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Excelentíssimo Senhor Juiz Convocado Gilson Félix dos Santos, Relator da
Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Sergipe

Processo no 201900319991

O Ministério Público do Estado de Sergipe, por conduto do Promo-


tor de Justiça convocado, no exercício de suas atribuições em substituição automáti-
ca na 9ª Procuradoria de Justiça, bem assim nos termos do artigo 129, inciso I, da
Constituição Federal; artigo 118, da Constituição Estadual; da Lei Federal nº
8.625/93 e da Lei Complementar Estadual nº 02/1990, vem requerer a aplicação de:

Medida cautelar de afastamento do exercício do cargo (artigo 2 o, do Decreto-


Lei no 201/1967) e medida cautelar de proibição de contato com codenuncia-
dos e testemunhas (artigo 319, inciso III, do Código de Processo Penal)

Em desfavor de Etelvino Barreto Sobrinho, brasileiro, casado, atual-


mente Prefeito de Rosário do Catete/SE, portador do documento de identidade n o
499.943 SSP/SE e devidamente registrado no CPF nº 234.896.775-87, com domicí-
lio na Fazenda Nova Taperoá, Zona Rua, município de Rosário do Catete/SE e na
Rua Jackson de Figueiredo, no 173, Centro, município de Rosário do Catete/SE.

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I. Da contextualização fática

O Ministério Público de Sergipe, por meio da Promotoria de Justiça de


Carmópolis, instaurou Procedimento Investigatório (PROEJ n o 26.17.01.0142), a fim
de apurar a contratação de Sidney Henrique Barreto Chagas como “servidor fantas-
ma” pela gestão do atual prefeito de Rosário do Catete, Etelvino Barreto Sobrinho.

Durante as investigações, constatou-se que o suposto servidor esteve


lotado, no período de janeiro a setembro de 2017, na Secretaria Municipal de Cultu-
ra e Turismo de Rosário do Catete, no cago de Diretor de Eventos-CC2, tendo as fi -
chas de ponto assinadas pela então Secretária da pasta, Maura Cecília Santos.

Em audiências realizadas na Promotoria de Justiça nas datas de 18 de


maio de 2018 e 4 de julho de 2018, Maura Cecília Santos tratou como “infundada” a
denúncia, e Sidney Henrique Barreto Chagas, da mesma maneira, negou os fatos.

Acontece que, em 18 de outubro de 2018, Maura Cecília Santos com-


pareceu espontaneamente na Promotoria de Justiça, quando, retratando-se, além
de assumir que Sidney Henrique Barreto Chagas era “servidor fantasma”, indicou
que a servidora Laila Medrado Gomes da Cruz estava na mesma condição.

Nesse depoimento, Maura Cecília Santos chegou a informar que nun-


ca conhecera Sidney Henrique Barreto Chagas e que foi somente a ele apresen-
tada numa reunião acontecida no escritório do advogado Jorge Rabelo (nesta capi -
tal), na qual também estava presente o Prefeito Etelvino Barreto Sobrinho, ocasião
em que supostamente foi orientada a falsear sua versão dos fatos, a fim de
confirmar a regularidade da contratação de Sidney, e quando recebeu a pro-
posta de embolsar quinze mil reais mensais para que se retirasse da Secreta-
ria e “ficasse em casa calada”.

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Com o aprofundamento das apurações, confirmou-se que Laila Medra-


do Gomes esteve a serviço da municipalidade entre março de junho de 2018, lotada
na Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, embora como “servidora fantasma”.

No bojo do procedimento, foram intimados os servidores que forma-


vam a equipe da Secretaria Municipal de Cultura e Turismo e todos eles prestaram
informações convergentes com as revelações de Maura Cecília Santos, no
sentido de que Sidney Henrique Barreto Chagas e Laila Medrado Gomes nun-
ca haviam trabalhado naquela pasta.

