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Amarras Da Paixão - Amante Secreta
Amarras Da Paixão - Amante Secreta
DA
PAIXÃO
Amante Secreta
Rummer
FICHA TÉCNICA – 1 EDIÇÃO- BRASIL- 2019
Todos os direitos reservados à autora Rummer.
Copyright ©2019
Grafia atualizada segundo o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa
de 1990, em vigor no Brasil em 2009.
Autora Rummer
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução em todo ou parte
em quaisquer meios sem autorização prévia.
Título: AMARRAS DA PAIXÃO
Subtítulo: Amante Secreta
Proibidos a reprodução, o armazenamento ou a transmissão, no todo
ou em parte.
Todos os personagens desta obra são fictícios.
Registro de marca e propriedade intelectual
Plágio é crime! Lei 9.610 Pena de três anos a um ano ou multa.
Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas é mera
coincidência.
Agradecimentos:
Eu agradeço muito aos meus amigos e meus leitores, que sempre me
apoiam nesta jornada. Principalmente as meninas do wattpad. Conheço cada
uma de vocês que acompanham meu trabalho.
Sinopse
― Regina Souza
Capítulo 1- Ester Marshal.
—Você está dizendo que está aqui porque o destino nos pregou uma
peça?
—Exatamente.
Seus olhos se demoram nos meus e ele sorri para mim de um jeito
jocoso que me arrepia o meu corpo inteiro. Ele meneia a cabeça.
—O senhor não acredita?
Ele me encara.
—Por que saiu do hotel? Não vai me dizer que te mandaram embora
por minha causa?
Eu aceno um não e ergo meu queixo.
—Não, eu pedi a conta. Estava enfrentando alguns problemas pessoais.
Seus olhos negros me avaliam, desconfiados.
—Sei, problemas...E agora não está?
—Não!
—Hum, interessante —ele diz como se ainda não acreditasse.
—Pelo visto sua perna sarou. —Digo mudando de assunto.
—Sim, demorou um pouco por causa do esbarrão — ele diz,
parecendo querer me lembrar daquele dia.
—Bem, bom apetite.
Eu giro meu corpo para sair.
—À propósito, eu não mordo, relaxe, não precisa me tratar como se
fosse uma gueixa. Tão...tão serviçal. Não cabe mais a nós esse tratamento,
não é Ester?
Me dá um branco. Não sei o que dizer a respeito disso, apenas aceno
um sim para ele. Murat me dá um novo sorriso, estremeço inteirinha e me
perco dentro de seus olhos negros. Sinto como se minha mente tivesse sido
roubada e eu perdesse a capacidade de reagir ou de pensar. Não sei quanto
tempo se passou entre nós até que ouço Murat dizer:
—Pode ir.
Pisco caindo na realidade, aceno com a cabeça e saio de sua presença.
Mas a imagem dele fica piscando no meu cérebro e fico revoltada comigo
mesma por ele mexer tanto comigo.
Calma! Isso passará é só você se acostumar com esse deus grego, ou
melhor, turco. Logo você o olhará como se ele fosse um homem comum.
Entro na cozinha, Norma me aponta as panelas.
—Bem, vou me recolher. A limpeza das panelas e pratos são por sua
conta. Daqui a pouco vai até a sala de jantar para verificar se ele terminou e
serve a sobremesa. E boa sorte. Espero que Murat goste.
Deus! Ainda tem a sobremesa.
Assinto para ela e vou em direção as panelas e as começo lavar. O
tempo passa. Escuto atrás de mim uma limpada de garganta.
Deus! A sobremesa!
Eu giro meu corpo e dou com Murat na cozinha. Ele está encostado no
arco da entrada da cozinha, com o braço cruzado e as pernas cruzadas.
—E Norma?
—Ela...já se recolheu.
Ele se ergue e vem na minha direção. Meu corpo se arrepia inteirinho
com a sua figura imponente na cozinha.
—Ela te falou que sou o formigão dessa casa? Que adoro um doce?
Eu aperto meus lábios para não rir, mas não consigo e lhe dou um
sorriso nervoso.
—Não, não senhor. Perdoe-me, eu me perdi no tempo lavando essas
panelas. Vá até a sala de jantar e eu sirvo a sobremesa para o Senhor.
Seu olhar se intensifica no meu rosto e ele sorri para mim e sem tirar
os olhos dos meus arrasta uma cadeira e se senta em frente a grande mesa da
cozinha, como se quisesse sentir minha reação ante a isso.
—Pode servir aqui mesmo. —Ele diz com um sorriso estranho, como
se tivesse algo por trás de seu sorriso.
—Aqui? —Por um momento me sinto atordoada e desconfortável com
ele se sentando no meio da cozinha e me olhando.
Murat abre mais o sorriso.
—Aqui. Por que não? Tem medo de mim, Ester?
—Medo? Não, senhor.
—Sem esse senhor, por favor. Só Murat. Todos aqui me chamam pelo
nome. E não cabe mais a nós esse tratamento depois de tudo que vivemos.
Parece que adora ser lembrada disso.
Deus! Que odioso!
—Sim, senhor. Quer dizer não senhor! Murat.
Ele se recosta na cadeira rindo de me ver tão atrapalhada. Ele me olha
mais à vontade do que nunca, me avaliando com um sorrisinho de canto no
rosto.
Deus! Desvio meus olhos dos dele e vou até a geladeira e retiro o
pequeno pudim, que era para ser um manjar branco se houvesse ameixa com
calda. Coloco em frente a ele. Murat passa os olhos pela sobremesa e dá um
sorriso.
—Foi você que fez?
—Sim, eu mesma.
—Como se chama? —Ele pergunta, seus olhos fixos nos meus.
—Manjar branco. Ele deveria ser servido com ameixa, mas Norma me
disse que o senhor não gosta.
—Uma colher por favor?
—Ah, claro!
Vou até a gaveta e pego uma colher de sobremesa e lhe entrego.
Nossos dedos se tocam e eu me arrepio inteirinha.
Eu me afasto dele. Minha vontade é ver sua reação ao comer o manjar,
mas eu saio da cozinha e vou para a sala de jantar retirar a mesa. Tremendo
retiro a porcelana da mesa e entro na cozinha. Murat já está no final da
sobremesa. Eu coloco a porcelana na pia e me viro para ele, quando ele
finaliza, não resisto e pergunto:
—E então? Gostou?
Ele ri e afasta o pratinho com apenas a calda que ficou.
—Sinceramente? Não sei por que o nome manjar? Manjar me lembra
nome de algo muito bom, algo que se serve a um rei, a príncipes. E essa
sobremesa parece uma papa dura de coco.
Eu não consigo deixar de rir, achando graça em suas palavras. Murat
me olha de um jeito estranho bem atento ao meu rosto.
—Ah e se gostasse de ameixa, teria gostado do pudim. Eu soube disso
só depois que tinha feito a sobremesa. Então, realmente, ele por si só não é
uma sobremesa que conquista. Mas sim a união dos sabores, pudim, a calda e
a ameixa.
—Bem, Ester, se queria me impressionar, falhou! É isso. Da próxima
vez, siga as receitas que Norma te passa. Não precisa me conquistar pelo
estômago. Eu sou conquistado pelo carácter, por outros atributos mais nobres.
Impressioná-lo! Essa é boa! Que cara ridículo!
—Não fiz para te conquistar, mas deixa para lá, não vai acreditar
mesmo. —Digo de um jeito seco, pois não gosto do olhar estranho que ele
está me dando. A intensidade nos seus olhos é grau mil. Ele me observa
demoradamente.
—Hum, deve ser isso então. Mesmo assim, siga as receitas de Norma.
Entendeu? —Ele diz de um jeito prepotente. — Ela sabe tudo que eu gosto.
—Sim—Digo, bem séria.
Ele se levanta se agigantando na cozinha e eu tenho que erguer meu
rosto para olhá-lo nos olhos. Ele dá um passo na minha direção e eu gelo. Ele
é incrivelmente bonito e a maneira em que ele se comporta sugere que ele
sabe disso muito bem.
—Por que deixou o hotel?
—Eu...estava para sair.
—Sabia que te procurei depois?
—Verdade? —Pergunto séria, mas ofegante.
—Você é muito bonita. Ester, embora esteja muito magra. Ao invés de
correr atrás de um homem rico, deveria ter tentado a carreira de modelo.
Teria se saído muito melhor.
—Sou muito baixinha. —Digo secamente, não gostando desse papo.
Espera aí! Ele disse de eu estar atrás de homem rico?
Eu o encaro severamente.
—Eu não estou procurando homem rico nenhum.
Ele me corta:
—Sabe, Ester. Não digo passarela, mas seu rosto é lindo. Seria bem
aproveitado em comercial de maquiagem, tinta de cabelos...
Eu ando para trás quando ele ergue a mão para tocar a minha cabeça.
—Permita-me? —Ele pergunta com a mão no ar.
Eu assinto, quieta, imóvel enquanto ele se aproxima mais e retira o
meu chapéu de chef e meus cabelos avermelhados caem como cascata nos
meus ombros. E ele fica emudecido, olhando para eles.
— Por que fez isso? —Pergunto.
Seus olhos passam por meus cabelos como que fascinados.
— Naquele dia esqueci de perguntar. São naturais?
Eu dou um passo para longe dele.
—Sim, são. Agora se me der licença, vou cuidar da cozinha.
Pego a touca que ele depositou na mesa e depois de colocar os cabelos
para cima a enfio na cabeça.
— O que está fazendo aqui Ester? Por que está tão nervosa? Está
difícil lidar com seu desmascaramento? Achou que eu ia cair nessa de
destino? — Ele se aproxima de mim com um sorriso predador.
Eu dou um passo para trás.
—Como? —questiono.
Ele sorri com prazer, como se estivesse se divertindo comigo. Isso me
enche de ira. Dou mais um passo para longe dele, mas tropeço na cadeira que
Murat tinha afastado para se levantar. Ela se vira e eu quase caio se ele não
me tivesse amparado bem na hora. Sinto o choque do meu rosto no peito
dele, que se aquece quando sinto o seu perfume masculino, maravilhoso que
emana de suas roupas de sua pele. Meus cabelos cobrem parte do meu rosto,
isso significa que o chapéu que eu estava usando saiu da minha cabeça.
Posso sentir a respiração ofegante de Murat se unindo a minha. Ele me
cerca com seus braços.
Deus! O que ele está fazendo?
Eu ergo meu rosto e dou com seu olhar muito sério no meu.
—Então Ester? Essa sua quase queda para me fazer ampará-la nos
braços e você se fazer de coitadinha, como fez no dia do hotel? Você aqui,
assim... Tudo destino?
—Solte-me, não é nada disso que está pensando.
Ele ri.
—Não? Não vai me dizer que seu desejo não é me enfeitiçar? Vai
tentar me convencer que tudo é uma coincidência mesmo? Tudo tão
conveniente para você...
Deus! Que cara arrogante.
—Claro que é uma coincidência. O senhor não me disse seu nome
completo no hotel e vim para trabalhar para a família Çelik, nunca que
imaginei que fosse a do senhor.
Ele ri.
—Você era da recepção Ester. Não checou meu nome completo?
Quem era o homem que estava hospedado naquele quarto?
—Deus! Você está me deixando nervosa. Melhor o senhor ir. O que
ainda quer aqui?
Ele sorri.
—O que acha que eu quero?
—Infernizar-me talvez, não...sei.
—Não sabe mesmo? Uma coisa é certa, não estou aqui porque gosto
de comer na cozinha.
Eu quase morro com suas palavras. Ele me puxa mais para ele e eu
sinto seu membro tocando minha barriga enorme, grosso. Eu fico molhada só
com o contato, isso porque sou totalmente inexperiente nesses assuntos,
tenho vinte anos e nunca namorei firme com ninguém. Minha vida foi um
caos tão grande que nunca tive tempo para pensar em namorado.
—Olha aqui! —Digo irada por ele pensar que eu sou fácil. Com um
resquício de razão que eu encontro, eu o empurro. —Não sou essas
empregadinhas que você come de sobremesa.
Estou ofegante, as pernas bambas. Seu cheiro maravilhoso ainda no
meu nariz. Ele inclina a cabeça para o lado e me dá um sorrisinho.
—Teria fundamento seu posicionamento caso não nos conhecêssemos
tão intimamente.
A pele do meu rosto queima, não só ela, meu corpo inteiro é
consumido por uma subida onda de calor. Cautela! Esse homem é um rolo
compressor, se você der brecha ele vai te usar, e depois passar por cima de
você como se você não fosse nada. Precisa lutar, enfrentá-lo...essa é sua única
alternativa. Só dessa maneira você vencerá essa atração.
—Murat! Por favor, me deixa em paz. Eu não quero te conquistar se é
isso que pensou. Farei meu trabalho bem feito e não falarei para ninguém
sobre aquele dia, caso seja essa a sua preocupação. —Digo alisando meu
avental com um gesto nervoso.
Ele continua a me olhar sem pressa de sair. Seus olhos passam por
meu corpo e depois voltam para o meu rosto.
—Você emagreceu. Você era mais cheinha quando nos conhecemos.
—Então ele aperta os lábios. —Humm. Lembro-me muito bem de seu corpo.
Perfeita. O que houve com você? Faz parte de seu jogo de conquista?
Deus! As mulheres devem perder a noção do ridículo para chamar
atenção dele, então ele está achando que estou fazendo o mesmo. Não tem
outra explicação.
—Senhor Çelik não me interessa sua opinião. E o que aconteceu
comigo é problema meu!
Ele ri e passa os olhos por mim novamente.
—Gostei de rever você Ester! Eu me divertir muito hoje. É gostoso
essa sensação que você me fez experimentar. Só lamento uma coisa. Pensei
que eu tinha tido a arte de te conquistar e não ser conquistado. Hoje vejo que
não foi bem assim. Tudo muito bem planejado. Bem, eu estava enfurnado até
agora numa reunião e você deu cor ao meu dia cinza com sua aparição por
isso vou te dar um descanso, por enquanto.
Ele sai assobiando da cozinha.
Inspire, expire, inspire, expire....
Se acalme. Tudo ficará bem...
Esse homem deve ter um histórico ruim com as mulheres então é
natural ele pensar isso de você. Até eu achei incrível a coincidência. Se eu
ficar na minha tudo ficará bem. É só ignorá-lo e ser forte e não bancar aquela
idiota carente.
Forçando-me a pensar dessa maneira volto as minhas atividades e vou
até a sala de jantar e depois de algumas viagens retiro tudo da mesa. Lavo
toda a louça suja e finalmente vou para o meu quarto. O quarto tem um
tamanho bom, a cama de solteiro fica no meio dele e o edredom marrom
combinando com a cortina creme com detalhes em marrom o deixa
acolhedor. Há uma televisão de tamanho médio em frente a cama. Um rádio
no criado mudo do lado direito dela.
O que eu gostei mais que ele tem um banheiro só pra mim. Mas antes
de tomar banho desfaço minhas malas e guardo tudo no guarda-roupa de duas
portas, roupas que não irei usar tão cedo, só quando eu tiver folga.
Mas sair? Para onde vou?
Nessa cidade não conheço ninguém.
Depois do banho e vestida com minha camisola branca de cetim, eu
me deito na cama.
Deus! Só uma mulher sem noção do perigo pode confiar o coração aos
cuidados de um homem como Murat. No mínimo ele deve trocar de mulher
como troca de roupa. Fecho os olhos tentando dormir, mas me sinto muito
agitada para isso. Uma espécie de instinto me prevenira sobre esse homem
ser perigoso, mas ele é muito mais do que eu pensei. Ele não é um cordeiro
com um lobo enrustido, ele é o próprio lobo e não faz questão nenhuma de
esconder isso.
Sem sono me levanto da cama. Pego um robe branco e felpudo que
achei no banheiro e saio do meu quarto, faço o caminho até a cozinha e vou
em direção ao jardim que fica nos fundos.
A noite está gostosa, o céu negro estrelado. No caminho formado por
paralelepípedos há um banco iluminado cercado pelo jardim feito por algum
paisagista famoso. As plantas são equilibradas, combinam em formatos
tamanhos e cores. Além de estarem espalhadas estrategicamente, sem deixar
aquela sensação de desordem.
Sento-me no banco e respiro o ar fresco, como quem não quer nada,
giro minha cabeça para ver todo o lugar. Engulo em seco quando vejo Murat
saindo da piscina que fica há apenas dez metros de distância. Ele está só de
sunga azul-marinho com detalhes em branco nas laterais, a água escorre por
seu corpo enquanto ele pega a toalha para se enxugar. Seu corpo é pura
perfeição. Suas pernas são musculosas, os ombros largos, a barriga cheia de
ondas firmes formada por músculos bem definidos. Lindo é pouco para
descrevê-lo.
Ele passa a toalha nos cabelos e então seu olhar, sem querer, se choca
com o meu. Ele estaca surpreso, quando ele sorri de um jeito lascivo e me dá
uma piscadela sexy eu engulo em seco.
Mesmo a essa distância, acho que ele viu meu rosto como ficou
vermelho. Agora ele ri mais, parece se divertir comigo, enquanto eu estou
aqui morta de vergonha por ter sido flagrada olhando para ele.
Engulo em seco novamente e giro minha cabeça, mas contínuo sentada
ali, sem olhar em sua direção para que Murat não pense que ele consegue me
desestabilizar ao ponto de eu fugir com o rabinho entre as pernas. Embora ele
tenha esse efeito sobre mim, ele não pode saber disso. Seria o meu fim.
Depois de um tempo giro minha cabeça e não o vejo mais lá. Solto o ar
aliviada e só então penso em voltar para o meu quarto.
Murat surge, então, na minha frente, saindo dos arbustos.
—Gostou do que viu, cabelos de fogo?
O homem na minha frente é pura perfeição, e sua voz um convite para
o inferno.
Deus! Acho que já estou nele.
Seu porte dominante é tão patente que me sinto pequena ao lado dele.
Sinto um formigamento que começa na minha espinha e corre para a minha
nuca.
Sem conversas!
Eu me levanto do banco como se eu tivesse levado um choque na
bunda e com passadas largas tento me esquivar dele. A mão gelada segura
um de meus braços e ele me puxa de encontro ao corpo dele.
Ele olha para mim profundamente, me estudando, lendo, analisando.
Eu não consigo me mover, fico estacada, ofegante olhando para ele, mas
quando seu olhar desce para os meus lábios uma alerta toca na minha cabeça
com sinal de perigo. Antes que eu puxe meu braço sua boca se choca com a
minha e ele me abraça enquanto sua língua força a minha boca se abrir,
quando eu faço isso ele me dá um beijo urgente, necessitado. Pior que esse
arrogante beija bem!
Seus lábios chupam os meus, sua língua envolve a minha com prazer,
suas mãos me tocam, me apertam como se eu fosse dele.
Deus! O que eu estou fazendo?
Eu comecei a empurrá-lo com força até ele desprender seus lábios dos
meus e me soltar.
Eu o encaro ofegante e passo o braço nos meus lábios inchados
demonstrando meu desagrado.
Ele ri com gosto. Parece um louco.
Com muita raiva me afasto dele ainda escutando o eco de sua risada na
minha cabeça.
Capítulo 6- Dia seguinte
Sete horas estou em pé. Não perguntei o horário que iniciarei meu
trabalho na cozinha, mas acredito que cedo, por isso me levantei a essa hora.
—Bom dia, levantou-se cedo. —Norma diz com um sorriso tomando o
café tranquilamente.
Eu sorrio para ela.
—Eu esqueci de perguntar a hora que começo na cozinha.
—Murat costuma tomar café lá pelas nove horas. Então, oito horas
você se levantando está bom. Ele não costuma comer muito no café da
manhã. Você verá que com Murat é tranquilo, ele almoça bem, mas
dificilmente aqui, ele faz suas refeições em restaurantes. Só no final de
semana mesmo, e às vezes nem isso. Já seus pais que, aliás, chegarão hoje,
são idosos, então não tem hora para acordar. Você então os servirá quando
eles estiverem à mesa.
—Está certo.
—Agora tome seu café tranquilamente.
Tranquilidade é algo que desconheço. Primeiro com a minha família
monstro. Meu pai era um infeliz, um homem que vivia com um copo de
bebida na mão. Sempre caído no sofá melancólico e por aí vai...
Sou de uma família abastada financeiramente, quando meu pai morreu
não recebemos nossa parte na herança, pois na verdade o que tínhamos de
valor mesmo é o casarão West e que ficou em poder da minha mãe. Com a
morte dele, ela trouxe seu amante para dentro de casa, eu tinha dez anos na
época. Com uma aposentadoria gorda de meu pai ela tem vivido.
Então eu o conheci meu padrasto de perto, bem de perto. Com uma
mão na minha boca para eu não gritar, ele...
Bem... não quero me lembrar disso e mesmo porque isso ocorreu
apenas uma vez, no outro dia eu o esperava com uma faca quando me ele fez
uma nova visita.
Então eu o ameacei, disse claramente que ia contar para todo mundo
caso ele tentasse algo comigo novamente. Que eu ia fazer um escândalo.
Acuado, ele nunca mais me pegou desprevenida. A porta do meu quarto
estava sempre trancada e eu sempre armada.
Quando eu e meu irmão entramos na fase adulta resolvemos sair de
casa. Finalmente. Chega de ter que dividir a casa com aquele escroto
arrogante e minha mãe fútil que só queria me arrumar homem rico.
Alugamos juntos uma casa, mal sabia eu que meu irmão tinha saído
por motivos nada nobres. Ele era uma pessoa complicada, um viciado em
drogas pesadas, traficava também para manter seus vícios e pagar as contas.
Descobri isso depois. Ele mentia para mim que trabalhava em uma indústria
como gerente de vendas.
Um dia chegou a notícia, eu estava no hotel nesse dia. Sem preparo
nenhum para receber um baque tão grande, os policiais me disseram que ele
foi encontrado morto em um beco sem saída. Então veio a revelação da
própria polícia, meu irmão andava com traficantes.
Claro que minha mãe me culpou por ter feito a cabeça dele para sair de
casa.
A droga de tudo isso é que um dia, saindo do hotel que eu trabalhava,
topei com ele na calçada e ele me apresentou a um desses caras que ele saia.
Mal sabia eu que esse homem era o chefão da máfia que ele trabalhava.
Depois que ele morreu, não demorou muito eles vieram atrás de mim e
eles me ameaçaram. Arthur devia uma grana alta para eles. Eu cheguei a
procurar minha mãe e pedir ajuda, mas a dama de gelo se negou a me ajudar:
"Vocês não saíram da minha vida? Não quiseram viver a vida de
vocês? Então agora se vire!
Bem... então veio Murat, um balsamo para os meus dias. Mas depois
que transamos dei me conta que eu que ia acabar como meu irmão. Eu já
estava começando a colocar os pés pelas mãos. Ficar com Murat naquele dia
me mostrou claramente isso.
Assustada, inclusive com meu jeito, não fiquei para ver o que ia
acontecer, vim para Londres com duas malas e o salário daquele mês e uns
acréscimos, já que eu não tinha muito tempo no Hilton.
Solto o ar.
—Você está tão longe. Tão pensativa.
Sorrio para Norma.
—Eu estava pensando na vida.
—Pensamentos tristes então?
Eu aperto os lábios e aceno um sim. Ela acena para mim com
compreensão e não diz nada. Acho que Rose contou a minha história para ela.
Depois do café começo a ajudar Norma na cozinha com os quitutes
que serão servidos logo mais à noite para a festa de boas-vindas pela volta
dos pais de Murat de viagem.
Conforme os minutos do relógio avançam eu vou ficando mais nervosa
só de pensar em revê-lo.
—Já pode colocar a mesa, Ester.
—Claro. —Paro imediatamente de fazer os barquinhos com a massa.
Ela receberá na última hora os recheios. Isso para que ela não perca a
crocância.
Lavo as minhas mãos na pia e as enxugo e começo as minhas viagens
até a sala de jantar levando tudo para a mesa, na verdade quero colocar tudo
antes que ele apareça. Ansiosa e tensa, sou rápida para ajeitar tudo que
Norma separou para levar. O café fresco, os pães caseiros, a geleia, o suco de
laranja, a manteiga e o patê de azeitonas pretas.
A porcelana, os talheres eu já havia colocado antecipadamente. Tudo
pronto saio da sala de jantar e aliviada e entro na cozinha, me sento e
continuo a fazer a modelagem.
—Você é muito habilidosa. —Norma diz quando vê a quantidade que
fiz.
—Ah, obrigada, mas acredito que você que é uma boa instrutora.
—Não acho. Você é muito ágil também.
—Por que eles não contratam buffet? —Pergunto modelando a massa.
Norma ri.
—Porque eu me especializei em comida turca que é uma das mais
ricas do mundo. Depois desses barquinhos assados, faremos alguns recheios e
você entenderá o porquê eles não contratam ninguém de fora.
—Hum, agora entendi.
Sino tocando na sala de jantar. Olho para Norma sem entender.
—Murat está chamando.
Ela passa os olhos pela cozinha e vê a leiteira no fogão.
—Você não colocou o leite na jarra?
Engulo em seco.
—Não! Esqueci!
—Leve já para ele! Deve ser por isso que ele está chamando. —Ela diz
despejando o leite numa linda jarra de porcelana que combina com a xícara
que está sobre a mesa.
