mas não era um ingênuo. Sabia que teria de haver
guiado pelos resultados a serem alcançados, podendo derramamento de sangue para que um grande Estado
tudo fazer. Não deveria ficar preocupado com questões fosse criado, e que isso teria de ocorrer sob a liderança de
morais, o importante era conseguir o poder e mantê-lo. um único homem.
Para Maquiavel, portanto, a política não é atrelada à
moral, pois os “fins justificam os meios”. No entanto, alcançada a estabilidade, um regime
republicano deveria ser instalado para que o interesse
O príncipe deve usar de todas as artimanhas coletivo pudesse guiar o destino de todos, e os rumos do
possíveis, mentir, ludibriar, enganar. É o homem astuto, Estado.
esperto o suficiente para conseguir o que deseja. Desse
modo, para conseguir o poder ele tem que possuir a É claro que não encontramos isso em O Príncipe,
virtu, ou seja, qualidades especiais que o diferencie dos que, como já dissemos, é um manual de como conseguir
outros homens. É ela que vai possibilitá-lo a reconhecer o poder e se manter nele. Esse perfil republicano de
as circunstâncias certas (fortuna) para agir como se deve Maquiavel é percebido em outra obra sua, qual seja,
no momento certo. A fortuna é o que muitos chamam de Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio.
sorte, mas só a aproveita quem estiver preparado.
Vejamos um trecho dessa obra em que isso fica
Esse é o elemento característico do pensamento bem evidente:
renascentista nos seus ensinamentos. Maquiavel sabe que
existem forças independentes da vontade do homem “Percebe-se facilmente de onde nasce o amor à
agindo sobre ele. Mas o homem como um ser racional, liberdade dos povos; a experiência nos mostra que as
dotado de inteligência, não é uma simples marionete cidades crescem em poder e em riqueza enquanto são
jogada de um lado a outro ao sabor do acaso. Ele pode livres. É maravilhoso, por exemplo, como cresceu a
usar sua racionalidade para decidir os rumos de sua vida. grandeza de Atenas durante os cem anos que sucederam
à ditadura de Pisístrato. Contudo, mais admirável ainda é
a grandeza alcançada pela república romana depois que
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foi liberta dos seus reis. Compreende-se a razão disto: As características que marcaram o sistema absolutista
não é o interesse particular que faz a grandeza dos foram:
Estados, mas o interesse coletivo. E é evidente que o
interesse comum só é respeitado nos repúblicas: tudo que  Centralização de poderes nas mãos do Rei;
pode trazer vantagem geral é nelas conseguido sem  Construção de um idioma nacional que pudesse
obstáculos. Se uma certa medida prejudica um ou outro dar unidade e identidade ao povo;
indivíduo, são tantos o que ela favorece, que se chega  Unificação de moedas e de sistemas de pesos e
sempre a fazê-la prevalecer, a despeito das resistências, medidas;
devido ao pequeno número de pessoas prejudicadas”  Demarcação do território do reino;
 Ordenamento jurídico único que valesse para
Essas palavras não parecem ser de um homem todo o território.
que defenda um governo absolutista, que deseja ver um
rei governar por toda a eternidade. Parecem mais o alerta Os ibéricos saíram na frente na formação dos grandes
de alguém que sabe a importância da liberdade para a reinos, enquanto Inglaterra e França ainda se matavam na
grandeza e prosperidade de um povo. guerra dos cem anos.
Somente depois, quando Portugal e Espanha já
haviam até começado o processo de exploração de suas
CAPÍTULO 7 - FORMAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO colônias americanas, é que aqueles dois países
DO ESTADO começavam a se fortalecer e emergir como monarquias
absolutistas.
O Estado foi o artifício criado pela nobreza e
burguesia para a manutenção de seus interesses e Na França, os conflitos religiosos entre a
privilégios, respectivamente. No momento de seu nobreza católica e a burguesia calvinista (huguenote)
nascimento ele tinha que vir ao mundo como uma formaram, juntamente com a Guerra dos Cem Anos, o
Monarquia Absolutista, pois era preciso a cenário que propiciou a formação e consolidação do
concentração de poder nas mãos de alguém que absolutismo francês.
personalizasse essa transformação que ocorria para fazer
nascer uma nova ordem social. Já nessa época, metade do século XVI, o jurista e
filósofo francês Jean Bodin (1530-96) defendia o direito
Os burgueses, pagavam impostos, mas ganhavam absoluto do governante, que para ele tinha que ser um
com: rei. A monarquia seria a melhor forma de governo, pois
estaria em conformidade com a natureza das coisas e dos
 Leis unificadas; homens. Só existe um Deus, um Sol, e um chefe de
 Sistemas de medidas e pesos unificados; família, por isso apenas um deve governar.
 Moeda única que facilitava o comércio;
 Segurança pública e jurídica; Suas ideias foram expostas em sua obra Os seis
Livros da República, publicada em 1576, e é nela que
Os nobres também ganhavam porque os reis encontramos a formulação moderna do conceito de
eram nobres, e todo o corpo burocrático necessário para soberania como sendo o poder supremo de governar,
o funcionamento do estado era composto de nobres. ou seja, é o poder que está acima de todos os outros
Além disso, eles tinham leis diferenciadas que os poderes, não se sujeitando a nada. “Por soberania se entende
beneficiavam de diversas formas, como por exemplo, a o poder absoluto e perpétuo que é próprio do Estado” (Livro I,
isenção do pagamento de tributos. Ou seja, seu status capitulo III).
estava garantido.
Um poder tão grande como esse só poderia vir
Algumas medidas foram tomadas pelos Reis para de Deus, cujo poder seria o único acima do poder
que centralizassem o poder. Dentre elas podemos citar: soberano do rei. O rei possui um direito divino de
governar. É por essa razão que Bodin não entende o
 Somente o Rei poderia ter um exército;
poder soberano como absoluto no sentido de ilimitado,
 A resolução dos conflitos e aplicação da justiça
tirânico, porque ele não deve confrontar os direitos
seria tarefa real. Acabaram-se os tribunais feudais
naturais divinos, dentre eles o direito à liberdade e
e a Igreja passa a julgar casos que envolvam
propriedade dos súditos.
somente questões de fé;
 O rei poderia criar leis que valeriam para todo o Pela teoria de Bodin, podemos ver que o poder
reino, sempre objetivando o bem comum; da Igreja Católica era muito grande na França. Tanto que
em 1589, quando o protestante Henrique IV tornou-se
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rei, teve que se converter ao catolicismo. Apesar disso, ver o rei abolir o Édito de Nantes e tornar o catolicismo
ainda conseguiu conceder tolerância religiosa aos a única religião a ser praticada em território francês.
protestantes com o Édito de Nantes, que não durou
muito, pois seus sucessores foram eliminando aos Além desse apoio, um grande marketing político
poucos essas liberdades. contribuiu para associar a imagem do rei à do próprio
Estado, fazendo com que ele mesmo afirmasse: “O
A consolidação do absolutismo na França se dá Estado sou eu”. A sensação que ele passa de ser o todo-
com o cardeal Rchelieu, que foi primeiro ministro de poderoso, um homem perfeito que simboliza o próprio
Luís XIII. Esse cardeal enfraqueceu o poder dos nobres, estado francês em sua grandeza.
e atribuiu grande autoridade aos funcionários do rei. Para
ele, as necessidades do Estado estavam acima de tudo e
de todos, podendo o mesmo fazer tudo para alcançar
seus objetivos.
E realmente fez. Para desbancar a Espanha como
potência mundial, a França, num ato contraditório,
apoiou os protestantes, a quem sempre perseguiu, no
conflito que ficou conhecido como Guerra dos Trinta
Anos (1618-48). Na metade do século XVII a França se
tornou o Estado mais poderoso da Europa.
Foi essa potência que Luiz XIV governou de
1643 a 1715. Ele aprendeu direitinho com o Richelieu, e
se tornou o todo poderoso Rei-Sol. O ápice do
absolutismo monárquico se dá no seu reinado.
No plano teórico, depois de Bodin, e ao tempo
de Luiz XIV, apareceu outro pensador francês para
justificar o direito do rei de governar absolutamente. O
bispo católico Jacques Bossuet (1627 – 1704) escreveu
a obra Política tirada da Sagrada Escritura, onde também
defendeu o direito divino de governar do rei. O rei
deve obediência somente a Deus, que legitima o seu Sua imagem foi cuidadosamente construída para
poder, e todos devem obediência ao rei. representar a magnificência, a perfeição e o caráter divino
Para fortalecer seu poder, Luiz XIV diminuiu do reino francês.
influência política da aristocracia, enquanto fortalecia Ele ia morar em qualquer lugar? Claro que não.
economicamente o Estado com as ações de seu ministro Teria que ser uma palácio digno se um rei sol. Luiz XIV,
das finanças Jean-Baptiste Colbert, cujas medidas então, manda construir um palácio que represente sua
mercantilistas ficaram conhecidas como colbertismo. realeza. E claro, tinha que ser o maior da Europa. Nesse
Tais medidas foram basicamente: sentido, o Palácio de Versalhes foi construído para
mandar uma mensagem ao mundo: “Aqui é a casa/sede
 O aperfeiçoamento do sistema de cobrança de do homem/estado mais poderoso do mundo”.
impostos;
 Incentivo às manufaturas;
 Estímulo ao comércio internacional de seus
artigos de luxo e produtos bélicos.
 Fortalecimento da marinha para entrar na
disputa por colônias;
Luiz XIV governou com o consentimento da
aristocracia e o apoio da Igreja. Os primeiros, apesar de
terem reduzida influência política, mantinham seu status
de “amiguinhos” do rei, e detinham uma série de
privilégios, como não pagar impostos. Já a Igreja, adorou

