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O "mundo rural" do Rio Grande do Sul vem experimentando, nos tiltimos vinte e cinco anos, algumas transformagies extraordindrias. Sob 0 angulo propriamente econdmico © produtivo, uma verdadeira revolugio agricola, que transformou a face agréria do Estado, redimensionando inteiramente © uso da terra e suas caracteristicas tecnolégicas. Se esta é uma faceta bem divulgada, a outra caracteristica marcante é ainda quase inteiramente desconhecida: a emergéncia de um amplo mnjunto de movimentos sociais inais e suas organizacoes que adentrou o "mundo da politica” @, a0s poucos, ven conseguindo romper com uma estrutura de dominacao social constituida historicamente, ampliando, como resultado, as oportunidades politicas para os segmentos sociais mais pobres, realocando a destinacao de fundos pablicos, no meio rural gaticho, © contexto em que emergiram, caracteristicas salientes em scu desenvolvimento, Av, Jodo Pessoa, 415 + 90040-000 24-8821 + Fax (051) 227-5131 Politica, protesto e cidadania no campo As lutas sociais dos colonos € dos trabalhadores rurais no Rio Grande do Sul Zander Navarro Organizador Claudia Job Schmitt Franklin Daniel Rothman Jonathan Fox Lynn Stephen Maria Stela Moraes Odaci Luiz Coradini ex: D) catitiversidade © dos autores T edicdo: 1996 Diteitos reservados desta edigéo: Universidade Federal do Rio Grande do Sul Apoio: Centro de Tecnologias Alternativas Populares (CETAP) Rodovia RS-324, Km 104 ~ Bairro Sao Joo, Passo Fundo-RS, Caixa Postal 616 — CEP 99001-970 — Fone (04) 31. Movineno de Atigides por Barragens(MABIRS Rua Espirito Santo, 165 Grexim- RS : ” ep 9700-000 Fane (0s4) 3221887 eae Sere nee eaaceanais dane ane 4 —Trabalhador rural—Rio Grande doSul. 1. Navarro, DU 304:323,32(816.5) Catalogacéo na publicacio: Monica Ballejo Canto. CRB 10/1023, ISBN 85.7025-406-7 Este livro € dedicado aos agricultores ¢ agri- cultoras dos movimentos sociais rarais do Rio Grande do Sul. Quem sabe afortunada- ‘mente, € impossivel aqui nominé-los, pois sio inimeros os personagens mais destaca- dos desses movimentos. Com suas organi- zagées, 08 colonos gatichos tém transforma- do nogies tedricas, como cidadania e demo- cracia, em uma realidade eada vez mais con- creta nas reas rurais deste Estado. Este livro € igualmente dedicado a Arnil- wen, Jacques Alfonsin, Joao Pedro José Siqueira (0 “Zecao”)¢ a Sue- Hi Belatto. Finalmente, é também dedicado a José mes da Silva (in memoriam), 0 insubst vel sonhador da reforma agraria no Bras A CUT dos colonos: 4 historias da construgéo de um novo (ores). Friends, Fo sindicalismo no campo no Rio Grande do Sul! Berkeley, Univers CLAUDIA JOB SCHMITT SCHMIDT,S.W. political cliente- ‘A retomada das lutas sociais no meio rural, no final dos anos 70, ‘coincide com o ressurgimento das greves e mobilizagoes dos trabalha- dores urbanos.A CUT, fundada em 1983, em seu processo de constru- ao, procurou integrar o campo e a cidade, reunindo, sob uma mesma sirutura, diferentes vertentes de contestacao ao sindicalismo oficial, que surgiram no processo de desintegragio do regime mil movimento, uma identidade mais abrangente, “o trabalhador”, passou | ‘a articular identidades singulares associadas a categorias profissionais : 0 operario, 0 pequeno agricultor, 0 funcionirio pa- 10 procura resgatar alguns elementos con: dos pequenos agricultores do sul do B pecial atencio A emergéncia e consolidagao do sindi is ta no Rio Grande do Sul. O engajamento dos trabalhadores do campo ¢, mais espe de organizagio da classe trabathadora no Brasil, no el ridade de sua hist6ria. Compreendé-la pode contribuir para que possa- 188 lo sindicalismo rural, enquanto