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DADOS SOBRE 0 AUTOR Ex-professor da Escola de Comando e Es- tado Maior do Exército, de 1948 a 1950, Diretor do Departamento de Histéria do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), de sua fundacdo até sua extinggo, ‘com 0 golpe de 1964, Autor de numero: s0s livros, dos quals so de destacar: For- magéo Histérica do Brasil, em 103 edigao; ‘Sintese de Historia da Cultura Brasileira, em 119 edie; Histdria da Literatura Bra. sileira, em 78 edigSo; A Ideologia do Cé - lonialismo, em 38 ediggo; Brasil. Radio: agrafia de um Modelo, em 53 edigéo; His- {ria de Imprensa no Brasil, em 38 edi¢ao; Historia Militar do Brasil, em 32 edie, e outros, entre os quais alguns editados no exterior, em russo, polonés e espanhol. NELSON WERNECK SODR MERCADO, Mm |ADERTIC || [Unome “Fes eps: Marea Cana Ne chamaoa fl G emporio: cdo Si Super; Sioa eoby “sss cor ogee po eat: Amon Robes Seal 1985 ‘Todos os direitos reservados a Eitora Mercado Absrto Ltda, \ ua Santos Dumont, 1188 ~ Fone (0512) 22 8822 980230 ~ Porto Alegre - RS 8670 I O tenentizmo, Porto Alegre, Mercado | Aborto, 1986, A 72p. (Revisfo, 16) | Hy | ‘cDU 981"1920/1890"" SUMARIO i i 2 | intRoDUGAO . 7 | i IEEEeH Lg EROGAE Soee ee eee eae te ee | II. ACRISE POLITICA EOS MILITARES ....... 15 i! | IIL. OS MOVIMENTOS ARMADOS .........+.. 25 I IV. A FASE POLITICA ........ oe 35 ; Yds alfabticos para catdiogo sistemstico: WciTeopoeenseneint ic | isoria do eras "1920/1990" sar“roz0/1930" 1 Brasil: HistOria: 1920/1930 981'"1920/1930"" SIGS ooo vance etn enim smn scownene: 55 | | CRONOLOGIA .....ccceeeeeteceneeeees » 61 H Biblotactreresponstvl:Rajane Raff Klees CRB - 10/500 einer erasesiittltUieelUdEreLaCLEE ea INTRODUGAO, Se a intervangé dos militares no process polftico & tum dado comum 10s pases da Américe Latino, e nfo s0- mente a eles, o fato & que, em determinada fase da nossa historia, assumiu tragos particulares que se configuraram raguilo que se convencionou conhecer como Tenentismo. Mesmo no Bras, as interveng6es militares no processo pol tic, que tm sido freadentes, assumiram aspectos diversos, tnnuinte 0 Tenentisma se apresenta, ainda hole, visto 8s. tincis, como{fendmane exegpcional cferente em tudo @ por tudo das demas intervenqSes militares, Dat a neces dade da anélise de tal fendmeno, para Ihe compreender as motivarSes eas caractersticas. De elgum tempo a esta par te, extudos,pasgules,arrolamentos de depolmentos,tnta- tiv de intrpreteodo, tses universities ocuparam-se do reterido fentmeno, em tno do qual se constitu rume: rosa bibliograia, com algumas contibuigSes vindes do es- trangeito. Ese Inteasse comprova a importinea ea singe laridade do Tenentismo, a respeito do qual surgiram algu- ‘mas controvérsias, em especial naquilo que esteve ligado 20 movimento de 1930, quando findou a Repdblica Velha, Pois bem, o Tenentismo foi um e imamente vin- culado & mudanea operada com a queda da Repiblica Velha e 2 Implantacdo do regime subseqiiente, que poderia ser de nominado de Replica Nova, embora esse titulo soja im- proprio, de vez que néo houve, entre uma e outra, a Velhe 2 2 Nova, diferengas essenciais. O movimento de 1930, que alguns consideram merecer 0 titulo de revolueéo, importou, na verdade, em mudangas significativas. Foi um dos epis6- dios da revolugo burguesa no Brasil, uma revolugo por pa ‘tamares, de lances sucessivos, bem diferente dos modelos criginais, quando @ ruptura com o passado se definiu om Jracos radicals. Assim, o Tenentismo pode muito bem ser | considerado um episédio: da revolu¢go burguesa no Brasil, revolucéo que esté sendo acebada diente dos nossos olhos, em nossos dias, com o alastramento das relacdes capitalistas a0 campo ¢ seu aprofundamento nas éroas urbanas, em que 8 Industralizago 8 se vinha processando e que mostra, com meridiana clareza, as classes sociais que definem o novo modo de producio, burguesia e proletariado, Néo era assim na fase em que o Tenentismo surgiu. Daf a conve- nincia de estudé-lo, analisé-lo, definir os seus tragos. Nada melhor, para isso, do que inser-lo na empla moldura hist6 (ceem que ocorreu, 1, AEPOCA A historiografia moderna chegou a determinado nivel de consenso em admitir que o fim do século XIX € 0 infcio do século XX 6 muito mais definido com a 1# Guerra Mun- ial, de 1914 a 1918, do que no marco que a cronologia assinala, Realmente, as duas primeiras décadas do século XX pertencem, por muitas razées, 20 que o século XIX vi- rnha marcando no seu quadro amplo, desde os costumes até as relagdes internacionais. Determinados tracos do século XX 56 aparecem com nitidez, havendo nisso também certo ‘consenso, a partir dos anos da terceira década do século, finda a Guerra Mundial. Néo apenas pelas graves e alastradas ‘conseqiiéncias que o conflito deixou, mas, além disso, por ‘uma razo suprema: com o advento da Revolucdo de Outu- bro de 1917, na Russia, © mundo conheceria o socialismo na prética, @ j4 ndo s6 na teoria. A existéncia de um pals sob dominio do novo regime social marcava mudanga de tal, significago que todas as demais, derivadas da intensa luta armada em que haviam perecido milhées de criaturas, apare- cceriam como secundérias. A diviso de classes nfo ocorrie, ‘agora, no interior de cada uma das nagGes — em cada uma assumindo aspectos particulares, evidentemente — para apz- recer em escala internacional e colocar, desde logo, e com violéncia, em primeiro plano aquilo que se convencionou conhecer como questo social, A politica assumia nova di- mensio, pois no poderia esquecer, desde ento, o dado fundamental de que, nela, 0 problema das classes sociais € de sua luta era colocado como determinante. Ao mesmo ‘tempo, e particularmente depois que se comprovaram infru- ‘iferas as tentativas de intervengio armeda estrangeira para fozer gorar o regime instalado na Russie, surgia uma nova correlacéo de forcas, de dimensifo universal, afetada, caf por diarite, pelas alteragées e mudangas que se procestassem em escala nacional ¢ particular. Gerava-se, assim, com a abertura do século XX, ums relacdo dialética entre o univer- sal e o nacional, que era a forma como se apresentava 0 par- ticular para 0 caso, Tudo, nesse mundo unificado, obedece- ria, agora, a uma relaco dindmica, a essa relagdo dialética: 0 que ocorria em qualquer canto do mundo era afetado e afe- tava, mais ou menos, 0 resto do mundo, todo o mundo. Afetava e era afetado através de mediagSes as mals comple- xas, evidentemente, por forga da defasagem de desenvol mento entre nagGes e povos; alguns jé situados na etapa:im- perialista do capitalismo, isto é, numa etapa avangada do desenvolvimento capitalista, outros ainda padecendo de sig- nifieativo atraso no desenvolvimento capitalista, e terceiros sofrendo ainda do absoluto predom/nio neles de relacdes pré-capitalistas. Admitimos, e seria longa analisar as razBes disso, que o Brasil estava no segundo caso, isto 6, 0 seu de- senvolvimento capitalista estava nas etapas iniciais e nele vigoravam ainda, em extensas éreas, relagdes pré-capitalis- tas. A sua revolucdo burguesa dava os primeiros passos, des- de a implantagSo da Repblica, e padecia as conseatiéncias de inserir-se num processo que, em escala universal, era co: mandado por nages em que o capitalismo alcancara pleno desenvolvimento, algumas jd na etapa Imperialista. Se a de- fasagem ocorrera j4, mas em outros termos, com nacGes da 10 prépria Europe — a Alemanha chegara tarde, por exemplo, @ teria de disputar pelas armas um lugar ao sol para 0 seu capita lismo — quando ocorrida em paises do tipo do Brasil colocava, problemes cuja gravidade a historia logo iria assinalar. Pats de passado colonial, com quatro séculos de escra- vismo, © Brasil conhecia uma acumulago capitalista multo lenta @ 0 fluxo de sua renda para o exterior colocave-o na escala de economia dependente. Era ume economia agréria € exportadora, com um povo que, em amples &reas, vivia fora da economia de mercedo e cujo mercado interno, li taco por isso mesmo, pertencia a empresas estrangeiras, que nos proviem do necessério ao atendimento das necessidades mais elementares, mesmo d alimentaggo, pois @ nosse econo- mia agricola e pastorl, de subsisténcia, era insuficiente para isso. Com 0 aumento das cotacdes do café no exterior, na segunda metade do século XIX, surgiu o primeiro impulso significative & acumulacéo interne de capitais, tendo sido possivel © aparecimento de personagens como Vergueiro @ principalmente como Maué, nossos primeiros burgueses de destaque. Exigéncias externas de ampliseo do mercado in- terno — entravado pelo escravismo, visto que o escravo no era um consumidor — somendo-se a exigéncias dessa acumu- lage em lento desenvolvimento geraram as alteracdes dos Lltimos anos no século XIX, como @ Aboligéo e a Reptbli- ca, Elas assinalam mudancas significativas na estrutura eco- ndmica e, conseqientemente, na estrutura politica € social do pats. Para tais mudangas, colaboraco dos militares, fora importante. A partir de entio — a rigor, a partir do fim dda guerra com 0 Peraqual — os militares passeram @ ter um espago nas lutas politicas que ngo tinham até af. A socieds- de brasileira era dominada por uma classe agréria, @ nobreza imperial, cuje importéncie residira na propriedade do escra- vo € na propriedade territorial e cuje representacio fora @ monarquia, Por forga do erescimento do mercado interno € da divisfo do trabalho, o Brasil conheceria, desde logo, uma camada social média, pequena burguesia,ligeda @ uma verie- dade de atividades antes desconhecidas ou pouco desenvol- vidas, desde os elementos ligados a atividados intelectusis, " rnecessérios a0 provimento do aparelho de Estado, até aque- les ligados as trocas comerciais, a burocracia e ao artesana- to. O comércio permitia jé a acumulacio ¢ ampliava o espa- {90 em que a burguesia comegava a se desenvolver. Quando, Por qualquer motivo, surgiam divistes na classe dominante agréria e exportadora, somando-se nelas a presenca de urna bburguesia em infcio e de uma pequena burguesia numerica- ‘mente importante, ocorriam alteragdes polticas. Na peque- pa burguesia recrutavam os seus elementos duas instituigdes que teriam papel destacado em nossa formagéo histérice, a Igreja eo Exército. Padres ¢ militares, como intelectuais, haviam sido figuras destacadas nas lutas da época da Inde- pendéncia e da Regéncia, desde conspiragées como a Minel- rae a Baiana, ainda na fase colonial, até insurreigSes como aquelas que abslaram 0 pats, recém-ingressando no rol das hnagSes auténomas, desde a Cabanagem 0 a Balaiada, a0 nor- te, até a Farroupilha, ao sul, passando pelas nordestinas. Se, com o passar dos tempos, declina o papel dos padres nas lutas poltticas, 0 dos militares cresce. Mantenedores do es- cravismo e da monarquia, eles destréem tais instituigGes quando a correlagéo interna de forgas sociais impde tais mu- dangas. Daf por diante, estargo presentes nos episédios prin- cipais da histéria brasileira. Intimamente inseridos na socie- dade, acompanhando as suas contradigGes, ora refletem as ppressdes da origem de classe, a pequena burguesia, ora refle- ‘tem as presses da classe dominante, como braco armado do aparelho de Estado. Na medida em que o regime republi- ano se consolida — e na medida em que, assim operando, conserva a estrutura tradicional da sociedade brasileira — ‘cada passo na ascensio burguesa © no avango das relagBes capitalistas, no Brasil, pressiona no sentido de mudangas. Paralelamente, surgem alteragSes ligadas a0 aparecimento de uma camada intelectual, particularmente definida pelos estudantes, jornalistas e escritores, que tende @ esposar as idéias de mudanga, ‘A heranga que a Repdblica encontrou foi a de um pfs que se assemelhava a uma grande fazenda mal adminis- ‘trada, em que, internamente, ume estrutura agrério-exporta- 2 dora impunha as medidas que Ihe preservavam os interesses, enquanto, externaments, dependia das exigéncias imperia- listas, denunciadas nas diferengas negativas na troca de mer- cadorias e no pesado e crescente Onus do servigo da dfvida externa, que consumia as divisas, forgando a seriago de em- préstimos para pagar empréstimos. Do exterior nos chega- vam, também, as conseqiiéncias das crises c(clicas do capi talismo e os mecanismos de transferBncia de efeitos, dos prejutzos principalmente, nos agravavam a situagéo; os me- ‘canismos transferiam dos pafses desenvolvidos para os me- nos desenvolvidos os efeitos das crises; internamente, como sempre, tais efeitos eram transferidos pela classe dominante as classes dominadas, Endividamento, inflagéo, carestia, so fendmenos tradicionais em nossa historia, E o regime repu- blicano no tocou na esséncia deles. O sistema politico, en- tretanto, sofrera alteracdes: 0 parlamentarismo de fachada, dda época imperial, fora substitu(do por um presidencialismo fem que 0 Executivo detinha amplos poderes; o sistema de leigdes, no império, fundado na discriminacéo de votantes e votados pela renda ~ a Constituigo imperial, note-se, nfo riminava 0 analfabeto: néo precisava dessa discrimina- do — fora substituido por uma espécie nfo confessada de censo alto que, na verdad, vedava o direito de escolha, As eleigdes eram a fraude organizada e sistemética e os parti- dos, que demoraram a aparecer, néo passavam de méquinas destinadas a processar as escolhas. No apenas as escolhas eleitorais, mas todas as escolhas, porque o provimento de todo e qualquer emprego s6 se fazia por indicagio dos che- es politicos. Campos Sales deu acabamento significativo a0 que ficou conhesido como