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Em 1964 o Brasil entrou em uma das fases mais violentas da sua história.

Caracterizada pela censura, ausência de democracia, supressão de direitos


constitucionais, perseguição política e repressão aos que eram contra o regime, a
ditadura foi o período em que, com seus dispositivos autoritários, os militares se
mantiveram no poder do Estado. É difícil sintetizar e detalhar simultaneamente uma
fase histórica tão rica em termos de conteúdo.

Em um contexto internacional, o mundo vivia o auge da Guerra Fria, e o estilo


populista e de esquerda, presente no governo de João Goulart, chegou a gerar até
mesmo preocupação nos EUA, que junto às classes conservadoras brasileiras, temia um
golpe comunista.

No livro Visões do Golpe – a memória militar de 1964, em um depoimento


concedido a Maria Celina D’Araujo, Ivan de Souza Mendes, tenente-coronel no
governo de Goulart, revela que a respeito da deposição do militar, um fator decisivo foi
o fomento a indisciplina, explícito em seu discurso no Automóvel Clube do Brasil, que
possuiu um caráter muito contrário aos ideais militares da época.

“A crise que se manifesta no país foi provocada pela minoria de


privilegiados que vive de olhos voltados para o passado e teme enfrentar o
luminoso futuro que se abrirá à democracia pela integração de milhões de
patrícios nossos na vida econômica, social e política da Nação, libertando-
os da penúria e da ignorância. (...)” TRECHO DO DISCURSO DE JOÃO
GOULART DURANTE REUNIÃO DE SARGENTOS NO AUTOMÓVEL
CLUBE EM 30 DE MARÇO DE 1964.

João Goulart é deportado e é instituído o Ato Institucional nº1, o primeiro dentre


os muitos mecanismos adotados pelos militares para legalizar ações políticas não
previstas e mesmo contrárias à Constituição.

Esse comportamento é típico do regime, onde princípios básicos da democracia


foram violados sem que se assumisse efetivamente seu caráter autoritário.
Dois dias após a instauração do AI-1, o general Humberto de Alencar Castelo
Branco foi promovido ao posto de marechal e eleito de forma indireta pelo congresso
nacional para a presidência da República.

Em seu governo o congresso e o poder judiciário ainda mantinham uma certa


autonomia. Nomeou ministros da fazenda e do planejamento na tentativa de recuperar a
economia brasileira. Também foi instituído, com o AI-2, o bipartidarismo. Só estava
autorizado o funcionamento de dois partidos: Movimento Democrático Brasileiro
(MDB) e a Aliança Renovadora Nacional (ARENA). Enquanto o primeiro era de
oposição, de certa forma controlada, o segundo representava os militares.

Pressionado pela ala das forças armadas mais linha duras, Castelo Branco adotou
uma póstuma mais repressiva: decretou um novo ato inconstitucional que estabeleceu
eleições indiretas para governadores e prefeitos de capitais, restringiu as liberdades
civis, cassou parlamentares e fechou o congresso, reabrindo-o por meio do AI-4.

A oposição cresceu com a posse do general Costa e Silva em 1967. Carlos


Lacerda uniu-se a seus inimigos tradicionais - João Goulart e Juscelino Kubitscheck -
lançando um movimento de oposição ao regime que buscava a redemocratização: a
Frente Ampla, sufocado meses depois.

Houve diversas manifestações de revolta popular sendo, em junho, a maior


delas, onde 100 mil pessoas saíram pelas ruas do Rio de Janeiro em passeata pelo fim da
ditadura no país.

No dia 13 de dezembro de 1968, o governo decreta o Ato Institucional Número 5


(AI-5), sendo este o mais rígido, pois aposentou juízes, cassou mandatos, censurou os
meios de comunicação, acabou com as garantias do habeas-corpus e aumentou a
repressão militar e policial.

O regime não cedeu às pressões sociais e de se reformar, seguindo cada vez mais
o curso de uma ditadura brutal.

Doente, Costa e Silva foi substituído por uma junta militar formada pelos
ministros Aurélio de Lira Tavares (Exército), Augusto Rademaker (Marinha) e Márcio
de Sousa e Melo (Aeronáutica).
Em 1969, a Junta Militar escolhe o novo presidente: o general Emílio Garrastazu
Médici. Seu governo é considerado o mais duro e repressivo do período, conhecido
como "anos de chumbo”. Nessa época toda uma rede de órgãos repressivos funcionava
para manter acuados não só os grupos de esquerda, mas também a própria sociedade. A
repressão à luta armada cresce e uma severa política de censura é colocada em
execução. Jornais, revistas, livros, peças de teatro, filmes, músicas e outras formas de
expressão artística são censuradas. Muitos professores, políticos, músicos, artistas e
escritores são investigados, presos, torturados ou exilados do país. Segundo dados da
Arquidiocese de São Paulo, 144 pessoas foram assassinadas sob tortura e outras 125
dadas como desaparecidas.

Em meio a esse cenário de negatividade na sociedade, o setor econômico colhia


os frutos de um longo período de crescimento. Chamado de “Milagre Econômico”, mais
precisamente durante os anos 1969 e 1973.

Com a abertura para o capital estrangeiro, o país continuava a contrair dívidas


externas. Além do mais, grande parte da população não desfrutava desse “milagre”
econômico, fazendo com que o legado do termo ainda hoje soe como uma verdadeira
ambiguidade política. O que Boris Fausto, no livro “Historia Concisa do Brasil”,
confirma ao dizer que os aspectos negativos do “milagre” foram principalmente de
natureza social.