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Mas Versalhes, e todo luxo em que viviam o rei e rurais que antes eram usadas em proveito coletivo,
sua corte, além de guerras constantes em que o estado passaram a ser exploradas por um único dono,
estava envolvido, tiveram um custo, que certamente não principalmente na criação de ovelhas que forneciam a lã
era pago com o trabalho suado do rei. A bomba estava se que impulsionava a nascente manufatura de tecidos nas
armando, e ela ia explodir na forma de uma das maiores cidades. Esse processo contribuiu para a criação de uma
revoluções do mundo ocidental. classe aristocrática aburguesada, e mais forte
economicamente, os gentry.
Na Inglaterra, Henrique VIII ganhou amplo
apoio da burguesia e de setores da nobreza ao romper Nesse processo houve o que ficou conhecido
com a Igreja Católica e fundar, como seu chefe, a religião como cercamentos, onde os camponeses foram
anglicana (essencialmente calvinista, mas católico na praticamente expulsos do campo para viver uma vida
forma), governando esse país de 1509 a 1547. Mas foi sua miserável na cidade. Isso forçou um descontrolado
filha Elizabeth I que tornou essa nação uma potência ao êxodo rural para as cidades que não estavam preparadas
governá-la de 1558 a 1603. para receber todo esse contingente populacional que se
tornou mão de obra barata e fortaleceu o mercado
consumidor interno. Esse processo contribuiu para a
consolidação do capitalismo na Inglaterra.
A “rainha virgem” morreu sem deixar herdeiros,
sendo sucedida pelo seu primo escocês, e católico,
Jaime. Este uniu Inglaterra e Escócia e governou de 1603
a 1625, iniciando a dinastia dos Stuart como Jaime I.
O cara mal chegou e já queria ter seus poderes
reais aumentados. E quem dava a fundamentação para a
legitimidade do poder ser ilimitado? Exatamente, o
catolicismo. Então ele começou a enfatizar o caráter
católico do anglicanismo. Mas não colou muito não. O
parlamento, composto pela aristocracia rural
aburguesada (gentry) e pelos burgueses fiéis aos
ensinamentos calvinistas (puritanos), se manifestou
Atrasados na corrida para exploração das contrário a essa jogada do rei, aumentando as tensões
américas, Elizabeth quis recuperar o tempo perdido a entre os poderes.
todo custo. Ela incentivou a construção de navios para a
formação de um poderosa frota que pudesse invadir e Já no reinado do sucessor de Jaime, Carlos I, o
explorar territórios, fossem eles já dominados por outros parlamento apresentou em 1628 uma Petição de Direitos
países, ou não. limitando os poderes reais. O rei ficou doido, mandou
fechar o parlamento e prender todo mundo. A situação
Foi nessa época que começou a ocupação da só piorou, e em 1640 desencadeou-se uma guerra civil
américa inglesa, que não dava muito lucro porque não (1642-48) entre os “cavaleiros” (bajuladores do rei) e os
havia muito o que explorar, pois as terras que produziam “cabeças redondas” partidários do parlamento. Tem-se
especiarias e tinham metais preciosos já estavam há muito início a Revolução Puritana.
tempo ocupadas pelos espanhóis.
A fim de tirar um rei absolutista do poder, Oliver
Diante disso, esses navios serviam também para Cromwell lidera as tropas do parlamento, corta a cabeça
saquear outros, de preferência os espanhóis, que vinham do rei e assume como ditador com o apoio do exército,
abarrotados de metais preciosos. instaurando uma republica ditatorial conhecida como
protetorado, e governa de 1649 a 1658. Forma em 1651
Não tardou muito para os espanhóis a Comunidade Britânica com a união da Inglaterra,
responderem, e a Invencível Armada (a maior frota de Irlanda e Escócia.
navios do planeta) do rei Felipe II atacou os ingleses, mas
estes saíram vitoriosos. A partir de então, os mares
passaram a ter outros donos.
Mas as transformações econômicas ocorridas na
terra da rainha não ocorreram só nos mares, o modo de
produzir na terra também se modificou. As propriedades
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THOMAS HOBBES E A MECÂNICA DO que ele chamou de Estado de Natureza. O homem é o


ESTADO lobo do próprio homem.
Hobbes (1588 – Hobbes parte de uma concepção de natureza
1679) nasceu na era de ouro humana para fundamentar o poder político. Como
elisabetana, mas sua vida Galileu na física, no campo da política, ele também
adulta foi marcada por esses começa contrariando Aristóteles, sustentando que o
conflitos entre reis e o homem não é naturalmente sociável, não é um animal
parlamento. Ele era crítico político.
da democracia e por
conseguinte, da monarquia Ele é um ser malvado por natureza, que precisa
parlamentar inglesa. de um poder superior ao seu para frear seus instintos
naturais de destruição. Segundo esse filósofo, nesse
Quando estourou a guerra entre rei e parlamento estado, o homem possuía o direito natural (inerente à
ele se manteve a favor do rei, e teve que se exilar na própria natureza humana) à vida, e à liberdade, que
França em 1640. Um país onde todo aquele quem consistia em usar seu poder para fazer tudo o que
quisesse defender o absolutismo era bem vindo. quisesse para preservar sua vida, ou seja, de se
autogovernar como quiser.
Hobbes encarou a questão da legitimidade do
poder absoluto e da fundamentação da criação do estado Mas esse mesma vontade de autoconservação que
em sua grande obra Leviatã, que publicou na França em o impele à guerra, faz o homem querer também viver em
1651, dois anos depois da vitória de Cromwell, e quando paz. O que fazer então?
seu governo ditatorial começava a se consolidar.
Contrato Social
Por que deve existir o Estado e de onde vem o
seu poder absoluto? Essa é a pergunta central da obra Para sair desse estado de guerra, onde os homens
magna de Hobbes. Na França, havia a teoria do direito podiam usufruir amplamente de sua liberdade para se
divino dos reis de governar, mas nosso filósofo era um autogovernar, todos eles devem concordar em renunciar
homem racional demais para abraçar tal teoria. parte desse poder, e transferi-lo a outro homem, ou uma
Além de filósofo, ele era também um matemático assembleia, a fim de se criar um ente todo poderoso que
que admirava a explicação matemática que Galileu dava à
realidade. Sua explicação para o poder político estava
embasada na nova forma de ver o mundo, oriunda da
nova ciência que estava surgindo.
Hobbes inova no pensamento político da época
ao defender que a organização social deve ser entendida
e explicada não como uma teia de jogo de interesses entre
classes sociais diferentes, mas do mesmo modo como a
ciência explica o movimento dos corpos através de suas
relações de causa e efeito, tendo como princípio básico o
entendimento do movimento como um fenômeno
natural. Filosofia, para ele, era física dos corpos.
Estado de Natureza
Para descobrir o fundamento do Estado e de seu
poder soberano, absoluto, Hobbes não faz uma
investigação histórica sobre as primeiras sociedades.
Tal como na ciência ele começa com uma
hipótese, a de que os homens viviam inicialmente
isolados, livres e iguais, em um estado anterior à pudesse acabar com os conflitos.
sociedade, no qual tudo era possível, não existiam leis e Esse ente que surge desse contrato feito entre os
muito menos justiça, onde havia a pura e simples homens, Hobbes chamou de Leviatã, um monstro
barbárie, um estado de guerra de todos contra todos a marinho citado na bíblia, no livro de Jó.

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Veja que o poder do Estado, ou seja, sua e) astronomia e religião.


soberania, advém não mais do direito divino do rei, mas
do pacto feito entre os cidadãos de renunciar parte do seu
poder de governar-se. 2. (2014) A filosofia encontra-se escrita neste grande
livro que continuamente se abre perante nossos olhos
Estado e Sociedade civil (isto é, o universo) que não se pode compreender antes
de entender a língua e conhecer os caracteres com os
Perceba que o homem só consegue viver em quais está escrito. Ele está escrito em língua matemática,
sociedade, para Hobbes, quando cria o Estado. Portanto, os caracteres são triângulos, circunferências e outras
diferentemente dos gregos que viviam numa instituição figuras geométricas, sem cujos meios é impossível
que era o reflexo do seu instinto natural de sociabilidade entender humanamente as palavras; sem eles vagamos
(pólis), o Estado é um ente criado artificialmente para que perdidos dentro de um obscuro labirinto.
os homens consigam viver em sociedade.
GALILEI, G. O ensaiador. Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1978.
A sociabilidade humana é algo criado e não
natural. No contexto da revolução científica do século XVII,
assumir a posição de Galileu significava defender a
E qual seria a forma de governo que deveria
assumir o Estado? Hobbes defendia a monarquia. Ele A) continuidade do vínculo entre ciência e fé dominante
acreditava que a guerra civil na Inglaterra aconteceu na Idade Média.
porque o poder soberano estava dividido entre o rei e o B) necessidade de o estudo linguístico ser acompanhado
parlamento. do exame matemático.
C) oposição da nova física quantitativa aos pressupostos
Dessa forma, a melhor maneira de se manter um da filosofia escolástica.
bom governo seria concentrando todas as forças nas D) importância da independência da investigação
mãos de uma só pessoa, para que essa pudesse manter a científica pretendida pela Igreja.
ordem e evitar a guerra por meio da força. Não é à toa E) inadequação da matemática para elaborar uma
que o Estado está segurando uma espada na figura acima. explicação racional da natureza.
Por causa disso, muitos de seus amigos o viram como
defensor do governo de Cromwell. 3. (2010) O príncipe, portanto, não deve se incomodar
A função principal do estado, portanto, é garantir com a reputação de cruel, se seu propósito é manter o
a vida e a segurança de seus cidadãos. Quando ele não povo unido e leal. De fato, com uns poucos exemplos
consegue garantir tais direitos a um indivíduo, a duros poderá ser mais clemente do que outros que, por
subordinação acaba, mas somente entre o estado e aquele muita piedade, permitem os distúrbios que levem ao
cidadão em específico. assassínio e ao roubo.
MAQUIAVEL, N. O Príncipe. São Paulo: Martin Claret, 2009.

QUESTÕES No século XVI, Maquiavel escreveu O Príncipe, reflexão


sobre a Monarquia e a função do governante. A
1. (2011) Acompanhando a intenção da burguesia manutenção da ordem social, segundo esse autor,
renascentista de ampliar seu domínio sobre a natureza e baseava-se na
sobre o espaço geográfico, através de pesquisa científica
e da invenção tecnológica, os cientistas também iriam se A) inércia do julgamento de crimes polêmicos.
atirar nessa aventura, tentando conquistar a forma, o B) bondade em relação ao comportamento dos
movimento, o espaço, a luz, a cor e mesmo a expressão mercenários.
e o sentimento. C) compaixão quanto à condenação dos servos
SEVCENKO, N. O Renascimento. Campinas: Unicamp, 1984.
D) neutralidade diante da condenação dos servos.
E) conveniência entre o poder tirânico e a moral do
O texto apresenta um espírito de época que afetou príncipe
também a produção artística, marcada pela constante
relação entre
4. (2012) Não ignoro a opinião antiga e muito difundida
a) fé e misticismo. e que o que acontece no mundo é decidido por Deus e
b) ciência e arte. pelo acaso. Essa opinião é muito aceita em nossos dias,
c) cultura e comércio. devido às grandes transformações ocorridas, e que
d) política e economia. ocorrem diariamente, as quais escapam à conjectura
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humana. Não obstante, para não ignorar inteiramente o 6. (2012)


nosso livre arbítrio, creio que se pode aceitar que a sorte
decida metade dos nossos atos, mas [o livre-arbítrio] nos
permite o controle sobre a outra metade.
MAQUIAVEL, N. O Príncipe. Brasília: EdUnB, 1979 (adaptado).

Em O Príncipe, Maquiavel refletiu sobre o exercício do


poder em seu tempo. No trecho citado, o autor
demonstra o vínculo entre o seu pensamento político e o
humanismo renascentista ao

a) valorizar a interferência divina nos acontecimentos


definidores do seu tempo.
b) rejeitar a intervenção do acaso nos processos políticos.
c) afirmar a confiança na razão autônoma como Na França, o rei Luís XIV teve sua imagem fabricada por
fundamento da ação humana. um conjunto de estratégias que visavam sedimentar uma
d) romper com a tradição que valorizava o passado como determinada noção de soberania. Neste sentido, a charge
fonte de aprendizagem. apresentada demonstra
e) redefinir a ação política com base na unidade entre fé
e razão. A) a humanidade do rei, pois retrata um homem comum,
sem os adornos próprios à vestimenta real.
B) a unidade entre o público e o privado, pois a figura do
5. (2013) Nasce daqui uma questão: se vale mais ser
rei com a vestimenta real representa o público e sem a
amado que temido ou temido que amado. Responde-se
vestimenta real, o privado.
que ambas as coisas seriam de desejar; mas porque é
C) o vínculo entre monarquia e povo, pois leva ao
difícil juntá-las, é muito mais seguro ser temido que
conhecimento do público a figura de um rei
amado, quando haja de faltar uma das duas. Porque dos
despretensioso e distante do poder político.
homens se pode dizer, duma maneira geral, que são
D) o gosto estético refinado do rei, pois evidencia a
ingratos, volúveis, simuladores, covardes e ávidos de
elegância dos trajes reais em relação aos de outros
lucro, e enquanto lhes fazes bem são inteiramente teus,
membros da corte.
oferecem-te o sangue, os bens, a vida e os filhos, quando,
E) a importância da vestimenta para a constituição
como acima disse, o perigo está longe; mas quando ele
simbólica do rei, pois o corpo político adornado esconde
chega, revoltam-se.
os defeitos do corpo pessoal.
MAQUIAVEL, N. O principe. Rio de Janeiro: Bertrand, 1991.
7. (2009.2) O que se entende por Corte do antigo regime
A partir da análise histórica do comportamento humano é, em primeiro lugar, a casa de habitação dos reis de
em suas relações sociais e políticas. Maquiavel define o França, de suas famílias, de todas as pessoas que, de perto
homem como um ser ou de longe, dela fazem parte. As despesas da Corte, da
imensa casa dos reis, são consignadas no registro das
a) munido de virtude, com disposição nata a praticar o despesas do reino da França sob a rubrica significativa de
bem a si e aos outros. Casas Reais.
b) possuidor de fortuna, valendo-se de riquezas para ELIAS, N. A sociedade de corte. Lisboa: Estampa, 1987.
alcançar êxito na política.
c) guiado por interesses, de modo que suas ações são Algumas casas de habitação dos reis tiveram grande
imprevisíveis e inconstantes. efetividade política e terminaram por se transformar em
d) naturalmente racional, vivendo em um estado pré- patrimônio artístico e cultural, cujo exemplo é
social e portando seus direitos naturais.
e) sociável por natureza, mantendo relações pacíficas A) o palácio de Versalhes.
com seus pares. B) o Museu Britânico.
C) a catedral de Colônia.
D) a Casa Branca.
E) a pirâmide do faraó Quéops.