Droga! Como eu fui esquecer do leite!
Eu a seguro pela alça e com ajuda de um pano térmico a apoio em
outra mão.
Entro na sala. Primeiro me deparo com sua cabeleira negra, meus
olhos descem e dão com seus ombros largos dentro do terno negro. Avanço e
de rabo de olho percebo que Murat está lendo um papel. Quando ele me vê o
coloca de lado, posso sentir seus olhos me observando enquanto coloco a
leiteira no descanso.
—Serviço quase completo. —Ele diz.
Sou obrigada a encará-lo. Sua aparência é magnífica com a camisa
branca e a gravata cinza-chumbo. Consigo manter meu rosto impassível,
embora não consiga controlar um arrepio que passa pelo meu corpo. No hotel
tive contato com executivos, mas nem de longe eles impressionavam tanto
como Murat. Ele tem uma postura altiva, e lindo como ninguém.
—Serviço quase completo? Falta alguma coisa? —Forço minha voz a
sair num tom normal e consigo.
Seus olhos se demoram no meu rosto então seu sorriso vai se abrindo
lentamente.
—Se tivesse a capacidade de ver as cenas que pensei, ler meus
pensamentos saberia que o que me falta, mas isso te faria corar, iluminaria
esse seu rosto, lindo por sinal e que você sabe usar muito bem.
Ele então me dá uma piscadela sexy. Odeio o formigamento que suas
falas me provocam, fico parada olhando para ele, tentando fazer meu cérebro
colaborar para rebater seu atrevimento, mas as palavras não vêm. Incapaz de
esboçar uma reação imediata— até mesmo balbuciar algo — permaneço
encarando os olhos negros do cara mais arrogante e cheio de si que já
conheci.
Sinto o meu rosto queimar com a minha demora em reagir, uma
vontade de provar a ele ao contrário, numa antítese de sentimentos, pois sei
que ele está certo. Esse homem mexe comigo e eu só tenho a fugir antes de
ser novamente uma vítima de seu feitiço.
Por fim consigo articular uma deixa para a minha saída:
—Ainda bem que não tenho essa capacidade e talvez se tivesse meus
dedos estariam na sua cara bonita. Bom dia senhor Çelik e bom apetite.
Eu vou deixando a sala escutando a sua risada baixa.
—Espere! —Ele então diz.
Eu solto o ar e me volto para ele. Nos encaramos. Ele recosta melhor
na cadeira:
—Já disse que senhor aqui é meu pai, apenas Murat. E por falar nele,
teremos uma festinha hoje. Você já deve estar sabendo.
—Sim. Inclusive, estou ocupada com os preparativos.
Ele vai abrindo o sorriso, que sai de um jeito jocoso. Como se ele
estivesse se divertindo comigo.
—Sei...sei.... Tudo bem, não vou te deixar em paz, agora. Pode se
refugiar na cozinha antes que você perca essa fachada de durona e demonstre
que no fundo está louca para eu materializar seus desejos...meus desejos...
fazendo esse vulcão enrustido e que conheço tão bem explodir.
A sala fica quente de repente. Não! Não é a sala. Sou eu que estou
pegando fogo!
Calma!
Respiro fundo, sorvendo uma grande quantidade de ar mantendo meu
semblante enigmático, embora muitos sentimentos inexplicáveis estejam me
rondando.
Preciso fugir de suas insinuações, não o confronte, uma voz me alerta.
Você virou uma espécie de divertimento e ele logo desistirá de você. Mas não
consigo e replico com um sorriso debochado:
— Esse tipo de falas deve funcionar para suas mulheres, mas não
comigo. Aquele dia, devido aos problemas, eu estava fora de mim, por isso
me deixei ser levada por um homem como você.
Seus olhos brilham diferentes e isso dispara meu coração, um sorriso
diabólico se forma em seus lábios que me estremece inteirinha. Como se ele
me visse como um desafio.
—O quê? Você está jogando cartas de negação? Ah, cabelos de fogo,
melhor você fugir, ou vai provar das minhas palavras em dois tempos e verá
como eu tenho razão. —Ele diz com uma passada de olhos nos meus lábios e
colocando as duas mãos na mesa pronto a se levantar.
Eu entro em pânico e quase me falta o ar. Mas consigo manter meu
semblante passivo. Aprendi isso ao lidar com a minha mãe, que detestava
choro.
—Com sua licença. Esse papo está me cansando. —Digo e saio me
atentando aquela voz que me disse fuja dele.
Ouço sua risada alta odiosa ressoando nas minhas costas antes de eu
entrar como um foguete na cozinha. Norma me avalia com os olhos.
—Murat acordou de bom humor hoje. —Ela diz com um sorriso. Com
certeza ouviu a risada daquele babaca sádico. —Você disse algo que o
divertiu?
Não eu sou seu divertimento!
—Não, ele que riu de sua piada particular.
—Ah, deve ser uma de suas piadas turcas. É difícil mesmo entender,
precisa conhecer a cultura.
Forço um sorriso para ela.
—É deve ser isso mesmo.
Eu me sento.
Que gringo dos diabos! Ele se acha o máximo.
Arrogante!
Pior que preciso do emprego!
Que droga!
Fique calma. Você já passou por grandes apertos e foi forte.
Droga! Mas eu tinha meu irmão!
Inspire, expire...Como Rose falou, vida nova. Preciso lidar com as
situações que surgirem da melhor forma possível.
Capítulo 7- Festa
Murat
Meus, tios, tias e primas estão aqui. Todos envolvidos com a fábula
que em uma dessas festas eu me prenda a alguém. Meu pai dessa vez foi bem
ardiloso. Ele está usando a minha ambição para me ligar a Hazal. Ela é,
simplesmente a filha de um dos nossos maiores concorrentes. Estará aqui
hoje para me conhecer.
Solto o ar irritado.
Quando eu entro na sala a tagarelice sem sentido das mulheres cessam
e meus tios sorriam para mim, eu correspondo com meu melhor sorriso, mas
minha atenção não fica neles por muito tempo e foco Ester a garota com
impressionantes olhos verdes e cabelos vermelho. Lobos babões! Eu percebi
como os meus tios a olhavam minutos antes enquanto ela os servia. Mas a
noite está quente, mais para mim do que para qualquer outro. Ester não tem
ideia o quanto ela mexe comigo. Meu sangue corre rápido em minhas veias,
cheio de adrenalina. É sempre assim quando a vejo. Nunca senti isso por
mulher nenhuma. Não sei o que ela tem? Mesmo sabendo que tudo não
passou de um jogo para me prender, me conquistar, sinto como se eu tivesse
levado uma flechada do cupido. Agora tento respirar devagar, controlado, ao
mesmo tempo que sinto minha ereção pulsar cheio de vida louco para entrar
naquela toca quente, úmida...
Allah! Será que ela tem ideia o quanto é bonita?
Aperto os lábios. Claro que sabe, essa ruivinha sabe o poder que tem
sobre os homens. Agora ela está muito magra, mas quando a conheci suas
curvas eram muito deleitáveis.
Per-fei-ta.
Sorrio quando reparo no seu leve tremor quando ela me vê. Sua
respiração agitada a delata sempre, mesmo que ela mantenha aquela postura
rígida e seu rosto enigmático. Sim, eu a afeto. Mas agora não sei se é porque
eu a desmascarei ou pelo desejo que provoco nela. Minha cabeça anda uma
confusão, entre raiva e o magnetismo que me puxa para ela. Mas hoje eu a
pego de jeito, quero muito tirar minhas dúvidas. Penso maquiavélico.
Quando ela se vira e vejo seu rebolado sob aquele vestido um pouco
largo, os pelos na minha nuca eriçam e eu preciso me conter para não ir até lá
e tirá-la dessa festa e rosnar no seu pescoço. Nem preciso dizer como fica o
meu amigo dentro das minhas calças.
Minutos antes....
Ester
Dia seguinte...
Hoje é sábado. Meu dia será cheio. Presumo que Murat ficará em casa
e isso significa que servirei a ele todas as refeições. Solto o ar com esses
pensamentos e entro na cozinha, já me sentindo nervosa.
—Bom dia a todas.
Rose e Norma me olham sorridentes.
—Bom dia. Estava comentando aqui com Norma que Murat não
acordou bem. Hoje você levará todas as refeições ao quarto dele?
Deus!
Quarto dele?
Isso está me cheirando armação.
—Rose, você poderia fazer isso?
Ele junta as duas sobrancelhas.
—Ester! Esse é seu serviço. Lembra? Eu estou sem uma empregada
para arrumar os quartos, limpar os banheiros, varrer lá fora, tudo porque você
está trabalhando na cozinha.
Imediatamente me sinto constrangida.
—Tudo bem. Eu levo—digo sem alternativa.
—Claro que irá levar! Você está sendo paga para ajudar na cozinha e
servi-los. Bem, vou dar uma ajeitada na casa. E já pode providenciar o café
dele e o antitérmico.
Assinto para ela. Ela então me explica aonde fica o quarto dele.
Quando ela sai Norma se vira para mim.
—Por que não quer servir Murat?
Eu a olho por um tempo sem falas.
—Acho estranho entrar no quarto de um homem solteiro.
—Deus! Você realmente é um achado. Se fosse outra adoraria levar o
café da manhã para ele. Bem, mas chega de conversa! Pegue o carrinho na
dispensa coloque tudo que precisa e leve para ele.
—Está bem— Digo, resignada.
—Ah, não se esqueça do antitérmico. Ele fica numa caixa de prontos
socorros naquele armário de duas portas, perto do fogão.
Eu faço tudo conforme Norma me pediu. Dessa vez coloco tudo no
carrinho, inclusive o antitérmico. Quero fazer uma viagem só, então não
posso me esquecer de nada. Vou deixar tudo lá e sumir, depois só irei buscar.
Murat
Passo as mãos nos olhos, buscando concentrar nos papéis que trouxe
para casa, mas não consigo e os empurro para o lado. Não consigo me
concentrar em nada.
Allah! Eu sou difícil ficar doente, mas quando fico me derruba. Minha
garganta não dói, não estou com coriza nem espirrando, só essa maldita
febre!
Jogo meu corpo para trás e caio nos travesseiros, estremeço de frio
embora o quarto esteja numa temperatura boa.
O bom disso tudo é ver os cabelos de fogo entrar por essa porta me
trazendo o café da manhã. Hoje quero ser mimado um pouco.
Batidas na porta.
Sorrio... eu pensando nessa feiticeira e olha ela aí.
—Entre —digo com rouquidão na voz e ajeitando meus travesseiros eu
me sento me apoiando neles.
A porta se abre e Ester surge. Ela está usando aquele chapéu ridículo,
mas nem isso tira a beleza do seu rosto, que é glorioso. Para não dizer
perfeito. Acho lindas essas sardinhas castanhas que ela tem no nariz e que se
estende até suas faces. Ela deve ter sido uma menina levada quando pequena.
Uma pimentinha.
—Eu trouxe seu café da manhã —ela diz de forma bem seca.
Paciência, determinação levam ao sucesso e em matéria da conquista
também. Por isso sorrio. Apesar dessa máscara séria, essa garota vibra
quando nossos olhos se encontram. Isso é só fachada para me manter
distante. Sei que ela pensa em me conquistar assim. Se fazendo de difícil, da
coitadinha, da empregada maltratada pela vida.
—Ótimo. Trouxe o antitérmico?
—Sim, senhor.
—Então, traga aqui.
Ela se volta para o corredor.
Essa atitude fria dela já começa a me incomodar, principalmente
quando ela me chama de senhor, embora eu já tenha falado que não gosto. E
outra coisa, não cabe mais em nós esse tratamento. Será que terei que lembrá-
la novamente com a minha boca na sua e minhas sedentas correndo seu
corpo?
Fungo.
Nunca precisei de muita lábia para conquistar uma mulher e levá-la
para a cama. Mas nenhuma das mulheres com quem saí nos últimos anos
mexeu comigo ao ponto de eu dar um telefonema para uma segunda saída. Já
essa garota parece uma droguinha linda, quanto mais se tem dela, mais se
quer. No fundo fiquei feliz em revê-la. É só não cair nessa armadilha de me
segurar.
Ela entra arrastando o carrinho. Um arrepio corre meu corpo inteiro
quando ela fica ao meu lado e não é da febre e sim por sentir seu cheiro
fresco. Uma mistura de xampu e o perfume que ela usa e que é dos bons. Não
é um perfume barato. Isso eu tenho certeza. Isso comprova minha teoria que
por baixo dessas roupas existe uma mulher interesseira.
—Bem, bom apetite.
Antes dela se virar eu rio e digo:
—Quero que fique para me servir. Pretendo tomar o café literalmente
na cama. Está vendo meu closet? Do lado direito, na parte debaixo você
encontrará o suporte.
Ester me examina. Seu rosto transparece sua desconfiança. No mínimo
ela deve estar achando que é uma artimanha minha eu estar me fazer de
doente para ela me servir no quarto.
Ela solta o ar.
—Tudo bem-diz como um soldado cumprindo ordens.
Ester se afasta e dou um sorriso de satisfação em vê-la cooperando.
—Ah, aproveita e me traga um cobertor, fica dentro de uma porta de
correr—digo quando estremeço de frio novamente.
Ester
Não é que ele parece mesmo doente! Ele está com os olhos e o rosto
vermelhos.
E cobertor? Nesse calor?
Pego a bandeja e uma manta como ele pediu. Vou até o quarto e dou
com seu olhar, que tão logo me vê, viaja por meu rosto e corpo com
satisfação.
Droga! Ele sempre faz eu me sentir nua, mesmo com esse uniforme
grosso.
Minha pele mais uma vez se arrepia quando seus olhos focam nos
meus novamente. Isso é excitante e enervante. Tudo ao mesmo tempo. Pior
que ele sabe o efeito que um olhar desse exerce sobre mim.
Ele dá um sorrisinho perverso e eu caio na realidade que isso é seu
mal. Ele, definitivamente, não é confiável. Com certeza alérgico a
compromissos. Vive de aventuras. Ele não é o tipo de homem que leva uma
mulher à sério. E para quê? Se ele tem elas aos montes? Todas prontas a
satisfazer seus desejos!
Eu fecho a cara e caminho até ele. Estendo o cobertor sobre o lençol.
Ele imediatamente o puxa para aquecer seus braços nus revelados pela
camiseta branca. Eu então me sinto segura e aperto as cobertas ao redor dele
e coloco o suporte entre suas pernas. Estou bem perto dele, e cometo o erro
de olhá-lo. Ele ergue apenas uma de suas sobrancelhas parecendo se divertir
comigo. A pele ao redor dos seus olhos deslumbrantes se enruga com seu
sorriso. Eu me ergo imediatamente.
—Sirvo primeiro o antitérmico?
—Sim, essa febre dá um mal-estar dos diabos.
Eu coloco minha mão na testa dele e vejo que ele está ardendo.
—Está alta mesmo.
—Fale a verdade? Pensou que fosse armação minha?
Quase rio de nervoso.
—A princípio sim— digo tirando o comprimido da cartela em olhar
para ele.
Sei que ele está com aquele sorrisinho enervante no rosto.
—Por que está aqui Ester?
Eu olho para ele não entendendo sua pergunta. Estendo o copo de suco
de laranja e o comprimido. Ele prontamente os retira da minha mão e toma o
remédio com o suco.
—E então? —Pergunta.
—Então o quê?
—Por que está aqui?
—No seu quarto? —Questiono, tentando ainda entender.
Imagens indesejáveis de nós nos beijando começam a surgir, minha
pele começa a formigar.
—Trabalhando ainda para mim, mesmo depois de desmascarada?
Respiro fundo, irritada, de repente. Ele ainda insiste nisso! Mas que
droga! Se eu disser que preciso desse emprego estarei nas mãos dele, mas não
vejo uma alternativa.
—Eu já disse que foi uma coincidência e eu preciso desse emprego. Só
quero ficar quietinha no meu canto, trabalhar dignamente.
Seus olhos brilham sem humor dessa vez.
—Sei o quanto a vida é difícil. Não pense que porque pertenço a elite
que eu sou desumano a ponto de não entender. Sempre tratei os empregados
muito bem. Meus pais são muito generosos também. Apenas acho que não
está aqui por acaso. —Ele diz e então toma o resto do suco.
—Você deve ter tido experiências desastrosas para pensar isso de
mim.
Ele fecha a cara.
—Você nem queira saber. Já encontrei uma mulher nua na minha
cama no hotel, já se jogaram na frente do meu carro, fora os esbarrões.
Solto o ar.
—Se fizeram tudo isso, por que me chamou para ir ao seu quarto?
Ele me olha pensativo.
—Você me pareceu muito abatida, aérea e não gostei do tom de voz
daquele rapaz. Você aflorou em mim um espírito protetor. E falei que você
estava me ajudando. Depois te testei, quando te convidei para ir ao meu
quarto. Você me olhou tão admirada, assustada, que eu gostei disso e fiz
valer meu convite.
—Está vendo como é uma coincidência eu estar aqui?
—Sabe, não estou mais preocupado com isso. —Ele diz dando de
ombros.
—Ótimo! Posso distribuir tudo no suporte?
Ele me entrega o copo vazio. Ele retira o suporte e dá umas batidinhas
com a mão na cama.
—Sente-se aqui!
Ah estava muito bom para ser verdade.
—Acho melhor não.
Ele fala mais enérgico.
—Sente-se!
Deus! Começou!
Eu me sento. Ele olha para o meu rosto.
—Ficou, porém, uma equação que precisamos resolver juntos.
—Uma...equação?
—Você precisa do emprego e eu preciso de você.
Suas palavras podem ser interpretadas de duas maneiras, mas a julgar
pela intensidade dos seus olhos, duvido que ele esteja falando sobre precisar
de mim por causa do meu posto como empregada. Faço de desentendida:
—Farei meu trabalho direitinho.
Eu me levanto, mas ele me puxa pelo pulso e eu caio sentada na cama.
Murat me empurra para a cama e depois de retirar meu chapéu diz:
—Ester. Você não tem ideia o quanto é desejável —diz ofegante,
rouco.
Murat
Ester
Servi o café da manhã para os Çelik. Não pude deixar de ouvir a
conversa dos dois. Eles falavam o tempo todo de almoço de amanhã, eles
estão crentes que Hazal se unirá a Murat. Que é questão de tempo. Eles
planejam introduzi-la em festas, jantares, almoços de família. Isso foi a
resposta confirmatória que eu precisava para entender que Murat só me usará.
Seus pais têm outros planos para ele e dificilmente o homem turco irá contra
à vontade deles.
E se Murat acabar gostando dela?
Ele me usará e me enxotará depois de sua vida.
Após eles tomarem café eu retiro a mesa. Estava lavando a louça
quando a senhora Ayla pede para Norma fazer uma sopa leve para Murat.
Terminando a louça, ajudo Norma a cascar os legumes enquanto ela cozinha
uma carne magra para depois colocá-los.
Tão logo a sopa fica pronta ela me pede:
—Ester, leve a sopa nessa bandeja e já traz o carrinho.
Meu coração se agita com seu pedido.
Deus! Não vai prestar eu ficar nessa casa. Na minha folga vou
procurar outro emprego.
Assinto para ela e levo com cuidado a bandeja com a sopa. No
corredor a coloco em cima do aparador e bato na porta. Não ouço resposta.
Meu coração dispara ainda mais. Sou obrigada a abrir a porta.
Murat não está na cama.
Apuro meus ouvidos e o ouço vomitando no banheiro.
Vou até lá. A cena é de um homem grande com a cabeleira negra
revolta, só de short azul-marinho e camiseta branca debruçado no vaso
sanitário.
—Murat?
Ele gira sua cabeça na minha direção. Está branco como papel. Eu vou
até ele angustiada.
—Vou chamar sua mãe.
—Não! Minha mãe não! —Ele diz se erguendo e se segurando na
parede do banheiro. Eu fico a olhar para ele sem saber o que fazer.
Ele aperta a válvula da descarga e depois olha para mim.
—Você pode me ajudar a voltar para a cama? Ou vai ficar aí, parada,
me olhando?
Insegura vou até ele e enlaço sua cintura. Ele me envolve com seu
braço e juntos vamos caminhando devagar até a sua cama. Ele se deita nela,
eu o cubro.
—Desde quando você está vomitando?
Muito pálido, ele abre os olhos.
—Desde agora. Eu estava lutando aqui na cama achando que o mal-
estar passaria, mas não teve jeito.
—Eu trouxe uma sopa.
—Allah! Eu não consigo comer nada agora.
—Você está...com....você sabe.
Ele me olha aéreo.
—Não, não sei.
—Só vomitando?
Ele sorri.
—Pode ficar tranquila, estou só vomitando.
—Bem, melhor.
—Leve a sopa e pede para Norma um remédio para cortar o vômito e
traga isotônicos.
—Vai tomar remédios por conta? Você já teve isso antes? Não acha
melhor chamar o médico?
—É um mal-estar de nada. Tenho trinta e seis anos nas costas, sou
bem vivido para saber que ficarei bem. Então, por favor! Minha mãe não
deve saber de nada, ela dramatiza tudo. Já vai chamar o médico e ele acabará
me receitando tudo isso que te falei.
—Não sei...eu ainda acho que ela deveria saber.
—Ester! —Ele ruge, eu estremeço inteirinha.
—Tudo bem.
Ele funga.
—Vamos fazer assim? Se eu não melhorar até amanhã, eu vou ao
médico.
Eu respiro mais tranquila.
—Está certo. Vou levar o carrinho com as coisas e já trago seu
remédio.
—Faça isso —ele diz de olhos fechados.
—Já volto.
Eu pego o carrinho e o empurro no corredor, vou até o aparador e
coloco a bandeja com a sopa na parte de baixo do carrinho e o movo devagar
até a cozinha.
—E Murat? Melhorou? —Norma indaga quando me vê entrando com
as coisas.
—Ele estava vomitando quando cheguei. Bem pálido. Pediu aquele
remédio que ele costuma tomar quando vomita e isotônicos.
—Hum, então ele nem comeu a sopa?
—Não.
Ela me olha pensativa.
—E a senhora Çelik sabe que ele vai tomar remédio por conta?
—Não! E nem pode saber. Ele pediu isso.
Norma aperta os lábios.
—Bem a cara de Murat.
—Ela dramatiza tudo, mesmo?
—Ele te disse isso?
Assinto para ela.
—Sim.
Ela ergue a mão e faz sinal de bobagem no ar.
—Dramatiza nada. Murat que tem uma vida independente. Seus pais
pensam que o tem nas mãos, mas ele é como uma águia. Voa livre e bem
longe e volta para o ninho só para agradá-los. Ele não luta contra mas faz o
que bem entende.
—Se ele é assim, por que não mora sozinho?
—Por causa das tradições. Turcos só deixam a casa dos pais depois
que se casam.
—Entendi.
Ela solta o ar.
—Bem, vou arrumar tudo para você levar.
Eu começo a retirar as coisas do carrinho e digo sem olhá-la:
—Você não quer levar para ele enquanto eu ajeito as coisas aqui?
Silêncio.
—Tudo bem, eu levo. Assim dou uma olhada no meu menino.
Eu a olho curiosa.
—Você trabalha muito tempo para eles?
—Sim, há mais de vinte anos. —Ela diz colocando os isotônicos, o
remédio e um copo em uma bandeja de prata.
—Puxa, há bastante tempo.
O interfone toca.
—Ah, deve ser a empregada nova. Atende. Se for libere a entrada dela,
eu vou levar tudo para Murat eu vou avisar Rose. Enquanto isso você ajeita
tudo por aqui.
Quando ela sai eu sinto um alívio. Murat que não gostará nem um
pouco. Bem, talvez não. Ele está muito debilitado para pensar em qualquer
outra coisa.
Eu atendo o interfone. Realmente é Lucy, a empregada que ficará com
a minha vaga a qual eu me candidatei, mas acabei vindo para a cozinha.
Conheci Lucy. A senhora de cinquenta e cinco anos bem forte e bem-
disposta para o trabalho. Eu gostei muito dela. Aquele tipo de pessoa humilde
que realmente precisa trabalhar e que faz tudo para se dar bem com todo
mundo.
Com relação ao trabalho me sinto afortunada. Durmo no serviço, não
preciso pagar aluguel, e estou me relacionando bem com todos. Meu
problema é com Murat.
Capítulo 9- Chá de sumiço
Murat
Estou fora de mim. Ester não apareceu mais no meu quarto. Passei
praticamente o dia inteiro à espera dela e isso é uma coisa que nunca
aconteceu, nunca mulher nenhuma me gerou essa expectativa.
E o pior! Ela nem veio saber como estou.
Outra coisa que me irritou foi a conversa que tive com meu pai quase
agora. Ele convidou Hazal e os pais dela para o almoço de amanhã.
Agora é hora do jantar, estou de banho tomado deitado na minha cama.
Ligo para o ramal da cozinha e digo para Norma que me sinto melhor e que
aguardo meu jantar ser servido no meu quarto.
Coloco o fone no gancho e fico a olhar para o teto.
Bufo lembrando-me de toda a atração sexual que existe entre nós e
Ester insisti em me manter longe dela. Meu outro eu, tenta me convencer de
que devo seguir minha vida e tentar ignorá-la. Mas quando ela está presente
no mesmo recinto que eu, ah meu corpo clama pelo dela de uma forma que
nunca senti por outro alguém. É impossível passar por cima dessa sensação,
meu desejo é forte ao ponto de quase me dominar. Quase perco a razão
quando ela está perto. Não sei o que há nela, só sei que o animal enrustido em
mim ganha vida quando a vejo.
