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As margens do Censo de 2010: expectativas, Tepercussdes, limites c usos dos dados de religiao* Renata pe Castro MENEZES itrodugio: o Censo visto do centro ¢ 0 Censo visto das margens Osdados sobre religidio do Censo de 2010 foram divulgados pelo IBGE, em 29 de junho de 2012 ¢ atingiram uma Tepercussio notavel. Apresenta- dosno mesmo dia nos noticidrios televisivos em hordrio nobre, ocuparam na manha seguinte a capa dos principais jornais nacionais, tornaram-se objeto de destaque nas revistas semanais, motivaram a circulagio de tabe- lise comentarios por correio eletrdnico ¢ em redes sociais. Foram também as com pesquisadores da area de religido, ou da area de indicadores sociais, instados a esmiugar os nuimeros € a apontar suas im- plicagdes, numa multiplicagio de leituras ¢ interpretagdes. Neste v; tema de entrevi sto material, houve destaques quase unanimes ao decrésci- mo absoluto ¢ relativo do ntimero de catélicos no pais; ao crescimento es cL cr ssa-redonda “As religiGes ¢ 0 Censo: analise dos Unt taser deste trabalho foi apresentado na Mesa-redo i oa eae nano Iser, Rio de Janeiro, em 31 de outubro de 2012, ats aos. a Sil- sia Fernandes e Faustino Teixeira, que me acompanaram na mesaye aos dei creas do fem figuras de Chrsina Vital da Cana ¢ Clem Femandes pelo esimuante ambiente ento cade, Aos calegas do Iser-Assessoria, que acolheram ¢ discutiram as primeiras formulag arg agradeso na figura de Solange Rodrigues. Digitalizada com CamScanner om relevancia do segmento pentecostal ¢, dentro deste, 4 . i fgreja Universal do Reino de Deus. Para a 7 d se au ma Seias foram apresentando variagdes em fungac pi as midis em matérias da especializagio ou da idiossincrasia de cada analista convigla. Saeci naneiar, Ou mesmo como fruto do jogo de citings pep 2 campo inlet, no sentido bourdieusiano ae a : oa que, Para ocorrer um pronunciamento relativamente qualifica oe qualificavel ie seio de uma comunidade especializada ¢ autorreferida, é necessirio dialo. gar com os pares sem meramente reproduzi-los, marcando sua diferenca, Como participante desse campo, também entrei no jogo, através de uma entrevista, na qual assinalei as mudangas em continuidade e em descontinuidade com os censos anteriores, mas também identifquei al. gumas permanéncias (MENEZES, 2012)*, Acrescentei “meus” t6picos A discussdo, que eram o da diversidade interna a0 pais, estadual ¢ re. gional, nos percentuais de pertencimento religioso ; oda desacelera- cao do crescimento dos sem-religiio” e o do crescimento diferencial ja no total de membros da quadro mais pera, 1. Refro-me aqui a um tema recorrente na obra de Pierre Bourdieu, que é o da existéncia de regras proprias de fancionamento do campo intelectual, nas quais a distingdo através da singularizagio tem lugar de destaque (cf., p. ex., BOURDIEU, 1968). 2. No grupo das mudancas esperadas, estariam os ja citados decréscimo do catolicismo e erescie ‘mento dos evangélicos pentecostais, movimentos que vém ocorrendo a largos passos desde a década de 1980. Como mudanga surpreendente, o decréscimo de membros da Turd, Enfatizei ainda que as referéncias 4 Assembleia de Deus ¢ & lurd como duas importantes denominagdes evangélicas en. volviam, respectivamente e para além de diferencas teologicas ¢ litrgicas entre ambas, uma igreia de modelo mais congregacional, capilar e deliberativo e uma igreja de modelo hierarquico, cen- tralizado e episcopal, o que nos impediria de tratar os evangélicos, mesmo os pentecostais, num bloco univoco, ¢ nos obrigaria a considerar as diferentes modalidades de agregacao e pertencimento compreendidas por essa identidade religiosa (cf. MENEZES, 2012: 10). 3. Nas diferengas regionais, permaneceriam as tendéncias de um Norte mais evangélico ¢ de um Nordeste ¢ Sul mais catélicos, sendo o Sudeste uma interessante mistura de estados mais e menos catélicos do que a média nacional. Destaquei que é preciso atentar as (grandes) variagies entre os estados (ef. MENEZES, 2012: 10-11). 