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8. (2012)
Que é ilegal a faculdade que se atribui à
autoridade real para suspender as leis ou seu
cumprimento.
Que é ilegal toda cobrança de impostos para a
Coroa sem o concurso do Parlamento, sob pretexto de
prerrogativa, ou em época e modo diferentes dos
designados por ele próprio.
Que é indispensável convocar com frequência os
Parlamentos para satisfazer os agravos, assim como para
corrigir, afirmar e conservar leis.
Declaração de Direitos. Disponível em: http://disciplinas.stoa.usp.br.
Acesso em: 20 dez. 2011 (adaptado).

No documento de 1689, identifica-se uma particularidade


da Inglaterra diante dos demais Estados europeus na
Época Moderna. A peculiaridade inglesa e o regime
político que predominavam na Europa continental estão
indicados, respectivamente, em:

a) Redução da influência do papa - Teocracia.


b) Limitação do poder do soberano - Absolutismo.
c) Ampliação da dominação da nobreza - República.
d) Expansão da força do presidente - Parlamentarismo.
e) Restrição da competência do congresso -
Presidencialismo.

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CAPÍTULO 8 – RACIONALISMO E EMPIRISMO O espírito mecanicista


Apesar da atitude de voltar aos antigos na A sociedade de sua época estava maravilhada
tentativa de recomeçar a empreitada humana como se o com as engenhocas mecânicas que divertiam a
pensamento teológico da Idade Média fosse só um aristocracia nos grandes jardins europeus, como a água
obstáculo a ser contornado, ele, obviamente, deixou sua corrente em tubulações subterrâneas que movimentavam
marca na história do pensamento europeu, e por robôs autômatos fazendo-os produzir sons musicais e
conseguinte, na nossa, já que somos, querendo ou não, quase fazê-los falar.
herdeiros diretos dessa matriz intelectual.
Mas não era só isso, bombas hidráulicas,
Na antiguidade, com exceção de algumas roldanas, guindastes facilitavam a vida de muita gente. E
correntes de pensamento, a investigação filosófica estava a invenção mais
centrada em descobrir a essência das coisas, com o impressionante para a
objetivo de entender a ordem do universo e do mundo e época, o relógio mecânico,
o lugar do homem dentro de toda essa trama. a perfeita aplicação das
teorias da física e da
Nessa empreitada, não se duvidava da capacidade mecânica na construção de
do homem de compreender isso tudo. Mas depois da máquinas.
Igreja passar quase 1.000 anos dizendo que o homem era
um ser desgraçado, que não tinha como alcançar o É nesse clima de
conhecimento das coisas, a não ser pela graça divina, isso euforia científica que
ficou marcado no pensamento de todos aqueles que Descartes cresce, sempre
viveram essa época. incomodado com o fato de que na escola não lhe ensinam
nada disso.
Desse modo, diante de uma concepção de razão
enfraquecida em sua capacidade de conhecer o mundo, a Apesar de católico, Descartes não era ortodoxo
pesquisa filosófica recua um pouco para, antes de ao ponto de obedecer cegamente os dogmas de sua
perguntar pela essência das coisas, questionar primeiro se religião, e percebia claramente a incompatibilidade entre,
somos capazes de conhecê-las. os ensinamentos sobre o mundo natural promovidos
pela igreja através de seus propagadores jesuítas nos
As questões passam a ser: “podemos conhecer?”, colégios e nas universidades e os avanços da ciência.
se sim, “o que podemos conhecer?”, e se sim, “como
podemos conhecer?”, e “quais os limites dessa Não aceitava a relutância da Igreja em admitir que
capacidade de conhecer?” . seus ensinamentos sobre o mundo natural estavam
errados, que, segundo ele, não passavam de falsas
A filosofia será reduzia à opiniões e de apego cego à tradição.
epistemologia/teoria do conhecimento, e cria-se dois
grandes paradigmas, o RACIONALISMO, para aqueles Ele não via aplicação prática daquilo que lhe fora
que defendem que o conhecimento é oriundo apenas da ensinado no colégio e no meio acadêmico. Descartes era
razão, e o EMPIRISMO, para aqueles que sustentam contemporâneo de Galileu e não ignorava os avanços
que o conhecimento é fruto dos sentidos por meio da dele na explicação do universo, principalmente porque
experiência. Galileu partia de um ponto de vista racional onde
qualquer pessoa, livre de preconceitos, e que tivesse
DESCARTES E O GRANDE RACIONALISMO disposta a usar a razão, poderia chegar as mesmas
conclusões que ele.
René Descartes (1596
– 1650) é “o” filósofo da E qual a linguagem usada por Galileu para
modernidade. Ele sintetiza o explicar a natureza? Isso mesmo, a matemática. O uso do
espírito do seu tempo e puro raciocínio, que poderia ser feito por qualquer
problematiza o que será pessoa. Descartes era obcecado pelo uso prático que se
discutido a partir dele. podia fazer da matemática.
Ele nasceu na França A missão de Descartes
e estudou no melhor colégio
daquele país, que obviamente Insatisfeito com os conhecimento ultrapassados
era jesuíta e onde se ensinava que recebeu e que ainda eram ensinados nas instituições
a doutrina escolástica aristotélico-tomista, é claro. de ensinos oficiais, conhecimentos totalmente

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desconexos, sem um princípio unificador, sem O caminho (método) certo


sistematicidade, ele decide viajar para conhecer o que o
mundo tinha a ensinar. O que há de radical nessa obra é que
diferentemente de todos os sistemas teóricos anteriores
Em uma das noites de sua viajem, sonhou que que já partiam para conhecer o mundo físico, aqui
deveria erigir um novo conhecimento, sistemático, descartes dá um passo atrás e começa pelo “como”
lógico, e totalmente fundamentado na razão, portanto, conhecemos, para saber se podemos ter acesso a um
universal. saber verdadeiro, não passível de erro.
Foi então que decidiu se fixar em um lugar para Nessa obra Descartes propõe quatro regas
mergulhar nos estudos. Queria ficar em Paris, mas a vida básicas para se chegar a um conhecimento verdadeiro,
agitada, e o medo das perseguições da Igreja fez com que são elas:
ele se mudasse para um lugar onde houvesse tolerância
de pensamento, e parte, então, para a Holanda. l) Regra da evidência - não aceitar por verdadeiro senão
aquilo que se apresenta clara e distintamente ao espírito;
Descartes tinha o projeto de abarcar a totalidade
do conhecimento e organizá-lo de forma sistemática, a 2) Regra da análise - dividir as dificuldades em tantas
começar por princípios seguros sobre os quais todas as partes quantas seja possível para melhor solucioná-las;
áreas pudessem partir, de modo que se pudesse chegar a
3) Regra da síntese - ordenar os pensamentos dos mais
conhecimentos complexos progredindo dos simples, tal
simples para os mais complexos; e,
como uma equação matemática. Ele imaginou o
conhecimento humano como uma árvore organizada da 4) Regra da enumeração - fazer enumerações gerais e
seguinte forma: completas para se ter certeza de nada omitir.
Para Descartes, mente, alma, espírito e razão são
palavras de mesmo significado. Portanto, na primeira
regra ele está colocando a razão como critério par se ter
evidência, clareza e distinção de alguma coisa, pois os
sentidos são enganadores.
Esses são os mesmo passos usados pelo
matemáticos que chegam às suas conclusões por
processo de decomposição e síntese.
A dúvida metódica
Desse modo, para decompor seu pensamento no
intuito de chegar ao primeiro princípio verdadeiro,
claro e distinto, Descartes se utiliza da dúvida metódica,
que é o processo de duvidar de tudo, das coisas mais
simples que me chegaram pelos sentidos até as evidências
matemáticas.
E para duvidar da matemática Descartes usa o
artifício do gênio maligno, que segundo ele é um deus
enganador que nos faz acreditar que estamos certo
quando dizemos que dois mais dois são quatro, quando
na verdade estamos errados e o resultado talvez seja
outro.
Sistematizar logicamente o saber humano dessa Cogito, ergo sum
maneira, era prover um meio, um caminho, um método
seguro, para se construir um conhecimento verdadeiro e Dessa forma, ao duvidar de tudo, não posso ter
universal. Então, em 1637 publica a obra que inaugura a certeza de nada. Mas desse processo, pode-se tirar um
filosofia moderna, o Discurso do método. E para certeza, que nem mesmo a dúvida metódica pode me
alcançar o maior público possível, ele publica o livro em fazer duvidar. É a certeza de que se eu duvido. E se eu
francês numa época que era costume publicar obras na duvido, eu penso, e se penso, eu existo.
língua pura que era o latim.
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Descartes encontrou o primeiro princípio abstrato que não se submete às leis físicas, a segunda
fundador de sua filosofia: “penso, logo existo”. O como algo material que está totalmente subordinada às
problema agora é partir desse princípio para saber se as leis dos corpos. Assim a ciência estudará a parte extensa
coisas existem e como podemos conhecê-las. do homem, enquanto que a filosofia se encarregará de
decifrar os mistérios do pensamento/racionalidade,
E esse não é um problema simples. Ele toma principalmente de sua capacidade de conhecer.
consciência que duvida, que pensa, que existe, mas esse
existir é como pensamento puro, como uma coisa Essa é a maior contribuição de Descartes ao
pensante (res cogitam), uma substância pensante, e não debate filosófico, essa mudança de rumo que ele imprime
como o indivíduo Descartes, com um corpo, com essa na filosofia. A partir dele a grande tarefa dos filósofos
cabeleira que parece uma peruca e com esse bigodinho será estabelecer “como” conhecemos, e quais os limites
ridículo. desse conhecimento.
Como ele vai provar logicamente, como ele vai
deduzir a existência do mundo, incluindo seu próprio
corpo, a partir dessa única certeza que tem de que existe, FRANCIS BACON – CONHECIMENTO
mas somente como substância pensante? Ele sabe que (EMPÍRICO) É PODER
não pode ser a causa das coisas, então como elas existem?
Francis Bacon (1561-
A existência de Deus e do mundo 1626) foi um parlamentar
inglês que se destacou como
A única ideia que ele tem que não depende dele é um grande cientista. Ele
a de que existe um ser perfeito, que é Deus. Ele chega a acreditava que ciência deveria
essa conclusão porque ele sozinho, como ser imperfeito, servir para o progresso e bem
não poderia ter a ideia de perfeição, pois o perfeito não estar das pessoas. Por isso,
pode vir do imperfeito, mas o contrário. E ainda, sendo para ele, conhecimento é
ele imperfeito, não poderia conceber essa ideia, portanto, poder.
ele já foi criado com ela, ou seja, ela é uma ideia inata.
Como era típico de sua época, era crítico de
A existência de Deus é a segunda certeza no Aristóteles e contrário ao silogismo dedutivo, fruto da
fundamento do conhecimento verdadeiro empreendido mera argumentação abstrata. Para ele o conhecimento
por Descartes. Daí que se existe esse ser perfeito, ele não deveria se fundar nas base solidas do experimento, do
pode ser enganador, então, o mundo realmente existe. As método indutivo de investigação.
ideias que tenho do mundo sempre estiveram em minha
mente, pois foram colocadas por Deus. Seu método está descrito em sua obra Novum
organum, onde ele afirma que o homem só pode progredir
Mas se esse mundo exterior chega ao pensamento na ciência quando se livrar de quatro ilusões, ou ídolos.
por meio de ideias, e eu como ser imperfeito que sou, Quais sejam:
posso me enganar quanto a elas, cabe ao próprio
pensamento descobrir quais dessas ideias são claras e 1º - Ídolo da tribo: não existem conexões entre a
distintas, ou seja, verdadeiras. natureza do homem e das coisas;