Os salários dos trabalhadores de baixa qualificação foram comprimidos,


enquanto empregos em áreas como administração de empresas se beneficiaram ao
máximo. Outro aspecto negativo foi a desproporção entre o avanço e o retardamento, ou
mesmo o abandono dos programas sociais pelo Estado.

Assim como Castelo Branco, Médici não conseguiu fazer seu sucessor e um
colégio eleitoral composto por membros do Congresso e das Assembléias Legislativas
estaduais elegeu o general Ernesto Geisel para sua sucessão.

Com Geisel, surgem os primeiros indícios da iminência de transformações no


regime militar. Ele se associa ao início da abertura política, definindo-a lenta, gradual e
segura, o que diante da contínua ameaça de retrocessos graças à linha dura, parecia
improvável.
Seu governo coincide com o fim do milagre econômico e alta taxa de
insatisfação popular. A crise do petróleo e a recessão mundial interferem na economia
brasileira, no momento em que os créditos e empréstimos internacionais diminuem.

Caminhando lentamente para a democracia, em 1978, Geisel acaba com o AI-5,


restaura o habeas-corpus e substitui o comandante do II Exército por um general de sua
inteira confiança, que mudou a linguagem e começou a estabelecer contato com a
sociedade.

Após impedir que o general Sylvio Frota, militar da “linha dura”, lançasse sua
candidatura a presidência, Geisel indicou para sua sucessão o nome do General Baptista
Figueiredo, que foi eleito de forma indireta em outubro de 1978.

O último general-presidente a comandar o Brasil, Figueiredo decretou a Lei da


Anistia (1979), dando o direito de retorno ao Brasil a artistas, políticos e demais
cidadãos brasileiros exilados por crimes políticos.

Estima-se que essa medida tenha beneficiado cerca de 10 mil pessoas, entre elas
lideranças políticas como Luís Carlos Prestes, Leonel Brizola, o educador Paulo Freire,
entre muitos outros que se encontravam exilados e retornaram ao país. Criminosos
políticos presos foram postos em liberdade.

Insatisfeitos com os benefícios dados aos terroristas, militares da linha dura


continuaram a desempenhar a repressão clandestina.

Durante o governo Figueiredo, o pluripartidarismo foi restabelecido no ano de


1979. A ARENA (Aliança Renovadora Nacional) passou a ser PDS (Partido
Democrático Social) e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro) se tornou PMDB.
Outros partidos foram criados, como PT (Partido dos Trabalhadores) e PDT (Partido
Democrático Trabalhista).

O acontecimento final do governo do general Figueiredo foi a campanha pelas


“Diretas Já”, em 1984. O país inteiro tomou parte. O movimento era favorável à
aprovação da Emenda Dante de Oliveira, lutando pelo direito de votar para presidente.
Nos últimos comícios, no Rio de Janeiro e em São Paulo, reuniram-se milhões de
pessoas. Foram as maiores manifestações de massa da história do Brasil.
Somente em 1985 a Redemocratização do Brasil foi concluída. Os militares
enfrentavam dificuldades para recuperar a economia do país. Nesta época, os índices de
inflação eram muito altos, além dos inúmeros casos de corrupção na máquina pública
revelados pela imprensa. Os setores de saúde e educação enfrentavam rombos enormes
e a sociedade pressionava para que os militares deixassem o poder.

A eleição presidencial de Tancredo Neves em 1984 pelo Colégio Eleitoral


marcou o fim da Ditadura Militar, apesar de não obter apoio de partidos da esquerda
como o Partido dos Trabalhadores e o Partido Comunista.

Entretanto, Tancredo Neves foi internado antes de ocupar o cargo e faleceu um


mês depois. Quem ocupou o cargo da presidência foi seu vice, José Sarney.

Durante o Governo Sarney, uma nova Constituição foi formulada e concluída


em 1988. O texto previa o fim da censura e proclamava o direito à liberdade civil da
sociedade.

A Constituição de 1988 apagou os rastros da ditadura militar e estabeleceu


princípios democráticos no país.

Com vários militares no governo ao longo desses anos, percebe-se o reflexo de


suas diferentes personalidades durante suas carreiras militares, notadas em diferentes
posturas adotadas em seus governos e na relação que mantinham tanto com a sociedade
quanto com os conservadores e militares “linha dura”.

O entendimento das razões que levaram ao golpe e a longa duração do regime


militar é uma tarefa incompleta. A história pode ser revista e reexaminada, mas novos
dados e novas fontes ou apenas novos interesses surgem com o passar dos anos. Esse
constante rever constitui um exercício de cidadania fundamental para que se possa
fundamentar um olhar mais crítico da sociedade diante da política e do governo.
Bibliografia:

• Fausto, Boris - História Concisa do Brasil

• Linhares, Maria Yeda – História Geral do Brasil

• Castro, Celso – Visões do Golpe – A memória militar de 1964

• Jornal do Brasil, 31 mar. 1964.

• http://www.culturabrasil.pro.br/

• http://www.brasilcultura.com.br/

• http://www.memoriaviva.com.br/ocruzeiro/10041964/100464_1.htm

• http://www.gedm.ifcs.ufrj.br/upload/documentos/42.pdf

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