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Michel Foucault AULAS SOBRE A VONTADE DE SABER Michel Foucault Aulas Sobre a Vontade de Saber Curso no Collége de France (1970-1971) seguido de O Saber de Edipo Edict estabelecida sob direc de Frangois Ewalde Alessandro Fontana, ‘ ‘por Lanel Dajert, + Toto ROSEMARY COSTHIEK ABILIO. esp etree eS con tv oe oo ei te ‘sme “cennewo arta ces dh or teen cp ate “en at fe hs a Lng sd ec cltgistice ob “Benth tent "asd tr lt ras a tH PAOLO nt infenfarngetacont ionamin ar INDICE Adverténcia Curso, anos 1970-1971 Aula de 9 de dezembro de 1970 Deslocamento do tema do saber para o da verdade. Elio do deseo de Saber na hstria da filesofiaa partir de Arsttoles. Nietzsche restbe- lece essa exterioridade.- Leitua interna e externa do livro A da Mera- Jisica, A tori arisotlia do saber exclu o saber transgressive da t= itdia grega,o saber sofatico, a reminiscéncia platGnica.- Curiosidade de poder: duas morfologins de saber. Aula de 16 de dezembro de 1970. Para uma andlse da desimplieagio entre o conhecimentoe a verdade, ~ Primodo obscuro da verdade em Aritdele, para quem desejo, verda- de, conhecimentoformam uma estruturaeérica. Espinosa, Kant, Nie Sche procuram subvertr essa sistematicidade, ~Libertar-se do “velho chinés” de KOnigsberg, mas matar Espinosa. ~ Nietsche afasta 0 per- tencimento entra verdade eo conhecimento, Aula de 6 de janeiro de 1971 meena (s Sofistas: seu aparecimentoe sua exclusio. ~ Histria da Filosofia segundo Aristteles, em suas relagdes com a verdade. O discuso filo- sfico no pode ter 0 mesmo estauto que odiscurs postco. -O modo de existéncia hstrico da filosoia consruido para séculos por Aristé- {cles.~A existénci da filesofiapossbiitada pela exclusio dos Sofs- tas, ~O Sofista como personagem. O sofismo como técnica. ~ A sols- ‘ica manipula a materialidade das palavra. ~ Papel diferente de Plato cede Arsteles a exclusio do Sofistas, Aula de 13 de janeiro de 1971 ( sofisma ea discurso verdadeiro, ~ Come fazer a historia do diseureo apofintico. ~ Manipulaedo ligica contra manipulago sofistica. - Ma- 29 31 ‘eriatidade do enunciado, materialidade da propesgfo. Roussel, Bris- set, Wolfson, sofista de hoje ~ Plato excluiopersonagem do Sofsta, ‘Aristteles exclu a téenica do sofisma. ~ O sofisma € a relagio do Aiseurso com o sujet fant. Aula de 27 de janeiro de 1971 Discursos que devem sus funciona socicdade grea a estar igados 8 verdade. Discuros judicais,discursos poticos.~Exame de um docu- ‘mento trio, no imiar da eivitizacio helenisica. -Comparagao com a Tada: una éspata homeérica quase judicial, Um sistema de quatro con- fiontos. - Soberania do juize soberania selvagem. — Um julgamento Inomérico, ou a famosa cena do escudo de Aquils”. Aula de 3 de fevereiro de 1971 Hesodo, ~Caraterigagio das fla de verdade cm Homer en disco ‘0 judicial, Ritual ordiico grego e Inquisigao cist. Prazere prova de verdade no masaquisma.~ Hesiodo eanior do iinein contra dita ein dos julzesreis devoradores de presentes.~Dikaion e dite em He- ‘iodo. — Extensio do frinein no espago jurdico grexo e novo tipo de afiemagdo da verdade. A legislagSo de Dracone reparacto.—Dikaion «ordem do mundo Aula de 10 de fevereiro de 1971... ~ ‘Distribuiio da fila de verdade segundo dicen Brine. — Sup mento de um dikaion hesi6dico como revindicaglo de uma ordem jus- ta. Papel do vizinho no jogo entre a justca ea hjustiga, ~ Da verdade ‘ordiliea A verdade-sabor.~ Aporte dos saberesassiros e hiitas. Sua Uransformagio na Grécia. Aula de 17 de fevereiro de 1971. 1 dikaion hesddico (continuagie), Tiania e moeda: dois emprést os vidos do Oriente. A trnsformacio greg deslocamento da ve dade, do ordilio para o saber; deslocamento do saber do ambito do po- er para o da justign. — Recorréneia de duas figuras onireas: santo [Antonio e Fausto, ~ Crise agririae transformagdes pica nos séeutos Vile VI. ~ Hoplitas e camponeses. O artesansto. - Verdade-desatio hhomérica esaber-poder oriental transformam-se em verdade-sabet. Aula de 24 de fevereivo de 1971. ‘A insltugo da moeda, A mood ou as moedas? ~ As tés fungdes da rmoeda grea: metitese do poder, simulacro, reulagio social. ~ A moe- da com intaurago do dkaion kal ales 65 5 91 10s ug Aula de 3 de marco de 1971, a ‘Onnémos. nstitugio contemparinea dae eenta e da moeda (ndmos © némisma) ~ Lei escritae ritual enuncatvo (ndmos e shesmas). ~ O ‘quato apoios do names. Moeda corintia eames ateniense, Eunomia hesiédiea e eunomia soloniana. - Economia e politica. A Cidode- ‘do: una noglo absolutamente nova, Cesura ene economia e politica. Reflexdo sobre o simulacro, a moeda, afl. O que & um némos dito por ninguém? Aula de 10 de marco de 1971. ( puro eo impure: a abluglohomerica como rito de passagem. ~ Re- versio do estatuto da conspureacio nos séculos VII e VI. ~ Némos, moeda e novas pritiasreligisas. -O pribido como substitlo demo critica do suesficio suntuirio, ~ Democratizagao da imortlidade. — (Criminalidade e vontade de saber. Aula de 17 de margo de 1971. Crime, pureza,verdade: uma nova problema. A tragédia de Epo Emergéncia do testemunko visual, ~ Némos e pureza, Patera, sab poder. 0 Edipo de Sdfocles versus 0 Fipo de Freud. ~O que o lugar do Sibio mascara, ~O que é um acontesimento discursive? ~ Utilidade de Nietzsche, Aula sobre Nietzsche ‘Como pensar a histira da verdade com Nietzsche sem bascar-se ma werdade (© conhecimento no tem uma orgem sim uma histria.A verdad tam ‘bém foi inverts, porém mais tarde. ~ Desenvoltura de Nietzsche, que desfiz a implicagio enue o saber ea verdade.~Sujeite-cheto, produtos eno fundamento do cenhecimento, ~A marca, 0 signo, a palava, 21 tice: intramentosenio acontecimentos do conhecimenta.~ Um conhe- tment que se desenvolve no espaco da transgressb. Jogo da marca, da palevra¢ do querer © conhecimento como mont. A verdade como ‘moral, O que arcula vende e verdad: aliberdade ou voléncia? - Os paradoxos da vontade de verdade. No hi uma ontologia da verdade. so, ero, mentra como categeias de distribuici da verdade no verda- ira, ~ Arisdeles e Nstsche: dois paradigmas da vontade de saber. Resumo do curso... O saber de Eaipo Em Bip re a api de Sac, cnc abort dfrontam ajustam, O mecanisme do simboton ei as meds, rege con 133 Ist 165 . Te3 201 209 Fronto dos saberes, ~ Em que se vé 0 inquérito, procedimenta judicial implantado nos séculos V1, frente frente com o procedimento divi- inatrio tradicional. - Epo, o ignorant, ¢ portador do saber do trano; dio, bras do inconsciente ou velha figura oriental do rei que sabe? Ealpo ei, ovo poder-sabertranspressivo. Simagio do cwso.. 239 Indice das noges 0m - 265, Jndice dos termos gregos.. 293, Indice dos nomes de pessoas. 