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Coimbra, Facultinds de ‘Ponlorada ase origins @ 1160, ‘Leg monasteres du dlocdse IDENTIFICAGAO DE UM PAIS ENSAIO SOBRE AS ORIGENS DE PORTUGAL, \dutibérinte ot Cluny. Les, mouasltes oe ree, 1 eteaa, "A Familia e 0 Poder, elieval Portuguese ‘Lisbea, Imprensa, Nack- eiros, A. Nobreea, 3 t ‘Gulmaries ed., Hii borane, ‘Amprensa Nactonal, 3065. ftads, Lisboa, mprensa Necio- jeval Portuguesa, Lisboa, Imprerss 1096-1325 Volume I— OPOSIGAO 2+ edicho ACS SOCHIE [Gs yy “6.1L 1906 1985) Baitorial Estampa Lisboa 26348 [ADVERTENCIA, og textos em portugues medieval transeritos nestas obras nfo Coe See Sacro for publondee 9 lo te seprtugem ¢ formausagio, forum franseton seeundo, Oe felt mad, Piclgtoon clboredan SO, oon to 20 Cam aay Cintra» publoaas no Hotetim de ulorta, 0073), pp. 417-425, Pela mesma rao, Sotrod totinog eltados, mesmo ave 280 ‘ade foram publleadoa. "Caweamentagho grata seré pubeads “cds ret: Kitograta, dan bran iin eemere See core, aoa, 08 rudasio doo cig willzen, ig italo deat, obra, que £4 galerdeada om. 29 6 Malo de 1965 is, emygyPrtnls Ae Te "ftais Quinas © Castes — 1den- Silt ae: bn May fo gy pare contusion oy 1 ee mesmo mome publicads em 2948, 15, 7” ie Se pe if ' Yio noa texto 1 _molGaculas © pontuad nog lugares ‘dveasem enas nem Outre no tim do vo IT desta ya INTRODUGAO O ESPAGO E O TEMPO 1. © TEMPO LONGO ATE © populagio portuguesa que olha com curiosidade os ma- pas publicados pelos jornais depois de cada acto eleitoral J be habituou a verificar, sem surpresa, a reparticao dos votan- tea em dois grandes blocos, cujas fronteiras coineidem, grosso modo, com a diviséria estabelecida pelas montanhas que pro- Tongam o Sistema Central. De tal modo se considerou esta repertigo um dado adquirido, que as perdas e ganhos dos partidos ganham relevo especial conforme se situam a norte ou sul daquela fronteira, iste facto vem projectar na vida quotidiana dos portu- < guesea uma das manifestagSes mais salientes da permanéneia Ge estruturas seculares, cuja longa duracio a Historia permite Gescobrir nas suas imimeras manifestages ¢ modalidades. © estudo das suas formas no passado ajuda, sem diivida, a compreender o funcionamento da complexa realidade em {quo estamos ingeridos e 2tomar consciéncia dos limites den- tro dos quais & possivel alguma mutagio ou mesmo a ela- Dorar ae estratégias adequadas para tansformar num sen- tido positivo uma realidade cultural, social ou econdmica que 8 nao corresponde is necessidades ‘do mundo actual. lApesar do que 2 amilise e compreemiu do passat tém que ver com a consciéncin do presente, ¢ mesmo, porven- fara, com as formas de accio sobre cle, apesar de ser, sem divida, uma ilusio imaginar que ele se pode estudar com {inteira’ objectividade e prescindindo de opgdes ideoldgicas fou do esquemas interpretatives, ambas estas perepectivas fe Gevem afastar como perturbadoras de qualquer projecto cien- tifico, Nao 6, pois, em funcio do presente ou de uma opgio doutrinal ou politica que se estudam os antecedentes da socie- Gade portuguesa, mas em si mesmos, como um objecto coe- : nte de se, O que, apesar de constituir um artificialismo, aa ye Se eee Jnente em que consiste essa coeréncia do passado em relagio ‘a si mesmo, nos convida a perscrutar todos os seus vestigios, rigorosamente datedos e situados no espaco, para recons- {ituir essa_memma © it m fio aleangard credibilidade. -A-demonstragio, de eoerén- ip seleccio de dados que revelam a. inlerdepen- ig dos