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O presente artigo tem como objetivo analisar a MD 31-M07 (Doutrina Militar de Defesa
Cibernética) como instrumento catalisador da unificação de pensamento para atuação das
FFAA no espaço cibernético, à luz do Direito Internacional Humanitário (DIH) / Direito
Internacional dos Conflitos Armados (DICA). A previsão de emprego do espaço cibernético,
delimitados pelos princípios, características, possibilidades e limitações da defesa
cibernéticas bem como as formas da ação e tipos de ação de defesa cibernética realizadas
pelas FFAA devem estar embasadas por meio do cumprimento das leis do DIH/DICA quando
aplicados como regulador dos meios e métodos de combate (jus in bello), por força do
previsto nos tratados de Genebra assinados em 1949 pelo Brasil. Existindo apenas um
único ciberespaço, onde militares e civis coexistem, não fica claro na MD 31-M-07 em quais
cenários as FFAA poderão ser empregadas em caso de Conflito Armado, pois a adoção dos
termos “situação de Guerra e de Não-Guerra”, para delimitar os cenários de operação, não
encontra respaldo no DICA/DIH. Isso posto, a análise busca demonstrar que as definições
empregadas na MD 31-M-07 (Guerra e Não-Guerra) não especificam a abrangência de
emprego das FFAA no espaço cibernético ao consideramos os conceitos de Conflito Armado
Internacional, Não-Internacional ou Internacionalizado como decisivos para a legitimidade ou
não do uso do DIH/DICA pelo Estado.
Na END estão previstas ações com o objetivo de promover para o Brasil a Inserção
Internacional, e dentro deste tópico, incrementar o apoio à participação brasileira no cenário
mundial, mediante a atuação do Ministério da Defesa e demais ministérios:
- nos processos internacionais relevantes de tomada de decisão, aprimorando e
aumentando a capacidade de negociação do Brasil;
- nos processo de decisão sobre o destino da Região Antártica;
- em ações que promovam a ampliação da projeção do País no concerto mundial e
reafirmar o seu compromisso com a defesa da paz e com a cooperação entre os povos;
- em fóruns internacionais relacionados com as questões estratégicas, priorizando
organismos regionais como o Conselho de Defesa Sul-Americano (CDS) da União de
Nações Sul-Americanas (UNASUL);
- no relacionamento entre os países amazônicos, no âmbito da Organização do
Tratado de Cooperação Amazônica;
- na intensificação da cooperação e do comércio com países da África, da América
Central e do Caribe, inclusive a Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos
(CELAC); e
- na consolidação da Zona de Paz e de Cooperação do Atlântico Sul (ZOPACAS), e o
incremento na interação inter-regionais, como a Comunidade de Países de Língua
Portuguesa (CPLP), a cúpula América do Sul-África (ASA) e o Fórum de Diálogo Índia-
Brasil-África do Sul (IBAS) (BRASIL, 2012).
Nesse contexto, o Brasil vem tentando projetar-se no cenário internacional,
participando de missões sob a gerência das Organizações das Nações Unidas (ONU),
fazendo parte dos seus contingentes, tal como podemos identificar na diretriz nº19 da END:
“Preparar as Forças Armadas para desempenharem
responsabilidades crescentes em operações internacionais de apoio
à política exterior do Brasil. Em tais operações, as Forças agirão sob
a orientação das Nações Unidas ou em apoio a iniciativas de órgãos
multilaterais da região, pois o fortalecimento do sistema de
segurança coletiva é benéfico à paz mundial e à defesa nacional”
(BRASIL, 2012).
Essa visão apenas corrobora uma postura brasileira que, ao longo do tempo,
tradicionalmente busca uma postura jurídica igualitária no sistema jurídico internacional, pois
desde a sua primeira constituição republicana em 1891 o Brasil aboliu a metodologia de
guerra por conquista, tendo sido pioneiro a ressaltar a importância da adoção de tratados e
acordos igualitários entre países, desde sua participação na segunda conferencia de paz em
Haia, realizada em 1907 (BRASIL, 2012).