Registre-se que os valores pagos indevidamente em nome de Sidney


Henrique Barreto Chagas somaram o valor de R$ 39.743,75 (trinta e nove mil, sete-
centos e quarenta e três reais e setenta e cinco centavos) e aqueles despendidos
em favor de Laila Medrado Gomes, R$ 12.075,87 (doze mil e setenta e cinco reais e
oitenta e sete centavos), resultando no prejuízo ao erário municipal de R$
51.819,62 (cinquenta e um mil, oitocentos e dezenove reais e dois centavos).

Em relação a essa situação fática (contratação de “servidores fantas-


mas”), foi ajuizada em primeira instância, em 15 de janeiro de 2019, Ação por Ato de
Improbidade Administrativa (processo de no 201974200022), que está em andamen-
to, e, neste grau, em 12 de julho de 2019, a presente Ação Penal Originária.

II. Dos fundamentos para decretação do afastamento cautelar

Como medida de cautela pessoal, o afastamento do exercício do


cargo durante a instrução criminal, previsto no artigo 2 o, inciso II, do Decreto-
Lei no 201/1967, sujeita-se tal qual as cautelares do Código de Processo Penal, à
presença dos requisitos do “fumus comissi delicti” e do “periculum libertatis”.

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De acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “tais
pressupostos alcançam não só as medidas previstas no art. 319 do Código de Pro -
cesso Penal, na redação dada pela Lei n.12.403/2011, como também o disposto
no art. 2º, II, do Decreto-Lei n. 201/1967, tendo em vista o caráter de norma ge-
ral do Código de Processo Penal, especificamente delineado no seu art. 1º.” (STJ,
REsp no 1814669/MA, Sexta Turma, Relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Dj-e de
16 de dezembro de 2019)

No caso, o “fumus comissi delicti” decorre da contundência da narrati-


va da denúncia, segundo a qual Etelvino Barreto Sobrinho, Prefeito de Rosário do
Catete, em concurso com os demais denunciados, manteve na administração muni-
cipal dois “servidores fantasmas”, gerando prejuízo aos cofres públicos municipais.

O respaldo cognitivo está nos documentos e, sobretudo, nos testemu-


nhos de servidores lotados na Secretaria Municipal de Cultura e Turismo (especial-
mente no de Maura Cecília Santos, mas também nos de Maria Aparecida Ferreira
da Silva, Carlos Rafael Pereira Dortas, Cleverton Felix Vasconcelos, Adailton dos
Santos Andrade e Maria Helena dos Santos), pasta à qual eram vinculados os dois
“servidores fantasmas”.

Transcrevemos, por reforço, trechos desses depoimentos, prestados


todos juntos à Promotoria de Justiça de Carmópolis, que, diligente e eficientemente
inaugurou e conduziu o procedimento investigatório:

Que Sidney realmente era um fantasma; que nunca conheceu, recebeu, nem foi apresen-
tada a Sidney. Que as pessoas que trabalhavam com ela na equipe nunca conheceram
Sidney. Que faziam parte da equipe Adailton Andrade, Rafael, Cida, Helena e Cleverton.
Que Sidney nunca trabalhou no local. Que foi chamada na Secretaria de Administração
para assinar as folhas de ponto. Que conheceu Sidney quando foi chamada para uma reu-
nião no Escritório de Jorge Rabelo, em Aracaju, que aconteceu uma semana antes da pri-
meira vinda dela nesta Promotoria. Que o Escritório de Jorge Rabelo foi contratado pela

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Prefeitura de Rosário do Catete, nesta atual gestão de Etelvino. (…) Que a depoente foi
orientada a dizer que Sidney realmente trabalhava na Secretaria, mas também realizava
trabalhos externos. (…) Que, Laila Medrado Gomes da Cruz também era ‘funcionária fan-
tasma’. Que, depois de ter participado da primeira audiência, nesta Promotoria, ficou teme-
rosa e decidiu devolver a funcionária, por receio do problema se agravar. Que Laila nunca
esteve no prédio da Prefeitura, e não reside no Município. (…) Por conta disso, na reunião
havida no Escritório de Jorge Rabelo, recebeu a proposta de se retirar da Secretária e em
troca receber uma remuneração mensal de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), ‘para ficar em
casa calada’ (sic). Que não aceitou a proposta.
(Maura Cecília Santos)