Reptiblica Velha, pela reforma do servigo da dfvida, em acordos firmados com os banquel- ros externos credores, ¢ pelo que ficou conhecido como “politica dos governadores”, em que o Presidente da Repa- blica assegurava-ihes a liberdade de ago através o em troca do apoio dos presidentes dos Estados federados; aquele era senhor absoluto na érea federal; estes, na estadual. Os Esta- dos federados eram geridos como fazendas privadas ¢ 0 pro- vimento do poder e, conseqtientemente, do aparelho de Es- 8 tado, obedecia a composigSo, em cada Estado, das oligarquias neles dominantes. Era um sistema r(gido, que nfo deixava es- apo algum para a manifestagdo do descontentamento popu- lar, Os Presidentes eram oscolhidos por consenso entre os {grandes chefes politicos, daf o revezamento entre governado: res de Minas Gerais e de Séo Paulo no poder supremo. Os par- lamentares eram escolhidos por eleigdes notoriamente frau- dulentas e'os resultados delas eram encaminhados ao Con- gresso Federal, onde se operava o "'reconhecimento”, isto 6, ‘onde se operavam as degolas dos raros desobedientes, que se arvoravam em representantes da oposi¢o, oposigo que rare: mente ocorria esempre em conseqiincia de lutas locals e pe: s08is. Ora, os primeiros e sérios problemas politicos surgiriam precisamente dessa ostensiva menipulacdo eleitoral. Por duas vezes ~ pouco antesda 2° Guerra Mundial e pouco depois de- la — houve um candidato de oposicéo, Rui Barbosa, isto é, houve uma cisdo nas forcas polftices que vinham operando ‘mansae pacificamente o processo eleitoral, Claro que, mesmo sendo 0 candidato da oposieo, oposigao que nfo diferia, qua- litativamente, da situaeo, personalidade de largo prest(gio, ‘mais intelectual do que partidério, avitéria do candidato ofi- cial foi tranqiiila. Mas o simples fato de ter ocorrido a cisso, fato de ter tido possibilidade de lovantar uma candidatura aceitével, mostravaque algo comecava a mudar.O movimento que ficou conhecido como civiismo, porque levantava acan- didatura de um civil, contra um militar que encarnavaas for- ‘¢as politicas tradicionais, deslocava o problema de seu centro de gravidade © escamoteava 0 verdateiro sentido de ciséo, processo subjacente,que néo tardaria em aflorar.Aflorou, no vamente, com 0 mesmo candidato, logo adiante,e novemente as forcas politicas tradicionais foram vitoriosas. A repeti¢go cera um sinal de alarma. Agora, as sucessdes presidenciais apre- sentavam’se sob novo aspecto ¢ comecavam a sensibilizar a opinido piblica. Denunciavam-secomo momentos de crise. O dominio absoluto, particularmente, como era o caso, quando prolongado, cega os que o exercem. E as forcas politicas do- minantes, que representavam as classes dominantes, perma- rneceram realmenta cegas diante do problema, 4 | | | ) I | ) | Il, A CRISE POLITICA E OS MILITARES © Presidente Epitécio Pessoa fora escolhido jé para enfrentar uma situaco de emergéncia e vinha romper com © revezamento tradicional entre candidatos mineiros ¢ can- didatos paulistas & sucessio presidencial. Ainda assim, Rui Barbosa, repetindo a contestaedo que ocorrera quando do Civilismo, denunciando pois a superficialidade anterior do suposto antagonismo civis x militares, tentara, novamente, sem melhor sorte, © sucesso eleitoral. Ora, a sucesso do Presidente Epitécio Pessoa comprovaria que 0 problema ser- vitia para denunciar a crise do regime ou, pelo menos, do processo eleitoral de escolha do mandatério da suposta von- tade popular. Na sucesso, novamente, surgiria uma candi datura de oposigo e novamente surgiriam os problemas sus- citados pela cist das foreas politicas tradicionais, que ma- nipulavar as instrumentos de poder em beneficio daquilo que representavam. Ao contrapor-se & candidatura de Artur Bernardes, governador de Mines Gerais e @ quem, no reve See Se zamento tradicional, caberia a vez, @ cendidatura de Nilo Pecanha traduzia a realidade de erescente contestagdo, e do crescente descontentamento, com @ forma como se proces- sava 0 jogo politico, reduzido ao arbitrio de poucas pessoas. © que estava em questiio, na esséncia, era o proprio regime, no que tinha de mais earacteristico, que era 0 processo de escolha do Presidente e dos representantes do povo, depu- ‘tados, senadores, governadores. Essa inquietagéo, entretan- to, denunciava as mudancas ja significativas que se vinham Procesando no Brasil, com o avanco das relacGes capitalis- tes @, conseqiientemente, com o papel de crescente impor- t8ncia que @ burguesia passava a desempenhar, 20 mesmo Passo que surgie um proletariado ja numericamente signifi- ccativo @ concentrado, que comecava a provar a sua forga e @ organizar-se, enquanto a pequena burguesia continuava a crescer e a desempenhar papal de dastaque nas questées po- liticas, Para compreender melhor o quadro em que se definiu a crise politica, entretanto, um dado precisa ser situado: a importancia da imprensa nas lutes da époce. Estvamos na fase em que se iniciava, no Brasil, a pastagem da imprensa artesanal para a imprensa industrial, que buseamos definir em nossa Histéria de Imprensa no Brasil. Nessa fase, a im- prensa vivia da venda avulsa e isto conferia destacado papel, em seu desenvolvimento, opiniéio popular, Um jornal mar- cava a sua importancia na proporgéo de sua tiragem e da venda avulsa Ihe provinham os recursos materiais com que s@ sustentava. A publicidade dava os primelros passos, entre NOS, @ pesava pouco na receita da imprensa, Pequenas em- presas © produtos isolados, que buscavam ampliar o sou mercado, serviam-se, habitualmente, de intelectuais, quase sempre poetas, para dar forma aos antincios. Os antincios na imprensa talvez influfssem menos do que os antincios nos meios de transporte coletivo, que eram os bondes. Nestes, ficaram conhecidos determinados endincios, que celebravam 08 efeitos de xaropes para a tosse, pomadas para feridas, Tomédios de variada espécie, e de restaurantes e de espeté. ‘culos teatrais, O Brasil desconhecia grandes empresas, mes- 16 mo em Séo Paulo, que se orgulhava, @ ostentava esse orgu- tho nos bondes paulistanos, de ser “o maior parque indus- trial. da América Latina’, A dependéncia da opinigo, isto 6, dda venda avulsa, colocava os jornais, como as revistas, néo s6 em estroita ligaggo com as tendéncias populares como nna necessidade de cultivé-las, servindo-as fielmente. Assim sendo, compreende-se que, a0 contrério do Brasil contem- pordneo, a imprensa da época fosse predominantemente de do, E de sentido oposicionista tio acentuado que os governantes se sentiam na necessidade de’ manter, a custa dos cofres pablicos evidentemente, uma imprensa a seu ser- vigo. Campos Salles — que deixou o poder, ao passar 0 car- go a0 seu substituto, sob a maior vaia que o Rio de Janeiro conheceu, no trajeto entre o Palécio @ a estagio ferrovidria onde tomaria o trem para Séo Paulo — Campos Salles con- ‘essa, em seu livro to importante para conhecimento do que era @ Replica Velha, que fora obrigado a manter jor- nais para a defesa da politica que adotara e que fora, sem ‘2 menor divida, contréria aos interesses populares. Quando 2 historiogratia oficial, lids, colebra a qualidade do governo cde Campos Salles, e as de seu Ministro da Fazenda, nfo esté ‘mais do que consagrando, hoje, isto é, a posteriori, a poltti- cca conveniente &s classes dominantes brasileiras, a custa dos sacriffcios das. demais classes. Lima Barreto retratou @ im: prensa da época em dois de seus romances: num deles, 0 ‘sates Caminha, satiriza 0 Correio da Manhé, carro chete da imprensa de oposicao na época; no outro, Numa ea Ninfa, denuncia como se fazia a polftica, a0 tempo, e como se processavam os lagos entre as personagens politicas e os jor- nais. Gilberto Amado, em suas memérias, rovela 0 quo fo! 0 Pais, jornal tipico da imprensa paga para servir 0 governo, com a figura singular de Joo Lage como representative des- sa forma de servir. O importante, quanto a0 que interessa .20.nosso tema, é 0 fato de que os jornais do tempo estavam vinculados & opinigo popular, que constitufa o seu piblico, @ eram, portanto, jornais de oposigo, Assim sendo, as cam- panhas que desenvolviam contra os governantes, embora de- finissem em tracos individuais mazelas do regime, encontra- "7 vam eco na opinifio dos leitores, mobilizavam essa opiniéo, campanha sucesséria se desenvolveu com a violéncia que davam-lhe os rumos. Ao mesmo passo, recebiam as presses dessa opinitio, dos sentimentos das camadas populares, des- contentes com o regime e cada vez mais conscientes de suas mazelas, Onde havia opinigo mobilizada, isto é, nos grandes éntros urbanos, o sentimento oposicionista crescie a cada passo e passaria, logo, a assumir formas apeixonedas de ma- nifestagio.. sentimento pol/tico do povo encontrava repercus- 80 pronta nos jornais e estes, reciprocemente, alimentavam ‘al sentimento, em relago dialética, A imprensa governista, sabidamente mantida 8 custa dos cofres plblicos, néo tinha enhuma credibilidade. Ore, a sucesso presidencial de Epi- ‘ticfo Pessoa iria mostrar o papel relevante das campanhas da impronsa. Alimentada pela tendéncia oposicionista da opiniao pablica, a imprensa dela participou ativamente — ‘com destaque, naturalmente na capital da Repiblica, o Rio de Janeiro, sede do Governo ¢ do Congresso. Colocedo 0 pprobloma da sucesso como a lute entre as candidaturas de Artur Bernardes, encarnando todas as mazelas do sistema, de Nilo Pecanha, elevado & categoria de renovador dos cos- ‘tumes polfticos, a imprensa, em maioria esmagedora quanto 0 niimero de jornais e quanto ao niimero de leltores, optou pelo segundo. A imprensa refletiria, entéo, os sentimentos Populares, sem davida, mas, por outro lado, colocaria o problema em termos pessoais. A esséncia nfo astava nas candidaturas, evidentemente; estava no regime, Mas a im- prensa nfo colocava em questo o regime; pelo contrério, colocava em questio os individuos, isto 6, os candidatos. Na verdade, discutia a forma de escolha doles e cumbatia, com violencia, os seus vicios. Mas no aprofundava a anélise, de sorte a desvendar o que estava subjacente. Na seqiléncia dos episédios da tormentose campanha sucesséria iniciada no Ultimo trimestre de 1921 e desenvolvida em 1922, iria ficar claro © engano, Mas os contemporaneos no viam tal enge ‘no: viam os fatos, os episéclios escandalosos, a superficiali- dade dos processos em torno deles é que se desencadea- riam as paixées. Realmente, jamais, em nossa histéria, uma 18 assumiu a de Epitécio Pessoa, antagonizando homens da mesma formaggo politica, como Artur Bernardes e Nilo Pe- ganha, Ao longo do processo histérico, alld, aquele, o can didato governiste, oriundo de processo polftico viciado, provaria sua inconteste superioridade, como homem pdbli ¢9, sobre o segundo, que aparecia, nto, como figura repre sentativa do combate as mazalas do regi didato sofreu, em nosso pats, cempenha como aquels que Artur Bernardes enfrentou, enquanto candidato e enquento governante. James a linguagem, nas lutes polfticas, zssumiu © tom que a referida campanha definiu. Ainde nesse parti- cular, Ficava esquecida a esséncia do problema — que era.o regime — para marcar ferozmente a pessoa do candidate oficial. Nunca, 20 longo de nossa vida republicana, urna per sonalidede pUblica enfrentou, como Artur Bernardes, vio- lencia igual, violincia verbal que se desmandari, desde os apelidos grotescos e infamantes até as fasidades mais gra- ves, A questio essencial, desse modo, ficava obscurecida por essa massa de insultos vulgares, que visavam um individuo, pelo fato de ser 0 escolhido, dentro das normas que o regi ime impunha, para ocupar a Presidéncia. std fora de dtivida que o carro chete da campanha de ‘posigfo, seja a0 governo de Epitécio Pessoa, praticamente desde @ sua instalagSo, até 0 governo de Artur Bernarde passando pele campanha sucessbria, seria 0 Correio da Ma- ‘nhé. Surgindo com 0 incio do século XX, na capital da Re- publica, o jornal dirigido por Edmundo Bittencourt cedo se istinguiria pele incontinéncia de linguagem e pela violéncia, ce suas companhes. Como Jornal poltico,aliés, 0 Correia dda Manhi foi o desaguadouro © o intérprete do inconformis- ‘mo popular com as mazelas do regime, mazelas configura das no fato de ser tal regime o retrato das oligarquies. aparecimento de um jornal desse tipo, como o papel que re- presentou na época, assinalam, isto 6, fazer parte do con- junto de fatos que marcam o avango da burguesia brasileira, correspondente a0 avango das relagGes capitalstas no pats. 0 cenério politico, sob as roupagens da comédia de enganos 19 que ere representada no palco, mostrava a mudanga que 0 Brasil atravassava, apos a 2? Guerra Mundial, com aliceroes anteriores, sem divide, ancorados om lutas politicas de que © Givilismo fore exemplo inaugural e frisante. Todo 0 pro- ccesso de mudanga que se anunciara com a Aboligo e com a derrocada da monarquia — episédios em que coube aos mili- ‘tares destacado papel — teria desenvolvimento nas primeiras décadas do século, justamente a fase em que 0 Corraio da ‘Manhé-rmarcou:2 sua posigso.na imprensa brasileira. O avan- G0 das relagdes capitalistas sofreu aceleracgo significative, aliés, com o conflito mundial, que funcionou como aciden- tal barreira & importaeio, alimentando o crescimento indus- trial do pals que a Repiblica oligérquica pretendia definir ‘como “essencialmente agrfcola”. Ao avango econdmico, porém, nfo corresponderia de imediato, para a burguesia, um avanco politico. Historicamente, alids, mesmo nos paf- 525 em que @ revolugdo burguesa surgiu originalmente, tal