4. Os sem-religido vinham crescendo, desde a década de 1980, em percentuais considerdveis: eram 0,8%, em 1970, dobrando em 1980 (1,6%), tornando-se trés vezes maiores em 1991 (4,89), n0- vamente quase dobrando em 2000 (7,3%). Em 2010, esse bloco aumentou mais uma vez, chegando 4 taxa de 8,0% da populagio e permanecendo como a terceira categoria no universo relgioso 40 pais (bem acima da quarta colocada, a categoria espirita, com 2,0%). Os sem-religiao demonstta- {arms de forma exemplar, os limites do exercicio de *futurologias” a partir de um censo: nas anlises “ Censo de 2000, houve alguns prognésticos de que eles cresceriam num ritmo igual ao dos pen~ von pt Ou mesmo maior do que o dees, e que este crescimento demonstraria uma mudanga mais Profunda no processo de construgo de identidades ¢ Pertencimentos religiosos no Brasil, hipdtese ‘que agora nao se concretizara, Digitalizada com CamScanner - segmento pentecostal ey, na ser tratado em bloco, sob pena gnalar 08 Tiscos da aPropria qubsidiar interpretacdeg mai: jigiosa do pais: “o Censo é am determinado contexto; ‘ANngélico, ° de si ao, i : desse Sttumento my Profundas sobre uma fotog ele nao po N40 poderia todolégico Para a dinami rafia da autodecla ssibilita qual eels i qualificay _ Angas, mas apenas NOS ajuda a visy i i das transformacées de uma década” (MENEZE 10 Simultaneamente 4 refle: scorer ic da vida re. racdo religiosa a mudanca, ou ae acs rensa), jornalistas, pessoas religiosas com distintos gra vinculagdo Seles funcionarios adeptos £m geral), politicos, enfim, um conjunto multi- facetado que abriu um amplo leque de didlogo em torno dos néimeros, sinalizando uma gran- ntos sobre religido no Brasil, dos quais Sa divulgacao dos resultados’, Neles, a cionado, pessoas e coletivos manifestavam publicamente seu interesse em conhecer, discutir e se apropriar desses dados*. Além disso, articulagGes de religiosos, como os umbandistas, ha- viam se mobilizado antes mesmo do inicio do Censo, a fim de evitar que se reproduzisse aquilo que identificavam como um problema recorrente, que seria sua sub-representaco percentual diante de uma presenca ine- participei nos meses anteriores cada vez que o Censo era men és 3s: palestea Devogio e formas de socia- Filan a ise ce colon, no than te Cnc San a reeds te abeaten a ise es ar oe a ee eo, Hos ds Jancis, Wee od 10 aE Gb 02 201A. content, Aa gee? Ngeze castle ee mitemporéneas, realizada na Universidade Federal do Rio Grande do Nore, sa Brel indir. oosteo de 2010, Além da movimenraglo de uma mcrs organizada cei: Natal, em 19 de owas celigides e 0 Censo: enfoques merodologicos, realizada no Museu Nacional mente sobre oe entre o PPGASIMN e o Iser, no Rio de Janeiro, em 28 de maio de 2012. ‘como uma parce! io do ano e dez meses se passaram entre a aplicagio yra, neste volume, que um P eat Oo Ma NC © a liberagdo das informagées sobre religiio (MAFRA, ao Se, somo aesiomta, houve uma intencionaldade no atraso dos mimeros como estate a eins propos a aunt jevelou-se equivocada, pois a demorae a divulgagio sem a companhia : ida revelou-se & i lee Jones de peso acabaram, a meu ver, por amplificd-os. indica‘ Digitalizada com CamScanner io nacional, num Movimento mug, avoea ¢ difusa no c 7a Pa uivoca ¢ estées étnico-raciais fiz, c Meg q ue os militantes das questées étnico-rac " ef am em Censos Cig ao que os identidade religi a og quanto a raga/cor, para que identidade religiosa fosse deel, te, riores qua Arad, ly ofetiv: + forma mais efetiva, a 7 episddios permitiam entrever a expectativa latente em torn, dos dados de religitio no Censo de 2010, conformando cert con, los da ° — : janto a sua importancia para 0 entendimento no apenas do Uniy, Ns anto 2 sua ‘ ae i ‘the religides, mas para a compreensio de uma dimensio ais amy a reali ci Em que pese minha concordancia pce"? da realidade nacional. Em que p 2 pessoal ssa posigao ~ acredito que o