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COMARCA DE PELOTAS

3ª VARA CÍVEL
Av. Ferreira Viana, 1134
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Nº de Ordem:
Processo nº: 022/1.09.0012517-0 (CNJ:.0125171-27.2009.8.21.0022)
Natureza: Reintegração de Posse
Autor: Real Leasing Arrendamento Mercantil
Réu: Empreiteira Serv Hidrosanitarios Goes L
Juiz Prolator: Juiz de Direito - Dr. Alexandre Moreno Lahude
Data: 20/08/2010

Vistos os autos.

Real Leasing Arrendamento Mercantil ajuizou ação de


reintegração de posse contra Empreiteira Serv Hidrosanitários Goes Ltda.,
ambos qualificados.

Narrou ter celebrado com a ré contrato de arrendamento


mercantil – relativo a um automóvel marca Volkswagen, modelo Gol 1.0, cor
vermelha, ano de fabricação 2006, placas INL-3684 – que prevê a devolução do
bem em caso de inadimplemento. Em face da mora, requereu liminarmente a
restituição do bem, e, para o provimento jurisdicional final, a reintegração em
definitivo da posse. Juntou documentos (folhas 05/21).

Foi deferida (folha 23) e cumprida (folha 24v) a liminar.

Citada, a ré contestou o pedido, folhas 27/32. Sustentou não


estar em mora em razão da cobrança excessiva efetuada pelo autor, situação
discutida em ação revisional ajuizada. Requereu a extinção ou a improcedência do
feito.

Houve réplica, folhas 53/59.

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64-1-022/2010/365285 022/1.09.0012517-0 (CNJ:.0125171-
27.2009.8.21.0022)
Em sede de agravo interno, folhas 69/75, foi determinada a
devolução do bem à parte ré, mediante depósito.

É o relatório.

Decido.

Cuida-se de ação de reintegração de posse, com pedido liminar,


em função de contrato de leasing.

Em havendo cláusula contratual prevendo a obrigação de


restituição do bem no caso de inadimplência (cláusula nº 13.1) e em estando certo
o inadimplemento, através da notificação extrajudicial (folha 20), merece prosperar
o pedido, sobretudo porque inerte a ré quando notificada à purga da mora.

Por outro lado, restou improcedente a ação revisional onde a ré


discutia a abusividade contratual, de modo que não há se falar em onerosidade
excessiva.

Os encargos cobrados, como restou assentado, nada têm de


ilegais, restando mantida a pactuação em todos os seus termos, conforme sentença
incluída no Sistema Themis e que ora colaciono na íntegra:

COMARCA DE PELOTAS
3ª VARA CÍVEL
Av. Ferreira Viana, 1134

Nº de Ordem:
Processo nº: 022/1.09.0010802-0 (CNJ:.0108021-33.2009.8.21.0022)
Natureza: Revisão de Contrato
Autor: Empreiteira de Serviços Hidro Sanitario Gois Ltda
Cristina Marques Gois
Ivair dos Santos Gois
Réu: Banco ABN AMRO Bank - Aymoré Financiamentos
Juiz Prolator: Juiz de Direito - Dr. Alexandre Moreno Lahude
Data: 20/08/2010

Vistos os autos.

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64-1-022/2010/365285 022/1.09.0012517-0 (CNJ:.0125171-
27.2009.8.21.0022)
Empreiteira de Serviços Hidro Sanitário Gois Ltda., Cristina
Marques Gois e Ivair dos Santos Gois ajuizaram ação revisional contra o
Banco ABN AMRO Bank – Aymoré Financiamentos S/A, todos qualificados.
Narrou ter celebrado com a instituição financeira ré contrato de
financiamento, onde lhe estão sendo cobrados encargos excessivos.
Em antecipação de tutela, requereu permanecer na posse do
bem dado em garantia, durante o curso do processo; a exclusão e/ou a proibição
da inclusão do seu nome nos cadastros de inadimplentes, bem como autorização
para efetuar o depósito da quantia que entende devida.
Para o provimento jurisdicional final, postulou a revisão dos
termos do contrato, a fim de serem excluídos os juros remuneratórios cobrados em
percentual superior a 12% ao ano; a vedação da capitalização; a exclusão das
tarifas de operações ativas, comissão de abertura de crédito, tarifa de análise
cadastral e taxa de abertura de crédito; a restituição do valor pago a título de
imposto sobre operações financeiras (IOF); a atualização do débito pelo IGPM; a
aplicação do Código de Defesa do Consumidor, a juntada, pela parte ré, do
instrumento contratual e a repetição do indébito ou a compensação dos valores
pagos a maior. Requereu pagar as custas ao final do processo (pedido indeferido à
folha 50/50v) e juntou os documentos das folhas 24/49.
A antecipação de tutela foi parcialmente concedido às folhas
86/95.
Citada, a ré contestou o pedido às folhas 96/111. Confirmou a
celebração do contrato e sustentou a legalidade dos encargos, livremente
pactuados. Requereu a improcedência do feito e juntou os documentos das folhas
112/116.
Houve réplica, folhas 118/125.
Veio aos autos o instrumento contratual (folhas 129/132).

