Você está na página 1de 10
Festas no Brasil colonial Elos de ligacao com a vida da Metropole ‘Maria Berhilde de Barros Lima e Moura FILHA * ‘Uma analise da documentacao que tramitava entre a Metropole ¢ o Brasil, no periodo colonial, nos mostra a importancia que as festas de cunko official e religioso tinham naquela época. Tratando das comemoracoes de carater ofi- cial, verifica-se que sto diversas as ordens que partiam de Portugal, cetermi- nando que fosse comemorado o nascimento de um principe, que fossem envi- ados os donativos para auxiliar nos gastos feitos com as festas dos casamentos Reais ocorridas na metrépole, ou ainda, especificando as formalidades a serem adotadas nos funerais das pessoas ligadas i Coroa Real. Por sua vee, partiam dos oficiis das camaras e dos governadores das capitanias do Brasil, oficios ¢ cartas, informando o re:ebimento das referidas ordens e prestando conta das celebracoes feitas, como uma indispensvel demonstragio de fidelidade a0 poder metropolitano. [Em Portugal, estes romentos de festa foram importantes para consolidar 0 poder absolutista dos res e para a demonstracao da opulencia dos grupos soci- ais dominantes. Nas colonias, como no Brasil, a celebracio destas datas tinham ‘como principal objetivo fazer presente a imagem do poder real ¢ estabelecer tum elo de ligacdo entre am rei, geograficamente distante,e seus stditos através de acontecimentos que significavam a continuidade do seu poder. Sendo assim, ‘muitas so as referencias as festasreligiosase fesas publicas, organizadas para comemorar os nascimentos, casamentos e coroacoes de membros da familia teal, como, também, as demonstragdes de pesar e dor pela morte de um rei Quanto as festas religiosas, sabemos que um dos artificios mais explorados pela Igreja Catolica foi a espetacularizacao ea exuberincia das suas solenida- des, No Brasil, desde os primeiros tempos da colonizacao, a Igreja fez uso de comemoragées caracterizadas pela teatralidade e pela pompa, possiveis na rea- lidade da colonia, Os padres jesuitas foram os primeiros a utilizar as encena- ‘oes teatrais para transmitir seus ideaisrelgiosos, para introduzir os rudimen- tos da civilizagdo entre os nativos, e também para manter um trago de unifo dos colonos com a cultura da Metropole, Assim, o teatro jesuitico talvez tenha sido o embriao do goste popular pelo teatro, ou a0 menos pelo espeticulo, * Untversidade Federal da Pantba, 465 Maria Bertil de Barros Lina ¢ Moura FILHA Estas solenicades religiosas vio estar presentes ao longo de todo o periodo colonial, atingindo seu apogeu no decorrer do século XVI, quando duas datas do calendirio linirgico foram mais significativas. Neste sentido, a procissio do Corpo de Deus, considerad em Portugal como “a procissao das procissies”, foi twatada com a mesma relevancia no Brasil. E, a partic de 1757, surge a obrigato: riedade de celebrar o dia de Sto Francisco de Borja, institutdo por ordem real como protetor do Reino e dominios ultramarinos contra os terremotos, sendo todas as cAmaras obrigadas a comemorarem este dia com procissio solene. E importante observar que se torna dificil fazer referencia distintamente as {estas oficiais e religiosas, pois, na realidade existia uma forte ligacao entre 0 poder monarquico e a Igreja Catélica, o que nao permitia uma distancia tao sgrande entre ambos. As celebracoes religiosas cumpriam objtivos préprios da Tgreja, mas tambem eram parte obrigatoria na comemoracio das datas referen- tes a Coroa, servindo para reforcar a presenca do poder temporal na colonia, pela