instrume: dos trabalhadores do campo, ocorre, no durante os anos do regime ser demonstrada através dat Bost \cio herdada do perfodo getulista. O sindicato tinico, base municipal, passow a congregar em seu quadro de associados um ‘conjunto heterogéneo de categorias sociais, reunidas em um: tidade, que foi enquanio o trabalhador rural. A estrutura organi deragdes ¢ na CONTAG. ‘No Rio Grande do Sul agio da FAG (Frente Agraria Ga 1361 pa fa dos Bispos gatichos, pode ser considerada como sendo decisiva no processo de constituicao dos sindicatos. Tratava-se de langar as bases de um sindicalismo “verdadeiro c autént paz de sc constituir enquanto Grgio de defesa dos des to de “novos profetas” associagao icultores Sem Terra).' Ainda nos anos 60, 196 sindi- fundados por influéneia da FAG, recebe portanto, no meio ru das nas lutas do pré-64, No pl imposigio daw sindicatos, na imposigio do estatuto padrio, no poder de intervencio das Delegacias Regionais do Trabalho (DRTs) sobre as eleicSes sindicai ‘numa série de outros mecanismos. Constitui-se, assim, um relagdes que assegura a subordinacio dos sindicatos (oficiais) is cap do aparelho de Estado - do Executivo, do Ju ‘ou do Legislativo”.* izacio do Estado mat contlitos, a insti jendimento ao associado” fazem parte de um conjunto mais amplo de estratégias desenvolvidas pelo calismo oficial enquanto mediador das necessidades vividas pelos tra- balhadores do campo nos anos do regime militar. fece especial atengio o papel assumido pelas re- icas do Es- junto aos associados, nao mas, sim, enquanto agén- le sorvigos.A arquitetura dos prédios construidos nes (0s do interior do Estado, geralmente perto da ‘com nitidez as funges desempe- agricultores: sal da FETAG (Federacao dos Trabalha- 990, Dissertacio ( i que recebia di- INAMPS pra 1a. Aquele que populagdes ru- na maioria dos estatutos que vi “ i para mera aprova- eo na asemblia de Fundago, Os esos ec a estruuragi do sm dicato foi resultado das experiéncias ce luta e organ’ ‘cato de pequenos proprietarios e, mais r Sindicatismo no campo: 192 ltates pela chapa encabegada por José Fi igiiidades presentes na acio do si tempo que se beneficia da parceria com 0 na exe as de saaide e previdéncia implementadas pelo re- gime: procura unificar os trabalhadores rurais levantando a band dda reforma agri ia legal o Estatuto da Terra, Em um perfodo marcado pela repressao politica e pelo est to dos canais de participacao, x CONTAG representou uma espécie de ‘oposigéo consentida no campo, em um mom ficava sua presenca no meio rural. Assi com especial destaque para 0 caso do Nord capaz de incorporar, em uma versio modera das organizagies de trabalhadores rurais do do inclusive, em seu quadro de associados, € intes egressos das lutas camponesas. Vale lembrar ainda que a sim \dicato, mesmo no caso das diretorias menos atu- lade de recorrer a uma ¢ relativizando, em ;mpostas pelos grupos dominan- existentes no que tange & aplicagio desses direitos sao, tanto dos Srgios fe, a estrutura of \s experiéncias de luta icamente, 0 surgi i coincide com a retomada das cio dos anos 80. Nos co! desenvolvido pelos seto- res progtessistas da Igreja Catdlica vao surgindo liderangas com novo perfil, que passam a disputar © controle dos STRs. jencialismo”e o“burocratis padendo ser transpost ‘especico da regio Sul do Brasil, Ver: PALME] 1OS.set,de7.1989, ada, para as bases, ou seja, para aqueles setores da popu: ivados ao mesmo tempo “do ter, do poder e do saber”,” desdobrand: imeiro momento, a Iuta dos sem- le barragens, organizagao das mulheres e dos jov Norte do Estado, marca ada de 1970 por diferentes conflitos fundid i como um dos mais impo: mediadores. Ali