“Que é servidora pública efetiva no cargo de auxiliar de serviços gerais, há aproximada-


mente 19 anos, no município de Rosário do Catete; que trabalha na Secretaria Municipal
de Cultura há cerca de oito anos; que a última Secretária Municipal de Cultura que tem co-
nhecimento foi a Sra. Maura Cecília. (…) Que não conhece Sidney Henrique Barreto Cha-
gas; que nunca o viu; que desconhece que ele tenha trabalhado na Secretaria de Cultura
de Rosário do Catete; ‘que nunca viu ele por lá’; que não sabia que Sidney era servidor de
Rosário; que apresentada a fotografia constante do RG do Sr. Sidney à depoente (fl. 47),
esta declarou que não o conhece; que também nunca viu Sidney em confraternizações e
festas de aniversário da equipe do local de trabalho. (…) que não conhece a Sra. Laila Me-
drado Gomes da Cruz; que Laila nunca trabalhou na Secretaria de Cultura do Município;
que apresentada a fotografia da Sra. Laila constante da fl. 62 deste procedimento, a depo-
ente nunca a ter visto.”
(Maria Aparecida Ferreira da Silva)

“Que é servidor público efetivo no cargo de assistente administrativo, desde de 2011, no


município de Rosário do Catete; que trabalhou na Secretaria Municipal de Cultura, de ja-
neiro de 2017 a outubro de 2018. (…) Que não conhece Sidney Henrique Barreto Chagas;
que nunca o viu; que desconhece que ele tenha trabalhado na Secretaria de Cultura de
Rosário do Catete; que não sabia que Sidney era servidor de Rosário; que apresentada a
fotografia constante do RG do Sr. Sidney ao depoente (fl. 47), este declarou que não o co-
nhece. (…) Que não conhece a Sra. Laila Medrado Gomes da Cruz; que Laila nunca traba-
lhou na Secretaria de Cultura do Município; que apresentada a fotografia da Sra. Laila

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constante da fl. 62 deste procedimento, o depoente declarou a conhecer pela imagem, não
pelo nome; que a conhece de vista da cidade, mas nunca mais a viu; que já viu Laila nas
festas da cidade; que após apresentada a fotografia de fls. 62, o depoente reafirma que a
Sra. Laila Medrado nunca trabalhou na Secretaria de Cultura, no período em que o depo-
ente lá esteve lotado”.
(Carlos Rafael Pereira Dortas)

“Que é servidor público efetivo no cargo de auxiliar de serviços gerais, desde outubro de
2011, no município de Rosário do Catete; que foi nomeado em março de 2018 para exer-
cer a função de Secretário da Junta de Serviço Militar no município de Rosário do Catete;
(...) Que trabalhou na Secretaria Municipal de Cultura, de janeiro de 2017 a março de
2018; que no período em que trabalhou na Secretaria de Cultura, a Secretária de Cultura
era a Sra. Maura Cecília. (…) Que não conhece Sidney Henrique Barreto Chagas; que
nunca o viu; que desconhece que ele tenha trabalhado na Secretaria de Cultura de Rosá-
rio do Catete; que não sabia que Sidney era servidor de Rosário; que apresentada a foto-
grafia constante do RG do Sr. Sidney ao depoente (fl. 47), este declarou que não o conhe-
ce.(…) Que não conhece a Sra. Laila Medrado Gomes da Cruz; que Laila nunca trabalhou
na Secretaria de Cultura do Município; que apresentada a fotografia da Sra. Laila constan-
te da fl. 62 deste procedimento, o depoente declarou não conhecer referida pessoa.”
(Cleverton Felix Vasconcelos)

