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[DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGACAO NA PUBLICAGAO (CIP) (CAMARA ERASILEIRA DO LIVRO, 5, BRASIL) Hstéria de literatura: © discurso fundador / orgarizayso Carmen Zk Bolognin. - Campinas, SP: Mercado de Letas, Ascciazto de Leitra do Basi (ALB); Sto Pavio: Fapesp, 2008.-\Colegdo Histirias de Leitua) “Textoe de Bouterwek /tredugéo de Carmen Zink Bolognini ISBN 85 7591.014-0 is 1. Bouterwek, Friedrich, 1765-1828 —Criic e iterprete¢ao 2. Literatura Historia e critica 1. Bologrini. Cermen Zink. ll. Série... 02.2813 00-809, Indices para catéloge sistematico: 1. Literatura Histriaeerlica 802 COLECAO HISTORIAS DE LETTURA ~ conselho editorial: Associagho de Leitura do Brast cape: Vends Rotts Gomidé prepereeso dos originals: Antonio Barros de Brito Jnior Mariée Marcelo Braide DIREITOS RESERVADOS PARA A LINGUA PORTUGUESA: © MERCADO DE LETRAS EDIGOES E LIVRARIA LTOA. Miva Berbota de Andrade, 111. Telefax: (19)3241-7514 ‘ 13073-410 - Carnpinas SP Bras ww mercado-celtrs.corm.bt Emil ivos@mercedodelevas.combr :ASSOCIAGAO DE LEITURA DO BRASIL? Faculdade de Edueagc/Unicamp idade Universitétia “Zeferino Var" 18081-970 - Campinas SP Brasil. Fone: (19) 3289-4166 2003 : Proibida a reprodugio desta obra ‘soma autotizago préva cos Ediores, Marcia Abreu 1 Podemos ‘citar inaus versos, quando eles so de unt grande Poeta, [La Fontainé] Piette Choderlos dé Laclos. Les liaisons dangereuses, 1782. \ ‘Ainvengée da literatura Em meados do século XVIII, Hamlet havia sido escrito hé mais de 150 anos, 6s Lusfadas estavam’ publicados ha quase 200 anos, D. Quixote fora impresso hd 160 anose, entretanto, ainda nao havialiteratura. Moliéie, * Swift, De Foe, Corneille, Milton, Dante nao escreviam literatura. Ou melhor, » + 1. Parte! das idéias’ aqui apresentadas fortram priméiro capitulo de iminha tese de “Live™ x Decéncia, intitulada O caminho dos livros, epresentada ao Departamento de Teoria Literdria "dolnsttuto de Estudos da Linguagem da Unicanto (2002), publiceda pela Editora Mercado de Leiras (2003) / 11 © que escreviam era literatura,tanto quanto os textos de filésofos, histotia- dores, ciéntistas. Eram todos igualmente “homens de letras”, pois perten- ceram a um tempo em'que 6 termo literatura designava erudicao. Os que viveram no século XVII assemélhavam-se no oficio € rid desprestigio social.’ Em um mundo ert que boa parte dos nobres nao sabia ler e em que a formarde cultura valorizada era a teligiosa, a carreira das letras nao estava entre as de maior distingdo — tanto que as famfias endinheiradas encaminhavam seus filhos para as lides da religido ou das armas, vendo com maus olhos a busca do trabalho intelectual. Em um - periodo em que ainda nao se haviam definido os direitos de autor, esses homens nao podiam viver de suas penas, tendo de se socorrer, portanto, de outros expedientes para garanti sua-sobrevivéncia material. Mesmo autores'de sucesso ndo recebiam quantia signficativa pela venda de suas obras, Embora tenlham inicio, nessa -época, movimentos para que os editores remunerassém os escritores, as somas pagas eram bastante reduzidas (Viala op. cit.). Seauindo Jean Marie Goulemot, os escritores de menor sucesso tinharn renda equivalente & dos cocheitos ¢ laéaios, os autores medianos fecebiam aproximadamente o mesmo que os artesdos de luxo e os de grande prestigio faziam jus a quantias semelhantes as teccbidas pot preceptores ‘secretérios particulares (Goulemot e Oster op. cit., p. 36): Além de ser pouco lucrativo, buscar a venda de livros como forma de sobrevivéncia material trazia forte desprestigio social. Era, portanto, o pior dos mundos: pouco dinhéir6, rienhuma valorizagao. Z : Tivessern fortuna propria, escapariam a essa dificuldade, mas eram poucos os homens de letras cujas posses permitiam uma vida confortavel. Precisavam, assim, buscer recursos. 'Umia das formes comuns era encontrar mecenes dispostos a fornecer dinheiro em troca do oferecimento da obra — seja por meio de uma dedicatéria, seja pela oferta de exemplares impressos, 2, Estudos detalhados sobre 0 papel social dos letrados no século XVII foram feitospor Alain ‘Viala (1985), por Henri-Jean Martin (1986) ¢ por Jean M. Goulemot e Daniel Oster (1992). 12 muitas.vezes ricamente encadernados. Outro expediente, ainda mais'co- mum, era engajar-se no sistema de clientelismo, buscando um pairao: um nobre em cuja corte empregar-se a fim de desempenhar tarefas diversas como secretério, biblioiecério preceptor. Ocupando-se em atividades tidas como inferiores as das armas, da politica e da religiao, os escritores dependiam de gente que nao ostinha em alta consideragao. © NaFranga, ainda noséculo XVI, os létradés comegaram a engajat-se em projétos que produzissem uma maior visibilidade e valorizac&o.(simbé- lica é financeira) de seu trabalho; Multiplicaram-se as academias e os sal6es, espagos freqitentados indistintamente por poetas, matemiticos, filésofos, astronomos etc. © prestigio desses grupos aumentava ou diminufa em sintonia Com o status dos due os acolhiam e daqueles ali vinculados, Além de coiiferir alguma valorizagao ao oficio do letrado, as academias e saloes colaboraram para a definigéo de especificidades no interior do trabalho intelectual ao especializar-se, separando as Letras, as Ciéncias e as Artes. Se pertencer a uma academia ou a um salao podia éonferir valor zagao simbélica ao leirado, a dependéncia de um mecenas fornecia apenas dinheira, Enquanto a pratica do mecenats privado diminuia sensivelmente, ampliava-se e sistematizava-se a participagdo do Estado nesse Papel. Dis- tribuindo prémios e estipulando pensdes anuais pata alguns letrados, o governo francés conferia, ao.mesmo tempo, prestigio € recuysos financeiros para alguns escritores. A furidagao da Academia Francesa, em 1635, colaborou no ptocesso, de valotizacao dos intelectuais, pois nao s6 distinguia socialmente os que dela eram membros como também garantia-Ihes um pagamento em dirihei- "9A partir daf alguns escritores contaram com a protecao dorei, recebendo 4 “ cartas-patente e selos reais, que esmaeciam um pouco 0 desprestigio das letras. A instituigéo fundada por Richelieu teve também uma participacao importante na distingao das diferentes areas de saber ao apoiar'se em inielectuais preocupados com questées de linquagem é de estética, prete- 13.

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