influencia e forca quea lgreja tinha perante a populaglo. Sendo assim, as procissoes realizavam-se, anto para sagrar 0s fatos ligados a vida da familia real ~ nascimentos, aniversérios, coroagdes ~ como, principalmente, as datas associadas ao calendar liirgico Embora as fesiasreligiosas tenham sido bastante significativas no Brasil colonial, particularmente, quando observa-se a questao dos aparatos cenografi- cos montados para seus eventos, optou-se no presente artigo, por analisar aquelas ocasides de carite: oficial. Deseja-se, com isso, entender estas festivi- dades como um rebatimento do pocler metropolitano na colonia. Cronologicamente, a documentacao trabalhada indica que desdle meados do século XVII, celebrava-se no Brasil datas signficativas da Coroa Portuguesa, No entanto, as mesmas estavam restritas, quase que exclusivamente, a algumas capitanias brasileiras: Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro, Maranhao. O século XVIIL, em particular, na sva segunda metade, vai ser o periodo de maior reali- ago das festas oficinis, que passam a acontecer, entao, em todo o Brasil, sendo conhecidas cerimonias realizadas, seja na Vila do Desterro de Santa Catarina, seja na Vila de Barcelos na Capitania do Rio Negro. Mas ao tratar estas fests como um elo de ligacao entre a metropole portu- {guesa ¢ a coldnia, € prec’so fazer algumas consideragdes preliminares. Em Portugal, é conhecida a santuosidade que estas festas atingitam, tendo sido este tema ja tratado por diversos autores. Algumas, em especifico, foram mar- cantes pela produgdo de elementos efémeros que transformavam 0 espaco urbano em verdadeiros cenatios, idealizados com qualidade artistica e functo simbolica, para expressar valores associados ao poder real. Com a participacao de arquitetos e artesios, eram produzidos arcos triunfais que marcavam 0 per- ‘curso dos cortejos reais. Carros alegoricos eram utilizados nos desfiles, asim ‘como eram feitos espetaculos de fogos de artificio, que estavam associados a ‘uma arquitetura fiticia qe hes servia de suporte Por sua vez, no Brasil foram poucas as ocasides em que as festas aleanca- ram um apogeu. E preciso lembrar que tratava-se de uma realidade bem dis- tinta, inserida num contexto de colonia, onde as limitagées orcamentarias nem estas no Brasil clonal Elos de igacto om a vida da Metropole 467 sempre permitiam maiores investimentos em tais eventos. Estes eram sempre fiscalizados pela Fazende Real, sendo o poder local punido quando as despests ‘ram elevadas, ou nao tisham sido previamente autorizadas pela metrépole. Ressaltase, também, que sendo manifestacdes eminentemente urbanas, essas fests s6 vio ter evidéncia no Brasil a partir do momento em que suas vila ecidades se apresentavam mais consolidadas, com uma estrutura social ¢ econdmica mais estivel. Isto explica porque, cronologicamente, estas festas $6 se tornaram relevantes no decorrer do século XVIII, acontecendo entao com maior frequéncia, ou tendo maior enfase no seu cardterteatral Contudo, através da documentacao trabalhada, ¢ possivel verificar que, quando se apresentava um contexto favoravel A realizacio dessas celebracoes, surgia logo a imtengdo de reproduzir na colonia o tipo de solenidade que se dlesenvolvia na metropole. Constata-se que, basicamente, a estrutura da festa vai ser transposta para o Brasil, onde @ exemplo de Portugal, constavam de missas solenes, procissOrs, representag6es teatrais, dancas, cortidas de touros, {jogos de cavalaria. Mas, prinipalmente,identfica-se a reproducao da esséncia da festa