niveis histdricos, dos paralelismos significativos, ag formas de tratismissio dos movimentos em sectores apa- faitemente independentes, sera, pois, o objectivo fundaren- jal_para a interpretagio do passado e, consequentemente, Fame tomar possivel o seu relacionamento com o presente, Orius nto poder’ deixar de revelar simultaneamente a iden- fidade gue os une—as permanéneias do tempo longo—, ¢ a8 diferengas que os separam — a alteridade de um sistema cul- tural e econdmico-social definitivamente desaparecido, Assim ‘so reGnem os elementos para conduzirem 4 tomada de cons- Cidiicia da colectividade nacional: 0 reconhecimento do que fpermaneceu id€ntico através de formas e.solucées historica- mente diferentes. Isto, na medida em que haja algo de verda- @eiramente permanente e significativo, interrogacio 2 qual este ensaio evidentemente nfo pretende responder. Ispera-se apenas que os partidarios eonvictos de respostas positivas ow negativas a esta pergunta aqui encontrem algum material para fundamentar as suas interpretagdes divergentes. ‘Seja. como. for, jaro de uma observagio que me parece insofismavel: a, de que se encontram no territorio portugues sistemas de relacionamento, estruturas sociais e econémicas © esquemas: ‘oulturais diferentes, mas que normalmente se podem articular emi dois grandes grupos, situados em areas | aa ,geogrifiens, distigtas, Q.fendmeno foi j& obsorvado por espe- y inistas ‘dé, gedgyafia himana, etndlogos, linguistas ¢ socid- 4 logos. Nag. tomo ‘mij/;a aneu ver, em base interpre- dative da histéria ndGiohall,Os'seus autores concebem geral- meite 0 oxpago!-naolonal ‘Gomo (um, tio, indiferenciag ou apenas com’ diferencas regionals poudo significativas. Imbors, como 6 também evidento, existam igualmente factores, d Unifleagso que permitem considerar o territério e a historia ional como-um todo e contrapb-lo a ‘outras nacionalidades fponingulares ott curopeias, a, diversidade apontada nio re pode ignorar © constitui, como, espero demonstrar, um dos: elementos mais importantes para explicar um sem Be oe fenémenos e a maneira como! se desenrolaram os grandes +\:\ movimentos histéricos, Podemos, m« considerar como ss \ tima das carecteristices petuliares di hossa Histéria a maneira 28 nein. $6 assim a tentativa de com: » 412 dois territérios agiram um sobre 0 outro, se com- plétaram mutuamente ou so opuseram perante situagses di- versas, imprimindo-lhe assim uma dinfmica propria, que se dc¥vo considerar constitutiva da especificidade nacional. Dexemos, porém, para o final deste. obra as conclustes inlerpretativas e as’ sinteses, Tratemos, apenas, no seu de- curso, do nfo perder de vista os fics condutores, os deno- minadores comuns © os mecanismos do conjunto. A distingio que acabei de fazer parcee-me ser, jusiamente, a principal base sobre a qual hfo-de repousar terpretativas que em cada enso tenciono propor. Comegarei por resumir as conclusies dos geégraf guistas, etndlogos e antropslogos, basewdas em observagoes Sobre a realidade contemporanea, porque elas me permitirio orientar a seleecio dos materiais historicos mais. signifiea- tivos, Verenios depois alguns dos principais equivocos da historiografia tradicional, para poder, enfim, definir melhor os critérios fundamentais da diferenciagio das grandes reas geograficas, B este o objectivo fundamental da presente intro- ‘io, Nao poderemos, no entanto, depois de ter definido ritérios, avanear com seguranca, sem averiguar, logo ins de seguida, os limites das diferencas, ou