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UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

CURSO DE GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

RELATÓRIO E ANÁLISE FILME: “O NOME DA ROSA”

ISABELLA DE SOUZA TAVARES – MATRÍCULA: 2015.1.02759.11

DISCLIPLINA: HISTÓRIA DA IDADE MÉDIA

PROF. MARTA SILVEIRA

RIO DE JANEIRO

2016
Ficha técnica do filme: O nome da Rosa foi produzido em 1986, dirigido por Jean-
Jacques Annaud, baseado na obra de Umberto Eco de mesmo nome lançado em
1980.

O romance de Umberto Eco e posteriormente o filme são obras muito


importantes que ilustram uma época muito significativa da Idade Média. A figura
nociva da mulher, a divergências entre as ordens religiosas, o temor do apocalipse e a
inquisição são temas que podemos ver claramente ao longo do filme. São obras de valor
cultural muito grande que nos auxiliam no estudo da história.

Tudo que vemos no filme se relaciona de forma direta com o que estudamos e
saindo de uma ótica leiga conseguimos perceber e analisar historicamente todas as
questões abordadas. Há no filme uma crítica muito clara a cerca da Igreja e de sua
doutrina através do personagem William de Baskerville, que é o monge franciscano
chamado para resolver o mistério do mosteiro através de métodos que se utilizam da
razão. William representa no filme um pensamento mais inclinado ao humanismo e a
razão, pensamento esse que é criticado por alguns monges durante o filme. Essa
oposição de luz e sombra está presente em todo o filme, mas é importante ressaltar que
William faz parte da Igreja mesmo com esse pensamento, representando uma crise que
demanda mudança pela qual a Igreja passa durante três séculos. É importante também
perceber que as duas visões populares a cerca da Idade Média estão presentes no filme,
mas precisamos ter em mente que a Idade Média foi uma época singular e que não
podemos deixar que nossa cultura ou nosso tempo nos influencie quando a analisamos.

Na análise das cenas vamos poder aprofundar um pouco mais as questões citadas
e perceber como elas se interligam de forma muito intensa entre elas e com aquilo que
estudamos. É claro, que sempre tendo em mente a singularidade desse período e livre de
etnocentrismo.

ANÁLISE DAS CENAS

Cena 1 e 2: “Quando uma fêmea por natureza tão perversa torna-se tão sublime por
santidade, então ela pode ser um nobre veículo da graça.”, “A mulher se apodera da
alma do homem” e “Mais amarga que a morte é a mulher”

Logo nos dez primeiros minutos do filme essa cena vem à tona. William e Adso estão
junto de um monge mais velho, que olha para uma imagem que parece ser de Maria e
seu filho nos braços sendo alimentado. Fica muito evidente o desprezo pela figura da
mulher e principalmente por seu corpo, dado os prazeres carnais aos quais os homens se
entregavam, inclusive os monges (que se aproveitavam de mulheres pobres fazendo-as
se prostituírem por comida).
No filme algumas falas são dirigidas as mulheres e sua perversidade, como por
exemplo, na cena em que Adso conta a seu mestre sobre sua relação carnal junto a uma
mulher. São proferidas frases como: “A mulher se apodera da alma do homem” e
“Mais amarga que a morte é a mulher”. No contexto histórico no qual o filme se insere
é muito interessante a reflexão acerca do que a mulher representava naquela sociedade,
sobretudo para a Igreja. Podemos dizer que a mulher representava um perigo e que ela
era naturalmente nociva a santidade dos homens. Houve uma demonização da mulher
por parte da Igreja, devido às escrituras do antigo testamento. Tanto que a caça às
bruxas na Inquisição ilustram o perigo que as mulheres representavam para a Igreja, sua
sabedoria sobre a natureza muitas vezes era considerada bruxaria. Portanto, não só o
corpo da mulher e seu sexo eram temidos, mas muitas vezes sua sabedoria também. É
importante ressaltar que não foi a Igreja propriamente que criou o machismo, mas
havemos de convir que a Igreja é uma instituição patriarcal assim como a sociedade da
época, então difundir uma imagem distorcida e demonizada da mulher não foi uma
tarefa difícil.

Cena 3: “Um monge não deve rir! Só os tolos riem à toa! (…) O riso é um
evento demoníaco que deforma as linhas do rosto e faz os homens parecerem macacos”

Essa frase compõe a cena em que William e Adso estão onde os monges copistas fazem
seu trabalho, o monge beneditino Jorge reprime William por causa das risadas
proferindo a frase acima.