Outra evidência é a de que como essas ideias se 2º - Ídolo da caverna: o indivíduo não deve
referem ao mundo exterior a mim, esse mundo, assim, analisar a natureza a partir de suas crenças particulares;
como o próprio corpo existem como uma extensão, uma
3º - Ídolo do foro: não se descobre o que a
res extensa.
natureza é apenas conversando com os outros;
Certo, o mundo existe, mas dele só podemos
4º - Ídolo do teatro: não acredite em falsas ideias
conhecer o que a matemática pode nos dizer, ou seja, sua
de doutrinas filosóficas ou científicas.
extensão, as propriedades quantitativas (o que pode ser
medido), nada de propriedades qualitativas como cheiro, Somente tomando esses cuidados o homem
sabor, quente frio, etc. Apenas as propriedades estará apto a explorar os mistérios da natureza usando o
quantitativas são as ideias claras e distintas (verdadeiras) método correto, qual seja, o da experimentação, que
que podemos ter do mundo. consiste em fazer uma hipótese, testá-la, buscando a
maior quantidade de dados possível, e somente depois
No pensamento cartesiano, o homem é
confirmar sua veracidade, podendo torná-la lei geral.
substância pensante e extensa. A primeira como algo

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ISAAC NEWTON E O GRANDE RELÓGIO Newton explica tudo com a sua teoria da gravitação
CELESTE universal.
Perceba a grandiosidade de sua obra, ela não
explica apenas os fenômenos terrestres, mas todo o
universo. Ele diz até como calcular a quantidade de massa
de cada planeta. Explica o motivo da terra ser achatada
nos polos e porque há uma saliência na região do
equador. Ele descreve as leis de funcionamento do
universo. É algo extraordinário.

O grande cientista que completou a revolução


científica do século XVII foi Isaac Newton (1642 –
1727). Ele também era fascinado pelos inventos
mecânicos de sua época, quando criança construiu pipas,
moinhos, e até um relógio d’agua.
Na universidade ele conheceu a filosofia
mecânica de Descartes e seus trabalhos de geometria, a
explicação matemática de Galileu para o universo, e as
leis de Kepler sobre os movimentos planetários.
Quando estudou a luz usou o método de
observação e experimentação de Francis Bacon, e
descobriu que as cores são um propriedade da luz e não
dos objetos. O Principia foi a primeira obra científica a
apresentar um trabalho quantitativo, exato, de um
Newton se vale das duas grandes concepções de sistema matemático, baseado em experimentação e
ciência de seu tempo, a matematização e a experiência. observação crítica. Ele concluiu o processo de explicação
Mas ele não é apenas um seguidor dessas diferentes matemática do universo, desde o cair de uma maçã, ao
concepções, ele as unifica e as supera, na síntese que faz movimento dos planetas.
do empirismo de Francis Bacon e do racionalismo de
Descartes. Apesar da grandiosidade do sistema newtoniano,
ele próprio admitia que não sabia o que era a gravidade,
Apesar de se utilizar da filosofia mecânica, apenas como ela atua. Por isso foi acusado de usar em
Newton não gostava do materialismo que estava por trás sua teoria conceitos medievais como a magia. Mas essas
dela, do fato desta filosofia ter tirado Deus da explicação críticas em nada abalaram a grandiosidade de sua obra.
do funcionamento do mundo.
Para ele, espaço e tempo são absolutos, tendo
Na base de todo o pensamento de Newton estava conhecimento do que acontecia num determinado
a crença em um Deus racional que havia criado um momento era possível calcular o que iria acontecer em
universo racional que poderia ser descoberto pela análise outro. Os eventos/movimentos eram determináveis,
e pela matemática. como em uma máquina, um grande relógio para ser mais
preciso. Descobrindo-se a causa de um efeito, poder-se-
Em 1687, chegara o tempo dele descrever ia prever os efeitos seguintes, como uma grande
racionalmente a grande obra divina que era o universo, engrenagem de causas e efeitos.
na sua grande obra Os princípios matemáticos da filosofia
natural, popularmente conhecido como Principia. Inaugurava-se então uma grande era de
inovações, onde os homens fariam uso das leis da
Kepler já havia dito que as órbitas planetária eram natureza para controlar seus destinos. A revolução
elípticas, mas não explicou o motivo. No Principia,

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industrial muito dificilmente teria acontecido sem as daquelas que foram anteriormente varridas por essa
ideias de Newton. mesma dúvida.
SILVA, F.L. Descartes. a metafísica da modernidade.
São Paulo: Moderna, 2001 (adaptado).

QUESTÕES A exposição e a análise do projeto cartesiano indicam


que, para viabilizar a reconstrução radical do
9. (2013) Os produtos e seu consumo constituem a meta conhecimento, deve-se
declarada do empreendimento tecnológico. Essa meta foi a) retomar o método da tradição para edificar a ciência
proposta pela primeira vez no início da Modernidade, com legitimidade.
como expectativa de que o homem poderia dominar a b) questionar de forma ampla e profunda as antigas ideias
natureza. No entanto, essa expectativa, convertida em e concepções.
programa anunciado por pensadores como Descartes e c) investigar os conteúdos da consciência dos homens
Bacon e impulsionado pelo Iluminismo, não surgiu “de menos esclarecidos.
um prazer de poder”, “de um mero imperialismo d) buscar uma via para eliminar da memória saberes
humano”, mas da aspiração de libertar o homem e de antigos e ultrapassados.
enriquecer sua vida, física e culturalmente. e) encontrar ideias e pensamentos evidentes que
dispensam ser questionados.
CUPANI, A. A tecnologia como problema filosófico: três enfoques, Scientiae
Studia. São Paulo, v. 2 n. 4, 2004 (adaptado). 11. (2014) É o caráter radical do que se procura que exige
a radicalização do próprio processo de busca. Se todo o
Autores da filosofia moderna, notadamente Descartes e espaço for ocupado pela dúvida, qualquer certeza que
Bacon, e o projeto iluminista concebem a ciência como aparecer a partir daí terá sido de alguma forma gerada
uma forma de saber que almeja libertar o homem das pela própria dúvida, e não será seguramente nenhuma
intempéries da natureza. Nesse contexto, a investigação daquelas que foram anteriormente varridas por essa
científica consiste em mesma dúvida.
a) expor a essência da verdade e resolver definitivamente SILVA, F.L. Descartes: a metafísica da modernidade.
São Paulo: Moderna, 2001 (adaptado).
as disputas teóricas ainda existentes.
b) oferecer a última palavra acerca das coisas que existem Apesar de questionar os conceitos da tradição, a dúvida
e ocupar o lugar que outrora foi da filosofia. radical da filosofia cartesiana tem caráter positivo por
c) ser a expressão da razão e servir de modelo para outras contribuir para o(a)
áreas do saber que almejam o progresso.
d) explicitar as leis gerais que permitem interpretar a A) dissolução do saber científico.
natureza e eliminar os discursos éticos e religiosos. B) recuperação dos antigos juízos.
e) explicar a dinâmica presente entre os fenômenos C) exaltação do pensamento clássico
naturais e impor limites aos debates acadêmicos. D) surgimento do conhecimento inabalável.
E) fortalecimento dos preconceitos religiosos.
10. (2013)
TEXTO I 12. (2012)
Há já algum tempo eu me apercebi de que, desde
meus primeiros anos, recebera muitas falsas opiniões TEXTO I
como verdadeiras, e de que aquilo que depois eu fundei Experimentei algumas vezes que os sentidos
em princípios tão mal assegurados não podia ser senão eram enganosos, e é de prudência nunca se fiar
mui duvidoso e incerto. Era necessário tentar seriamente, inteiramente em quem já nos enganou uma vez.
uma vez em minha vida, desfazer-me de todas as opiniões DESCARTES, R. Meditações Metafísicas.
São Paulo: Abril Cultural, 1979.
a que até então dera crédito, e começar tudo novamente
a fim de estabelecer um saber firme e inabalável. TEXTO II
Sempre que alimentarmos alguma suspeita de que
DESCARTES, R. Meditacoes concernentes a Primeira Filosofia. São Paulo: uma ideia esteja sendo empregada sem nenhum
Abril Cultural, 1973 (adaptado).
TEXTO II significado, precisaremos apenas indagar: de que
É o caráter radical do que se procura que exige a impressão deriva esta suposta ideia? E se for impossível
radicalização do próprio processo de busca. Se todo o atribuir-lhe qualquer impressão sensorial, isso servirá
espaço for ocupado pela dúvida, qualquer certeza que para confirmar nossa suspeita.
HUME, D. Uma investigação sobre o entendimento.
aparecer a partir daí terá sido de alguma forma gerada São Paulo: Unesp, 2004 (adaptado).
pela própria dúvida, e não será seguramente nenhuma

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Nos textos, ambos os autores se posicionam sobre a


natureza do conhecimento humano. A comparação dos
excertos permite assumir que Descartes e Hume

a) defendem os sentidos como critério originário para


considerar um conhecimento legítimo.
b) entendem que é desnecessário suspeitar do significado
de uma ideia na reflexão filosófica e crítica.
c) são legítimos representantes do criticismo quanto à
gênese do conhecimento.
d) concordam que conhecimento humano é impossível
em relação às ideias e aos sentidos.
e) atribuem diferentes lugares ao papel dos sentidos no
processo de obtenção do conhecimento.