defasagem ficou assinalada. No Brasil, em quo o peso do atrato do campo, no plano politico, representou sempre problema importante, aquela defasagem ficou marcante, E~ foi também marcada pela singularidade do papel aqui repre- sentado pela pequena burguesia, Na época de que tratamos, @ pequena burguesia néo apenas assinalava 0 avanco burgués nna sociedade brasileira, como, e principalmente, mostrava 0 seu papel-de vanguarda aguerrida-da:ascenséo politica lenta da burguesia: Por. outro: lado, se a ascenso burguesa no campo'da politica, nas primeiras décadas do séoulo XX, so- fria do ritmo lento em que se processava — entravada pelo predomfnio das relagdes pré-capitalistas em vastas éreas do pafs — também o proletariado avangava com lentidéo, en- travado palo peso histérico de quatro séoulos de escravismo @ de submissio feudal no interior. A contradi¢go entre bur- guesia e proletariado, aquela que dé o contorno da socieda- de contemporénea, nfo assumia, na época, caréter agudo, Foi uma razo externa, a Revolugto de Outubro, que moti- vou, aqui, a precocidade da legislacdo arbitréria que preten- deu regular 0 que se convencionou conhecer como “questo social”, 0 sentido reacionério com que, muito cede, no Bra- 20 sil, a legislacdo situou as relagdes de trabalho e particular- ‘mente o papel polftico da classe trabalhadora em geral e do proletariado am particular. Sem tradigao democrética, foi facil, 20 eco dos acontecimentos ocorridos na Réssia, gerar, cedo, antes de raz6es internas objetivas, um clima de repres- fo de que ainda hoje padecemos e cujos episédios esto presentes na consciéncia popular. O avango da burguesia, por outro lado, sempre sofreu da conciliae#o com o latifan- dio, com a velha classe dominante de senhores-de-terras; essa conciliagfo foi assinalada, ao longo do tempo, por acor- dos técitos, 8s vezes escritos, com as mais retrégradas for- mas de agfo polftica, sob 0 peso esmagador das relagdes sistas no campo. Tudo isso, peculiaridades da for- ist6riea em nosso pats, reforea a importincia da ja no nosso desenvolvimento politico. Ela responde, também, pelo flagrante contraste entre o pals legal ¢ 0 pafs real, isto é, entre a legislagéo e a realidade; aquela muito mais avangada do que esta, elaborada muito mals para efeito do que para efetividade. A pequena burgue- sia contentava-se, muitas vezes, com a aparéncia, com 0 as- ecto formal das coisas, com a perfei¢do legal, despreocu- pada daquela cantundéncia do conereto que ¢ apandgio do proletariado, Na fase de que estamos tratando, assim, a pe- ‘quena burguesia constitufa a vanguarda da burguesia bras leira, cujos valores aceitava e esposava, Nes crises, ela se apresentava como reivindicadora de reformas que interes ‘vam & burguesia e que esta, sem combatividade, nfo coloca- va. A imprensa brasileira, com o cardter oposicionista que assumiu na referida fase, essinala também o papel destaca- do da pequena burguesia e marca o sentido de suas inter vengdes, Ora, na pequena burguesia brasileira do tempo, os militares apresentavam-se como os elementos mais ativos © interessados em mudangas polfticas. Entre eles, apereciam com destaque os jovens oficials — os tenentes. Na tormentosa campanha sucesséria, alguns epis6dios foram marcantes ¢ assinalaram 0 caréter que cla assumiu. Assim, 2.9 de outubro de 1921, 0 Correio da Manhé publi- cava com destaque uma carta atribufda 20 candidato oficial 2 eee Artur Bernardes com pesados Insultos aos militares. No dia 12, tornava @ publicar aquela carta e divulgava outra, do ‘mesmo teor insultuoso, visando os militares e atribuda a0 mesmo candidato, Estava desencadeada a tempestade, que convulsionaria © pafs por longo tempo e perturbaria 0 de- senvolvimento politico, com as sucessivas intervenes ar- madas, Um més depois, reunito agitada no Clube Militar ava inicio a ume controvérsia de todo deslocada sobre a autenticidade daquelas cartas. Ndo adiantou nada o preten- 80 signatério desmentir com veem@ncia a autoria; néo tou nada a inverossimilhanea que residia no fato de essumit um papel de afronte aos militares, em tudo e por tudo in- conveniente para ele; néo adiantou nada a palavra de equi brio de alguns politicos de grande responsabilidade na vide nacional, como Rui Barbosa. A Ascembléia Geral Extraordi néria do Clube Militer, a 12 de novembro de 1921, por 439 votos contra 112, aceitava a autenticidade das cartas e, con- seqiientemente, julgava os militares insultados pelo cendida- to Artur Bernardes, Segunda Assembléia Geral Extraordind- ria do Clube Militar, agora prosidida pelo Marechal Hermes da Fonseca, ratificava o decidido pela anterior. Os militares, assim, pela sua associagao de classe, condenavam o candids. to oficial © Ihe negavam o direito de pleitear a preferancia eleitoral para @ Presidéncia da RepUblica. Hé dois aspectos do problema em geral descuidados pelos cronistas da época, © primeiro deles ¢ que o Clube Militar era, e 4, sempre foi, uma sociedade civil, com a particularidade de reunir asso dos militares; uma entidade, assim, desprovida de poder de clsério, uma vez que, instituigo constitucional e hierérqui- £2, 0 Exército, como @ Marinha, falava pelo pronunctame to de seus chefes, particularmente o Ministro. Havia, p. lume diferenca fundamental entre deciséo do aparelho ofi cial, 0 Ministro ou 0 Alto Comando, e decisto de sociedade ‘ndo hierérquica, Essa diferenga Iria pesar consideravel- mente, daf por diante, nos fatos que se sucederem ¢ no pro- eso politico por eles marcado. A segunda diferenga, tam: bém esquecida sempre, é que as Assembléias referidas, em Que tais decisées foram tomadas e ratificadas, nfo contaram 22 | com e presena daqueles que, adiante, seriam as mais deste- cast figuras do Tenantsmo, Nem Prestes, nem Jodo Alber to, nem Miguel Costa — que pertencia & Force Publica pow lista — partciparem dela, ou nelas encontraram o¢ motives para as acGes relevantes de que seriam depois protagonistas. ‘A 19-de margo de 1922, Artur Bernardes foi eleito Presidente da Repdblica, a7 de Junho foi proclamado como tal e a 15 de novembro tomava posse. Entre @ eleigdo e 2 posse, entretanto, ocorreriam episédios de singular relovo no movimento que ficou conhecido como Tenentismo. Sem falar em outros episédios, como a Semana de Arte Moder- na, em $0 Paulo, muito mais badelada do que importante, mas que assinalou, sem divida um instante do movimento que trarie significatives mudangas em nossa literatura, © Modernismo, hé que recordar que foi nos dias 26 @ 27 de mmargo de 1922 que, em Niter6i, ocorreu 0 | Congresso do Partido Comunista do Brasil, assim batizado entfo, e que marearia @ sua fundaefo. Oriundo da reunigo de grupos es- taduais, 0 PCB surgia com uma forte eiva anerquista, de que se libertou 20 longo do tempo. © anarquismo, contando principalmente com elementos provindos da imigra¢do eu- ropéia, teve papel importante nos episédios mais destacados dos anos que antecederam 0 aparecimento do PCB, entre eles a greve geral paulsta de 1917, quando surgiu do pré- prio movimento uma direedo, isto 6, quando o proletariado, no préprio andamento de uma greve, gerou um tipo de or- ganizaggo que, ainda nos moldes circunstanciais e t8o-so- mente voltada para o problema do momento, importave no reconhecimento de que amadureciam as condigées para a formacfo de um partido, isto é, da organi2ac8o especitica destinada a oriantar as lvtas do proletariado. Na época, no entanto, a camada que comandava as mudangas politicos era a pequena burguesia, como vanguarda da burguesia em ascensfo. 23 i | | j II, OS MOVIMENTOS ARMADOS. Entre a eleigdo de Artur Bernardes e a sua posse rola- ram quase nove meses agitados, em que as ameagas de movi- mento militar se sucediam. Entre 2 eleiggo, quando ficava claro que o regime ganhara a parada, e o primeiro ato armi do de rebeldia militar, entretanto, correram apenas quatro meses, tempo suficiente para que a agitacdo se alastrasse © as conspiragées buscassem dar-Ihes vaso. Os militares divi- diram-se, nesse perfodo, e depois, em duas facgGes adversas: 2 dos legalistas, que defendiam a “‘ordem”, Isto é, a manu- ‘tengo do status quo, e a dos revoltosos, que se articulavam ppara movimentos armados. Se os primeiros tinham por si a quase totalidade da estrutura oficial das Forgas Armadas, Isto 6, 0s comandas e os ministérios, os segundos contariamn, de infcio, com um chefe de grande prestigio para estimular apolar as suas ages, Em verdade, a participagio do Mare- chal Hermes Rodrigues da Fonseca — dado que o Exército era uma organizagfo hierérquica — teve, em 1921 ¢ em pe eee 1922, muita importancia, Membro de uma familia de mil teres, em que fulgurava a tradi¢#o de Daodoro da Fonseca, fundador do regime, Hermes fora Ministro de Guerra e Pre- sidente da Reptblica. Seu prest(gio derivava desse pessado & fra acrescide do que o posto significava para os militares Sua presenca na crise, desde as assombiéias tumultuoses do Clube Wilitar, dava relevo a uma participago que ele hon- rou com decisées concretes e firmes. 0 Tenentismo, assim, surgia, apesar de fundar-se particularmente na atividade dos militares jovens, ainda nos postos iniciais da carreira, sob a protepo de um chefe que encarnava o que o Exército tinha de mais representativo na época. A crise teve, entre muitos outros episédios, que denunciavam a intense agitagSo daque- la fase, 0 que ocorreu em Pernambuco. Néo cabe aqui histo: tia @ detalhar o referido episédio, aqui mencionado apenas ppara situar a presenga ativa de Hermos na rebeldia militar que crescia, Na qualidade de chefe da mais alta graduaggo ® ainda na qualidade de Presidente do Clube Militar, ele diri- giu um telegrama ao comandante das forcas do Exército em Pernambuco, alertando-o para o fato de que devia obedién- cla aos prinetpios que regiam a instituigo militar, acima da obediéncia 20s eventuais detentores do poder. Era uma ini- ciativa que 0 colocava, a0 marechal, em confronto ostensive com o Presidente da Repdiblica, chefe das Forgas Armadas or dispositive constitucional. Epitécio Pessoa, cioso de sua autoridade e em fim de mandato, ndo era inclinado & trans géncia: a 2 de julho de 1922, o Marechal Hermes da Fonse- ca foi preso. Estave armada a espoleta do disparo que vinha sendo preparado ha muito, A § de julho, a rebelido estours- va no Ho de Janeiro, © levante foi uma coisa e a conspiragdo foi outra col- sa; na verdade, como depois se repetiria, os elementos que se levantavam, em diversos lugares e em ocasiGes diversas, 20 longo dos anos, contavam sempre com uma adesfo que jamais se confirmou, pelo menos nas dimensées esperedas. Isso aconteceu na madrugada de 5 de jutho de 1922: quan- do 08 cadetes da Escola Militar, entdo no Realengo, mercha- ram sobre a Vila Militar, sob 0 comando do Coronel Xavier 26 de Brito, certos de que ali receberiam as adesGes com que ‘contavam, foram recebidos a tiros. A tentativa ocorrida em um dos quartéis de Vila Militar, envolvendo uns pouces ofi ciais, morreu no nascedouro e a maior guarni¢go da capital do pa(s manteve-se 20 lado da legalidade, Os cadetes retor- naram & Escola Militar, onde foram presos e, depois, tive- ram a8 suas carreiras cortadas. Os mais ativos iriam engros- sar as fileiras dos conspiradores, em uma atividade que atra- vessaria 0s anos, A maioria teve de buscar meio de vida no- vo e dispersou-se, depois de breve estigio em unidedes di verses, como soldados. Isso aconteceu, também, no Forte de Copacabana, comandado pelo Capito Euclides Hermes da Fonseca, filho do Marechal Hermes: tendo acordedo a cidade com o troar de sous canhées — um de seus tiros atin giv mesmo o patio do Ministério da Guerra — a guarnigéo do Forte ficou reduzida a um pequeno grupo, logo que confirmed o fracasso do levante. No dia 6, realmente, pre~ 0 0 seu comandente, que safra para parlamentar com as autoridades, a maioria das pragas e dos oficiais optou pela desisténcia e abandonou a fortificacdo. Sob 0 enérgico e vi- goroso comanda do Tenente Antonio de Siqueira Campos, reduzido grupo de oficiais e pragas decidiu enfrentar as tro- pas governistas que se concentravam em Copacabana. Si- queira Campos, depois de abrir os portdes a0 que desejas- sem abandonar 0 movimento, partiu a bandeira do Forte em dezoito pedagos, que entregou aos que haviam optado pela [uta até 0 fim. O extraordinério feito desse pequeno ‘grupo, que se deslocou ao longo da praia de Copacabana, a0 tencontro das foreas legals, tornou-se, com a ressonancia que aleangou em todo o pais, @ com a sua gloriticacao pela im- prensa de oposigfo, uma das motivagSes fundamentais das ages que se sucederiam a0 longo dos anos. Abatidos pelo fogo legalista, morreram os tenentes Mério Cerpenter Newton Prado e ficaram feridos os tenentes Siquaira Cam- pos ¢ Eduardo Gomes, © herofsmo dos revoltosos abalou, realmente, © povo brasileiro ¢ deu a medida do extremo a que chegara a paixo pela causa que defendiam. A derrota, nas condigées em que ocorreu, com 0 fracasso no Rio ena 27 tentative da guarnigio de Mato Grosso — comendada pelo General Clodoaldo da Fonseca, capitulou em Trés Lagoas — rio arrefeceu send temporariamente o énimo dos militares feridos pelos reveses mas sempre prontos a tetomnar a luta, Essa dimenséo de herofsmo, realmente, em aparente despro- oreo, vistos os acontecimentos na disténcia do tempo, 4 profundidade a que atingira a repulsa is mazelas do regime, sob-a superficialidade dos motivos entéo alegados. Havia, evidentemente, um processo profundo e subjacenta, ue prosseguiria a0 longo do tempo, e uma sinalizagio exte. rior e factual de