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EMCUICNC OMEN IIOELeLD e Outros Ensaios Valentin Nikolaevich Volochinov LAS ical Caer NES Cen CCR ue Raion veCae mer eee ert cer re id contexto dialégico (este se estende ao passado sem limites e ao futuro sem limites). Nem os sentidos do pasado, isto é, nascidos no didlogo dos séculos passados, podem jamais ser estaveis (concluidos, acabados de SUN a TCOn saat Sec Coen nr ety COO Co to anne ere ito Gee Gh omni tetet t OOO COMER Okie st eons tee eC ne eee? DE Roo Geet Coker ea omen ose Cretan ee hy Saree Cw maneretete mete eect) pO SO aac un Oana Lon eta eet techy eet CSS OC MC ne tee Cons ern er ts BOE CUO oe On Orem Gra mn Cee nea ey een 1H! Ps Copyright © Autor e Organizador “Trios os direitos garanidos. Qualquer parte desta obra pode ser reprodusida ou transit ot arquivadalevadosem conta os dts do autor do orgrizador. ey Valentin Nikolaievich Volochinow [A construcio da Enunciagio e Outros ensaios. Si Carlos: Pedro & Joo Editores, 2013. 273p. 4 ISBN 978-85-7993-169-7 1. Enunciagio. 2. Estudos de Linguagem. 3. Filosofia da Linguagem. 4, Autor. I. Titulo. cop- 410 Capa: Marcos Antonio Bessa-Oliveira Editores: Pedro Amato de Moura Brito & Jo30 Rodrigo de Moura Brito Revisio do Texto; Cemila Caracelli Scherma; Marina Haber de Figueiredo, Conselho Cientifico da Pedro & Joao Editores: ‘Augusto Ponzio (Bari/tili); Jodo Wanderley Gerald (Unicamp/Brasil); Nair F. Gurgel cdo Amaral (UNIR/Brasil); Masia Isabel de Moura (UFSCar/Brasil); Maria da Piedade Resende da Costa (UFSCar/Brasil); Rogério Drago (UFES/Brasil) Pedro & Joao Editores 13568-878 - Sao Carlos ~ SP 2013. SUMARIO INTRODUGAO - O mundo nao nos ¢ dado, mas construido Joio Wanderley Geraldi 1, Para além do social. Um ensaio sobre a teoria freudiana (1925) 2, Palavra na vida e a palavra na poesia. Introdugio ao problema da poética sociologica (1926) 3. As mais recentes tendéncias do pensamento linguistico ocidental (1928) 4, Que é a linguagem (1930) 5. A construgao da enunciagio (1930) 6. A palavra e suas fungBes sociais (1990) 7. Sobre as fronteiras entre a poética ea linguistica (1930) 8, Algumas ideias-guia para a obra Marxisnto e Filosofia da Linguagem 1 2. APENDICES {Indice de “O problema da transmissio do discurso alheio: um ensaio em pesquisa sociolinguistica” (1925-1926) indice de “Marxismo e filosofia da linguagem” (1927-1928) 20 a 101 iat 187 189 213 269 21 ial, os sistemas. ideoldgicos jé formados nao sio sendo uma iN@ologia cotidiana sistematizada e fixada com signos externos ~ “psicologia social”. : (0 caminho percorrido pela eriagio literdria ¢ o seguinte: da sensagio cou da expresso embriondria & enuunciagéo expressa exteriormente, Na base da sensagio e na base da expressio hé uma tinica estrutura social Qualquer fendmeno da realidade objetiva, qualquer situagdo, 20 provocar no homem uma reagao orgénica, habitualmente faz, emergir a inguagem interior que facilmente se transforma em linguagem exterior. Tanto a linguagem interior quanto a exterior se encontram orientadas para 0 “outro”, para o “ouvinte”, Tanto o falante quanto o ‘ouvinte sao participantes conscientes do acontecimento da enunciagéo e ocupam nele posigdes interdependentes. ‘A enunciacio artistica, isto é a literdtia, é tio sociolégica quanto a enunciagio cotidiana. H Somente com uma investignelio sociolégica nos aproximaremos do esclarecimento da esséncia dos fendmenos ligados aos conflitos da Tinguagems interior com a linguagem exterior, que leoam 0 nome carncteristion de “Yormentos da palavra”, Mas disso falaremos noutra oportunidade, 156 ‘A CONSTRUGAO DA ENUNCIACAO 1. O intercdmbio social e a interacao verbal Em nosso artigo anterior!, esclarecemos a natureza social da Jinguagem. Indicamos os fatores, as forgas motoras que determinaram as origens e o desenvolvimento da linguagem: a organizagdo do trabalho na sociedade e.a iuta de classes. Estamos convencidos do fato de que a linguagem humana 6 um fendmeno de duas faces: cada erunciagio pressupée, para realizar-se, a existéncia