Em face ao exposto, fica claro que a PND e a END buscam definir o que são e qual o
papel das FFAA na sociedade brasileira, e paralelo temos o DIDH (embutido no Constituição
de 1988) direcionando o preparo e emprego em tempo de paz bem como o DICA
delimitando os meios e métodos que poderão ser utilizados em caso de conflito.
Porém como Kissinger (2015) observa, a natureza das comunicações em rede, com
sua capacidade de impregnar e penetrar os setores sociais, financeiros, militares e
industriais atropelou a compreensão daqueles que têm o dever de ajustar as normas
públicas à sociedade em evolução. Torna-se necessário entender como o ambiente virtual
influencia a sociedade e como o princípio soberano de uso da força pelo Estado por meio
das FFAA está normatizado segundo o MD.
Possui dez características, dentre as quais para os fins deste artigo destaca-se o da
Incerteza que diz [...] as ações no Espaço Cibernético podem não gerar os efeitos
desejados em decorrência das diversas variáveis que afetam o comportamento dos
sistemas informatizados.” (BRASIL, 2014, grifo do autor).
No que tange as formas de atuação (item 2.7.4), a Guerra Cibernética pode ser
utilizada em “[...] um ambiente de crise ou conflito, em apoio a uma operação militar.”
(BRASIL, 2014, grifo do autor). Dessa maneira, são três as possibilidades de emprego em
ações cibernéticas:
Ataque Cibernético - compreende ações para interromper, negar, degradar,
corromper ou destruir informações ou sistemas computacionais
armazenados em dispositivos e redes computacionais e de
comunicações do oponente.
Sendo essas ações limitadas, no que tange as formas de atuação (item 2.7.4 da MD
31-M-07), em operações de Guerra e Não-Guerra da seguinte maneira:
Operações de Não-Guerra - por ocasião da execução de Operações de Não-
Guerra, o emprego de ações de ataque cibernético necessita de autorização
expressa de autoridade competente, normalmente em nível político. Para
as ações de exploração cibernética, deverão ser observados atos normativos
do ordenamento jurídico em vigor. Em caso de dúvidas, caberá ao EMCFA
consultar o nível político acerca do emprego das ações anteriormente
mencionadas.
Quanto as características, foi ressaltada entre as dez, aquela que se entendeu mais
relevante, pois a Incerteza significa que não se pode estimar a extensão dos danos
causados. Isso implica na inobservância de pelo menos quatro princípios: Distinção, uma
vez que não será possível distinguir quem será afetado pela ação; Limitação, pois não será
possível saber se os danos serão supérfluos e o sofrimento desnecessário; Necessidade
Militar, pois não será possível precisar a vantagem militar esperada e Humanidade, pois não
se pode garantir o ataque exclusivo contra objetivos legítimos.
CONCLUSÃO
Pode-se concluir ao final deste trabalho que embora a Doutrina Militar de Defesa
Cibernética procure abranger todo o conhecimento necessário para o direcionamento das
ações nesse campo, cabe ainda algumas ressalvas quanto ao emprego militar quando nas
operações em conflitos armados.
Procurou-se abordar os princípios, as características, as possiblidades e as
limitações de emprego da Guerra Cibernética, tal qual definida na MD 31-M07 (Doutrina
Militar de Defesa Cibernética), à luz dos princípios do Direito Internacional dos Conflitos
Armados definidos também pelo Ministério da Defesa no Manual de Emprego do Direito
Internacional dos Conflitos Armados (DICA) nas Forças Armadas (MD 34-M-03).
Foi identificado que, em alguns momentos, as definições do “como deve ser feito”,
relativos as operações militares, são conflitantes. Utilizou-se como premissa que, sendo o
DICA fruto de acordos ratificados e internalizados pelo Brasil, sua filosofia tem precedência
sobre qualquer doutrina de emprego das FFAA, inclusive sobre a cibernética, cabendo
assim, uma adequação dessa última em relação a primeira.
Conclui-se que o assunto não se esgota nesse trabalho, especialmente ao
observarmos a complexidade dos temas envolvidos: conflitos armados, ciberespaço e
Direito Internacional. Sendo assim, espera-se que novas abordagens surjam sobre esse
tema e que novas linhas de debate apareçam, sempre com o intuito de melhorar a
capacidade de defesa do Brasil.
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