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CAPÍTULO 16 - ILUMINISMO ILUMINISMO NA INGLATERRA


JOHN LOCKE: EMPIRISMO E LIBERALISMO
POLÍTICO
O iluminismo é um movimento intelectual de
valorização da razão que tem início na Inglaterra ainda no O inglês John Locke
século XVII, inspirado pela revolução científica, mas que (1632 – 1704) vem de uma
toma maior destaque na França no século XVIII (devido família de comerciantes
à estrutura social daquele país e o impacto que a puritanos, estudou na
revolução daquele país teve no ocidente), e na região que universidade de Oxford,
posteriormente iria se tornar a Alemanha. onde se formou médico, e
sempre esteve envolvido na
Assim como a revolução científica deu à luz, por política. Lá ele teve contato
meio da razão, as leis que regem o universo físico, os com as ideias de Francis
iluministas queriam trazer à luz, a sociedade, afastando-a Bacon e Descartes.
das trevas dos preconceitos oriundos da tradição e da
religião que perduraram durante toda Idade Média. Era contra a
monarquia absolutista e por isso teve que se exilar na
E que trevas eram essas? 1) O absolutismo Holanda em 1683 no final do reinado de Carlos II, contra
monárquico, 2) o mercantilismo e 3) a estrutura social o qual ajudou a elaborar uma conspiração.
hierarquizada e sem mobilidade; todos sustentados pela
autoridade irracional da tradição e da religião. Em suma, Com a revolução gloriosa, e a ascensão ao trono
o Antigo Regime. do holandês Guilherme de Orange, ele volta à Londres e
pode se dedicar inteiramente à filosofia.
Essa estrutura irracional e opressora aprisiona o
homem e não deixa ele se desenvolver, causando a Mesmo já vindo se desenvolvendo antes dele,
infelicidade humana, e por isso deve ser combatida e muitos o consideram o pai do empirismo, mas não há
exterminada. dúvidas de sua paternidade quanto ao liberalismo
político.
Mas já que o sistema era tão ruim quanto
pintavam os iluministas, porque as pessoas não se Empirismo
voltaram contra ele por conta própria? Por que elas
estavam nas trevas e não conseguem enxergar a luz, A obra que trata
devendo serem educadas para perceberem sua situação. sobre a capacidade de
conhecermos é Ensaios
Por que a natureza é do jeito que é? Por que o rei acerca do entendimento
governa? Por que a sociedade é dividida e rígida? “Por humano, onde defende o
que Deus quer”. Com os avanços da razão nas ciências, empirismo afirmando
esse tipo de fundamento não se sustentava mais. A razão que ao contrário do que
deve agora guiar o homem em direção ao progresso, por dizia Descartes, não
meio da educação. temos ideias inatas,
nosso conhecimento é
E essa tarefa de iluminar a sociedade foi abraçada adquirido por meio dos
com toda força e vigor pelos iluministas. Eles sentidos através da experiência.
conseguiram propagar as ideias que derrubariam regimes
inteiros e instalariam uma nova ordem mundial baseada Seu objetivo nessa obra é investigar, não o que
na razão, na liberdade e na felicidade dos povos. conhecemos, mas o que, como, e os limites do processo
de conhecer. Sua preocupação é em saber como a mente
Eles tinham um novo projeto de sociedade, que funciona.
seria organizada racionalmente, assim como o universo
mecanicista de Newton. Dessa maneira, o método Segundo ele, a mente do ser humano ao nascer é
empírico-matemático usado para descobrir as leis físicas, como um folha de papel em branco/tábula rasa, onde
seria usado também para organizar essa nova sociedade. vão sendo impressos conhecimentos/ideias ao longo da
vida, que nos chegam por meio dos sentidos.
Começaremos a abordar o assunto pelo
iluminismo inglês, pelo homem precursor desse “Suponhamos, pois, que a mente é, como
movimento e que influenciou os iluministas franceses. dissemos, um papel branco desprovido de todos os
caracteres, sem quaisquer ideias; como ela será suprida?
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De onde lhe provem este vasto estoque, que a ativa e que defensores do jusnaturalismo (jus = direito, naturalismo =
a ilimitada fantasia do homem pintou nela com uma natural).
variedade quase infinita? De onde apreende todos os
matérias da razão e do conhecimento? A isso respondo, A propriedade
numa palavra, da experiência. Todo o nosso
Em um sentido mais restrito, a propriedade para
conhecimento está nela fundado e dela deriva
Locke é também a posse de bens, sejam eles móveis ou
fundamentalmente o próprio conhecimento.” (Ensaio
imóveis. Os burgueses quase deliraram de alegria quando
sobre o entendimento humano. Livro II, cap. I, sec. 2).
leram o que ele escreveu sobre a propriedade, que era
Esse conhecimento nos chega através de uma muito mais favorável a eles do que a concepção de
experiência sensível imediata/sensação e é Hobbes, além de ser algo inovador para a época.
processado internamente por meio da reflexão.
Para Hobbes, a propriedade não existia em estado
Adquirimos ideias simples pelos sentidos e elaboramos
de natureza tornando-se somente possível com a criação
as complexas através da reflexão.
do estado, por isso o soberano, a causa de sua existência,
Mas por entender que a matemática é um podia dela dispo como bem lhe conviesse.
conhecimento válido em termos lógicos, Locke não pode
Para Locke, não. A propriedade já era possível
ser considerado um empirista radical.
desde o estado natureza como um direito do homem. E
Liberalismo político por ser um direito existente antes mesmo da criação da
sociedade, não pode ser violado pelo Estado. Que
Assim como não há ideias inatas, não existe bacana, não é?
também o direito inato, divino de governar. Locke era
contra um governo absoluto, que tudo pudesse fazer, Em estado de natureza o homem era livre e dono
desrespeitando os direitos dos indivíduos e invadindo a de sua pessoa e de seu trabalho. E era este o critério de
esfera da sua intimidade. aquisição de propriedade. A terra foi dada por Deus aos
homens, mas pode se apropriar dela quem lhe imprimir
Assim como Hobbes, ele vai tratar sobre a origem o seu trabalho. Quem trabalha num pedaço de terra se
e a legitimidade do Estado, mas via diferir deste em torna seu proprietário, não podendo ninguém mais ter
muitos aspectos. direito sobre esse pedaço.
Suas ideias políticas estão contidas no Segundo Desse modo, se só posso ser dono do que
tratado sobre o governo, obra que foi escrita para justificar e conseguir trabalhar, então, minha propriedade será
legitimar a revolução gloriosa, investigando até onde deve limitada, porque não poderei trabalhar em grandes
ir o poder de governar e para que ele serve. extensões de terra, certo? Errado.
Essa obra é um marco histórico no pensamento Cm a invenção do dinheiro, o que era útil, mas
político ocidental, pois serviu de base para as principais perecível, como a carne, o leite, arroz, trigo, etc, pôde ser
revoluções liberais da Idade Moderna. O Segundo tratado trocado por moedas de ouro e prata, ou melhor, pôde ser
sobre o governo é o primeiro e mais completo trabalho sobre comprado. O dinheiro possibilitou o comércio, e uma
o Estado liberal. nova forma de adquirir propriedade, além do trabalho.
Estado de Natureza De limitada, a propriedade pôde se tornar
ilimitada, basta ter dinheiro para comprá-la. Aqui, Locke
Na mesma linha de Hobbes, e contrário a legitima a acumulação de riquezas e, por conseguinte, a
Aristóteles, a teoria individualista de Locke afirma que o desigualdade.
homem é anterior à sociedade e ao Estado.
Contrato social
Mas diferentemente de Hobbes, ele afirma que
realmente, historicamente, existiu um estágio pré-social e O estado de natureza pensado por Locke, não era
político onde o homem vivia em liberdade e igualdade, um estado de guerra como em Hobbes, havia até uma
que não era um estado de guerra, mas de relativa paz, relativa paz. Então, por que fazer um pacto para criar o
chamado de estado de natureza. Estado?
Nesse estado o homem já era um ser racional Para estabelecer leis gerais aceitas por todos,
detentor de propriedade, esta entendida em sentido resolver os conflitos que possam aparecer, com
amplo como sua vida, liberdade e seus direitos naturais. imparcialidade e força para fazer valer as decisões. Não
Locke, assim como Hobbes, também foi um dos grandes
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se pode deixar que os particulares resolvam sozinhos os legítimo de se rebelar contra ele, podendo usar até
seus conflitos, pois não haverá justiça no resultado. mesmo a força.
Disso decorre que seus objetivos principais são: Conclusão
1) Preservar os direitos naturais, entendidos John Locke foi um grande filósofo, tanto por
como a propriedade em sentido amplo, ou seja, vida, seus trabalhos em teoria do conhecimento, quanto em
liberdade, e a propriedade em sentido estrito (posse de política. A teorização da defesa dos direitos naturais,
bens), e; como a vida, a liberdade, e a propriedade dos indivíduos
como fim a ser perseguido pelo Estado, faz dele o pai do
2) Proteger a comunidade política dela mesma liberalismo político.
(evitar guerra civil) e de inimigos externos.
Suas ideias políticas justificaram a Revolução
Em Hobbes, o contrato social é um pacto de Gloriosa, a revolução norte-americana, e a Revolução
submissão. Em Locke, é um pacto de consentimento. Os Francesa.
homens de livre e espontânea vontade criam o Estado
para preservar os direitos que já possuíam em estado de Não tem como entender a política de nosso
natureza (direitos naturais). tempo sem estudá-lo, pois suas ideias estão na base de
nosso sistema político.
Sociedade política ou civil
A passagem do estado de natureza para o Estado
se dá pelo consentimento unânime de todos os indivíduos, GEORGE BERKELEY
mas o mesmo não ocorre com a escolha da forma de
governo, que deve ser uma escolha majoritária (pela A marca deixada por George Berkeley (1685 –
maioria). 1753) na história da filosofia foi a sua afirmação da
imaterialidade do mundo, pois para ele, nós não podemos
No caso da Inglaterra, pós revolução gloriosa, saber se existem as coisas materiais.
impera um sistema misto de governo, onde o rei
representa a monarquia, a Câmara dos Lordes, a Esse filósofo irlandês, e sacerdote anglicano,
oligarquia, e a Câmara dos Comuns, a democracia. Mas, acreditava que a Europa estava perdida no materialismo
mesmo para um homem comum participar desta última, científico e no ceticismo ocasionado pela dúvida
era necessário ter terras e dinheiro, pois só assim teria estimulada pelo pensamento filosófico, o que retirava as
condições de participar da vida política. A democracia pessoas do caminho da fé, afastando-as de Deus.
pensada por Locke é, nessa medida, exclusiva e elitista.
Com base nisso, pediu recursos ao parlamento
Na teoria política de Locke, o Estado não é inglês para fundar uma Universidade na américa do norte
invasivo na regulação da vida do indivíduo em sociedade, para educar os jovens de lá, que, segundo ele, ainda
devendo haver liberdade de expressão, de pensamento, e tinham salvação. Passou três anos em Rhode Island,
de culto, e principalmente, não deve interferir na colônia inglesa nos EUA, mas voltou para Londres
atividade econômica. depois que percebeu que os recursos nunca seriam
enviados.
Ele existe apenas para preservar o bem comum,
qual seja, a propriedade dos indivíduos, que consentiram Para combater esse estado de degradação,
viver em sociedade justamente para esse fim. Fora isso, o Berkeley ataca, em sua obra Tratado sobre os princípios do
estado deve deixar o indivíduo em paz. conhecimento humano, a base fundamental da ciência
moderna formulada por Newton, que é a matéria.
Para Locke, o Estado só se legitima quando existe
o controle do governo pela sociedade, quando o governo Ele sustenta um tipo diferente de empirismo, ao
é comprometido com a proteção do direito de afirmar que só podemos conhecer através dos sentidos
propriedade (bem comum), e quando há o controle do que nos dão a percepção das coisas, mas nada além disso.
executivo pelo legislativo. Melhor dizendo, nós conhecemos, apenas, as percepções
das coisas, mas nunca as coisas mesmas, pois elas não
Direito de resistência existem.
Quando o governo deixa de preservar o bem A matéria não existe, o que existe são as
comum, e começa a exercer o poder em interesse percepções (ideias) que temos da existência das coisas.
próprio, ele se torna tirânico, e a sociedade tem o direito Por isso que, para ele, “ser é perceber e ser percebido”.
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E ainda, essas percepções são apenas ideias Segundo ele, o que existe em nossa mente são
simples, de experiências com objetos particulares, nunca percepções, que são de dois tipos:
podemos ter ideias complexas ou abstratas, porque elas
não são originadas de experiências que temos com 1 – impressões, que são percepções fortes.
determinados objetos. Quando queimamos pela primeira vez a ponta do dedo
em algo quente, temos a percepção do calor e da dor.
Esse negócio de ideias gerais e abstratas, isso é Quando isso acontece novamente, não temos mais a
invenção de filósofo e cientista. Ora, se isso não existe, percepção, por que ela já está em nossa mente, o que
não há como existir as leis formuladas por Newton para temos é uma impressão, que é o sentir a percepção
explicar a natureza, e tchau ciência. novamente.
Em síntese, Berkeley defende a imaterialidade do 2 - ideias/pensamentos, que são percepções
mundo sustentando um idealismo imaterialista, segundo mais fracas. São as lembranças que temos das percepções.
o qual, tudo o que existe são os sujeitos com suas Quando lembramos do dedo queimando, temos apenas
percepções oriundas da experiência. uma ideia (percepção mais fraca) do que aconteceu, mas
não sentimos novamente a dor e o calor. Nossas ideias,
Mas então, poderiam argumentar que as coisas portanto, são apenas cópias das impressões.
que não estão sendo percebidas não existem, ao que ele
refutaria dizendo que existe um ser supremo que garante De posse disso, podemos agora perceber quando
a existência das coisas a serem percebidas. E adivinhem uma ideia é verdadeira ou falsa. Somente as verdadeiras
quem ele diz que é esse ser supremo? Exatamente, Deus. tem origem na experiência.
Perceba que, para ele, o mundo não existe de uma E para saber quais delas se originam na
relação direta do indivíduo para com esse mundo, mas do experiência temos que decompor as ideias complexas até
mundo com indivíduo através de Deus que garante a chegarmos às simples, se essas tiverem por base a
percepção e o conhecimento do mundo ao indivíduo. experiência, são verdadeiras, e se da sua união surgir uma
ideia complexa que também tem por base a experiência,
então, ela também é verdadeira.
DAVID HUME E O PODER DO HÁBITO Imaginemos um pégaso, ele é um cavalo com
asas. Temos a ideia de
Nascido em
cavalo unida a ideia de
Edimburgo, na Escócia,
asas. As duas ideias
Hume (1711-1776)
provêm de percepções
abandona os estudos de
reais, pois cavalo e asa
direito para se dedicar à
existem, todos já vimos
Filosofia. Passa a maior
na realidade. Mas quando
parte de sua vida na
essas ideias se juntam,
Inglaterra, onde se dedicou
não há qualquer
à política e ocupou cargos
correspondente disso no mundo empírico, real. Portanto,
públicos, como o de
só podemos concluir que pégaso é uma ideia falsa.
embaixador na França.
Esse processo de decomposição é importante
Foi um filosofo muito importante e famoso,
porque nossa mente pode nos enganar com seus truques
escrevendo sobre política, moral, teologia, e foi muito
que a razão não pode controlar. Por isso que um
importante para a teoria do conhecimento, avançando
conhecimento, proveniente somente da razão não pode
nos estudos do empirismo. E é nessa parte de sua
ser confiável, ele deve ter a experiência como base de
filosofia que vamos nos ater aqui.
verificação.
Empirismo
O mesmo processo se aplica a ideia de Deus, e do
Hume é um empirista radical, para ele, não existe eu cartesiano. Se Deus existe, nós não podemos conhecê-
conhecimento que não tenha sido adquirido pelos lo, pois não há essa percepção da realidade. De outra
sentidos. Não existem ideias inatas, todas elas vão se banda, há medida que vamos vivendo vamos adquirindo
formando em nossa mente desde quando nascemos e várias percepções do eu, e cada uma delas diferentes umas
durante toda a nossa experiência de vida. Na experiência das outras. Portanto, não existe essa unidade constante
reside a fonte de nosso conhecimento. E como fazer para que é uma substância pensante. Isso não passa de
verificar se o que pensamos saber é falsa ou verdadeira? invenção da mente.
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O hábito, a crença e o fim da causalidade manter instituições públicas, como a justiça, construir
obras públicas e cuidar da defesa nacional.
Quando uma criança solta alguma coisa pela
primeira vez, ela não sabe que aquele objeto vai cair. Mas Sua teoria está contida em sua obra Investigação
quando ela cresce, de tanto ela soltar coisas, ela aprende sobre a na natureza e as causas da riqueza das nações, que foi
que cai. publicada em 1776 em plena Revolução Industrial. Ela é
um marco na história da economia e serviu de
Newton respondeu que as coisas caem porque fundamento teórico para a expansão do capitalismo
existe a gravidade que a atrai para o chão. Mas o próprio industrial.
Newton não sabia o que era a gravidade, ele nunca a viu,
ou tocou nela, e nem sentiu. Você, agora, está sentindo a Nessa obra ele defende que devemos medir a
gravidade? Quando você pula você sente a gravidade lhe riqueza de uma nação, não pela riqueza do Estado, mas
puxando para baixo? Não. Você apenas cai. E sabe que pela riqueza gerada pelo seu povo através do trabalho,
vai cair porque sempre experimentou isso, não é? que deve ser especializado para aumentar a produtividade
de bens. Ao Estado não é permitido interferir nas
Ora, não existe uma lei racional chamada relações econômicas, pois o mercado se autorregula. Mas
gravidade que é a causa de todos os corpos tenderem ao como?
chão. Pensar nisso é apenas um truque da mente, o que
existe são percepções disso, nada mais. Por termos o Para ele, assim como o universo possui suas leis
hábito de experimentarmos isso toda vez, acabamos universais e imutáveis, o mercado também têm suas leis
tendo a crença de que isso sempre se repetirá. naturais, e são elas que regulam a economia. Mas que leis
são essas? A oferta e a procura.
Hume diz que não existem causas gerando
efeitos, o que há é uma crença, oriunda das experiências Oferta e procura
habituais, de que toda vez que um evento x acontecer,
um evento y também irá acontecer como seu efeito. A economia é a ciência que estuda a criação e
distribuição das riquezas limitadas tiradas da natureza.
Por isso não há um conhecimento certo e Quando existe muito produto ofertado no mercado, ele
universal de que o sol nascerá todos os dias, ou de que a se torna abundante e seu preço tende a cair. Quando
noite sucederá ao dia, ou de que se eu me atirar de um existe muita procura por um produto, o seu preço tende
penhasco eu vá cair. Para ele, portanto, não existe esse a aumentar. Resumindo:
negócio de leis imutáveis da natureza. Isso é só um
truque da mente humana. Oferta > procura = baixa no preço;