Batidas na porta.
Eu me sento na cama e olho a porta com expectativas.
—Entre.
Norma surge. Eu ofego, puto!
Mas que merda! Pensei que Ester me traria o jantar!
Engulo todo o meu mal humor e a encaro.
—Seu jantar. Que bom que está melhor. Está mais corado mesmo.
—Verdade —forço-me a dizer. Pois posso ter melhorado de saúde,
mas me sinto um vulcão prestes a explodir.
Por que justo a mulher que sinto alguma coisa é tão difícil?
Eu me mordo de vontade de perguntar por Ester, mas não faço isso.
Norma é bem esperta. Ela trabalha há mais de vinte anos conosco, ela me
conhece muito bem.
Ela coloca o suporte sobre as minhas pernas e ela me serve a sopa. O
aroma que vem dela perfuma o ambiente. Estou com fome agora, então
começo a comer com prazer sob às vistas de Norma que ainda não foi embora
e me observa.
—Gostou?
—Muito. —Digo e coloco outra colherada.
—E a febre?
—Passou.
—Que bom.
—Seu pai convidou Hazal e os pais dela para o almoço de amanhã. O
que acha que devo servir?
As palavras dela reviram o meu estômago.
—Vê com a minha mãe. —Digo seco e dou a última colherada.
—Ela disse para eu falar com você.
Eu rio amargo e a encaro.
—Essa é boa! Comigo? Desde quando eu dou palpite na cozinha?
—Acho que ela quer você se envolva mais com esse almoço.
—Norma, faço o que achar melhor. Estou pouco me lixando com esse
almoço.
—Tudo bem.
Ela tinha que me lembrar disso agora?
Ela vai até a janela e olha para fora, só se vira para mim quando estou
finalizando.
—Posso servir mais?
—Não, obrigada Norma. E Ester? Pensei que fosse ela que fizesse esse
serviço? —Digo, como quem não quer nada e olhando meus papéis para
disfarçar. Tenho medo que ela leia nos meus olhos o quanto arde em mim a
vontade de saber sua resposta.
—Ester serviu seus pais e depois se recolheu cedo. Eu a dispensei. Ela
estava morrendo de dor de cabeça.
Dor de cabeça?
—Entendo. Então, obrigado e boa noite.
—Boa noite menino. Bem, então farei o almoço de amanhã da maneira
que acho.
—Ótimo!
—E se sua mãe perguntar? Digo que opinou?
—Diga que tenho muita coisa para pensar com relação ao trabalho. —
ergo os papéis —do que me preocupar com o que teremos amanhã de
almoço.
—Eu não vou dizer isso! —Ela diz retirando o prato do suporte.
Eu mostro os dentes.
—Diga o que quiser, então.
—Ah! Está bem! E você está bem ranzinza hoje. — Resmungando se
afasta empurrando o carrinho.
Quando ela sai eu afasto os lençóis e me levanto irritado e solto um
palavrão em turco. Dor de cabeça? Duvido! Ester está me evitando.
Tudo bem! Sorrio maquiavélico. Hoje mesmo farei uma visitinha ao
seu quarto, quero ver aquela boca sexy me negar algo quando ela for
preenchida com a minha...
Capítulo 10 - Furacão
Não podemos prever uma furacão, foi isso que senti ao ver Murat
entrando no meu quarto e fechando a porta com um sorriso devastador. Agora
ele está de short preto e camiseta branca, uma sandália de couro nos pés.
Imediatamente dou um salto e fico em pé do outro lado da cama,
puxando o lençol para cobrir minha camisola branca de cetim. O encaro,
enrolada a ele.
—O ...que você está fazendo aqui?
Murat ainda sorrindo fecha a porta, parece estar se divertindo muito
com meu gesto assustado. Seus olhos então focam a televisão ligada e ele
olha para mim.
—Para quem estava com dor de cabeça, você me parece muito bem...
—Você veio checar se eu estava com dor de cabeça?
Ele se encosta a porta e cruza os braços e me olha com seu sorriso
maquiavélico.
—Pensei que estivéssemos nos entendendo, Ester.
O desejo de seu olhar quase quebra meu autocontrole.
—Entendendo? —Eu o questiono furiosa comigo mesma por ter
permitido que ele me beijasse. Agora ele acha que pode fazer o que quer. —
Um beijo roubado não significa nada!
Seu sorriso some e seu rosto endurece.
—Beijo roubado? Você sai beijando todos por aí?
Meu coração acelera. Um rubor quente cobre meu rosto.
—Não! E para começo de conversa, não fui eu que te beijei, foi você
que forçou uma situação.
Murat ri, então gargalha.
—Allah! Ester! Eu forcei uma situação?
Então dá um salto na minha cama e num minuto está ao meu lado. Eu
estremeço numa mistura de medo e desejo. Seu perfume no meu nariz e seus
olhos negros nos meus tem quase um efeito hipnótico.
Ele meneia a cabeça.
—Você adora me colocar no papel de vilão, não é mesmo? Só que fica
me dando sinais que quer o mesmo que eu. Eu já disse que detesto jogos. E
você está jogando comigo.
Eu dou um passo para trás.
—Jogos? Você no fundo acha que estou aqui para te conquistar me
fazendo de difícil agora e balançando a isca.
Sua respiração se agita. Frieza cinzela em seu olhar.
—Não quero pensar quem sou, quem você é. Nem o que você está
fazendo aqui. Quero apenas que as coisas aconteçam entre nós.
Deus! Este homem se chama ameaça, e eu nunca experimentei nada
diferente da segurança até conhecê-lo....
—Saia do meu quarto agora! Desculpe-me se te passei a impressão
errada. Eu errei! Está bom assim? Errei de ter me deixado levar pelo
momento.
Ele funga, como se exercitasse a paciência comigo. Como se a errada
fosse eu e ele o certo.
—Você me teme, Ester. Eu entendo. Eu provoco sensações intensa no
seu corpo. Elas te assustam.
Eu rio da cara dele, mas sei que é de nervoso, pois ele disse
exatamente o que eu sinto.
—Você é muito convencido!
Ele se aproxima de mim como uma cobra sinuosa e me enlaça pela
cintura. Estremeço. O medo se transforma em pânico. Eu fico o olhando
como um passarinho assustado.
—Eu sou muito prático, sincero. É bem diferente de convencimento.
Falo o que sinto.
—Você ficou com uma imagem errada de mim. Não sou essa mulher
que você imagina.
—Eu te dei a oportunidade de me falar sobre você!
—Você acha que eu caio nessa? Você está louco para me convencer de
ir para a cama com você novamente. Você está pouco me lixando com a
minha história! Eu sei onde é o meu lugar. Não sou uma iludida.
—Seu lugar? Temos lugares por acaso? Se não se sentisse tão inferior
iria ceder apostar para ver o que vem depois. E se eu quiser investir nessa
relação? —A voz aduladora de Murat chega rouca aos meus ouvidos me
provocando calafrios.
Não! Não! Não caia nessa! Ele quer quebrar suas defesas.
—Hah! E você quer? —Questiono incrédula.
—Não sei...você não me dá oportunidade para saber. —Ele diz
beijando meu pescoço. —Como você cheira bem Ester...
Milagrosamente minha cabeça funcionou de forma bem clara e eu o
empurro com raiva. Embora meu coração bata forte e meu coração arda pela
forte atração.
—Isso é um erro!
Murat me olha ofegante sem dizer uma palavra. Ele fica como uma
estátua me olhando. Todo orgulhoso brilhando pela luz da televisão.
Sei que ele não é um homem que aceite um não como resposta. Não
sei como ele vai lidar com isso.
—Erro é o que está cometendo! —Ele diz, seco.
—Não me sinto errando. Sou uma empregada fazendo meu serviço. —
Digo confiante, mantendo o lençol bem preso ao meu corpo.
Ele sorri diabólico.
Não gosto desse sorriso!
—Adoro provar o quanto está errada...
Ele puxa o meu lençol e antes que eu dê um grito seus lábios esmagam
os meus num beijo quente, eu estremeço em seus braços. Enquanto sua boca
sujeita a minha e me devasta. Sua língua visita cada parte dela, me
provocando, dançando, tremulando. Suas mãos deslizam nas minhas costas
envolventes me trazendo mais para ele, me fazendo tremer de desejo. Seu
calor radiante atravessa o tecido fino da minha camisola, seu cheiro
maravilhoso me envolve embotando meus pensamentos.
Então uma de suas mãos escorrega até o meu bumbum e o aperta e
depois ele a desliza e ergue a minha perna, encaixando meu corpo melhor no
dele fazendo eu sentir a potência latejante no meio de suas pernas.
Nunca me senti assim, meus sentimentos tão dominados por um
homem. Desesperadamente começo a puxar de dentro de mim pensamentos
negativos, pessimista com relação a isso: Esse homem só quer uma coisa de
você, sexo! Ele irá devastar seu coração e quando você quiser muito mais que
isso, ele te lançará fora da vida dele.
Como que acordando de um pesadelo eu começo a empurrar Murat.
—Não! Não! —Digo e por fim consigo me desvencilhar dele.
Murat
Ester
Quando ele sai do meu quarto eu me sento na cama e passo a mão no
rosto.
Preciso procurar outro emprego. A folga que eu tiver farei isso. Quem
sabe consigo de recepcionista em algum hotel?
Não! Não! É um risco. Se eles me procurarem, me encontrarão lá.
Somos tendenciados a repetir experiências anteriores e eles sabem disso.
Deus! Mas que merda! Pior que eu gostei de trabalhar aqui. Rose e
Norma são uns amores...
Os Çelik's também. São muito na deles e não são aqueles patrões
chatos. Meu problema é mesmo Murat.
Capítulo 11 – Almoço com Hazal e família.
Dia seguinte...
Murat
Estou em pé olhando para fora da janela, sem nada ver. O sol irradia
sobre o jardim bem cuidado, mas minha mente está longe, desatento a toda a
beleza e a paz que ele transmite, pois nem a vista dele me tranquiliza agora.
Há uma grande responsabilidade sobre meus ombros, a esperança da
minha família está toda depositada em mim. Passei meus anos ouvindo o que
meu pai tem para mim como sonho. Despejando em mim tudo que eu devo
ser. Faço o jogo dele, não o confronto, uma vez fiz isso por causa de uma
garota que eu me encantei na faculdade, eu tinha vinte anos. Mas perdi a
batalha. Ele fez da minha vida um inferno e a dela também.
Aquela máscara serena que ele usa esconde uma personalidade
intimadora. Ele a coloca e a tira quando lhe convém. Isso me influenciou
muito na formação do meu caráter, bem como minhas reações diante das
situações que a vida me apresenta. Depois do que ele fez com Karina, eu me
fechei completamente para as mulheres de fora, mas como uma espécie de
protesto, me fechei para as da minha cultura também.
Aos vinte e seis anos, eu já havia terminando a faculdade e o MBA.
Ao lado de meu pai trabalhei com afinco, crescendo na empresa, me
destacando. Tenho um espírito nato de liderança. Minha personalidade é forte
e por isso sempre gostei de controlar tudo e, mas não todos.
Meu pai tem a maior parte das ações, e, ele sabe usar muito bem esse
poder. Na época de Karina ele ameaçou colocar meu primo Tabor no meu
lugar na empresa. Até hoje ele é um calo no meu sapato, uma sombra que me
cerca, sempre me ameaçando.
Hoje meu coração está desconjuntado com conflito de emoções e sinto
que estou perdendo a cabeça novamente, mas de um jeito diferente do que foi
com Karina. Porque Ester não só mexe com meu corpo, mas também com
minhas emoções. Tudo com ela é muito intenso. Chega a ser assustador essa
fascinação que ela exerce sobre mim e as reações que ela provoca em meu
corpo. Sinto como se ele tivesse vida própria. É aquele tipo de coisa que não
tem explicação. Você apenas sente e pronto.
E o mais engraçado de tudo é que das mulheres que meu pai tentou
inserir no nosso meio para despertar minha atenção, Hazal foi a que mais se
destacou.
Alta, magra, a pele sem manchas, os cabelos negros iguais aos seus
olhos. Resumindo: Bonita. E o fundamental para eles, ela é a imagem da
mulher turca, que carrega todas a nossa cultura, nossa língua. Além de ser
uma mulher fina, cordial, impecável, obediente.
Passiva, ela sabe qual será seu papel ao meu lado como esposa e
perante a sociedade. E mais, tenho total consciência também que nossa união
será ótima para os negócios. Por isso me sinto encurralado. Agora estou aqui,
dividido entre os meus dois eus: A razão que é o homem que devo ser, e o
outro homem, aquele que ultimamente está sendo imponderado, insensato, o
homem que está se perdendo e sendo levado pelas emoções.
—Hazal e os pais delas já estão aí. —Minha mãe diz entrando na
biblioteca.
—Ok. —Digo sem me virar para ela.
—Murat, seu pai está pondo grandes expectativas na união de vocês.
Quando você irá esquecer o que ele fez com Karina? Você tem o punido
desde então. Se fechando para qualquer tentativa dele introduzir a mulher
certa para você.
Eu solto o ar e me viro para ela.
—Mãe, farei meu papel direitinho. Sossegue. Só me dá um tempo.
Ela aperta os lábios.
—Não faça teu pai vir aqui. Você sabe o quanto ele sabe ser
desagradável.
—Sim, eu sei.
Quando ela sai eu solto o ar novamente.
Queria tanto acreditar que Ester é uma mulher interesseira, queria
tanto me apegar a isso, mas à medida que o tempo passa a sua versão
inocente fica mais forte e eu me sinto entrando mais nessa areia movediça,
me afundando nas minhas emoções.
Allah! Essa noite fiquei deitado na minha cama pensando em tirá-la da
minha mente, ignorar a vontade de meu corpo, agir mais racionalmente,
esquecer essa mulher.
Por que investir em algo que não dará certo?
Mas hoje quando ela me serviu o café da manhã, quando ela entrou na
sala, todas essas minhas resoluções foram por água abaixo.
—Murat! —Ouço a voz de meu pai.
Kahretsin ne! (Mas que merda!)
Eu me viro para ele. Seu olhar me fulmina. O antagonismo está nas
feições dele, o gelo nos seus olhos. Ele então cuspiu palavras que foram feitas
para me atingir, a tensão toma conta de mim:
—Por que você sempre dificulta as coisas? Sabe que estou começando
a desacreditar em você.
Solto o ar. O significado das palavras dele me acerta em cheio. Ele
está ameaçando a mudar seu foco, meu primo.
—Não vou dificultar nada e para sua informação, gostei de Hazal.
Meu pai solta o ar.
—Ótimo.
Hazal me avista entrando na sala, ela ergue os olhos para encontrar
com os meus, então me dá um sorriso largo. Forço meus lábios a sorrir para
ela como se estivesse feliz em vê-la. Seus olhos se iluminam demonstrando o
seu interesse.
Sim, ela está feliz em me ver.
Desvio meus olhos dos dela incomodado com isso. E instintivamente
meus olhos posam em Ester que está ajeitando a mesa do almoço.
Imediatamente me sinto eufórico em vê-la. A aura dela parece que brilha
mais do que todos a minha volta.
Se sentindo observada seus olhos verdes sobem e encontram com os
meus, isso é o suficiente para meu corpo inteiro estremecer.
Allah! Ignorá-la? Como? Acho mais fácil esquecer meu próprio nome.
É estranho estar aqui recebendo Hazal e a família dela em frente a
mulher que tem sido o me alvo. Mas a verdade é que só estou cumprindo um
protocolo. Encenando um interesse que não tenho para deixar meu pai
satisfeito, para ele não dizer que não tentei gostar de uma mulher como
Hazal. Como eu disse, eu não bato de frente com ele, eu me esquivo. Entro
no seu jogo, mas acabo fazendo o que quero.
Quando disse a ele que gostei de Hazal, não menti. Gosto dela para ser
uma boa amiga, mas como mulheres turcas não tem amizades masculinas,
mais tarde ela só será uma lembrança como tantas outras que meu pai
introduziu nessa casa tentando provocar meu interesse.
Meu pai abraça meus ombros, talvez percebendo meus olhos em cima
da empregada. É uma forma de ele impor e me lembrar aonde tem que estar a
minha verdadeira atenção. Essas mãos querem me direcionar a cumprimentar
os pais de Hazal que conversam com a minha mãe no outro canto da sala,
como se eu fosse ainda um garoto, não o homem de maduro que sou. Às
vezes ele se esquece disso, ou sua arrogância não o deixa enxergar.
Irritado, eu retiro o braço dele dos meus ombros e avanço por vontade
própria, mas não em direção a eles, sigo até Ester.
—O que temos para o almoço? —questiono quando estou próximo a
ela.
Sua respiração se agita e ela desvia os olhos dos meus e continua seu
trabalho, colocando os talheres nos lugares certos.
—Serviremos primeiro o Zey...
—Zeytinyagli —completo com um sorriso adorando ela tentar falar o
turco.
Ela busca meus olhos e os desvia novamente.
—Depois o Kebab e por último o Manti.
—E de sobremesa?
—Baclava de nozes.
—Perfeito. Bem agora vou assumir meu papel nesse palco armado e
representar o mocinho interessado na mocinha.
Ela ergue seus olhos verdes um sorriso sarcástico se forma em sua
boca.
—Ah, você é muito bom nisso, representar.
—Quem disse que com você eu represento? —Provoco, assistindo-a
ficar vermelha.
Ah como eu gosto disso!
Você será minha Ester! E eu costumo conseguir tudo que quero.
Eu me afasto e dou com meu pai me observando enquanto conversa
com os pais de Hazal e com ela que se uniu a eles. Vou até lá com um sorriso
agradável no rosto.
Vamos ao primeiro ato!
Espero que no segundo a mocinha não chore.
Minutos antes...
Ester
Murat
As palavras dela me fazem ofegar, eu me encho de ira. Desvio os
olhos dela tentando controlar toda a minha raiva. Sinto-me às vezes como um
animal enjaulado, que precisa conter toda sua fúria porque vê as grades.
Eu a encaro novamente.
—Ele te humilhou?
—O que acha? —Ela questiona.
Ofegante passo o olhar por seu cabelo sedoso, sua camiseta branca que
revela seus seios redondos e que combina muito com a calça jeans agarrada
que ela usa. Então reparo na sua mão delicada de dedos finos com unhas sem
pintura.
Terrivelmente atraído eu me aproximo dela, com vontade de beijar sua
boca. Um desejo tão forte e avassalador que mesmo com seu passo para trás,
fugindo de mim, eu avanço direcionando todo o meu olhar quente e
penetrante dizendo exatamente o que eu quero.
Seguro firme sua cintura e a puxo de encontro ao meu peito, enquanto
a outra entra em seu cabelo na nuca e segura forte sua cabeça, imobilizando-a
para mim. Antes de beijá-la eu a encaro por uns instantes, segurando seu
olhar no meu, a queimando com meus olhos. Meu rosto se aproxima do seu e
a minha boca da sua. Mas não a beijo de imediato, eu passo meus lábios
sobre os dela, sentindo a textura macia deles e que tanto adoro. Ouço seu
arfar saindo de sua boca. Eu a olho, seus olhos verdes são duas esmeraldas
grandes e brilhantes, agitada, excitada, abalada.
Quando estou para tomar sua boca com volúpia e paixão.
Sinto a dor aguda no meu saco!
Allah!
Ela me deu uma joelhada, merda! Eu a solto ofegante e envergo o meu
corpo com dor. Levo a minha mão lá. Sento-me na cama com tudo latejando.
Não acredito nisso! Ela me deu uma joelhada?
Minha respiração se torna mais pesada mais com raiva agora do que
com a dor.
—Eu não acredito que você fez isso mesmo? —Digo num tom
abafado.
Eu procuro seus olhos. Ela me olha com a respiração irregular, as faces
coradas, os olhos brilhando nos meus. Seu olhar é angustiado agora.
—Eu não queria te machucar, Murat. Mas sua atitude me obrigou a
isso. Você não me deixa escolhas.
Fico a olhar para ela ainda sem acreditar no que ela fez. Blasfemo em
turco. E digo irado:
—Eu não vim aqui para te beijar. Eu vim para conversar. Só que toda
vez que estou com você eu perco a razão, levado por instintos que me
entorpecem. Ainda mais com sua visão tão sexy nessa camiseta branca
agarrada.
—Vou facilitar para você. Resolvi sair dessa casa. Na minha folga vou
procurar emprego em outro lugar.
Eu a olho ofegante, meu coração se enche mais ainda de ira. Mas que
merda! Meu pai não pode vencer dessa vez. Eu me levanto com tudo
dolorido.
—Meu pai te intimidou tanto assim? O que ele te disse?
—Não, antes dele falar comigo, eu já tinha resolvido.
Ainda estou com a fome voraz de unir seu corpo ao meu me
consumindo. Mas muito mais que isso, sinto meu peito se apertar com suas
falas. Observo-a atentamente.
—Não quero que vá. —Digo, ofegante, com o rosto sério,
compenetrado.
—Isso não é um assunto a ser discutido. Está resolvido.
Caio em mim que o que menos faço é conversar. Preciso passar
segurança para ela. Preciso lhe falar de Hazal.
—É por causa de Hazal? Se for, não há o que se preocupar. Eu
conversei com ela hoje. Abri o jogo com ela. Disse que estou dançando
conforme a música, mas que que não pretendo ter nada sério com ela.
Manteremos as aparências por um tempo. E sabe por que eu fiz isso? Por
causa de você.
Ester me olha ofegante. Eu vou até ela, e a tomo nos braços
novamente. Sinto seu arfar perfumado.
— Vai me dá uma joelhada novamente? Depois de tudo que eu disse?
—Questiono, meus olhos cheios negros de desejo.
Ela não responde e eu então colo minha boca na sua, a beijando com
paixão e toda a volúpia que meu corpo exige. Ela cede.
Allah! Finalmente cede...
Quando sinto seus lábios sob os meus tão receptivos, eu gemo de
prazer e os mordisco a provocando ainda mais, então coloco minha língua
entre a sua boca, dançando no seu interior úmido, me embriagando com seu
gosto. Envolvo minha língua na dela e me deixo levar por uma gama de
sentimentos e emoções que só ela me provoca. A puxo mais para mim,
colando seus seios ao meu peito e tomo sua boca dando tudo de mim,
esquecendo toda a minha razão, enlouquecido por esse beijo.
O sangue corre rápido nas minhas veias num pulsar violento, seu
cheiro nas minhas narinas me desnorteia, como se não pudesse ter o bastante
dela e eu a aperto mais nos braços como se eu quisesse me fundir a ela. Ester
geme e envolve seus braços no meu pescoço.
Ah como eu sinto prazer com isso. Aos poucos nossos beijos vão se
acalmando. Então eu a beijo nos olhos, nas bochechas, por todo o rosto.
—Preciso ir. Amanhã venho no mesmo horário no seu quarto.
Ela abaixou a cabeça.
—Não quero que venha.
Allah! Que mulher difícil!
Eu me aproximo dela e seguro seu queixo com o polegar e o dedo
indicador e a faço olhar para mim.
Ester
Murat
—Soube pelo seu pai que você e Hazal Omã estão namorando.
Coloco os papéis que preciso na pasta e ergo meu rosto para ele. Nem
preciso fazer força para que o imenso desprezo brote nos meus olhos quando
o encaro e digo:
—Namorando? Ainda se usa esse termo? Eu usaria, estamos nos
conhecendo melhor.
Tabor ri.
—Sim do jeito que é alérgico a compromissos, essa palavra se encaixa
melhor com seu estilo de vida. Deve ser difícil ter que se prender apenas uma
garota tendo tantas na sua cama?
Dou um sorriso frio:
— Não quando se gosta.
Com prazer vejo como isso o abala, seus lábios se apertam com as
minhas falas.
Nunca perco tempo com esse idiota. É sempre ele que entra no meu
escritório como quem não quer nada e me provoca. Mas não caio nessa
armadilha. Já bastam meus problemas. Isso acontece desde que ele
começou a trabalhar aqui, e a merda toda que ele tem todo suporte de meu pai
que dá mais peso para suas ações. Um pau mandado. Talvez meu pai o tenha
orientado para me irritar. Não duvido nada.
Verifico tudo dentro da pasta.
Está tudo aqui! Estou indo para Manchester onde tenho uma reunião
com um grande lojista. Espero que tudo se resolva logo. Pretendo ficar no
máximo dois dias.
—Então, está gostando da garota?
Esse merda ainda está aí? Ergo meus olhos e o encaro. Nessa hora
meu pai entra no escritório. Tabor muda imediatamente sua postura, se
apruma e estufa o peito.
—Já está indo?
—Sim, baba. Essa conta será nossa. O senhor vai ver.
Meu pai acena com a cabeça e olha para Tabor.
—Vamos para a reunião? O cliente já nos aguarda.
Reunião? Eles não me falaram nada disso. Eu ofego.
—Que reunião?
—Tabor conseguiu uma reunião com Robert Smith. Ele teve uma
ótima ideia, de fazermos venda casada. Nossos televisores serão oferecidos
junto com a venda da assinatura da System. Vamos negociar tudo agora.
