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Resumo:
Tendo a leitura do livro Volta ao Mundo em 80 dias, de Júlio Verne, como motivação inicial,
pensou-se num projeto para o ensino de Geografia no 7º ano do ensino fundamental II,
possibilitando aos alunos “viajarem” com o personagem principal - Phileas Fogg - em sua
estória de aventura, superação e conhecimento científico do planeta Terra. E assim, por meio
dos acontecimentos vividos no dia-a-dia dos personagens, os leitores/viajantes ao conectarem-
se com a grande viagem, seu planejamento, suas indagações diante dos problemas
enfrentados, puderam fazer conexões e analogias com o conteúdo de Geografia proposto para
a série, tornando o ensino significativo e prazeroso. Os pressupostos teórico-metodológicos
que serviram como base ao trabalho estão presentes em David Ausubel, Lev Vygotsky, Piaget
e Henri Wallon.
Abstract: Having read the book Around the World in 80 days, by Jules Verne, as the initial
motivation, a project for the teaching of Geography in the 7th year of primary education II,
allowing students to "travel" with the main character - Phileas Fogg - in its history of adventure,
overcoming and scientific knowledge of the planet Earth. And so, by means of the events lived
in the day-to-day of the personages, readers / travelers connecting to the great journey, their
planning, their inquiries into the problems they faced, could make connections and analogies
with the content of Geography proposed for the serie, making teaching meaningful and
enjoyable. The theoretical-methodological assumptions that served as the basis for to work are
present in David Ausubel, Lev Vygotsky, Piaget and Henri Wallon.
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ISBN electrónico: 978-9978-77-407-6
“É porque se espalha o grão que a semente acaba por encontrar um terreno fértil.”
Júlio Verne.
Introdução
A estória criada pelo escritor Júlio Verne – A Volta ao Mundo em 80 dias – começa
quando num encontro em um clube de cavalheiros (Reform Club), na cidade de Londres, um
típico membro da aristocracia inglesa chamado Phileas Fogg, aposta com seus pares que é
qualificado para dar a volta ao mundo em apenas 80 dias; o ano é 1872. Estamos falando de
uma sociedade industrial do século XIX, sem os meios tecnológicos que dispomos hoje como
trens modernos e supersônicos, aviões, satélites, G.P.S, telefonia... A missão parece
inconcebível, contudo, Phileas Fogg, acompanhado de seu leal ajudante –Jean Passepartout,
dará início a essa aventura e aproveitará todos os recursos possíveis e impossíveis para
triunfar. Ele alcançará o êxito apesar da caça do detetive Fix, da polícia londrina, que
equivocadamente o confundirá com um ladrão em fuga, e o perseguirá por todo o globo.
No projeto elaborado para o ensino da Geografia no 7º ano do Ensino Fundamental II,
intitulado de “Projeto Viagem pela Geografia – Viajando com Phileas Fogg”, os alunos
tornaram-se participantes desse itinerário global e acompanharam o personagem Phileas Fogg
em sua peregrinação extraordinária. Foi realizado com uma (1) turma do 7º ano do Ensino
Fundamental II, do Colégio Cavalieri no 2º bimestre do ano letivo, na cidade de Belo Horizonte
– Minas Gerais.
A base do projeto está alicerçada na teoria da Assimilação da Aprendizagem e da
Retenção Significativas de David Ausubel (1980, pág. 1) que considera que:
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cooperação e reciprocidade; viver em grupo e especialmente, trabalhar em grupo, é um
aprendizado básico.
O material didático deve ser traçado dentro de um processo pedagógico, usando uma
metodologia apropriada e em função de objetivos claros. O material pré-produzido e aquele
idealizado no processo educacional, em partes e/ou no todo, podem ser significativos ou não,
dependerá de sua interação e assimilação pelos alunos. Inclusive, até mesmo um material
coerentemente significante (em nossa opinião) pode ser compreendido de forma mecânica pelo
aluno. Se não for interessante para ele, não terá nexo. Se for pertinente, os elementos
aglutinam-se, cognitivamente falando, de forma oportuna, permitindo generalizações, ainda
conforme Ausubel.