Lembrem que falei no início que ele havia sido Procura > oferta = alta de preço.
um filósofo famoso, pois é, sua teoria foi levada a sério
Isso se aplica a tudo, são as leis universais e
pelos pensadores de seu tempo. Por isso, o seu
imutáveis do mercado.
empirismo radical, levado às últimas consequências, tinha
que ser refutado, pois ele acabava com toda esperança de Mas quando se chega ao extremo da procura por
um conhecimento racional. um produto ser tão grande que eleve o preço às alturas?
Ou, quando a oferta é tão grande que o preço do produto
Sem o princípio de causalidade não há como
fique muito pequeno?
existir nem ciência, nem moral, muito menos uma
política racional. Então, diz Adam Smith, entra em ação a mão
invisível do mercado para equilibrar a situação, e o
ADAM SMITH E O LIVRE MERCADO
mercado se auto regular.
O escocês Adam Smith (1723 – 1790) era filho de
No primeiro caso, em que a procura é maior que
família de classe média que
a oferta e o preço aumenta, exatamente por causa da alta
estudou na Universidade de
do preço, a procura diminui e o preço cai.
Oxford, na Inglaterra. É o pai do
liberalismo econômico, ou seja, No segundo caso, em que a oferta é muito grande
do capitalismo em sua forma e o preço diminui, exatamente por causa da diminuição
mais pura. do preço a produção diminui por que não compensa
produzir para vender muito barato. Então, a oferta
Criticava o mercantilismo
diminui e os preços aumentam.
e defendia uma economia livre da
interferência do Estado. A este caberia apenas criar e
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Nos dois casos, a mão invisível do mercado Não era um democrático, pois acreditava que o
regulou/equilibrou a oferta e a procura. E isso se fez sem povão não tinha capacidade para participar da política.
nenhuma necessidade de interferência do Estado na Era defensor de uma monarquia esclarecida que
economia. governasse de acordo com a razão. Trocava cartas com
Frederico II da Prússia e a imperatriz Catarina da Rússia,
aconselhando-os a tomar decisões racionais que levassem
ao progresso de seus países, como em investir em
ILUMINISMO NA FRANÇA
educação.
Em meados do século XVIII a França ainda era
um país caracteristicamente feudal. Havia um rei com
poderes absolutos, uma sociedade altamente estratificada MONTESQUIEU E OS TRÊS PODERES
e praticamente sem mobilidade social, e ainda, com a
Igreja católica legitimando todo esse sistema e ditando o Montesquieu (1689 –
que as pessoas podiam ou não fazer. 1755) era um nobre que
desde muito cedo recebeu
O pessoal já estava puto por lá, de saco cheio dos formação iluminista,
padres, bispos e cardeais corruptos que viviam no luxo às tornando-se um crítico
custas do trabalho alheio. severo das monarquias
absolutistas e do clero.
Os intelectuais franceses visitavam Londres e
ficavam maravilhados com a ampla liberdade que o A sua principal obra é O
indivíduo desfrutava naquele lugar. As pessoas tinham a espírito das leis (1748), onde
possibilidade de mudar de vida pelo esforço próprio, e os ele analisa o comportamento político dos diferentes tipos
cargos público eram preenchidos por qualquer um que de sociedades apresentadas pela história, e suas relações
tivesse competência. com o poder. A partir daí, ele traça um panorama geral
da natureza, do espírito, das leis.
E acima de tudo, todos pagavam impostos e o rei
poderia criar novos tributos somente com autorização do Ele não está interessado na discussão da
parlamento. Era algo de se admirar. legitimidade dos governos, como Hobbes e Locke, o que
ele quer entender é o funcionamento dos governos e
como eles se mantêm.
VOLTAIRE E A TOLERÄNCIA
E para começar a discussão, contrapondo ao
De família rica burguesa, Voltaire (1694-1778) é conceito medieval de Lei como fruto da vontade divina,
o maior propagador do Iluminismo na França. Hábil ele apresenta uma nova concepção de Lei influenciado
escritor, denunciava constantemente a intolerância pela física newtoniana, com o intuito claro de tratar de
religiosa, o clero, e a prepotência dos poderosos, sendo política como uma área totalmente independente da
muito vezes perseguido, preso, e exilado. Mas sempre religião.
combativo.
Para ele, Lei é a relação necessária que deriva da
É autor de Dicionário natureza das coisas. Com essa concepção ele quer
Filosófico, onde faz uma mostrar que apesar da variedade de costumes das
veemente defesa da tolerância. diferentes sociedades que funcionam por regimes
Ele é um dos grandes políticos distintos, podemos encontrar uma
defensores da liberdade de uniformidade/universalidade (como na física) no
crença. É famosa a sua célebre funcionamento (movimento) dos governos
frase: “Posso não concordar (massa/matéria/corpos).
com nenhuma palavra que
Dessa análise do funcionamento das diversas
você diz, mas defenderei até a
formas de governo (monarquia, república, despotismo),
morte o seu direito de dizê-la”.
ele chega à conclusão de que a liberdade (o direito de
Concordava com Locke sobre a necessidade de fazer tudo aquilo que a lei permite), só pode existir
limitações ao poder real, assim como o fato dos homens verdadeiramente quando há a separação (bem definida),
serem dotados de direitos naturais que não podiam ser harmonia, e independência entre os poderes executivo,
violados pelo governo. legislativo, e judiciário.