seja, sem enumerar principais factores de unificagio. Hstarcmos, assim, aptos a situar as diferencas no seu Ambito proprio, para’ evitar exagerar as suas ramificagées e consequéncias, Antes de pas- sarmos ao exame detalhado de cada um dos sistemas regio- nais ali definidos, teremos ainda de marcar os eritérios da periodizacio global que permitirao conferir alguma com- preensibilidade & dimensio diacrénica, Poderemos entao des- cobrir_os niveis de profundidade atingidos pelas diversas mutagées, na sua simultaneidade on no seu desfasamento, os factores que as precipitm ou retardam © os elementos constantes unificadores de cada periodo. Nao ‘esqueceremos, também, que nos interessam funda. mentalmente os niveis social e’ cultural. Nao por desprezar- ‘mos ou ignorarmos 0 econémico, ou, melhor, 0 material, que Bituamos, pelo contrirlo, como 'o fundamento de tudo,’ mas por o considerarmos suficientemente definido no seu con- junto, simples no seu funcionamento e nos seus mecanismos proprios, mais susceptfvel de se isolar © compreender por si do que os outros. tempo, par ssublrom As pastagens altas. A secs estival que dura dole meser no Minho, choga a vols no Algarys,> (!) © NORTH Assim, 0 Norte montanhoso 6, por isso mesmo, grande reservatorio de homens, «de proletirios», mundo a margem das civilizagdes, «refligio contra soldedos ¢ piratass, reduto de sociedades e civilizagées arcaicas, zona de liberdade, rea de povoamento mais precoce, regido cade frequentemente reine a efome montanhesa, grande alimertadora das deseidas», dan constantes emigracdes. Parece-se, nisto, com todas as regives mediterrinicas onde predominam as serranias (°). Com i dife renga de que, em Portugal, como acentuou Orlando Ribeiro, as montanhas alisam-se muitas vezes. em planaltos, recoriam-se \ constantemente em valgs. Encontrs-se, portant, no Norte, tina lerge proporeio de pondores © colina do espagoe cui vaveis e hiimidos onde se podem fixar grupos de cultivadores |pormanentos ¢ onde o hatifar bo tora frequentemente Ge perso. j Assim, o pastoreio caracteristico das montanhas associa- facilmente & agricultura e ao miniftindio, 20 menos na regifio denominada Norte atldntico, Aqui, as condicdes naturais favo- focom a eriagao de comunidades nutosaficientes, permiter, "certo iimilo,« abeorado, em tepioss prnimas entre al, a Seeedentes.demograticos ea eoncentrardo oe ma Populacko SEmorose, O mesmo je nko acontace no Worte terion, para Ege Marko, onde na Saracersteas propriaa da montane ou Mo planalto’ se: tomam exclusivas, om rerras mie pobres © com um clima mais austero. Ai, no Norte interior, abundam as. tetas quae planaaro montes redondos,e por isso, como acontece frequentemente nos planaltos, os homens circulam, twegtm rotae's eaminhos que iigam entre oi os centro mas atitadoo, ongenizam formas de dominar as teansteréneias de aa ie fe'cebiniga ¢ de moreuiorias No terntono portugues, Borer, ew planaives munca sto tao extensos, como, fa, Mecota castelhana. Por isso voltam a encontrar-se na Beira e em TriscerMontes ag compartimentarces, qu, eam ova sala e sentido, vimos j4 aparecerem no Norte Atlantico, Efectiva- ‘mente, nas terras altas a norte da Serra da Estrela, a escassez () 0, Ribeiro, w970, pp. 206-297 () F Braudel, 1978, 1, pp, 27-47 45 4 de vales himidos raramente permite a concentracio demo- grifies, o habitat disperso ou o minifindio. = ° suL A civilizagéo condicionads. pela montana e pela frequéncia dos vales, opde-se a imposta pelas planicies do Sul. Enquanto