acontecimentos e formulegdes cuja superti- cialidade surpreende hoje, Além disso, verificava-se a distan- cia singular entre os proclamedos propésites dos rebelados e aquole herofsmo levado as Gltimas conseqiéncias: enquanto este estava além da medida, aquele era de impressionante modéstia. Por outro lado, e hoje a perspectiva do tempo admite esta visfo, havia uma diferenga enorme entre as ma- zelas de um regime }& em dissonancia com a realidade do als e os problemas tbpicos e circunstanciais colocados © ue despertavam paixées t8o violentas. Os protestos milita- res em defesa da dignidade ofendida, depois que os falsrios hhaviam confessado a fraude que haviam cometido e depois. que Bernardes. desmentira @ autoria das cartas, pareciam sem sentido. Este era o lado formal, entretanto, E apenas ‘mostra, como exemplo frisante, que a hist6ria como arrola- mento de fatos pode falsear, ¢ realmente falseia, a realidade do process. AA luta politica prosseguiu, depois dos acontecimentos de julho de 1922, As prisbes e depois 0 afastamento dos clo- ‘mentos militares mais envolvidos nos levantes colocou-os em condig6es de dedicar todo o tempo a novas articulapSes. © ano de 1923, realmente, assinala o desenvolvimento de intensa trama conspiratéria, tecida por elementos diversos, dentro eles se destacando 0 capitfo Joaquim Tévora, secun. dado por alguns ex-cadetes da Escola Militar, Paralelamente, como componente que se juntaria, adiante, aos novos levan- tes militares, surgia no Rio Grande do Sul, a 25 de janeiro de 1923, uma rebeligo de ambito estadual, contra o governo 28 Ha do Borges de Medeiros. Tal rebelio, em que as forgas mili- tares federais ficavam marginalizadas, assinalava uma suces- sfo de choques militares de tropas irregulares, que destaca- riam alguns chefes regionais cujo renome cresceria com 0 ‘tempo. Nos primeiros dias de novembro, o governo central — Borges de Medeiros figurara como um dos mais destacedos apoios & candidatura oposicionista de Nilo Peganha e Ber- ards estava interessado em ganhé-lo para poder enfrentar 2 luta contra as rebelides militares — conseguiu 0 armist/cio entre as faces desavindas no Rio Grande. Finalmente, @ 14 de dezembro, firmavase ali o acordo de Pedras Altas, pondo fim Squela guerra regional. © Marechal Hermes da Fonseca falecera a 9 de setembro ¢ as atividades revolucio- érias enfrentariam, agora, mais um problema: o de conse+ ‘guir um chefe militar que concordasse com os propési mantidos pela conspiragéo que nifo cessara. Esse chefe seri © General Isidoro Dias Lopes, jf reformedo, que se destaca- ra em atividades no sul do pafs. Era um nome respeitaco mas pouco conhecido. O represamento das atividades dos revoltosos néo arrefecera, entretanto, o énimo dos conspira- dores. Joaquim Tévora ia de guarni¢fo em guarnigéo, bus- cando adesdes e compromissos para nova tentativa. Tratava- se de aproveitar a ligdo de 1922 e conseguir que os compro- iissos fossem realmente honrados e que os levantes projeta: dos niio sofressem da anemia do isolamento. Dois anos de- do extraordinsrio feito dos 18 do Forte de Copacaba- ra, surgia a rebeligo que teve como sede a cidade de Sé0 Paulo. (O-segundo 5 de julho, o de 1924, teve dimenséo mui to maior do que o primeiro, que ficara marcado pelo sact ffcio heréico dos 18 do Forte de Copacabana. Tratava-se, ‘agora, do controle sobre a segunda cidade do pats, na épo- @, e seu maior parque industrial, onde, portanto, estava concentrada massa operdria de dimensio jé significativa. Dé ‘outro lado, of efetivos militares empenhados na revolta eram muito mais vultosos e dispunham de efetivos e de a mamento muito mais importantes do que ocorrera antes. Entre 0 dia 5 e 0 dia 28, quando os revoltosos decidem 29 abandonar a cidade de Séo Paulo © retreir para o sul do pals, a crise militar aleangou sua dimensiio méxima. A mor- te de Joaquim Tévora, em combate, influlu certemente para tuma deciséo que importava em reconhecer @ superioridade do cerco imposto pelas forcas legalistas. Mas a rebelido con- tava, agora, com chefes militares néo s6 mais numerosos ‘como msis devotados do que equeles que antes se compro- * metiam e na hora faltavem aos seus compromissos. Houve ‘uma certa correspondéncia entre @ conspiragio ea rebeligo: unidades inteiras incorporaramse ao movimento, vindas de quernigSes diversas do Estado, A luta foi intensa e a cidade suportou bombardeio pesodo, que fez numerosas vtimas na populagdo civil alarmou as autoridades locais ¢ particular- mente as entidades patronals. Até que ponto a populacdo apoiou 0 movimento é diffcll precisa; era inequvoca a sim- patia geral pelos revoltosos mas a inexperiéncia, a falta de motivecéo direta reduziram tal simpatia @ muito pouco, em ‘termos reals. Por outro lado, 0 Tenentismo iria provar, com (caso concreto de Sto Paulo, seu claro distanciamento da massa operéria, Os dirigentes mais ldcides do movimento ‘operério paulistano, realmente, buscaram o General Isidoro Dias Lopes e the pediram armas, para concretizar a sua par- ticjpagéo na luta, Mas 0 chefe rebelado no ousou aceltar essa adesfo, que poderia alterar a qualidade da revolta. A massa operdria, em Si Paulo, assistiu o movimento, acom- panhou os seus lances em clara simpatie pelos revoitosos, ‘mas nfo ultrapassou esse limite, Elementos estrangeiros, de caracteristicag proletérias inequivocas, participaram da luta ‘mas dela se afastaram assim que verificaram as dimensGes de sous limites e a falta de perspectiva em que se colocarie, quando a superioridade dos legalistas ficou patente @ os re- belados mantiveram sua potigdo de recurs 2o apoio popular para a luta armada, Em Séo Paulo, realmente, o Tenentismo fiaria caracterizado como movimento de fragGes militares dda pequena burguesia, temeroses do aprofundamento de sua luta, E esta, entretanto, ganharia dimensées noves e en- contraria eco em locais divars0s © distantes. A 13 de Julho, realmente, levantave-se parte da quarni¢fo de Aracaju, em 30 Sergipe, depondo 0 governo estadual. 0 movimento foi su- focado 36 a 2 de agosto, isto &, teve razodvel duragéo e de- mandou esforco considerdvel do governo para debelé-lo. A 24 de outubro, em Santo Angelo, no Rio Grande do Sul, levante-se a quarnigéo, sob 0 comando do capitio Luis Carlos Prestas; a 29, Gay levantava a guarnigdo de S40 Luts; Juarez Tévora, @ de Uruguaiana; Siqueira Campos, a de Sé0 Borja; Femando Tévora, @ de Cachoeira, No dia 30, Jofo Alberto e Juarez Tévora atacavam Alegrete; a 11 de novern- bro, travave-se 0 combate de Guagu-Bol. Como as adesdes demorassem, 0s revoltosos concentraram-se em Sé0 Lu’s e ram por dois meses, com o controle da situagéo, A 27 de dezembro de 1924, chegava um emissério do General Isidoro Dias Lopes: sugeria 0 deslocarnento das foreas revol- tosas para o norte, rumo & Foz do Iguacu. A 28 de dezem- bro, 0s revoltosos de So Paulo retiravam-se da cidade, em comboios ferroviérios, rumo as barrancas do rio Parand, combatendo em diverses cidades do interior do Estado. Ba- tidot om Trés Lagoas, desceram o Parand, ocupando locali- dades das margens e fazendo da For do Iguact o centro de gravidade das agGes e a sede do comando. Haviam ocorrido agGes isoladas em lugares os mais distantes: a 12 de julho de 1924, levantara-se @ guarnicdo de Ponta Pord, em Mato Grosso; a 23 de julho, 0 tensnta Ribeiro Junior ravoltara a uarnigio de Manaus, conseguindo controlar 0 governo; a 4 de novembro, levantave-se 0 couracado Sé0 Paulo, sob 0 comando do tenente Hercolino Cascardo, sendo obrigado a entrogar a belonave, em Montevidéu, a0s oficiaislegalistas. ‘A queda da preca de Catanduvas, no Parané, em marco de 1928, sob o assédio de forcas legalistas poderosas,, mostrava a necessidade de uma decisfo que abrisse perspec- tivas 20s movimentos militares que, dispersos, eram sucessi- vomente batidos. Muitos elementos j6 haviam procurado 0 oxilio, desesperados ou simplesmente desanimados quanto a tum sucesso préximo do movimento militar. A 2 de abril ddesse ano, na Foz do Iguacu, encontravam-se os chefes dos movimentos surgicios em Séo Paulo e no Rio Grande do Sul; de um lado, 0 General Isidoro Dias Lopes; de outro lado, 0 31 cicacemumaerauemmmmams Murai aneeeaaarmaee Capito Luis Carlos Prestes; ambos acompanhados dos que 08 haviam seguido até af. Duas opiniées se chocaram ont a dos que optavam pelo exitio, & espera de navas e melhores condigtes para a retomada da luta, ou jé desanimados de Que ela conseguisse superar todos os obstaculos que vinha encontrando, desde 1822; e a dos quo optavam pela conti- ‘nuapfio da luta, mas sob nova forma, O intérprete e defen- sor acérrimo dessa segunda solucdo foi o Capito Lu(s Car los Prestes, secundado pelos principais elementos que o ha- viem seguido desde a arrancada de Séo Luls das Missées, va- rando o interior de Santa Catarina @ do Parané. Prevaleceu @ posigio defendida por Prestes que achava ser a guerra revolucionéria, no Brasil, nas condig&es com que se defronta- vam, a guerra de movimento, Tratave-se, para ele, de orga nizar uma coluna que fosse dotada de capacidade de desio- ‘camento répido e que percorresse o interior do pafs, entran- do por Mato Grosso @ rumando para Sao Paulo quando ade- 6es significativas ou novas condigbes o permitissem, Os ré- pidos deslocamentos impediriam a repressio pelas forcas le- ais,,permitiriam provocar adesées em quarnigBes dos Esta- dose manteriam viva a chama da revolugio de sorte @ de- seneadear novos acontecimentos. A Coluna Prestes, real- ‘mente, cumpriu a Gltima parte do projeto, mas foi o limite méximo a que atingiu. Extraordinério feito militar, sem pa- ralelo na hist6ria — a sua marcha foi mais longa do que a de Antal e do que a dos revolucionérios chineses de Mao Tse- ‘Tung — fixou fundamente a imagem do herofsmo tenentista no espfrito popular, levou a bandeira da rebeldia a recantos do Brasil que desconheciam os mais elementares direitos da cidadania, trouxe em constante preocupacio as autoridades , com isso, provocou dela variadas formas de repressio, desde o emprego de forcas regulares até a utilizagfo intensi- va da tropilha do latifindio, que acossou os restos da Colu- ‘na até sua internapgo na Bol(vie, em fevereiro de 1927, de- pois de percorrer cerca de 30,000 quilometros © de ter tra- vedo numerosos e cruentos combates. Néo despertou, po- rém, 0 que era fundamental, adesGes significativas, seus efe- tivos tenderam & redugo e seus recursos em armas e muni- 32 Bes estavam praticamente esgotados quando da deciséo de encerrar as sues atividedes, Ficaria como proeze militar € como exemplo de devogio ® causa revolucionéria e fixaria ‘na meméria popular algumas das personagens mais destaca- das do Tenentismo. Entre elas, singulatmente, a de Prestes. A imprensa da oposi¢o, que celebrava os feitos da Coluna @ mantinha as atencdes do piiblico sobre eles, criou o titu- lo de Cavaleiro da Esperanga, com que ficou conhecido por muitos anos. O prest/gio de Prestes alcangou, naquela fase, tum nfvel como raramente, no Brasil, alguém conheceu, A partir de Colune, e com a concordéncia explicita de Isidoro Dias Lopes, Prestes passaria a ser a figura militar mals deste- cada do pals e nada se poderia coneretizar som a sua opt, nifo ser ouvids, daf por diante, No exilio, os remanescentes dos movimentos armados, aguardavam nova oportunidad para intervir na lute. A conspiracio, com altos e beixos, prosseguia, animada por eles do extlio e atenta a0 quadro politico que se agravara no Brasil. Em maio de 1925, quan- do a Coluna jé percorria o interior, o Tenentismo realizava mais um de seus desesperados atos militares, com o ataque 0 quartel do 3° Regimento de Infanteria, na Praia Verme- tha, Ataque malogrado, evidentemente, pela absoluta falta de condicdes para o sucesso, o que ancorraria, praticamente, a seriapdo das ades tonentistas. IV. A FASE POLITICA © largo painel em que o Tenentismo se desenvolveu, no Brasil, enquadrou-se entre duas grandes crises do capita- lismo em escala universal: a crise cfclica de 1920 ¢ perticu- larmente a crise cfclica de 1929, cuja gravidade foi enorme «© cujas repercussées em todos os continentes foram muito fortes, incluindo-se a América Latina entre as éreas mais fundamente atingidas pelos seus efeitos e o Brasil como um dos pa(ses em que tais efeitos ultrapassaram o nfvel econd- rico e financeiro para atingir 0 nivel politico, culminando (© procesto com a chamada Revolugio de 1930, que assinala um dos tltimos epis6dios do Tenentismo, se é que néo foi, realmente, o dltimo. Um dos reflexos da crise ofclica de 1920 foi 0 declfnio da exportagio do café brasileiro, em valor; esse declinio nfo s6 afetava seriamente’a estrutura politice dominante, gerando inquietagdes, como importava ‘em baixa no prestigio das forcas politicas da drea cafeeira, (0 Estado de Sfo Paulo particularmente, a que pertencia, com 0 Presidente Washington Luts no poder, @ hegemonia nacional. Entre as preocupagées deste Presidente, que os- ‘entava o seu mandonismo como sea situago o permitsse, a estabilidade financeira era principal. Como sempre aconte- 2, no Brasil oligrquico e mesmo no contemporéneo, 0 Brasil de precom{nio social da burguesia, projetos de estabi- lidade monetéria ou de seguranca econémica para os lucros dda classe dominante importavam @ importam sempre em projuzos para as classes dominedsas, entre elas a que forne- ©2 0 trabalho. O macanismo de transferéncia de efeitos fun- ciona, nesses projetos ou nos planes que o$ definem, como rotina habitual: as economias imperialistas transferiam os seus prejulzos para as economias subordinadas e, nos