entendimento das dinamicas teligig e 3 50) pais possa ajudar 4 compreensio de fenémenos sociais ¢ cule nee amplos, e vice-versa ~, os vicios de Postura do oficio de ANtropslog, ne levam sempre a procurar desnaturalizar os Consensos. Pois o interesse pelos dados de religlio no Censo no me parecia constants; ag qe trario, ele me parecia crescente’, 0 que me levou a indagar sobre Suas possiveis razdes. a E diante desse quadro que este texto se constréi, propondo uma dis. cussio as margens do Censo de 2010, Ele busca estabelecer uma rela, sobre expectativas e repercussdes, a fim de entender que lugar esses ng. meros podem estar ocupando atualmente na vida nacional, Os nimeros da religiao e as representagoes do Brasil Em um de seus livros, o antropélogo Roberto da Matta, um dos mais renomados do pais, ao falar das coisas que fazem o Brasil ser 0 que cle é dedicou um capitulo aos “caminhos para Deus” (DA MATTA, 1986) Segundo este autor, um dos elementos distintivos da identidade nacional estaria na importancia que os brasileiros atribuem ao “outro mundo”, estabelecendo uma comunicagao direta e pessoal com o sobrenatural, a fim de construir vinculos que garantam prote¢ao para os desafios e agru- ras da vida humana. “Somos um Povo que acredita profundamente num outro mundo”, diz ele (p. 117). ——_—_ 7. No sentido de um maior controle do que poderia ser apenas uma impressio pessoal, foi u™ ct indienne tm trabalho de Emerson Giumbelli, reconhecido pesquisador da teint aie ea » ainda sobre o Censo de 2000: *...| ha indicios que apontam para wm ma de aaa Ctatisticas religiosas. E pode-se encontrar sinais de ‘que esse interesse vern Panhado de uma fein, $0 mem eto de um uso diferente daqueles que predominavam 2! Digitalizada com CamScanner jo aver essa afirmacio, Da Matta Parece q, son deri das represennnn lefinir seu pais através da ie sm 2 Bh NS Gi no Sobrenatural como al; oa ie eos 83” visio de mands ta 80 que fatia parte de "ed bri de lidar com o sagen is 38m uma forma “ a cligiosa constitutiva do jeito de Ss Pécie de forma elemen- Outro antrop6logo, Pierre Sanchis, eee de os anos de 1990°, tem chamado epresentagoes sobre o Brasil. §, We os brasileiros fazem des em . watdlica © @ Soci dade e cultura brasil pistorico de formagao do Pals, cm que a Igreja Catélica teve um papel fundamental, teria marcado indelevelmente as formas de organizacao e de pensamento da vida nacional. No entanto, este autor destaca ainda a mnanipulagao ideolégica dessa construgio: Sabe-se como 0 catolicismo foi identificado juridicamente com a en- tidade Brasil, desde o inicio da colonizacio pelas autoridades polit cas, que necessitavam de um cimento social para o empreendimento colonial. Sabe-se também como, no decorrer dos séculos, elaborou-se do lado da Igreja uma ideologia do Brasil essencialmente e sociogene- ticamente “‘catdlico”, ideologia que assegurava a estrutura eclesidstica um lugar central no mundo da “patria”, permitindo-Ihe eivindicarle- gitimamente um papel correspondente nos meios politicos da “nagio” (SANCHIS, 1997: 29). des do Brasil, ou seja, a associagao a dinamica de transforma- do em questo, 0 que faz como bem ira (SAN- Sao justamente essas representa¢ cultura e catolicismo que td colocan: entre povo, nagao, goes religiosas das ultimas décadas es i i yor alguns, com que o crescimento pentecostal seja tratado Pe igi e a cultura catélico-brasilei formulou Sanchis, como um “repto” 4° aes CHIS, 1994). Vejamos esse process mais detal aes a a capo Os cientistas sociais comegam @ ne ee 0 ae 1970 livid xis nso a religides em anélises amparadas pelo edugio discreta é ta-se uma F (CAMARGO et al., 1973). oe ee “espiritas € protestantes”, No niimero de catdlicos, com 0 ae ee gee como assinalou Procépio Camargo ( a nail “Re aga amen ei tes nas referencias prbliogefcas dest capi Sanchis prese! 