Que, a Norte, @ altitude média ronda os 400 metros © pode Aibir frequentemente 20s 3200, no Sula métia anda pelos 250 metros e as altitudes maxisans raramente ultrapassam os O00. Aqui, a falta do chuvas es ruteza das eorrentes fTuvia Gbrigata és culturas de sequeiro, quando se podem faze afastiun as pessoas, Tirando as margens dos rios, as colinas férteis da Estremadura, as planicies de aluvido do Tibatejo, a esireita orla verde do ‘Algarve e um ou outro ponto onde se fundar eidades — oasis no mieio das vastas planuras — Budo o mais 6 uma enorme zona que até ao século XIX formave tama extensa quase ininterrupta charneca, ‘ea cultura fazia-se apenas A roda day povoagdes © 10 longo dos cursos de gua, Sobre 0 terreno ondulado, nos areais di delra-mar, nos cascalhelros que enquadram 0 curse dos los, apenas havia 0 matagal intermindvel de estevas, lentieeos ¢ Iucdronheitos. De Tonge em longe derrotava-se tum pedago, che igarase foro aos ramos reefequldos. semeando-se na cinza fertiilzanto, Mag depois de dois ou trés anos de seara, tudo vyoivia ao bravio primitive.» (*) As CIDADES Se 0 Sul era coutro mundo. ha muito aberto a todos os yentos da civilizagios (*), faciimente dominado pelos, povos mediterrinicos, Fenicios, Gregos e¢ Cartagineses no litoral, ig Romanos @ Mouros em todo o territério, a formacio itica e a conquista nao s0 fazium tanto pela capacidnde administragio. © aproveitamento das planicies, mas. pela conquista das cidades e centros urbanos, onde a maioria da populagio sempre se_concentrou, deixando aos rebanhos ¢ aoe pastores a animagio das charnecas. O Sul nao podia viver, Portanto, do autoconsumo, mas da cultura intensiva e da (®) 0, Ribeiro, 1970, pp. 296-291 (9 F, Prauael. 1976, pp, 27-47. troca muciga Uus pemsoes oe Hveiia rem coméreio, De facto, nas cidades, a massa da popu: Tako mio pode contar sb com a agricultura das, hortas, © tach hae mas com @ produgao artesanal criadora da riqueza oe teplivel de ser trocada pelos produtos ca terra. Um, mundo Stfotate, portanto, estruturado pela diviiio do trabalho,, pe- ditertearquias sociais, pela ordenagio politiea ¢ Juridica Flog movimentos de massas, no qual ers. impossivel ® orem vecedo em pequenos eireulos ou comunidades auto suficien- Tizegae minaiias por sistemas econémices ¢ culturais basendos tee iegdes simples e directas, Um mundo em que a circula- om TSonstante da riquera cria wna imagem de abundancia eo ontura. fatsa, mas mem por isso mens persuasor. Daf Porvennte atraccao que exerce sobre os poves das monte: sieee onde tantas vezes reina a fome, Daf a constante presenca. nhas, Oindes e na sua periferia, de massas de desenraizados, Ge imigrantes, de famintos e de sem trabalho (") COMPLEMENTARIDADE, Zonas diferentes, portanto, estruturalmente opostes, nas quais mio podem deixar de surgir eivilizagies distin'os, om Gi sistemas baseados em diferentes formas de dominar Seles za. Sendo as condigdes naturais diferentes, também os Bafamas culturais que organizam o dominio da natureza, 0 Tege'ae ger. O que nao quer dizer que nfo se possa estabele- terre ag relagio harmonica ou complementar entre os dois Grandes’ conjuntos naturais, imposta, afinal, pelas proprias Frartaeees de cada. um deles. Assim, a planicie absorvers 6 canitteates demogréficos da montanha e exportaré pars cla 0s cree produtos essenciais—os cereais, o vinho, as oleaginosas seus provoder-sea eriar_o cireuito racional e complex da {esl mania, © possivel, portanto, integrar os dois sistemas Hranewisamo e ‘nico