E quando essas conceptualizações decorrem por meio de vivências, ainda segundo
Ausubel, temos etapas sucessivas de elaboração de hipóteses, novas tentativas de acertos,
busca por respostas e resolução de problemas, com a geração de novos conceitos. Esse
caminhar favorece a aquisição de uma nova forma de pensar, contribuindo para uma
aprendizagem efetiva. Para que a aprendizagem aconteça de maneira mais profunda é
necessário, então, o conhecimento anterior, a ponte entre os materiais produzidos e saberes
cotidianamente construídos pelos alunos, bem como o interesse; uma combinação de fatores.
A aprendizagem ocorre, entre outras razões, porque o aluno não é passivo na evolução de sua
aprendizagem.
Ausubel (1980, pág. 6) esclarece esse ponto a seguir:
Objetivos
Escolhemos o livro Volta ao Mundo em 80 dias depois de uma pesquisa feita pelos
professores e uma enquete com os alunos sobre livros de expedições e aventuras que eles
conheciam ou que gostariam de conhecer. O livro escolhido está na forma de história em
quadrinhos, particularmente, em razão da idade dos alunos e do atrativo dos mesmos nessa
área.
O uso da literatura como recurso pedagógico na Geografia incentiva à leitura e à
utilização de novas linguagens no ensino, no caso, as histórias em quadrinhos. E leva o aluno
a perceber que a Geografia está presente em tudo que fazemos e vivenciamos, depende da
nossa percepção. Junto com a leitura do livro novos assuntos foram sendo acrescentados
naturalmente à discussão coletiva, exigindo pesquisas e buscas em diferentes mídias, além da
preparação de materiais ligados ao projeto (mapas, fichas sobre os países visitados, cartas e
postais de viagens enviados aos pais, entre outros).
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Para estimular o interesse dos alunos a escolha do livro de Júlio Verne foi crucial, pois
ele soube tomar para si o conhecimento geográfico, permitindo outras concepções de mundo
que estava progredindo de forma acelerada. A Geografia tornou-se o pano de fundo de suas
criações literárias empolgantes, com personagens instigantes – cientistas, exploradores de
toda ordem, homens em busca do conhecimento científico, de novas fronteiras e espaços, de
desafios. Evidenciando como se dava a apropriação tecnológica naquele momento histórico,
rico em invenções, descobertas de novos territórios e a dominação da maior parte do mundo
por uma única potência européia – a Inglaterra.
O fato de ser um homem culto e esclarecido, além do seu tempo, o impelia, também, a
fazer as suas advertências em seus livros, para que os avanços não se tornassem estéreis e
que a tradição não se tornasse um campo cada vez maior de desigualdades entre os homens.
Em muitos aspectos, Júlio Verne foi visionário e fez uso da Geografia para que, no
transcorrer de suas estórias, personagens e leitores fossem tomados pela visão/imaginação de
paisagens, de novos pontos de vista diante da vida e do mundo, além da busca pela
singularidade, pelo discernimento, pela ilustração e pelo engrandecimento do conhecimento
humano. Ele perverteu o senso comum dos heróis, tornando-os humanos e isso nos aproximou
ainda mais de sua obra, gerando um encantamento.
Os tópicos abordados foram variados, embora o projeto tenha sido pensado para o 7º
ano do ensino fundamental II, ele pode ser adaptado para outras séries, com maior
aprofundamento, à escolha do professor responsável. O aprendizado se dará de forma direta e
indireta, levando-se em consideração o entusiasmo despertado nos alunos e no professor,
associando-os o máximo possível. A seguir, alguns exemplos do que foi trabalhado e outras
sugestões factíveis, sem se especificar a série e o grau de complexidade exigido, sem o perigo
de esgotarem-se as alternativas, que são imensas:
a) Tópicos abordados:
- visão global do planisfério terrestre, continentes e oceanos, conceitos de circunavegação,
paisagem, lugar, espaço, países, fronteiras, limites, entre outros;
- hemisférios, orientação, fusos horários e a história da criação desse sistema de horas
mundial;
- coordenadas geográficas (Meridiano de Greenwich, latitude e longitude, Linha Internacional
de Data);
- evolução científica no período em comparação com os avanços na atualidade, meios de
transportes, a Revolução Industrial na Inglaterra e sua expansão posterior;
- a visão de mundo predominante na época em que foi escrito o livro, a existência do Império
Britânico e seu poderio retratado em suas colônias pelo mundo, tipos de colonização e as
consequências da colonização para os países hoje independentes;
- as percepções das paisagens e dos habitantes de lugares tão longínquos em relação à
Inglaterra, a idealização e o elogio excessivo aos costumes ingleses – considerados modelos
de civilização;
- as desigualdades culturais, sociais e econômicas entre os povos;
- a violência contra a mulher (quando Phileas Fogg e Passepartout salvam a jovem indiana -
Sra. Aouda - da morte durante a passagem pela Índia);
- conhecimentos gerais sobre os países/colônias visitados: localização, idioma, bandeira,
clima(s), costumes curiosos, sistemas de governo, culinária, pontos turísticos...