niio 36 de um falante, mas também de um ouyinte. Cada expressio linguistica das impressdes do mundo externo, quer sejam imediatas quer sejam aquelas que se vao formando nas entranhas de nossa consciéncia e receberam conotagdes ideoldgicas mais fixas ¢ estiveis, é sempre orientada para o outro, até um ouvinte, inclusive quando este nfo existe como pessoa real, Jé vimos que até as mais simples, as mais primitivas expressées de desejos, de percepcdes puramente fisiolégicas, tém uma clara estrutura socioldgica, Tudo isso nos dé a possibilidade de dar uma definigéo conclusiva da linguagem e passar a um exame mais detalhado da enunciago da vida cotidiana; e depois, da enunciagio literdtia. Antes de tudo, devemos recordar que a lingua nao é algo imével, dada de uma vez para sempre e rigidamente fixada em “regras” e “excegies” gramaticais. A lingua néo é de modo algum um produto morto, petrificado, da vida social: ela se move continuamente e seu desenvolvimento segue aquele da vida social. Este movimento progressivo da lingua se realiza no processo de relagio entre homem ¢ homem, uma relacio nfo 96 produtiva, mas também verbil. Na comunicagéo verbal, que é um dos aspectos do mais amplo intercdmbio comunicative ~ 0 social - elaboram-se os mais diversos tipos de enunciages, correspondentes aos diversos. tipos de intercambio comunicativo social. ' Rofere-se ao artigo “Que & a linguagem?", publicado neste volume, (Nota do organizador da edigéo argentina, Guilleemo Blanck). 157 No compreenderemos munca a construgéo de qualquer enunciagio ~ por completa e independente que ela possa parecer ~ se nao tivermos em conta 0 fato de que cla é s6 um momento, uma gota no rio da comunicagéo verbal, rio ininterrupto, assim como 6 ininterrupta a propria vida social, a histéria mesma. ‘Mesmo a comunicacao verbal nao passé formas de desenvolvimento - “de formagao” ~da comunidade social na qual se realiza a interagéo verbal entre pessoas que vivem uma vida social. Por isso, seria uma tarefa desesperada tentar compreender a construgao das enunciagdes, que formam a comunicaco verbal, sem ter presente nenhum de seus vinculos com a efetiva situagio social que as Dei chegamos a nossa iiltima conclusio: a esséncia ¢fetion da linguagem esté representade pelo fato social da interagao verbal, que é relizada por wma ow mais enunciacdes. De que depende e em que ordem ocorre « mudanga das formas da de uma das inumerdveis linguagem? (© material do artigo precedente nos permite construir um esquema do processo que provoca esta mudanga, esquema que da uma resposta A pergunta feita: 1. Organtzagto agricola da sociedade. Intercimbio comunicativo social Interagio verbal. Enunciagées. amaticais da lingua. pee ‘nos serve one guia na investigagao dessa unidade real da linguagem que chamamos enuncingfo. Nao devemos, obviamente, encerrar-nos no exame dos problemas ligados ao estudo das formas e dos tipos de vida econdmica da sociedade. Esses problemas so objeto de estudo de outras ciéncias, a5 ciéncias sociais, eem particular a economia politica, Tampouco nos entreteremos muito no exame dos varios tipos de interchmbio comunicativo social. Para nosso objetivo, € suficiente indicar 0s tipos mais essenciais e mais frequentes. Somente a um deles vamos dedicar, em nossos sucessivos artigos, uma atengao particular, ptecisamente 0 intercimbio comunicativo artistico 158 Se observarmos de perto a vida social, podemos individualizar facilmente, além do intercémbio comunicativo artistico jé assinalado, os seguintes tipos: 1. 0 intercdmbio comunicativo ligado & produgio? — nas fabricas, nas indtstrias, na agricultura’, etc; 2. 0 intercdmbio comunicativo dos negdcios ~ nos escritérios, nas organizagées sociais, etc; 3. © interc&imbio comunicativo da vida cotidiana —.encontros e conversas pela rua, a [conversagio] permanente numa mesa social, na propria casa, etc; 4. 