“Que exerceu o cargo em comissão de diretor de cultura do Município de Rosário do Cate-


te, desde 01 de fevereiro de 2017, sendo que foi exonerado, no mês de setembro ou outu-
bro de 2018, não se recordando exatamente a data; que no período em que exerceu o car-
go de diretor de cultura, a secretária Municipal era a Sra. Maura Cecília. (…) Que não co-
nhece Sidney Henrique Barreto Chagas; que nunca o viu; que desconhece que ele tenha
trabalhado na Secretaria de Cultura de Rosário do Catete; que não sabia que Sidney era
servidor de Rosário; que apresentada a fotografia constante do RG do Sr. Sidney ao depo-
ente (fl. 47), este declarou que não o conhece.(…) Que não conhece a Sra. Laila Medrado
Gomes da Cruz; que Laila nunca trabalhou na Secretaria de Cultura do Município; que
apresentada a fotografia da Sra. Laila constante da fl. 62 deste procedimento, o depoente
declarou a conhecer pela imagem, não pelo nome. (…) O depoente reafirma que a Sra.
Laila Medrado nunca foi vista pelo depoente por lá na Secretaria de Cultura, no período

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em que exerceu seu cargo no local.”


(Adailton dos Santos Andrade)

“Que era auxiliar de serviços gerais da Prefeitura de Rosário do Catete, na condição de


servidora efetiva; que se aposentou no mês de maio de 2018, sendo que o seu último local
de lotação foi na Secretaria de Cultura, onde estava desde 2010’que quando se aposentou
a Secretária de Cultura era a Sr. Maura Cecília; que não conhece Sidney Henrique Barreto
Chagas; que nunca o viu; que desconhece que ele tenha trabalhado na Secretaria de Cul-
tura de Rosário do Catete; que não sabia que Sidney era servidor de Rosário; que apre-
sentada a fotografia constante do RG do Sr. Sidney ao depoente (fl. 47), esta declarou que
não o conhece, ‘que nunca viu’. (…) Que não conhece a Sra. Laila Medrado Gomes da
Cruz; que Laila nunca trabalhou na Secretaria de Cultura do Município; que apresentada a
fotografia da Sra. Laila constante da fl. 62 deste procedimento, a depoente declarou não
conhecer referida pessoa.
(Maria Helena dos Santos)

Sobre o “periculum libertatis”, por seu turno, ele pode ser dividido em
dois vértices: nos perigos à ordem e a moralidade públicas pelos riscos de conti-
nuidade delitiva, e nas chances de influência na instrução processual.

II.1. Dos riscos à ordem e à moralidade públicas:

Como componente da primeira vertente, anotamos que, além do feito


criminal presente, o denunciado Etelvino Barreto Sobrinho é réu no processo no
201674290004, em que lhe é imputado o crime de apropriação indébita majorada
(artigo 168, § 1º, inciso III, Código Penal) em concurso material.

Naquela ação penal, Etelvino Barreto Sobrinho é acusado de ter, no


período entre setembro e dezembro de 2012, enquanto também ocupava o cargo
de Prefeito de Rosário do Catete, apropriado-se de parcelas referentes a em-
préstimos consignados, planos odontológicos e contribuições sindicais dos salários

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dos servidores municipais, retendo em folha os respectivos valores, sem repassá-
los às instituições credoras, o que acarretou na inclusão dos nomes dos servidores
no rol dos órgãos restritivos de crédito.

Ainda que esses fatos digam respeito a uma gestão anterior, chama a
atenção que tanto eles quanto os crimes ora apurados ocorreram no mesmo pano-
rama: o denunciado, exercendo cargo no executivo municipal, fez mau uso
das atribuições e dos poderes por ele conferidos para praticar ilicitudes.

Isso é revelador de um descompromisso habitual do denunciado en-


quanto gestor público e da renitência de comportamentos descompassados dos
princípios da administração pública e das expectativas dos munícipes.

Em outras palavras, a coincidência de contextos fáticos entre os dois


crimes (ainda que se tratem de tipos penais diferentes), tendo como pano de fun-
do a chefia da administração pública municipal, aponta para a tendência e para
a afeição do denunciado ao cometimento de ilicitudes contra o poder que ocupa
e contra o erário que deveria bem administrar.

Sob essa perspectiva, a probabilidade (e não possibilidade) de repe-


tição de atos contra as contas da administração pública municipal é flagrante.

Se o denunciado responde, em outra ação penal, por crimes cometi-


dos em mandato eletivo passado e nesta, por crimes relacionados à gestão
atual, é possível aferir uma propensão e uma inclinação a novos desvios.