b) outras possibilidades
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- a relação dos relatos de viagens ficcionais e não ficcionais com a Geografia (literatura e
Geografia);
- a história da evolução do pensamento geográfico e como ela aparece no livro;
- a aplicação dos princípios da Geografia no dia-a-dia, em sala e fora dela – analogia,
extensão, conexidade ou interação, causalidade e atividade;
- tipos de preconceitos, a dificuldade de lidarmos com as diferenças, alteridade, racismo,
xenofobia, etnocentrismo;
- quem eram os exploradores do passado, quem custeava suas viagens, a quem serviam;
- a desmistificação da imagem do herói nos livros de Júlio Verne;
- a relação da Geografia com a arte, a língua portuguesa e a história;
- a importância da cartografia como suporte para o ensino da Geografia, as diferenças entre o
conhecimento cartográfico no século XIX e o conhecimento cartográfico de hoje...
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O sequenciamento não foi rígido, acompanhou a evolução espontânea do processo de
ensino-aprendizagem, sendo apenas direcionado pelos professores para que se cumprissem
determinados pontos considerados essenciais. Para facilitar a compreensão das etapas, as
expomos a seguir.
planejamento da prática (metodologia, materiais pedagógicos que serão utilizados, nº
de aulas disponíveis, assuntos que devem ser abordados no trabalho, viabilidade de
ser realizado com outra(s) disciplina(s),);
elaboração do mapa da viagem literária/geográfica a ser colocado na parede da sala;
disponibilização dos livros para a leitura;
início da leitura coletiva do livro “Volta ao Mundo em 80 dias” de Júlio Verne;
construção da maleta de viagem e sua costumização, fabricação dos carimbos para o
passaporte;
impressão dos passaportes e fichas dos países a serem visitados - individuais;
produção pelos alunos dos postais de viagens e cartas com seus relatos para a
família;
discussão coletiva sobre o trabalho de acordo com o andamento do projeto;
avaliação.
“- O fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que o aprendiz
já conhece. Descubra o que sabe e baseie nisso seus ensinamentos.” (Ausubel, 1980, p.137).
Nós afirmamos que conjuntamente com o que foi exposto, o que cada aluno já sabe faz
parte de sua história e da apropriação de sua aprendizagem, se conseguirmos unir esse
conhecimento buscando áreas de contato afins com a Geografia e seus campos de interesse e
competências, levaremos esse encanto e essa simpatia para o ensino-aprendizagem e,
consequentemente, para a prática no ensino da Geografia.
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Esse projeto foi uma dessas tentativas que deram excelentes resultados, as fotos
adiante mostram partes do projeto desenvolvido (Figuras 1, 2 , 3 ,4).
