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15/04/2019 O parlamentarismo do difícil - 08/04/2019 - Celso Rocha de Barros - Folha

Celso Rocha de Barros (/colunas/celso-rocha-de-barros/)

O parlamentarismo do difícil
Bolsonaro pode se tornar irrelevante, mas vai querer reivindicar crédito

8.abr.2019 às 2h00

EDIÇÃO IMPRESSA (https://www1.folha.uol.com.br/fsp/fac-simile/2019/04/08/)

Nas próximas semanas, o Brasil pode entrar em um período de alguns meses


de parlamentarismo.

Bolsonaro não consegue fazer nada de útil, o Brasil precisa ser governado, os
vizinhos de praça dos Três Poderes parecem dispostos a assumir a tarefa.

A primeira iniciativa nesse sentido pode vir na tramitação da reforma da


Previdência. Deputados e senadores devem melhorar muito a reforma da
Previdência (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/celso-rocha-de-barros/2019/02/quem-vai-pagar-a-passagem-
para-o-regime-de-capitalizacao-da-previdencia.shtml) enviada pelo governo. Devem cair as

mudanças no BPC, a capitalização, a desconstitucionalização que permitiria


revogar a PEC da Bengala com maioria simples, tudo que é obviamente
injusto, insustentável ou estelionatário.

Se Bolsonaro conseguir destruir a própria reforma, os congressistas podem


tentar a do Temer.

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A novidade é que os parlamentares podem não esperar a articulação política


do Planalto para tocar qualquer um desses projetos.

Parte disso pode ser pressão dos governadores, que também querem a
reforma. (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/celso-rocha-de-barros/2019/02/nao-e-assim-que-se-passa-
reforma.shtml) Parte pode ser, é preciso admitir, responsabilidade diante da nação,

ou diante dos setores econômicos que elegeram os deputados


conservadores.

E parte pode ser o lobby de empresários amigos do presidente, que, como


revelado pelo O Estado de S. Paulo, estão atuando pesado nos bastidores
para convencer os deputados, sabe lá Deus como. 

Em uma virada ainda mais surpreendente, o Congresso deve começar a


discutir uma proposta de reforma tributária própria. Se for mesmo algo na
linha do que vinha sendo proposto pelo economista Bernard Appy, pode ser
muito bom. A maioria das campanhas presidenciais namorava esse projeto,
porque ele resolve problemas muito difíceis.

Nesse caso, o Congresso não vai só dispensar a articulação do presidente. Vai


dispensar sua iniciativa.
Se isso tudo acontecer, Bolsonaro (https://www1.folha.uol.com.br/colunas/celso-rocha-de-
barros/2019/01/nova-era-para-o-baixo-clero.shtml) vai se tornar completamente irrelevante por

vários meses, talvez anos.


E o presidente parece estar achando isso um bom negócio.

Na semana passada, deu entrevistas dizendo que não nasceu para ser
presidente, que graças a Deus não vai ter que lidar com esse abacaxi pra
sempre. Resolveu brigar com o horário de verão. Seu assessor Filipe Martins,
um desses coitados para quem o Olavo mentiu que já dava para vir para a
discussão sem passar vergonha, parou de tuitar sobre as Cruzadas (pois é) e
começou a reclamar da tomada de três pinos.

É golpe.

Se o Congresso fizer todo o trabalho difícil das reformas,


(https://www1.folha.uol.com.br/colunas/celso-rocha-de-barros/2019/01/a-previdencia-nao-veste-azul.shtml) as

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perspectivas de crescimento econômico melhorarão sensivelmente.

É aí que Bolsonaro quer reemergir no Twitter reivindicando crédito pelo


crescimento. Vai dizer que, olha só, bastou eleger um cara honesto que a
economia cresceu.

Não vai ter sido por isso, e Bolsonaro é Queiroz Boy, mas quem estiver com
vontade de acreditar vai acreditar.

Carlos Bolsonaro dirá que a economia foi reativada porque construíram uma
hidrelétrica em torno do tuíte do golden shower.

Se o Congresso quiser governar no lugar de Bolsonaro nessa encruzilhada, eu


entendo, alguém precisa fazer o ajuste. Mas espero que alguém tenha
também um plano de contingência para quando o Brasil tiver no Planalto um
fanático autoritário para quem só terá sobrado a parte fácil do trabalho.

Bolsonaro topa numa boa o parlamentarismo no que for difícil, mas não se
enganem: nunca vai desistir do presidencialismo no que for fácil.

Celso Rocha de Barros


Servidor federal, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).

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