FDP! Essa ideia foi minha. System é uma tevê por assinatura via
satélite. Eu estou atrás desse cliente como um cachorro louco há meses.
Soco a mão na mesa, não me importando com a expressão carrancuda
que meu pai faz com meu gesto.
—Espera aí! Essa ideia foi minha. Estou há meses tentando falar como
esse cliente!
—Não importa quem teve a ideia. Tabor conseguiu essa reunião.
Eu ofego e me levanto tão rápido que a cadeira de rodinhas corre para
trás e bate no janelão de vidro. Fico em pé com meu 1,90 de altura. Uma
carranca se forma no meu rosto enquanto caminho em direção a Tabor com
seu 1,70. Bem perto dele me agiganto, meus olhares se fixam nos seus olhos.
Louco para amassar sua cara. Esse verme!
Ele ofega com meu gesto. Elevo minha voz:
— Como você ficou sabendo que eu estava atrás de Smith? Tem
ouvido conversas atrás da porta?
Alguém está vazando informações. Como ele sabia dessa minha ideia?
Minha secretária? Tem escutas no meu escritório? Com certeza tem dedo do
meu pai nisso.
Meu pai pega meu braço e me empurra para longe.
— O que é isso, Murat? Você deveria ficar feliz. Aqui trabalhamos em
equipe. Você teve a ideia e ele conseguiu o cliente.
Eu encaro meu pai, amenizando a vontade de mandá-lo para aquele
lugar bem bonito.
—É uma visão muito ingênua da situação. Ele roubou a minha ideia! E
equipe? —questiono ofegante. — Que equipe? Vocês me deixaram de fora.
Se eu não perguntasse eu nem saberia dessa reunião?
—Exatamente por isso. Para você não arrumar essa confusão toda.
Você sabe que não gosto dessa rixa entre vocês!
Eu solto o ar. Essa é boa!
—Tabor, saia. —Rosno para ele.
Tabor olha para meu pai como um mico adestrado, esperando sua
autorização. Ahmed acena um sim para ele, então ele sai. Quando fecha a
porta eu me viro para meu pai.
—O senhor quer enganar quem? Eu conheço seu jogo, pai. Desde que
Tabor começou a trabalhar aqui o senhor instigou essa competitividade toda
entre nós. Tabor está aqui, não por ser competente. O senhor sabe quantos
milhões eu já trouxe para a nossa companhia. Mas para o senhor me manter
sob controle, como uma ameaça, caso eu não ande na linha, o senhor tem
uma pessoa engatilhada para assumir a presidência.
Meu pai endurece o olhar.
—Pense como quiser. A verdade? Estou preparando sim Tabor para
assumir meu lugar caso você continue vivendo levianamente. Quero uma
pessoa séria para assumir a presidência, não um filho que me desonra com
essa sua má fama em lidar com a vida, sempre cercado de mulheres.
Balançando a cabeça em desolação, digo entredentes:
—Parabéns, pai. O senhor está criando uma cobra aqui dentro! Bem,
vou fazer lá fora o que faço de melhor, trazer alguns milhões para a
companhia. E acho que isso que deveria importar, não minha vida pessoal, ou
como lido com ela.
Saio do escritório e bato a porta com força, não costumo fazer isso,
mas hoje foi irresistível. Minha secretária coitada dá um pulo na cadeira e
agora está me olhando assustada.
Ester
Dia seguinte...
Rose foi maravilhosa, me indicou uma pensão só para mulheres e
pediu para o motorista da casa me levar para o endereço que ela deu para ele.
Depois de me registrar, Margot, uma senhora rechonchuda me
apresentou meu quarto e o lugar onde eu passaria meus próximos dias. Com
direito a uma refeição, almoço ou jantar. Escolhi o jantar, pois passaria o dia
fora.
Depois de acertar o mês adiantado com ela e ficar praticamente dura,
guardei minhas coisas no armário e virei minha chave. Saí para a rua para
mais uma batalha. Ainda bem que o lugar fica no centro, então poderei fazer
tudo a pé.
Foi o que fiz, com minha carteira de trabalho na bolsa sigo rumo as
agências que ficam aqui perto. Passei quase o dia inteiro preenchendo fichas,
sendo entrevistada pelas recrutadoras.
Quando voltei para a pensão já eram cinco horas da tarde. Sem comer
nada o dia inteiro, tomo água na cozinha para passar a fome até a hora do
jantar às sete horas. Não posso me dar o luxo de gastar meu dinheiro com o
almoço por não saber quanto tempo ficarei nessa vida à procura de emprego.
Quando deu seis horas da tarde, estou deitada na minha cama de papo
para o ar. Entra uma mulher, bem baixa e meio gordinha de uns cinquenta
anos, quando ela se dirigi a cama vazia entendo que seremos colegas de
quarto. Ela se senta na cama e olha para mim.
—Oi. —Diz, simpática. —Meu nome é Raquel Hertz. Pelo jeito
dividiremos o quarto pelos próximos dias.
—Sim. Verdade. Eu me chamo Ester Marshal.
Ela sorri e se joga na cama de costas.
—Deus! Meus pés estão tão doloridos, estou quebrada.
—Está à procura de emprego? Ou você está chegando do seu trabalho?
—Estou procurando emprego, mas está tão difícil. E você? Está
trabalhando?
—Não, estou procurando emprego também —digo desanimada. —Faz
tempo que procura?
—Um mês e nada.
Pensei na vaga na casa dos Çeliks.
—Sabe cozinhar?
Ela se senta na cama.
—Sei.
—Saí de uma casa que estão precisando de auxiliar de cozinha.
—Verdade? Por que saiu?
—Eu queria arrumar um emprego na minha área —digo simplesmente.
—Qual é a sua profissão?
—Eu fui recepcionista em um grande hotel. Falo bem o espanhol, meu
pai me ensinou. Ele nasceu em Madri e veio quando era jovem para a
Inglaterra.
—Ah, entendi. Nesses tempos difíceis não podemos nos dar o luxo de
escolher, mas como você sabe bem o espanhol, eu entendo. Você pode me
passar o telefone dessa família?
Eu meneio um não com a cabeça.
—Não, eles são muito fechados. Você precisa ir na Escala. É a agência
que eles usam para o recrutamento.
Ela sorri.
—Farei isso. E se eu souber de alguma coisa na sua área eu te falo.
—Obrigada.
Ficamos conversando, nos desabafando, falando sobre a vida, de como
tudo está difícil, a falta de dinheiro e os muitos desempregados. Sim, é nítido
como vivemos uma crise.
Embora a conversa tenha fluído bem entre nós, não abri nada da minha
vida para Raquel, ela também não e, eu entendo o porquê. Nossas vidas estão
em transição. Hoje estamos aqui, amanhã talvez não. Então é difícil criar
laços profundos com alguém com a vida em movimento.
Murat
O guarda-roupa dela vazio me deixou com a mandíbula contraída.
Sinto um misto de dor, raiva e decepção, os três sentimentos apostando
corrida para ver quem cresce mais no meu coração. O que mais me confunde
é esse aperto que sinto na garganta. Angústia?
Ofego e caminho de um lado para o outro no antigo quarto dela.
Então ela foi embora? Se aproveitou da minha partida para sair da
casa, fugir de mim. Não sei por que eu me importo, sinceramente não
entendo o que vi nessa mulher, mas a vontade dar um soco na porta do
roupeiro quase me domina. Respiro fundo e fecho os olhos tentando não
perder meu autocontrole. Saio do quarto dela na surdina, da mesma forma
que entrei. Alcanço meu quarto e me sento na cama, fito minhas malas no
canto da cama.
Retiro meu paletó e minha camisa. A gravata eu já havia retirado antes
para vê-la, cheio de empolgação, como um adolescente. A pego sobre a cama
com raiva e a jogo longe.
Idiota! Tão logo cheguei fui ao seu quarto, ansioso, cheio de saudade,
morrendo de vontade de beijá-la, de sentir seu cheiro, de revê-la.
Essas últimas horas eu estava insuportável, apressando tudo que eu
tinha que fazer, louco para chegar em casa e ver Ester.
Encontrar seu quarto vazio foi como levar um soco na minha cara
dizendo: Acorda! Esqueça essa garota. Você sempre foi racional e agora está
pondo tudo a perder. Deixando que suas ações sejam dominadas pelo desejo
que você sente por essa mulher.
Puxo na minha mente todo meu sonho de ser presidente, revivo todos
meus esforços para isso e me levanto determinado a fazer isso acontecer.
Preciso esquecer esse rabo de saia e tentar enxergar Hazal com um prisma
diferente. Na hora sinto um baque por dentro com meus pensamentos; o
coração batendo mais forte, a respiração descompassada dizendo o oposto,
como se eu tivesse me permitindo ser amordaçado, indo de encontro ao meu
acorrentado destino.
—Que se dane! —Como uma máquina, aniquilando sentimentos
contrários exclamei.
Está na hora daquele verme do meu primo ser colocado no seu lugar,
meu futuro ditará isso. Talvez meu pai esteja com a razão em querer que eu
me case com uma mulher da minha cultura. Ao menos meu futuro não seria
incerto, e eu não teria surpresas pelo caminho.
Quem é Ester?
Um rabo de saia com cabelos de fogo, com aquela voz sexy do
inferno, sempre pronta a me desafiar, me fazendo subir pelas paredes com
suas negativas.
De repente me lembro que ela era a visão mais sexy do mundo quando
eu a pegava de jeito nos braços e ela me olhava com aqueles olhos verdes
arregalados, os lábios naturalmente vermelhos separados.
Irritado desato meu cinto e o puxo, o jogo com raiva no chão,
afastando pensamentos que querem contradizer a minha razão querendo me
levar para o lado sentimental da coisa.
Eu nem a conheço direito!
Não! Não posso estar gostando dela! Eu a queria apenas na minha
cama!
Capítulo 16 -Uma semana depois...
Ester
Uma semana e nada de emprego. Ao contrário de Raquel, que hoje
cedo me ligou no celular dizendo que conseguiu a vaga na casa dos Çelik.
Meu coração disparou com a notícia. Ela me disse que ligaria mais a noite e
me passaria suas impressões com relação aos patrões.
Estou agitada agora, olhando toda hora o celular. Ansiando por sua
ligação.
Quando meu celular toca e o nome Raquel surge no visor, eu o pego
na mão e quase e o derrubo. Já são nove horas da noite. Com certeza ela já
serviu o jantar para todos e está me ligando do seu quarto.
—Raquel?
—Oi, Ester.
—E aí? Gostou do emprego?
Ela funga no telefone.
—Rose e Norma são como você disse, uns amores. Mas fiz como
pediu, não mencionei que você me indicou a vaga.
Meu coração se agita.
—Sim, eles são muito desconfiados. São muito fechados por causa da
natureza Turca—solto o ar antes de perguntar—E os donos da casa? Teve
contato com eles?
Quando fiz essa pergunta foi a mesma coisa de perguntar se Murat
tinha chegado de viagem e se ela o conheceu.
—Sim, conheci todos hoje. O senhor e a senhora Çelik e, meu Deus, o
lindão de seu filho, embora eu o ache sem educação nenhuma.
Deus! Então ele chegou.
Sem educação? O que ela quis dizer com isso?
Eu engulo em seco.
—Murat? Sem educação?
—Muito. Extremamente irritado, reclamou de tudo. Que o leite estava
frio, que o pão estava murcho. Coitada da cozinheira. Ainda bem que eu só
servi. Ela que fez toda a refeição dele.
—Entendo.
—Norma disse que geralmente ele não é assim, mas que não sabe que
bicho mordeu o rapaz. Parece que ele está assim desde que chegou de
viagem.
—Verdade? —Questiono e digo com o coração apertado. —Nossa! O
que me livrei!
—Sim, verdade. Ainda bem que o homem não quis jantar hoje e eu
não tive que servi-lo.
—Bem, Raquel. Boa sorte. Espero que tudo dê certo para você aí.
—Obrigada por tudo. Eu já estava um bom tempo desempregada.
Minhas economias estavam acabando. Nem sei o que faria se você não
tivesse me dito sobre essa vaga.
—Que bom! Então boa noite.
—Para você também.
Deitei-me na cama e fiquei a olhar para o teto. Já conheço cada
rachadura nele, de tanto olhar para ele pensando na vida.
Será que Murat estava assim por que fui embora?
Não! Não pode ser! Nem nos conhecemos o suficiente para ele agir
dessa maneira. Algo deve ter acontecido no trabalho para deixá-lo assim.
Talvez a soma disso, o trabalho e descobrir que suas investidas caíram por
terra. Afinal, do jeito que ele é arrogante, deve ter ficado morto de raiva por
ser dispensado por uma mulher, uma simples empregada.
No dia seguinte acordo cedo. Isso já virou rotina. Tomei um banho
morno em um dos dois banheiros muito disputado. Vesti uma saia social e
uma camisa branca. Sapato de saltos altos.
Hoje tenho entrevista como recepcionista numa construtora.
— Bom dia. — Cumprimentei Margot, a dona da pensão.
Ela todo dia tem me cedido um café reforçado da manhã mesmo que
isso não esteja no contrato. Acho que devido a minha magreza.
—Bom dia. Mais uma entrevista de emprego?
—Sim, espero que tudo dê certo. É a primeira entrevista na minha
área. Só tem surgido empregos que não tenho experiência.
—Claro que dará e você está muito bonita. Aliás, você é linda.
—Ah, obrigada. Quero causar boa impressão.
—Olha que preparei para você.
Ela coloca um prato de ovos mexidos com queijo, café com leite e
torradas. Eu sorri, emocionada.
—Nossa! Você me fez um banquete. Obrigada.
Uma garota se aproximou de nós e eu me calei, pois todas na pensão
pensam que eu pago por isso.
—Coma, antes que esfrie. —Ela diz e se afasta.
Assinto e comecei a comer devagar, saboreando meu café da manhã
pois depois só o jantar. Meus pensamentos então começam a me levar para
longe. Eles sempre voam para Murat.
Fico me perguntando se ele vai se deixar um dia ser dominado por seu
pai ou se ele vai acabar cedendo e se casando com Hazal.
Raquel não me ligou mais.
Melhor!
Já está difícil me esquecer daquele deus turco, imagine então se eu
ficasse me informando das coisas que acontecem na casa dele, sabendo de
sua rotina e tudo que o cerca.
Lavei minha louça e depois de dar um beijo em Margot, saí para a rua
com o endereço que a agência tinha me dado em mãos.
Comecei a caminhar em direção ao ponto de ônibus que me levará até
a área comercial da cidade quando meu celular tocou. No visor tia Elizabeth.
—Oi tia.
—Como estão as coisas? Já está trabalhando meu bem?
Soltei o ar lentamente.
—Sim e não. Eu estava numa casa de família, mas não deu certo.
Agora estou indo fazer uma entrevista.
Ouço seu suspiro no telefone.
—Você sabe que a minha casa está de portas abertas para você.
—Sim, eu sei tia. Mas voltar para York? Tenho medo de encontrar
aqueles homens novamente.
—E se eu falasse com sua mãe? Explicasse a situação, que você foi
ameaçada.
Minha mãe? Ela é minha mãe porque me pariu, a vida toda fui criada
por empregadas. Ela sempre foi mais chegada no meu irmão. Sempre achei
que éramos filhos de pais diferentes por isso.
—Ela me culpa pela morte do meu irmão. A senhora não irá conseguir
nada com ela—digo caminhando distraída na calçada.
—Eu posso tentar. Se você pagar esses traficantes poderia morar
comigo e tentar algo aqui mesmo em York.
Solto o ar.
—Tia, tenta. Eu não vou pedir nada para ela. Já foi muito humilhante
ter pedido da outra vez. Ela me culpa pela morte do meu irmão. Ela está se
lixando para mim.
—Eu irei conversar com ela.
—Está certo, beijos.
Uma maré de tristezas me invade querendo me derrubar, mas eu a
afasto determinada e cerro os dentes. O farol de pedestre está para fechar.
Desço da calçada para atravessar a rua ao mesmo tempo que tento guardar o
celular na bolsa. Um barulho horrível de brecada de pneus. Meus olhos
assustados para um carro preto.
Deus!
Sinto o baque e a dor.
Tudo voando.... Eu voando e depois indo ao chão.
Mais dor e escuridão.
Capítulo 17- Más notícias
Murat
Meu pai construiu seu império sozinho, vindo do nada. Por isso é
sempre dele a última palavra para tudo. Mal sabe ele o que estou armando
bem debaixo do nariz dele. Não me orgulho disso, mas se eu não o fizer, ele
me come vivo.
Agora ele está aqui no meu quarto exibindo um sorriso satisfeito no
rosto:
—Então irá na casa de Hazal hoje?
—Irei. —Digo sem sorrir colocando o meu blazer marrom.
Meu pai aperta meu ombro direito.
—Ela é uma ótima garota. Você escolheu bem, meu filho. Ainda bem
que não evoluiu nada com as outras que apresentei. Hazal realmente é a
melhor.
Eu lhe dou um sorriso frio.
—Eu sei.
—Sua mãe não me amava quando nos casamos. Eu mal a conhecia. O
amor foi construído ao longo dos anos, pedra sobre pedra. Claro que não é
empolgante como uma paixão, mas o que tenho é forte e durável. A paixão é
algo fugaz, ela vem rápido e passa.
Solto ar ainda tentando me convencer sobre isso.
—Bem, vou indo. Já estou atrasado. —Digo me sentindo como se
fosse a um jantar de negócios.
Desde que Ester se foi eu continuo naquele empenho de conversar
normalmente, comer, dormir, e fazer o que deve ser feito. Como uma
máquina sem sentimentos.
Nenhuma mulher agitou as coisas aqui dentro. Não sei o que eu vi
naquela ruivinha. Penso enquanto checo se minha carteira está no bolso com
uma expressão carrancuda.
—No começo será assim, nada excitante, mas aos poucos você a
conhecerá e verá que tudo mudará. —Ele então solta o ar.—Bem, eu vou me
recolher cedo.
Ergo os meus olhos e só então reparo na expressão cansada dele.
—O senhor não me parece bem.
—Estou com a artrite atacada, isso tem me roubado noites de sono.
—Vai ver isso pai. Não fica tomando remédio por conta. Quer que eu
peça para Rose marcar o reumatologista para você?
—Eu já marquei para sexta-feira.
Eu aceno e toco o ombro dele.
—Ótimo, se cuida.
—Vou me cuidar. E lembre-se que quero o teu bem.
Eu estico meus lábios forçando um sorriso e saio do quarto. Quando
estou passando pela sala vejo Rose ao telefone. Ela logo que me avista faz
sinal para eu esperar. Eu aceno um não. Estou realmente atrasado. Seja lá o
que for ficará para depois.
—Murat. —Ela insiste tampando o bocal do telefone.
—Estou atrasado Rose. Isso não pode esperar?
Segue então um estranho silêncio, isso envia um sinal de alerta para a
minha cabeça.
—Estão me ligando do hospital São Lucas. Ester sofreu um acidente.
Eles entraram em contato conosco através do nosso endereço e telefone que
ainda estavam guardados na bolsa dela.
Cerro os punhos, nervoso. Ao mesmo tempo estou agitado por dentro.
Meu coração se aperta em angústia.
—Acidente? Hospital? No São Lucas?
—Sim. —Ela diz angustiada. —Eles tentaram...
Eu a interrompo:
— Eu irei vê-la! Ligue para Hazal agora e desmarque o jantar, diga
que tive um imprevisto. Não fale nada disso para o meu pai. Tudo bem?
Ela acena um sim.
—Está certo. Vou dizer para atendente que você irá vê-la.
Assinto e ela volta a falar ao telefone. Eu saio de casa agitado com se
uma nuvem negra me perseguisse.
Deus! Sinto um gosto amargo na boca pensando no que pode ter
acontecido com ela.
Ester
Quando desperto a luz que vem de uma janela fere meus olhos. Reparo
de repente que estou num quarto completamente estranho. A consciência do
meu corpo dolorido me faz rever toda cena do meu atropelamento.
—Allah'a şükür! —Ouço aquela voz profunda. Eu a reconheceria em
qualquer lugar. Não! Por favor diga que eu estou imaginando essa voz.
Com o coração agitado giro minha cabeça na direção dela e prendo a
minha respiração. Então eu o vejo. Murat está sentado ao lado de minha
cama. Nossos olhos se encontram. Há um brilho de preocupação nos olhos
dele, e ao mesmo tempo eles são áridos para mim.
—Murat? —Digo com voz débil.
Ele se levanta com a expressão séria:
—Vou chamar o médico.
Deus! Quem o chamou? O que ele está fazendo aqui?
Uma senhorinha se aproxima.
—Que bom que acordou. O senhor Çelik tem estado muito preocupado
com seu estado.
—Eu...
Murat entra com o médico. Um senhor grisalho de olhos azuis. Ele se
aproxima do meu leito e se inclina, começa a examinar meus olhos com uma
pequena lanterna com luz intensa. Se afasta para dizer:
—Você ficará bem. Com a batida seu cérebro estava inchado. Por isso
tivemos que entubá-la e sedá-la para que ele se recuperasse. Fomos retirando
a medicação aos poucos e depois os tubos quando ele desinchou. Tudo indica
que ficará bem. Faremos todos os exames para nos certificarmos disso.
Confirmando sua melhora é só cuidar de suas costelas que estão quebradas.
—Costelas?
Por isso o subir e descer da minha respiração doí tudo. Inclusive minha
cabeça, essa me dói horrivelmente.
—Sim, duas costelas quebradas e escoriações pelo corpo. Você ficará
mais um dia conosco para fazer exames. Se tudo estiver bem, amanhã à noite
terá alta.
Deus! Alta?
Eu me desespero.
Para onde vou assim?
Não posso voltar para a pensão? Ser um peso para Margô.
Eu me apavoro, mas não digo nada.
Preciso ligar para a minha tia.
Deus! Voltar para a casa dela nesse estado será muito penoso.
Vejo então Murat se aproximando da minha cama. Posso sentir o
cheiro dele daqui onde estou. Divino, maravilhoso. Estremeço. O médico fala
algo para ele e sai. Ele então olha para mim.
Ele está lindo como sempre, embora pareça abatido. Ficamos nos
encarando em um silêncio constrangedor. Ele então dá um passo na minha
direção.
—Aluguei um apartamento e contratei uma da cuidadora para ficar
com você lá. Ela fez enfermagem. Ela te assistira em tudo que você precisar.
Eu abro a boca sem falas por suas ações.
—Eu...não...sei o que dizer.
Seus olhos não são compassivos para mim. São duros.
—Não precisa dizer nada. Mesmo porque acho que não tem escolha.
Andei te investigando. Está hospedada numa pensão para mulheres. Tenho
certeza que não vai querer voltar para lá em suas condições?
Ficar sob domínio desse homem. Deus! Melhor não!
—Eu posso ficar com minha tia. Ela mora em York.
Minhas palavras saíram de mim como se fosse um erro, pois Murat
ofega como se eu o tivesse ofendido. Seus lábios se contraem e ele me olha
com olhos mais duros que eu já presenciei nele. Meus lábios tremem, abalada
com seu olhar.
—Essa tia mora aonde, posso saber?
Deus! Engulo em seco e digo com relutância:
—Em....York
Murat ri amargo e então puxa o ar como se exercitasse a paciência
comigo.
—York fica há quatro horas daqui? Quatro horas daqui, e você prefere
ligar para a sua tia do que aceitar minha ajuda? Você ficará comigo e isso não
será algo a ser discutido! Entendeu? Allah! Você deve me querer pelas costas
mesmo!
Eu passo a língua pelos meus lábios ressecados.
—Eu só não quero causar nenhum transtorno. Eu pagarei cada centavo
que está gastando comigo.
Murat sorri, um sorriso frio. Então seus olhos brilham e eu engulo em
seco pois não gostei nada do olhar predador que minhas falas provocaram
nele.
—Ótimo.
Eu continuo rápido:
—Posso trabalhar para você de alguma forma. Você descontaria do
meu salário.
Ele me estuda e depois sorri meneando a cabeça, como se minhas
palavras fossem absurdas, então ele olha para mim. Como se o valor que eu
recebesse lá fosse irrisório.
Deus! Seu pai...Não vou pensar nisso agora.
—Não pense nisso agora. Você precisa se recuperar. —Ele diz como
se lesse meus pensamentos.
Fecho os olhos. Minha cabeça dói tanto, terrivelmente agora,
forçando-me a manter as pálpebras fechadas. É difícil até pensar em qualquer
coisa que não seja entrar na escuridão e aceitar tudo que ele me oferece.
—A cuidadora que contratei ficará com você agora. É bom que se
acostume com ela, pois depois ela continuará com você no apartamento.
Eu abro os olhos, embora seja muito penoso fazer isso.
—Desde quando eu estou aqui? Quando você soube do meu acidente?
—Completa uma semana hoje , eu tenho acompanhado seu caso desde
o começo. —ele diz seco. —Se não tivesse saído da minha casa da forma que
saiu, não ficaria exposta na rua procurando emprego. Nada disso teria
acontecido!
Eu fecho os olhos novamente.
Ele está me culpando agora?
Lógico que saí!
Que alternativa eu tinha? Não quero confusão, minha vida é uma
confusão.