297 ADVERTENCIA Michel Foucault lecionow no College de France de dezembro de 1970 até sua morte em junho de 1984 ~ com excegdo de 1977, em que desfru- touum ano sabitica, O name de sua citedra era: Histoire des systémes de _ponsée [Historia dos sistemas de pensamento]. Foi criada em 30 de novembro de 1969, por proposta de Jules Vuille- i, pela assembleia geral dos professores do College de France,em subs titulo & eitedra Historia do pensamento filoséfico, que Jean Hyppolite ‘ocupara até falecer. Em 12 de abril de 1970, a mesma assembleia elegeu Michel Foucault titular da nova eitedra', Ble tinha entio 43 anos, Foucault proferiu sua aula inaugural em 2 de dezembro de 19702. O ensino no Collége de France segue regras particulates. Os profes- sores comprometem-se a dar 26 horas de aula por ano (metade éas quais, ‘no miximo, pode ser cumprida em forma de seminérios?). Devem expor ‘anunlmente uma pesquisa original, 0 que os obriga a renovar todo ano 0 contetido de seu curso. A assisténcia as aulas e seminarios ¢ inteiramente livre; no requer inscrigo nem diploma, ¢ o professor nio outorga diplo- ‘ma’. No vocabulirio do Collége de France, diz-se que os professores no ‘tém estudantes, ¢ sim ouvintes. (Os cursos de Miche! Foucault aconteciam toda quarta-feira, do inicio de janeiro ao Final de margo. A assisténcia, muito numerosa, composta de estudantes, dacentes, pesquisadores. curiosos, entre os quais muitos estran- _geiros, mobilizava dois anfiteatros do College de France. Foucault muitas |. Michal Foseaut ener um Five ego paras andra com 2 sepine fraser psianempreener 9 inria dos seat Je pnsrnen.o” (Tie sue mitt Certs 19941988, 08 por D Delon & F.Ewsk co) Lagrange Par Gals 1994.4 vl ef tp 846) 2. Fl sr pubes pl igeGallmar em si de 1971 como tl LO de tour. 3 Michel Foul ssi Fert ie ds anos 1980 | Nocomexlo de Cole de Fane x Aude stn avn de ster ‘vezes se queixou da distincia que costumava haver entre ele sea “pili +60" e do pouco dilogo que a forma do curso possibilitava’. Sonkave com lum semindrio que fosse lugar de um verdadeiro trabalho coletivo. Fez diversas tentativasnesse sentido. Nos ltimos anos, terminada aaula, de- -dicava um longo momento a responder as perguntas dos cuvintes. Em 1975, un jornaista do Nowe! Observateur, Gérard Petitjean, sdesereveu assim o ambiente: “Quando Foucault entra na aren, rio, Aarrojado, como alguém se jogando na Sgua, tem de transpor corpos para ehogar & sua cadera; empurra os gravadores para poder colocar seus pa ‘ls, rao easseo,acende uma Himpada e arranca a com por hora. Voz fort, eficiente,reproduzida por alto-falantes~ nia concessdo ao moder- nismo numa sala mal aelarada por uma luz que se ergue de coachas em estuque. Ha trezentos lugares ¢ quinhentas pessoas aglutinadas, entupindo todo minimo espago live [...} Nenhum efeto de orator. E limpido ¢ terrivelmenteefiess. Nem a menor concessio ao improviso. Foucault tem doze horas por ano para explicar, em curso pblico,o sentido de sua pes- aquisa durante o ano recém-findo. Assim, ele aperta ao maximo cenche a5 margens, como esescorrespondentes que ainda tém muito dizer quando chegam ao final da pigina. 19815. Foucault para. Os estdantes precipi tam-se até sua mesa, Nao par falar com ee, e sim para desiga os grava- dores. Sem pergunas. Na balbidia, Foucault estés6:" E comenia: “Seria preciso poder dscuir © que presenti. As vezes, quando a aula no fi boa, bastaria pousa coisa, uma pergunta, para recolocar tudo no lugar. Mas ess pergunta nunca vem. Na Fran, o efito de grupo tora impossivel toda e qualquer ciscussio rea. E, como nio hi canal de retorno, a aula se teataliza enbo uma relag3o de ator ou de acrobata com s pessoas que ali esto E, quando scabo de falar, uma sensagio ée solidio tot.” ‘Michel Foucault abordava seu ensino como um pesquisador:explora- ‘¢des para um livro futuro, desbravamento também de campos de problema- tizagdo, que talvez formulasse mais como um convite langado a eventuais| pesquisadores. Por isso as cursos na College de France nao repe:em os li- ‘ros publicados, Nao sio seu esboso, ainda que entre livros e cursos possa 4. £m 1976 cons epernoga v4 de rar inci, Miche Foucault madou bora camo, que patio de IP, no ald de prs 9 hors dh anh. CI inc da prime ‘aul (7 de ania de 1976) de fut ddr esc Cours a Coli de Francs 1976. -eF.Evai & A Fonts, por M Beran & A. Fontana, Pars, Galkmar Seu (eal Hates fades, 1997 6. Ge Poin, "Les Grands Pres deur Fags", Le Nowe! Osera- tour? abi de 19'S Abverénia XI aver temas em comm. Tém seu proprio esto, Fazem parte de um re- ime discursivoespecifico no conjunto de “ats flodticos"eftuados por che! Foucault, Nos cursos ele desenvolve muito paicularmente o pro- arama de uma geneslogia das elages saber/poder em fungio do aul 8 atid inicio dos anos 1970, rediecionara seu trabalho ~em opesqio 30 eum arqusologia das formaydesdscursivas, que até eno ele dominara s cursos tinham também uma fungdo na atualidade. O ouvinte que _vinha segui-los nido era apenas cativado pelo relato que ia se construindo semana a semana; ndo era apenas seduzido pelo rigor da exposigdo; encon- trava li também um aclaramento da atualidade. A arte de Michel Foucault estava em diagonalizar a atualidade por meio da histéria. Ele podia falar de Nietzsche ou de Aristteles, da peritagem psiquidtriea no século XIX ou 4a pastoral crst: 0 ouvinte extraia-thes sempre uma luz sobre o presente © sobre 0s acontecimentos de que era contemporines. A forca propria de Michel Foucault em seus cursos devia-se a esse cruzamento sui ene eru- digao cientitica, engajamento pessoal e trabalho sobreo acontecimento. ‘0s anos 1970 viram o desenvolvimento eo aperftigoamento dos gra- vvadores portiteis, que logo invadiram a mesa de Foucault. Os cursos (¢ alguns semindrios) foram conservados assim. 7 Esta edigdo toma como referéncia o que foi falado publicamente por ‘Michel Foucault, na medidas em que se conservaram gravayBes. Apresent a transeri¢do mais literal possivel dessa fat. Gostariamos de poder ofe~ recé-la sem modificagio alguma, Mas a passagem do oral para o escrito impde uma intervengio do editor: & preciso, no minimo, introduzir uma pontuagio e fazer parigrafos. O principio foi sempre permanecer 0 mais perto possivel do curso efetivamente proferide. ‘Quando parecia indispensivel, suprimiram-se as retomadas ¢ repeti- Bes; restabeleceram-se as frases interrompidas ¢relficaram-se as cons- trugdes incorreta, ‘As reticéncias signifieam que a gravagio esta inaudivel. Quando a fase for obscura, figura entre colchetes uma integracio conjectural ou Asteriscos no rodapé mostram as variantes significativas das anota- «es uilizadas por Michel Foucault com relagdo ao que disse nas aulas. 1.Cf pnacipslnene “Nicaea, aging est"yem Dae Best Usp 137. Fora tlizadss mais expecta rays Feiss pr Girt Bs Jaequss ‘Lagrange, depots no Calle de France a0 NEC. xt Asks a vont de sabor Verificaram-se as citagdes e indicaram-se as referéncias dos textos utiizados. O aparato critco limita-se a elucidar 0s pontos obscuros, ex- plicitar certas alusdes e precisar os pontos crticos. ‘A fim de facilta a leitura, cada aula foi precedida de um breve su- ‘mario que aponta suas principais articulagdes. Para este ano de 1970-1971 no dispomos de uma gravacio do curso ‘de Michel Foucault. Por isso o texto foi estabelecido com base no manus- crito preparatério. Em “Situagao do curso", Daniel Defert especifica as regras de estabelecimento do texto. ‘Ao texto do curso segue-se © resumo publicado no Annuaire du Collége de France. Michel Foucault costumava redigi-los no més de ju- rho, portanto algum tempo apés 0 encerramento das aulas. Para ele, esse era o momento de extrar,retrospectivamente, a intengdo e os objetivos do curso; o resumo constitui sua melhor apresentact ‘Cada volume encerra-se com uma "situaGi0” cuja responsabilidade & do editor do curso. O objetivo é oferecer ao eitor elementos contextuais de ordem biogrifica, ideoldgica e politica, ecolocando 0 curso na obra ppublicada e dando indieagdes sabre seu lugar dentro do corpus utilizndo, fim de faciltar o entendimento e evitar possiveis contrassensos por es- quecimento das circunstincias em que Foucault elaborou e apresentou cada curso. ‘As Legons sur la volonté de savoir, de 1970-1971, seguidas de Le Savoir d'Edipe, sio editadas por Daniel Defert. A edigo dos eursos no Collége de France vem divulgar um lado novo da “obra” de Michel Foucault, Nilo se trata de inéditos no sentido préprio, visto que reproduzem o ‘que Foucault falou publicamente, O suporte eserito que ele tilizava po- dia ser muito elaborado, como atesta este volume. Esta edigdo dos cursos no Collége de France foi autorizada pelos hherdeiros de Michel Foucault, que decidiram atender & intensa demanda ‘de que eram objeto, tanto na Franga como no exterior. E isso em incontes- tiveis condigBes de seriedade, Os editores procuraram estar altura da confianga que eles thes prestaram, FRANCOIS EWALD & ALESSANDRO FONTANA, Curso Anos 1970-1971 AULA DE 9 DE DEZEMBRO DE 1970, Deslecamento do tema do saber para o da verdade. Elisdo do deseo de saber na histéria da filosofa a partir de Aristteles, Nietsche restabelece essa exteriori= dade. ~ Leiwra interna e externa do livr A da Metaisica. A teora aristotelica to cabor exclu o saber tranrgrecsive do ragédia gga, o eabereoftio, a re Iminisednca platdnica, ~ Curiosidade arsttdlicae vontade de pode: das mr Jologias de saber (11 A vontade de saber: é esse entio o titulo que eu gastaria de dar ao curso deste ano. Na verdade, acho que poderia t-10 dado também para a maioria das andlises historicas que tenho feito até o momento, Também é ele que poderia caracteizar as que gostaria de fazer ago +, Em todas essas analises ~ passadas ou ainda por virem -# creio ue se poderia reconhecer algo como “fragmentos pars uma morfo= logia da vontade de saber" (21 Em todo caso, €esse tema que, sob uma forma ou outra tentarei tratar nos préximos anos. Ele is vezes serd investido em pesquisas histérieas determinadas: como se estabeleceu o saber dos processos econdmicos do século XVI ao século XVIII; ou como do séeulo XVII ao XIX o saber da sexualidade se organizou ese dispés. Outras vvezes, ¢ sem divida mais raramente, seri tratado em si mesmo; € {entatei ver em que medida € possivel estabelecer uma eoria da von- tade de saber que possa servir de fundamento para as znlises hist ricas que mencionei hi pouco. Portanto, eu gostaria de alternar assim, mas de maneira irregu- Jar, ao sabor das exigncias, as pesquisas concretas e as pontuagées teria. 1 Buuma dessas pontuagdes que eu gostaria de marcar este ano, 20 mesmo tempo que comesaremos, em seminirio, uma investigacio * ta Voom de no sek efesament ou de pms volume de istered a seal, Pais, Gallia 976. 4 ro @ Alas soe vot de saber istérica que, por sua vez, talvez leve varios anos, O seminar teri ‘como enguadramento geral a penalidade no século XIX, na Franca © ponto preciso da analise seria inserco de um discurso com pre- tenstc cientfica (a medicina, a psiquiatria, a psicopatologia, a so ciologia) no interior de um sistema —o sistema penal até entio in- teiramente prescritivo; deveria dizer quase inteiramente, pois basta pensar na intervengio dos médicos nos processos per bruxaria nos steules XVI-XVIL para ver que o problema remonts & muito antes. (© ponto da anise, portanto, seri essa insergdo; o material preferen- cial ser a peritagem psiquiitrica em matéria penal e, por fim, 0 hhorizente da pesquisa seri identficar a funglo e medi 0 efeito de um diseurso de verdade no discurso da lei. Quanto ae curso, jd indiquet rapidamente, na dltima veo!, © jogo? que eu gostaria de jogar: consistiria em saber sea vontade de ‘verde no exerce, com relagdo ao discurso, um papel de exclusao, anilogo — numa ceria parte ¢, admito, numa parte apenas ~ 20 que pode desempenhar a oposigio entre a loucura ea razip, ou o sistema, de preibigdes. Em outras palavras, consistira em saber se a vontade de verdade nio & tdo profundamentehistériea quanto qualquer outro sisterra de exclusio; se, na raz, nfo é arbitriria como eles; se nio & ‘modifiedvel como eles no decurso da historia; se, como eles, no se apoia ¢, como eles, nfo & incessantemente reativada por toda uma rede institucional; se no forma um sistema de coergip que se exerce ‘lo sé sobre outros discursos mas sobre toda uma série de outras pri ieas. Em resumo, consiste em saber quais lutas reais e quais rela- bes ée dominagio sio mobilizadas na vontade de verdad E.assim que eu havin caracterizado o tema deste curso. Eficil ver toda a série de questdes que tive a impressio de atra- vvessar animadamente quando dei essas poucas indicaydes. E prime +o esta: quando se fala de vontade de verdade (fala-se da vontade que escolte 0 verdadeiro contra 6 falso, ou de uma vontade mais radical {que pie e impaco sistema verdade/erro?), esti em causa a vontade de verdade ou a vontade de saber? E, entre essas duas nogdes, © que acontzce com aquela que no podemos deixar de encontrar, se as ‘sarmes uma ou a outra~ quero dizer: 0 canhecimento? Precisar, por- tanto, o jogo entre estas trés nogdes: saber, verdade, conhecimento. CGutra questo, tambm de ordem semintica: 0 que se deve enten- der por vontade? Qual diferenca fazer entre essa vontade ¢ 0 que Se ‘entende por desejo, em expressBes como desejo de ccnhecimento ou desejo de saber? Que relagio estabelecer entre a expressio “vontade de saber" aqui isoladae a expresso mais familia “deseja de conhecer™? a i) o ule de 9 de dezmb de 1970 5 EssasquestbesSemntcas, como na maioria das pesquisas des se tips, 6 poderdo ser resolvidas totalmente, sem dvida, no Final do percurso’. Pelo menos teremos de regularmente colocar balizas e propor denies intermedi. ‘Mas hi outros problemas. Primeiramente ese: em que 0 estudo historico de certos conhecimentos ou [de certos) saberes, de certas. disciplinas, de cerosacontecimentos de dscurso pde levar a essa ‘questo da vontade de saber? Pos preciso reconhecer que até 3g0- Ta pos histriadores das cigncasseniram neceasidade de recor tera ela, Em que essa nogio & requerida ou ¢indspensivel? Tisufeigneia dos instrumentos de anise hstrica fornecidos pela epistemologin ‘Segundo problem: elagdes entre vontade de saber e formas do contisimento: em nivel tebice: em nivel histrico, Tercio grande problema: & realmente razoive, para um ané- lise dos sabores que procuranio se refere a um sueito fundador, extraircomo nocdo ceniral a nocio de vontade? Nao sera uma ou maneia de reintoduzirnovamentalgo como um sujeito soberano ‘Quarto problems: se est em causa descobrir, por ris dos f+ menos histrioos do saber, uma expévie de grande vontade de ai ‘magi (mesmo que anima), ser que no vamos voltae para wma tspéce de hist autGnoma e ideal em que a vontade de saber é que deteminaria por si s6 os fendmenos em que se manifesta? Emaque iso seria diferente de una histéria do persamento, ou da consién- cia, ov da cultura? Em que medida & possivel articular essa vontade de sater com os processos reais de lata e de dominago que se de- Senvolvem na hstri das sociedades? Einalmente percebemos 0 que esti em jogo, no dria o quinto problema sim aque qe permeia todos os que mencionei~enem mesmo deveria dizer problema, e sim posta sberts, sem estar Se ro de poder fin (ratando-se de sabe} “se pndemos, sob hiss dos diseursos verdadsitos, razr &tona a histira de uma carta vontade do verdadero ou do fs, hstéria de ua certavontade decolocro sistema solidrio do verdadeiro © do falso, ‘em segundo lugar, se podemos descobrir que ess aplicagiohisté- rie, singular e sempre renovada do sistema verdadeiro ou flso consti oepisio central de uma eera vontade de saber propria de nossa civilizago; or fim, se podemos articular essa vontade de saber, que tomou a formade uma vontade de verdade, no com um sujeito ou uma forca anénima, sim com os sistemas res de dominaglo, 9) an may Auda seo vont de saber — Entlo, resumindo todos