barrocarealizada na Europa, caracterizada pela teatalidade, pelo espe- culo e riqueza visual, reunindo elementos que apelavam para os sentidos. Sempre que possvel, surgia a intencao de valorizar estes acontecimentos, wtli- zando-se eenarios efémeros que vinham enriqueceresteticamente as cidades. ‘No Brasil colonial, foram marcantes esses dias de festascivicas, promovidas para comemorar os faustos da Coroa, 0s quais associados as celebracdes reli ios, consttuiam morientos excepcionais de animacdo num quadro de vida urbana ecoletiva muito resto Portanto, detendo-se nas cerimonias de cariter oficial ocorridas no século XVIII, € relevante perceber como ocorreu a tranferéncia deste tipo de evento para o Brasil, observando-se a estruturagdo das solenidades e, na medida do possivel, os cents urbanos construidos. Para tanto, foram selecionadasinfor- rmagées sobre algumas solenidaces realizadas para marcar os easamentos, mas- cimentos ¢ cerimonias frnebres dle membros da familia real, buscando-se refle- tir sobre tas aspectos. Os casamentos reais, 0s documentos expedidos pelos governadores ¢ pelas cAmaras mostram {que para celebrar os casimentos dos principes ocorriam “demonstracoes de ale ¢gria’, segundo um modelo que consideravam ser de “costume em semethantes ocasides”. As missas solenes, as procissbes e as noites de luminarias parecem ter sido elementos esserciais das referidas solenidades. ‘A fim de verficar ccmo essas festas ocorreram no Brasil Colonia, toma-se como baliza um acontecimento dos mais celebrados em Portugal, no século XVIII: 0 duplo matrimonio dos infantes D. José, principe do Brasil com D. Mariana Vitoria, filha de Filipe V, e D Fernando, principe das Asturias com D. Barbara de Braganca, filha de D. Joao V, Esta alianca, considerada como 0 +468, Maria Bertie de Baros Lina Moura FILMA auge da politica de luxo e magnificéncia de D. Joao V, devia também ser cele- brada em todas as cidades e vilas brasileiras, as quais por carta régia, foram cconvocadas a festejar este duplo consércio. Entre os documentos que trataram das comemoracdes destes casamentos, tum em especifico chamou a atencao, Em carta datada de 1° de maio de 1729, Capitao-mor do Rio Grande do Norte, prestava conta ao rei das solenidades financiadas por ele, para festejar os casamentos dos principes reais dizendo: (2 mo obs «eterlidadeelemiasdo dt pai €0 demi das suas poses, ‘quis mostrar muito qu apa esas elias cllebrando nove dis sucess, am Comets vras esa cavalo ¢ mascars, ote galas, com ml oo deat {ito ess de athart, sa soleement canada com 0 Shor exon ¢ pcs, ‘tuminandese tes nates das cas desta cidade.) cauzando matali wees assto, por nce trem visto outa semelante cllebacaoeipecalmente ds mutos Indes Tpuyas ds Aldea desta Capp gue cra edmiade, Jaen mas apc soda Rel ganda de Ysa Mageade (3-1 Atraves deste relato, vése como estas festas eram utlizadas com a intencio de fazer presente na coldria a imagem do rei e impor seu poderio diante dos povos colonizados. Na disante Regiao Nordeste do Brasil, esta festa, que cele- brava o casamento de prircipes nunca vistos na colonia, devia levar os indios ‘Tapuyas a tomar consciéncia do poder da Coroa Portuguesa, ‘A grandiosidade que marcou a celebracao deste duplo casamento em Portugal fez recair sobre as capitanias brasileiras pesados encargos, com os donativos impostes para financiar tas festas. A obrigatoriedade desses donati- vos era uma pritica corrente, que repercutia num grande nuimero de pedidos para reduc4o ou caneelamento desses tributos. Diante deste aspecto, fica claro © quanto