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VIAGEM A MECA

Eu não teria, no decorrer normal dos acontecimentos, desejado vir à Inglaterra naquela
primavera de 1996. Eu, Gulshan Fátima, a caçula de uma família mulçumana Sayed,
descendendo do profeta Maomé através daquela outra Fátima, sua filha, sempre levada uma
vida serenamente retirada dentro de casa no Punjab, Paquistão. Isso ocorria não apenas por
eu ter sido criada no purdah desde o sete anos de idade, de acordo com o severo código
islâmico ortodoxo dos xiitas, mas também por eu ser paralítica e impossibilitada de, sem ajuda,
sair do meu quarto. Um véu ocultava meu rosto dos homens que não fossem parentes
permitidos, isto é, meu pai, dois irmãos mais velhos, e um tio.

Foi Papai quem me trouxe à Inglaterra- ele, que menos prezava os ingleses por estes adorarem
três deuses em vez do Deus Único. Contudo, ele me trouxe, após ter gastos altas somas numa
busca infrutífera de tratamento em nosso país. O estranho foi que eu, a paralítica, a mais fraca
de cinco filhos, viesse a torna-me, afinal, a mais forte de todos, a rocha que despedaçaria tudo
o que lhes era caro.

Tudo o que tenho a fazer é fechar os olhos, mesmo em idade adulta, e diante de mim erguer-
se a figura de meu pai, o querido Aba-jan.

Vejo-o em pé perto de minha cama, no lado oposto ao quadro da Casa de Deus em Meca, o
lugar mais santo so Islã, a Caaba, erguida, segundo dizem, por Abraão, e restaurada por
Maomé. Papai tira o santo Alcorão da alta prateleira, o lugar mais alto do aposento, pois nada
deve ser colocado sobre ou acima do Alcorão. Antes de tudo, ele beija a cobertura de seda
verde e recita o Bismillah i- Rahaman-ir-Raheem (começo isso em nome de Deus, o
compassivo, o Misericordioso.) Em seguida, ele desenrola a cobertura de seda verde – não
antes de ter realizado cuidadosamente o Wudu.

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