esses passes, cada qual muito longo e ‘muito complexo, teremos recolocado 0 jogo da verdade na rede de coergdes ¢ de dominacdes. A verdade ~ seria melhor dizer o sistema do verdadeiro e do falso'~ tera revelado o rosto que ha tanto tempo vem escondendo de nds, ¢ que & 0 de sua violéacia E preciso dizer que nessa pesquisa 0 diseurso filoséfico € de bbem pouca valia. Sem divida, praticamente nlo héfilosofia que no tenha designado algo como vontade ou desejo de conhever, amor i verdade etc. Mas, na realidade, pouquissimos ~ exceto talvez Espi- rosa ¢ Schopenhauer ~The deram mais da que um estatuto marginal: como se a filosofia no tivesse de dizer primeiramente 0 que & efe tivamente designado pelo nome que ela porta, Como se colocar como epigrafe de seu proprio discurso esse desejo de saber que ela retoma em seu nome Ihe bastasse para justificar-se por existire mos- trar que & de uma s6 vez ~ necessiria e natural: todos os homens, por natureza, desejam saber... Portanto, qual homem ndo &filésof e como a filosofia, mais do que tudo no mundo, no seria necesséria? ‘Ora, o que eu gostaria de mostrar esta tarde é, partindo de um cexemplo, como é feta ja logo no inicio de um discurso filesofico, a listo desse desejo de saber que, entretanto,€ designado na filosofia para explicar¢ justificar sua existénci CO exemplo escothido seri o de Arist6teles nas primeiras linhas, da Mewjisica. Na proxima semana, mostrar como Nietzsche foi o primeiro a fazer 0 desejo de conhecer escapar da soberania do proprio conbs mento: a restabelecer a distincia e a exterioridade que Aristoteles hhavia suprimido e cuja supressfo fora mantida por toda afilosofia. Dia 23 [de dezembro}, ver 0 que deveria eustar ao pensamento- ‘a colocagio do problema da [vontade*] de saber. ‘Texto muita conhecida, muito banal ¢ que a localizaco nas li- nhas iniciais da Meta/isica parece manter na margem da obra: “To- dos o$ homens tém, por natureza (guise), 0 desejo de conhecer; ‘prazer causado pelas sensacdes ¢ prova disso, ois, além de sua lidade, elas nos agradam por si mesmas e, mais que todas as outras, as sensagdes visuais”™ * 0 manus compart: verde 04) us) Ast de 9 december de 1970 7 De fato, este texto pode ser lido do proprio interior da obra: cada elemento recebe da Filosofia de Aristteles seu sentido, seu valor, suas fungdes: ndo hi nenhum que ndo seja justificivel por ela. E, apesar de seu cariter quase marginal, este texto transparente pode ser reenglobado no interior da obra. Prest-se a uma leitura interna ‘Mas se presta também a uma leitura externa: pode-se detectar nele ‘uma operagdo que diz respeito ao discurso filoséfico propriamente dito. Eno $6 a0 de Aristteles, mas ao discursofiloséfico tal como cexistiu em nossa civilizagio’. LA Sobre este texto de Aristateles ~ que é um pouco um texto limi- te—eu gostaria de dizer, como sobre alguns outros que ocupam uma posigdo semelhante e exercem fungSes andlogas, que ele constitui im “operadar filaséfico”; com elementos internos ao sistema e in- teiramente interpretiveis a partir dele, diz respeito & totalidade do sistema, sua possibilidade e sua justificagdo, sua origem e seu nasci- ‘mento necessirio; e,mais além do préprio sistema, recaie age sobre © estatuto do discurso filosofico em geral: = operador filos6fico: aquele texto de Descartes* em que ele expe seu desejo de chegar & verdade, em que enumera as razdes para duvidar © em que exclui para si mesmo a possibilidade de estar loueo; 25, ~ operador filosofien: 0 texto de Espinosa no Tratado sobre a refor- ‘ma do entendimento” sobre o desejo de uma vida nova, sobre a incer- teza das bens que possuimos, sobre a incerteza de alcangar um bem ‘eterno e perfeito e « descoberta desse bem na [flicidade da} ideia vverdadeira, ‘Sem diivide também seria possivel reconhecer em textos cienti- ficos 0 que poderiamos chamar de “operadores epistemolégicos": cles se referem A propria possibilidade do discurso em cujo interior so considerados. E por possbilidade nao devemos entender aqui os axiomas ou postulados, os simbolos empregados e suas regras de uso; devemos entender aquilo que torna possivel nfo a coeréncia, 0 rigor, a verdade ou a cientificidade do diseurso, mas sua existéncia Penso, por exemplo,no inicio de Curso de linguistica geral de Saus- sure; ou no texto de Lineu sobre a estrutura do sparelho sexual das plantas" (na medids em que funda a possbilidade de uma descriga0 faxonémica, descrigio que tem como objeto precisamente sua pré- pria condicZo de possibilidade ~ ou seja,justamente essa estrutura) Pg 13Hscade 8 a on Aud sobre a vont esber ‘Voltemos para o texto de Aristételes. [Para] a primeira frase: ‘Todos os homens, por natureza, desejam o saber’, Frase que muito claramenteenvove ts tesest existe um desejo que dz respeito ao saber, 2 ese deseo € universal e enconira-seem todos 0s homens, 3 le € dado peta naturezs 4 Dessas teses Arstteles vai apresentar 8 provas. Or, esa provas, ou melhor essa provaéapresentada como sendoum aso Esse temo onpciov nfo deve ser traduzido exclusivamente por “si nal”, Refere-se de um modo geral 4 prova, ao testemunho, aquilo ue manifesta, € uma maneia tradicional eos Fl6soos eos orado- res introduzirem uma prova qualquer (omuciov:como prov). Ente- tanto er Aristéels essa expresso intoduz um tipo muito particu lar de rciocini. Tratase de um raciocinio no pea. causa ¢ sim pelo exemplo, pelo caso particular. O caso pariular est sbsuigo fob um principio gral sindahipottco; ea verdade do caso particu far estatelecea verdade do principio geal € 0 enimema (em todo «aso, una de suas estrutures passives) ‘Que prova de que todos os homens descjam o saber ssa dada por um entimema na ¢iniferente ~longe disso. = sea provaé que as Sensagdescausam prazer entre clas, 38 sensagdes visuais~e que causam prazer por si mesmas,independen- temente de qualquer relagdo com a utilidade ‘Ora, essa prova~ antes, esse caso particular ~ comporiatés deslocamentos que talvez ndo possam ser totalmente sobrepotos f0 deslcamento que permite descer muito simplesmente do geral para o particular = Isso porque se passa do conhecimento (eiSévas) para a sensagdo (aloBneic) ¢, por fim, para a sensagzo visual. Em que 2 sensagio, com seu prazer, pode ser um exemplo do dessjo de conbecer? {b= Segundo deslocamento: odesejo de conhecer estava inser dona natreza (oon); agora ¢spresentado como o praze da sensa- Gio considerada em si mesma ~ id ex, fra de qualquer wtildade,¢ de qualquer agio, como € dito um pouco adiante ~ como se ano- “lida da sensugioesivesseinserida na natrez +1~Passarse do desajo (péyov7a), temo tradicional em As sotles, para prazer. Maso prazerndo é designado pela palavra tradicional Above sim por uma palavra bastante ara em Arisée- Jes e que partcultrmente no intervém em sua teocia tradicional do prazer: éycimmaic, us 19) 0) ula de 9 eden de 1970 9 ‘Ayekznaic, que designa antes o fato de apresentar seus respeitos ‘a algumacoisa ou alguém, testemunhar-he a afeigdo que lhe & devi a, atribuir-the de bom grado o que Ihe cabe por diteto, e ficar sa- tisfeito com essa outra coisa, reconhecer que ela The apresentou seus respeitos. ciyciznanc designa a satisfagdo da ordem. O contentamen- to que ottemos de algo que nos contents. Portanto, temos uma tese ‘um argumento em forma de ertimema, tum tripo deslocamento nessa argumentagio. ‘A. Primeira questo: em que a sensacZo e seu prazer proprio so um exemplo satisfatrio do desejo natural de conhever? EE preciso provartrés coisa = que a sensagio é realmente um conhecimento; = que