Você está na página 1de 11
Campina Grande De(FL)vORADA Por FoRASTEIROS: a passagem de Campina_patriarcal a Campina burguesa Siléde Leila Oliveira Cavalcanti’ 1. Os Discursos Que Inventam CaMPina agens de Campina ... a essas imagens poéticas se jun sempre “tendenciosas”... © se ias dessa cidade, ela pode ser pensada, sentida, resignificada e vista através de varios angulos e olhares (sem ‘que com isso se hierarquize saberes), possi desfile de imagens, tal qual um caleidoscépio, vislumbrando inameras Post so possiveis c século pasado, e de modemizagao e urban das de 30 e 40 desse século, discursos ordinarios-populares, ‘ofessore do ensino médio da Rede Estadual - PB e mesire em Historia pela UFPE. he CCaurnin Grane De(F:)voRAoA Pon Fonastenos 58 uma Campi tos com estranh que teria sido educada de triarcal, onde cabia a seu legitimad: diresdo a sua vi Desautorizando o casamento religioso, dentro de uma ordem ao mesmo t se em outros lugares sociai varios forasteiros), de cafe Se todo 0 seu esp! Oque se dizé que, pelasi hua”, portanto, i paz” de responder por deflorada por um tal forasteiro, que desde as sado aqui chamados “Tro (do Sertéo, C al, peles, couros e gado para vender e trocar todo 0 Estado e 105 € de comportamento recatado, agrario ¢ quase rude; e mais, ‘dono”, 0 homem provedor e racional ida, a seus passos, a seus desejos € a seus amores. casamei /erso Ge codigos bur vai resignificar normase valores josa e costumeiramente, pois, depois de conhecer o amor tucionalizado eas vezes nio legitimado, vai colocar- Enfim, Campina her perigosu. Talvez dai adver hoje deseja ser Nova York, um dia quis ser Paris. Paris com :ndor, brilho e sedusso, gem” e “ing@- logo, assexua- inf as décadas do século pas- -gou, com centenas de outros, em lombos de animais, Eram os ‘0s da Borborema” que traziam, em cima de patas de Agreste e Litoral) produtos agricolas variados e, feira que ganhou alcance em ¥ém em municipios de estados circunvizinhos como Per- nambuco, Cear’ e Rio Grande do Norte. Alirmagao. 2 imprensa de Campina Grande, por Gilberto Gil, no ano de 1983, 10s eu nfo, lembram que Campina tinha um eor- vas, entradas e passagens potencialmente flexi ente sedutoras, pois fundia, ligava, enredava e confluia as mm. Bfetivamente, sua geografia era privilegiada, visto cla espacialmente e cortejada por outros lugares, ao mes- - eestes lugares, encontrando e tocando as suas perife- centro, 0 seu amor e suas trocas, ¢ desejan- migrando, viajando wento, pro~ fe muito em- {is vezes com timidez, as vezes com atrevi ito ousadas para a época; eles eram realm ;, voltando a “moral” da menina, o que se diz é que, depois da lesses mascates, feirantes e forasteiros, ela no foi mais a mesma gestada e nascida, no final do século XVIII, de dentro 0 pecuéria, pequenina, frégil, mas de um valor imenso, e, por cenfeitada e embrulhada para ser dada de presente a rainha; dat clo em princesa da Borborema, caprichosa, atrevida e ousada. ade, diz-se que, Campina cidade menina-mulher e desvirginada, ais exibidas em espago piiblico, quando, seu pai, como de, procura a justica para roubador de honra familiar. erdida” da mulher passa a ser , onde questbes, antes resolvidas no ambito as condutas e praticas amorosas, sfo transferides para 0 espago instituigdo juridica , que procura administrar as condu- Jo um certa moralizagao dos costumes, busca, a0 mes- .¢a privada para uma sangéo pil sagdo dos costumes e das con- -vivenciada pela Europa em fins iado, detoda asociedade, 2 da invasdo do Estado Modemno Burgues, através do ‘Ordem privada, come a condula moral © sexuel 1.4 Vontade de Saber. ‘Caurna Granoe Detri)voraan Pon Forasienos 61 na Grande, assim como, por nas décadas de vi nimeras filhas ¢filhos desta, mais especialmente, juenta, visto ser, 0 periodo da icagio de seu eres & rua, a0 es- ‘paso publico, incremento do lazer, Todos esses deslocamentos, mudangas e crises de valores de Cam; Grande, preocupam as autoridades, em especial as autoridades médicas, cas ¢ educacionais. Era preciso cuidar da morale preservar 0s bo de Campina e de seus res e decentes, bem com Era necessério 0 Estado tomar o lugar da fa nar et nova fa zando seus membros, e seu comporta costumes lar @ \orma e, das mulheres, ica, as pragas, as izando que saiam da esfera privada e doméstica, para a esfera escolas, 0s escritérios, as feiras © proceso de republicanizagéo das condutas sexuais avés do aparelho ndireta Jjudici sendo encaminhado desde o primeiro cédigo penal, o de 1890; instrumento gal, eminentemente liberal, difunde um valor burgués de trabalho, bem comode moral sexual e de familia. ‘A parte especial da primeira redagdo penal republicana, sob o titulo “Dos crimes contra a seguranca da honra e honestidade das familias e do ul- traje piiblico ao pudor”, veicula ¢ estabelece um determinado tipo de norma de honra feminina e revela como o Estado entra como ‘Ao mesmo tempo, protege a “célula mater da sociedade” de desom mento e na