paises Gependentes, as classes dominantes os transferiam 8s demais classes, @ que faltavam recursos politicos para resistir. De ‘qualquer forme, quando o Presidente Washington Luts, com 4 obstinago que the ere caracterfstia, pretendeu aleancar 4 estabilidade financeire, 0 prestigio do Governo, que vinha sendo abalado sensivelmente pelo movimento tenentista e pelo crescimenta de uma oposicdo politice que se articulava agora e tomava formas organizadas de lute, 0 prestigio do Governo declinava ainda mais, la ter infcio uma nova fase no desenvolvimento do Tenentismo, Até af, 0s militares haviam timbrado em man- ter-se distantes dos politicos civis. Predominara, entre eles, a idgia de que a politica & uma coisa suja e de que os poli. ticos $80 necessariamente corruptos ou, quando menos, mais interassados em sua realizagio pessoal do que na defe: sa do povo. Essa idéia, ada politica como atividade indigna dde homens probes, como definida pela defesa do interesse privado, exercida por pessoas desvinculadas do povo e a ser- ‘igo de lucrosilfcitos era um dos elementos conceituais que $2 inseriam com justeza no pensamento politico dos militae Fes. Os objetivos do Tenentisme, como veremos adiante, eram madestos, Eles pretendiam, em suma purificar o reg. ‘me, republicanizar a Reptiblica, como costumavam dizer, nas suas formulagdes, em diversas oportunidades. Nada mais 60 que isto. Ora, © que vinha sujando a Repiblica era a atividade dos politicos. Realizada uma tarefa preliminar de limpeza da érea polttica, tudo entraria nos eixos e 0 Brasil, finalmente livre da corrupedo inerente aos politicos, pode- Tia realizar 0 seu destino. Daf 0 ostensivo distanciamento que os militares ligados a0 movimento tenentista manti- ‘nham para com todos aqueles que exerciam atividades polt- ticas, mesmo. quando de oposicéo. Essa desconfianca apare- ce nas formulagdes dos militares empenhados ne luta € consta mesmo de documentos, especialmente daqueles tro- cados entre eles mesmos, isto 6, resguardados da divulgacio. Portadores de uma miso purificadora, nfo queriam a liga ‘oo com 0s polfticos, que simbolizavam a corrupcéo. Por seu lado, os politicos, que assistiam as ages desesperedas dos militares, sempre condenadas 20 malogro, sentiam-se inseguros ante a desconfianga deles e no viam em tais ages mais do que elas representavam, isoladamente. Isoladamen- te, eram de repercusséo polftica menor, sem divide, Ora, 0 andamento do proceso iria por em questdo justamente problema da unigo entre civis e militares que se propunham renovar a politica brasileira. A oposigSo intermitente, mar- cada polas composigdes transitérias que surgiam por forca das lutas sucess6rias, ¢ terminavam com elas — composigdes de cdpulas, am que os governos estaduais entravam e safam sem maiores comprometimentos, particularmente programé- ticos — estava condenada ao fim, suas possibilidades, esgota- das em cada episédio, nfo se renovavam e, portanto, as perspectivas se fechavam para uma ago efetiva. Em dezom- bro de 1926 — a Coluna Prestes intemar-se-ia na Soltvia pouco depois e longe — Leonel Racha e Zeca Neto, caudi- thos sulinos, trabalhando em combinaglo com diatrizas de Isidoro Dias Lopes, dadas em Libres, sede do comando te- rentista, tentaram incursées em territério brasileiro, sem sucesso, tendo de retrait para o exilio. Outra tentativa de ppenetracSo no Brasil, juntando caudithos sulinos ¢ elemen- tos tenentistas no extlio, realizou-se em dezembro de 1926 janeiro de 1927. Eram os estertores de uma agonia que a Coluna Prestes prolongara além de todas as possibilidades e com grandes sacrificios. Nos Gitimos dias de setembro de 1927 era fundado, em Sfo Paulo, o Partido Democratico que, adiante, aparece ria também no Rio de Janeiro, Era a primeira organizecdo artidéria de oposiggo visando aco politica continuada que aparecia no cenério brasileiro, desligada de problemas suces- sbrios © pretendendo submeter-se ao julgamento popular, em eleigtes, apresentanco programa capaz de atrair apoio. O'Partido Democrético assumia dimenséo nacional, assim, ‘depois de mais-de ano de existéncia de sua face paulista, que datava de fevereiro de 1926. Tratava-se de fato novo, que influiria na mudanga em processo, No Rio Grande do Sul, por outro lado, em novembro de 1927, Getiilio Vargas, assumia 0 governo estadual, chegando ao fim o prolongado ‘exerefcio de poder por Borges de Medeiros, motivo formal {das lutas que haviam dividido as forcas politicas do Estado, Empossado em janeiro do ano seguinte, Vargas criava condi- ‘98es para estabelecer um clima novo em seu Estado, Jé em ‘margo, os entendimentos entre politicos civis ¢ revolucions- rios militares tinham infcio de forma sistemética. Era um momento inovador. © quadro geral anunciava mudangas. Alguns fatos :menores passavam despercebidos: em dezem- bro de 1927, Prestes fora procurado, na Bolfvia, por Astro- jildo Pereira, que falava em nome do Partido Comunista do Brasil, de que fora um dos fundadores. Astrojildo, depois de encer sérias resisténcias na dirego do Partido, levava a Prestes propostas concretas de ago comum. Para preparé- las, conduzia alguns livros marxistas, que deixou com 0 co- mandante da Coluna. Em outubro de 1928, Joo Pessoa to- ‘mava posse do governo da Parafba, Personagens até af de se- gundo plano comecavam a despontar. Mas, no geral, impor- tante era a conjugago entre civis, organizedos em forma partidaria, ¢ militares, que abandonavam sua ojeriza tradi rnal pelo entendimento com politicos e trocavam a pratica da ‘ago armada pela prética da ago politica. Ainda assim, em agosto de 1928, Prestes, ern documento divulgedo em ambi- to restrito por Juarez Tavora, dava um balango na situag achava que os militares ndo dispunham de elementos para nova a¢do armada, que os politicos, com os quais jé manti- 38 nham entendimentos, no dispunham de organizacdo efi ite, que 0$ recursos financeiros pera qualquer ago no estavam disponfveis e que, portanto, “somente em época mais ou menos remota se poder esperar que tenhamos reu- ido elementos para um movimento sério". Era um balanco pessimista da situacdo, que levava a uma diretriz modesta: os civis deviam continuar a rregimentar-se, mantendo-s2, entretanto, isolados da “‘preparacdo militar até que esta es- teja mais ou menos consumada”; os militares “deviam ser trabalhados pelos préprios camaradas com quem j4 conta- mos dentro.dos.corpos, até que se possa apurar, de fato, a possibilidade real de cooperacgo de cada unidade". © ano'de 1929.iria dar acabamento 20 processo de aproximago entre’ polfticos civis e militares revolucioné- rios, coma abertura do problema sucessério. Continuando fo que j4 se'vinha processando desde o Civilismo, as suces- ses presidenciais abrindo crises e possibilitando cisSes nas forcas pol‘ticas tradicionais, a do Presidente Washington Luis provocaria o agravamento delas a cada lance, agora apresentando aspectos verdadeiramente ameacadores & es- ruture do regime, ao dominio das oligarquias. Contrarian- do 0 técito atordo entre Minas e Séo Paulo, para reveza- ‘mento na Presidfincia da Repdblica, Washington Lu‘s colo- carla todo o peso de sua autoridade no sentido de atribuir a So Paulo, novamente, a Presidéncia, na pessoa de Jélio Prestes, de quem esperava a continuacdo da politica que vinha desenvolvendo para a estabilizagdo financeira. 1380 teria conseqiléncias, inevitavelmente, porque o governador de Minas Gerais, Antonio Carlos Ribeiro de Andrada, julge- vase, por the caber ¢ vez e por ser quem era, no direito de suceder ao paulista que governava a nag. Para enfrentar 2 forma como Washington Luis conduzia 0 probleme, Minas, @ Rio Grande do Sul, nele interessados, firmaram um pacto politico, em junho de 1929. Habilmente, Antonio Carlos levantaria a candidatura de Getilio Vargas: a alianca entre 0s dois Estados paracia suficiente para enfrentar as foreas governistas, Quando, em julho, Jodo Pessoa respondeu & ‘consulta de Washington Luis para apoio & candidatura de 39 Jalio Préstes com o contundente Mego, reforsava-se aquilo ‘Que se tornaria, na campanha, a Alianga Liberal, cuja cam panha, iniciada em agosto, seria um espetéculo inédito, peelas proporgées, abrangendo todo o territério nacional, Para ela no apenas concorriam os governadores dos trés Estados, Minas, Rio Grande do Sul e Pérafba, mas os opo: cionistas de todos os.Estados ao governo central. E, para completar o quadro, os militares exilados @ todos aqueles ue, embora fora do Tenentismo, viam com preocupagéo 0 dbilitamento do poder central e a perspectiva de uma luta interna em que seriam necessariamente envolvidos e obriga- dos a optar. Em dezembro do 1929, Prestes encontrou-se com Vargas, em Porto Alegre, e estava montado um dispo- sitivo que permitia aos exilados entrar e sair do Rio Grande do Sul, participando ativamente da conspirago para vencer © Governo central, af ja desmandado com a intervengdio na luta na Parafba e com medidas de todo género destinadas a ‘assegurar a vitéria do cendidato oficial, Prestes fora procu- rado, agora em Buenos Altes, por outro emissério da dire- so do PCB. Entre um fato € 0 outro — 0 encontro com 0 Teferido emissério comunista e 0 encontro com Vargas — Prestes, mais uma vez, @ falando pelos companheiros de lu ‘tas, mostrava'se oético quanto a alianes com os politicos, ‘embora estes, agora, estivessem franca e abertamente dese vindos com 0 governo central. Em carta a um companheiro, fem agosto, definia a posi¢o que, a seu ver, 08 elementos ‘tenentistas deveriam manter. Observando a luta eloitoral, dizio, “no interviemos, evitando alianeas que julgamos des. Necessérias 0, portanto, prejudiciais as verdadeiras relvindt- eagBice polfticas ou, como jé tivemos ocasigo de dizer, in- compatfveis com as aspiracées revolucionériss e ultrajantes '& meméria dos companheiros que foram sacrificados na lu: ta”, Joo Alberto contou, mais tarde, em suas memérias, ue Prestes permanecera irredutivel, quando, procurado por ele @ por Siqueira Campos, em Buenos Aires, disoutira a ‘uapfo 0 problema da alianca com os civis: “Quando, mais tarde, voltei a insistir sobre a questéo, Prestes explicou-me ue fora a Porto Alegre por insistincia do Siquaira ¢ no 40 i por vontade prépria. Adiantou que néo confiava em poltti- 08 e, sobretudo, em Osvaldo Aranha, acrescentando que me chamara porque, entre revolucionérios, somente eu ou Siqueira poderia controlé-lo”. ‘ ‘As eleigdes de 19 de marco de 1930 foram a repetiego de’ um velho espetéculo, mostrando que, na Reptblica ol gérquica, 0 governo néo as perdia de forma alguma, varian- do entre a corrupeio ¢ # fraude, de permeio com a violén- cia: Vargas foi derrotado no cémputo dos votos. Ngo satis- feito, Washington Lufs mandou “degolar” sumariamente toda @ bancada paraibana e os elementos mais combativos dda bencada mineira. Fazia um aceno ao Rio Grande do Sul pera que se conformasse @ voltasse ao rebanho. A conspire 0 que juntava civis @ militares entrou em exasperante ppausa, parecendo dar razlo a Prestes. O 6rg8o do Partido Republicano, em Porto Alegre, saiu com o editorial “Pela ‘ordem”, em que ficave definido um rumo de capitulagéo. Prestes entendeu bem o recado ¢ escreveu: “Estou informa- do de que @ msioria dos nossos companhelros discorda das, rminhas idéias compreendo que a minha exclusto do meio dos antigos revolucionérios de 22 24 é indispensivel. Jé ‘expus 2 minha opiniéo ne carta de 22 de novembro e estou hoje disposto 3, depois de prévia e lealmente avisados todos: ‘08 companheiros, torné:la piiblica.” Em maio de 1930, pa- ra culminar 0 processo de cisdo que estava esbogado ha muito, Prestes lancava o seu manifesto “eo proletariado sofredor das nossas cidades, aos trabalhadores oprimidos des fazendas © das estancias, @ massa miserdvel do nosso sertéo @ muito especialmente aos revolucionérios sinceros”. Optava por uma linha autenticamente revolucionéria e sape- ravase dos antigos companheiros. O Tenentismo sofria a sua crise mais profunda. Daf por diente, iria dividirse entre aqueles que optavam pelo reformismo, modesto em suas reivindicacdes ou vago nas suas formulages, e aqueles, mi- noritérios sem @ menor davida, que optavam por seguir a linha preconizada por Prestes, Mas os primeiros, em conse- @iiéncia do recuo das foreas polfticas tradicionais, eventual- mente divergentes do poder central no problema sucess6rio, at comecavam a ver que os proprios civis se dividiam entre tuma ala que estave inclinada a voltar a compor-se com 0 poder vitorioso, abandonando qualquer veleidade de reali 2ar 8s promessos eleitorais,e uma ala que, minoritéria som a menor dvida, continuava a voltarse para a soluggo de luta armada e continuava, por isso mesmo, a compor.se com os, Inilitares tenentistas e a conspirar. Um acidente desafortu- nado alterou brutalmente 0 quadro, ajudando a esta tltima ala: 0 assessinato de Jot Pessoa, no Recife, a 26 de julho de 1930, Siqueira Campos, o mais prestigioso dos elementos do Tenentismo, depois de Prestes, falecera em acidente de aviagfo; Juarez Tévora, em junho, contestara a linha preco- nizada por Prestes ¢ assumira uma posigfo de lideranca no movimento, Era a direita que passava a predominar. A conspirago, com a morte de Jodo Pessoa, foi retomada @ avolumouse. A 3 de outubro de 1930, irrompia o movi- mento que, @ 24, pela opeSo dos elementos que ainda ser viam ao governo central, tornousse vitorioso. A 3 de no- vembro, Vargas assumia a chefia do Governo Provisorio ¢ Juarez Tévora, em saguida, era designado para as funcées esdrdxulas de vice-rei do Norte e 0 Ministério da Viacdo. Surgiam os tenentesinterventores, figuras que se tornaram ‘objeto de samba. Elementos secundérios do Tenentismo parsavam a recebor prémios pelo que no haviam feito, sl- Vo raras @ honrosas excecées. Outros, mals discretos, volta vam &s atividades profissionais. 