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Boa tarde.

Em nome das turmas de Música, Teatro e Artes


Visuais que colam grau hoje, gostaríamos de agradecer a
presença de todas e todos nesta tarde de quarta-feira,
principalmente aos nossos familiares, amigos e amigas e
pessoas que amamos tanto e que tiveram a disponibilidade
de numa quarta-feira às 15h30 estarem aqui, nosso muito
obrigado.
Hoje é dia 20 de fevereiro de 2019, dia histórico para a
cultura brasileira, aqui nesse palco formam-se artistas,
músicos, atrizes, atores, professores e professoras,
performers, pesquisadores e o mais importante: agentes de
transformação cultural do país. Hoje também é o
51º(QUINQUAGÉZIMO PRIMEIRO) dia do ano, diante das
atrocidades encontradas em apenas 51 dias de um “novo
país” onde a pauta cultural não é vista como PIB, nós artistas
não seremos poeira, faremos poeira.
O percurso nunca é fácil quando o assunto é arte,
principalmente quando essa caminhada artística nos guia
para uma formação acadêmica e profissional. O Centro de
Artes da UDESC diante dos seus 34 anos, forma artistas que
potencializam a expansão artística na região sul, em Santa
Catarina e em Florianópolis, é também através do CEART
que Florianópolis consolidou-se enquanto um dos mais
importantes polos de formação artística do país e hoje nós
fazemos parte dessa história.
Como não lembrar da nossa chegada na Universidade?
Muitos abdicaram de suas cidades, de suas famílias, dos
comodismos encontrados na vida para começar uma nova
história em uma cidade diferente, eu por exemplo vim da
Europa, sai de Chapecó. Estudar artes, seja ela música,
teatro ou artes visuais definitivamente não é para todos, mas
não estou falando deste tal de “talento” que nos fizeram
acreditar que existia, estou falando do acreditar na arte que
nós há muito tempo nos demos conta que ou era isso ou era
nada. Sabe aquela pulga atrás da orelha? Então, as nossas
algumas vezes estavam manchadas de tinta, segurando um
violão e tentando entender a frase “ser ou não ser, eis a
questão”.
E como evitar as perguntinhas da família “você faz teatro?
Conta uma piada pra nós!”, ou ainda “você toca violão? Ah
Toca Raul!” e a clássica “adoro artes, tenho ate um quebra-
cabeça do Romero Britto”. Bom, poderia ser pior, imagina se
fizéssemos medicina! Brincadeiras a parte, ou nem tanto.
Naquele dia iniciamos nossa evolução, não só enquanto
artistas, mas também enquanto pessoas sensíveis,
generosas e abertas para novas descobertas. Nossa vida
artística-acadêmica inicia-se em um período histórico no
Brasil, marcado por muita luta contra retirada de direitos e
principalmente contra toda forma de censura e fascismo que
encontramos durante este período, estamos falando do pós-
golpe. Nossa força de luta fez-se valer pelos momentos de
convivência e de planejamento artístico, onde um ato de
revolução não era só ir pra rua em caminhada entoando
cânticos revolucionários, mas em levar nossa arte para a
rua, em levar arte de luta para pessoas que não tem acesso
à universidade, rompendo com os muros da academia,
ressignificando a própria extensão universitária e a nossa
própria arte. Nosso saber artístico fez-se preenchido na rua.
A melhor maneira para conhecer nossas e nossos
companheiros de vida artística e acadêmica é estar ao lado
destes que nos impulsionam para seguir em frente, sem
medo do amanhã, mas com curiosidade para entender o que
se pode encontrar no caminho. Foi diante das ocupações
feitas por alunos, alunas, professores e técnicos que nós
conhecemos a fundo uns aos outros, destaco aqui a
Ocupação do Restaurante Universitário em 2015, onde
reivindicávamos um preço acessível e digno a todos e todas
pelas refeições para romper com o título que a UDESC
levava de “RU mais caro do Brasil”, até hoje ele é o mais
caro. Destaco também a Mobilização Estudantil no Brasil ou
a Primavera Secundarista no final de 2016 e a grande