organizam-se as p 194, Ita possui dimensoes ético-religiosas, como fica explicito no proprio material de ranizar em sindicatos 1s, O povo que acre- sta maquina capi- a servico da lu foram conquistados atra- izacio dos ag as eleigdes projetavam-se em um horizonte tes objetivas, relacion ‘Nas proposta apresentadas px 195 ria de um salério minimo aos 55 anos e aposentadoria da mulher); ~ methor dos servigos de assisténcia 4 satide prestados pelo poder piblico. E importante observar que a critica a prestagao de servigos de aten- o pelo STR raramente aparece de forma 60s. No que diz respeito a questo da sat i no sentido de reforcar 0 papel da entidade de clas- se eng smo fiscalizador da atuagio dos médicos, dos hospi- tais ¢ do FUNRURAL, bem como seu compromisso de esclarecer aos agricultores os seus direitos. Em certos casos, dependendo da conjuntu- . mas iri reverter esse dinheiro no atendimento odontolégico nas, ‘omunidades.. lo no que for possivel A partir do ano de 1984 amplia-se a conquista de novos STRs. Neste ‘ano a chapa 2, Renovagao, assume a directo do STR de Erexim. Ocor- rem ainda eleigdes em Tenente Portela, Rock combativo” ass ‘vas vit6rias: Palmeita das Miss celino Ramos. Seria um erro, no enti irmos o movimento de renovagio sindieal que ocorre no periodo ao surgimento das aposigées sindicais, perdendo de vista experiéncias inovadoras surgidas no interior da pro= pria estrutura sindical oficial. Estas, em muitos casos, contaram também s de vinculagiio progressista. foram as mobilizagdes pro- com a influéncia de mediadores religi ‘Um exemplo desse tipo de inicia movidas pelos trabalhadores rurais da regitio nos anos dle 1980 e 1981, os sindicatos estiveram a frente -mpregando metodologias p: cagGes dos produtores de uva, ws pelas opasigdes si etos vivida pelos fumicultores neste mesmo perfodo, Nesta primeira metade da década dle 1980, paralelamente a ¢0 das oposig6es sindicais, verifica-se também o surgimento de novas organizagdes que, apesar de posswirem, sobretudo nesse primei mento, win e smo} cos, se constituindo enquanto movimentos auténomos. No Rio Grande do Sul, no ano de 1983, realiza-se 0 1 Encontro Ei tadwal de Trabalhadotes Sem Terra. As deliberagdes aprovadas pelas derangas ali presentes apontam, ja naquele momento, para a orga ‘cio de um movimento independente “ de todo o povo trabalhador”, No Alto Uruguai, a Comissio Regional de Barragens, formada em 1979 por religiosos, sindicalistas e um profes- emergéncia de conflitos especificos, sendo suas instancias de patticipa- ‘gioe decisio gestadas, em grande medida, como desdobramentos de um proceso de luta social, No caso de alguns municipios, a conquista do sindicato nao teve como ponto de pattida o engajamento dos agriculio- res em um conflito social determinado. Em outros casos, o surgimento do sindicatismo combativo foi um desdobramento da atuagao dos “mo- vimentos”. O papel do STR no que diz respeilo a implantagao dessas especificas, que envolvem uma parcela de seu quadto de associados, tor- na-se cada vez mais diluido na medida em que essas frentes de atuagio vo assumindo uma dinimica propria. ‘Chama atengio no periodo a velocidade com que se dé o eresci- mento horizontal, tanto do sindicalismo combative como das demais or- ganizagbes que emergem no meio rural. A relacio com a Igreja foi, se sentido, de fundamental importineia, para que o trabalho pudesse pe netrar em novos muniefpios, envolvendo um nimero erescente de age cultotes. Ao mesmo tempo em que essas novas posighes eram conquis tadas, desenvol ‘a criagdo de féruns de nivel superior. Em meito momento surgem articulagoes de sindicatos e oposik No Rio Grande do Sul, em margo de 1983, como