0 comando recusado por Prestes, fora ocupado por Geis Monteiro que se tornaria elemento destacado nos acontecimentos militares, daf por dliente: a direite era roforcads. No desenvolvimento do pro- cesso, Jogo Alberto perdia o governo de So Paulo e Miguel Costa era marginalizado, Dividido, surgiram nele divergén- clas pessoals, lutas por cargos, despojamento das ilusbes en- +igas: nada como 0 pader pera corromper as pessoas. A ten- tativa, om 1932, de retorno ao status quo ante, com a rebe- lido paulista dita constitucionalista, ainda provocou limita- do movimento no sentido da recomposi¢do das fileiras do Te- nentismo. Foi o seu Giltimo estertor, porém. Derrotacios plas, armas, os que haviam articulado © movimento de rebeldia, 42 contra 0 Governo Provisério, foram vitoriosos p te: a chamada Revolugio de 1930 entrava em ritmo lento aproximava-se de uma crise de natureza bem diversa, no conturbado porfodo entre 1930 e 1935, quando a agitago provocou uma radicalizacdo de posigdes de que surgiram em cena dois tipos de organizagio: a Alianga Nacional Liberte- dora e a Acdo Integralista Brasileira. Em ambas, elementos tenentistes participaram ¢ isso definiu o desaparecimento dos motives que antes os haviam unido: o Tenentismo esta- va morto, A ditadura de 1937, em seguida, provocava o seu desaparecimento do cenéric icamen- 43 V. CONTEUDO E PROGRAMAS © Tenentismo, particularmente entre 1922 e 1924, perfado rico em acontecimentos militares, tentativas arma- das de tomada do poder, foi sempre pobre em manifestar es programéticas. Nao houve, da parte dos seus elementos mais destacados, capazes de operar feitos de extraordinério valor e até de singular herofsmo, isto é, na prética, nenhuma preocupago em definir os seus propésitos, especialmente em eleborar programas. Isto estava ligado, ainda, & antiga ¢ constante refratariedade de seus elementos 20s métodos Usuais, 0 horror que neles sempre havia despertado a inocui- dade dos programas com que 0s politicos buscavam disfar- Ger @ indigncia de seus propésitos e a tendéncia a assegurar ‘a continuidade da estagnac8o republicene, que permitia 0 ‘rangililo domfnio oligérquico. Obrigados, de quando em vez, pelo menos na atividade parlamentar, a definir rumos, propor questées, esclarecer tendéncias, dizer algo sobre os objetivas que os moviam, os elementos politicos tradicio- nais no se preocupavam demasiado com as palavras e ainda menos com os compromissos. Mesmo os com{cios s6 se tor- naram habituais nas fases de crise sucess6ria e a partir do aparecimento de oposicio organizada em partido, Mas néo & diffe, entretanto, encontrar, aqui e ali, pronunciamentos que ajudam a esclarecer sobre os propésitos dos elementos, militares ligados a0 Tenentismo. Em 1922, Eduardo Gomes, 1no interrogatério policial militar a que foi submetido, infor- ‘mou que participara do. movimento “porque 0 governo es- ‘tava saindo fora da lei com o propésito de intervir em Per- nambuco e porque era desejo do pars ver afastada a hipote- se da posse do Dr. Artur Bernardes"; Siquelra Campos, no seu interrogat6rio, diz que participara do movimento “por- que achava que os dltimos atos dele (0 governo), jé na ques ‘to das candidaturas presidenciai, {4 no caso de Pernambu- 0 e, finalmente, no caso puramente militar ds prisfo do Marechal Hermes © nas notas consecutivas, enfim de um modo geral, a maneira por que o governo tratava 0 Exérci- +o, segundo acha o depoente, petmitia a esse Exército todos (08 atos de revolta”; 0 tenente-coronel Frutuoso Mendes, elemento que se destacara nas Assembiéias do Clube Militar, fem suas declaragdes responsabiliza o Presidente Epitécio Pessoa’ e seus conselheiros pelo movimento, porque “prati- cou excessivas arbitrariedades, violéncies, injustices, desobe- isncia as leis ¢ ultrajes contra as classes armadas © as de- mais da NaoSo”, “por ter repreendido e prendido, injuste- mente, indmeros oficiais, alguns dos quais de alta patente € sem uma nota que hes manchasse a brilhante {6 de offcio”, “pela prisio de um marechal, o chefe do Exército, em pleno estado normal, num regimento comandado por um tenente- coronel, sob 0 falso pretexto de ter infringido a discipline’, “pelo fechamento do hist6rico Clube Militar de to glorio- 08 tradigGes, ato que por si s6 basta para evidenciar a sua provocaeio insolente ¢ injuriosa:ao Exército”; os 588 alv- ros da Escola Militar rebolados confessaram “o haverem fei- to espontaneamente para auxiliar os chefes a desafrontar 0 Exército”. 46 Percebe-se que @ nota Gnica, quando néo absolutamen- te predominante — raramente hé mais de uma—& a desafron- ‘a de dignidade militar, ferida por atos do Prosidente Epitécio Pessoa. Nao hd mencéo a qualquer motivo ou objetivo polf- tico; raramente aparece referéncia as eleicCes em que Ber- nardes fora escolhido. Jé os revoltosos de 1924, em So Paulo, iam mais longe. Tiveram mesmo a preocupacéo de deitar manifesto em que buscavam explicar as raztes do movimento: “‘tornar piblicas as razBes fundamentais do seu movimento definit os seus objetivos’. Visava “muder completamente a situa¢o do governo, da Repdblica e dos Estados, onde isso for necessério a execueio do programa revolucionério"”. Quanto eo governo — agora de Artur Ber- nardes ~ frisava que “o Exéreito Nacional no pode e no pode nunca, acelter”, pols “permanecem de pé as gravfssi- mes ofensas por ele dirigidas ao Exército". Mas o movimen- to no visava a pessoa de Bernardes, mas a substituigdo do seu governo era porque “no.esté a altura dos destinos do pais" © “ser 2 continuagio dos governos eivados de vicios, que.tém dirigido o Brasil nestes Gltimos lustros”, governos “"de nepotismo, de advocacia administrative e de incompe- téncia técnica na alta administracdo, de concesséio em con- cessfo, de acordo em acordo, vém arruinando paulatina- mente 2s suas forcas vives, aniquilando-o interna e externa: mente”, © Brasil estava reduzido a “verdadeiras satrépias, desconhecendo-se completamente 0 merecimento dos ho- mens ¢ estabelecendo-se como condi¢ao primordial, para 0 acesso as posigées de evidéncia, o servilismo contumaz que, movendo-se pela mola das ambigSes, cada vez mais se gene raliza, constituindo fator de degradacio social”. Entrava erm detalhes, responsabilizando o governo “por nfio ter poupa- do 20 pais o vexamo de uma vistoria estrangeira, ainda se ter dado publicidade, por iniciativa governamental, de um documento da missGo inglesa em que até se inclufam graves, insinuagGes sobre a probidade brasileira”, Era preciso, pois, tum governo “de homens arraigados &s suas nobres tradicdes, capezes de ser equi urna unidade eficiente do programa ge- ral de moralizacdio nacional” (esta referdncia era relacionada 47 i 20 Estado de Sio Paulo e se completava com a informacdo de, para cumprir tal finalidade, j4 havia sido feito convite 10 Sr. Conselheiro Antonio Prado"), O movimento revolu: cionério era “‘um gesto de indignacdo e patriotismo", re- presentava a vontade militar “porque o Exército é compos- to daqueles que assinaram-o manifesto do Clube Militar”. Mantinha os prefeitos da capital e de todas as cidades em suas funges © esperava 0 apoio do povo, E um manifesto fem que é fécil observar um passo & frente: continua a men- ionar aversfo a0 governo e & pessoa de Artur Bernardes, ‘mas pretende moralizar a Repiblica, que vinha rolando de escdndalo em escéndalo; mencionava, entre eles, o da inter- veneo em nossos negécios internos de uma misséo estran- geira. Os revoltosos de Sergipe, no mesmo ano, também se sentiam obrigados a deitar manifesto. Comagavam por men- cionar “a situago de desrespeito e menosprezo aos direitos alheios implentada pelos que, nestes Giltimos seis anos, vEm governando a Reptblica Brasileira”; referia'se com destaque “os vexames que esses mesmos dirigentos vim impondo & classe militar”, responssbilizando pelos mesmos ao Presi- dente Epitdcio e ao seu sucessor; declarava sua adesio aos revoltosos de So Paulo e proclamava a instalagio de uma junta governativa militar até que assumisse o poder “o ver dadeiro escolhido do povo"’. Os revoltosos da Amezénia também se sentem obrigados 2 langar manifesto, em julho de 1924, Esse manifesto comega por esclarecer que, em politica, “‘regredimos, vergonhosamente, ao regime das donatérias", constituindo-se 0 governo “por intermédio de concordatas politicas passivas em que o predomfnio do di reito de voto nada mais representa do que um joguete ign bil manejado, desprezivelinente, pelos nossos dirigentes; na economia “estacionamos”; nas finangas, os orgamentos no assavam de “sfmbolos aritméticos, inexpressivos e fals(s- simos”. Em 35 anos de regime republicano, nosso povo ““ignora 0 que seja 0 regime democrético, vive maltrapilho e faminto”, porque os governantes nada mais taziam do que ‘mentir despudoradamente. Por isso, “nds, militares, no po- derfamos permanecer por mais tempo surdos a esses angus- 48 tiosos apelos de protegdio e benemeréncia que, por intermé= io de seus sofrimentos e amargores, os nossos concidadtios nos faziam”, Estavam dispostos @ ir as diltimas.conseqtién- cias para “a regeneragdo dos nossos costumes poltticos", vi sando “ao engrandecimento e & pujanga redentora do nosso magestoso e querido Brasil’, Jao manifesto de Sao Borja, de outubro de 1924, propunha “salvar a Const clarava que 0s revoltosos ngo queriam “subverter as institui- ¢6es", ¢ algumas modificagdes na Carta Magna, em “alguns pontos secundérios” seriam suficientes para mudar a face do Brasil. 1a mals adiante, entretanto, pois alinhava esses pontos: impedir as intervengdes nos Estados, unificar a jus- tiga, © ensino, 0 processo eleitoral e o fisco; tornar o ensino obrigatério ¢ estimular 0 ensino profissional; estabelecer 0 voto socreto @ obrigatério, “estirpar a megalomania dos gas- +08"; punir os defraudadores do patriménio do povo; rom- per a diferenca entre o Tesouro “endividado e pobre” e os politicos profissionais que deixavam sempre o poder ““me- lhorados e présperos”; finalmente, ‘cumprir e fazer cum- prir com sinceridade energia todas as leis votadas no pats”. Essa simples dectaragdo de intenedes era subscrita por per- sonagens como Isidoro Dias Lopes, Honério Lemos, Jogo Francisco, Zeca Neto, Olinto Mesquita, Felipe Portinho, Bernardo Paditha, Leonel Rocha e Miguel Costa. Prestes, no ‘mesmo més, em Santo Angelo, assim justificava a rebeligo: proclamava a ades#o dos revolucionérios do Sul, em diversas guarnigées, aos de Sio Paulo, porque estes lutavam “por amor do Brasil”, para que “o voto do povo soja sccrato”” ¢ que “a vontade soberana do povo seja uma verdade respei tada nas urnas", para que “sejam confiscadas as grandes for- ‘unas feitas por membros do governo &s custas dos dinhei- ros do Brasil”, para que os governos “tratem merios da pol ticagem e culdem mais do auxtlio ao povo laborioso”. Fina- lizava conclamando os brasileiros & luta “‘para recobrarmos © dinheiro que os nossos maus governos nos roubaram @ po- dormos assim evitar que em 1927 0 governo inglés venha to- mar conta das nossas alfandegas ¢ das nossas ricas colonias para cobrar a divida do Brasil”. 49 ‘Ao longo do tempo, os propésitos dos revolucionérios véo encontrando formulas novas para se expressarem. Desde @ do General Olinto de Mesquita, nas comemoragées de 7 de Setembro de 1924, que assume dimensées diferentes do {que costumava acontecer ¢ continuaria a acontecer. Como- vido pela passagem da data, no meio do mato, entre (ndios, nna retirada de Sao Paulo, ele define o seu pensamento ‘assim: “Quem sf esses pobres caboclos que, abandonedos Ge toda proteeo oficial, 102.anos apés a constituicdo da Pétria brasileira, viram, pola primeira vez, a bandeira naci nal? Sfo eles os dltimos senhores da terra, dominadores dos ros ¢ das florestas, eles, os brasileiros que os conquistadores encontraram no Brasil. Porque vivem assim miserdveis, fora- gidos nas matas, banidos de onde foram reis? Porque a ci lizago traz consigo algemas e o (ndio preza, acima de tudo, a sua liberdade, Foi o capitalismo ign6bil, base da organiza- fo social que nos domina, que relegou o (ndio ao degredo voluntério em que definha. (. . .) Foi para no gemer sob 0 ergéstulo do_capitalismo, no mourejar, de sol a sol, para que uma meia diizia de exploradores ser consciéncia e po- Ifticos. profissionais empilhassem tesouras e edificassem pa- lécios que 0 selvicola bras vir morrer & mar- gem dos seus rios, que ainda correm livres @ orla das suas, campinas onde se respira, a plenos pulmées, 0 oxigénio da liberdade, no cume das suas montanhas onde, como nas de que falam os versos de Heredia, cré-se ainda ouvir 0 grito do homem livre . . . E rematei concitando os soldados da revo- lugdo a cumprir 0 que fora prometido pelo general: varrer @ metralha 0 capitalismo do Brasil. Desafoguel.”” A 14 de se- tembro de 1926, entretanto, carta assinada por Prestes, Mi- sguel Costa e Juarez Tévora, escrevendo em nome da Coluna, mencionava “come limite m{nimo de nossas aspirac6es libe- 1a revogago da lei da imprensa e a adogo do voto se- ‘ca a repetirse nas manifestagSes tenentistas, Pode-se consi dérar como manifestagées pessoais, ¢ néo expresstio do pen- samento tenentista. como um todo, quer 0 manifesto de Prestes, quer a resposta de Juarez Tévora, ambas de malo de 50 reuse 1930, 0 Tenentismo sofrera a sua primeira e grave