conjynto politico, que ordene as trans. MU ise das coisas © dos homens, mantenha as hierarquiss ferénciag Grbitre os conflitos. As proprias insuficiéncias de socials © soles impoem a uniao e conferem a forga aos vinculos Golfticos, #em que estes deixem, mnitus vezes, de co rovetarsT Preciries. instficientes ou imadeguados, sem due passim Yimais impedir as tensoes ¢ divergeneias que os poem @) Para uma informasto clara ¢ sucinta do problems da rerloned: mmo aa Sndllzas ate agora feitas e das, planifiescbes Dropos!ae ree” aso. ae eee Glehard, 1989-1985, pp: 11-47 33. Nio é este 0 momento, porém, de analisar os elementos unificadores do espago nacional. O que importa, por agora 6 justificar a diferenea, descobrir a sia morfologin elles! © seu funcionamento, Para isso nio basta mostrar @ oposi¢ao do base imposta vela geografia, 6 necessirio, ainda, aver guar como se apresentam as diferencas no plano da antrop. logia e noutras manifestagdes da vida humana 12, A aatzopologin A relagio entre # geografia humana e as estruturas do nao € facil prever recaniemos de tal modo necessdriog, a um determinado conjunto de condigées de de habitat corresponda automaticamente um purenteseo. As variiveis sfio demasindo numerosas para se poderem presumir vincalos deste tipo. Por outro Indo, 08 esti. dos acerca da antropologia cultural portuguesa sto. ainda demasiado incipientes para se poderem propor desde ja vi- 86e3 de conjunto sélidas ¢ bem documentadas, Utilizando, porém, estudos pionetros de J. M. Nazareth ¢ de Robert Rowland (*), podemos apontar alguns dados fundamen. ‘ais, cuja coincidéncia com os descobertos a partir da goografia humana 6 impressionante, Baseado em dados estatisticos que podem recuar até ao século XVIII, ¢ em alguns casos ema el AUT, malt aon cone que existem, pelo menos desde o principio da época moderna, duas zonas de sistemas de parentesco caracterizndas por dife, rentes solugdes em outros tantos pontos escenciais: a idade do primeiro casamento dos homens e mulheres e a perceata. gem de familias ; ¢ que as mesmo tempo, alguns Uetalhes que revelam a complexidade das situagies. Al volta. mos a encontrar, conforme 0s tracos fonéticos ou os vocabu- Jos, demareagies reveladoras ora de uma oposigio entre o Norte e 0 Sul, com uma fronteira que oscila entre as mon- tanhas do Sistema Central e o Tejo, ora um contraste entre 0 vcidente e 0 oriente, entre o litoral e o interior. Mas a nio Coineidéncia entre os ‘diversos indicios estudados pelos espe Gialistas e em particular por Paiva Boléo, Hereulano de Car- valho e Lindley Cintra, s6 pode revelar fenémenos histéricos Qe datacio e significado muitas vezes dificeis de estabelerer. ‘X solugao reside, nao pode haver divida, no estabelecimento fo critérios que permitam encontrar a\ coeréneia entre os $e Suns dace "De uma mancira geral, a difculdade reside Gm saber se os fendmenos dbservados dependem da trans- fereneia de populagces ou da transferéncia de cultura, uma vez que esta nio implica necessariamente aquela, Com a difi euldade suplementar dg que por vezes se encontram os mais mareados fendmenos de vonservadorismo em dreas de imigra~ go, sobretudo quando estas se mantiveram isoladas de con- tactos posteriores. FRONTEIRAS FONETIC/ s Se 03 fenémenos fonéticos s6 podem dever-se & permanén- cia ou transferéncia de populagées, os lexicais dependem muito frequentemente de vagas civilizacionais, B assim, a admitir o eritério do maior conservadorismo das comunida- des montanhesas, nio podemos deixar