Uma lágrima então desce sem que eu consiga contê-la. Sinto a mão de
Murat nos meus cabelos e seus lábios na minha testa.
—Shiiii. Ficará tudo bem. Você verá. Perdoe-me se fui rude com você.
É que me tira do sério.
Eu abro os olhos e mais lágrimas descem. Encontro seus olhos
incrivelmente carinhosos agora nos meus. Assinto para ele com a cabeça.
—Preciso ir. Vou tomar um banho, comer alguma coisa.
As falas dele me fazem reparar nele melhor. Realmente ele parece
abatido, amassado.
—Você passou a noite aqui?
—Hoje passei. —Ele diz calmamente.
—Seu pai está sabendo disso?
—Não — ele diz seco e pelo jeito nem vai saber. Então ele me dá um
beijo na testa. —Vou indo. Amanhã venho te pegar para te levar para o
apartamento.
—Está certo. E... obrigada—digo num sussurro.
—Estou feliz que esteja de volta...da inconsciência. — Ele diz
suavemente, os olhos ardentes fixos nos meus...
—Eu também...
Ele ainda me olha por um tempo e acena com a cabeça e se afasta,
saindo do quarto. Imediatamente uma senhora entra e ocupa a cadeira que
Murat estava sentado. Eu fecho os olhos e fico em silêncio. Não querendo
pensar em nada, essa dor de cabeça não me deixa. Até a luz me incomoda.
Dormir é melhor que pensar nesse momento.
Aos poucos meus olhos vão ficando pesados e não demora muito eu
caio na escuridão.
***
Murat
Entro em casa e imediatamente meu pai vem na minha direção.
Relanceio o olhar para a janela da sala e contemplo o deprimente espetáculo,
relâmpagos iluminam o céu, nuvens pesadas anunciam a tempestade se
formando lá fora, mas o que me preocupa é com a que está se formando aqui
dentro.
—Aonde você estava?
Voltei a cabeça para o meu pai.
—Não te devo satisfação. Meu trabalho está em dia, não está? Esse é
seu limite. Cobrar meu trabalho, quanto ao meu dia a dia, minha rotina e o
que faço, nunca te dei essa abertura e não é agora que vou dar.
Num gesto nervoso, meu pai pega o meu braço quando estou para
deixar a sala.
— Você tem um compromisso com Hazal! Quer pôr tudo a perder? —
A voz estridente chega aos meus ouvidos. —Eu fui ao seu quarto. Você não
dormiu em casa. O que há com você?
Eu retiro suas mãos do meu braço.
—Pai, como eu te disse, tenho trinta e seis anos e não te devo
explicação.
—Pensei que finalmente essa sua vida devassa fosse acabar. Mas pelo
jeito me enganei. E quando você se casar? Será assim? Desrespeitará os
costumes? Terá essa vida mundana?
—Não! Serei o homem que devo ser. Não faria isso com ela. —Digo
com minha raiva contida.
—Pensei que finalmente estivesse apaixonado, gostando de Hazal —
meu pai me olha tentando me entender.
Minha vida está uma confusão de sentimentos. Minha rotina mudou
depois que soube de eu acidente e o que menos tenho pensado desde que eu
soube que Ester estava internada é em Hazal.
Bem, eu já não pensava muito nela desde que Ester saiu da minha
vida, essa é a verdade...
—Para mim ela é uma grande mulher, virtuosa, blá, blá, blá...
Meu pai blasfema em turco:
—Não encare tudo com cinismo.
—Pai, bom dia para o Senhor, se me der licença, hoje é Sábado e eu
vou dormir até mais tarde.
—Não dormiu essa noite? —Meu pai pergunta com desprezo.
—Não, não perdi meu tempo dormindo. —Digo e saio da sala.
Pela cara que ele fez, tenho certeza que a vontade dele é me bater com
uma vara como ele fazia quando eu era adolescente. Tenho vontade de jogar
tudo para o alto. Dar um basta nessa dominância de meu pai. Mas nunca agi
pelo coração, sempre fui razão e quero a presidência, custe o que custar!
Finalmente eu descobri um jeito de estar sob controle da situação, mas
isso levará tempo. Tenho amarrado todos os contratos que conquistei ao meu
nome. Sem mim, não há negociações, nem transações futuras. Meu coração
se fecha em dor por ter que mentir, enganar, trapacear. Sinto como se eu
jogasse toda os ensinamentos de minha mãe no lixo, mas não consigo evitar.
Sei que meu pai jogaria sujo comigo caso precisasse.
Por que eu agiria diferente?
Hazal seria sim, a mulher certa para casar se não fosse por um pequeno
detalhe, essa fascinação que sinto pelos cabelos de fogo...
Capítulo 14-Lar doce lar...
Dia seguinte...
É tarde, nove horas da noite, meus olhos estão fechados, mas não estou
dormindo.
Ontem passei o dia sentada esperando Murat, o tempo todo olhando
aquela porta, mesmo quando meu cérebro me dizia que eu era uma idiota
fazendo isso. Quando ele não veio, me recusei a ficar com pena de mim
mesma. Mesmo que eu seja a garota desempregada, com uma mãe egoísta,
carente e agora dependente dele.
Limpo uma lágrima que rola no meu rosto.
Acho que ele não vem...
Estou pensando nisso quando sinto seu cheiro maravilhoso que o
precede. Meu coração dispara e antes que eu o encare sinto sua mão afagando
meus cabelos. Minha respiração se intensifica. Abro meus olhos devagar.
Deus! Ele está lindo com um terno negro bem cortado revelando seus
ombros largos. A gravata vermelha se destaca por causa da camisa branca.
Meu coração se enche de alegria em vê-lo.
—Oi—digo.
Ele se senta no cantinho da minha cama. Estuda meu rosto.
—Você está bem?
Eu o encaro, tentando enxergar nele real preocupação.
—Eu...acho que sim.
Ele dá um sorriso lento.
—Tereza e Julia têm dado conta do recado?
Eu lhe dou um leve sorriso.
—As duas são maravilhosas. Tereza faz tudo para me agradar com
seus pratos maravilhosos e Julia é uma ótima cuidadora.
Ele amplia seu sorriso, parece realmente aliviado por eu estar sendo
bem tratada.
—Você veio direto do trabalho ou passou em casa? —Pergunto.
—Vim direto, mas antes passei num restaurante de comida japonesa.
—Verdade? —pergunto séria, o avaliando com os olhos.
Todo esse cuidado. O que tem por trás de suas ações?
—Sim, comprei um combinado. Tereza está desembalando, daqui há
pouco ela trará para nós.
— Vou precisar comer com palitinhos? —Pergunto o avaliando
novamente e lhe dando um leve sorriso.
Ele sorri.
—Não, claro que não.
—Que bom, pois eu não saberia comer com eles.
—Ninguém é perfeito —ele diz num tom jovial passando seus olhos
por meu rosto.
Tereza nessa hora entra com a bandeja, os quitutes dentro de uma
barca. Murat se levanta e ergue minha cama um pouco mais. Puxa então a
mesa hospitalar e a posiciona na minha frente. Pega a barca das mãos de
Tereza.
—Nossa! —Eu digo quando ele a deposita em cima da mesa. —É
linda. Perfeita.
—Não só bonita visualmente. É tudo muito gostoso também.
Tereza me dá um sorrisinho antes de deixar o quarto. Ela deve estar
achando que somos um casal de pombinhos.
Deus!
—Vamos! Prove esses sushis de salmão com raiz forte. Tem molho de
gengibre e shoyo também.
Eu peguei um.
—Não! Eu quero primeiro sentir o sabor deles.
Ele me olha inseguro.
—Sério que nunca comeu?
Eu aceno um não para ele.
—Nunca.
—Espero que goste —ele diz demonstrando toda a sua insegurança. É
tão verdade esse sentimento em seus olhos. Ele realmente está preocupado
em me agradar.
—Claro que irei gostar! Geralmente não sou chata para comer.
Ele sorri, aliviado. Parece verdadeiramente aliviado.
Comemos tranquilamente, Murat me fez provar todos. Um mais
gostoso que o outro. Nunca pensei que um dia fosse gostar de comer peixe
cru. Quando finalizamos a refeição eu digo:
—Gostei muito, estava tudo maravilhoso.
Murat se levanta e afasta a mesa então olha para mim.
—Que bom que gostou.
Seus lindos olhos negros me estudam por um tempo e então olha o
relógio.
—Bem, preciso ir.
—Tão cedo... —As palavras escapam dos meus lábios.
Ele me olha estacado, sem ação. Seu rosto então suaviza.
—Amanhã vou viajar cedo. Não sei quanto tempo ficarei fora —ele
diz seus olhos avaliando meu rosto, tentando ler minha alma.
—Tudo bem —digo disfarçando meu desapontamento.
Murat se senta ao meu lado. Então pega a minha mão.
—Se precisar de qualquer coisa peça a Tereza. Ela providenciará para
você. Aproveitando que estou aqui, você precisa de alguma coisa?
—Meu celular. Pedi para Julia procurar nas minhas coisas, mas ela não
o encontrou.
Ele me olha profundamente, com certeza me lendo, me analisando;
sem nem ao menos piscar como em transe, prendendo meu olhar no dele.
—Ele deve ter se perdido no acidente. Por que precisa do celular? —
Pergunta num tom seco, seu rosto ainda é sério, atento ao meu rosto.
—Para falar com minha tia...
—Sua tia mesmo? —Questiona, sua voz é contida, como se ele tivesse
se esforçando para isso.
Meu coração se agita. Ele está com ciúmes?
—Sim. Não tenho ninguém. Nenhum homem. É essa a sua
preocupação?
Deixando de me analisar ele pisca como se dessa conta de algo.
—Eu compro um novo para você.
Eu engulo em seco. Não consigo relaxar com ele, não sei o que se
passa na cabeça de Murat, quais as suas reais intenções. Resolvo perguntar:
—Posso te fazer uma pergunta?
—Claro—ele diz, atento a expressão do meu rosto.
—Se eu ficar bem e quiser partir... você aceitará isso numa boa?
Seus lábios tremem e ele parece reagir mal a minha pergunta. Seu
rosto é sério, seus lábios estão entreabertos com sua respiração agitada. Ele
parece irritado, nervoso.
—Você é livre, Ester. Como eu disse, não te estendi a mão para te
prender a mim. É isso que pensa?
Eu engulo em seco, meu rosto afogueado, não consigo responder por
causa da expressão dele que parece uma pedra, seus olhos como balas me
almejando.
—Meu coração é de carne. Não de pedra como pensa —diz e se
levanta. —Bem, vou indo.
Ele se inclina e me dá um beijo na testa, um beijo seco, firme, de
despedida. Então se afasta. Ombros largos, passos decididos, peito estufado;
agarrando-se ao seu orgulho ele deixa meu quarto.
Obrigada mãe! Por eu ser assim, desconfiada de tudo e todos, por não
conseguir confiar em ninguém e colocar todos numa lista negra com o título
"Ele só quer se aproveitar de você".
Deus! O que eu estou fazendo?
Preciso dar uma chance para ele...
Tentar compreendê-lo nesse meio tempo...
Murat
Sábado de manhã...
Ester
Murat tem me ligado todos os dias. Percebi nessas breves conversas
que ele mudou comigo, acho que ficou chateado em ver a minha preocupação
em me ver livre dele.
Estou tão confusa agora. Não sei se isso é bom ou ruim. Rebobinei
minha memória dos motivos que me fizeram sair da vida dele e entendi que é
isso que eu devo me apegar. Preciso relaxar e, o que tiver que ser, será...
Ontem, como sempre, depois do almoço nos falamos. Ele me disse que
virá hoje me visitar.
Agora são dez horas da manhã e eu estou na sala, sentada no sofá à
espera dele.
Não demora muito escuto o barulho da chave. A porta se abre. Murat
entra. Seus olhos logo encontram com os meus. Meu coração se agita no meu
peito.
Ele me dá um sorriso fraco, que não é natural dele. Ele não sorri assim.
Ele teria me dado um sorriso predador se ele estivesse no seu normal.
Reparo como ele está lindo vestido com uma calça preta de brim,
camiseta branca e jaqueta de couro da mesma cor que a calça.
—Oi—digo e abro o sorriso.
Ele caminha até onde estou e sério se inclina e me dá um beijo na
testa.
—Oi
Seu cheiro maravilhoso no meu nariz, seus lábios quentes e úmidos na
minha testa fazem meu coração se agitar mais ainda. Ele então se senta e me
encara, ainda com a mesma expressão. —Pelo visto está melhor.
—Ainda estou com dor, mas é horrível ficar numa cama.
Seu olha endurece.
—Você não deveria abusar. Essa fase passará mais rápido se seguir as
recomendações do médico. E pelo que eu saiba, não era para você ficar
andando por aí.
Eu solto o ar. Eu estou enganada ou ele está louco para se livrar de
mim?
—Murat, você veio para me dar um sermão ou para me ver? Caminhei
ao lado de Julia até aqui, devagar.
Ele passa a mãos nos cabelos num gesto nervoso.
—Tudo bem. Esqueça isso! —Ele coloca a mão na jaqueta e estende a
caixa do celular como prometido. Sem embrulho para presente. Sem
surpresas. Ontem mesmo ele disse que me daria um celular.
—Um Iphone 10?
—Gostou?
—Claro, Murat. Você me deu simplesmente o melhor! —Digo mal
olhando para o celular, encarando Murat, tentando entender esse homem.
—Sempre quero o melhor —ele diz e desvia os olhos dos meus e
então suprime um bocejo.
—Quando você chegou de viagem?
Ele me encara.
—Ontem de madrugada. O voo atrasou.
—Deve estar cansado.
—Já estou acostumado.
—Você almoçará aqui? —O questiono, o coração agitado.
Ele me olha por um tempo então diz:
—Vou almoçar na casa de Hazal.
Sinto como se uma faca aguda desferisse no meu coração. Claro! Ele
ainda continua com isso...
—E você e ela? Como anda a relação de vocês?
—Não anda. Não é uma relação. É uma peça. Somos atores de um
palco armado. Para não dizer um circo, onde somos os palhaços deixando
todo mundo feliz.
Eu meneio a cabeça com descrédito.
—Ela pode estar gostando de você...
—Ela gosta de um cara da faculdade —Ele diz confiante.
Eu lhe dou um sorriso frio.
—Você acreditou nisso? Ela pode ter dito isso para você não se sentir
culpado quando terminar tudo entre vocês.
Murat me olha confuso, mas por pouco tempo, logo seus olhos me
olham determinados.
—Não, ela me disse a verdade. Ela não mentiria sobre isso.
—Acho que é mais fácil acreditar nisso, não é? A consciência fica
mais leve.
A respiração de Murat se agita.
—Eu sei quando uma mulher está interessada. Admito que no começo
Hazal estava, mas ela caiu na realidade. Ela não é masoquista ao ponto de
ficar ligada a uma pessoa que a encara como uma estratégia para ter controle
de sua vida.
Acho incrível que Murat não tome nenhuma atitude contra isso.
—Controle? —Eu o provoco. —Que controle?
Seu olhar endurece, percebo que seu maxilar está rígido, ele está tenso.
—Não espero que entenda. —diz com indiferença. — Bem, vou indo...
Ele se levanta.
—Não te entendo mesmo, Murat. E isso é uma das coisas que nos
separou e nos separa até hoje.
Seu olhar é intenso. Murat é um homem intenso, sua expressão exala
poder, ele consegue passar exatamente o que sente apenas com um olhar, isso
quando ele quer, pois ele consegue esconder debaixo de uma frieza também.
Ele me encara duro e se senta novamente. Seus olhos bem fixos nos
meus.
—Recapitulando, você fugiu de mim. Não nos deu nenhuma chance,
saiu da minha vida mesmo com o meu pedido para que ficasse e esperasse eu
chegar de viagem para conversarmos. E agora me acusa de não me entender?
Eu engulo em seco. Ele me deixa confusa.
Ele continua:
— Olha, não quero que sua estadia aqui seja desagradável. Sei também
que não entende o papel de Hazal na minha vida e eu não vou me desgastar
tentando te fazer entender tudo isso. —Ele olha o relógio e se levanta. —É
isso...bem vou indo.
Sim, é isso e acabou!
É isso que ele está me dizendo.
—Ótimo! —Digo, seca. Como se tivesse louca para me livrar dele.
Seu olhar se torna duro e ele se vira, sai furioso. Sua cólera é tão
grande que ele bate à porta. Tereza entra na sala. Julia em seguida.
—O que foi isso? —Tereza pergunta.
—Um turco sendo turco.
Dois dias depois...
Murat
Há mais de quinze dias que eu não vejo Murat. Agora ele está aqui,
sentado no cantinho da minha cama.
Ele faz um pequeno movimento para frente como se fosse me beijar,
mas ele apenas ajeita melhor meu travesseiro. Meu coração dispara com sua
aproximação. Ele sempre tem esse efeito devastador em mim. Não consigo
disfarçar meu olhar de desejo, ao mesmo tempo que fico tensa, quase
petrificada. Só não pareço uma estátua pois minha respiração está agitada.
Ele percebe o quanto sua aproximação mexeu comigo. Seus olhos
ficam mais escuros nos meus, mas ele se afasta ainda mais.
—Tem falado com sua tia?
Seus olhos lindos nos meus me deixam ainda mais tensa por causa das
reações do meu corpo. Morri de saudades dele, essa é a verdade.
—Sim...mas não contei nada do acidente. Não acho certo preocupá-la.
—Digo, meus olhos descem para os seus lábios sem que eu possa me conter.
Ele ofega e movimenta a cabeça de um lado para o outro, como que
negando algo para si mesmo. Então se levanta e pega um copo que está no
aparador e o enche com água e toma o líquido de uma vez.
—Como andam as coisas? Seu trabalho? —Pergunto para quebrar um
pouco essa tensão entre nós.
—Mais ou menos. Há muitos clientes meus em potencial que preciso
visitar, mas está difícil marcar uma reunião.
—Por que está difícil?
—Porque essa reunião precisa estar presente o dono, o presidente da
corporação. E eles são homens muito ocupados.
—Então você não tem viajado esses dias? —pergunto com aquela
pontinha de mágoa por ele ter sumido todos esses dias.
Ele se senta na minha cama e me olha mais sério ainda.
—Não.
Eu desvio meus olhos dos dele, não gostando dessa sensação de
tristeza que isso me provocou.
— Você não está chateada por eu não ter vindo aqui antes, está? —Ele
me pergunta e se senta ao lado da minha cama. — Eu não pude vir, toda hora
surgiu alguma coisa, mas todos dias liguei para saber como você estava.
Meu íntimo está agitado, no entanto eu o encaro com a expressão
serena. Seus olhos perscrutam o meu rosto, tentando ler mais do que eu
demonstro com a minha expressão de “está tudo bem”.
—Não, eu sei que tem sua vida —digo e forço um sorriso.
—Julia me disse que está bem melhor.
—Sim, tanto que quero dispensá-la.
Murat fecha a cara.
—Nada disso, ela ficará pelo menos mais quinze dias com você.
—Quinze dias?
A resposta de Murat foi olhar fixo para mim, de um modo que me
dizia que não mudaria de ideia.
—Murat... —insisto.
—Erga os braços!
—Como?
—Você me ouviu! Erga os braços!
Engulo em seco, pois dói muito fazer isso.
—Não vou erguer braço nenhum!
—Então Julia ficará!
—Tudo bem. O dinheiro é seu. —digo, mal-humorada.
—Sim, o dinheiro é meu.
Abaixo minha cabeça evitando os olhos de Murat.
Eu sei por que estou assim, irritada. Eu me apaixonei por esse homem
mesmo sabendo que não deveria ter me permitido. Minhas costelas irão sarar,
mas a dor no meu coração por ter me apaixonado por ele demorará muito
tempo para sumir.
— O que você tem cabelos de fogo?
Ergo meus olhos para ele. Faz tempo que ele não me chama assim.
—Eu estou me sentindo triste. Carência, eu acho. Eu me sinto muito
isolada.
Ele dá um sorriso torto.
— Carência? É quer mandar Julia embora?
—Ela não é muito de conversar —digo sem mentir, isso é pura
verdade.
—Posso pedir para ela mudar isso!
Deus! Não é essa resposta que eu esperava.
—Não! Não faça isso! É o jeito dela. Ela é fechada mesmo. É horrível
alguém ir contra sua natureza.
—E Tereza? Ela parece meio mãezona.
Eu sorrio com o feeling dele.
—Ela é, mas tem o trabalho dela.... Você poderia vir mais vezes me
ver. —As palavras saíram de minha boca antes que pudesse contê-las.
Ele me olha cuidadoso. Isso que está começando a me irritar nele. Seus
gestos são todos programados. Até o beijo que ele me dá ou quando sua mão
toca a minha, não tem nada de ameaçador.
—Eu verei o que posso fazer.
Eu verei o que posso fazer?
—Isso, olha sua agenda. Quando não estiver escrito Hazal, aí você
vem.
Murat sorri e aproxima seu rosto do meu.
—Você está com ciúmes?
A presença dele me desestabiliza, assim tão perto me faz perder o
fôlego. Não consigo falar enquanto Murat me olha, inundando-me com
sensações. É difícil respirar, ou pensar em qualquer outra coisa além da
masculinidade dele.
Sou uma confusão de sentimentos, estou me recuperando de um
trauma, mas estou bem o suficiente para me dar conta do quão esse homem
me afeta. Quando ele me olha assim, com certeza é uma válvula de escape
perfeita para as minhas emoções me tomarem de um jeito que eu me esqueço
até quem eu sou...
Eu precisei de uma grande força de vontade para conseguir responder
a ele:
—Não! Não estou com ciúmes.
Ele passa a mão no meu rosto, eu estremeço. Tenho certeza que o olho
como um coelho assustado.
—Hábitos antigos são difíceis de abandonar. Negar o que sente é um
deles.
Meu corpo arde com o toque dele, o calor do seu contato e seu hálito
soprando a minha pele me fazem ofegar, meu coração se agitar, minhas mãos
transpirarem, embora todas essas reações consigo endurecer meus olhos:
—Eu disse a verdade. Não sinto. Tenho certeza que não a ama. Ela só
é uma pobre coitada como... —Não completo a frase —deixa para lá.
Os lábios firmes dele abrem-se em um sorriso perverso.
—Complete a frase, Ester. Diga: Uma pobre coitada como a maioria
das mulheres que se envolvem com você.
—Sim, exatamente isso. Você as usa e depois as descarta. —Confirmo
com raiva por me lembrar disso.
Murat me solta e se afasta. Se coloca em pé.
—E você ainda quer minha companhia Ester?
Eu não respondo e ele me dá um sorriso frio. O meu coração bate mais
rápido, e tudo que eu consigo pensar é na minha vontade de estar naqueles
braços, na sensação de estar encostada ao corpo dele.
Ele olha o relógio.
—Bem, vou indo. Boa noite Ester. Dias melhores para você.
Eu estremeço, sem saber muito o que pensar sobre sua mudança
drástica de atitude.
Murat
Encaro Tereza sem falas. Ela dispensou Julia sem meu consentimento.
Comprimo a mandíbula, contrariado.
—Então ela deve estar bem.
Tereza sorri.
—Muito! Bem melhor.
—Que bom —digo, mas sinto um aperto forte no meu peito.
—Caiu cedo da cama hoje?
Eu solto o ar. A verdade é que não consigo evitar a necessidade de vê-
la. Enquanto ela estiver aqui, será assim. Depois, não sei...
—Eu viajo hoje à tarde, resolvi passar aqui para ver como Ester está
antes de seguir viagem.
—Que bom. Vá até a sala de jantar e eu te sirvo o café.
Eu arrasto a cadeira da cozinha e me sento nela.
—Pode me servir aqui mesmo.
—Você que sabe.
Enquanto Tereza prepara o café fico a olhar o vazio.
Ontem sai com uma garota. Allah! O sexo não foi bom. Foi tão
decepcionante. Eu apenas estava dentro dela para satisfazer minhas
necessidades. Pela primeira vez eu me senti como um animal. Gozei rápido,
querendo acabar logo com aquilo. Quando ela saiu do quarto do hotel eu me
senti vazio.
Decadente.
Ester entra na cozinha. Isso é o suficiente para meu coração se agitar
no meu peito. Seus olhos estão bem abertos, revelando sua surpresa. Ela está
linda, com um vestido de lã preto e uma bota de cano curto.
—Bom dia —digo com rouquidão na voz, sem conseguir tirar meus
olhos dela.
—Bom dia. Antes que diga alguma coisa. —Ela ergue os braços.
Meu coração se aperta novamente.
—É, Tereza me disse que dispensou Julia.
Ela puxa a cadeira e se senta ao meu lado.
—Estou surpresa de te ver aqui. Você nunca vem esse horário.
—Vou viajar hoje à tarde e ficarei fora um tempo. Então, passei aqui
para ver como você está.
—Graças a Deus bem, como pode ver.
Tereza colocou o bule com o café e a jarra de leite quente. Ester olha
para Tereza como que pedindo ajuda. Entendi que ela não consegue pegar
peso.
—Pode deixar —digo e sirvo o café em sua xícara. —Leite?
Ela me olha sem graça.
—Sim, um pouco.
Tereza pede licença e sai da cozinha para termos privacidade. Por um
momento, tomamos café em silêncio, cada um preso aos próprios
pensamentos. Eu relanceio os olhos para Ester. Ela está mais corada e
recuperou um pouco o peso. Está mais bonita. Ela que comia distraída ergue
os olhos para mim.