cisfo. Na fase em que $2 conjugam as ag8es conspirativas dos elemen- tos do Tenentismo e dos elementos politicos aue, antes ¢ depois das eleigSes em que Vargas apareceu como derrota do, trebalharam juntos, 0 objetivo politico aparece resumi- do'em dois pontos: representagdo e justiga. Finalmente, triunfante a chamada Revolugfo de 1930, quando 0 Clube 3 de Outubro pretende conjusar elementos heterogéneos, para corresponder a uma espécie de heranga do Tenentismo, isto é, em dezembro de 1931, 0 programa te torna vago e até inexpressivo: “Trabalhar pelo fengrandecimento do Brasil. Propagar a grandeza da brasili- ‘dade. Combater sistematicamente as preocupagses de regio nalismo. Pugnar pela uniformizagdo das les, justiga e ensi- no, Obrigetoriedade de ensino primério. Ensino profissional gratuito. Gratulto ensino secundério. Cultura fisica. S6 ‘comprar 0 que for de producdo genuinamente nacional, sal- vo quando ngo existe similar no pats. Fazer intensa propa- ‘ganda contra as companhias estrangeires que exploram osc: lagdes cambisis para aumento de prego. Combater sistema camente o luxe". Era um programe cuja vacuidade dispen- sarla andlise, Em malo de 1932, ume crise interna pratice mente liquidava 0 Clube 3 de Outubro, A lute pelo poder, entre os remanescentes tenentistas ¢ 05 politicos continua fia a se desorwolver. A revolucdo paulista de 1932 motivou ainda, e por perfodo transitorio, a recomposigdo des forcas que haviam tido no Tenentismo a sua base fundamental. Depois disso, 2 sorte do Tenentismo estava selada. Elemen- tos diversos, agindo enquanto individuos, porque o movi- mento se pardera, tomariam posigdes, ora & direlta, ora 8 es- querda, militando alguns na Alianga Nacional Libertadora, ‘outros na Agfo Integralista Brasileira, em que esquerda e d reita se dividiriam, no Brasil. Mas o Tenentismo jé no exis- tia. A discussfo sobre 0 momento em que ele desaparece do fato 6 diffcil e motiva controvérsias. A rigor, acebou com a.chamada Revolugso de 1930. J4 com o Governo Provis6- rio,'Seus remanescentes tém papel de relavo, aqui e all nas interventorias estaduais por exemplo. Mas esse papel obe- 81 dece @ uma conjuntura nova, a condig6es novas. E a longa agonia do Tenentismo, com a destruigfo progressiva de seus valores individuals, © quadro polftico nacional, por outro lado, apresentava, agora, caracter{sticas inteiramente diver- ses daquelas dos anos 20. A sociedade brasileira era outra. A composicéo de forcas, muito diferente. No havia mais lu- gar para o Tenentismo, Este esgotare as sues possibilidades ¢ cara alijado do cenério. (© Tenentismo no pode ser analisaco, em suas origens: © em seu desenvolvimento, sem a compreensso do fendme- ‘no singular que é a Revolugdo Burguesa nos pafses de eco- ‘nomia dependente ou colonial, onde ela aparece, pois, intei= ramente defasada das motivagdes que a configuraram em suas fontes classicas. & por isso que, vie de regra, ela se pro- ‘eessa por lances sucessivos, por vezes deformados em acon- teclmentos que enganam os estudiosos, porque disfargam 0 processo profundo de que emerge. No Brasil, fol assim, ea chamada Revolugfo de 1930 representou um desses lances, etapa de importincia indiscutivel, que motivou mudangas significativas na estrutura do Estado, pela participagao nele, agora, da burguesia, em busca da hegemonia politica. Em pa(ses desse tipo, em que o proletariado € numericamente Feduzido ou dotado de organizacéo débil, a vanguarda dos movimentos de mudanga recai no comando da pequena bburguesia: esta € que marca o compasso, levanta af reivindi- ‘cages ¢ define o andamento do processo. Ora, 0 aleance, a profundidede, o sentido das mudangas socials decorre, pre- cisamente, da composi¢éo de forcas e em particular daque- la que exerce a hegemonia na fase om questo. © Tenentismo assinala, no Brasil, a pequena burgue- sia exercendo & hegemonia no processo de mudanga, como vanguarda de uma burguesia que vinha ascendendo lenta- mente e que temia romper com a classe dominante tredicio- nal, de senhores-de-terras, 0s latifundiérios, e que nfo se sentia ainda ameacada pelo imperialismo, vendo nele um allado, para os momentos diffceis, com 0 qual teria de se ‘compor, em troca embora de concesstes. Parcela importan- ‘te da pequena burguesia, desde que os militares, fundadores 52 do regime republicano, haviam passado a ter espago nas lutas polfticas, os jovens oficials, acompanhados por alguns altos chefes no primeiro instante, representavam 0 pensa- ‘mento politico € os anseios de mudanca da pequens burgue- sia a que pertenciam e nfo tinham consciéncia, como ser pre acontece, de que interpretavem, como vanguarda, o ‘movimento da burguesia ascensional. Daf terem permeneci- do, 20 longo de todo 0 tempo, infensos ao apoio do proleta- riado, cujos interesses nfo compreendiam e néo aceitavem. Dat suas formulagées vegas e inécues, perdides em verbalis: mo, muito mais de intencées do que de compromissos, Tra- tavase de um reformismo que se disfarcava sempre no apa- rente radicalismo de algumas apbes, aquelas acBes dotadas, dda dimensfo do herofsmo que tanto marcaria 0 prestfaio dos elementos tenentistas e para eles carrearia as simpatias sgerais do povo brasileiro na época. O Tenentismo represen ta, em nosso desenvolvimento hist6rico, nume fase impor- tante pois decorre entre as duas Grandes Guerras, 0 proces- so de mudanga peculiar a uma sociedade em que o proleta- riado nifo atingira ainda 0 nivel quantitativo e qualitative aque the permitisee participar como forga importante, apa- recendo a pequena burguesia como forga hegemonice Vindicadora de alteragses que rompessem com 0 passado mas sem comprometimento com mudangas redic rando @ continuidade de valores tradicioneis, de que as clas- ses dominantes néo podiam abrir mo. As insuficiéncies do Tenentismo comecam a tornar-se claras, e ele comeca a del- xar 0 palco, na medida em que 0 processo avanca e, nel comega a aparecer uma ameoga de participagio do prolet Fiado. As agitarGes poltticas da fase entre 1930, quando triunfa 0 movimento armacio de que o Tenentismo é uma das componentes, ¢ 1935, quando, acompanihando a escala- da internacional do fascismo, prepara-se outro lance da as- canso burguesa no Brasil, a ditadura do Estado Novo, assi- nalam a agonia do Tenentismo, quando o quatro politico torna clara a insuficiéncia de sua proposta, degeu reformis- ‘mo simplista, e marca 0 momento a partir do qual a burgue- sia assume nitidamente © comando do processo politico. 53 i | | | Ele assume; assim, a vanguarda quando j4 no nece equena burguesia para servila nesse prop6sito, que impor- ta em riscos. E a pequena burguesia, por sua vez, em seu movimento pendular, acompanha a burguosia, cujos valores essenclais esposa, ao mesmo tempo que evolul, com alguns {de seus grupos, para uma radicalizagéo que pode aproximé-la do proletariado, em circunstancias e limites bem determi- nados. A partir da’, o imperialismo terd de langar mio de ‘um entorpecente especial, o anticomunismo, para evitar que parcelas da pequena burgusia se aproximem do proletariado @ esposem as suas posigéies. O alvo pi rismo serd, evidentemente as Forgas Armadas, o elemento militar. No hé mais lugar para movimentos do tipo do Te- nentismo. Os remanescontes desse movimento tipico na his- t6ria brasileira passam a constituir quadros valiosos para a reita, enquanto uma fra¢o minoritéria acompanhard a ex- trema esquerda, a que emprestaré, em largo perfodo, 0 seu prest(gio. 54 CONCLUSGES (© Tenentismo foi, assim, a forma sob a qual a peque- ra burguesia brasileira, como vanguarda da lenta e acidenta- da escensfo burguesa, manifestou os seus propésitos refor- rmistas e essinalou a sua repulsa & forma oligérquica como a Repiblica construfra o regime e o mantinha. Manifestou-se pela organizago de agrupamentos militares aguerridos que buscavam, pela luta armada de in(cio, ocupar espaco na érea polftice, impondo mudangas que ndo importassem em tocar nna ostrutura do Estado. O regime era bom, desde que acei- ‘tasse pequanos retoques, mals de forma do que de conted- do. A partir do-momento em que a crise econdmica de 1929 — a rigor,-a partir da crise cfctica de 1920 —e os epi- s6dios das crises polfticas ligadas ao processo sucess6rio the permite espego e oportunidade, o Tenentismo aparece e fulgura, E uma-espécie de trator que abre sulcos no terreno, preparando-o para sementeiras futures. Sua tarefa demoli- dora é inequ{voca. O sentido preparatério de que se reveste aparece & simples anélise, Rompedor de resisténcias tradi- cionais, longamente ancoradas na sociadade brasileira, 0 Tenentismo esgota 0 seu papel quando 0 quadro anuni uma nova personagem na pera, o proletariado. A partir des- s@ momento, aquele papel esti liquidado © os quadros te- entistas servirgo, de um lado, para robustecer os movimen= ‘os de direita, em que as forgas resistentes as mudancas de- Positam suas esperancas, e, de outro lado, os movimentos de esquerda, ainda débeis, compondo-se com os quais Ihes levaré 0 sou inequivoco sentido golpista, isto é, @ subestima polas aces de massa e a superestima, correspondente, pelas ‘ag6es violentas, empreendidas por pequenos grupos e na in- tenco de realizar as. mudangas para as quals a correlaggo de forgas nfo esta prepareda. A participacdo dos militares na arregimentago das organizagées polfticas de esquerda, no Brasil — singularidade interessante do processo histérico brasileiro contemporaneo — enquanto thes permite ostentar capacidade de luta e de organizagéo, leva 0 fermento, que reponta de quando em vez, de um sentido golpista inequt- vyoco, Oscilando entre o obreirismo extremado e a tendéncia para ages isoladas de grupos reduzidos, esperando delas alteragées signiticativas, a¢ forcas de esquerda, a partir de ‘ua fuso com remanescentes do Tenentismo, demoram em livrarse dessa tendéncia, peculiar & pequena burguesia, que coloca em segundo plano a influéncia e o papel das massas, © proletariado sofrera, no Brasil, por isso mesmo, dessa contribui¢#o que, com ser valiosa, impulsiona as suas for- ‘mas de organizagao para o oportunismo, de um lado, e para © sectarismo esquerdista, de outro, © Tenentismo passou por algumas fates, em seu de- senvolvimento histérico. Na primeira fase, entre 1922 ¢ 1927, timbrou em ostentar o seu carter militar, fazendo disso um exclusivismo e tendendo a manter um sentido de pureza que o distanciava das forgas polfticas tradicionais. Desde 0 levante de 1922, com o momento herbico dos 18 do Forte, até a Coluna Prestes, com os sous extraordinrios feitos, pessando pelo levante de So Paulo, com repercussio em focos diversos, de dimenso diversa, em outros Estados, 56 decorre a primeira fase do Tenentismo, quando assinala @ sua posi¢fo e ampli os seus quatros, dando-Ihes dimensio. nacional. O sentido essencial dessa fase, a sua marce, esté na pureza, isto 6, na exclusividade buscada e mantida, no dis: tanciamento da politica feita pelos politicos. Este, para ot militares revoltados, 6 uma forma impura de agéo piblica. Isto isola o Tenentismo e the dé a nota de ago acima das contingéncias reais, mas 6, apesar de seu contetdo conserve dor, para no dizer reacionério, uma espécie de t/tulo eno- brecedor, muito caro 8 pequena burguesia que aeompanha @ aplaude as agdes armadas que 0 Tenentismo desenvolve. firm dessa fase iniclal pode ser assinatado com o interna- mento da Coluna Prestes na Bolivia, em feversiro de 1927. A coesfo ainda mantida pelas organizagSes polticas oligér- uicas, os PRs esteduais e o governo central, impade o aps- Tecimento de iniciativa que poderia alterar os rumos do Te entismo e, portanto, do processo politico brasileiro. A, certeza da eternidade de seu mando, entretanto, caga aque las organizacées, que subestimam o Tenentismo e suas pos- sibilidades. ‘A segunda fase do Tenentismo comega com o exitio de seus remanescentes e coincide com as mudances.que co megam @ ocorrer no quadro politico brasileiro, com 0 apa- recimento de partidos organizados de oposicéo, nfo mais, simplesmente ligados @ crises sucessérias mas pretendendo ago prolongada, na certeza de que a situacdo nfo poderia, permanecer sem alteracdes © que teis alteragBes abririam perspectivas, na luta pelo poder, para equeles que, de forma organizada, apresentassem propostas dignas de aceitacdo pola sociedade pare mudonga de rumos. Estas organizactes polfticas oposicionistas surgem em S80 Paulo, com o Parti- 60 Democrético, ¢ no Rio Grande do Sul, cujo territério, ainda na primeira fase do Tenentismo, fora sacudide por lutas armadas de facg6es regionais. A tendéncia natural aproxima essas forgas politicas dos remanescentes do Te- nentismo. Elas préprias, com o sou aparecimento, denun- ciam cisées na politica tradicional © em suas formas. Esta segunda fase, pois, mostra 0 Tenentismo aceitando allangas 87 ‘com forgas politicas civis, isto 6, rompendo 0 seu isolamen- to e, assim, abandonando o sentido de pureza antes esposa- do, O acontecimento principal dessa segunda fase é a cha- mada Revolugfo de 1930, resultante da composigd0 com o “Tenentismo de parcelas importantes néo so de organizecées polfticas tradicionais como de. executivos estadusis. Nao se ‘opera sem dificuldade essa aproximaeo: de um lado, 0 dos militares, ocorre © acidente da-defecego de Prestes, a sua ‘maior figura, indicado para o comando do movimento polf- tico-militar contra 0 governo que, com recuos e avangos, acaba por se realizar; de outro lado, pela resisténcia de figu- ras politicas eminentes, como Epitécio Pessoa, Artur Ber- nardes e outras, que s@ haviam destacado