estes se tornavam onerosos para algumas capitanias onde a pobreza predominava. Como exemplo desses inumeraveis registro, cta-se uma carta dos oficiais ‘da Camara de Sergipe del Rey, datada de 1729, na qual alegavam que o valor ‘de doze mil cruzados anusis,estabelecido como donativo para os gastos com ‘0s easamentos dos prineipes, tinha sido imposto sem observar 0 miseravel ‘estado em que se achavami os moradores da Capitania, por ndo ter preco nem demanda os produtos da :erra, Relatava, que durante a arrecadagao do dona- tivo, alguns moradores, pera completarem a porgao em que haviam sido finta- dos, chegaram a por em arrematacio até as proprias vestimentas. Diante disso escreviam ao re, solicitando a redueao deste donativo pois, assim, a populacao poderia (..) “com mais suavidade contribuirem as suas obrigacaens a que vivem sogeitos,¢ como bons vassllos, obedientes sempre a Vossa Magestade” (..)? "NATAL, 1729, mao, 10, Carts do eapitto-mor do Rio Grande do Nort, Domingos de Moras Navarzo, a0 sel D. Joao V, sabre a festvidades que ocortzam pele easamento des principes als, AHU~ ACL CU O18, Cx 2.136, 2 SERGIPE DEL REY, 1729, jaro, 10. Carta ds Oficiis da Camara ce Seripe del Rey a0 Ret 1. Joao \, slictando que os asi da contribuicao er que fram moltads pata o donatvo do cexsamento dos principes, pols, devido a miséria dos Habitats e smpossiel ating a soma pedida, AHU~ ACL = CU ~08i, Cx 03, D197 ests no Bras colonil los de liga com a vide da Metropole 469 Mas houve, também, ocasides em que estas festas chegaram a excessos de riqueza, eriticados perante a realidacle brasileira. Para avaliar o requinte que cessas festa alcancaram, nada melhor do que se referir @ aquelas que acontece- ram em Minas Gerais, onde a alta rentabilidade do ouro oferecia meios para ue as comunidades promovessem, com mais recursos financeiros e qualidade <énica, 05 seus eventos piblicos. Sendo assim, em 1786, as nove Camaras exis- tentes na Capitania de Minas Gerais celebraram (..) “com mayor gosto, luzi- ‘mento e grandeza que foy possivel” (...), 0 easamento de D. Joao VI com D. Carlota Joaquina e da Infanta D, Mariana Vietoria com D. Gabriel, Infante de Espana, Segundo informou 0 Governador, Luiz da Cunha Menezes, a mais pomposa dessas festas aconteceu em Vila Rica, havendo no dia destinado as “festas de igreja", uma missa solene celebrada pelo Bispo Diocesano, uma prociss4o compantada pelos Regimentos de Cavalaria e Infantaria, e por fim os fogos € disparos que faziam o encerramento das solenidades religiosas. Seguido a este brithante dia” sucederam os dias de festa publicas assim descritos (tres maid Caathadas excuades por qurenta it excletes Cavaco ca ¢ unjormemente vest: es mais de toro es de Operas Publics, een tos os sobre {os dias owerao tu nacoens por ada esta Vila entrando neste numero as da Camara ¢ -nais as dem passe public ou jam eleorcamenie uminado com sels ml hanes que ‘Siero a sua brilhaneeluninosadeoracaodemonsirar-opluzivel objec a que se dd cao amos semlhartes fests” (.)° A partir desta citagao, chama-se a atengao para a forte relaglo que sempre hhouve entre Igreja e poder, sendo todas essas datas comemoradas com as “es- {as de igreja”, repetindo o modelo que, além da sua esséncia de teatralidade, constava sempre de missa solene, procisto, fogose disparos de avulharia, Em paralelo, ganhavam cada vez mais espago as festas publieas, com as tradicio- nais cavalhadas ¢ corridas de touros, e a introdugao das operas e outras ence- nagoes de carater profano ‘Um segundo aspecto a comentar éa preparacao da cidade