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A LEI N. 9.610 DE 19 DE
FEVEREIRO DE 1998 –
aspectos contraditórios.*
Vanisa Santiago
RESUMO
Analisa os aspectos contraditórios e as omissões relevantes da Lei n. 9.610/98, tecendo considerações sobre os
contextos histórico, técnico e político de sua tramitação, aprovação e sanção pelo Poder Público.
Aponta as imperfeições terminológicas da Lei dos Direitos Autorais, ao citar a ausência de definição legal quanto aos
conceitos de “público”, para fins de utilização de obras, e “privado” para os fins que lhe são próprios.
Conclui que a Lei n. 9.610/98, apesar de não ter sido a ideal para reger os bens intelectuais a que se destina, em um país
com extrema riqueza criativa e mercado de dimensões consideráveis, foi a possível no momento histórico de sua
aprovação, visto que tais aspectos negativos não lhe retiram qualidade e modernidade.
PALAVRAS-CHAVE
Lei n. 9.610/98 – Lei dos Direitos Autorais; Conselho Nacional de Direito Autoral–CNDA; ECAD.
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* Conferência proferida no "Seminário sobre Direito Autoral", realizado pelo Centro de Estudos Judiciários, nos dias 17 e 18 de março de 2003, no
Centro Cultural Justiça Federal, Rio de Janeiro - RJ.
U
normativa, no caso, o projeto do en- questões: a da cópia privada, a da
ma análise dos aspectos con- tão Deputado José Genoíno, inspira- centralização da gestão coletiva dos
traditórios, inconsistências e do nos estudos que haviam sido ela- direitos musicais de execução públi-
omissões relevantes que a Lei borados pelos membros do CNDA. ca e a da existência de um órgão
n. 9.610 de 1998 apresenta, não po- Há cerca de sete anos, o en- governamental de fiscalização e con-
deria dispensar considerações pré- tão Deputado Aloysio Nunes Ferreira trole. Outros pontos também levanta-
vias e esclarecedoras sobre os con- recebeu a incumbência de relatar o dos foram os relativos à cessão de
textos históricos, técnicos e político Projeto, encontrando grandes dificul- direitos, às obras realizadas por en-
de sua tramitação, aprovação e san- dades para conciliar as propostas comenda ou em cumprimento ao de-
ção pelo Poder Público. divergentes e os interesses contradi- ver funcional e às obras audiovisuais,
Na verdade a lei de 1973, vi- tórios dos setores envolvidos, os amplamente discutidos para que se
gente até a promulgação do diplo- quais impediam que o processo de pudesse encontrar fórmulas que har-
ma em análise, necessitava ser atu- modernização da legislação brasilei- monizassem os interesses de diferen-
alizada para que suas disposições ra sobre os Direitos de Autor seguis- tes segmentos.
se tornassem adequadas aos novos se seu curso normal. Finalmente, em A aprovação do novo texto pela
meios de utilização das obras, sur- 1997, o projeto do Senado, com to- Câmara dos Deputados teve lugar no
gidos a partir do vertiginoso progres- dos os seus apensos, foi remetido à dia 10 de dezembro de 1997, após 4
so tecnológico que se verificou nas consideração de uma Comissão Es- horas de discussões em plenário,
décadas seguintes à de sua promul- pecial constituída por 40 deputados, com a lamentável supressão dos arts.
gação. tendo sido designado como Relator 104 e 105 do “substitutivo adotado
Algumas iniciativas nesse sen- o próprio Deputado Aloysio Nunes pela Comissão”, que se referiam à
tido foram tomadas no final dos anos Ferreira. Essa Comissão Especial foi compensação pela cópia privada de
1980, tendo sido as mais importan- presidida pelo Deputado Roberto obras e fonogramas em suportes
materiais virgens 2.
Uma vez aprovado na Câmara
dos Deputados, o Projeto foi alvo de
críticas severas que partiam do setor
artístico, fortemente mobilizado con-
Em Direito Autoral a noção de público não pode ser tra as presunções juris tantum incluí-
das nos arts. 36, 37 e 38, relativas às
confundida com a de privacidade, como no caso do direito obras elaboradas em cumprimento ao
dos hóspedes que se encontram em um quarto de hotel. dever funcional, às obras por enco-
Nesse tipo de estabelecimento os apartamentos são postos menda e às obras audiovisuais.
Uma vez devolvido ao Senado,
à disposição de “um público”, que são os hóspedes, que sua casa de origem, o substitutivo já
obviamente têm direito à privacidade e nem por isso o uso não poderia sofrer emendas. As úni-
cas alternativas possíveis, conforme
das obras pode ser considerado privado. determina o Regimento do Congres-
so Nacional, seriam a de sua aprova-
ção na íntegra ou com supressões,
ou então a de sua rejeição como um
todo. Com parecer favorável do
Relator na Comissão de Constituição
tes a que se originou no então atuan- Brant e contou com a participação e Justiça, o substitutivo foi encami-
te Conselho Nacional de Direito Auto- ativa da Vice-presidente, Deputada nhado à votação em plenário no dia 4
ral–CNDA 1 e o projeto, apresentado Jandira Feghali e do Deputado José de fevereiro, durante a convocação
pelo falecido Senador Luís Viana Fi- Genoíno, bem como de parlamenta- extraordinária no período de recesso
lho em 1989, rapidamente aprovado res de diferentes cores políticas. do Legislativo.
em plenário pelo Senado Federal, sem Concluída a árdua tarefa de Na votação em plenário o Pro-
emendas. examinar 34 textos diferentes, muitos jeto foi uma vez mais aprovado por
O Projeto oriundo do Senado, dos quais continham disposições unanimidade pelo Senado, em regi-
que mantinha a estrutura jurídica e inconstitucionais, o Relator refundiu o me de “urgência urgentíssima”, com
técnica da lei anterior, foi encaminha- texto do projeto original do Senado, a supressão dos arts. 36, 37 e 38 já
do à Câmara de Deputados em 1990, incorporando alguns preceitos conti- mencionados, registrando-se críticas
sob o número 5.430, tendo sido acom- dos no “Projeto Genoíno” e apresen- quanto à forma acelerada com que
panhado por diferentes relatores na tando um substitutivo que foi subme- havia sido votado naquela Casa, após
Comissão de Constituição e Justiça tido a debates entre os membros da quase dez anos de letargia na Câma-
e submetido a debates em diversas Comissão, passando em seguida a ra de Deputados e quanto à manu-
audiências públicas. Durante sua lon- uma fase de consultas com os seto- tenção da centralização da gestão
ga tramitação nessa Casa outros 33 res públicos e privados interessados coletiva dos direitos de execução
projetos sobre a matéria foram na matéria. Esse trabalho não se res- pública das obras musicais e fonogra-
apensados ao projeto original e apre- tringiu ao campo técnico-jurídico, mas mas em um escritório central, já que
sentados por parlamentares de dife- também ao de articulação política de o Escritório Central de Arrecadação e
rentes partidos. Alguns deles se res- um acordo que tornasse possível a Distribuição–ECAD havia sido subme-
tringiam a alterar parcialmente a Lei aprovação da nova lei. Durante a fase tido a uma Comissão Parlamentar de
n. 5.988/73 e apenas um deles pro- de consultas, os pontos mais polê- Inquérito na Câmara dos Deputados,
ABSTRACT