ini parcela do movimento sindical mais ligada a CPT (contando ‘© apoio de entidades de assessoria dedicadas ao trabalho de organi 197 popular, como por exemplo @ CAMP"), organi do Alto Unuguai), cujos obje O Informati- ‘empo, um instrumento de comuni- cacio entre os sindicatos e um vefculo de difusio do trabalho para no- im 1986 é fundada a ESAU (Bs guai ) voltada fundamentalmente para 0 trabalho de formagio politica de dirigentes A divergé iio Rural), na regio da Serra, € pelo GEA (Grupo de Estudos Agririos), na regio das Misses. Eim 1984 comega a estruturar- da CPT, aArticula- gio Sul, congregando, inicialmente, tas dos Estados do Rio AESMA (Escola Sindical Margarida Alves), por exempl de 1986, 1987 € 1988, dedicava-se d formagao dos quadros dirigentes que Aco ‘mantinha uma estreita relago com a cor tuuragao do PT. partido Tanga bases No ano de 1983 organiza-se em Ronda va como era, mas no se consegui reverter. E.em 1988 teve um fato..um grupo de pessoas entio do PMDB, toda af, se incomodaram e po de pessoas. foram praticamente de casa em ea i precisava mais pagaro sindicato, porque o sindi vva mais, que no tinha mais médico. Com a conquista da STR, o embate apenas comegava. QUEBRANDOA ESTRUTURA POR DENTRO: (OS DESAFIOS DOSANOS 80, enfrentamento com as forgas \Glo das Iutas sociais no campo no Rio Grande do Si rante toda a década de 1980. Uma melhor compreenséo dessa trajetoria exige, no entanto, que voltemos nosso olliar para 0 espago interno das inspirou a emergéncia das oposigies sindicais, bem como o proces- so de construgio da CUT, tanto no campo como na cidade. As resolu- Ges aprovadas nos congressos da Central, em que pe dades ¢ eventuais contradicdes internas, refletem um posicionamento nesse sentido: ) imponha um dical e nem so dé o dirvito de aprovar ou vetar u ‘Combateremos também a tese de que esta questao deva esper iada com os mecanismos da es- trutura sindical fascista que esta af. Em resumo, nfo aprovamos uma nova ical para ser colacada em apresentagio na Congresso Naci- ia, nom para ser apreciada pela Constituinte, nem para ser ida com a velha estrutura sindical. Aprovamos uma estrutura sin ical para im este movimento de construgio do’ realizado em agosto de 1986, como uma das pri da CUT no proceso consti de de organizacao si 201 missdes de Fat cionaiios pablicos: movimento sindi ‘A nova Carta Constitucional, no entanto, preservou diversas amar- ras que sustentavam a velha estrutura, reafirmando o sindicato tinico por base territorial, garantindo (e mesmo ampliando) as contribuigdes sin- dicais obrigatérias, e mantendo a divisdo do movimento sindi tegorias. Em que pese algumas conquistas obtidas no campo legislativo, ‘como por exemplo, o ainda que restrito direito de greve, 0 quadro que ‘emerge no periodo pés-Constituinte, do ponto de vista de legislacio, tancia-se bastante dos principios que norteiam a liberdade e a autono- ‘ia sindical. Tendo como referencia este cendrio € que foi redigido 0 do- cumento aprovado no Ill CONCUT, ocorrido em 1988: a, delegado sindicais, etc.) ea sindicalizagio dos fun- iravam entre as propostas a serem defendidas pelo (..) ha urna questéo titica ¢ imediata diretamente rel discussio sobre concepcio sindical da CUT: o resul C Apesar de formalmentecitado oprinetpio da tiberdade e au- fonomia sindical, foram mantidos dois elementos fundamentais da estru- ide imposta pela lei ¢ 0 ‘dade © autonomia sindical depende- ro da CUT, de sua capacidade de im- uma organizagio sindical alternativa. Da mesma forma que, na sda das lutas ¢ na origem do novo foi decisivo romper com os 3, apontam para a inte no que diz respeito& leg

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