a sensacio é acompanhada de prazer; qu: oprazer que proporciona esti realmente igado aiquilo que 1 faz ser conhecimento. Primeira propasicdo: a sensagio & realmente um conhecimento. Cf. 0s textos de De anima'* em que é dito: ~ que a sensacio & uma atividade (ato em comum daquele que sente e do sensivel); ~ que é uma atividade da alma sensitiva; sa que essa atividade tem como resultado tornar atual a qualida- de (n0151) de algo. A sensacdo & 0 ato do conhecimento qualitative, ‘Segunda proposigdo: a sensagio & realmente acompanhada de prazer. Cf. a passagem da Etica nicomagueia, X, 6°, em que € dito: {que 0 prazer no deve ser considerado como 2 mesma coisa ‘que a atividade, que & diferente dela: = mas que, entretanto, ele acompanha a atividade quando esta decorre como deve ser, = € que, als, hd tantos prazeres distintos quantas so as at earn [Outro] deslocamento: [do dado por] natureza para a auséncia de utlidade; ou ainda, do prazer sensivel em geral para o prazer es- pecificamente humano que © homem pode obter de suas préprias sensagBes. B— Hi de fato uma questo que é Ievantada pela questo ante- rior: se todas as sensagGes causam prazer e na medida de sua ativi- dade de conhecimento, por que os animais, que tém sensagées, no desejam conhecer? Por que Aristételes parece atribuir 0 desejo de Cconhecer a todos os homens, mas apenas aos homens? ‘A razio disso esti nas diferencas genérieas que caracterizam 0 ‘homem e que, a0 contro dos animais, he permitem obter prinei- palmente prazer das sensagées indteis. a~ O primeiro conjunto de diferengas esti ainda na sensagio ros confins (dJa animalidade e da humanidade: + Pgs 22 sca bs) pa dia de 9 de decembr de 1970 u — 4 meméria que & produzida pela sensagio, mas apenas em certs anim = a audigio, o ouvido, Um tema frequentemente repetido em Aistéeles& que a audigo ni existe em certos anima (as formi- gas asabelhas). Ora, por audigio Aristételes entende um fendmeno ‘muito empl pois se tata, num limite, da audigdo de sons inarticu lados (cv yopa), diz 0 texto; mas também (d]a capacidede de entender a linguagem e, num nivel ainda mais alto, de receber uma educasio. Aparece com a meméria a propriedade de ser inteligente (ep6v1u0¢); © aparece com essa audigdo 0 fto de poder est dis- posto aprender aaptiddoparaserdiscipulo;ofatodeser padnsuxos, ((de} ser disciplinavel 'b-O segundo conjunto de diferengas que caraceriza o hymnem por oposigio ao animal sensitive &a réyv (a arte) ex Emery [a inca ‘Ambas tm como caracteristica poderem ser ensinadas, como ser dio no mesmo livro da Metafsica({A, 1] 981 b):porianio,sio las que passam pelo ouvido. Caracterizam-se também pelo fto de levarem consigo um julgamento universal extaido a partir d2 uma infinidade de nogSes que vém da experiéncia®" (éx noha wig ‘yncipiag tvwdnwarov), ou seja, de se apoiarem na meméria. Par fim, tém a paticularidade de frequentemente ser menos efieazes ‘que a experiéncia. A experincia sabe reconhecer os casos eaprovei= tar as oportunidades; a arte e a eigneia colocam prineipios gerais, mas nao dio as regras, o esquema e 0 prineipio de apicacio cestes. €=Por fim, a terceiradiferenga que separa anatureza harnana 4o animal sensitivo & presenga da copie copia é 0 conhecimento da causa, qu esté englobad no conhecimento da esséncianaquilo ‘que ela tem de universal. (Or, esse conhecimento das causas é 0 conhecimento supremo; serve apenas ai mesmo, é live e ele mesma & seu nico fin ao se submete a nenhuma wilidade. Sendo fim para si mesmo, ele Go fim 4e todo conhecimento, é para ele que est se direciona Prolongando wm poueo 0 pensamento [das primeiras linkas} da Metafitica,consegue-se correlacionar dois prncipios. Por um lado, hum modo de conhecimento especifico de homem eque niogo da, sensagio: & 0 conhecimento que primeiramente tem como matéia (como causa material) as imagens da meméria eos sons articulados; "Tea Treat elds: experimen ea pal pa Autos ob vom der ‘como forma (ou causa formal), a vézvn € a éxtoriun; como fim ¢ ‘causa final, a sabedoria, a cogic. Por outro Indo, em cada nivel as ligagdes de uilidade se afrouxam; como se vé pelo exemplo das abe~ thas e das formigas, a audigdo ndo & necesséria para a vide; a zy1) a Emon sio menos ites que a experiéneia; Finalmente, numa ‘ltima viravolta,o tinico fim da coopta esti em si mesme Portanto, agora € preciso dizer que essa famosa “satisfaglo que se ‘obtém das sensacoes initeis” nfo € tanto, ndo é apenas um caso par- ticular do grande e geral desejo de conhecer que existria em toda parte na natureza, mas € principalmente — seguindo o fio dessa se- jgunda andlise 0 modelo ainda rudimentar, o paradigma miniscule de um conhecimento cujo tinico fim é ele mesmo. Sem dkvida, enquanto o homem permanecer no nivel animal da sensagio, permanece no nivel do que é itil para a vida. Mas, se en- contra satisfago em sensagies que nio sio diretamente itis, que ji esté se delineando o ato de um conhecimento que, por sua vez, rio estar subordinado a nenhuma uilidade, visto que é, em si mes- ‘mo, seu préprio fim. * Poderia causar surpresa, agora hi pouco, que o descjo de co- rnhecer, dado a todos os homens pela natureza, tenha como prova a satisfacio das sensagies initeis (ao passo que as sensagies slo titeis pornatureza). E que a natureza de que se falava era na realidade uma certa natureza do homem destinada a um conhecimento sem outro fim além de si mesmo. E esse fim ditimo € que jé puxava para sia simples atividade de sentir e jf a tornava agradivel, quando por um instante a prova da utilidade se rompe em torno dela E agora fica facil responder & terceira questdo referente a0 te ceiro deslocamento: por que Aristteles, para provar que “todos os homens desejam coubever”, apresenta como argument © prazer, © contentamento que se obtém com as sensacdes? ‘A chave desse deslocamento & sem divida o emprego da pals- ‘ra éydamorg, O que acompanha toda ¢ qualquer atividade, contan- to que decorra em condigdes adequadas,¢ 0 prazer chamado f)50vi Em contrapartida, o que acompanha a mais alta atividade, a da vir tudeedacontemplacio, éalgo diferente: felicidade,acdbauovia, ‘Ora, a sensagde, quando é paradigma da contemplacao, quan- ddo se compraz com sua prépria inutilidade e quando ja & também & imagem da teria, de qual prazer especifico é acompanhada de per + Ties qua dpi 8 sep Auda de 9 de deeb de 1970 1B [30] 102 Sem divida no do Sows que pode acompanhar toda e qualquer sensasio; também nio da ebSayovia, que implica cotinuidade, habit, 8g acompanhada de uma categoria especifis de Sov, aque & como o inal, © paradigma da feicidade fitura da tora, & ‘tcompankada de én Assim como a sensado intl &o para digena da conterplagao por vir, o contentmento que a scompanha ‘jadelineia a felicidade furura: dycimnanc. Portanto, dualidade dessa palavradyinnarc, como se ela desig- rnasse a matéria do prazer sensorial e animal jéassumindo a fora genericamente humana de feliidade. 