Você está na página 1de 1

A solidão dos tempos modernos

Uma das coisas interessantes que eu acho que esta quarentena trás é que as pessoas
estão cada vez mais a deixar cair os filtros.
Por exemplo, no Instagram eu vejo muito menos vídeos de maquilhagem, vejo muito
mais pessoas em fatos de treino. Eu sinto que estamos a ver mais a verdade na vida
das pessoas.
Vejo uma sala que é uma autêntica lixeira com brinquedos de criança
e deixa-me a pensar claro, é normal. Isto é interessante, é um fenómeno interessante,
estamos a ter acesso a coisas que antes nos estavam completamente vedadas.
Reparem este modo de andar assim por casa já eram comum, a questão é que as
pessoas antes disto só escolhiam mostrar os 3% mais interessante da sua vida (só que
estes 3% são sempre um momento efémero, é só a foto do brunch, naquela pose, as
panquecas acabadas de ser servidas naquele instante e “rápido, rápido” tirar a
fotografia antes que o café arrefeça para não perder o fumo para a foto.
É isto que nos chega, mas depois não se esqueçam que depois daquela foto houve
provavelmente uma refeição meio passada em silencio e ela deve ter estado uns
25min a editar a foto no telemóvel sem sequer falar com os amigos.
Nas redes sociais é fácil mostrarmos apenas o que queremos, uma versão otimizada de
quem somos, o que, em última análise, impossibilita a criação de relações autênticas.
O que acontece antes e depois desta foto, normalmente é medíocre.
Grande parte das nossas vidas é relativamente aborrecida, momentos medíocres o que
não quer dizer que sejam infelizes. É dobrar meias, é passar tempos infinitos a espera
do autocarro… e reparem não havia mal nenhum nisso…ate agora, ate estes 3% nos
habituarem as aparências e isso depois tem efeitos muito negativos nas nossas vidas
porque depois ficamos a achar que somos nós que estamos mal e que a vida tem
muito mais para nos dar (como panquecas num brunch cheio de plantas de interior
atras).
O que eu acho fascinante neste momento de quarentena é que estes 3% da vida já não
estão ao alcance de ninguém estamos todos em casa e de alguma forma estamos a
dignificar os restantes 97% que no fundo são os mais verdadeiros, é a vida a acontecer
eu acho isto interessante, positivo até.

Você também pode gostar