Nessa cena há um embate acontecendo, enquanto que o monge Jorge usa o argumento
de que as escrituras nunca mostraram Jesus rindo, William defende que nada nas
escrituras prova que Jesus não ria. William ainda dispõe de São Francisco e Aristóteles
para defender o riso e o monge Jorge o reprime fortemente por ser totalmente contra a
figura e os ideais de Aristóteles. O riso é um assunto de muita repercussão nesse
momento, tanto pelo fato de muitos religiosos se posicionarem contra quanto pelo fato
de que as obras clássicas não só de Aristóteles começam a serem lidas novamente por
causa do movimento renascentista e humanista que vai se formando através dos séculos.
O próprio Platão afirma que o riso afasta o homem da verdade. Quanto a Aristóteles, o
segundo volume de sua obra Poética se dedicava a comédia, porém este livro se perdeu
provavelmente na Antiguidade ou no inicio da Idade Média.

Mas é importante observamos como um assunto como o riso, hoje tão corriqueiro, era
motivo de discussões inflamadas na Idade Média. Também é importante atentarmos
para o fato das divergências teóricas entre William, que se mostra adepto a razão e o
humanismo, e o monge Jorge de Burgos que se pauta no teocentrismo vigente na Igreja.
Esse contraste de luz e sombra também permeia a época renascentista, é claro que com
muito mais luz do que nesse momento.

Cena 4: O descobrimento da biblioteca. “[...] são livros perigosos para o pensamento


cristão”, “[...] e a dúvida é inimiga da fé.”
Chegamos a umas das cenas mais especiais do filme, quando Adso e William
encontram a biblioteca. O fato de o acesso a esta biblioteca ser restrito já diz muita coisa
sobre ela, William ainda afirma que poder ter encontrado umas das maiores bibliotecas
da cristandade. É uma cena muito simbólica, pois além do fato de conter livros da
antiguidade clássica e de pensamentos heréticos segundo a Igreja. A biblioteca fica num
espaço de labirintos onde os dois personagens se desencontram e precisam usar da razão
para achar a saída do lugar. Mas para além das alegorias usadas no filme, é importante a
reflexão do por que do acesso restrito a determinadas obras e por que as obras clássicas
que evocam a razão são proibidas. Como nas frases citadas no título, William tinha
muita consciência do que aquelas obras representavam para a construção do
conhecimento e muita consciência do perigo que elas representavam para a cristandade.
O fato de Wiliam ser religioso e adepto ao humanismo e a razão, já é um prenuncio da
mudança na forma de pensar.

Cena 5: Encontram a mulher, um gato preto e uma galinha preta.

Nessa cena, a mulher vai ser acusada de bruxaria pelos objetos encontrados junto a ela.
Na primeira cena já falamos de como neste contexto histórico a mulher é subjugada,
especialmente a mulher não cristã. Isso demanda um número muito grande de mulheres
acusadas, torturadas e queimadas na Inquisição, pois dizer que o cristianismo alcançava
a todos na sociedade medieval seria um equivoco quando nem a própria doutrina cristã
era bem difundida na época, especialmente nos campos. O paganismo continua a existir
nessa sociedade, muitas vezes fundido ao cristianismo. Vale lembrar também que uma
parcela esmagadora da sociedade não era letrada, então os costumes iam passando pelas
gerações. Com a Inquisição se matou muitas mulheres com o argumento da bruxaria,
quando na maioria das vezes as mulheres estavam pondo em prática seus conhecimentos
sobre a natureza.

Cena 6: “Quem contesta um veredicto de um inquisidor é culpado por heresia”

William profere esta frase quando seu discípulo Adso o questiona por não ter defendido
aquela mulher acusada de bruxaria mesmo sabendo a verdade. William contestou um
veredicto de um inquisidor quando este culpou um escrivão apenas por ter traduzido
uma obra secular e para William esse não deveria ser o objetivo da Inquisição, acusado
de heresia teve de pedir ajuda ao Papa.

Esta cena reflete como na Inquisição se punia por muito pouco, traduzir um livro
secular vira uma heresia, pois este livro poderia ser perigoso para a Igreja. Mas William
pensava no progresso do conhecimento, indo de encontro ao pensamento religioso.
Talvez por isso muitos intelectuais renascentistas vão embasar seus discursos unindo
deus e a ciência.

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