—A nova consulta está marcada daqui a quinze dias —ela diz,
achando que me esqueci.
Isso me deixa tenso, eu me recosto na cadeira tentando bloquear
minhas emoções.
—Eu sei. Estarei aqui para te levar à consulta.
Ela solta o ar.
—Embora nossas diferenças, gostaria de agradecer por tudo que tem
feito.
Eu a encaro.
Allah! Não vou conseguir deixá-la ir.
A cada dia que passa eu entendo que estou ligado a essa mulher de um
jeito inimaginável. Quando penso em sua partida me angustio. Eu quero Ester
e quero que ela me aceite minhas condições. O que tenho a oferecer a ela
agora.
É tarde para nós?
Eu estraguei tudo?
—O que foi? Você ficou calado de repente?
—Eu estou pensando em adiar a viagem que farei hoje. Pensei em
passarmos mais tempo juntos.
Ela engole em seco, seus olhos verdes bem atentos aos meus.
Ester
Murat me olha de um jeito indecifrável. Com o coração agitado e
tentando controlar minha respiração pergunto:
—Por que resolveu isso agora?
Ele me olha sem resposta então bufa. Esse jeito dele não me agrada em
nada.
—Por que precisa de uma resposta pra tudo?
Observo-o atentamente. Não quero espantá-lo, na verdade gostei muito
disso.
—Eu só gostaria de entender sua resolução.
Suas íris negras se encontram com as minhas, determinadas.
—Você disse que tem andado muito sozinha. A viagem pode esperar.
Esse homem é bipolar, só pode ser.
Eu sorrio.
—Tudo bem.
—Já terminou o café?
—Já.
Ele se levanta e me ajuda com a cadeira.
—Então vamos até a sala?
Eu me sento no sofá. Murat vai até as cortinas e as abre, permitindo
que o sol entre no apartamento. Detesto comer e não escovar os dentes. Com
um pouco de dificuldade eu me levanto do sofá.
—Eu já volto.
Murat assente para mim.
Murat
Ester
Ele parece nem ter me ouvido. O jeito que Murat olha meus lábios eu
já sei o que está prestes a acontecer. Sem que eu tenha tempo de me afastar e
dizer a ele que quero uma conversar, quero entender o que se passa realmente
no coração desse homem, ele me beija, de um modo profundo e exigente. Ele
beija meu pescoço, me aperta contra seu corpo. Sua mão entra pelo meu
vestido, me tocando intimamente, acariciando minhas pernas, me deixando
quente e úmida. Ele retira sua mão e gentilmente me traz mais para junto
dele, sendo devorada por seus lábios, sua língua quente na minha, dançando
sobre ela. Fico mole em seus braços e não contenho meus gemidos quando
ele escorrega seus lábios para o meu pescoço.
Aos poucos questões sem respostas vão se infiltrando no meu cérebro
e começam a me assolar.
Temos muito nós eu disse. Ele nem me contestou quando expliquei o
motivo da minha partida. Ele não resolveu sua situação. Continua levando
sua vida e o pior, ele não faz nada para mudar isso.
O que serei? Sua amante?
E a questão é: o que ele sente realmente por mim?
Eu abaixo minha cabeça e não permito que ele me beije mais. Murat
me olha ofegante.
—Murat... Não! Acho melhor deixar as coisas ficarem como estavam
antes.
Ele me olha aturdido por um momento, mas sem perder o desejo em
seus olhos. Isso faz meu coração se agitar mais. Ele parece possuído. Seus
lábios se apossam dos meus, exigentes, me forçando a corresponder. Como se
ele quisesse me convencer pela forte atração que sentimos. Meu sangue corre
com grande velocidade nas minhas veias. Ao mesmo tempo que eu o desejo
tenho raiva por ele forçar uma situação.
—Murat! Não!
Ele se afasta e bufa de raiva.
—Você não sabe que quer Ester!
—Eu? Eu sei muito bem o que eu quero. Eu quero um homem por
inteiro numa relação. Você é um pacote. Seu pai, Hazal. —Meus olhos ardem
e sinto como se um bolo se formasse na minha garganta.
Vejo a tempestade formada em seus olhos. Ele me olha ofegante,
possesso.
—Sabe qual é o seu problema? Você não se esforça para entender a
situação que vivo!
Ele me olha totalmente magoado, me fulminando com os olhos.
Deus! Ele se sente uma vítima? Ou se faz de vítima?
—Por que não me convence ao contrário? Você não conversa comigo,
já percebeu?
Ele me olha sem falas por um momento. Então seus olhos endurecem.
—Você não cria um clima para que isso aconteça. Você só me chuta!
—Porque você inverte a ordem das coisas, sempre!
—Porque eu te desejo Ester e confesso que perco o controle ao seu
lado, isso às vezes me domina. Por isso inverto as coisas como diz... Não sou
como você, que parece ter um botão que liga e desliga. Então você me quer e
depois não me quer. —ele respira fundo. —Você, ao invés de contornar a
situação com sabedoria, você me fere com seu jeito.
—Agora eu não tenho sabedoria?
Ele funga.
—Se o diagnóstico do médico for bom, teremos uma conversa
definitiva. E vou indo. Entendi que não consigo ficar aqui. Melhor eu seguir
viagem. Se eu ficar mais um minuto com você, vou piorar as coisas e eu
quero respeitar a sua vontade. A verdade? É que não consigo ser apenas um
amigo. Até tentei, mas como viu, falhei e estou cansado de ser chutado.
Suas falas me estremecem. Meu coração se agita, minha boca seca,
mas eu o ergo meu queixo.
—Ok.
Ele sorri friamente e balança a cabeça, sai com o peito estufado,
carregando seu orgulho e então bate à porta.
Turcos!
Capítulo 17- Boas notícias?
Murat
Murat
Mas que merda! É isso que provoco nela? Apenas gratidão?
Tereza nos chama para o café. Ajudo Ester com a cadeira e me sento
na cabeceira. Então à sirvo. Sei que ela ainda não está cem por cento para
erguer o braço e suportar o bule pesado.
—Obrigada.
Não respondo, na verdade nem olho para ela. Não quero que ela leia o
quanto estou agitado na expectativa de tudo se resolver entre nós.
Sim, estou apaixonado. Lutei contra meus sentimentos e perdi.
Agora um elefante está sentado no meu coração e não vai sair até eu
resolver tudo entre nós. A pergunta é: Esse sentimento sairá do meu peito se
ela me rejeitar?
Ester
Seu olhar passa com desejo pelo meu corpo me fazendo ofegar e ao
mesmo tempo ansiar por suas mãos.
—Linda...
Sim, eu recuperei meu peso nesse tempo que fiquei no apartamento.
Murat umedece os lábios enquanto com agilidade abre os botões de
sua camisa, seus olhos correndo meu corpo, a luxúria brilhando em seus
olhos. Ele a joga longe e desata o cinto, abre sua calça que escorrega para
baixo. Seu membro grande, duro e inchado me distrai, mas só por um
momento.
Esse homem é muito sexy, gato, ele tem todos os adjetivos que me dá
água na boca e é todo meu.
Constrangida, desvio meus olhos, e minha atenção se volta para o seu
rosto.
Ele sorri retirando a cueca, e vai até sua carteira, pega a camisinha.
Quando percebo o que ele vai fazer, vou até a cama e me sento.
Com as mãos trêmulas retiro minhas sandálias e o restante da minha
roupa. Primeiro a calcinha e depois o sutiã. Então me deito na cama à espera
dele. Não demora muito Murat está de joelhos em cima de mim.
— Vire-se — diz ele.
A sua voz rouca espalha prazer às partes mais sensíveis do meu corpo.
Sinto uma sensação quente, urgente, crescente e latejante me tomando.
Eu faço como ele pediu, ele fala algo em turco enquanto suas mãos
correm a minha espinha mansamente e brutalmente segura o meu bumbum, o
apertando. Seu nariz se esfrega pelas minhas costas até chegar a minha nuca.
Então ele desce os lábios pelo meu corpo me mordiscando, lambendo, me
provocando.
Todo o meu corpo se sente intumescido e desejoso por ele e eu me
ergo e eu giro meu corpo debaixo dele. A visão do seu peito peludo e forte,
seus olhos quentes nos meus cheios de paixão me fazem estremecer.
Com as emoções vivas eu sorrio para ele me lembrando de repente que
ele vai lutar por mim, por nós. Neste momento estou feliz e isso é uma coisa
que nunca me aconteceu. Não que eu me lembre.
Os olhos de Murat ficam mais ardentes quando ele vê meu sorriso, ele
lambe os lábios obscenamente, incendiando meu corpo de prazer.
Um gemido baixo ecoa de sua garganta quando Murat me beija. Ele
segura os meus cabelos e puxa a minha cabeça para trás para cobrir minha
boca com paixão avassaladora. Eu arfo com o sabor do toque das nossas
línguas, enquanto suas mãos passam por mim, rudes e exigentes. Eu
correspondo com vontade, sem me importar com os gemidos que escapam de
meus lábios quando ele toca o bico do meu seio e escorrega sua mão até tocar
minha intimidade. Seus lábios correm por minha mandíbula e mordiscam
meu pescoço enquanto seus dedos mágicos estimulam meu clitóris e me
fazem ofegar.
O orgasmo chega e paro de respirar segurando seus ombros com força.
Momentos depois estou choramingando, com um apelo para ele me penetrar,
preciso ser preenchida por ele.
Jogo minha cabeça para trás quando finalmente ele me toma e nossos
quadris se encontram. Quando ele me penetrou, a nossa respiração estava
entrecortada com o nosso desejo avassalador.
—Murat... —Gemo alto seu nome quando ele começa a se
movimentar, uma, duas, três vezes...numa dança envolvente de corpos
sincronizados, não demora o orgasmo chega, sem aviso, forte, pulsante e isso
me faz gemer alto.
Meus olhos ficam úmidos, emocionada quando me dou conta que
Murat realmente gosta de mim, não entreguei meu corpo, mas minha alma e
creio que ele também.
Sim, pela primeira vez, em anos, choro sem ser de tristeza.
Meus olhos úmidos se abrem e olho para Murat. Ele ainda se mexe
dentro de mim, lindo, poderoso, de os olhos fechados. Então, o músculo em
seu maxilar treme quando ele goza, e ele abafa um longo gemido apertando
os olhos e as mãos que seguram a cabeceira da cama.
Ele então se deita ao meu lado e me puxa para os seus braços. Corro os
dedos por seu peito e suspiro. Ele me olha, ainda recuperando a respiração.
—Você me pertence —ele diz, seu semblante sério. —Você entende
isso? Não entende?
—Sim....
Ele sorri satisfeito, antes de tomar minha boca e me beijar, um beijo
doce, suave...
Capítulo 18- Dias atuais...
Murat
Como diz um provérbio da minha terra: “Beije a mão que você não
pode morder” É isso que estou fazendo. Danço conforme a música, por
enquanto...
Allah me perdoe!
Eu amo Ester, com todo o meu coração, afinal: “Por amor de uma rosa,
o jardineiro não é servo de mil espinhos?”
Sim, ele é!
Como disse um dia para ela, já que vou para o inferno, melhor fazer
direito!
Bem, agora vou à conquista de mais uma conta.
Dois dias depois...
Ahmed
—Murat está nos enrolando, Ayla.
—Ahmed, e você não conhece o ditado? “O que se inflama
rapidamente extingue-se logo” Deixe-o! Uma hora ele entenderá a
necessidade de ter uma família. Você verá, logo ele pede a mão de Hazal em
casamento.
Eu solto o ar nervoso.
—Ayla! Sinto dizer, mas não é o tempo que Murat está levando para
ficar noivo com Hazal que está me preocupando. Eu descobri recentemente
que ele está mantendo um apartamento. Uma imobiliária ligou para o
escritório o procurando e eu atendi me passando por ele. Eles avisaram do
aumento do aluguel do contrato que ele fez de um ano.
Ayla me olha no meio do quarto sem entender:
—Ele alugou um apartamento? Para que ele alugaria um apartamento?
—Ayla! Allah! Pense! Nosso filho alugou um apartamento para sua
amante. Ele se encontra com ela lá. Por que acha que muitas vezes ele não
dorme em casa? Ele dorme lá com ela.
Ayla se senta na cama pálida.
—Allah! Não! Não pode ser!
—Acredite! Murat tem vida dupla.
Minha esposa começa a chorar e isso me enerva mais.
—Chorar não resolve nada!
Ela engole o choro.
—Quanto tempo você acha que Murat está mantendo relações com
ela? —Ela pergunta chorosa.
Digo entredentes:—Quase um ano. Todo esse tempo ele estava com
essa cadela! Sempre soube que ele tinha seus casos por aí, mas manter uma
mulher! Isso é demais!
Ayla chora alto. Aperto as mãos com raiva. Até alguns dias eu pensei
que tinha tudo sob controle.
Ledo engano!
Meu filho é uma vergonha! Meu filho envergonha a nossa casa.
De tantas gerações, de tantas famílias, a desgraça veio cair justo aqui!
Se eu não der um jeito nisso, serei tido como o pateta da família.
Um homem sem pulso!
Um fraco!
Vou até Ayla e a abraço:
—Isso não ficará assim Ayla, eu te garanto! —Falo convicto.
Ela limpa as lágrimas.
—O que você irá fazer? Ameaçá-lo? Você já tem feito isso várias
vezes e não resolveu.
—Primeiro vou ver essa moça. Quero conhecer de perto a mulher que
virou a cabeça do meu filho e colocá-la pra correr. Depois vou reunir os
acionistas e se Murat não se casar com Hazal, vou passar a presidência para
Tabor. Ele é esforçado.
—Você vive me dizendo que Tabor é despreparado.
—Eu estarei ao lado dele. Ajudarei no início. Ele é homem sério, que
respeita os costumes.
Eu não queria Tabor na presidência!
Porra! Quero meu filho!
Levei uma mão trêmula às minhas têmporas que começam a latejar.
Isso sempre me deixa nervoso.
Allah! Onde eu errei para ter um filho tão indecente, pecaminoso?
Não medi esforços para passar os preceitos para ele. Até em escola
Turca ele frequentou, foi uma forma de ele conviver com crianças com a
mesma mentalidade.
Ayla suspira.
— Ahmed, você sabe o quanto Murat é ambicioso. Sei que ele quer a
presidência. Fora que ele sabe o quanto a família seria beneficiada com a
união dele com Hazal. Por que ele resiste tanto? Não se liga a ela e a
ninguém? Você acha que ele ainda está nos punindo por causa daquela moça?
—Não! Não tem nada a ver com aquela moça. Se fosse assim ele não
estaria com Hazal. Ele não a estaria vendo nos finais de semana ou
permitindo que ela venha aqui em casa. Ele já teria terminado com ela há
muito tempo. Mostraria seu descontentamento como sempre fez. Ele está me
enrolando, isso sim! Me enrolando enquanto tem um caso fora. Não duvido
nada que ele se case com Hazal e continue vendo essa mulher!
—Allah! —Ayla diz e abaixa a cabeça, começa a chorar. —Você está
enganado Ahmed, Murat não faria isso.
—Não chore meu amor, eu darei um jeito nisso. Primeiro vou enxotar
sua amante e depois de um tempo, vou dar ultimato! Acabou a pouca
vergonha. Ele terá que se casar e colocar sua vida em ordem, ou eu vou
colocá-lo para fora de nossa vida, da empresa. E ele não verá um centavo
meu.
Ayla chora alto. Ela é mais fraca, tem pena de Murat. Eu não! Farei
isso sem pestanejar. Eu a abraço passando consolo, ao mesmo tempo travo a
mandíbula com a toda a minha raiva.
Sempre coloquei a lealdade, o respeito às tradições da família como
prioridade. Por causa desse incidente, eu perdi a confiança no meu filho. Não
vou esperar ele resolver essa situação por si só. Ele pode estar muito ligado a
essa mulher, não vou correr o risco de perder meu filho para essa mundana.
Amanhã mesmo irei resolver isso!
Eu irei vê-la!
Enquanto isso....
Dinamarca, Odense
Murat
Ahmed
Não foi difícil entrar no apartamento que Murat alugou. Foi simples
demais. Peguei o carro do meu filho, o Lykan Hypersport, que tem vidros
escuros e entrei no condomínio. A porteiro abriu as portas sem pestanejar,
pensando ser ele. Esse carro não é comum pelo seu alto preço.
Agora estou em frente à porta dessa vagabunda. Toco a campainha e
ergo um buquê de rosas vermelhas tapando o olho mágico. Minha respiração
está ofegante. Estou louco para ver quem é essa mulher. Deve ser bem bonita
essa ordinária para virar a cabeça de Murat a ponto de ele sustentá-la.
Ester
Murat
Ester
O beijo de Murat é urgente, necessitado, ele me prende pela cintura e
eu passo as mãos por seus cabelos, não consigo resistir e o puxo mais para
mim. Murat geme de encontro a minha boca adorando meu desejo.
Sim, eu o amo. Nada com ele é fingido. Tudo com ele transborda de
dentro de mim.
Quando seus lábios escorregam para o meu pescoço, fecho os olhos.
Mesmo ante o prazer que isso me provoca, a minha cabeça começa a
trabalhar. A dor começa apertar meu peito, por tudo que eu irei fazer.
E eu não sei mais lidar com nossa vida dessa forma. Essa espera tem
que ter um fim, ainda mais agora que eu passei no teste. Consegui entrar na
orquestra sinfônica de Londres. Ele precisa se decidir por mim.
Chega de ilusões!
Murat precisa tomar uma atitude. Concordo que ele não pode saber
que seu pai esteve aqui. Não quero que ele se sinta pressionado. Quero que
ele tome uma atitude por me amar.
Quando ele começa a puxar meu vestido eu paro suas mãos. Eu nunca
fiz isso, nunca o brequei desde que estamos juntos.
Murat me olha ofegante, confuso. Eu o encaro também, com a
respiração entrecortada.
Deus! Não consigo encontrar as palavras!
Minha garganta se fecha com medo desse enfrentamento, da sua
resposta, embora eu tenha me preparado para elas. Será uma dor muito
grande deixar Murat.
Os olhos cheios de desejo, ele me puxa novamente e toma a minha
boca com paixão avassaladora.
Deus! Preciso fazer isso parar!
—Não, por favor! —Digo o empurrando para longe de mim
fisicamente, mas não do meu coração que o deseja grandemente.
Murat me olha sem entender.
—Por que está me afastando?
Encaro o homem que fez sonhar com uma vida em comum além das
paredes desse apartamento. Que me fez sorrir e ter esperanças, acreditando
que um dia ele iria me assumir.
—Precisamos conversar.
Ele olha para o meu ventre, então olha para mim. Vejo seu coração
agitado, sua respiração ofegante.
—Você está grávida? Está esperando um filho meu? É isso? —ele
pergunta estudando minha expressão, seu rosto não revela muita coisa,
enigmático.
Deus! Graças a Deus não é isso! Tá aí uma coisa que nunca pensei, em
engravidar para segurar Murat.
—Não. Não é isso.
Ele me puxa para os seus braços.
—O que foi então?
Eu espalmo minhas mãos em seu peito.
—Não quero mais essa vida, Murat. Chega! Não quero viver essa vida
escondida, enquanto você segue sua vida normalmente.
Ele ofega, parece aliviado. Sorri.
O desgraçado sorri!
—Também não quero —ele diz e uma de suas mãos me puxa para os
seus braços novamente. A outra corre por meu rosto. —Falta pouco para eu te
assumir perante todos.
Sempre assim! Promessas. Ninguém vive de promessas.
Eu o afasto.
—Não quero mais suas promessas—digo sem embargar minha voz, de
um jeito firme. —Quero que tome uma atitude. Agora!
—Canim, isso ainda não é possível. Não é do jeito que você quer e
nem na hora que você quer, já te disse isso. Prometo para você que falta
muito pouco para isso acontecer, mas agora não posso.
—Eu não tenho esse tempo. Eu passei no teste. —eu o corto.
—Teste?
—Sim, da orquestra sinfônica.
Um grunhido baixo e frustrado sai dos seus lábios.
—Allah! Você ficou de conversar comigo.
Eu rio na cara dele.
—Para quê? Para você ir contra?
Ele me olha ofegante com a expressão fechada.
—Sim, sou contra. Isso irá dificultar as coisas para nós. E eu não quero
minha mulher levando essa vida de viagens.
—Só você, não é Murat? Que pode viajar e ficar dias sem aparecer?
—Eu estou resolvendo nossa vida. Eu já não te disse isso?
—Não tenho esse tempo, preciso tomar uma decisão.
Ele me olha cheio de amargura.
—Ah, agora eu entendo...Isso tudo é desculpa para você seguir sua
vida sem olhar para trás. Não é isso?
—Não! Não é isso. Eu apenas quero alguém que me assuma de
verdade. Cansei dessa espera!
Murat me envolve novamente nos braços. Eu fecho os olhos, fugindo
do feitiço que ele exerce sobre mim.
—Olha para mim! —Eu abaixo a cabeça, meus pensamentos tomados
pelas ameaças de seu pai. Ele será banido de sua família, perderá sua herança,
será afastado definitivamente da empresa. Deus! Claro que ele sabe de tudo
isso. Ele está me enrolando. Ele pega meu queixo e o ergue. —Ester, olha
para mim.
Eu o empurro e o afasto, seu toque, seu calor, seu cheiro me
enfraquece.
Eu me levanto e só então o encaro.
—Não, Murat. Não quero ouvir nada. Chega de palavras bonitas.
Quero viver minha vida. Eu aceitei ser a mais nova concertista da Orquestra
Universitária de Londres.
—Allah! —Ele exclama. —Já estava tudo resolvido, não é? Mesmo
antes de ter de mim uma resposta.
Sim, me antecipei a sua resposta, pois no fundo sabia qual era. Ele iria
me enrolar como sempre fez.
—Eu apenas me dei conta que mereço muito mais do que você me
oferece.
Murat se levanta. Agitado começa a andar de um lado para o outro
como um leão enjaulado, então para e olha para mim.
—É por causa de Hazal, não é isso? Eu já disse que ela não significa
nada para mim.
—Você está se ouvindo? Não percebe que tudo isso é um absurdo.
Murat segura com força meus braços.
—Tudo que tenho feito é para me esquivar de meu pai e resolver
minha vida. Não estou enganando Hazal, não estou enganando ninguém.
Você sabe que tudo isso é uma armação para meu pai parar de me encher.
Eu puxo meus braços com raiva, ele sempre tenta criar uma ilusão que
as coisas ficarão bem, que tudo será resolvido.
Estou cheia disso!
—Chega Murat! Estou resolvida a sair de sua vida. Não há nada que
diga que me faça ficar ao seu lado.
Seu rosto se fecha, agora ele parece um gigante de músculos tensos.
—Pensei que fosse feliz ao meu lado. Que nada do mundo externo te
atraísse a não ser nós dois.
Por um segundo as palavras dele evocaram em minha mente imagens
de nós dois tomando banho juntos, jantando a luz de velas, pernas
entrelaçadas, assistindo um bom filme, fazendo amor... Porém, nada além
disso, nada de conversas do mundo externo, nada de problemas. Cercados por
uma frágil redoma.
Murat não sabe nada da minha vida e nunca quis saber. Acho que ele
tem medo de me perguntar. Afinal eu não era virgem e me entreguei para ele
na primeira noite.
Ele também, nunca fez questão de me contar de suas ações externas.
Ele quer que eu confie nele de olhos fechados. Mesmo quando o vejo levar
sua vida e continuar seu namoro com Hazal.
Solto o ar e digo: —Sim, de certa forma eu fui feliz, mas isso por um
tempo até não ser mais.
O mundo então se reduziu a um par de olhos negros fixos em mim,
perdidos. Vejo então um lampejo de dor neles. Isso reflete no meu coração
que se aperta e eu desvio meus olhos dos dele.
Preciso ir embora!
Não posso mais ficar mais um minuto aqui! Tenho medo que ele me
confunda e não quero pensar em nada nesse momento.
Eu me viro e abro o closet onde puxo minha mala e a coloco em cima
da cama, puxo o zíper e a abro. Os olhos de Murat estão pousados em mim,
observando todo os meus movimentos.
—Todo esse tempo juntos e eu me pergunto agora se algum dia me
amou?
Com o coração apertado no peito não olho para ele, não posso me
perder em seus olhos.
—Murat! Essa conversa não convém nesse momento. Acho que isso
não importa mais—digo entrando no closet onde pego uma porção de roupas
e jogo na mala.
Sinto seus dedos se fechando no meu braço e ele me puxa para ele.
—Como não importa? Depois de tudo, tenho direito de saber. —Seu
hálito no meu rosto é um afrodisíaco, mas o encaro enigmática, como uma
boneca de pano, domando meus sentimentos. —Preciso entender a mulher
que apostei todas as minhas fichas. A mulher que acolhi.
Eu abaixo a cabeça com pensamentos:
Apostou todas suas fichas?
Adianta alguma coisa argumentar?
Ele irá te ludibriar. Não caia nessa!
—Alguma vez você me amou, Ester? —Ele me sacode.
Eu me desvencilho dele e o encaro firme:
—Sim, eu te amei. Está satisfeito?