8. Refiro-me aqui aos textos de Pierre (SANCHis, 1994, 1997, 2001, 2008)- aad Digitalizada com CamScanner como propuseram Peter Fry e Gary Howe langa religiosa que foi interpretada de |, de refazimento da tessitura de “pentecostais ¢ umbandistas”, (FRY & HOWE, 1975), uma mud: ; até certo ponto funcional, Cs a I sociais em uma sociedade que s¢ urbanizava e modernizava a largos lagos si a A religido, isto é, aos novos pertencimentos religiosos, caberia o aay ae ancias de uma populagao marcada pela transfor. papel de arender as carénci a eoae q ic5es de vida, por um “milagre econdmico” que magio radical das condig6es ) : fine jalizacdo crescente, pelo éxodo rural-urbano, pela mo. gerara uma industrializagio Pe EC eal forma che dernizagao. Para esses autores, 0 catolicismo, tré “ i igiosa da cultura brasileira, estaria sendo trocado por novas formas le perten- cimento religioso, mais adequadas a0 desafio do urbano, da sociedade de classes, da identidade individual no mundo moderno, capazes de refazer grupos e teias de solidariedade em situagoes de anomia e desfiliagao. Nas décadas seguintes, essas chaves de leitura, ou ao menos seus prognésticos, sero colocadas em suspenso, pols, a partir dos anos de 1980, a transformagao acelera-se, complexifica-se e muda de sentido, Avanca a diminuicSo de catélicos, h4 um veloz crescimento do segmento evangélico; mas os espiritas deixam de crescer tanto, € ha uma redugio percentual da umbanda, embora com um pequeno aumento de mem- bros do candomblé. Cresce também, como j4 vimos, o numero dos que se declaram sem religido, a ponto desta categoria se tornar a terceira no universo religioso do pais. E mesmo que em percentuais censitarios pequenos, novas identidades religiosas se fazem presentes no cenario na- cional’, Portanto, se o que estava em jogo era o atendimento de necessi- dades diante de processos de modernizagao, ficou evidente que algumas mudangas religiosas eram privilegiadas em relagdo a outras. Esse é 0 quadro de transformagées entre os anos de 1980 e 2010, que as panora- micas dos censos sucessivos tornaram perceptivel. uma perspectiva 9. Um exemplo dessa dversidade pode ser identifcado com clareza na vigiia intereligiosa qué mmacou a Fz0-92, a coneréncia do meio ambiente da ONU, realizada no Rio de Jancto, Poa reales tt OrganizaGbes Nio Governamentas responsives langaram uma conwocat6ria, que ved (indigent) C adcmbléy Avonde Nenana udatsmo; Espicta; Catolicismo; Santo Daime; Kaio- rand de Lars Umbanda: Hinduise feu 20 Sagrado; Evangéicos; Mugulmanos: rts eden Man Cran Rae es dismoe Theravada; Hare-Keshna; Ireja Messanieg het ae Budibmibeiane, Zep 5 Baha'i, Movimento Sathya Sai Baba; Brahma Kumaris; Gra ide Frate Grande Fraternidade Branca. Todos ess, f Rio de Janeiro, com adeptos brasileitos, wT pes boar seem ads 334 Digitalizada com CamScanner __ © i080 de espelhos que se forma entre a sociedade e Censo, po: rém, tem problemas, pois nem sempre aquilo que se gostaria de ver consegue ser mostrado. O Censo é um instrumento de andlise inca- _ paz de capturar movimentos finos, pois, para gerar visdes em escala nacional, opera a partir de conjuntos amplos, fixos e homogeneos e, Para produzi-los, nivela, simplifica e demarca com nitidez. posigdes _ que, no cotidiano, sio marcadas por com plexidade, variagio ¢ am- aed : ie biguidade’”. A pergunta enunciada por um recenseador, nao admite - _ Sabe-se, no entanto, que no dia a dia as coisas nao se passam exa- _ tamente assim. No universo das religides, sao diversos os graus de en- - volvimento e as formas de participagio possiveis que o Censo nao cap-- processos de iniciagao. Ha os que vao apenas eventualmente a uma_ou - outra ceriménia. E, por fim, hé os que procuram a religiao apenas nos momentos solenes de sua vida pessoal e familiar - nascimentos, casa- © mentos, mortes - ou em momentos de crise - doenca, desemprego etc., = mantendo com o religioso uma relagao de clientela. E 3 Se emaeren eee a ‘a. Bi e ict Anderson, quanto aos recenseadores coloniais, sua *paixio [.