3 *Assim, neste texto de Aristételes hi nfo tanto am ras superposig&es de sentido: ~ quando Aristoteles tala de natureza (@Ucer), retere-se a natureza em geral, mas também a diferenga genérics do homem por oposiio = quando introduz ume prova chamando-a enpiciov, est designando tanto o exemplo como caso particular de um principio geral quanto 0 paradigma de ego por vir = quando emprega o termo éyéaig, refee-se tanto 20 prazer da Sensaglo quanto a algo que prenuncia a elicdade da contemplagio** Por intermédio dessas superposiges, Aristteles ecnegue, por um lado, insert odesejo de conhecimento na natureza, ligi-lgasen- 2630 e 20 corpo edarlhe como correlato uma cera forma de gozo; mas, por outr lad e 20 mesmo tempo, di-the estatuto fundamen to na natureza genrica do homem, no elemento da sabedoriae de tum conhecimento euj Unico fim & ele mesmo e no quo prazer & Felicidade E imediatamente 0 corpo, o dese sioelidids; © movimento «que no préprio nivel raso da sensago leva rumo ao grande conheci- tmento Sereno incorporal das causa, esse movimente ja em si mesmo, vontade obscura de aleangar essa sabedora, esse movimen- to i flosofa [32] Assim filosofia, ue desempenha o papel de conbesimentosu- premo ~ conhecimento dos prinepios primeiros e conhecimento das causas fins -, tem também o papel de englobar j desde 0 inicio * Aettstmo do eircom bse em um fapment conservedo o cus dado orien mast cet ems se Sgb sivrencagio partis edade + Fim da eansrgbo de apesentpio ol. : 13) ba Aula obra vntad de saber todo desejo de conhecer. Sua funcio assegurar que o que hd real- ‘mente de conhecimento a partir da sensaglo, a partir do corpo jé é, por natureza e em funglo da causa final que o dirige, da ordem da contemplagio e da teoria. Sua fungi também & assegurar que, ape- sar da aparéacia, odesejo nfo & nem anterior nem exterior a0 conhe~ cimento, visto queum conhecimento sem desejo, um conhecimento feliz e de pura contemplacio jf 6, em si mesmo, a causa desse dese- _jo de conhecer que tremula no simples contentamento da sensacdo. Se agora tomarmos alguma distincia desse texto, podemos idenificarum certo nimero de aconteimentos macigos que ele su- Se ou toma possves. 1/ Poder dizer que, por natureza, © homem desea saber € que ‘esse desejo jf se anuncia no prizer da sensagio supde que esta, ‘exeluido o tema de umm saber transgressvo, proibido temivel Ora, & esse tema que engontramos constanemente na ragédia _regae singularmente fem] Esquilo e S6foces, (0) saber*,o heréi trgco est longe de desji-o por natureza De fato, ei primeiro lugar, se ele deseja saber, nfo & porque ‘seja movido por un movimento natural, inserido em Sua natureza ja 8 partir da sensago, & porque uma fala foi proferda de Tonge e do allo ~ fala enigmétca, de duplo sentido, que ele compreende eno ‘compreende, coma qual se ranguiliza e que no entanto oinquieta. Em Os persa,€ sonho da rainha, é sombra de Dario. Em As traquinias™, & a profecia do Centauro a Dejanira: Héracles seri atingid pelo comato magico “a ponto de nfo preferirnenhuma mux ther que ele possa ver” (¥ 569). Em Eetipo, obviamente, & 0 boato relatado, (Or, esse saber desejado (porque € 20 mesmo tempo obscure € promissor)€ um saber temive: ‘4~ De fato, ele & retido ciumenta e avidamente pelos deuses: 0s caminhos da pensamento divino vio para seu objetivo por mi {agais e sombras espessas que nenhum othar conseguiria penetra’ (Esquilo, Suplicantes, v. 93)" ~ Bi seguid, ele cea justamente os mesmos a quem diz res- peito: um saber qu ola e eujoolhar ofusca aqueles que fina ‘io olha a dtego do segredo, mas 0 sepredoolha em sua direo, rio tira 0s os dele procura capo, atingindo-o no firal. Ele cepa as mesmas pessoas a quem di espit, a al pono que, quando + Manasrio: Com acoso saber Bs) Ba Aula cde 9 le emt de 1970 Is (0 deuses liberam um pouco seu segredo, o her6i € 0 nico 4 no reconhecer esse saber que se aproxima e o ameaga, a0 passo que © ‘plblico eo Coro jé sabem. E o que acontece com Ajax?! fot iludido por Atena e disso todo mundo sabe; mas ele mesmo nao Vé essa te- rivel presenga a seu lado, nfo vé a grande figura que o destoi; € implora-e: "A ti pego apenas que estejas a meu lado e sempre como alisda, como és agora.” ¢~ Por fim, é um saber que mata. No momento [em que] caisobre ‘herd, ete nfo the resist. 0 raio da luz e 0 da morte confundem-se. (s temas aristotéicos de um saber que vai do prazer 8 felcida- de, para a qual somos levados por um movimento natural, por inter- ‘médio de uma fala que ensina e nfo profetiza ede uma meméria sem cesquecimento nem enigma - todos esses temas se opem ao saber trigico”. Aliés, um pouco adiante na Metafisica Aristoteles diz: 0s ‘deuses nio sto ciumentos”. 2/ Ao dizer que o homem deseja conhecer por natureza e que ‘esse desejo de conhecer ji é movido pelo movimento rumo a dade tedrica, Aristoteles tira de jogo a questo sofistica ou soct -sofistica do “por que desejamos conhecer?”. ‘Questo que surgia sob miitiplas formas, [tais como]: = se é por virtude ou porque ji temos uma natureza boa que desejames saber, entBo por que aprender? Ji sabemos; + ‘ou eto: se desejamos aprender por razdes mis (para leva a melhor sobre 0$ outros ou para ganhar causas injustas), entfo sera preciso mudar para aprender, ou o fato de aprender mudari cquele {que aprende. Em resumo, 0 sujeito do saber no poder sero mesmo {que o do desejo, Eutidemo: ensinar & matar*~— ¢ tris de tudo isso se perfila a grande questio que a filosofia nfo cessou de mascara, na ‘mesma redida em que seu surgimento talvez no Ihe seja totalmente alheio: osaber pode ser vendido? Por um lado, pode fechar-se sobre si como objeto precioso de uma avidez e de uma posse? E, por outro lado, pod: entrar no jogo e na circulagdo da riqueza c dos bens? Pois, seo saber & algo que desejamos, por que no seria ua bem, ‘como os outros, entrando com eles na universalidade da moeda? Essa questo Aristteles tira de jogo: colocando o desejo de co- nhecer muito antes da realizagio do conhecimento, no nivel mais bbaixo, (o] da sensagio; port fazendo com que esse desejo ji per- {tenga a0 zonhecimento, visto que é na sensacdo que ele aparece pri miro. Esté contido no conhecimento, mas o conhecimento no é totalmente dado com ele, 6 bn bs) (9) 0 Auda sobre vortad de saber *Ainda com essa afirmagdo do carter natural do desejo de co- shecer, [Arsttees] ta de jogo o tema platénico da memria e do mundo supraceleste Por um lado, em Arisoteleso desejo de conhecer anuncia-se no nivel das sensagBes e nelas; no esta de modo algum ligado a0 pro- {eto de desprender-se delas ¢ ir mais além para lé encontrar uma realidade mais verdadeira. Ao contrrio eperigo hi, €0 de nfo nos, desprendermos delas. Por outro lado, a meméria, que é realmente indispensivel ao deseo de conhecer em seu movimento todo, essa _meméria esti ligada a sensagio, visto que € a persisgncia © 0 rastro desta, O desejo de saber ndo afastaa gavzaata®;insere-s e apoia- “se nla ‘eros, porém, que afatando o tems platnico Arisételesre- solve o mesmo problema que Plato; pelomenos,obedece 8 mesma ‘exigéncia tdrica. Ou seja: fazer com quea vontade de conhecer se fundamente nica ¢ exclusivamente nas prliminares do proprio co- nhecimento; fazer com que o desejo de coshecer ese inteiramente ‘englobado no interior do conhecimento; fazer com que 0 conheci- mento jd o tena retomado logo no inicio Ihe dB assim, em seu primeieo aparecimento, seu lugar, sa lei eo principio de seu movie mento. Esa exigéncia Plato atendia como mito da reminiseéncia: antes mesmo que saibas, antes mesmo de desejares saber, sabia, jé havis sabido. CCostuma-se ler a teoria da reminiscéncia nfo apenas como o- correlato da transeendéncia das ideias, mas como uma manera de imterligaro conhecere 0 desejarconhece: Na verdade, deve-se ler essa tora como uma maneira de alojaro desejo de conhecer no in- terior do conhecimento ‘Ao colocar a vgn exatamente no rasiro da Sensagio, Arst6- telessubverte a dsposigio, mas a faz descmpenhar o mesmo papel: 0 desejo de conhecer, em sua ntureza em seu ato, em sua potéacia, nfo escapa a esse conhecimento que ele deseja, Portanto, 0 texto aristotélico supde