Ele me dá um olhar torturado. Eu dou as costas para ele. A respiração
ofegante. Deus! Como dói tudo isso.
—Não, Ester. Você nunca me amou.
O tom mordaz de sua voz me faz me virar para encará-lo, há algo
perigoso nele que faz arrepiar os cabelos da minha cabeça.
—Acredito que no fundo te foi conveniente ficar comigo. Sem
preocupações, foi atrás de seu sonho e agora que o tem realizado está me
dando um belo adeus.
A dor no meu coração me toma e eu o encaro cheia de amargura:
—Você está errado. Eu não ficaria com você se não te amasse. Na
verdade, eu ainda te amo, só que não quero mais me anular por sua causa.
Pela primeira vez estou pensando em mim.
Vejo o agitar de seu íntimo. Seus lábios se separam com sua respiração
ofegante, seus olhos se intensificam nos meus. Seu rosto é uma carranca de
amargura. É a primeira vez que o vejo seus sentimentos tão expostos. Ele
sempre demonstrou poder e controle em qualquer situação.
—Se me amasse realmente como diz, você ficaria e não me deixaria.
Apostaria em nós—ele diz entredentes, num tom baixo.
Eu respiro fundo, me armando de uma frieza que não sinto. Quebrada
por dentro, embora meu exterior esteja passivo.
—Apostar em nós? O que tenho feito todo esse tempo? Não posso
Murat. Acabou.
A expressão de seu rosto muda, se torna orgulhosa, altiva. Seus olhos
correm meu rosto como uma frieza agora que lhe é típica, que ele deve usar
para os seus negócios.
—Há alguém entre nós? Quem é esse homem? —Ele grunhe,
Homem? Tudo isso é por ele não tomar uma atitude. Eu não vou jogar
minha carreira fora por um homem que não se decide por mim!
—Não há homem nenhum! Se houvesse, você seria o primeiro a saber.
Eu jogaria limpo com você.
Um silêncio se faz presente entre nós. A impotência que vejo em seu
rosto é tocante, eu me viro e recomeço a arrumar a minha mala.
Não posso recuar agora! Encará-lo me fará desabar em choro. Não
posso fraquejar! Ele precisa me ver determinada a sair de sua vida.
— Tudo bem Ester. —ele faz uma pausa, então diz como se pensasse
—não precisa sair com pressa por minha causa —Se quiser fique essa semana
e pode ficar tranquila, enquanto estiver no apartamento, não pisarei mais
aqui.
Quando ele sai eu desabo na cama. Agradeço por estar perto dela, acho
que teria caído no chão por causa da fraqueza das minhas pernas.
— Mu... — Quase o chamo.
Deus! Não!
Preciso deixá-lo ir... mesmo que meu coração esteja doendo
horrivelmente e minha mente esteja um caos.
Será melhor para ele, mas eu não tenho tanta certeza que será melhor
para mim...
Minutos depois estou encolhida na nossa cama, os olhos inchados de
tanto chorar. Agora é madrugada e estou tentando dormir, mas mesmo de
olhos fechados, não consigo conter a tortura das lembranças. Flashes de
momentos que passamos juntos nesse apartamento começaram a invadir
minha mente...
Murat
Quem disse que homem não chora? Penso limpando minhas lágrimas
quem caem sem que eu consiga contê-las. Meu pai diz que não.
Allah! Quando criança engolia meu choro quando ele me repreendia,
não chorava na frente dele. Aos poucos fui me tornando uma fortaleza ao
ponto de não me lembrar quando chorei.
Acho que foi no enterro de vovó.
Allah, como dói meu coração.
É madrugada. Estou dentro do carro estacionado em frente ao parque
Royal sem pressa para ir embora. As lembranças de nós dois me tomando, me
massacrando.
Lembro-me de nós dois sorrindo na janela por causa da neve que caí lá
fora e estávamos no outono ainda.
—Deus! Neve fora de época? —ela sorri. —Adoro esse branco
acumulado nas árvores. Adoro sentir a neve no rosto.
Suas palavras espalham satisfação.
Sim, eu sei o porquê ela me conquistou. A simplicidade dela.
—Podemos descer. O que acha? —Digo observando seu rosto se
iluminar. Ela olha para mim como uma criança sapeca louca pela liberdade.
—Jura?!
—Sim. Se agasalhe.
Sorrindo, ela se afasta imediatamente para colocar uma blusa. Eu
pego meu casaco grosso e coloco meu cachecol.
Não demorou muito ela surge na sala com um casaco rosa de lã e um
cachecol branco. Ruivas combinam com rosa.
Definitivamente. Ela está linda.
—Então vamos! —Diz animada.
Eu sorrio, o coração agitado, quase mudando de ideia, louco para
tirar toda a sua roupa. Meu amigo aqui embaixo, já duro, lateja
concordando com meus pensamentos.
Não vou fazer isso com ela.
—Vamos! —digo ofegante.
No elevador privativo estamos abraçados. Quando ela ergue o rosto
eu tomo sua boca e a beijo com vontade, um beijo urgente. Quando
finalmente me afasto vejo seus olhos brilhando nos meus. Então as portas se
abrem nos forçando a sair da nossa redoma e do elevador.
Lá fora flocos de neve se acumulam em seus cabelos vermelhos, suas
bochechas estão quase da mesma cor de seus cabelos. Eu a abraço, ela se
esquiva de mim. Pega um punhado de neve e joga nas minhas roupas.
—Vamos! Quero ver você acertar em mim! —Ela diz animada, agora
bem distante.
Adoro sua voz, seu tom rouco pode ser meiga e sensual.
Sorrindo pego uma porção e faço uma bola dura com ela. Tento
acertá-la, mas ela se esquiva bem na hora.
Isso virou um desafio!
Pego outra e tento de novo. Ela sai da mira novamente rindo, ao
mesmo tempo que pega uma porção e acerta bem meu rosto.
Eu fico vermelho e pasmo, então rio com vontade.
—É assim então! —digo sorrindo.
—Vamos Murat! Dizem que muitos músculos deixam o homem lento.
—Lento? Você vai ver que é lento!
Pego uma porção novamente, mas não fico parado para acertá-la e
avanço, ela se assusta e corre, cai sentada no chão e começa a rir.
Rindo muito também, pois ela caiu de um jeito muito engraçado, a
puxo para os meus braços e começo a enchê-la de neve e cócegas.
— Não, Murat. Você sabe que sou fraca para cócegas. Por favor!
Lembro-me de nós dois rindo e eu pensando que era maravilhoso estar
com a pessoa certa. Pisco, limpando as lágrimas.
Com raiva dou partida no carro. Agora tudo isso acabou e eu preciso
lidar com isso, da melhor forma possível. Mas uma coisa tenho comigo, vou
continuar meu empenho para conseguir esse contrato assinados e depois disso
vou dar adeus para minha vida de sujeição. Se meu pai quiser colocar Tabor
na presidência, pois bem.
Só que ele terá que me engolir em todas as reuniões. E quanto a Hazal,
vou acabar com essa palhaçada também. Não posso empatar mais sua vida.
Se bem que depois de mim, a escolha não será dela para um novo
pretendente. Por isso ela não está com pressa nenhuma de terminarmos tudo.
Capítulo 21- Uma semana depois...
Murat
Consegui!
Consegui finalmente agendar com o CEO da grande rede de
Hipermercados que vendem os nossos televisores. Mas nem isso consegue
alegrar meu dia, ainda exibo uma carranca de amargura em meu rosto.
Meu pai anda estranho, parece mais animado, como se minhas
frustrações lhe enviassem sinais que andarei nos eixos e entrarei no jogo dele.
Mal sabe ele que depois desse cliente ele verá um novo Murat. Um que
tomará as rédeas de sua vida.
Faz uma semana que Ester saiu da minha vida e ainda sinto como se
um elefante estivesse sentado no meu peito. Essa dor, esse aperto de angústia
não me deixam. Revivo o tempo todo os momentos que tivemos juntos, cenas
no apartamento criados por ela, que eu mesmo incentivei.
Lembro do dia que dispensamos Tereza e depois de tomarmos uma
taça de vinho em frente a lareira da sala, tiramos nossas roupas, aquela
ansiedade de sentir um o corpo do outro. Aquela urgência que nos deixavam
O crepitar do fogo, as nossas respirações ofegantes, nossos gemidos
eram os únicos sons no apartamento.
Ela jogou o que tínhamos fora! Digo para mim mesmo com raiva.
Nessa hora meu pai entra no meu escritório.
—Como andam as coisas?
Eu solto o ar.
—Tudo sob controle.
—E Hazal? Quando pensam em marcar a data do casamento?
Eu o encaro por um momento em silêncio.
—Quando eu chegar de viagem eu resolverei isso.
Meu pai abre o sorriso.
—Mas isso é muito bom ouvir de você. É a melhor notícia que poderia
ter me dado.
Eu o encaro enigmático. Hah! Ele pensa que vou evoluir as coisas com
ela.
Não, não é o momento ainda, por isso não digo nada.
Eu me levanto da cadeira.
—Aonde você vai? —Ele me pergunta.
—Não estou bem, pai. Essa noite não dormi quase nada. Vou para
casa.
—Eu e sua mãe reparamos que não está comendo direito, está mais
abatido. Está mais em casa também. Está doente, meu filho? O que houve?
Eu o encaro, fico me perguntando se há uma real preocupação, pois ele
me parece feliz. Resolvo contar a verdade, não há mais nada a esconder.
—Eu não estou assim por estar doente. Estou assim porque me
apaixonei e quebrei a cara. Ela me deixou.
Meu pai ofega, seus olhos endurecem.
—Como você tem a coragem de dizer isso na minha cara? Que estava
tendo uma vida dupla? Saindo com essa garota e ao mesmo tempo mantendo
um relacionamento com Hazal?
—Não vou discutir isso com você... Mesmo porque acabou. Está
satisfeito? Palmas para você, pai.
—Ela não te merecia meu filho. Foi provisão de Allah.
Eu o olho com desgosto.
—Pode ser. Mas meu coração me diz também que ela pode ter me
deixado por eu não ter tomado uma atitude.
Meu pai vai até onde estou e toca meu ombro, seus olhos são
amistosos para mim.
— Isso vai passar, essa dor vai passar.
Com raiva, retiro a mão dele do meu ombro.
—Acho que não! —Digo e saio do escritório.
No elevador estou ofegante, pensativo.
Ela poderia ter apostado em nós, ela poderia ter esperado mais um
pouco!
Ela me amava mesmo como disse?
Acho que não!
Capítulo 22 – Enfrentamento...
Ester
Hoje não teve ensaio. Passei o dia andando pelas ruas. Fui a um museu
de artes. Tentei encontrar a paz nas pinturas, nas esculturas antigas e
modernas, tentando não pensar muito nessa noite. Mas está difícil, pois
imensos cartazes estão espalhados por todos os lugares anunciando a estreia
da iniciante orquestra sinfônica da UEl (Universidade Estadual Londrina)
Somos considerados principiantes, engatinhando ainda, mas com a
entrada de Paul Guy Cole, elevou muito nosso patamar.
Deus! Estremeço quando penso nisso e me dou conta da posição que
conquistei.
À tarde tivemos uma boa notícia, um famoso CEO do mundo dos
eletrônicos deu sua gorda contribuição. Isso causou um reboliço de alegria no
nosso meio. Ele nos será apresentado hoje no jantar de gala que ele mesmo
preparou para nós depois do espetáculo. O evento será num salão reservado
no nosso hotel.
Agora estamos aqui, no Wigmore Hall que está lotado. Ela é uma sala
de concertos linda e aconchegante. A decoração toda em dourado lembra uma
caixa de joias ou caixa de música como diz Cole.
Aqui se apresentam orquestras do mundo todo. O público sempre
conta com uma grande variedade de músicas de alta qualidade. Nas cadeiras
com almofadas de veludo azul um folheto com o descritivo do espetáculo.
Hoje nossa orquestra apresentará canções de Tchaikovsky, Medtner e
Rachmaninov.
Entramos todos juntos no auditório, todos os homens de fraque e nós
mulheres de vestido longo negro. O público levanta-se para aplaudir com
entusiasmo. Parece surreal eu estar aqui entre os concertistas. Dou um sorriso
nervoso, ensaiado como a de uma atriz que tem que sorrir para o seu público
com confiança mesmo estando nervosa.
Então nos dirigimos aos nossos lugares. Cada um com seu
instrumento. Não demora muito o Maestro entra e o público se levanta para
aplaudi-lo com mais fervor que antes.
Alto, ombros largos, ele se posiciona em frente a nós, as baquetas
elevadas em suas mãos.
Sim, ele passa a impressão de força, autoridade e competência.
O silêncio se instala.
Hora de eu me concentrar. Ergo minhas mãos sob o piano atenta as
mãos do maestro e as notas. Quando ele dá início com os violinos, aguço
meus ouvidos para entrar no tempo certo.
Ele olha para mim ergue a baqueta em minha direção é o sinal para
que esse instrumento mais que perfeito, emocionante revele suas notas.
Sob meus dedos ágeis, seu som enche o ambiente se unindo aos outros
que vão crescendo à medida que a música vai ficando mais dramática,
transmitindo a emoção a cada alma desse lugar, desde a quem assiste e faz o
espetáculo.
Minhas mãos correm o piano e tocam como nunca, com o desejo de
vencer, com o mesmo espírito que me fez passar no teste. Tentando não olhar
para trás, tentando não me lembrar do que abandonei: seu lindo rosto perto do
meu, sua voz no meu ouvido, terna, ardente. Seus olhos negros que não
perdiam meus movimentos, suas mãos suaves correndo meu corpo...
Toco!
Toco!
Atenta as notas, atenta aos meus movimentos, atenta as mãos do
maestro...
Assim as músicas passam, entre aplausos e início de uma nova música
o tempo corre e o espetáculo cada vez mais emocionante, bonito.
O concerto termina o público aplaude com entusiasmo redobrado
consagrando o maestro que fez de uma orquestra inexperiente emocionar os
londrinos.
O maestro se inclina e acena para nós que nos levantamos e nos
posicionamos em frente ao palco. Sorrio para o público. Agora meu sorriso é
mais caloroso, satisfeito, feliz por tudo ter dado certo.
Corro meus olhos pelo mar de pessoas bonitas e bem vestidas, mas
eles param em um homem. Meu coração dispara, minha boca seca. Então eu
o vejo. Aquele rosto com aquela barba inconfundível O porte altivo, a altura,
a cabelereira negra bem penteada para trás, seus olhos nos meus...
Murat! O sorriso vai morrendo nos meus lábios.
Depois de uma leve inclinação em agradecimento ao público, eu saio
dali, fujo, como sempre fugi. Com as pernas bambas eu me afasto em direção
aos bastidores. Preciso beber alguma coisa, urgentemente.
Ele veio! Por que ele está aqui? Para me atormentar?
Paro no meio do caminho me segurando na parede, minhas pernas
ainda moles. Aos poucos vou sentindo os concertistas rindo e falantes
passando ao meu lado. Karen para e me olha.
—Você está bem?
—Sim —forço um sorriso.
—Foi emocionante, não foi? —Ela me pergunta, pensando ser esse o
motivo do meu mal-estar.
—Sim, muito... —digo e me dou conta que a emoção maior foi vê-lo
ali: Murat em carne e osso.
Antes de alcançar o camarim o maestro chama todos num canto.
—Vocês se saíram muito bem. Um ônibus os espera lá fora para levar
os célebres músicos ao hotel. Lá vocês serão orientados para seguirem em
direção a festa que nosso investidor fez questão de oferecer.
Os olhos do maestro voltam-se para mim. O calor sobe para as minhas
bochechas quando ele vem na minha direção.
—Quero que vá comigo no meu carro.
Ainda estou ofegante, pensando em Murat.
—No seu carro?
—Por que não?
Ainda estou desnorteada. Murat não sai da minha cabeça. Sem forças
para recusar assinto com um aceno de cabeça:
—Tudo bem-digo fazendo o maestro sorrir. —Vá até seu camarim e
pegue seu casaco. Eu te espero aqui.
Assinto para ele e faço conforme ele disse sem nem mesmo pensar
sobre o assunto. Na minha mente só fica piscando a imagem de Murat me
aplaudindo, o semblante sério.
Paul me dá seu braço e o seguro, sob os olhares femininos atentos de
cobiça o acompanhando, atravessamos os camarins até alcançar o lado de
fora.
Uma limusine nos espera com a porta aberta. Gentilmente ele me faz
entrar primeiro e então ocupa o grande assento ao meu lado. Pega a minha
mão e a beija.
—Você foi divina...
Eu forço um sorriso.
—Obrigada.
Viro a cara para o vidro. Fico quietinha no banco enquanto sinto a mão
de Paul alisando a minha, meus pensamentos em Murat, cheia de questões
não resolvidas.
Que novidade há nisso? Com Murat sempre foi assim, nada é normal,
tudo é complicado.
Então me lembro do tal investidor.
Será?
Não pode ser!
Viro a minha cabeça para Paul que sorri para mim, pois eu o peguei
em fragrante me observando.
—Você sabe quem é esse CEO?
—Sim, claro que sei.
Um pico de adrenalina por causa dessas simples palavras dispara o
meu coração. Antes que eu pergunte para ele quem é o tal CEO chegamos ao
hotel. Um segurança abre a porta para nós.
Descemos sob a mira dos fotógrafos e uma avalanche de flashes nos
iluminam a todo momento...
O maestro sorridente coloca a mão direita nas minhas costas me
conduzindo. Subimos o tapete vermelho até o saguão do hotel. Lá entregamos
nossos casacos e fomos conduzidos por uma hostess até o salão. Um
volumoso buque de rosas enfeita uma mesa de centro com rosas vermelhas.
No teto, um lustre imenso com luzes potentes ilumina o ambiente.
A vasta sala está aos poucos se enchendo. Vejo as pessoas olhando
uma para as outras, umas sorrindo, lançando sinais de reconhecimento.
Vejo os concertistas de um lado e alguns convidados do outro. Todos
estão muito elegantes.
Um grupo formado por seis músicos toca num canto do salão: um jazz
gostoso. Garçons de branco e gravata vermelha servem bebidas e canapés às
pessoas conforme elas vão chegando.
—Quem são essas pessoas? —Pergunto a Cole.
—Amantes da música clássica. O ministro da cultura está ali naquele
canto e aquele casal é...
— O prefeito e sua esposa? Nossa! Nosso anfitrião é bem relacionado.
—Na verdade, eu os convidei. Nosso anfitrião deixou por minha conta
os convites de hoje.
Mais aliviada percebo que Murat não está entre eles. O maestro pega
uma taça de champanhe e quando ele vai pegar uma para mim eu aceno um
não. Minhas mãos ainda tremem pelo impacto de ver Murat. Acho que
derrubaria na roupa.
—Quem é esse CEO? Ele está aqui? —Pergunto me preparando para a
resposta.
—Não, ele ainda não chegou. —Deus! Ainda não chegou? Suas
palavras me enviam sinais de alerta. —Olha ele aí.
O maestro bate palmas para alguém, provocando outras palmas que
explodem no ambiente. Cautelosa eu viro meu corpo para a entrada do salão.
Murat avança de terno negro sorrindo...
Claro que é ele...
Ele está todo de preto, gravata, camisa. Parece o anjo do mal em forma
de gente. Murat não foi concebido normalmente, acho que ele foi feito em
laboratório. Não é possível tanta beleza em um só homem.
Nossos olhos se encontram.
Ofegante retiro meus olhos dos dele, e reparo em um grupinho de
mulheres, concertistas, cochichando uma para as outras. São as mesmas que
estavam com a revista de Murat o outro dia.
Sim, ele é lindo, encantador, charmoso. A aura magnética de Murat é
tão grande que o maestro considerado um semideus para as meninas perderá
seu brilho tão logo elas o vejam de perto. É como se o deus Adônis estivesse
entre nós.
Que jogo é esse? O que esse homem está fazendo aqui? Veio tirar
minha paz de espírito?
Forço-me a lembrar que estou de frente ao homem que me magoou o
suficiente para eu desconfiar do amor fulminante que acaba em lágrimas e
palavras ácidas.
Agora estou aqui, parada, desconfortável, não sei o que fazer. Tão
deslocada que nem sei onde coloco as mãos.
—Ester. —Paul estende a sua mão em minha direção.
Deus! E agora? O que faço? Demonstro que eu o conheço? Melhor
não!
Caminho até eles, tentando controlar minha respiração, o queixo
erguido, os olhos altivos.
—Gostaria de apresentar-lhe a minha mais nova concertista, Ester
Marshal. Lembre-se do nome dela, essa garota um dia será famosa.
Os lábios de Murat tremem quando ele força um sorriso que não toca
os seus olhos. Ele está incomodado. Eu o conheço bem demais.
—Eu me lembrarei desse nome—ele diz e estende a mão para mim.
Toco sua mão. Murat a aperta em um cumprimento forte e seu polegar
a alisa um bom tempo antes de soltá-la. Eu lhe dou um sorriso frio embora
meu coração palpite dentro do peito e eu tento a todo custo acertar minha
respiração que está muito rápida.
Estou reagindo a ele como sempre reagi.
Nada mudou.
Não me culpo, esse turco transpira magnetismo. Sou mais uma vítima
do charme de Murat.
Não posso mudar isso, Murat sempre vai abalar minhas estruturas, mas
posso garantir que Murat Çelik não terá a chance de me enganar novamente
com palavras mansas.
—Você tocou muito bem —ele me elogia.
Seus olhos deslizam pelo meu rosto. Reparando com certeza na minha
maquiagem caprichada. Meus cabelos vermelhos presos no alto da cabeça,
algumas mechas laterais emoldurando meu rosto.
—Todos tocaram bem-digo com um novo sorriso glacial.
—Aceite o elogio, minha querida, você fez por merecer. —Paul pega a
minha mão e a beija.
Eu aceno para Paul e sorrio para Murat.
—Bom então obrigada senhor Çelik.
—Ester é uma musicista muito talentosa. —Paul diz esticando seu
braço para alisar minhas costas nuas. Nunca lhe dei essa liberdade. Acho que
por ter aceitado seu convite de vir no carro dele e ele ter alisado minha mão,
enquanto eu só pensava em Murat, acho que ele pensa que mudei de ideia em
relação a nós.
Murat trava os dentes. A intensidade de seu olhar captura o meu. Noto,
através de sua respiração pesada, o quanto ele está se dominando. Ele não
está gostando nada do jeito que Paul está tocando minhas costas.
Está com ciúmes?
Não devo mais nada a você!
O encaro com altivez.
—Não tenho dúvidas disso —Murat diz, sério.
—Querida, vou apresentar o senhor Çelik à algumas pessoas.
—Claro —digo com um sorriso.
Murat me dá um sorriso sexy, aquele que me faz enxergar que ele é
pura perfeição. Enviado ao mundo para confundir as mulheres, raptar seus
corações, devastá-los.
Um filme se passa na minha cabeça. Seus braços me trazendo mais
para ele. Os lábios dele nos meus, me provocando, me excitando.
Antes de dar um gemido audível, eu me viro, e me afasto deles.
—Deus! Murat Alakurt Kemal Çelik entre nós e você teve a honra de
conhecê-lo de perto —Karen diz extasiada.
—Sim.
—Deus! Ele é mais lindo e charmoso pessoalmente.
—Muito — digo, quase demostrando meu enfado.
—Onde esse homem vai tem jornalistas no pé dele perguntando se ele
está com alguém, quando o dono da Teleimagem contrairá casamento. Ele é
muito arisco e discreto. Ninguém sabe nada direito de sua vida pessoal.
Parece que ele não se mistura com mulheres de outras culturas. Só que
também nunca viram ele com turca.
Eu solto o ar. Estou com sede e cansada, mas antes de me virar e ir
atrás de algum suco, vejo várias concertistas se aproximando de nós. Todas
querendo saber mais de Murat Começam a comentar entre si sobre ele.
Elogiam seu físico, seu charme, blá, blá, blá...
Eu me afasto delas. Preciso beber e comer algo também. Vou atrás de
um garçom e pego um canapé e um copo grande enfeitado com abacaxi.
Mastigo como se fosse plástico e o empurro para dentro do meu corpo com
um gole grande do suco.
Não consigo comer o restante do canapé. Sabe o que faço? Jogo-o
dentro do meu copo de suco quase vazio e o deposito na bandeja de um
garçom que passa ao meu lado.
Então o clima da festa muda de repente. Os músicos de jazz começam
a tocar música pop. Ed Sheeran – Photograph.
Sinto um toque no meu ombro e vejo Murat ao meu lado. Ele pega a
minha mão e me puxa.
—O... que você está fazendo?
—Te puxando para uma dança...
Ele me envolve com seu abraço. Eu estremeço e ao mesmo tempo o
empurro:
—Murat, você não pode ir chegando, me puxando assim como se eu te
pertencesse.
—Precisamos conversar.
—Não temos mais nada a dizer um para o outro.
—Não diga isso sem me ouvir primeiro.
Quase não nos movemos. Os olhos de Murat estão fixos em mim. Eu o
empurro.
—Acabou Murat. Saiba que eu não o culpo. Você está sujeito às suas
tradições. Melhor você seguir sua vida...
Eu me afasto dele, Murat puxa o meu braço.
—Ester!