para esses dias de festa. Embora critieas da época questionassem a realizacao delas, no pertodo de decadencia da extragio do ouro em Minas, vé-se que esas fesas foram gran- diosas, permitindo a canstrucdo, em Vila Rica, de uma espécie de passeio piiblico com ruas arborizadas e até mesmo dois lagos antificiais onde acontece- ram as touradas e cavalhadas e onde armaram os camarotes destinados& gente nobre da vila, ricamente ornamentados de cortinas de damasco. + > VILA RICA. 1786, agosto, 3. Carta de Luis da Cunha Menezes, governor de Minas Gerais, para Martino de Melo e Casto, Secrelaio de Estado da Marina e Ultamar, informansd tet ‘cumprid as ordens reas veerenes 4 realzagt de letejosalusivos sos casamentos do nlante D. Joao com a Infants Carlota Joaguina, eda Infanta D. Mariana Vitola com o Infante D. (Gabriel, AHU-Cons Ul_Bril /MG, Cx. 125, D.12 Ch, FERREIRA, Delson Goncalves. Cartas Chilenas: retro de uma época. Belo Horizonte UEMG, 1987, 470 Maria Berd de Barros Lima ¢ Moura FILHA O nascimento de infantes © nascimento de um principe era sempre saudado como uma dadiva com a qual Deus felictava o reino, pos representava a continuidade da familia real e, consequentemente, do seu poderio. As coldnias, colocando-se como constan- tes merecedoras das merces e heneficios dos seus soberanes, tinham mais wma vez que aplaudir estes acortecimentos. Sendo assim, em762, # Camara de Aquiraz, cabeca da comarca do Ceara Grande, parabenizava 6 monarca pelo nascimento do Infante D. Jose, agrade- cendo a Deus a mercé de Tes dar um principe e assim “ver firmada a propaga- 0 Regia”. Informava que tinham sido feitas as “demonstraes de alegria que Couberdo na pobreza da tera". A exemplo do ritual adotado para comemorar 0s casamentos reais, as festividades em Aquiraz, constaram de tés noites sucessi- vas de luminarias,¢ t8s das de “entrudo”, patrocinados pelo Corregedor da ‘Comarca. ? ‘A mesma ocasiao do nascimento do principe da Beira, fot comemorada na Vila de Sto Joao del Rei, on Minas Gerais. Os oficiais da Camara informaram das “demonstracoens de jublos e fstejos costumados em semelhante acca”, com- postas das festividades de lgrejae dos repetidos dias de festas nas pracas publi- cas, sendo tudo comemorado “com to brilhante lustr, que fez inveja aos mais consethos".* [Na Cidade da Paratha, em 1794, foi festejado o nascimento da Serenissima Princesa da Beira com tés dias de festa assim deseritos: no primeiro dia, fot ‘tuminada toda a cidade e se celebrou uma famosa comédia, No segundo, con- tinuada a mesma iluminagio, houve marchas ¢ exercicios. No uhtimo dia, cele- ‘browse missa cantada, a tarde foi realizada uma procissio e por fim o cantico dle um Te Deum com muita miisica e demonstracio de fogos de antficio. Informava ainda o goverrador, que na Paraiba, “as mais Cameras das pobres villas taobem fzerdoo que efi possivet” para comemorar a ocasiao.? (Os fumerais dos reis Em Portugal, a importancia das cerimonias fanebres, como forma de exal- tagao da monarquia, justificava a construgao de grancliosos cenairios montados para essas ocasibes, quando as igrejas eram ornamentadas com simbolos da > AQUIRAZ. 1762, marco, 6. Carta da cimara da vila de Agultaz 20 ei D. José 1, comunleando (06 Festeos pelo nasclmento do Principe da Beira. AHU ~ ACL - CU) ~ 017, Cx. 8, D498 S'SAO JOAO DEL REY. 1762, cezembio, 15. Representagto dos oficiais da Camara de Vila de Sio Joo del Rei, cumprimentando pelo nascimento do Petnelpe einformando a grande festa Teta nesta vila naquela ocsig, AHU-Cons Ul Brasil MG, Cx. 80, D- 69 PARAIBA. 