-] De ee ae peqtvocs Dal a intolerdncia deles diante de identificagies mél- am ai or uma categorizagio exit ie indstntas ou variveis™ (ANDERSON, 2009: 229), tiplas, politicamente *travestidas’, in« Digitalizada com CamScanner 1a amb 0 temp de aes cOnsequenement, ip, oculta a F a a — rcepgao de circulagdes de pessoas entre re! shen que ocor. possibilta a peteer na década. Mais ainda: o Censo tem dificuldades He at isto 6, de pessoas que lidem simula. imento miiltiplo, ato do pertencime! tiple et na ea ‘com duias ou mais religides. Ou mesmo com aqueles que, sendg neamt deptos de uma religiéo, colocam-se abertos a conhecer outras, seja por a ereidade” (por um desejo de conhecer coisas novas), Seja por “neces. Reiter estar buscando solugao para om fefiens cy ue cons der sua religido ineficaz), seja por julgar que “todas ela ee = ah que por isso é possivel combind-las. E ainda com aq que rea zam uma combinagio singular de crengas ¢ praticas de varies matrizes reli sas, constituindo, numa espécie de “bricolagem , “sua propria” religiio, Enfim, o Censo nao tem como classificar aqueles que definem suas ‘ icas, reflexivas como sendo uma filosofia, uma praticas espirituais, mistis am fé, uma explicagao, uma cosmologia, ¢ nao uma religido. A estes, e aos demais casos ambiguos acima citados, caber4, ao responder 0 questio- nirio, reduzir sua experiéncia a uma das possiveis categorias religiosas existentes", sob pena de acabar agrupado em “outros”, “indetermina- dos”, ou a se incluir nas rubricas sem religido, ou “sem declaragao”. As diversas formas de relacionamento com a religido que acabamos de citar, baseadas em Brandao (1993), esto, todas elas, presentes no cotidiano Brasil atual, mas nao aparecem no Censo. Elas se tornam perceptiveis apenas ao olharmos para as religides mais de perto, em pesquisas quali- tativas, pelo angulo da relacdo individuo-religiao. Também nfo aparecem no Censo as relagSes que as religides ou igre- jas estabelecem entre si, pois estas nao sao suas unidades de andlise. Sa- bemos que, entre elas, ha aquelas abertas 4 conquista de mais adeptos, numa dinamica concorrencial que envolve aperfeigoamento de técnicas proselitistas; enquanto que hd outras cuja doutrina defende o fechamen- to exclusivo a uma etnia, a um povo eleito. E ha os segregacionismos, os fundamentalismos, 0 fechamento dos que consideram a sua religiao como a forma exclusiva de chegar a Deus, de pessoas que tentam criar um mundo apartado, tratando os adeptos das outras religides com reservas, 336 Digitalizada com CamScanner com dese ov at6 mesg © com yj, Ntes, oy i: o erescimento de “baggy XEIRA & MENEZES, 9, A incapacidade qo errados, OU ignor, Wend 8s Dor ¢ lem Considers ; 'Oniados, ye siderae lade de 0 ¢ discutida, no sentido de py guns, © problema ¢ abe mente no questiong domicilio, alias. We é aplicade se 80, hé sugestdes ssem a the confey ios vi sua aplicacio 3 lios visitados. Outras criticas téeni aplicagio totalidade dos domie tio comple ai pleto, Quanto ais da pergunta em outras que ajud: 7 ajuda: também, demandas ae esta contida so- ‘ctivamente, ¢ ndo em Para o desdobramento todos os. isto 6, as palaveas que i : Fao fato de os descritores, serem pouco precisos. maior rigor e transparéncia da parceria c anieAceo na que estabeleceu com uma organizagio nao govern Iresdionaliberde' i campo dos estudos da religido, o Instituto de Estudos da Religido (Iser), para auxilio no tabelamento dos dados; pareceria que, apesar de envolver uma assimetria consideravel, renova-se ha trés censos (cf. MAFRA, 2004). Outro exemplo da sensibilidade do érgio piiblico a demandas de melhoria da qualidade dos dados esta na apresentagio, neste Censo, do bloco dos 0 com matizes internos, isto é subdivido nas categorias sem re- sem-religi ligido, “ateus” e “agndsticos”; ena abertura A possibilidade de registro de duplo pertencimento. Tratava-se de antigas demandas dos pesquisadores através do Censo, os movimentos de transito e 0 “ca- para tentar identifica, eens ee al, que i mencionamos”. rater miltiplo” do pertencimento religioso nacion: S22. i rio: o basico, 1 12. 