0 intercimbio comunicativo social no sentido proprio do termo: propagandistico, escolar, cientifico, filoséfico, em todas suas variagbes. © que haviamos chamado no artigo precedente de situagio no & sendo a efetion realizagio na vida real de uma das formas, de uma das variedades, do intercémbio comunicatioo social. Qualquer situagio da vida em que se organize uma enunciagéo, nao obstante, pressupée inevitavelimente protagonistas, os _falantes, Chamaremos auditério da enunciagio A presenen dos participantes da situaci, Cada enunciagio da vida cotidiana - veremos isso mais adiante — compreende, além da parte verbal expressa, também uma parte extra verbal ndo expressa, mas subentendida ~ situagio e auditério ~ sem cuja compreensio no é possivel entender a propria enunciagdo. Essa enunciago, enquanto unidadé da comunicagéo verbal, enquanto unidade significante, elabora e assume uma forma fixa precisamente no processo constituido por uma interagio verbal particular, gerada num tipo particular de intercambio comunicativo social. Cada tipo de intercdmbio comunicativo referido anteriormente organiza, constréi ¢ completa, A sua maneira, a forma gramatical ¢ estilistica da enunciacao, sua estrutura tipo, que chamaremos a partir daqui de género 2 INT] Na edigo argentina, a palavra “produgio” foi omitida, mas ela aparece na «edigdo em italiono. ° INT] A edicio em Iingua espanhola mantém aqui 0 terme russo “koljés", que segundo nota de Guillermo Blanck significa “cooperativa agréria’. Opte? pelo sgenérico “agricultura’, ja que quando da publicagio deste artigo, esta produgio se fazia coletvamente nas cooperativas de produgio agricola, o que jé ndo ocorre, de modo que o termo “koljés” passa a ter aqui um sentido metonimico. (N.T}) 159 Observemos, ainda que seja brevemente, a relagéo de um tipo de intercambio comunicativo social - 0 da vida cotidiana - com sew correspondente tipo de interacao verbal. Ja vimos como a situacéo e 0 auditério provocam a passagem da linguagem interior a uma expressio externa, a qual é parte integrante de uma situagio da vida que permanece nao expressa — mas subentendida —e se completa nela por meio de uma agdo, de um ato ou ‘de uma resposta verbal dos outros participantes da enunciagao. .. Uma questéo completa, a exclamagio, a ordem, 0 pedido so ‘enunciagbes completas tfpicas da vida corrente, Todas (particularmente as ordens, os pedidos) exigem um complemento extraverbal assim como um inicio no verbal. Esses tipos de discursos menores da vida cotidiana séo modelados pela fricgio da palavra contra 0 meio extraverbal e contra a palavra do outro. ‘Assim, a forma da ordem é determinada pelos obstéculos que ela pode encontrar, 0 grat de submissio do receptor, ete, A modelagem das enunciagfes responde aqui a particularidades fortuitas e mio reiterévels das situacGes da vida corrente. $6 se pode falar de férmulas especificas, de esteredtipos no discurso da vida cotidiana quando existem formas de vida em comum relativamente regularizadas, reforgadas pelo uso e pelas circunstincias, Assim, encontram-se tipos particulares de {Grmulas estereotipadas servindo &s necessidades da conversa de salfo, fatil e que néo cria nenhuma obrigagao, em que todos os participantes sio familiares uns aos outros e onde a diferenca principal & entre homens e mulheres. Encontram-se elaboradas formas particulares de palavras-alusGes, de subentendidos, de reminiscéncias de pequenos incidentes sem nenhuma importancia, ete. Um outro tipo de formula elabore-se na conversa entre marido e muller, entse irmao ¢ rma, Pessoas inteiramente estranhas umas as outras e reunidas por caso (numa fila, numa entidade qualquer) comegam, constroem ¢ terminam suas declaracies e suas réplicas de maneira completamente diferente. Fncontram-se ainda outros tipos de serées no campo, nas ‘quermesses populares na cidade, na conversa dos operitios & hora do almogo, etc. Toda situagio inscrita duravelmente nos costumes possui tum auditério organizado de uma cetta maneira e consequentemente uum certo repert6rio de pequenas formulas correntes. A formula estereotipada adapta-se, em qualquer lugar, ao canal de interagio social que Ihe & reservado, refletindo