a exclusio de trés temas: o do saber tragico, oda aprendizagem-mercadoria, © do conhecimen- to-meméria. Mas, como [Platio**] embora por um outro modo, ele procura proteger © conhecimento da exteroridade e da violencia do. desejo, O desejo de conhecer no é mais que um jogo do conheci- es quis da pin seas ** Mansi in, an) (2 Aula de 9d decom de 1970 7 _mento com relacio a ele mesmo, ndo faz sendo manifestar a génese, ‘0 retardo e o movimento dest; 6 desejo & 0 conhecimento diferido, ‘mas ja tornado visivel na impaciéneia do suspense em que ele se maniém. Esse englobamento,e em Aristteles muito mais que em Plato, tem como consequéncia que o saber e o desejo nfo esto em lugares diferentes, em posse de dois sujeitos ou dois poderes, e sim que aquele que deseja o saber ja é aquele que o possul ou que é capaz de possuito; e & sem violéncia, sem apropriacdo, e sem luta, sem ccamércio [tampouco}, mas pela simples atualizagio de sua natureza, que aquele que o deseia acabara realmente por saber; um tinico su Jeito vai do desejo de saber ao conhecimento, pela boa razio que, se teste no estivesse ai como precedéncia*™ do desejo, o préprio dese- sonio existiria. E, inversamente, 0 desejo de conhecer ja 6, por natureza, alo ‘como 0 conhecimento, algo do conhecimento. Nao pode querer o cconhecimento por outra coisa que nao ele mesmo, visto que é a par- tir do conhecimento que quer conhecer. E ao mesmo tempo seu ob- {Jeto, seu fim e sua matéria. E por isso que: ~ por um lado, na diversidade dos desejos haveri aquele singular, separado e sereno que chamaremos de curiosidade, dessjo de saber por saber etc; i €, por outro lado, nesse desejo ndo reconheceremos nenhuma ¥io- Jéneia, nenhuma vontade de dominagdo, nenhuma forga de exclu slo e de rejeigio. No jogo de exterioridade entre 0 desejo eo saber, encontram-se substituidos 0 pertencimento de um pelo outro, o en slobamento do primeiro pelo segundo, e algo como uma conatura- lidade, Daf compreendemos: a necessidade de alojar os dois numa mesma instincia — ‘mesma alma, mesmo sujeito, mesma consciéncia; Bo esciindalo que hi em recolocar a vontade ¢ 0 desejo fora da consciéneia, como fizeram Nietzsche ou Freud: ya dificuldade para pensar filosoficamente uma vontade de saber que nBo saja considerada de antemdo na unidade de um sujeito cognoscente Digamos, para precisar © vocabulirio, que se chamari de co- heeimento o sistema que permite dar uma unidade preliminar, um pertencimento reejproco e uma conaturalidade ao desejo a0 saber. + ambigu, Poder tbo proviso, SE 8 18) “a 1 Aides sore a vortae le saber FE que se chamaré de saber aquilo que é preciso arrancar da inteiori- dade do canhecimento para ali recuperaro objeto de um querer, 0 Fim de um desejo, 0 instrumento de uma dominagdo, a metade uma tata, Vamos continuar olhando um pouco mais longe. Existe hi sé- ‘culos um tema cuja banalidade chega a causar enjoo; éo tema de que ro Fim da contas todo mundo € um pouco filésofo. ‘Tema que o discursofiloséfico afasta de imediato para ressaltar este faqui, ou seja: que a filosofia & uma tarefa especifica, recuda cei distancia de todas as outras e que ndo pode ser reduzida a nerhu- mma outa, Mas, tema que © discurso filoséfico retoma ndo menos regularmente para afirmar que a filosofia nada mais é que © movi ‘mento da pripria verdade, que ela é a conscigacia tomando conse! ncia de si— ot que quem desperta para 0 mundo sé ilésofo. (Ora, preciso notar que esse tema, sempre descartado e sempre retomado, de uma filosofia ligada a0 primeiro movimento do conhe- cimento em geral, 6 un tema que teria parecido muito esranho para os primeitos filésofos gregos. Mas sobretudo pode-se vera fungi que precisamente ele exerce: ja ha contemplagdo no conhesimento mais aso e mais corporal; ent € ela, essa contemplagao, qu: vai provocar todo o mevimento do conhecimento, de acordo com alégica que lhe € propria ou com a necessidade do objeto que cla contempla. E conse {quentemente o desejo fica eld, com sua eficécia, O desejo ja nio 6 causa: €o conhecimento que se tora causa de si mesmo (a partir da ideia ou da sensagdo, da evidéneia ou da impressio, no importa) causa desi mesmo e do desejo que Ihe diz respeito. , como consequéncia, 0 sujeito do desejo ¢ 0 sujeito do conhe- cimento so um s8 ¢ o mesmo. © problema sofistico (aquele que ainda nio conhece e que deseja no pode ser aquele que conhece € no dese;a mais), esse problema desaparece. A estranha discussio ‘do Euidemo em que o Sofista diz: "Se queres que (eu amigo apren- da, & preciso que ele no seja mais © mesmo, € preciso que morra”, essa irdnicairrupedo da morte entre o sujeito do destjo ¢ 0 sueito ‘fo] conkecimenta ~ tudo isso pode agora desapareccr, pois o desejo ‘nada mais & que o quase imperceptivel tremor do sujeito de conheci- ‘mento em toro do que ele conhece, O velho tema milenar “todo ‘mundo é mais ou menos filésofo” tem uma fungi precisa e deter- ‘mindvel na historia ocidental: ndo se trata nem mais nzm menos que do fechamento do desejo de conhecer no proprio contecimento. + Spats nota de a aunt pigina 3 ater sido da, Notas: 1. Nala nag de 2 de demo, publica cam ilo Be Ora dca 1A onder do deo, Pars, Gallimard. 1971 "ho olce Igo deans metsfore do og tltzada por Netz em O nascent ste rage nts de ora: tn de ets conestncave estar Foor evoando Essen $a uc faz Nitarbe cesar dices hedgers por se dogs? CE Fink, eletanme pmol monde, a, ances Bidenbrand & A Linder, Ps, Mio 1966 (doi Das Spd ar Heyl Stag W Kore, 1960), NB eats dye80 seats, be jogo de verde 20 ql oueul core ase. (C “Sago a, ‘esp. 282 50 jogo de Foueul”~ em que ocomocao ¢ Deleuze) STO vedo ral do pererso bem pods er id aula de 6 de onto de 1982, Cr. IM Foal Lierméncnigne dsj. Cours au College de France, 1981-1982, e . Gros, Pas Gallimard Seu (col. utes xed) 200, pp. 1820. “fag Foot descaont tent efee Je aus pesqus daqule, mals cist- roti presenta sey domi de canis ap Callige de France me ern “ios © ‘anaes (1969 in Die Berm, 1954198 [okado poset: DE) or D. Deft {Ci Evaid cok Lagrange ai, alia 199478 vals e171 pp 2-6; ed nz oly col "ef a1 pp. 8104 ‘SN Deteane hove descr ecentomeneo pst alice formado por “Ait, & senda pei e=Lethe'o exqucimento, qe cern do par deseo por W. Lathe {rer nd “Lige"m estn riche, Llp. R Nosks, 1935, publica om 1954 1958 CM. Detsme ar Marr de srt don a Grice archi, etc de Vial “Naqus Par’ Maspr, 1967, pp. 459. (C-"Siao do arson. 249) “Ailes Le tpg, A 1980 21-24 wa. ness Tt ee co de lei), Pi Via ("blob des tes pilsaphques"), 1948, 2 vl ip | Eom ego ro const do mane em da serio da sesso Set 3 Focal "TNs ola de 6 de jaz de 198, Foul descreve Anse “aque em quem ees eeonbcelo o prop unord ibita”(LHerménetqne di sy op. ci. 1 Ver ee do elo dus Medes cao in M Foucault: de ile ge clesigua Par, Pom 96, pp 35-5 cjeta deve polaris com Det, J 1963 a 972 1 Der Eerie ct a Diorence, ai, ea 1967 1 gl Foal wencona§ Tht trea mforma do cntendimnto, passages ito mateaesi do que tee. pst desgun aralos,e que Foul cm or ‘ruvis soto bastante elo Charles Appa (Pui, api de 1929). Ele meno Savamentcna mera ssngen i 6d jer de 982 L ermenetqu ds. 29) T0-Ch Lime Sone etl de gun, (radio por N. Jayla. Pas, Rena Ager Ano Ve 188 opp 19-20; eM Foul, Ls Matter Cons, Pr, Gal tran 1966 cp. VE VIE Le douse ati T1-ehauprap. eta 6G, Delee pops um coment netscian dese prcsupot en Direc tReiion, Pans, PUE 196, pp 72-3; nil pea 25 ‘icneoes ison, dee too mando em, pr nate djo cose a boat Smo ebba mis compas’ par seria exisencia do pressapost |}. Quad ‘SiRtchc sada sobs respon ais ere