É dizer, uma análise prospectiva estima que a manutenção no car-


go importará em mais ilicitudes, porque estará ele exposto ao mesmo pressu-
posto (o cargo) que permitiu consumar os crimes que hoje são imputados.

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Aqui vale a repetição: as acusações desta ação datam de época poste-
rior à deflagração do processo n o 201674290004, servindo como indicação do ani-
mus de continuidade do denunciado quanto a atos ímprobos e ilícitos.

A existência de ações penais em andamento é, enfim, aceno claro da


necessidade urgente de interromper futuras atuações do denunciado que pos-
sam impactar ainda mais no erário municipal.

Em casos como esse, cautelares mais aflitivas, como o afastamento do


exercício do cargo, encontram justificativa, de acordo com a jurisprudência do Supe-
rior Tribunal de Justiça, verbis “da leitura dos excertos transcritos, verifica-se, por
mais uma oportunidade, que tanto a decisão que impôs a medida cautelar de afas -
tamento do cargo de prefeita, quanto o acórdão, que determinou a sua prorrogação,
estão devidamente fundamentados com base em dados concretos extraídos dos
autos. Assim, parece-me consentâneo com os princípios da razoabilidade, proporci-
onalidade e adequação, a manutenção da medida cautelar imposta, a qual foi esta -
belecida de maneira suficiente aos fins visados, para garantia da ordem pública, evi -
tando-se a reiteração delitiva, tendo o eg. Tribunal de origem consignado a existên -
cia de ‘suporte probatório suficiente a se admitir [...] a prática de reiteradas condu-
tas supostamente criminosas com o fim de enriquecimento ilícito pelos agen-
tes públicos e particulares, mediante o desvio de recursos do Município’ (fl.
39), as quais vem ocorrendo desde o ano de 2013, de forma reiterada”. (STJ, AgRg
no HC 501.305/CE, Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, Dj-e 1 o de agosto de 2019)

Destacamos, ademais, que o denunciado possui condenação não de-


finitiva (em segundo grau) no processo n o 201274200540 por ato de improbida-
de administrativa, somando mais uma conduta, ainda que não criminal, lesiva
ao bom funcionamento da administração pública e a seus princípios reitores.

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Além disso, ele coleciona ações em curso por atos de improbida-
de administrativa nos processos de n o 201674200438 (contratações irregulares
mediante inexigibilidade de licitação), n o 201974200279 (nepotismo), no
201974200424 (enriquecimento em prejuízo ao erário por meio de esquemas
com empresas privadas) e n o 201974200022 (os mesmos fatos aqui apurados,
“servidores fantasmas”).

As ações tombadas sob os no 201974200279 e 201974200022 dizem


respeito ao mandato presente e as demais, à gestão anterior (2009-2012).

Colacionamos, para melhor compreensão, passagens das acusações:

Processo no 201274200540:

“Restou descortinada irregularidade na contratação de Edines dos Santos, por parte do


município de Rosário do Catete/SE, pelo atual Prefeito Etelvino Barreto Sobrinho, tendo
em vista à desobediência ao imperativo constitucional da prévia aprovação em concurso
público para exercício de cargo ou emprego público. Neste sentido, ainda segundo acervo
probatório coligido, Edines dos Santos foi nomeada pela Prefeitura de Rosário do Catete
para desempenho de cargo em comissão, Decretos no 611/2010 e 1012/2011, mas em
verdade atendia telefone, anotava recados e entregava ‘papel’ na Prefeitura segundo de-
claração prestada pela própria Edines dos Santos perante a Promotoria de Justiça.”
(Trecho extraído da denúncia)

Processo no 201674200438:

“No dia 19 de fevereiro de 2015 foi instaurado o procedimento PROEJ n o 26.15.01.0017


para apurar irregularidade na contratação de bandas e shows artísticos pelo Município de
Rosário do Catete para as comemorações da Festa ‘Carnacatete’, realizada nos dias 18 a
21 de fevereiro de 2012. (…) Vale ainda notar que das bandas/artistas que prestaram as
informações requisitadas, o total pago pelo intermediário às mesmas foi de R$ 439.200,00
(quatrocentos e trinta e nove mil e duzentos reais), sendo que a empresa recebeu da Pre-