Metodologia
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1. Proposta de uma viagem com um personagem literário, cuja história estivesse
ancorada à Inglaterra no início do período da Revolução Industrial. Foi sugerida a
obra “A volta ao mundo em 80 dias”, pelo fato de abarcar esse contexto histórico, ser
uma aventura, passar por vários locais que eram de domínio inglês e enfocar
questões geográficas, entre elas, os fusos horários, a influência dos meios de
transporte, entre outros assuntos;
2. Construção de uma linha do tempo dos principais acontecimentos ocorridos na
Inglaterra para os alunos terem uma idéia da cronologia dos fatos, desde o séc XV
até o séc XXI , com a localização da história “A volta ao mundo em 80 dias” no tempo
e no espaço;
3. Leitura da obra em uma versão em quadrinhos;
4. Discussão dos vários aspectos da obra (o autor e sua vida, quando foi escrita, seus
cenários histórico-geográficos e sociais);
5. Proposta de uma viagem seguindo os passos do personagem (Phileas Fogg),
partindo do Brasil em direção à Inglaterra para início da aventura;
6. Elaboração de um passaporte, de um fichário básico e de uma mala de viagem para
nela depositar-se as informações geográficas que forem sendo colhidas ao longo da
jornada imaginária, (Figura 5).
7. Localização da rota em um mapa mundi atual, com os pontos de passagem, para dar
idéia da extensão da jornada (distâncias percorridas, países e lugares, diversidade
cultural);
8. Início da viagem, com o carimbo nos passaportes e cpmeço do preenchimento dos
fichários com as informações de cada país por onde o viajante passou;
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9. Discussão coletiva das informações levantadas em cada país para que todos
tivessem as mesmas informações (principalmente do item “curiosidades”)
10. Análise dos tipos de transporte disponíveis segundo os países por onde o
personagem passou, para dar a idéia de desenvolvimento tecnológico disponível na
época e no espaço (1872);
11. Discussão das formas de contagem do tempo durante a aventura;
12. Elaboração de modelos dos meios de transporte da época, conforme os meios
utilizados pelo personagem Phileas Fogg;
13. Resolução do enigma da contagem de tempo presente no livro, o que permitiu que o
personagem ao final da história ganhasse a aposta, e comparação com o sistema de
fusos horários na atualidade;
14. Exposição realizada na escola mostrando o progresso de todo o projeto;
15. Possibilidade de trabalhar-se o projeto com várias disciplinas: Ciências, Português,
Artes...
Considerações Finais
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potencialidades psicológicas do aluno são influenciadas pelo contexto sócio-cultural em que a
criança está inserida (Vygotsky, Wallon).
Junto com a afetividade ocorreu a união com a ludicidade, e ao reconhecermos que todo
ser humano interage e interdepende do outro, e que deve “dialogar” em todos os espaços,
acrescentamos mais um aspecto determinante no ensino-aprendizagem, a alteridade.
Sem dúvida, a experiência diferenciada em sala de aula, demonstrou que o valor do
trabalho não está somente na metodologia e na possibilidade de, literalmente, viajar com o
personagem Phileas Fogg, e sim, na concepção de como se elabora o conhecimento e quais
são seus ganhos didáticos, que ultrapassam a literatura. O processo criou momentos
agradáveis e possibilitou questionamentos, abordando variados tópicos com um maior
aprofundamento dos conceitos geográficos.
Por fim, baseado no estudo da literatura e tendo como companheiro de viagem o
personagem principal, Phileas Fogg ao longo do livro, o projeto nos fez compreender que a
produção cultural e nesse caso, a literatura, não está separada do contexto da vida diária e da
formação de conceitos e princípios metodológicos da Geografia. As práticas, junto com o lúdico
e a afetividade, são veículos para a aprendizagem, que se deu com a elaboração individual e
coletiva do conhecimento, agregando os saberes com a curiosidade e o despertar de
descobertas. Todos esses fatores podem e devem estar presentes na sala de aula e estão
relacionados com nossas visões de mundo e como vemos o processo educacional. Permitem
que façamos uma reflexão a todo instante entre o professor que somos e aquele que
desejamos ser, numa retroalimentação constante.
O projeto convoca-nos, a procurarmos sempre novas estratégias e metodologias,
contribuindo assim, na busca pela melhoria do ensino, da prática educativa e do desejo de uma
maior humanização dentro do processo educacional. E estimula o aluno, quando o mesmo
compreende que a aprendizagem começa na vontade interna de cada um e que o
conhecimento está em todos os lugares, em toda a parte. Desnuda a idéia de que o lúdico, a
alegria, não podem ser utilizados como ferramentas pedagógicas. Onde está escrito que o
aprendizado tem que ser triste ou enfadonho? A revolução no ensino começa em nossas ações
e em nossas práticas.
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