ideologicamente o tipo, @ 160 estrutura, os objetivos e a composicio social do grupo. As férmulas da vida corrente fazer parte do meio social, sio elementos da festa, dos lnzeres, das relagSes que se travam no hotel, nas fébricas, etc. Elas coincidem com esse meio, sio por ele detimitadas ¢ determinadas em. todos os aspectos. (Marxismo e Filosofia da Linguagem, p. 125-126) 4. [N-T] Transcrigéo direta dessa passagem conforme aparece na ediglo brasileira do livso Marxismo ¢ Filosofia da Linguagem (Mikhail Bakhtin (Volochinov), $0 Paulo: Hiucitee, 1981). Numa traducio direta da edigéo argentina que estamos manuscando, a passagem teria a seguinte formulagio: ‘Uma pergunta completa, uma exclamagio, uma ordem, um pedido: eis aqui as formas mais tipicas da enunciagio da vida cotidiana. Todas elas ~ sobretude a ordem © 0 pedido ~ necessitam de um complemento e de tum comeso extraverbal. O tipo _mesmo ce execucio desses pequenos géneros cotidianos & determinado pelo impacto da palavra com o ambiente exiraverbal e pelo impacto da palavea com uma palavra alheta ~ uma palavra de outras pessoas, Assim, a forme da ordem ¢ determinada pelos obsticulos que pode encontrar, pelo rau de obediénca, ete. A execugo do género, neste caso, depende das caracterfstias peculiares das situagies da vida, que sio casuais eierepetiveis Pode-se falar de tipos especificos de realizagio de géneros da Hinguagem ootidiana somente onde exislam formas de interainbio comunicativn catidiano que sejara de algum modo estéveis,fixadas polo habitoe polas circunstinctas, ‘Assim; um tipo perticular de realizago de género se encontra na conversa de salio,ligeira e casual, onde todos estdo entre conhecidos e onde a diferenciagio ~ subclivisio ~ substancial entre os presentes ~ chamamos “auditdric" ~ 6 a diviséo entre homens e mulheres. Aqui aparecem formas partculares de fala, insinuacSo, 28 fase vedas, epetico de pequenasistrias de cater notoiamente igi. ‘Outro tipo de realizagdo do género se encontra na conversa entre marido e muller, entre irmao e irma, Pessoas heterogéneas, ao encontrarem-se casualmente nume fil, num escritério, etc. 92 manifestam e constroem suas réplicas de maneira abgolutamente distinta, Tem seus tipos particulares de enunciagées 03 velérios campesinos, as festas urbanas, as conversas dos trabalhadores na pausa de almoco, etc. Cada situacfo fixa da. vida corresponde a uma organizagie particular do aucltério, e em consequincia a um repertério de pequeros géneros cotiianos. sénero da vida cotidiana se situa sempre no leite do intercimbio comunicativo social #€0 retlexo ideokdgico de seu tipo ce estratra, se objetivo sa composi soca. © género da vida oidana¢ uma parte do anon da festa do tempo ive da conversa de saléo, da conversa no escritério, na oficina etc. Ele coincide com este ambiente, édelimitado por ele e todos seus aspectos interiores resultam determinados por ele. (V.N. Voloshinov/M. Bakhtin. Marxismo flosofia da lnguagem), Para leitores mais exigentes com a vida dos textos em suas multiples linguas, transerevo a seguir a versio em francés desta mesma passagem, tal como aparece em Volosinov, Valentin Nicokaevic. Murxisme et Philosophie du Langage. Les 161 2. 0 discurso monolégico e o discurso dialégico Se se observa o proceso de formagio desses pequenos géneros cotidianos, nao ¢ dificil notar que a comunicacao verbal, em cujo ambito eles nascem e se organizam, compée-se de dois momentos: a enunciagio feita pelo falante e sua compreensio por parte do ouvinte. Essa compreensio contém sempre os elementos da resposta. Em realidade, normalmente nés concordamos ou discordamos do que ouvimos, fendamertax de la méthode soclogque dans la Science dh langage, Nowe Gaon bingo tite du rape pat Paik Sot ct lana Tykowsi-Ageeva (Cioges: Lambert cas, 2105 "Une qleson, une saaton, uh ore, ne demande ol es es aches atm Is plus typgues des Enon de ave orn, Tous (om parler, onde Erle demande) exigent um complénent, fst comme une amore. Le ype mene

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