É o relatório.
Decido.

Com exceção do autor Ivair dos Santos Gois, em relação ao


qual não restou demonstrada a pactuação alegada, extraio do instrumento
contratual trazido às folhas 129/132 que as partes celebraram contrato de
arrendamento mercantil.
A matéria desafia a incidência da Lei nº 8078/90,
desimportando o fato de se tratar de relação contratual onde figura instituição
financeira em um dos polos. Trata-se de serviço fornecido ao mercado de
consumo, havendo previsão expressa no § 2.º do artigo 3.º do CDC. Ademais, já há
entendimento assentado nesse sentido na súmula da jurisprudência do STJ,
verbete nº 297.
Consequência, é a submissão do negócio às regras que
disciplinam as relações de consumo, tal como a previsão do artigo 51, que fulmina

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de nulidade pleno iure as cláusulas contratuais que estabelecem obrigações
consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem
exagerada ou sejam incompatíveis com a boa fé ou a equidade, caso em que se
viabiliza a intervenção judicial a fim de resguardar e garantir o equilíbrio entre as
partes.
A aplicação do CDC não significa, todavia, a admissão de
vantagens irrestritas ao economicamente mais frágil, porquanto há que se apurar a
abusividade e o efetivo desequilíbrio contratual no caso concreto. Defeso ao
tomador do serviço, sob a alegação de se tratar de contrato de adesão, invocar tal
regramento no propósito de se esquivar do cumprimento de obrigações livremente
avençadas, porquanto a revisão é válida apenas para expurgar o inexigível.
A propósito, sinalo que eventual declaração de nulidade de uma
ou mais cláusulas não vicia o contrato como um todo, forte no artigo 184 do CC e
no artigo 51, § 2.º, do CDC.
Não é esse o caso dos autos, onde os contratantes tiveram
conhecimento de todos os termos contratuais e encargos incidentes já no momento
em que firmada a avença. Não há qualquer fato superveniente juridicamente
relevante que implique o rompimento da base do contrato, de modo a exigir a
integração judicial do pacto, que foi firmado por pessoas capazes, está isento de
vícios de forma e de vontade, e tem objeto lícito, inclusive quanto aos encargos.
O que o autor perdeu de vista quando reputa de excessivamente
onerosa a prestação é que o contrato celebrado é de arrendamento mercantil, e
não mútuo ou compra e venda.
O contrato de arrendamento mercantil, também chamado de
leasing, é um contrato de natureza mista. Isto significa que se mostra figura
contratual autônoma, formada por elementos de outros contratos, a saber, a
locação, compra e venda e financiamento bancário.
Como o contrato é autônomo, os elementos que o constituem
formam conjunto integrado, com função comum. Ao se mesclarem, acabam os
elementos por perderem suas funções peculiares, passando a ter novo caráter,
justamente em decorrência dessa aliança. Assim, descumprindo-se uma parte do
contrato em relação a um dos elementos que o compõem, automaticamente se
está atingindo aos demais.
No arrendamento mercantil não há três contratos (locação,
compra e venda e financiamento), mas sim o nascimento de uma novo instituto, ou
seja, o próprio arrendamento mercantil.
Inviável que haja a aplicação separada do instituto da locação,
pois nesta não se computa o desgaste do bem locado, tampouco custos
operacionais, como ocorre no leasing.
Tampouco vislumbra-se separadamente uma compra e venda,
uma vez que o contato de leasing apenas encerra um princípio de compra e venda,
já que as prestações pagas periodicamente expressam, além do pagamento parcial
da coisa, também contraprestação pelo uso do bem.
Por fim, e aqui se mostra o aspecto mais importante para o
deslinde do feito, também não é o leasing uma operação pura e simples de