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Ele é fã de John Locke e vai para Londres estudar Mas então, toda a desgraça aconteceu quando
o funcionamento da monarquia constitucional alguém cercou um pedaço de terra e disse que era seu, e
parlamentarista, que é o modelo de governo que ele pior, ninguém disse nada e ainda consentiram, dando
defende, sendo a favor de um liberalismo aristocrático e início à propriedade privada.
não da democracia.
Com a propriedade privada surgiu o egoísmo, a
ganância, a diferença entre ricos e pobres e todos os
sentimentos ruins que levam ao estado de guerra descrito
ROUSSEUAU E A VONTADE GERAL por Hobbes.
Jean-Jacques Para estabelecer a segurança, os ricos proporam
Rousseau (1712-1778) um pacto para a criação da sociedade onde todos se
nasceu em Genebra, mas era beneficiariam. Era só balela, com o tempo eles colocaram
filho de franceses calvinistas as garras de fora e começaram a explorar os pobres.
que fugiram da França por
causa das perseguições. Pacto social
Foi talvez o único Para sair dessa relação de ganância generalizada,
filósofo iluminista que não Rousseau propõe um novo pacto, baseado na vontade
nasceu em berço de ouro. geral, onde todos terão vez e voz.
Desde muito cedo teve que
trabalhar para se sustentar, e em 1742 vai para a França Nesse pacto, cada um deixa de ser um indivíduo
em busca de se destacar profissionalmente como e passa a ser cidadão. O que isso significa? Que cada um
professor de música. passará a ser entendido a partir do todo, da coletividade,
pois fará parte de um corpo político.
Rousseau era um Homem inteligente e escrevia
sobre muitos assuntos. Ele escreveu sobre música, É desse corpo político que surgirá a Lei, como
poesia, mas foi com Discurso sobre a origem e a desigualdade fruto de uma vontade geral, que não é a simples soma de
entre os homens (1755), O contrato social (1762), e Emílio todas as vontades particulares, mas uma vontade
(1762), que Rousseau deixou seu nome marcado na originada e guiada da busca pelo bem comum, que por
história como um grande filósofo, influenciando com sua vez é a expressão do interesse de todos e não de um,
suas ideias os rumos da França, e do mundo ocidental ou de poucos.
por conseguinte.
O que Rousseau está propondo é algo
Essas três obras são um todo que formam o seu revolucionário demais até para outros iluministas, que
pensamento político. Suas obras eram tão radicas que ele restringiam a cidadania a uns poucos detentores de
recebia críticas severas até mesmo de outros filósofos posses.
iluministas, principalmente de Voltaire que dizia que se
Para ele, a liberdade só pode existir dentro de um
fossemos dar ouvidos a Rousseau teríamos que voltar a
sistema em que todos participem na criação da lei, que é
andar de quatro.
a expressão da vontade geral da qual fazem parte todos
Rousseau é também um grande contratualista, ele os cidadãos. Ele dizia que nenhum homem pode ser
escreve sobre a origem do Estado seguindo o mesmo melhor representado do que por ele próprio.
caminho de Hobbes e Locke, mas diverge totalmente de
Outro fator que caracteriza essa liberdade é a
ambos. Vejamos, então, como ele concebe a passagem do
obediência à lei, que acontece justamente porque a lei é
homem em estado de natureza para a sociedade política.
fruto da vontade geral da qual todos participam. Um
Estado de Natureza povo só é livre quando tem o poder de atribuir-se leis.

Ele também escreve um história hipotética da A soberania em Rousseau, desse modo, advém do
origem da humanidade porque considerava impossível povo, pois somente assim, ela é legítima. E aqui devemos
conhecê-la verdadeiramente, já que se tinha tão pouco esclarecer que o soberano é esse corpo de leis criadas em
conhecimento e vestígios dessa época. vistas ao bem comum. É ele que deve guiar os atos de
quem vai administrar o Estado.
Para Rousseau, em estado de natureza o homem
era solitário, livre, e feliz. Agia seguindo apenas seus bons A participação direta do povo é na criação das
instintos naturais e em harmonia com o seu meio natural. leis, ou seja, no legislativo, mas a administração, o
Era um bom selvagem. executivo, poderá caber a um (monarquia), a poucos
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(aristocracia), ou a muitos (democracia) a depender das que regem o universo, também há leis naturais na
características do país em questão, como o tamanho de economia.
seu território, de sua população, etc.
O Estado deveria parar de intervir na economia,
Independente da forma de governo que o porque isso não é de acordo com a natureza, e devia
Estado venha a adotar, o importante é que ele governe deixar ela correr solta. A competitividade selecionaria os
para o soberano, que é a vontade geral do povo. melhores e enriqueceria quem merecia enriquecer.

ENCICLOPÉDIA O DESPOTISMO ESCLARECIDO


O matemático D’Alembert e o escritor Diderot Apesar do iluministas
não eram filósofos, mas foram os responsáveis pela serem contrário ao
Enciclopédia, a grande obra que marcaria o movimento absolutismo, haviam reis que
iluminista. gostaram desse negócio de
progresso material por meio
Ele é a reunião de da educação.
escritos de mais de cem
autores e foi a maior Esses reis aplicaram
forma de propagação do certos ideais iluministas em
pensamento iluminista, seus governos e ficaram conhecidos como déspotas
tanto é que eles ficaram esclarecidos. Entre eles se destacaram Frederico II da
conhecidos como Prússia, José II da Áustria, Catarina II da Rússia, e Dom
enciclopedistas. José I de Portugal, motivado por seu ministro Pombal.
Ela é fruto da Os três primeiros ampliaram a liberdade de culto
crença que eles e investiram em educação, enquanto o último procurou
compartilhavam de que a implantar um governo mais racional em sua
razão traria progresso administração, e que melhor explorasse as riquezas do
tanto espiritual quanto reino.
material para os homens.
Além disso, serviria
como o grande livro a ser
ILUMINISMO NA ALEMANHA
usado nesse processo educacional de tirar as pessoas das
trevas a que estavam submetidas. IMMANUEL KANT
A Enciclopédia foi a obra que reuniu a descrição Kant (1724-1804) nasceu
das maiores invenções tecnológicas, e era um manual de na Prússia, na cidade de
como funcionavam as máquinas mais sofisticadas da Koningsberg, onde levou uma
época no campo do artesanato, manufatura, e indústria. vida extremamente regrada e
simples. De origem
protestante e humilde, nunca
OS FISIOCRATAS se casou, nem saiu de sua
cidade natal. Dizem que
Na economia destacaram-se pensadores como quando alguém queria acertar
Quesnay e Turgot. Eles defendiam que a verdadeira o relógio, esperavam ele
riqueza de um país advinha da natureza, ou seja, da passar para saber a hora.
agricultura.
Apesar de seu estilo de vida simples, Kant foi um
O artesanato gerava pouca renda, e o comércio dos maiores filosóficos da história. Conheceu fama ainda
só fazia circular a riqueza. Somente a agricultura gerava em vida e suas obras sintetizaram o espírito de sua época,
os produtos, e por isso, somente ela produzia riqueza. sendo ele o maior porta voz do modo de vida
individualista liberal.
Eles eram fervorosos críticos do mercantilismo,
pois acreditavam que assim como existem as leis naturais A sua doutrina filosófica moldou o modo de ver
e pensar o mundo no alvorecer da contemporaneidade,
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influenciando diversas áreas do saber. Não há como Kant fez a grande síntese entre essas duas teorias
entender qualquer filósofo que veio depois dele, sem e ainda foi além. Este feito o tornou o grande filósofo da
estudá-lo à fundo, pois ele é leitura obrigatória para todo transição entre o mundo antigo e o moderno.
aspirante à intelectual.
Ele dizia que ambos estavam certos, porque
Conheceu a física de Newton na universidade, utilizamos a experiência e a razão para obtermos
reconheceu a contribuição de Hume sobre os limites da conhecimento, e ambos estavam errados, porque não
nossa capacidade de conhecimento, e estudou utilizamos apenas uma ou outra.
profundamente os filósofos iluministas franceses. Foi um
pacifista e defensor do regime republicano, apoiando a Mas assim como Copérnico avançou na
independência norte-americana. explicação do sistema solar ao colocar o sol no centro,
contrariando a teoria geocêntrica, era preciso abordar a
Ele escreveu as três grandes críticas das mais questão do conhecimento por um ponto de vista
importantes áreas, quais sejam, a teoria do conhecimento, diferente, colocando o sujeito também no centro da
a moral, e a estética, além de ter formulados os princípios questão.
do direito, e ter escrito À paz perpétua (1795), texto que
serviu de inspiração para criação da Organização das O homem não tem que regular o seu
Nações Unidas (ONU). entendimento pela análise dos objetos, mas os objetos é
que tem que ser estudados a partir da capacidade de
É de se deixar claro que o termo crítica está sendo entendimento do homem. Essa é a revolução
usado no sentido de análise, e não no sentido negativo de copernicana que Kant imprime na filosofia.
escrever coisas ruis sobre determinado assunto. O que ele
estava fazendo era analisar o que os filósofos haviam Para Kant, era necessário investigar o que existe
escrito sobre a razão. em nós que nos permite conhecer. A essa investigação ele
chamou de filosofia transcendental, não no sentido
Crítica da razão pura metafísico, mas no sentido imanente de conhecer. O que
é característico do homem que o permite conhecer? Ele
Na época de Kant a física newtoniana estava a nos diz que é a sensibilidade e o entendimento. Mas
todo vapor, os avanços obtidos pelas ciências eram como elas funcionam?
indiscutíveis, máquinas eram construídas de acordo com
suas leis e a humanidade começava a acordar para as Os dados do conhecimento, o material, nos chega
possibilidades de um progresso material e domínio da por meio dos sentidos, das experiências, no dizer dele,
natureza sem precedentes na história. pela sensibilidade. Sempre percebemos algo situado no
espaço e tempo, mas esses conceitos não estão fora de
Em contra partida, no campo da metafísica a nós, são forma a priori de percepção das coisas exteriores.
discussão não tinha fim, não havia consenso, muito Ou seja, espaço e tempo estão em nós e não no mundo.
menos progresso no debate, ninguém apresentava uma
teoria que fosse universalmente aceita. Perguntas como o Depois que percebemos uma coisa em um
que era Deus e a alma, sempre tinham muitas respostas, determinado lugar e tempo, essas percepções vão para o
mas nenhum consenso. nosso entendimento, que vai trabalhá-las por meio de
categorias inerentes a nós, como por exemplo, a
Então, o que Kant pretende responder nessa substância, a existência e a causalidade. Esta última,
primeira crítica é porque a física e a matemática muito importante para o avanço da ciência.
progrediram como ciência, enquanto a metafísica não. E
para isso ele teria que passar pelo grande problema Essas categorias são conceitos puros do
epistemológico sobre a possibilidade de conhecimento entendimento que estão presentes em nós, mesmo antes
das coisas: como nós conhecemos, e quais os limites do de qualquer experiência. São elas que fazem a síntese dos
conhecimento. dados percebidos para que possamos produzir
conhecimento. Nós pensamos os objetos por meio delas.
Nós já vimos que haviam duas correntes
filosóficas opostas, que davam respostas antagônicas Quando soltamos uma maçã, ela sempre cai no
sobre como conhecemos. O racionalismo dizia que chão por causa da gravidade. Quando colocamos a mão
tudo que conhecemos já estava em nossa mente como no fogo ela queima porque o fogo é quente e causa a
ideias, e o empirismo defendia que o conhecimento só queimadura. Mas essa relação de causalidade de um
era possível pela experiência dos sentidos com os objetos evento x gerar um efeito y não está nas coisas, nem é uma
exteriores a nós. crença proveniente do hábito (como afirmara Hume), ela