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feitura Municipal de Rosário do Catete o valor de R$ 682.520,00 (seiscentos e oitenta e


dois mil, quinhentos e vinte reais), ou seja, uma diferença de R$ 243.320,00 (duzentos e
quarenta e três mil, trezentos e vinte reais), valor apurado até o momento.”
(Trecho extraído da denúncia)

Processo no 201974200279:

“O Ministério Público do Estado de Sergipe instaurou o procedimento, tombado sob o


PROEJ no 26.18.01.0032, visando apurar possível prática de nepotismos no âmbito da ad-
ministração pública municipal na cidade de Rosário do Catete, a partir da informação de
que a filha e o irmão do atual Prefeito exerciam funções de Secretários Municipais, sem a
devida qualificação técnica.”
(Trecho extraído da denúncia)

Processo no 201974200424:

“Assim, os ato delituosos renderam a quantia, até o início das investigações, de R$


2.300.180,88 (dois milhões, trezentos mil, cento e oitenta reais e oitenta e oito centavos).
(…) Assim, pena análise do evento em testilha, tem-se como incursos no presente artigo
os requeridos Etelvino Barreto Sobrinho e José Laércio Passos Júnior, porquanto, na con-
dição de ex-prefeitos nos períodos de 2009/2012 e 2005/2008, respectivamente, urdiram
esquema para que este pudesse administrar empresa com contratos públicos, o que é ve-
dado por Lei, permitindo que empresários, e eles próprios, se enriquecessem de forma
ilícita, em prejuízo ao erário”.
(Trecho extraído da denúncia)

Processo no 201974200022:

“Consoante se afere nos depoimentos acima colacionados, todos os servidores que forma-
vam a equipe da Secretaria de Cultura e Turismo foram uníssonos em afirmar que os se-
nhores Sidney Henrique Barreto Chagas, e a senhora Laila Medrado Gomes da Cruz nun-
ca trabalharam na referida Secretaria, aliás, todos eles nem mesmo conheciam os referi-
dos ‘servidores fantasmas’”.

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(Trecho extraído da denúncia)

Em síntese, a chefia no executivo municipal expressa-se, infelizmente,


como um campo propício para que o denunciado desvirtue o cargo e a confiança
depositada pelos cidadãos rosarenses por meio do voto.

O afastamento cautelar, mais uma vez, apesar da excepcionalida-


de que o condiciona, mostra-se como freio de contensão a novas (e prová-
veis) investidas vulnerantes contra a estrutura administrativa.

Não é concebível que um gestor público, ainda mais de um município


interiorano, como é Rosário do Catete, com receitas limitadas, apesar das necessi-
dades sempre urgentes de seu povo, faça do mau uso da máquina pública prática
costumeira de suas gestões, lesando incessantemente as contas do executivo.

Observe-se, nesse aspecto, que não apenas as acusações que


pesam nas ações penais são de gravidade relevante: as imputações das
ações de improbidade, ainda que de natureza civil, são acompanhadas de
possíveis (e elevados) prejuízos aos cofres públicos.

E é justamente isso que o afastamento busca evitar: comportamentos


incompatíveis com a ordem e a moralidade pública e, sobretudo, lesões ao erário.

II.1. Dos riscos à instrução criminal:

No segundo quadrante, registramos que nos chegou, pelo canal da


Ouvidoria do Ministério Público do Estado de Sergipe, duas manifestações de mu-
nícipes rosarenses dando conta de posturas do denunciado possivelmente atenta-
tórias ao bom andamento da instrução processual.

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Em uma delas, o manifestante alertou-nos para a nomeação de uma
das testemunhas arroladas na denúncia, Adailton dos Santos Andrade, para cargos
em comissão no executivo municipal depois de ter sido exonerado no curso das
apurações investigatórias pelo próprio Prefeito Etelvino Barreto Sobrinho.