de notar a coincidéncia global entre a Grea de altitudes e serranias e a dos dialectos 4 an, 4 do galego-portugués do Norte, segundo 0 critério estabele- . cido por Lindley Cintra, isto’ é 0 da fronteira meridional do s Apico-alveolar (#7). Esta observacao confirma-se, além disso, ao observar as evidentes afinidades deste fenémeno com a distingao fonolégica em posigio inicial da silaba, entre 03 fonemas /c/ © /s/, apesar da area da Boira Baixa em que este tiltimo fenémeno ultrapassa a fronteira dos falares do Norte (*). Mas a nio coincidénein desse limite com 0 dos outros apresentados pelo mesmo Autor, o desaparecimento da cpo- si¢do fonoidgica entre os fonemas /v/ e /b/ ea sua fusio num fonema iinico, assim como a morotongacao de ci em é, ¢ de ou em 6, constitui uma divergéncia muito euriosa, apesar da soincidéncia global da primeira série de oposicdes com a segunda, quando se compara 0 norte do Douro com o sul do ‘ejo. Ao contririo da primeira fronteira, considerada a mais significativa por Lindley Cintra, esta coincide com 0 limite entre a zona onde as altitudes sto constantemente supe- riores acs 400 metros ¢ as restantes, mas com uma barreira natural, que é a Serra da Wstrela. Assim, a zona da Beira Alta est toda ela fora da area da fusio v = b, Dir-se-la, portanto, que este fenémeno linguistico, tipico de populagdes evelhas>, nio chega a atingir as regides mais isoladas da Beira Alta, apesar de, no mais, existirem com cla muitos contactos. Po rém, se une num’ vineulo comum as que vivem quer em. Tris-os-Montes, quer no Baixo-Vouga, e mesmo numa parte do Baixo Mondego, onde evidentemente se deram maiotes tro- cas civilizacionais, ‘ulizapassando mesmo, a oeste, a area da fronteira do ¢ apico-alveolar, isto significa, certamente, o lento alastrar macigo da populagio nortenha, 9 seu avanco global, em tempos comparativamente mais tardios, pelo litoral e 0s vales fluviais, £ de notar, de resto, a relacio entre a fronteira da fusio v-b e a que separa a conservacio do ou perante 6, quase paralela figuela, mas situada mais a norte, excepto no ‘Alto Douro, ¢ ainda a que opde a area da conservagio do ef perante é, igualmente quase paralela, mas mais a sul, e com uma cunha de penetracio coincidente com as serras dos Can- deviros © de Montejunto. Estes fenémenos de avanco pelo litoral parecem dever-se, portanto, a um alastramento macico, lento, de caracter demo- grafico, de gente que invade em conjunto as terras férteis para ©) Cintra, 1983, p. 147 () Adelina A. Pinto, 1983, pp. 138-102, sobretudo pp, 187-192. soles felrblichs peeiares uma. inguin comm 4, By Tin Topi at, oaks angen por toda a parte. Mas ha também, eae Bees Rept amps oe alan tea wign e do Alto Alentejo ao norte de Portalegre, onde se cheze ‘yadorismo le caracteristicas arenicas fora, das guns, regimes hovos argumentos por Lindley Cintra (‘*) PRONTEMRAS LEXICAIS sontrari fonéticos, os fendmenos lexicais podem cat Sts cajetion a contacto ciilizacionas ¢ sofreren, Or fanto, transformagoes mais ripldas que se podem or S00 Kiterar a caracteristicas étnico-culturais de base, Siocon pativels com transtertncias de minorins ou, Simpice Core 9 ‘circunstancias, porém, os conserva toa humans, Ei Gerecem partioularmente signiticatives, da permanencla de populagdes. Assim, os vocibulos de onset Taina como mugir on moger, alo, tibere, espiga @ cari Yevelam, como Lindley Cintra mostrou ¢ Orlando Ribelro sect. fuou (*), a, permanéncia de uma, populagio simullancanen densa e estivel, resistente 2 