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Origens da radiodifusão local portuguesa.

Discurso e práticas das primeiras


experiências (1977-1984)

LUÍS BONIXE
IPP – ICNOVA
LUIS.BONIXE@GMAIL.COM
O contexto

 Político – Portugal saído de um


período de ditadura
 “Duopólio” no setor da rádio
(RDP e Renascença e pequenas
emissoras locais).
 Experiências europeias (rádios
Rádio Alice. Bolonha. 1975-1977
livres com expressão em Itália,
França, norte da Europa)
As primeiras experiências

 Rádio Juventude (1977-1981). Emissão Grande Lisboa.


 Rádio Imprevisto (1979-1981). Emissão era captada nos concelhos de Amadora, Queluz, Barreiro, Almada, Trafaria, Loures
e Amadora
 Emissoras Associadas (Rádio Imprevisto e Rádio Juventude - 1982)
 Rádios vãos de escada- O jornal “O Ponto” (29/01/1981) faz referência a um diálogo curioso que inadvertidamente saiu pelo
microfone. “ – Vai apagar o lume. – Agora não posso, estou no ar”.
 Durante este período registaram-se rádios piratas no Algarve, grande Porto, Grande Lisboa, Beiras, zona centro (Tomar,
Abrantes), etc

 TSF (1981) – Projeto diferente dos restantes. Cooperativa formada por profissionais, alguns deles já com carreira
construída na rádio e no jornalismo em Portugal.
Surgiu em 1981 apenas na forma de Cooperativa: “Não queríamos emitir sem estarmos licenciados, mas percebemos que se
não fizéssemos alguma coisa podíamos ser ultrapassados” (Emídio Rangel, Público, 1 março de 1998).
Mesmo sem emitir de forma frequente, a TSF teve um papel importante neste período liderando algumas ações de contestação
à lei que não previa a legalização das rádios piratas.
Emissões irregulares (Diário Popular, 19 março 1984)
O movimento

 Apoio autárquico – Entrevistas a presidentes de câmara (Rádio Imprevisto, Rádio Juventude, Rádio Top Rádio
Livre, Rádio Hertz). Programas camarários (Rádio Popular de Gaia).

 O então secretário-Estado das Comunicações, Raúl Junqueiro, admite pela primeira vez haver a funcionar em
Portugal “com mais ou menos regularidade 19 estações de rádio das quais 14 foram observadas pela primeira vez
em 1984”. (Diário de Lisboa, 25 de Outubro de 1984.) Em fevereiro desse mesmo ano, o secretário de estado
referiu que existiam 360 pedidos de licenciamento (Notícias da Tarde, 19 fevereiro 1984)

 I Encontro Nacional de rádios livres, a 18 de Junho de 1983, em Vila Nova de Gaia. Aí foi criada uma
Comissão Coordenadora Nacional das Rádios Livres, destinada a encabeçar a luta pela legalização.

 Encontros de Abrantes
“Fizeram-se aqui, pelo menos, três encontros à escala nacional de todas as rádios do país. Os encontros de
Abrantes ganharam muito protagonismo, não havia rádio que não passasse por aqui, chegámos a trazer cá
deputados” (António Colaço, um dos organizadores dos encontros, Jornal Público, 24/12/1998)
A “ideologia” das rádios locais

 Dar voz às populações locais


O principal objetivo das rádios piratas portuguesas era o de permitir que as vivências das comunidades locais fossem
representadas no espaço mediático. Alegavam que os grandes meios de comunicação em Portugal não o faziam.
 Fugir aos padrões uniformizadores de “fazer rádio”
A irreverência, o quebrar com o discurso vigente são algumas das características que motivaram o aparecimento das rádios
locais em Portugal. É curioso notar as designações que as emissoras piratas assumiram na altura e que ilustra precisamente
o objetivo de “agitar as águas”. Rádio Delírio, Rádio Caos, Rádio Livre, Rádio Porta Aberta, entre outras.
 Atingir novos públicos
Procuravam sobretudo um público jovem. Muitas rádios optaram na altura por emitir música rock e considerada
alternativa. Os então chamados Lado B dos discos.
 Desafiar o poder
- Emissão conjunta das rádios-piratas de Lisboa entre 15 de abril e 15 de maio de 1984. A ideia era mostrar ao poder político
que legalizar as rádios locais “não só era justo como imperativo” (Diário Popular, 19 de março de 1984)
- Contestação à Rádio das Forças Armadas norte-americanas, em Oeiras. Ao mesmo tempo que o Governo resistia à
legalização das rádios-piratas, aprovava o funcionamento de uma rádio que pretendia atingir apenas 200 pessoas (os
militares), mas que era acusada de chegar à população.
A exigência de uma nova lei da rádio

-Projeto Lei de Dinis Alves e Jaime Ramos


(1983)

- Os ouvintes passariam a dispor de “um poder mais


alargado de escolha de programas mais variados e
mais ajustados à especificidade das diversas regiões
do país”
-relevo dado ao noticiário local, cujo tempo nunca
deveria ser inferior ao destinado às informações de
âmbito nacional e internacional (artº 23).
- as emissoras locais deveriam possuir uma
programação própria e que não deveria ser inferior a
50 por cento da totalidade da emissão (artº 19).

(JN, 29 dezembro de 1983)


O projeto lei de Dinis Alves e Jaime Ramos (1983)
 O artigo 10º impunha ainda que a programação
semanal não poderia ser inferior a 21 horas de
emissão, algo que obrigaria a uma profunda
remodelação das rádios piratas existentes na altura

 autarquias poderem “contribuir directa ou


indirectamente para a cobertura dos encargos de
criação e funcionamento dos serviços de radiodifusão
local da área respectiva desde que o total dessas
contribuições não exceda um quarto dos encargos”
(artº 37)

 proibia a intransmissibilidade das licenças (artº


33 ), prevendo a sua cessação sempre que se verifique a
tentativa de monopólio de duas ou mais estações e o - DN,19 de março, 1984
desvirtuamento da titularidade das licenças. - Notícias da Tarde, 10 janeiro de 1984
Considerações finais

 O período 1977-1984 marcou o arranque do fenómeno das rádios locais em


Portugal.
 Caracterizou-se pela afirmação de um discurso de rutura com o setor dos
média de então, defendendo a liberalização do audiovisual português,
começando pela rádio.
 Com exceção de alguns projetos mais sólidos, neste período, a maior parte
das rádios-piratas que surgiram tiveram vida muito curta. Serviram para
marcar uma posição e pressionar os governos para a necessidade de alterar a
lei.
 Abriu caminho para o surgimento de rádios mais consistentes, sobretudo a
partir de 1986 e para um debate público (e político) que ganhou consistência
na segunda metade da década de 80. A lei que liberalizou o setor da rádio em
Portugal acabaria por ser aprovada em 1988.
Obrigado !
luis.bonixe@gmail.com

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