Nessa linha, devemos voltar ao depoimento dado na Promotoria de


Justiça (acima reproduzido) pelo próprio Adailton dos Santos Andrade, em que ele
afirmou que fora exonerado do cargo comissionado que ocupava na prefeitura “no
mês de setembro ou outubro de 2018, não se recordando exatamente da data”.

De fato, em pesquisa no Portal da Transparência da Prefeitura de Ro-


sário do Catete (https://www.rosariodocatete.se.gov.br/Site/LinkExterno/39), vimos
que o nome dele não constou nas folhas de pagamento compreendidas entre
setembro de 2018 (mês mais antigo de pesquisa) a dezembro de 2018, voltan-
do a estar em janeiro de 20191.

Não há como não soar estranho que o servidor tenha sido exone-
rado durante o aprofundamento das investigações, e readmitido justamente
após o ajuizamento da ação de improbidade administrativa (protocolada em
15 de janeiro de 2019) que apura os mesmos fatos aqui tratados.

Dentro desse cenário, pois, é possível enxergar sugestões mínimas de


que o movimento do denunciado Etelvino Barreto Sobrinho, quem dispensou e re-
contratou o servidor, represente uma tentativa de, com o cargo remunerado pe-
los cofres públicos, contar com a complacência da testemunha nesta ação pe-
nal e na ação de improbidade administrativa.

1
De janeiro de 2019 a janeiro de 2020, Adailton dos Santos Andrade ocupou o cargo de Diretor de
Promoção Turística CC-02 e, a partir de fevereiro de 2020, passou a ocupar o de Diretor de Arte e
Cultura (cargo que ocupa até hoje).
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Além disso, a outra manifestação que nos chegou pela via oficial da
Ouvidoria (e pelo e-mail da 9a Procuradoria de Justiça) foi escrita por Maura Cecília
Santos e nela a codenunciada informa que vem sofrendo intimidações as quais
atribui à sua conduta de ter significativamente auxiliado na elucidação dos fa-
tos e contrariado os interesses do Prefeito Etelvino Barreto Sobrinho.

Em seu relato, Maura Cecília Santos conta que, em duas ocasiões,


uma camionete preta interpelou pessoas próximas a ela (primeiro uma vizinha e, em
segundo momento, o irmão), perguntando se naquela casa (a residência da denun-
ciada) morava “um pessoal de Rosário” e que, em seu entendimento, esses acon-
tecimentos somente explicam-se por sua contribuição às apurações e à defla-
gração da presente ação penal.

Tamanho o temor sentido por Maura Cecília Santos e sua suspeita do


envolvimento do denunciado Etelvino Barreto Sobrinho que ela registrou boletim
de ocorrência e, ainda, renunciou ao cargo de Conselheira Municipal de Saúde
que ocupava junto à Prefeitura de Rosário do Catete.

Vale lembrar que, quando prestou depoimento de retratação na Pro-


motoria de Carmópolis em 18 de outubro de 2018, Maura Cecília Santos alertou que
“desde a primeira audiência extrajudicial, ‘sua vida profissional tem sido um inferno
(sic), porque tem tido diversas discussões com o Prefeito e com a primeira-
dama” e “que recebeu diversas ligações para conversar com o Prefeito, por-
que supunham que ela viria nesta Promotoria, mas não chegou a informar a nin-
guém que compareceria na presente data.”

Ou seja, o cerco promovido pelo denunciado sobre codenunciada, que


foi, repita-se, peça chave nas apurações, existe há muito tempo e aparentemente
permanece, não sendo estranho imaginar que ele estreite-se com o avançar da
ação penal, deixando-a em perigo e também arriscando a instrução processual.

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Na manifestação enviada à Ouvidoria, a codenunciada implorou


por “garantias de vida” para ela e sua família e, em e-mail encaminhado à 9 a
Procuradoria de Justiça, afirmou que “o único problema que tenho é deste
processo criminal em qiestão (sic), quando se trata de ‘poder’ não se até onde
o ser humano é capaz”.