1794, abi, 7. Ocio do governador da Paratha, brigadeto Jeronimo José de Melo « Casto, ao secrotario de esiado da Marina e Ultamar, Martinbo de Melo e Castro, infor ‘mando sobre os peepatatives da festa feta pelo naseimento da Princesa da Beir AHU_ACL_CU_O14, Cx. 32,D 2307 Festas no Bral colonial, Els de igacdo com a vida da Metropole 471 morte destacando-se sempre um grandioso mausoléo, erigido como principal elemento do repertorio éecorativo.® No Brasil, porém, os lutos e cerimnias funebres,impostas como obrigato- riedade pela coroa portuguesa, nem sempre podiam ser cumpridos com a gran- diosidade que estes mortentos requeriam, havendo restrgdes em consequén- cia da precariedade de recursos financeiros. Mas ¢ curioso perceber que, também nessas ocasides, ocorria uma tranferéncia do modelo de solenidade que acontecia na metropole e era reproduzido na colonia, de acorde com as elreunstancas locais Alguns documentos testemunham 0 contexto em que estas cerimonias aconteciam. Uma consulta do Conselho Ultramarino ao rei D. José, datada de 10 de outubro de 1754, resultou em uma adverténcia 20 Ouvidor da Comarca de Parnagud, Capitania do Piaut, que havia autorizado despesas com as exé- ‘quis do Rei. Joao V, sem ter ordem especifca para tal fim, Este documento tras um breve relato das exéquias celebradas e das limitacOes que se apresenta- vam para realizagao dest cerimonia, Segundo relaa este documento “por flesamano do Senor Rey Dom Joo qu qu eta em gla elebron Camere dla Vl sus xegues cam a stoi qu permite o ca dagces {eras ormande na gua Mairi um anal grande guarnecldo das posse demonstra ses de sentient comocando ad Clee Roos dS Francie Compania A eau com eo tural, cere muzica e mals anos da grease dispenderao teens ini res enrando met computa hua poe de bac qe dra pr ls ods oa ‘esd Camera Justis, png ne sm esta aud de cat ta poses pra este Sinha ato cama decent neces ()® Por este relato, vé-se a presenca de um grande timmilo como elemento cen- tral das exéquias reaizaas em memoria de D. Joao V, seguindo o modelo das solenidades da metropcle, onde sempre o grandioso catafaleo era o pricipal elemento do repertério decorativo das cerimdnias finebres. Este modelo vai ‘continuar a se repetir a0 longo do tempo. Por Provisio Regia, catada de 10 de dezembro de 1795, a Rainha D. Maria solictava a0 Governador ¢ Capitio General da Capitania do Mato Grosso que informasse sobre as (..) “despesas dos Funerais e Exequias das Pessoas Reaes, € «do costume que se tem practicado; fazendo-se relacdo daquellas Cameras que nao tem rendimento para as ditas despezas, ¢ por onde nestas se tem feito, remetendo uma exacta relacao das formalidades e despezas que se tem practicado™."° TEDIM, Jose Manuel, Apartosfnebres, eos ssadosos nas exéquias de D. Pero Ite de D. Jodo V In: PEREIRA, Joao Cstel-Branco (Coord). rue Elemea eat Posugal. Lisbou: Fundacto Calouste Gulbenkian, 2001. pg 236 ~279. "LISBOA. 1754, Outubr, 16. Consulta do Conselo Ultramarino ao ei D. Jos, sobre a carta do owvidor de Parnagua, Antonio Pires daSilva e Melo Porto, acerea das despesas que a Camara fez com as exequlas do vei D. Joao V-AHU_ACL_CU_016, Cx 5, D-333, "VILA BELA. 1708, junho, 10. Cara do governador e expito-general da capitania de Mato Grosso, Gaetano Pinto de Miranda Montenegro &ainha D. Maria |, sobre o cumprimento da provisto regia que orden as chmaraspratquem as formalidades de funerals e exequias as pessoas reais, AHU_ACL_CU 010, Cx. 34,D. 1781, 472 Maria Baril de Barros Lima ¢ Moura FILHA Em cumprimento a essa provisio, 0 Governador