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CIUMES

Pierrot dorme sobre a relva junto ao lago. Os cisnes junto d'elle passam
sêde, não n'o acordem ao beber.

Uma andorinha travêssa, linda como todas, avôa brincando rente á relva e
beija ao passar o nariz de Pierrot. Elle accorda e a andorinha, fugindo a
muito, olha de medo atraz, não venha o Pierrot de zangado persegui-la
pelos campos. E a andorinha perdia-se nos montes, mas, porque elle se
queda, de nôvo volta em zig-zags travêssos e chilreios de troça. E chilreia de
troça, muito alto, por cima d'elle. Pierrot já se adormecia, e a andorinha em
descida que faz calafrios pousou-lhe no peito duas ginjas bicadas, e fugiu de
nôvo.

De contente, ergueu-se sorrindo e de joelhos, braços erguidos, seus olhos


foram tão longe, tão longe como a andorinha fugida nos montes.

De repente viu-se cego - os dedos finissimos da Colombina brincavam com


elle. Desceu-lhe os dedos aos labios e trocou com beijos o arôma das palmas
perfumadas. Depois dependurou-lhe de cada orelha uma ginja, á laia de
brincos com joias de carmim. Rolaram-se na relva e uniram as boccas, e já
se esqueciam de que as tinham juntas...

- Sabes? Uma andorinha...

E foram de enfiada as graças da ave toda paixão. Pierrot contava


enthusiasmado, olhando os montes ainda em busca da andorinha, e
Colombina torceu o corpo numa dôr calada e tomou-lhe as mãos.

Havia na relva uma máscara branca de dôr, e a lua tinha nos olhos claros
um olhar triste que dizia: Morreu Colombina!

Almada Negreiros, in 'Frisos - Revista Orpheu nº1'

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