como inimigos marcados pelo Tenentismo e ferozes perseguidores de sous elementos, e cuja participagdo na luta contra o governo con- tral era, entretanto, indispensével. Esta segunda fase, em que 0 Tenentismo comega violentamente a se desfigurar, pperdendo a pureza anter almejada e mantida, é encerrada ‘com a vitéria do movimento armado que dep8e o Presiden te Washington Luts e leva Gettlio Vargas a0 Governo Pro- jo. O seu encerramento pode sor aczito come 0 do inf- cio désse Governo Provisério, que apresenta em primeiro plano a figura de Vargas, que ocuparé o centro do eenério até sua morte em 1954. A composigio com as forgas pol cas tradicionais, rompidas com a situagio dominant na luta pelo poder contém o germe da terceira fase e, portanto, da derroceda total do Tenentismo. ‘A torcsira fase, a de agonia do Tenentismo, tem infcio ontio e 6 assinalada pela luta interna, isto é, pelo antagonis- mo entre @s duas componentes da chamada Revoluggo de 1930, a configurada pelo Tenentismo e a contigurada pelas forcas politicas cindidas das tradicionals, isto ¢, aquelas ‘que, na luta pelo poder, optaram pela safda armada, usan- do os elementos militares que nela se haviam especializado 0 © seu prestigio. & uma luta de foice no escuro, que se de- senvolve ao longo de anos, mas que se anuncia desde o ins tanto da vitoria, Os episédios que a assinalam passam peladi- visio do pafs com a nomeago de Juarez Tévora para vice-el 58. do Norte e a designaedo de elementos ligados ao Tenentis- ‘mo para as interventorias estaduais, mas alcangam sua dimen- so méxima com a chamada Revolu¢go Constitucionalista, irrompida em Séo Paulo, em julho de 1932, Derrotados pe- las armas, com apoio dos remenescentes do Tenentismo a0 Governo Provisbrio, os tebelados, que pretendiam alijar aqueles de suas posigées, incomodados com os propésitos reformadores de alguns de seus figurantes, os interventores esteduais principaimente, acabam triunfendo pol quando a anistia e a entrega do governo de Sio Paulo aos antigos rebelados acaba por Ihes dar primazia sobre os impe- nitentes adversérios. Quando, em maio de 1932, 0 jornalista Jalio de Mesquita Fitho, articulador méximo da chamata Revolugo Constitucionalista, escreve: ‘No petmitiremos que 0s tenentes voltem a dominar Séo Paulo” ~ esté pro- clamando um propésito deliberado, que acabou triunfante, Realmente, o Tenentismo acaba com a vitoria de Pirro que foi, para 0 conjunto do movimento, o triunfo sobre a rebe- ligo paulista, O Tenentismo estava liquidado, Entre as inegé- veis habilidades politicas que constitufram o essencial da personalidade de Vargas esté a de ter usado o Tenentismo, até a dltima gota, desfazendo-se dele, sem pressa mas com clareza, para emergir com diretrizes proprias. Mas isto & J outra histo 59 CRONOLOGIA 1921 - Outubro, 09 — 0 Correia da Manhi publica a pri rmeira carta falsa Outubro, 12 — O Correio da Manhé publica a se- gunda e republica a primeira carta falsa Novembro, 12 — Assembléia Geral Extraordinétia do Clube Militar; por 439 votos a 112, as cartas atribu(das a Artur Bernardes so aceitas como au- ténticas Dezembro, 28 — Assembiéia Geral Extraordinéria do Clube Militar, presidida pelo Marechal Hermes Margo, 01 — Eleicio presidencial Marco, 27 — | Congresso do Partido Comunista Brasileiro, iniciado a 26; fundagao do Partido Junho, 07 — Bemardes 6 proclamado Presidente da Repiblics, eleito por 466 mil contra 317 mil votos, dados a Nilo Pecanha Julho, 02 ~ Pristo do Marechal Hermes da Fonse- ca Julho, 05 — Levante no Rio, na Escola Militar & Forte de Copacabana, e em Mato Grosso Julho, 06 — Episédio dos 18 do Forte Novernbro, 15 — Posse de Bernardes ne Presidéncia da Replica Janeiro, 25 — Rebelito estadual no Rio Grande do Sul Setembro, 09 — Morte do Marechal Hermes da Fonseca Novembro, 07 — Armisticio no Rio Grande do Sul Dezembro, 14 — Acordo de paz no Rio Grande do Sul Julho, 05 ~ Levante em So Paulo Julho, 13 — Levante em Sergipe controls o Estado Julho, 15 — Levante no Amazonas Jutho, 28 — Os revoltosos abandonam a cidade de Sio Paulo 1925 1928 62 — Agosto, 02 ~ Sufocado o levante de Sergipe Agosto, 15 ~ Sufocado o levante do Amazonas ~ Outubro, 24 — Levante de Santo Angeto — Novembro, 04 — Levante do couragado Séo Paulo’ — Novembro, 10 — O couragado entrega-se em Mon- tevidéu — Dezembro, 27. — Prestes deixa So Luiz das Mis- 66s, rumo & Foz do Iguacu, coma sua coluna — Margo, 26 — Queda da praca de Catanduvas ~ Abril, 02 — Prestes, na Foz do Iguagu, faz prever lecer a decisSo da continuagéo da luta — Abril, 29 — A Coluna transpée o rio Perané, em Porto Adola, e atravessa o Paragual — Maio, 02 — Ataque 20 quartel do 3° Ri, no Rio de Janeiro — Junho, 23 — Fim da campanha de Mato Grosso — Novembro, 17 —A Coluna entra no Maranho — Fevereiro, 24 — Fundagio do Partido Democrat co, em So Paulo = Setembro, 07 — Posse de Antonio Carlos no gover- no de Minas Gerais — Novembro, 04 — Levante no Rio Grande do Sul = Novembro, 15 — Posse de Washington Luts na Pre- sidéncia da Repdblica = Novembro, 17 — 1 Congresso do Partido Democré- tico = Feversiro, 03 — A Coluna Prestes internarse na Bo- Via ~ Setembro, 27 — Fundago do Partido Democrético Nacional — Novembro, 25 — Vargas & eleito Presidente do Es- tado no Rio Grande do Sul — Dezembro, 14 — Encontro de Astrojildo Pereira com Prestes em La Guaiba, na Bolivia = Janeiro, 25 — Vargas assume 0 governo do Rio Grende do Sul — Margo, 07 — Inicio da conspiragio de civis e mili- tares — Outubro, 22 — Posse de Joo Pessoa, na Paratba 1929 — Junho, 17 — Pacto entre Minas ¢ Rio Grande do Sul para a sucesso presidencial = Julho, 18 — Encontro de Basbaum com Prestes, ‘em Buenos Aires = Julho, 29 — Mego, de Jogo Pessoa = Agosto, 05 — Infcio da campanha da Alianca Libe- ral na Camara Federal = Dezembro, 18 — Encontro de Prestes com Vargas, em Porto Alegre — Dezembro, 26 — Assassinato de Sousa Filho, na Camara 1990 — Janeiro, 01 ~ Comicio da Alianga Liberal, no Rio de Janeiro — Fevereiro, 28 — Encontro de Prestes com Vargas, em Porto Alegre = Margo, 01 — Eleigdes presidenciais — Maio, 09 — Morte de Siqueira Campos = Maio, 30 — Publicago do manifesto comunista de Prostes — Julho, 26 — Assassinato de Jodo Pessoa — Agosto, 02 — Prestes langa a Liga de Ago Revolu- ciondria = Outubro, 03 — Irrompe o movimento revolucion- rio no Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Parafba — Outubro, 06 — Morte de Joo Dantas, na Deteneéo do Recife = Outubro, 08 — Revolucgo no Maranhéo — rendi- fo do 129 RI, em Belo Horizonte = Outubro, 10 ~ Os revolucionérios entram em Curi- tba = Outubro, 12 — Vargas assume o comando da revo- lugo, em Ponta Grossa = utubro, 15 — Combate da Ribeira — Outubro, 24 — Junta Governativa depée Washing- ton Lufs = Outubro, 28 — Jodo Alberto ¢ designado delegado da revoluggo em So Paulo 63 1931 64 — Novembro, 03 — Vargas assume o Governo Provi- sério — Novembro, 089 — Reversdo de Isidoro Dias Lopes & ativa = Novembro, 12 — Jodo Alberto e Miguel Costa fun: dam @ Legigo Revolucionéria, em Séo Paulo — Novembro, 12 ~ Dissoluedo dos legislativos = Novembro, 16 — Nomeagio de interventores nos Estados — Novembro, 19 — Criagéo da OAB (Ordem dos ‘Advogados do Brasil) — Novembro, 26 — Juarez Tévora exonerado do Mi nistério da ViaeSo, que passa a José Américo de Almeida — Novembro, 26 — Jodo Alberto assume a interven toria em Séo Paulo — Novembro, 26 — Joo Cabanas é preso, em So Paulo — Novembro, 26 — Cédigo dos Interventores — Novembro, 28 — Criago do Ministério do Traba- tho ~ Dezembro, 04 — 0 PD deixa de participar do go- verno de So Paulo = Dezembro, 08 ~ Nomeagio dos jufzes do Tribunal Especial — Fevereiro, 27 — Manifesto da Legifo de Outubro — Margo, 28 — Carta de Prestes, analisando 0 movi- mento de outubro e criticando suas limitagdes — Abril, 03 — Criago do primeiro sindicato de jorna- listas e gréticos — Abril, 07 — O Partido Democrético rompe com 0 governo = Abril, 12 — Comicio, em So Paulo, da Legléo Re- volucionéria — Abril, 22 —Desfile da Legio de Outubro, em Belo Horizonte — Julho, 13 — Demissio de Joo Alberto da inter- ventorla em Séo Paulo 1932 Julho, 28 ~ Miguel Costa pede reforma da Forga Pablica ‘Setembro, 24 — Congresso da Legiio Revolucioné- ria, em So Paulo Novembro, 12 ~ O General Manoel Ratelo é no- meado interventor ern So Paulo Dezembro, 22 — Joarez Tavore demite-se de vice- rei do Norte Janeiro, 17 — Rompimento do Partido Demoeréti- co com 0 Governo Provisério Janeiro, 19 — Manifesto de formaco da Frente Unica em Sao Paulo Janeiro, 30 — O Partido Libertador se solideriza com 0 Partido Democrético Fevereiro, 16 — Formagio da Frente Unica paulis- tz (PD, PRP e classes conservadoras) Fevereiro, 24 — Nova lei elettoral Fevereiro, 25 — Nomeado Pedro de Toledo inter- ventor em So Paulo Fevereiro, 25 — Empastelamento do Diério Cario- ca, no Rio de Janeiro ‘Margo, 14 — Mauricio Cardoso demite-se do Minis- trio de Justiga Margo, 18 — Joao Alberto nomeado Chefe de Polf- cia'em Sio Paulo Maio, 25 — Julio de Mesquita Filho escreve: “Néo Permitiremos que os tenentes voltem @ dominar ‘So Paulo”. Maio, 25 — Juarez Tévora pede sua reverséo as ati- vidades militares Junho, 03 — Empastelemento de jornais governis- tas em Sio Paulo Junho, 27 ~ O General Leite de Castro delxa o Ministério da Guerra Junho, 29 — Nomeado para Ministro da Guerra 0 general reformado Espfrito Santo Cardoso Julho, 08 — © General Bertoldo Klingor & refor- mado 65 | | — Julho, 09 — Revolugo Constitucionalista, em So Paulo = Julho, 10 — Isidoro Dias Lopes adere'& revolugio pai = Julho, 12 — Klinger assume 0 comando da revolu- ‘G0 em So Paulo e Euclides Figueiredo instala 0 seu QG em Cruzeiro = Setembro, 17 — Capitulagic dos rebelados de Sio Paulo — Dezembro, 11 — Juarez Tévora aceita o Ministério da Agricultura 1933 — Maio, 03 — Eleig6es para a Assembléia Nacional Constituinte. Chapa Unica, em Sio Paulo Julho, 14 — O general Waldomiro de Lima deixa a interventoria em Sdo Paulo Julho, 19 — Juarez Tévora veta o nome de Arman- do de Salles Oliveira para interventor em Sto Paulo Julho, 19 — Armando de Salles Oliveira é nomeado interventor em Séo Paulo Novembro, 18 — Instala-se a Assembiéia Na Constituinte nal BIBLIOGRAFIA A bibliogratia sobre o Tenentismo, que deve englober a soma de informagbes sobre o quadro historico em que se desenvolveu, atinge, agora, nimero considerével de contri- buigéies. De forma organizada, a Fundagéo Getilio Vargas publicou bibliografia sobre o Tenentismo que, embora com muitas falhas, mesmo para @ época, foi a primeira tentative no género e pode servir de base para os interessados erm am- pliar pesquisas sobre o tema. Forneceremos, aqui, entretan- to, pequena relaeo de obras que podem esclarecer quem precise ter uma idéia sobre o assunto. E uma bibliografia essencial e, portanto, suméria. © levante de 1922 ¢ apresentado, em detalhes fac- ‘uals, no livro de Hélio Silva: 1922. Sangue na areia de Co- ‘pacabana, com que inaugura a série de volumes ligados 20 que denominou ciclo de Vargas. O levante de 1924, em So Paulo pode ser estudado em dois livros: Narrando a Verda- de, do General Abflio de Noronha, que era o comandante das forgas governistas na capital paulista, e Sob a metralha: histdrico da revolta em Séo Paulo, de 5 de julho de 1924, de Ciro Costa e Eurico de Gées. A Colune Prestes teve um cronista emérito: Loureno Moreira Lima, com.o:seu A Co- luna Prestes: marchas e combates; na qualidade de secreté- rio da Coluna, Lourenco Moreira Lima escreveu no apenas uma espécie de disrio dos acontecimentos, mas, na verdade, um cldssico das letras militares brasileiras. Mas 0 epis6dio da Coluna pode, ainda, ser estudado em dois outros livros: 1926. A grande marcha, de Hiélio Silva e A-Coluna Prestes. Andlise e depoimentos, de Nelson Werneck Sodré. A fase de entendimentos e aliancas entre os elementos tenentistas @ polfticos desavindos com 0 governo estabelecido pode ser entendida pelo conhecimento da obra de Paulo Nogueira Filho: /deais e lutas de um burgués progressista. A chamada Revolugto de 1930 teve o levantamento de seus acontec!- mentos feito por Hélio Silva, no volume 1930. A revolugio tratda. A luta interna, apés 0 triunfo'dos revoltosos, esté bem reconstitufda em Héllo Silva: 1933. A crise do Tenen- tismo, prolongamento de 1931: Os tenentes no poder. O ‘movimento constitucionalista de Sto Paulo foi bem apre- ciado ainda por Hélio Silva: 1932; A guerra paulista, Esses trés volumes do chamado ciclo de Vargas, acompanham @ longa agonia do Tenentismo. Edgard Carone, com 0 Tenen- tismo, reuniu, aproveitando trechos de documentos, a tra- jetéria do movimento, alinhando os acontecimentos, a8 per- sonagens e o$ programas, além de apresentar bibliogratia, Creio que, para enquadramento do fendmieno politico que foi 0 Tenentismo no quadro geral do desenvolvimento his- t6rico brasileiro, seria conveniente ler: Nelson Werneck So- dré: Historia Militar do Brasil e alguma coisa sobre a cha- mada Reptiblica Velha: pessoalmente, gosto das obras de Afonso Arinos de Melo Franco, as blografias de seu pal, Afrénio de Melo Franco, e de Rodrigues Alves, como da anélise de Barbosa Lima Sobrinho: A verdade sobre @ revo- lupo de outubro. Esta é a bibliografia essencial, que levaré, nnaturalmente, os interessados no aprofundamento de seus estudos, @ uma lista maior e mais variada, E preciso sempre lembrar que 0 Tenentismo foi epis6dio da revolugdo bur ‘guesa no Brasil, sem cuja compreenséo seré impossfvel en- tendé-lo em suas motivagdes e em seu processo. Sees os Socnarers. oes ae ae

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