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a4 Note-se que estas distingSes se aplicam a toda a teoria das ciéncins sociais ¢ que os problemas que elas colocam, (podemos ¢ devernos, desde logo, dirigir © cestorgo para determinada categoria? Podemos ¢ deve- ‘mos combinar diversos tipos? Qual ¢ 0 melhor método? etc.) sto problemas comuns, a todas as teorias em tencla politica, Tambern as andliscs as quais x entregou M. Jean Meynaud, a propésito desta, si0 transponiveis para o estudo das relagdes internacio- nnais!. Ainda assim, a teoria destas relagoes apresenta ‘uma originalidade profunda ¢ os problemas comuns colocam-se com uma acuidade ou sob formas parti- culares. (9 Wer vu Introduction oo sci politique (Paris, 19°9),€1 particular ov capitulo Fa ds VI aa 3 45 ‘TEORIA DAS RELACOES INTERNACIONAIS DEFESA DA ABORDAGEM CLASSICA Medley Bull Duas abordagens da teoria das relacées interna- Cionais, disputam a nosse stenco no momento actual. Designarei por classica « primeira destas abordagens. Naventendo por ela oestudo ea critica dos «clasicas> das relagoes internacionais, os escritos de Hobbes, de Grotius, de Kant ou de outros grandes pensadores do passado, que s¢ consagraram aos assuntos internacio- nais. Um tal estudo, constitui, certamente, um exemplo ds abordagem classica ¢ fornece um métado particular- mente frutuoso ¢ importante. que tenho em mente & no entanto, qualquer coisa de muito mais amplo: a saber, a abordagem tebrica que deriva da fllosofie, da historia ¢ do direito € que se caracteriza, sobretudo, Por uma confianga explicita na utilizagio do raciocinio © pela suposicio de que nao ‘diremos multas coisas importantes a respeito das relagdes internacionais, se thos limitarmos a critéries apertados de verificagao © de prova; isto quer dizer que 9$ proposicaes gerais sobre este assunto devem derivar, por consequéncia, de um processo de percepcio ou de intuigao cientifica- * “Tradurido de sInvertational Theory: The Carer» Classical ‘Appevachs, World Poics, wl. XVM, 1968, gp. Ml 377. 36 mente Imperfcito © que nao podemor dar = essas proposicdes gerals ouira coisa senso o estatuto hipoté- fico e nao conclusivo, proprio da sue origem incerta. Praticamente todos o$ ensaios te6ricos em relacoes internacionais se fundamentaram, até hi pouco, na abordagem que acabamos de descrever. Esta abordagem € perfeitamente reconhecivel nos diferentes ensaios ssistematicas de teoria internacional da nossa epoca — ‘em trabalhos como os de Alfred Zimmern, E. H. Carr, ‘Hans Morgenthau, Georg Schwarzenberger, Raymond Aron e Martin Wight. E, sem divida alguma também, ‘0 método dos seus diferentes precursores, em relagao aos quais tentaram reunir os pensamentos esparsos € as andlises parciais: filésofos da politica, como Maquiavel ou Burke, juristes, como Vattel e Oppenheim, panfletirios, como Gentz ou Cobdem, historiadares, como Heeren e Ranke. E porque esta abordagem foi, durante muito tempo, 4 abordagem comum, que a podemos denominar de classica Designarei por cientifica a segunda abordagem. Decidi chama-la de cientifica, em vez de cientista, « fim de nio prejudicar a questo que quero discutir. recorrenda a um termo pejorativo. Ao utilizar este termo, para esta segunda abordagem, tenbo entretanto ‘em mente mais.as aspiragdes daqueles que aadoptam, do que aquilo que concretizaram. Eles aspiram a uma teoria das relacdes internacionais, cujas proposicOes seriam haseadas em provas légicas ou matematicas, ‘ou em estritos procedimentos empiricos de verificagio. Alguns deles consideram as teorias classicas das rela- {¢6¢s internacionais como nio tendo nenhum valor € imaginam-se os fundadores de uma ciéncia absoluta- a mente nova, Outros, admitem que os resultados da abocdagem classica tinham algum valore consideram- nos, talvez até com alguma simpatia, um pouco como © dono de um carro de 1965 contempla um modelo mais antigo. De qualquer modo, nos dois casos, eles esperam © eréem que o seu proprio tipo de teoria suplantara completamente 0 tipo clissico. Como os adeptos do positivismo légico, quando eles tentaram apropriar-se da filosolia inglesa nos anos 30, ou como os brilhantes jovens tecnocratas do Sr, Me Namara, quando entraram no Fentagono, eles consideram-se como homens novos, experimentados ¢ de espiritofrio, Que assumem a sucessio de uma disciplina usada « imprecisa ou de uma pseudo disciplina que tinha conseguido, até ai, escapar ae métode cieatifico, por uma estranha manigancia, mas gue teve sempre, como destino inevitavel, o dever de sucumbir perante eles. A abordagem cientifica na teoria das relagées inter- nacionals, assim definida, aparece na teoria dos sis temas internacionais, tal como € desenvolvida por Morton A. Kaplan ¢ outros, em diversas extrapolacées da teoria dos jogos, de John von Neumann e Oskar Morgenstern, na teoria da negociagio (morchandage) de ‘Thomas C. Schelling, nos trabalhos de Karl W. Deutsch, sobre as comunicacdes sociais, no estuda de William H. Riker, sobre as coligacies palitieas, ros modelos de conducio da politica externa, elaborada or George A. Modelski e outros, nos estudos materna- ticos ds corrida aos armamentos ¢ dos coallitos mori feras de Lewis Richardson e nas teoriss dos conflitos, desenvolvidas por Kenneth Boulding © Anatol Rapo- Port. Ela parece constituir, igualmenyd, tuyia fpane 38 importante do conteddo do que denominamos «inves- LigagGes sobre @ paz=' ‘Os estudos que mencionci diferem muito no que concerne aos métodos utilizados ¢ is questéxs tratadas B inegivel que os seus autores, longe de enfrentarem © mundo exterior formando uma frente comum, consi deram-se geralmente uns acs cutros com a hostilidede dos lideres das scitas marxistas, Podemos avancar que existem também desaeordos importantes entre estes ‘autores, quanto & medida em que esclareceram 0 nosso tema. Por outre lado, oque eu denominei de abordagem cientifica nao esté patente, em todos, de maneira idéntica. E perigoso considera-los em bloco ¢ ¢ dificil evitar que criticas dirigidas so conjunto ndo parecam injustas em relagao a alguns. Todos estes estudos € todos estes modes de proceder incorporam, de algum modo, a abordagem cientifica e, a0 discutirmos esta abordagem, & necessério limitar s nossa atencio ac que eles tém de comum.(..). T” Ver, por exemple, Merton A. Kantas, Stem anal Process ar Iriemationel Poliics, New York, 1957: Oskar Moncessttan. The ‘Question of Natiomal Defense, New York, 1959: Thomas SevELLIN, The Stategy of Conflict, Cambridge (Mass), 1940; Karl W. Davis tal, Polincal Comonty ava the Neth Atte Are Internanional Orpenicaton in the Light of Histeseal Experience, Prietion. 1987 William H. Rinex The Thairy of Political Cocitions. New Haven, 1962; George A. Monet! A Thoorr of Foran Policy, New York. 1962: Lewss F. Ricauaesos, Arme and Insecvity: A Mathematical ‘Study ofthe Causes and Origin of War, ed by Nicolas RasievSKS and Ernesto Taveco,ittiburgh, 1960; Siarscs of Daady Quarrel, ed ‘by Quincy Waicirt and CC. Larxau, Pittsburgh, 1560: Kenneth [BouLDING, Conflict and Defense: A General Theory, New York, 1962; jpnatel Rasorunr. Fighs, Games, ond Delaom, Ane Asher, 9060. A literatura que emergiu da abordagem cientifica deveria, sem qualquer diivida, ser considerada seri mente. Se a julgarmos segundo os seus prdprion critérios de preciso légica e de rigor cientifico ela é frequentemente, de alta qualidade. Por outro lado, por mais desfavoravel que seja a atitude que adoptemos em relagéo a cla, ¢ impossivel examina-la com atengao € simpatia ¢ concluir que a sua contribuigio para a compreensay das relagdes internacionais ¢ nula. Com feito, seria extraordinario que essa eontribuigéo fosse nula, dada @ grande concentragao de energia e de talento que entrou na produgo desta literatura nos ultimos anos. _E pois desejavel, se devemos rejeitar a abordagem Cientifica, que nos demos ao trabalho de examinar e formular as objecydes que tenhamos a seu respeito. Hoje em dia ela esta de tal modo desenvolvide que 0 ‘siléncio a seu respcite ou pior, o denegrir facil com que ela € por vezes acolhida pelos criticos ingleses, niio bastardo para a pir em causa, Se, como eu creio, a abordagem cientifica deve ser firmemente margi lizada, isso néo se pade realizar senao através de uma critica racional. 0 (..) A abordagem cientifica contribuiu e ¢ susceptivel de contribuir muito pouco para a teoria das relacdes internacionais ¢, na medida em que se prope spoderar da abordagem classica e finalmente de_a.repelir, &

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