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financiamento, de empréstimo. O sistema do leasing expressa uma flexibilidade
superior ao financiamento normal, já que este sempre impõe maiores precauções,
dependendo, via de regra, de garantias a serem apresentadas pela pessoa
tomadora do empréstimo, com repercussões fiscais. A pessoa ao efetuar contrato
de leasing poderá obter outros créditos, o que não seria o caso de ser
financiamento, porque o contrato de arrendamento não afeta situação creditícia do
arrendatário. No caso dos empréstimos, o contrato não é colocado como débito no
seu passivo. Estes aspectos, em se tratando, principalmente de pessoas jurídicas
arrendatárias são de suma importância para o desenvolvimento e administração
das atividades.
Também não há como ser depreendido o sentido independente
do financiamento, pois, na verdade, o arrendador, no caso, a parte autora, via de
regra faz empréstimos junto às instituições bancárias para adquirir o bem o qual irá
ser objeto do arrendamento com o arrendatário. As prestações a serem pagas pelo
arrendatário têm o intuito de recuperar o dinheiro investido pelo arrendador na
aquisição do produto, custear os gastos, bem como auferir lucro, já que a empresa
arrendadora tem finalidade lucrativa.
Não se constitui, pois, a empresa arrendadora uma entidade
financeira, o que indica não ser possível a aplicação a esta do mesmo tratamento
jurídico dado para a atividade bancária.
A ligação entre a arrendadora e as entidades financeiras é no
sentido de que a primeira capta recursos para a aquisição do bem na segunda,
sujeitando-se, pois, às origens de seus recursos: a remuneração paga pelo sistema
financeiro às aplicações feitas pelos investidores. Sabe-se, a partir disto, que o
custo com que opera é alto, não havendo a limitação em relação aos juros por ela
pagos para a aquisição do bem, conforme é cediço.
Diante destas constatações, resta claro que o tratamento puro e
simples do contrato de arrendamento como sendo de financiamento, foge ao
instituto peculiar do arredamento mercantil, contrato diverso e autônomo que é.
Certo é que quando o arrendatário visa firmar o contrato seu
objetivo é o financiamento para a aquisição de um bem. No entanto, não pode
pretender que seu intuito seja considerado como a natureza jurídica do contrato
que quis firmar, pois este, conforme já aduzido, possui requisitos próprios a ele
inerentes, o que acaba por trazer vantagens ao arrendatário em relação ao
financiamento.
Como toda opção a ser efetuada, a pessoa interessada deve
ponderar as vantagens e as restrições quanto a cada uma delas. No caso do
leasing, as desvantagens são visíveis, ou seja, o encarecimento da coisa
arrendada, já que na montagem do cálculo das prestações a valorização do bem é
sempre tida como novo, até o vencimento do contrato, se incluindo também o custo
da administração, a captação do recursos para a aquisição do bem por parte da
arrendadora, bem como o lucro da empresa.
As vantagens, por sua vez, se mostram com relação: a) valor
fixo das parcelas, b) não imobilização de capital no momento de efetuar o negócio,
c) desnecessidade de garantias mais formais para formalizar o contrato e, por fim,
d) a possibilidade de estar como crédito liberado para conseguir financiamentos,
sendo viável a dedução no imposto de renda.

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64-1-022/2010/365285 022/1.09.0012517-0 (CNJ:.0125171-
27.2009.8.21.0022)
Diante do acima exposto, verifica-se ser inviável a revisão
pleiteada, como se o contrato se tratasse de um simples financiamento.
Mesmo não tendo sido invocado na inicial que eventual
antecipação de valor residual garantido (VRG) pudesse transmutar a avença para a
compra e venda, tenho que este fator não descaracteriza o contrato de
arrendamento mercantil, na esteira da súmula da jurisprudência do egrégio
Superior Tribunal de Justiça, verbete nº 293.
Por tais motivo, a abordagem posta na inicial é manifestamente
equivocada, já que pretende a revisão do contrato de leasing como se mútuo fosse.
Via de consequência, mantida a pactuação, assoma evidente a
mora do arrendatário, dando azo à incidência dos encargos moratórios também
previstos, assim como a rescisão do contrato e a reintegração na posse dos bens
arrendados.
Por fim, impende referir que a liminar anteriormente não mais
subsiste ante o juízo de improcedência.

Isso posto, revogo a liminar e julgo improcedente o pedido.


Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e honorários
advocatícios do procurador do réu, os quais vão fixados em R$ 800,00, atendidas
que ficam as disposições do artigo 20, § 4º, do CPC.

Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Pelotas, 20 de agosto de 2010

Alexandre Moreno Lahude,


Juiz de Direito

Via de consequência, mantida a pactuação, assoma evidente a


mora do arrendatário, motivo pelo qual se impõe a reintegração definitiva do autor
na posse do bem.

Nesse contexto, ante o juízo de procedência, não há se falar em


perdas e danos suportados pela parte ré.

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64-1-022/2010/365285 022/1.09.0012517-0 (CNJ:.0125171-
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Isso posto, julgo procedente o pedido e reintegro o autor na
posse do bem descrito na inicial. Condeno a ré ao pagamento das custas
processuais e dos honorários advocatícios do procurador da parte autora, os quais
arbitro em R$ 800,00, atendidas que ficam as disposições do artigo 20, § 4.º, do
CPC.

Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.

Pelotas, 20 de agosto de 2010

Alexandre Moreno Lahude,

Juiz de Direito

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64-1-022/2010/365285 022/1.09.0012517-0 (CNJ:.0125171-
27.2009.8.21.0022)

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