aceitago de um casamento legal. A legislagao penal eral”, da conseqi € da construgo de uma naga ind de equiparago do Brasil com os paises ca lobo, €0 instrumento legal de efetivacao desses objet senvolvidos do os. Ordem e progresso simbolizavam o desejo de ser uma nago rica, poderosa, moderna e civilizada, tal qual a Europa e os Estados Unidos. O nascimento da Repiiblica foi marcado por uma tentativa de controle mais sistematico, pelo menos a nivel de prolifera¢do de normas institucionali- zadas, sobre todos os movimentos da sociedade. Os cédigos penais, nesse 62 luacens MurrACETADAS OA Heron CE Catena GRACE a promover a difuséo de modelos burgueses de indivi- sado, de trabalhador laborioso € de membro de fa ‘ocidadao completo € cumpridor de ivamente “Os ju sim como os médicos, apeis interdependentes; eft te peli aa uardides de um projeto de progresso e civilizagdo que se impunha & sociedade e que passava evidentemente pelo aspecto do comportamento (ESTEVES, 1989:47, prifos meus) Em certa medida, 0s discursos e praticas da Justiga néo fazem mais do legi -galizando-os € normatizando-os, os costumes instituidos social- Je legit alizando- sen ’ vi 3's € adequando-os a uma ética liberal-burguesa (porém, iercalicen ela al 30s do sexo, por parte da para homens e mulheres, ¢ 1s diferentes (anormais, res- mora jo elaboradas e, assim, izados ficado no artigo 217 como ato de “seduzir mux anos € maior de catorze, e ter com ela con- orais) so margi O crime de seducio, ther virgem, menor de dezoi ; juncao carnal, aproveitando de sua inexperiéncia ow jus ‘anca”, & um caso em que se percebe, mais claramente, essa espé , oriundos do senso comum e dos cédigos e das nor- mas juridicas, pretensamente cientificas. Consuetudinariamente, o deflorador era punido, ou com a imposigao de casamento, o que ocorria menos, ou com @ : uma vinganga privada, evelando-se, para a Just iva. Dai, 0 enunciado dos cédigos emprestar vida legal a0 que, ha autoridade efetiva nas relagdes cotidianas; um enfoque ‘05 costumes, ocorrendo uma es- médico, juridico, racional e moderno reveste os costumes, ocor indamentado nos cédigos re- imeiras décadas do século, em 1a maior procura das far proceso de legalizacao dos costumes, publicanos, éexperienciad, por Campina, nas especial a partir da década de trinta, quando ha ica. O evid pela ee (sexvais) revela, ao mesmo tempo, uma maior procura das fa cia juridica, nos casos de resgate & honra, bem como se \dependente dos seus membros. Jstiga no seio "Ba oni deervnpt its db EA ei ef 40 brasileira, em especial de Campina, denota 0 que Fouc Compr Grance De(stJvonaon Pos Fonasrenos explosio discursiva da sexualidade, ocorrid itag4o institucional a falar do sexo, politica, econdmica, técnica a falar do sexo... §2b w idade, de classificagdo e de especificacao, através quantitativas ou causais" (FOUCAULT, 1982:27) Precisava-se ralmente aceitével e tecaicament tomada como objeto de andlisee alvo sexual dos casais uma O referido processo de insitucionalizagto, de centifcizago eraconal izagdo do sexo, seja na ordem da economia, da medicina , da pedagogiae de a ca, incintando, organizando e normalizando condutas sexuais, seqiesra 0 corpo da ‘mulher, o qual passa ser um problema cientificoe piblico, Osiseursoda Justica, fundamenta-se nessa cincia da sexualidade, que legitima e impée modelos de normalidade, de patologia, de doenga, de perversdo & de: ‘A nova redapo do Cédigo Penal Brasileiro, de 1940 como mais um ety. mento de moraliza¢ao dos costumes do Es eral, é marcada por um olhar dor dos costumes, Nele, a sexualidade da mulher aparees . ora da familia, ra do Estado, porém, nunca dela mes Tudo se passa como seo corpo assexuado (da mulher) para o deseja ara o Barer, mas Féril para areprodusdo,precisasse de uma protes4o e de uma tele do Estado modemo. A violéncia sexual é pensada em relacio a uma Propriedade. A mulher nio tem a posse de si, tudo indica que el pois ndo consegue responsabilizar-se pelos seus atos, no ambi toda asociedade. Com isso, revela-se, no disc de sexo, mo- Por isso a conduta sexual da populacao & fe intervengdo, fazendo do comportanents nduta econémica e politica del yerada. ide sexual do corpo, vida sobre suas decisdes pessoais e privadas diversas maneiras sar & mulher atus de sujeito. "(VIGARELLO, 1988-43) A mulher ndo representa ninguém legalmer Porque, nos processos crimes. pesquisados, desde a primeira até a quinta década, a mulher raramente aparece como responsive ou tutora, seja do réu, da da testemunha; elas no sto (mies) capacitadas a responder Juridicamente pelos filhos, cabendo ao pai a condigo de tutor dos Se nao tem capacidade de responder pelos filhos, Soas! Com isso, s6 aparece como testemunha quando me recu- ‘mesma. Iss0 explica década desse sé magine por outras pes. € pega chave e, cena, 9 Seu depoimento, po no te respaldo juriico, poda anes penn ajudar, a quem ela defendesse, visto se configurar em palavra de my,

Você também pode gostar