ocupação do Ministério da Cultura – MINC em 2016 logo
após a extinção do Ministério por um governo que não
representava a classe artística e grande parte da população
brasileira, o prédio no Largo da Alfândega recebeu mais 100
ações culturais gratuitas. Nossas lutas se cruzaram e assim
nos emancipamos enquanto figuras que buscavam e
buscam uma universidade de qualidade, acessível a todas
as pessoas e plural em suas diferenças, que valorize a
permanência estudantil e acessibilidade da educação.
Diante das diferenças, da pluralidade e força artística
encontrada em um pequeno espaço da universidade do
estado de Santa Catarina, o CEART, tivemos o privilégio de,
ao andar em direção as salas de aula, nos deparar com as
colegas da música e seus instrumentos potentes e
apoteóticos, com provas públicas do teatro na arena do ceart
e as cerâmicas do pessoal das visuais que secavam ao sol.
Toda essa magia interrompida por alguma buzina maldita
vinda de algum aluno da esag estacionando o carro que
ganhara do pai.
Sexta-feira parecia não chegar para aqueles que
aproveitavam das boas aulas de confraternização e
encontro com Dionísio. As aulas nesse espaço no verão
eram impossíveis, o truque era sempre o mesmo: leva o
repelente na mochila e esconde bem pois se alguém ver tu
passando, acabada em dois minutos. As cadeiras amarelas
da apreciada cerveja Glacial ornavam com as mesas verdes
de sinuca. Era ali, bem ali que a formação continuada da
universidade tomava corpo e quase sempre a disputa na
seleção de música da juk-box nos tornava inseparáveis, ou
tão próximos que você poderia observar rápido um encontro
de contato e improvisação no meio da sala de aula. Pra
quem não entendeu, sim era um bar, mas não qualquer bar,
migramos. Como bons artistas mambembes, passamos por
vários estabelecimentos: iniciamos no Capengas, colamos
no Sobradinho e terminamos no Pacheco.
Mas, como todo artista que se prese, bons artigos e
trabalhos de conclusão de curso nasceram numa mesa de
bar, compartilhando assuntos entre colegas e percebendo
que a universidade em nossas vidas é só mais um detalhe,
ou quem sabe, uma grande rodoviária onde embarcamos em
boas viagens.
Parcerias foram firmadas, relacionamentos iniciaram e
terminaram, amizades ruins vieram e foram. Mas diante do
caos encontrado no mundo e no país, das diversas vezes
que pensamos em desistir e fraquejamos, sabíamos que a
única certeza era a arte e então fazíamos valer na prática a
proposta curricular “ninguém solta a mão de ninguém”.
Sabíamos que só ela nos salvaria da podridão do mundo e
questionaríamos sobre o que não era certo, ou talvez o que
nos levaria para o caminho das trevas. Sabíamos desde o
princípio que nossa área, por mais desvalorizado que fosse,
era a única que derrubaria os muros da censura, da
violência, do desamor e da falta de sensibilidade com as
diferentes formas de vida.
Olhem para o lado e vejam essa figura artística majestosa
que conclui esta etapa com você. Quantas momentos bons
essa figura passou com você no caminho truculento da vida
acadêmica? Hoje estamos fazendo história. Por todas e
todos que já passaram abrindo caminho para que hoje
pudéssemos estar aqui, por todas as horas dedicadas a arte,
por nossas famílias plurais que sempre nos acolheram e
hoje nos fazem virar mais uma página do nosso livro
chamado vida, só temos a agradecer. Como já diz o poeta
“amanhã vai ser outro dia” ou quem sabe acordaremos
desse berço esplendido ao som do mar e a luz do céu
profundo. Artistas, hoje mais do que nunca sabemos da
força e da necessidade em se fazer arte, em se pensar e
discutir arte e poder leva-la para espaços não habitados.
Pela diversidade cultural, pela fruição da arte, pela
valorização das diferentes formas de expressão da arte e
pelas políticas públicas culturais, nós artistas RESISTIMOS!

Muito obrigado.
Arthur Gomes
20/02/2019

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