do Mato Grosso solicitou as Camaras das vilas existentes na Capitania que prestassem tais informacoes, Sobre a pratica adotada era tais solenidades, respondeu a Camara da Vila de Cuiaba: “A practica observade nesta Villa desde asta creagdo¢€ agora sobre as Exequias das Pessoa Rees, eda mancira sequin. Loge que en Camera se abe a Cara de particpacdo la noticia divi plo Esme. Snr General do Estado, se mando publica Elitas pou ‘olen o tos conforma ley, ¢delarao dia em que devem Ser celebrada as Fxequas, ava que a ellasvenhan asst toda a Nobreza da tera e Poo. Para isto se manda coxsruir na Ire Marighum Mauzulo com & maior pompa poss vel 5econyca tado 0 Clap, ¢Irmandades a maior muzica, €o mithor order, equ ao Mestre de Compa ha Corp de Milcas, que acabada a fanao dem as descargas de esi.” ou CCabia informar ainda sebre a forma como eram pagas as despesas feitas nes- tas solenidades, e isto nos da ideia da simplicidade com que ocorriam essas cerimonias, que ainda assim se mostravam relevantes para a época, Acrescentaram os oficias da Camara: Tada a despea do Mauzulo, da muzica, do orador da povora eda sera que se eprte port o Clr, Irmandaies e pessoas de Govemanca, he fla plo bens do Conceho, jus Tando-s.ecomprand-s tudo por oem do Senado, com recbo das pessows competenes se lea em conta ao theconcr, po srem despezas minds, bras de que noha areata {até mesma 0 Mauzulea, ea constracdo munca houve quem arrematss, Toda esta des ‘ea importa onlnaramunte hm conto dees, eda para cima”. Por sua vez, a Camara de Vila Bela, capital da Capitania, informou que con- cluam (..)*ndo ter esta Camera sempre comprido com esta forcoza obrigacao, porque dos seus livros se nao acha com individuagdo especificada esta despeza (..) € porque sé a que se fez com o funeral do Senhor Rey D. Jozé que Dees aja he que se acha com clareza” (..). Sobre esta solenidade informaram as despezas feitas ‘com a musica, cera dada aos oficiais do Senado, baeta preta para a functo, ac ‘Na carta drigida a Rainha, aerescentou 0 Governador do Mato Grosso que em Vila Bela, (..) “por falecimento do Senhior Rey Dom Joze 1°, Augusto Pay de Vossa Magestade, se quebrardo taobem aqui os Escudos, como se practica no Reyno” (.). E sobre a nio realizagio de cerimdnias nestas “tistissimas occai- des", informou o Governador que era consequeéncia dos baixos rendimentos da capitania e que tal falta seria corrigida, caso o comércio com a cidade do Para ampliasse, ou se a coroa prestasse algun auxilio extraordinario, para que por falta de meios, nao deixassem de satisfazer (..) "a estes indispensaveis deveres da saudade e Fidelidade Portugueza’ (..). Festas no Bras! colonial. Els de ligocdo com a vida da Metropole 473 Guardadas as limitacoes economicas, vé-se claramente que os govemnantes locais tinham a conscienzia de estar seguindo os modelos de solenidades reali- 2zadas em Portugal, incluindo até mesmo a quebra das escudos, como se prati- cava no Reino. E embora essas cerimonias fossem marcadas pela modéstia, cumpriam seu principal objetivo que era a demonstracio de fidelidade a Coroa Portuguesa Portanto, estas cerimonias eram, de fato, um forte elo de ligacio entre a Metropole Portuguesa ¢ o Brasil, fazendo sempre presente o distante poder real. Ao mesino tempo, confirma-se a tranferéncia, para o Brasil, dos modelos de festas adotados em Portugal, seja na repetigao da estrutura bisica das ceri- rmonias, ou na intencao de reproduzir, ainda que muito modestamente, o tipo da festa battoca, marcadé pela teatralidade e pelo espeticulo.

Você também pode gostar