Eu retiro meu braço das mãos dele. Uma onda de pânico se espalha por
todo o meu corpo. Dou um passo atrás.
—Não temos nada para conversar, Murat.
Paul se aproxima de nós.
—Vocês se conhecem? —Pergunta olhando de um para o outro. Eu o
encaro e aceno um sim. —Ele é o homem do seu passado?
Murat ofega nervoso.
—Passado não! Presente e futuro! Por favor Ester, me acompanhe...
Arrogante!
Paul aperta os lábios contrariado.
—Senhor Çelik, não é porque contribuiu com seu gordo donativo e nos
recebeu com essa festa que pode fazer o que quer. Ester não parece querer ir
com o senhor —diz entredentes para Murat.
Murat o encara e aperta os punhos. Nunca vi Murat tão vermelho e
demonstrando tanto esforço para se dominar. Mas ele sorri friamente para
Paul, embora seus olhos pareçam duas metralhadoras almejando o maestro.
—Admiro muito seu trabalho, mas não entendo o que o senhor ainda
está fazendo aqui? Não vê que é uma conversa íntima? De marido e mulher?
—Sua voz sai alta, meio fora de si.
Eu olhei para os lados sem jeito. As concertistas estão me olhando de
queixo caído. Até os convidados estão começando a reparar no clima ruim
aqui.
—Ele é seu marido? —Paul diz, ainda tentando entender tudo isso.
Eu encaro o maestro.
—Paul, pode deixar. Depois nos falamos. Eu vou conversar com ele.
—Tem certeza que ficará bem?
Murat ofega e dá um passo na direção dele impondo sua presença.
—É claro que ela ficará bem! —Diz entredentes.
Paul o encara vermelho. Então se afasta. Só então Murat parece
relaxar.
—Allah! Por pouco não perco a cabeça com esse idiota.
—Murat, o que faz aqui? Para que armou tudo isso se entrou para
estragar a festa?
—Sei que hoje é seu dia. Você brilhou como nunca, mas ainda assim,
precisamos conversar. Sou intempestivo mesmo e não escondo o que sinto e
muito menos o que quero. E estragar a festa? Os convidados parecem bem
felizes tomando meu champanhe e os canapés de caviar.
Dinheiro?
Eh, os negócios devem estar indo muito bem. No mínimo conseguiu a
presidência. Se ele pensa que com o lado profissional resolvido e por ter
chutado Hazal as coisas ficarão bem entre nós, ele pode tirar o seu cavalinho
da chuva.
—Muito bem, estamos sozinhos. Diga o que tem a dizer.
Murat
—Aqui não! Quero conversar com você num lugar calmo. Sem
pessoas ao redor.
Sempre fui muito popular com as mulheres. Posso farejar o interesse
delas de longe. Nesse salão por exemplo, elas me olham curiosas, outras
embevecidas. Isso não eleva em nada meu ego, de maneira alguma.
O que adianta ter todas as mulheres do mundo se a mulher que amo
não quer me ver pintado de ouro na sua frente?
Nunca nenhuma mulher me fez sentir tão vivo como Ester.
Não gosto desse domínio que ela tem sobre mim. Nenhuma mulher
deveria ter tanto poder sobre um homem desse jeito...
Ela ainda olha para os lados indecisa. Isso acaba comigo. Quase me
tira a razão. A vontade que tenho é arrastá-la desse salão, jogá-la sobre os
ombros.
Ester me encara.
—Você deve ter conseguido a presidência, terminou com aquela
coitada da Hazal e veio me procurar como se isso fosse me trazer de volta. —
Diz tudo com pouco caso.
Eu estremeço de nervoso e dou um passo em sua direção. Encaro seus
olhos verdes, que estão bem ariscos.
—Não vou dizer nada aqui. Garanto que essa conversa é definitiva.
Depois de me ouvir, estou pronto para sua decisão. Nunca mais você me verá
na sua frente, caso queira que continuemos separados. Mas agora, não aceito
um não como resposta. Se não sair comigo agora, vou criar situações, farei de
tudo para termos essa conversa em particular. Algum dia terá que me ouvir.
Não desistirei assim, tão fácil.
Ela conhece meu olhar determinado. Ela sabe que farei da vida dela
um inferno caso ela resista.
Ester solta um suspiro baixo. Seus olhos vão criando um brilho
resignados, mais passivos.
—E seus convidados? Vai deixá-los, assim? —Ela argumenta.
—Você acha mesmo que estou preocupado com isso? Ou com o que as
pessoas estão pensando ou pensarão? Que estou preocupado com a porra
dessa festa? —Digo tudo de forma crescente, minha voz aos poucos se
elevando.
Ela estremece nitidamente.
—Tudo bem. Murat. Vamos então! Você já está perdendo o controle.
Eu solto ar me sentindo aliviado. Coloco minha mão em seu braço de
um jeito natural, até sem pensar. Ester se esquiva. Cerro meus dentes e ofego.
Isso age em mim como um punhal desferido no meu coração.
Ela não suporta nem meu toque.
Capítulo 25- Pingo nos “is”
Ester
Arrogante! Sempre envolto nessa nuvem de poder, ele não parece ter
mudado em nada. Embora ele me olhe agora como um cachorro vira-lata
perdido:
—Eu cometi vários erros na nossa relação. Fiz do nosso apartamento
um mar de rosas, um ninho de amor, sem levar nada do mundo externo para
você. Hoje vejo que isso não nos uniu, nos afastou.
Eu solto o ar. Presa em seu olhar, não digo uma única palavra. Ele
continua:
—Errei em não te contar as ações que eu estava tomando lá fora para
que nosso castelo de sonhos não se desmoronasse
—Você conseguiu a presidência Murat? É isso? Terminou com Hazal
e agora espera me assumir e enfrentar seu pai?
Ele abre a boca, eu o corto:
—Aí terei que assistir ele te massacrar com ameaças, te banindo da
família, com humilhações. Você realmente tem estrutura para isso? Conviver
com ele, trabalhando lá, mesmo sendo presidente na empresa? Ele fará de
tudo para te prejudicar. Ele está obstinado.
—Posso falar?
Eu solto o ar.
—Pode.
Murat hesita, numa demonstração de nervosismo.
—Eu desisti da presidência. Aliás, nem estou mais trabalhando na
Teleimagem.
Eu meneio a cabeça quase sem acreditar.
—Seu pai te escorraçou de lá?
—Não, como eu te disse. EU DESISTI DA PRESIDÊNCIA.
Eu meneio a cabeça sem acreditar nisso. E esse dinheiro que ele doou?
—Como assim? Você é muito ambicioso para ter largado tudo!
Ele solta o ar.
—Sim, é verdade. Eu larguei tudo porque dei uma rasteira no meu pai.
Eu me angustio, pois ele nunca me contou nada a respeito disso, então
por isso penso o pior.
—Você...o roubou?
—Não! —Murat me dá um sorriso triste, abaixa a cabeça e solta o ar,
então me olha. —Não cheguei a esse ponto, mas me sinto como se o tivesse
roubado.
Então ele começa a me contar tudo, desde o início.
De suas viagens, porque ficava dias fora, dos clientes que visitou. O
contrato que ele os fez assinar. Então me contou que terminou com Hazal e o
enfrentamento com seu pai e a forma como seu pai reagiu, o banindo da
família.
Meu coração fica apertado no peito. Não gosto disso. Eu aperto meus
lábios me sentindo triste, sem falas, meus olhos fixos nos dele.
—Não fico feliz com isso. Uma das razões que saí de sua vida, foi
exatamente por isso. Sinto-me até um pouco culpada por essa situação.
Murat desliza seu grande corpo no sofá, se aproximando mais de mim.
Eu estremeço com seu gesto. Ele solta o ar e me olha fixamente:
—Pare Ester! Você não é culpada de nada. Meu pai não pode ditar
meu coração, minha vida. Isso é errado. E ele teria puxado o meu tapete sem
dó. Ele teria me ferrado. Eu teria saído com uma mão na frente e outra atrás.
Ele adoraria ter me visto na lama com a esperança que eu voltasse para casa
com o rabo entre as pernas...
Eu estremeço me lembrando de tudo que ele disse no apartamento.
—Eu sei disso.
Murat olha longe, ele está muito sério, como se colocasse seus
pensamentos em ordem, eu aproveito para observá-lo. Ele parece tão
diferente agora. Tão disposto a conversar, a pôr os pingos nos is. Agora estou
vendo um homem de atitude.
Ele meneia a cabeça e olha para mim.
—Errei com você da última vez que nos falamos, quando você me
confrontou, exigindo uma atitude minha. Eu estava atrás de um cliente
grande, era a última conta que faltava para eu dar o golpe fatal. Unindo-se a
isso, você se decidiu pela sua carreira. Isso me deixou inseguro do seu amor
por mim e por isso te deixei ir...
Estremeço com as falas dele. Murat se levanta. Quando dou por mim
ele está ajoelhado na minha frente.
—Quero que saiba que o valor que conquistei com esse último cliente,
doei para a orquestra que participa. Para mostrar a você o quanto estou
arrependido. Fui arrogante o suficiente para achar que eu ficaria bem sem
você...
Eu abaixo os olhos e foco minhas mãos no colo.
—Não sei se há uma chance para nós. Há ingredientes que não gosto
em você.
Murat pega a minha mão.
—Eu estou disposto a mudar. Quero construir um outro tipo de
relacionamento com você. Um mais aberto. Quero que participe de tudo na
minha vida.
—Você está se ouvindo? Sua vida. E quanto a minha? Você nunca fez
questão de entender quem eu sou!
Ele fica sem falas. Então abaixa a cabeça e beija as minhas mãos.
—Eu era um arrogante idiota. —Ele me olha. —Não sou mais aquele
homem. Quero saber tudo sobre você.
— Você está disposto a me conhecer agora?
Ele expira pelo nariz pesadamente. Suas mãos pegam meus joelhos.
—Sim, Ester...
—Ou irá me ouvir para me agradar? Tem medo de se decepcionar?
Ele me olha determinado.
—Eu não vou me decepcionar.
—Por que nunca quis saber meu passado? Aprofundar nossa relação
sabendo mais da minha vida?
Murat solta o ar.
—Porque eu era um arrogante machista. Não queria ouvir histórias de
outro homem em sua vida. Sempre gostei de pensar que fui o único. Perdoe-
me.
—Você foi o único.
Ele ergue os olhos, confuso.
—Como único? Você não era... virgem quando fizemos amor pela
primeira vez.
—Eu fui molestada pelo meu padrasto quando tinha dez anos.
Seus olhos que agora parecem cansados refletem uma fagulha de dor.
Ele me olha com os lábios separados, sem ar.
Blasfema em turco quando finalmente parece assimilar minhas
palavras.
Ele encurta a distância entre nós, coloca suas mãos no meu rosto e me
beija com carinho nos lábios. Olha para mim.
—Perdoe-me por ter sido tão egoísta a ponto de rejeitar partes de você
que me desagradava...
—Turco machista, você quer dizer.
Ele dá um sorriso triste.
—Sim. —Ele me olha por um momento calado. —Agora quero saber
tudo de você. Sua infância, adolescência, o que te levou a trabalhar para a
minha família tão longe de casa?
Eu solto o ar e aceno um sim para ele.
—Então está pronto a me ouvir?
—Allah! Ester! Quero muito saber sua história.
Eu solto o ar.
—Tudo bem!
Murat se senta no sofá novamente e eu, aos poucos, vou contando
minha história... sobre a minha mãe e seu jeito egoísta de ser, a ausência de
amor. Contei sobre a morte prematura do meu pai, a chegada do meu
padrasto e tudo que aconteceu depois.
A decepção de ver minha mãe querendo se ver livre de mim, louca
para eu me casar com um homem da alta sociedade e por isso as aulas de
piano. As roupas curtas que ela me fazia usar, as festas que ela me fazia
participar. De como ela me tratava na frente dos outros e como um lixo em
casa.
Conto então a minha saída de casa, a morte prematura do meu irmão,
os traficantes me ameaçando.
Murat
Meu corpo inteiro está tenso. As palavras dela levam um tempo até
entrarem no meu cérebro. Minha boca está seca, meu coração apertado por
tudo que ela vivenciou e mais, sinto-me um ser desprezível ante tudo que fiz.
Ela lutava para recomeçar sua vida ante a tanta desgraça e eu agi como
um trator, passando por cima dos seus sentimentos, só pensando em mim, no
meu desejo...
As palavras dela me corroem tanto por dentro. Acho que nunca me
senti tão quebrado em toda a minha vida. Ergo meus olhos atribulados para
ela. Ester me encara altiva, ofegante.
—Decepcionado?
—Como? —Pergunto sem entender o que ela quis dizer com isso.
—Decepcionado com a minha história?
Eu tomo o rosto dela com as minhas mãos e deslizo com delicadeza
meu polegar na pele macia desse rosto lindo, o mais lindo que eu já vi.
—Estou arrasado com minha atitude. Por isso está me vendo assim.
Estou me sentindo culpado. —Eu a solto e digo com a voz sufocada. —
Maldição! Ester. Eu me sinto um crápula. Você tentando ser forte, lutando
sozinha depois de passar por tudo isso e eu sendo tão egoísta. —Ela assente
com tristeza. —Você me perdoa? —Pergunto quase sem voz.
—Sim.
—Você me ama? Consegue me amar depois de tudo isso? —
Questiono, inseguro.
Ela me olha calada. Não perco o tremor de seus lábios.
—Eu te amo, Murat. Sempre te amei...
É como se uma tonelada saísse de meus ombros e eu a abraço
apertado, meus lábios procuram os seus num beijo sedento, ardente. Por um
milagre ela corresponde, eu fico louco para aprofundar mais tudo isso, porque
sou louco por ela, mas não faço isso de maneira ardente. Mas fico apenas na
doçura de seus lábios, feliz por ela me amar, me contentando por sua entrega.
Não quero assustá-la. Eu me controlo e aos poucos me afasto.
Não quero estragar tudo.
Ainda há coisas para dizer. Retiro o anel de noivado do bolso do meu
paletó. Então, me coloco de joelhos e digo:
—Case-se comigo! Conceda-me a alegria de tê-la como minha esposa.
Ester
Murat
Amo vê-la assim entregue. Aquece minha alma vê-la perdida em mim.
Nossas respirações e gemidos se unem e enchem o quarto. Meu corpo é uma
mistura de sensações, emoções, sentimentos...
Ter Ester novamente, senti-la é o ápice da minha felicidade.
Movimento-me com vontade, provocando prazer em seu corpo, no meu
corpo...
Seu gemido alto foi a revelação que ela está tendo um orgasmo forte.
Continuo me mexendo, sem quebrar o momento, consciente que posso fazê-
la alcançar o clímax novamente. Não demora muito isso acontece. Mordendo
o lábio inferior, Ester geme alto e crava suas unhas na minha pele.
É magnífico esse prazer de fazer amor com a mulher amada. Não
perco nenhum de seus gestos, tudo sempre é muito novo para mim. Com um
gemido rouco eu também me rendo, chegando ao ápice do prazer.
Quando tudo termina, emocionados, ficamos nos olhando com ternura,
afirmando um ao outro a grande felicidade de estarmos juntos.
— Não existem palavras que expressem o que sinto quando estou ao
seu lado... — digo todo sentimento.
—Murat...eu nunca pensei que me amasse o suficiente para mudar sua
vida por mim.
—E eu que pensei que era claro com meus sentimentos. Mas entendo
que a situação que vivíamos exigia de mim mais clareza nos meus atos. Mas
não vamos falar sobre isso. Quero uma vida nova.
Ela me beija na boca.
—Verdade, o importante é que nos amamos.
Eu sorrio e a puxo para mim num abraço forte. Sorvo o ar devagar e o
solto com um sentimento de plenitude, felicidade...
Fizemos amor várias vezes na noite, numa necessidade de recuperar o
tempo perdido, depois dormimos abraçados, exaustos, felizes pelo sentimento
mútuo e verdadeiro.
Capítulo 26- Oito meses depois...
Murat
Murat
Quando meu pai se foi, Ester se senta no sofá ao meu lado com
Yasmin no colo.
—Senti um clima estranho entre vocês dois.
Eu solto o ar.
—Ele já estava querendo opinar aonde nossa filha irá estudar.
—Escola turca?
Eu aceno um sim.
—Se eu deixar, Ester. Ele se meterá na nossa vida, na de Yasmin como
fez na minha vida. Fará da nossa vida um inferno. E isso meu amor, nunca
mais. Já estou cortando logo.
Ela suspira.
—Pelo menos as coisas aos poucos estão se ajeitando entre vocês.
Eu a abraço e a olho com todo carinho do mundo
—Sim meu anjo. Estou feliz por isso.
—Senti que ainda existe uma reserva entre vocês.
Eu solto o ar.
—É natural. Isso passará apenas com o tempo. Só espero que ele não
se meta na nossa vida, pois aí as coisas complicarão.
—Na minha humilde opinião, acho que você precisa conversar com
seu pai. Como fez comigo. Vocês precisam falar a mesma língua. O cordão
de duas dobras é mais difícil de arrebentar.
—Você diz isso pois tenho muito do homem turco, não é isso?
Ela acena com a cabeça, afirmando.
—Sim. Não acho que será um pai que aceitará numa boa que Yasmin
use um vestido curto, minissaias, fale palavrão, se comporte levianamente.
—Mas não mesmo!
Ela ri zombeteiramente.
—Eu sei disso. Mas será que ele sabe? Deixa claro isso para seu pai.
Mostre para ele que Yasmin crescerá se vestindo decentemente, mostre esse
seu lado turco que eu conheci.
—Isso não me pareceu um elogio.
Ela dá um sorriso de canto de lábios e continua.
— Converse com seu pai, mostre que está disposto a passar os
ensinamentos que você teve para Yasmin, falar da história do seu povo. Que
você mesmo ensinará o turco para ela. Isso o tranquilizará.
Murat me olha inseguro.
—Você não se arrependeu de ter se casado com um turco, não é?
—Não, Murat, não me arrependi. Embora sofro um pouco com seu
ciúme exagerado, às vezes até sem razão, seu excesso de cuidado comigo...
Eu solto o ar me lembrando de um episódio onde um cara a abordou
quando ela ia ao banheiro do restaurante que fomos jantar. Sem pensar, me
levantei do meu lugar e fui até o homem.
Quando estava para falar um monte para ele, Ester me apresentou
como seu antigo professor de piano. Só então o reconheci, fiquei com
vergonha.
E olha que o cara é bem gordo e velho.
Eu desconverso.
—E as roupas? Te incomoda os vestidos que eu comprei? —
Questiono olhando seu vestido verde, bonito.
Ele não marca excessivamente o corpo. Depois que ela pegou peso
suas curvas ficaram voluptuosas. Ela não faz ideia o quanto é bonita.
—Não Murat. Eu sei que me casei com um homem turco. Eu sabia que
aos poucos você me induziria a me vestir “decentemente” como diz. Isso
nunca me incomodou.
—Está certo! —digo, me sentindo aliviado.
—Eu te amo Murat. Muito.
Eu sorrio.
—Eu também, meu anjo lindo. Você nem sabe o quanto...
Nos abraçamos e nos beijando. Yasmin reclama no colo de Ester. Eu
me afasto e sorrio para minha filha que chora coçando os olhinhos.
—Allah! Vamos para casa! Nosso reloginho está com sono.
—Tadinha, passou o horário dela dormir.
—Vai indo para o carro que eu fecho a loja. —Eu digo e dou a chave
do carro para Ester.
—Está certo.
Olho para trás e sigo minha esposa com os olhos até ela abrir a porta e
sair da loja. Sorrio e subo rapidamente as escadas para apagar as luzes do
andar de cima e do showroom. Sorrio mais aberto me sentindo pleno, sem
nenhuma sombra de tristeza.
Epílogo
Meu olhar está distraído vendo Ester brincando de bola com os nossos
filhos na piscina. É inacreditável como o tempo passou. Yasmin, está com
nove anos e Osman, oito anos.
—A carne está cheirando queimado. —Ouço Tereza dizer.
Pisco e só então vejo o fogo alto que se formou. Jogo um pouco de
água no carvão para diminuir as chamas.
—Droga!
Meu pai se aproxima se firmando em sua bengala.
—Deixa que eu cuido disso—ele diz.
—Não precisa baba. Eu que estava distraído.
Ele olha os netos brincando com Ester.
—Eles cresceram, não é isso que estava pensando?
—Sim, o tempo passou. Tanto que me sinto um velho. As nossas
diferenças de idade agora estão bem em evidência —digo reparando em
Ester, que continua linda, com seus trinta e três anos e eu quarenta e oito.
Estou grisalho, as rugas evidentes nos cantos dos olhos.
—Você não deveria se preocupar com isso. Ester te ama. Não vê como
ela olha para você? Como ainda te procura com os olhos nas festas
beneficentes? Se isso não é um caso de ciúmes, é o que então?
—O senhor acha?
—Tenho certeza. Como tive certeza que havia algo entre vocês quando
Ester veio trabalhar na minha casa.
É, meu pai pega as coisas no ar.
—O senhor está certo pai. E, bem, eu sabia que um dia isso iria
acontecer.
—Baba, vem jogar! —Yasmin me convida.
Meu pai coloca a mão no meu ombro.
—Vai filho, vai se unir a sua família. Eu cuido da carne. Você já assou
quase tudo, praticamente está tudo pronto.
Eu aceno para ele com um sorriso e vou até a minha família, antes de
cair na água retiro a minha camiseta expondo meus pelos bem grisalhos no
peito. Retiro então minha bermuda e só de sunga caminho até eles. Ester sorri
para mim, passando com desejo seus olhos pelo meu corpo.
Eu sorrio para ela.
Sabe de uma coisa? Isso é besteira minha.
Com esse pensamento pulo na parte funda da piscina e por baixo da
água nado até onde eles estão. Emerjo em frente a Ester. Ela sorri, me puxa
para seus braços e me beija. Yasmin nada por baixo e se coloca no nosso
meio.
—Me põe nos ombros, baba.
Eu sorrio e olho para Ester. Então me lembro do que Ester um dia me
disse de ter menina. A concorrência entre nós seria grande. Yasmin a todo
custo quer chamar a minha atenção.
—Vai, baba.
Ester sorri para mim. Acho que ela se lembrou dessa conversa que
tivemos anos atrás, antes mesmo de saber o sexo da criança.
—Está certo. —Digo afundando minha cabeça e colocando minha
filha sobre os ombros.
—Mãe, eu estou com fome. —Osman diz. Ele é bem alto pela pouca
idade. Dizem que ele é minha cópia, eu concordo plenamente.
—Sua avó está colocando a mesa. Por que não vai ajudá-la agilizando
as coisas? Eu vou sair também.
—Está bom. —ele diz. Com um impulso sai da piscina.
Ester me encara e ergue o rosto e observa nossa filha satisfeita por
estar sentada nos meus ombros.
—Pronto Yasmin, agora desce. O baba não anda bem das costas.
—Só mais um pouquinho, anne. (mãe)
—Está me chamando de velho? —Pergunto.
Ester me encara.
—Você outro dia reclamou de dor nas costas.
—Foi apenas um mal jeito.
—Você ainda não está bem, Murat. Não pensa que não vejo você se
automedicar. Desce Yasmin. Vai ajudar a vovó. Vamos!
Ela bufa.
—Está bem!
Eu me inclino e a tiro dos ombros. Obediente ela sai da piscina. Eu
abraço Ester.
—Você continua linda. O tempo não passa para você.
Ela me abraça e me beija, então me olha.
—Você também está cada dia mais bonito. Eu, quando estiver na sua
idade não sei se estarei tão bem assim.
—Sei. Eu? Bonito? Com esses cabelos quase todos brancos, essa barba
grisalha? Nem meus pentelhos escaparam.
Ester ri com vontade.
—Você é lindo Murat. Por dentro e por fora. E você sabe muito bem
disso. E eu que não fique esperta!
Eu sorrio e me encho de prazer com suas palavras.
—Sério que ainda sente ciúmes de mim? Não acredito!
—Então acredite! E você não ouse me testar ou me provocar.
Eu corro minhas mãos pelo rosto de Ester. Os cabelos dela no sol a
deixam mais linda.
—Tudo bem, cabelos de fogo. Você me convenceu. Eu não seria louco
de provocar a fera que mora em você.
Ela sorri.
—Isso mesmo! Bem, vou ajudar sua mãe.
Eu a envolvo com meus braços e a puxo mais para o fundo.
—Ainda não, nossos anjinhos estão se saindo muito bem. A mesa está
ficando linda.
Ester gira a cabeça e sorri quando vê os dois já vestidos trazendo os
talheres e pratos para a mesa.
—Tudo bem, então, ficarei mais um pouquinho. —diz e me abraça
apertado e me beija demorado no pescoço. Eu estico meus lábios com
satisfação, sentindo o seu corpo quente moldado ao meu.
Ah! Como eu amo essa mulher!
Subo meus olhos e ao longe vejo meu pai nos observando com um
sorriso maroto nos lábios.
[1]
Eu penso em você Eu não consigo te esquecer
Porque o amor é assim Inta Habibi
Eu te amo Inta Habibi
Habibi, amor Habibi, amor
Eu reclamo para a lua do meu amor
Me abraça forte Eu não quero te deixar
Porque o amor é assim? Inta Habibi eu te amo Inta Habibi