Adicionalmente, acentue-se que a codenunciada alega ter sido


chantageada, para que aceitasse quinze mil reais menais em troca de seu si-
lêncio sobre os fatos aqui apurados, em reunião em que estavam presentes o
Prefeito Etelvino Barreto Sobrinho, um advogado e outras pessoas.

Avaliando essas circunstâncias, portanto, percebe-se que há suspeitas


de que o denunciado Etelvino Barreto Sobrinho vem intimidando e cooptando pes-
soas, a fim de alterar a verdade dos fatos, sendo conclusão lógica desse raciocí-
nio que poderá investir também contra outras testemunhas, a maioria de ser-
vidores do município.

Em ações penais como a presente, em que os testemunhos são


medulares à reconstituição da verdade dos acontecimento, é relevante ofere-
cer garantias aos depoentes contra quaisquer ameaças à sua integridade e à
sua verdade.

Então, podendo o denunciado, pela força do cargo e pela hierar-


quia que exerce sobre as testemunhas, exigir-lhes algum respaldo espúrio,
apenas o afastamento cautelar conservará a higidez da prova a ser produzida,
resguardando também a integridade das pessoas que já se sentem intimida-
das (a exemplo da codenunciada) e evitando que outras o sejam.

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O que se quer dizer é que a permanência do denunciado no car-
go, pelas projeções aqui formadas, denota provável obstrução à instrução.

Em hipóteses assim, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça


referenda a aplicação de medidas cautelares pessoais contra o gestor público, “esta
Corte Superior já decidiu que se os delitos investigados guardam relação direta com
o exercício do cargo, como na espécie, o afastamento do exercício da atividade pú -
blica constitui medida necessária para evitar a reiteração delitiva, bem como para
impedir eventual óbice à apuração dos fatos.” (STJ, RHC 103.406/PR, Quinta
Turma, Relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Dj-e 30 de agosto de 2019)

III. Dos fundamentos para aplicação de outras cautelares

Pelos mesmos fundamentos expostos acima, notadamente aqueles


declinados no tópico “II.1. Dos riscos à instrução criminal” (além dos referentes ao
“fumus comissi delicti”), os quais deixaremos, por economia, de repetir, é necessária
a aplicação da cautelar prevista no artigo 319, inciso III, do Código de Proces-
so Penal, a fim de proibir o contato do Prefeito Etelvino Barreto Sobrinho com
todos os codenunciados e todas as testemunhas arroladas na denúncia.

A medida deve abranger o distanciamento físico e também a ve-


dação de contato por quaisquer meios de comunicação (promovido por ele
próprio ou por interposta pessoa), sob pena, em caso de descumprimento, de
ser requerida a decretação da prisão preventiva, conforme artigo 282, § 4º, do
Código de Processo Penal.

IV. Conclusão

À vista do exposto, a cautelar de afastamento do cargo é fundamental


para evitar recidiva de ações de péssima de gestão, cíveis e criminais, por parte do

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denunciado Etelvino Barreto Sobrinho, que parece conduzir a máquina pública com
pouca eficiência e mínimo compromisso, gerindo-a como se fosse de sua proprieda-
de particular, e para preservar a instrução criminal, dado que ele, pelo cargo
máximo que ocupa no executivo municipal e pelas atitudes que possivelmente vem
capitaneando, poderá influenciar na produção da prova.

A cautelar de proibição de contato com codenunciados e testemunhas,


por sua vez, reforçará a proteção à instrução e resguardará a integridade de todos.

Portanto, com fundamento no artigo 2 o, inciso II, do Decreto-Lei no


201/1967, reafirmamos o pedido feito na denúncia, a fim de que seja cautelar-
mente afastado o denunciado Etelvino Barreto Sobrinho, Prefeito de Rosário
do Catete, do exercício do cargo que ocupa no executivo municipal, e, na
oportunidade, requeremos a aplicação conjunta da medida cautelar prevista
no artigo 319, inciso III, do Código de Processo Penal.

Nestes termos, pede deferimento.

Aracaju/SE, 29 de maio de 2020.

Luís Cláudio Almeida Santos


Promotor de Justiça convocado em Substituição

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