0 IBGE aplica dois tips de questiondro: 0 Dé E o completo aparece uma amostra de 11% deles. no completo aparece & ateus € agndsticoS ‘ io pantedo, compan seu proprio Pal a elas que compet, eraa-se de uma rntativa cevidenciat eniciment0, > ligose, ou 8 ea plilimo” religion, nacional’ @ (9 m exemplo dessa posiao a maioria dos domictos,€ o completo, 2 questio sobre religiio. parcels de pessoas em rst em espiritualidades 13, Acredita-se que n0s 8 rojas, & aa entre religides ou entre c » duplo ou triplo per a cara inais pessoais. Quanto 2¢ : fr aguilo que a maioria acredita ser unm capacidade de identificar-se cO™ varia cm Fernandes, 1988. stica multancamente- Digitalizada com CamScanner im, Ou, A MeNds, No da nao funcion n “oy IBGE sempre € possivel jogar com fo que o Censo perde em sutilezas ganha em amplitude, ee Feita kevando em consideragao as séries idler possibilidades de comparaco com Curiosamente, duas tentativas que Ja, De qualquer form Goes ¢ qualquer mudanga tem que histéricas, sob pena de, ao inovar, Pel as categorias do passado". . : ‘ s criticas a incapacidade de captura do Censo nao focalizam s sim os entrevistados. O baixo per- ‘as, COMO umbanda e candomblé, ou Jo um problema de recusa de declara- provocando distorgées. Outr: propriamente o instrumento, contual de religides afro-brasile siderad ento religioso, ‘a um historico de perseguic6es e pre- conceitos sofridos pelos adeptos dessas crengas e praticas num pafs em religido oficial do Estado, ¢ que, mesmo depois do advento republicano, teve dificuldade em acolher praticas de matriz africana como verdadciras religioe Mas, por outro lado, & preciso indagar se os recenseadores (bem como os pesquisadores e ) estio tratando como religiao aquilo que, do be outros qualificativos. Ou se a questao um pluralismo identitario mais amplo e [quer demarcagao exclusivista carecer spiritas, é cor cio do “verdadeiro” pertencim Essas recusas estariam associadas que até 1889 0 catolicismo era alguns agentes religiosos ponto de vista “nativo”, rece ssica do sincretismo envolve c mais simbiético, a ponto de qua de significado. Concordando grandemente com as criticas ¢ os esforgos para melho- rar a qualidade dos nimeros do Censo, gostaria, no entanto, de trazer Jio alguns elementos que nos permitam pensar nas dimens6es a discu politicas da contagem das religides pelo Estado. Censo: descrigao e prescrigao Um censo parece um inofensivo e neutro instrumento de contagem: uma apresentagio numérica da populagao e/ou da riqueza e dos recursos de determinada Area, pais ou regido, dentro de certas categorias, para a produgio de conhecimento, com suporte da ciéncia estatistica. Nimeros 14, Embora Cindido Procépio Camargo tenha relativizado o alcance das séries histéricas, a0 aS° sinalar uma grande variagio, até 0 Censo de 1980, nas classificagdes das religides existentes "° pais. Afirma este autor que “os resultados de varios censos, na realidade, menos representa @ idenciam a hegemonia do catolicismo” (CAMARGO. osa da populagio, como & Digitalizada com CamScanner ye parecem falar Por si mesmo, ita dimensGes mais complexa; on istoricamente, tanto o Ce, confere Suporte surgiram no ¢, cionais Modernos, servindg di No entanto, s. » Sua apz i Ua aparente objetividade TSO como cién Ontexto © alicerce 4 fados Na - a sua co; e gatado-nacio se consolidasse erg Necessatia umes tstO: Para que 9 pierarquizada, de sua popula me s Visio ¢ : S40 © seus dominios ents «0,40 enguadré-los em categen » Cuja leitura © Cen. Olas pred, ; : 7ER & AREL, 2008, ANDERSON, Zoos inadas, Permitiu (KERT- > uma contagem altar conta aquilo que considera importante, caracreristicas das pessoas, certos paps sociais e cers, modalidades de sstegacio, enfatizando outros. Nada é “Sbyio” ness fern de apre- smnagio do povo de um pais: analisando o papel do Censn na telagdo

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