vochbulos equivalents vindos 7° fora, Suficientemente expansiva, porém, para poder, <2 De prit, exportar alguns desjes vocibules para dreas que desorte Fivadin, como podemos concliir da, comparacio dos mans tragados & base de critérios Linguisticos com os tragados, & partir de indicios fonéticos, Verifica-se assim que a Estsoe Gnra é 2 Srea portuguesa onde as eontradigoes entre os diver og eriterios & mar: ore goresena,tragat as, constraly, cane ene cenites, ore de cenvelnecimento>, A. atraccio veoreida pelas cidades da Bstremadura e as possibilidades de ay Cintra 1988, pp. 58-54 : (Gaara SE Pe, Gosek 0. Ribeiro, sbi, DH 19s aproveitamento do solo entrecortado por colinas e com sufi- ciente humidade permitin a A a ciente hnumidade ccupacao densa em época rla- DIVERGRNCIAS NORTE-SUL Nio me quero referir tant a ero referir tanto maior fequencia de voesbulos de-origem tate, a sil do. “eo, Tendmeno bem convclde, embora estudado até agora com menos profundidade, aposat da mutrida tista de opasigies entre termiog de origem Yom. nica, germéniea ou tbérica eos de procedéncia. ari posta por Orlando Rikeiro (*). Penso, por um lado, nas mega. Tebismos eneontrados por Cintra, com os relacionados. com Ineo evthas, emo & supresifo don ditongoe em on 0 ty no sim, ndo posso coneordar que a permantneia do v 8 sul do Sistema ‘Contra se Sere tacit coos Duals transferéncias de poptlagdes nortennas para zonas de povoxe nto e que ai teriam mantido formas arcaicas ("), mas naa do especial conservadorismo da gente da montanha, ra tiearmente na Ben Alka. Assn, ao conelhecimentor’ reve. Indo pein fusio,b =v, opée-se 0 eenvlhesimenton reveado Mili dente ou mejt a acentungio de earacterotens smo admitindo que estes fenémen N i némenos podem sor tard atc Soest tn enon ne nn difuo, ito egniica a apeial resetncin do forte a monotongar ou e ei © a oposi¢ao a in et Soares coy cee lado, a homogeneidade de cada uma das zonas, exceptuando Asteriaadan ences com caractristica_ propia, 6 foe ear a le fendmenos de ‘massa, ‘deni Drolomintcin di ndtncian fortanto to ara ‘cpacoe imilar todas as correntes imigrato 4 ou amplitude no soja suficiente para fazer decagansoat came teristicas anteriores. aa DIVERCRNCIAS LITORAL-INTBRIOR © que parece, a primeira vista, mais surpreendente, a0 examinar os mapas lexicais tracados por Lindley Cintra, ¢ 2 Sparente invastio de outros termos mais «recentes» nas terras aitas, e que, segundo 0 mesmo autor, teriam sido importados de Castela, alguns deles, até, em épocas relativamente tardias Refirome 2 ordenkar, amojo, borrego, cardeiro, chibo © ma- thorra (*), Ja Orlando Ribeito relacionou este fendmeno com © da oposigdio entre a frea do gudo bovico ¢ a do gado ovine @ caprino, O due surpreende, porém, 6 a sua maior densidade fas Jonas montanhosas, em prineipio meis resistentes as inc vagies. ‘Gostaria de propor uma interpretagio bem correcta par fo fenémeno, relacionado com a cultura ligada 4 pecurin, ‘ron lexical’ dentro da qual se situa a maioria_dos termos Qitudades por Cintra, De facto, a sua distribuiedo num ver for norte-sul, © proprio termo ordenhar, que supde na sua origem. 