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é o produto de nosso entendimento do funcionamento Kant rejeita todas as doutrinas morais anteriores
do mundo. porque, segundo ele, elas estão fundamentadas em
Quando procuramos entender um objeto, não concepções metafísicas, portanto, impossíveis de serem
conseguimos entendê-lo como ele é em si mesmo. O que conhecidas pelo homem.
nós entendemos é só o que podemos entender com nossa Agir de maneira a conseguir um lugar no céu, ou
capacidade de conhecimento. Ou seja, entender um de acordo com o bem comum, ou para buscar a
objeto é entendê-lo somente como ele aparece para nós, felicidade, ou para evitar a dor, ou para alcançar um
entendemos apenas seus fenômenos, suas manifestações. interesse; nada disso faz sentido para ele, porque todas
É por isso que a ciência (física newtoniana) essas concepções metafísicas não podem ser
conseguiu avançar, porque ela trata de estudar os racionalmente sustentadas.
fenômenos, e não o objeto/a coisa em si mesma. Mas Quando ele fala que não podem ser
dizer que os objetos devem ser entendidos a partir do racionalmente sustentadas, ele quer dizer que não podem
sujeito não é cair em subjetivismo? Onde está a servir de fundamento para um agir moral que seja
objetividade da ciência? universal. Kant está à procura de uma fundamentação
Para Kant, a objetividade reside no sujeito, nas que sirva para todo ser racional, independentemente de
condições a priori da experiência. Não adianta tentar tempo e espaço, ou seja, não importa onde e quando ele
entender as coisas pelas leis do mundo porque as leis esteja.
estão no sujeito. E como todo ser racional possui essa Todo ser racional vai agir de acordo com essa
mesma estrutura de capacidade de conhecimento, fundamentação. E qual é a única coisa que é inerente ao
conseguindo conhecer da mesma maneira, ela não é homem independente do lugar ou da época que ele esteja
singular a um indivíduo A ou B, mas é universal à todo o vivendo? A razão.
gênero humano. O homem tem que seguir apenas as leis universais
Ser racional é possuir essa estrutura a priori que que a razão ordena para o agir moral, nada de ficar
possibilita a nossa capacidade de conhecer. A razão é a buscando outros motivos.
grande legisladora que dita as leis pelas quais conhecemos Para Kant, a moral produz dois tipos de ordens,
as coisas, ou melhor, seus fenômenos. que ele chama de imperativos: os hipotéticos e os
Mas sendo ela impotente para conhecer a coisa categóricos.
em si mesma, não pode falar, nem legislar nada sobre Quando o homem age visando algum interesse,
metafísica. Os conceitos de alma, Deus, liberdade, por ou seguindo alguma inclinação, ele age de acordo com os
exemplo, só podem no máximo ser pensados, mas nunca imperativos hipotéticos.
conhecidos efetivamente. Já quando ele age sem pretender obter nada,
A metafísica ao se propor ser um estudo da totalmente desinteressado, sua ação está obedecendo um
essência das coisas (lembrem dos gregos) só pode cair em imperativo categórico. Somente esse tipo de ação é, para
contradições. Por esse motivo é que não se consegue ter Kant, uma ação racional, porque é realizada somente por
avanço na metafísica, como se tem na física e na dever, e pelo dever.
matemática. Mas o homem não é um robô. Ele tem o livre
Imagine alguém dizer que conheceu/entendeu o arbítrio, a liberdade para decidir qual tipo de imperativo
que seja Deus, que teve um conhecimento objetivo do vai seguir. Desse modo, ele deve ter a vontade,
que ele seja; Kant perguntaria, mas como se todo nosso independente das circunstâncias, de seguir a lei moral.
conhecimento começa pela experiência? Qual foi o Essa vontade desprovida de qualquer inclinação é a boa
contato que você teve com Ele? vontade.
Mas Newton disse que descobriu as leis que Para Kant, o homem só é racionalmente moral
regem o funcionamento do universo, demonstrou e quando age por dever, sem nenhum tipo de interesse ou
provou que estava certo, e todos tiveram que concordar inclinação. Só esse tipo de ação pode ser universalizável,
com ele, por que através de suas experiências e cálculos que é uma exigência da razão.
matemáticos, ele usou a razão, o entendimento, para Assim, a resposta que Kant dá para a pergunta “o
dizer quais seriam essas leis. Lembrem-se, ele não disse o que fazer”, é: “age de tal maneira que o motivo que te levou a
que era a gravidade, apenas a descreveu como ela se agir possa se tornar lei universal”.
manifesta para nós. Essa é a regra de ouro da moral kantiana, que
serve para guiar o agir moral em qualquer lugar, tempo e
Crítica da razão prática circunstância. É uma regra universal.
A Crítica da razão prática é a obra em que ele analisa Assim, ele responde também à pergunta: “por
os fundamentos do agir moral. O que fazer? Por que agir que agir dessa maneira?”. O homem deve agir dessa
de tal maneira? São as perguntas que ele tentar responder forma porque essa é a maneira racional de agir. Seguir
nessa obra. uma lei ditada pela razão.
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Kant estabelece dessa forma a deontologia moral, divergências dos indivíduos. Assim, criam-se os poderes
que é agir somente por dever. E essa doutrina moral é Legislativo, Executivo e Judiciário, atuando de forma
formalista porque não admite nenhum tipo de motivação independente para a efetivação da liberdade, sendo que
que não seja o dever. esta não existe se uma mesma pessoa ou grupo exercer
os referidos poderes concomitantemente.
A dignidade da pessoa humana MONTESQUIEU, B. Do espirito das leis. São Paulo Abril Cultural, 1979
(adaptado).
Segundo Kant, o homem ao agir seguindo a regra
de ouro estará, ao mesmo tampo, sendo racional, e A divisão e a independência entre os poderes são
portanto, autônomo, e ainda, respeitando a dignidade do condições necessárias para que possa haver liberdade em
outro, pois ao tratar o outro como gostaria de ser tratado, um Estado. Isso pode ocorrer apenas sob um modelo
está respeitando a pessoa como um fim em si mesma e político em que haja
não como um meio para se chegar a algo.
a) exercício de tutela sobre atividades jurídicas e políticas.
O esclarecimento b) consagração do poder político pela autoridade
Kant talvez seja o único filósofo a se perguntar o religiosa.
que foi esse movimento que estava acontecendo em sua c) concentração do poder nas mãos de elites técnico-
época conhecido como Iluminismo. científicas.
E o descreve como sendo a saída do homem da d) estabelecimento de limites aos atores públicos e às
sua menor idade para começar uma época em que ele iria instituições do governo.
começar a pensar por si mesmo. Não iria mais estar preso e) reunião das funções de legislar, julgar e executar nas
a dogmatismos religiosos ou metafísicos, mas seguiria os mãos de um governante eleito.
preceitos da razão. “Ouse saber” era o lema que ele atribuía
a esse movimento. 15. (2012) Esclarecimento é a saída do homem de sua
menoridade, da qual ele próprio é culpado. A menoridade
é a incapacidade de fazer uso de seu entendimento sem a
QUESTÓES direção de outro indivíduo. O homem é o próprio
13. (2012) É verdade que nas democracias o povo parece culpado dessa menoridade se a causa dela não se encontra
fazer o que quer; mas a liberdade política não consiste na falta de entendimento, mas na falta de decisão e
nisso. Deve-se ter sempre presente em mente o que é coragem de servir-se de si mesmo sem a direção de
independência e o que é liberdade. A liberdade é o direito outrem. Tem coragem de fazer uso de teu próprio
de fazer tudo o que as leis permitem; se um cidadão entendimento, tal é o lema do esclarecimento. A preguiça
pudesse fazer tudo o que elas proíbem, não teria mais e a covardia são as causas pelas quais uma tão grande
liberdade, porque os outros também teriam tal poder. parte dos homens, depois que a natureza de há muito os
libertou de uma condição estranha, continuem, no
MONTESQUIEU. Do Espirito das Leis. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1997
(adaptado). entanto, de bom grado menores durante toda a vida.
A característica de democracia ressaltada por
KANT, I. Resposta à pergunta: o que é esclarecimento? Petrópolis: Vozes, 1985
Montesquieu diz respeito (adaptado).
Kant destaca no texto o conceito de Esclarecimento,
A) ao status de cidadania que o indivíduo adquire ao fundamental para a compreensão do contexto filosófico
tomar as decisões por si mesmo. da Modernidade. Esclarecimento, no sentido empregado
B) ao condicionamento da liberdade dos cidadãos à por Kant, representa:
conformidade às leis.
C) à possibilidade de o cidadão participar no poder e, A) a reivindicação de autonomia da capacidade racional
nesse caso, livre da submissão às leis. como expressão da maioridade.
D) ao livre-arbítrio do cidadão em relação àquilo que é B) o exercício da racionalidade como pressuposto menor
proibido, desde que ciente das consequências. diante das verdades eternas.
E) ao direito do cidadão exercer sua vontade de acordo C) a imposição de verdades matemáticas, como caráter
com seus valores pessoais. objetivo, de forma heterônoma.
D) a compreensão de verdades religiosas que libertam o
14. (2013) Para que não haja abuso, é preciso organizar
homem da falta de entendimento.
as coisas de maneira que o poder seja contido pelo poder.
E) a emancipação da subjetividade humana de ideologias
Tudo estaria perdido se o mesmo homem ou o mesmo
produzidas pela própria razão.
corpo dos principais, ou dos nobres, ou do povo,
exercesse esses três poderes: o de fazer leis, o de executar 16. (2012) Até hoje admitia-se que nosso conhecimento
as resoluções públicas e o de julgar os crimes ou as se devia regular pelos objetos; porém, todas as tentativas
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para descobrir, mediante conceitos, algo que ampliasse


nosso conhecimento malogravam-se com esse
pressuposto. Tentemos, pois, uma vez, experimentar se
não se resolverão melhor as tarefas da metafísica,
admitindo que os objetos se deveriam regular pelo nosso
conhecimento.
KANT, I. Crítica da razão pura. Lisboa: Calouste-Guibenkian, 1994 (adaptado).

O trecho em questão é uma referência ao que ficou


conhecido como revolução copernicana da filosofia.
Nele, confrontam-se duas posições filosóficas que

a) assumem pontos de vista opostos acerca da natureza


do conhecimento.
b) defendem que o conhecimento é impossível, restando-
nos somente o ceticismo.
c) revelam a relação de interdependência entre os dados
da experiência e a reflexão filosófica.
d) apostam, no que diz respeito às tarefas da filosofia, na
primazia das ideias em relação aos objetos.
e) refutam-se mutuamente quanto à natureza do nosso
conhecimento e são ambas recusadas por Kant.

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GABARITO

UNIDADE 1 – FILOSOFIA ANTIGA


1. d
2. d
3. b
4. e
5. c
6. c
7. a
8. a
UNIDADE 2 – FILOSOFIA MEDIEVAL
Ainda não houveram questões.
UNIDADE 3 – FILOSOFIA MODERNA
1. b
2. e
2. c
4. c
5. c
6. e
7. a
8. b
9. c
10. b
11. d
12. e
13. b
14. d
15. a
16. a

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