0 apriseo, ou seja 0 conjunto de uma considerdvel quantidade de cabecas c uma técnica muito precisa, palavra Borrego relacionada com a producéo de 1A, sflo outros tantos Indicios que remetem para uma cultura propria do pastoreio f tempo inteiro, ou aeja da transumdncia, Assim se explicaria fa identidade de vocdbulos de ambos os lados da fronteira dialectal tracada A base de critérios fonéticos © a sua relacio com o léxico da Meseta castelhana. A circulagio de rebanhos fo sentido Norte-Sul ‘stabeleceria a ligacio entre as duas yonas dialectais. A este propésito, porém, nao se deve esque- cer 2 observacio de F, Braudel que acentua 0 caracter tardio Ga transumfncia dos grandes rebanhos e das longas distin- cizs. Ao contririo da de raio curto, esta supde ja os amplos mnercados, a organizacio dos itinerdrios, os acordos entre concelhos mereadores bu entre agricultores e pastores, a proteccio de Poderes mais vastos do que os locas © regio- iis). 8, portanto, um fenémeno que pode datar do fim da Tdade Média on mesmo da Bpoca Moderna, mas se situa nas zonas de pastagens ¢ fora das cidades e liga, por isso, as Populagdes conservadoras das montanhas com as, inovadoras seecitodes, Nes momtanhas. os termes proprios dos pastores Gedicados A transumancia difundiram-se largamente © subs. Siheiers vg vaades “eles dongs Jos peauencs rebanhes que no saiam fora dos limites da aldeia. Mas no chegaram nunca ‘es vales, onde os agricultores nio podiam admitir os milha- res de cabras ou ovelhas que Ihes destruiam os campos, como eram os de Entre Douro © Minho, do vale do Vouga ‘ou da Esstremadura. cdo a dann dominante oom, ua certs eta mm | wig = gee ces Le dima Se pnim mete Tac: passiclos ‘conseguira manter ao mesmo tempo o dominio e ‘o dominio politico que na Reconquista alcangou. concusors Voltamos, ussim, & oposi¢io entre as montanhas ¢ as pla- nicics, ou entre os ‘plunaltos © as colinas, Entre as comuni- dedes areaicas das alturas que atravessam os séeulos, man- tendo teimosamente as suas estruturas, e as das cidades ¢ zonss ribeirinhas, sujeitas 4 bruseas ou lentas mudancas tre- zidas pelas minorias detenicras do poder politico, social ou tecnico, permeiiveis a invasdes de proletirios vindos das mon- tanhas ou dos vales superpovoados, susceptiveis de mudan- gas profundas determinadas pela evolugio da produgio eco- némica. Por detris dos sistemas conservadores ow progres- sivos, hi populagdes que permanecem e que constituem 0 substrato dominante quer de uns quer e outros. E aqui, : nesta zona mais profunda das estruturas fundamentais, que descobrimos a diferenca entre o Norte e 0 Sul da Peninsula. i Os grandes movimentos histéricos 66 vém reforgé-la, A maior densidade da ocupacio romana a Sul do que a Norte, o amplo estabelecimento dos invasores suevos ¢ visigodos a Norte e no Centro, mas escasso no Sul, o longo dominio i islimico muito mais’ denso na zona meridional e esporadico *% ow superficial para Norte— tudo isto acentua ¢ reforea a diferenca, pelo menos até & énoca da Reconquista. E se ha também fenémenos de unifio ¢ de sintese, eles partem ora de uma zona ora de outra. Mas os que permitem estruturar as nacionalidades, nio 86 a portuguesa mas também a castelhana ¢ a aragonesa, sob as formas que vieram a revestir na Epoca Moderna, ou s9ja, og fenémenos de sintese que permitiram dar continuidade a solugtes politicas concretas, foram certamente os que radi- cam na capacidade expansive da populagio nortenha ¢ que Portanto consagraram 0 dominio do Norte sobre o Sul. Toda- via, se 0 Norte fornece a gente nio sustenta o progresso nico ou cultural. Este situase nos vales e nas cidades, e por isso seria partir do momento em que a gente do Norte as geupa que dai poderi dominar todo o territério e formar um Estado vidvel. Este vinculo, que assim une todo o territério 46

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