last, da que si sacle ‘por pis pena Moral caer de conence-tos que o pssameno fer aa Bo a ‘ene pensar, uma bos vonage, que apes Bem pode fundamen pos a {Ea do yensameso com o Vedado} pari fcam mas clas asenighs de uma fiosota aon ge pressposor de nest tipo em ve# de apotrse na Imager mara do Pensamcm sora como ponte de pari ua rea ial a Iyer dos "post 2» Aude sre vontoe de saber das’ qu emolve Comeatxio que Fuca evu en cons "Aine se pendue" (1969), DDE 64.197, 1 opp 169-70 “Quai vo 1, pp. 195:9:¢"Textam psnphica™ (0970), DE 80, e197, pp. 7899 "Quast" ofp. 98267 Nb apeneexspasiagem sponta pas slog subierine que se esablecs ene Digirmce or Ripsiton etre 1970, como segue dae de Deleaze most gue ‘Sermo dialog com Ler Mose es Chote, Nota uu ea psger sft tmbim Ueidege, Qu opel poner? Ud A. Becket & G- Grate, Pus PUF, 1959 (eof se Deter, Tebinge, M. Niemeyer 1984 2: Arsninds de enimena ou casinos rtroe= se esr por Ariatlee em Retire, 2, 3860s eom Ror 1,250 eres £9 abet do lope, Gu. po 0 ex ¢ um aici iio (L- Robin, dito, ai PUF, 164, pp. 5333. cp. 289) Ts" MdveesSvlpaaor 208 Sevan Speyovies des CEng, p. 6s m6 14. Aten, Bonin, 2 4256, 26 L- Robin Aris, pct 18293 15. Atlee Ethique a Ncomague X,6, eleva. faces Vlg, Pat, Case, 1940; ei patiesirment ant or Foscoul, 16. isis, De anima leap el ep. 1.8280 1 Afseles, La Steplysigve,A, 980021 "de todos moss sete, visio & aqule qu os fz abu mas conecmenas equ os eel ms feegas (el has, hp. 18. Baul, Os pers,» 7805, vera Pa, Les Belles Lette, 1982 3D. CE. Esq, Les Soppiones, 93, ec ad.fancesn P Mazon, Pi, Les Blis Lewes (Colton des univers de Face) 1923. 21 Sofas. 705 22. Esa as asume ado eu send compara com ade Nice: “Ich ent abe ds “rai eidesk™ Dor le sr Moh, § 1029 (i Nianrcher Mera XVI, 377, Llp. C (G:Naumam, 190 1899) cade por Ch. Aner in Ninos ec ag poe VI La Deri: Phlesonie de Nicesche’ Le reelomen de tof ates, Pris, Boss ‘Galina, 1951. 358) f ambi Le Cipscule ds des, “Ce que dois an nes” {ape devo sos stor § 51-0 einem rig, us fig ant or Arsees como por ass pessimsa(..O maselmenn a gia 6 mina pecs ans ‘todos os vlres com some eolco no sole doe reseeu me er. eu sabe —e, ‘ime disp do fief Dsonan eu o reste do ero rlomo. ede. faces Aber Pars, Mercure de Fane, 1983, 235 ego anotda por Foul). 23 Aros La episiue A, 2, 9838, Uep 10 "Nio sie que a dvi esa ctumena” (mul saris por erect seesenaatansen), 2A Pada, Eulyime, 28d: vto qu oss meres & gure [lini] dee Sto ame que hoje IM. Fescreve 0 mes], essa nego oS simpesmene que ele pero” (Cres comptes ede tad ances L. Robi, Pats, Galan "Bisque de Talia, 20, eff 1871p 377). 25. A agin € rated perslment em De ania, 3 236, Aubenquc eer: "A craic propa do silos ipolnseem un vende setecedemt preceded verde 3ea mete verde eeu vcabo" (Auber, Ue Prem del ie che: Aisne Pus, PUR 1960p. $4, gill do etn). NB fein, sao engi exc, 8 possgens em io gu iguram esta obra sto blinds no ex, AULA DE 16 DE DEZEMBRO DE 1970 Para wna anise da deximplicagao emtr 0 conhecimento ¢w verlade. -Prima- ‘do abscuro da verdade em Aristtles, para quem desejo, erdade, conhecimento formam uma estraura teérica. Espinosa, Kant, Niet=sche procuram subverier ‘esa tematicidade ~ Libertarse do “velho hinds” de Kénigsberg, mas mutar ‘Espinosa. Nierscheafasiao pertencimento entre a verdade e 0 conhecimento. (1) Na semana passada, eu haviatentado analisar um texto, aparen- temente muito banal, de Arstétele. Esse texto tratava do desejo de saber e de seu cater natural. Ora, examinando um pouco mais de perto 0s termas, haviamos pereebido que esse desejo natural de sa- ber era primeiramente manifestado por um prazer obtido da sensa ‘40 intr Triplodeslocamento que revelava duas coisas: Na riz do desejo, antes mesmo que ele se manifestasse e co- megasse a agit havia 6 conhetimento. Um conhecimento ainda sen- soril,é claro: mas, mesmo assim, um conbecimento, um conheci- ‘mento j present, a arte do qual o desejo podia desenvolverse (21 De forma que o conhecimento precedia esse destjo que Ihe di- 2a respeito;e esse desejo mesmo nada mais ea que uma espécie de retardo do conhecimento com rela a si mesmo, desojo correlativo a demora que o retardava para aleangar de ume vez sua verdadei- ra natureza, isto &, a contemplagio. 2/ Mas esse trip deslocamento também manifestavaoutra cot 42, De fato,vimos no texto de Arstteles ue, s© a sensaedo podia ser considerada como um exemplo legitimo de conhecimento, a razio disso era que ela tina avesso a0 verdadeiro~ 8s coisas em si mesmas, com suas qualdades proprias ‘Vimos tambem: que, ena senso podiamos abter uma certa forma de prazer (Grrdsmors), era porque a sensagio era capaz de apresentar-nos como que # figura avangada da contemplagdo, ou seja, do conheci- mento do verdadero 2m si mesmo 2 8) 0 Aud sea ota ester Por im, vio IMiue se pacer etava lgado& propia inutlidade da sensa- clo, ou eas ao fato dea senso no ter smplesmento papel de Sevirkwi animale sus ecesidades, esi ela mesma poder ter Ei sume, or baixo do texto ue fla de uma espci de dese- jmaurl de conhece aparentemente anterior a odo conecinen- to enaino dese texto avi as operands: una qu retod- 3a o conhesimentocmbnio do dese em se primp mesmo; ¢ Sout, ainda mais sua, que intodiia 9 verdade como terceiro Slemenio ene odesjo eo eonheciment. Todas as argumenacbes e proms que se encontam nos ous exos de Arise e plas i se pode justiiear ese tpl estocament, todos ees eos Sipsem gue a sensagioe seu pizer tim logo com a verdad ‘Schucm geal deseo de conhecr eso cnhesimento pode fi- zee naset no interior de et propo movimento, algo como 0 dese jing pore to ji transcorre om ordem da verdad _verdade como grata efundamento do descjo de concer Grn creio que est final opto mas importa: pare fe- ture passage do desej prn 0 concent, hi € precio que taj, a verdad porque no dsso jest em caus a verdade que desejo pode te Gago de conheciment; versamente,€prauea lage coma verdadeé fandamental que ce deseo de conbecmnto ie eso, en una, a ordem to conhecimesto;, por Fi, "porque arelgao com a verdad comands ambos que o ones meta ¢0 deseo podem ter apenas wi tnic «mesmo sujet, © ‘ueito do conhecimento © seit do deseo podem ser considers- des o esi, vst que tem a mesma relay com a verdad Porta, a vedadedescrmpenha is paps: assogura a pasa- em do desejo para 0 conheciment; em contropartie e como em fespesa, fundomentaaanteriordadedoconhesimento sobre odese- Jp: lugar dented do seo no desej eno conhecimen. ‘ras iss, ess ogo da verdad com ago 0 dejo © 20 conhesient, qe consi o momento fate de oda es sistema. fehdade Se munca na Mlosofnocdental a Nietzsche odesej ea vor fade conseguir liars de sa subordinagio cm re—30 30 o- tcciment, so dejo de confoce exteve sempre acompanhado pelo pé-requsto do conbeciment,& por eausa dessa reli fire Tament som a verde 6) m dee 16 de deco de 1970 2 E por sso que podemos dizer que, também ai, Espinosa foi até 6 limite: até o ponto mais alto dessa esruturateéica, bem onde es- tava muite perta de sie dela derrubia [er] 9 inicio da Reforma do entendimento: [* [por fim re- solv investgar se existiaalgum objeto que fosse um bem verdade- ro, eapaz ce ansmiti-see pelo gual aula, renunciando a qualquer ‘outro pucesse ser aetada unicamente; um bem cuja descobertae posse tivessem como fruto uma eteridade de jibilo continuo ¢ soberano."*]' Nao esta em causa, como em Aristételes, um desejo de conhecet,¢ sim um desejo de flicidade ~ de uma felicidade eterna fe que nada poderiacomprometer (e que nada ainda diz que se da ‘ordem do conhecimento). Ora, & nessa busea dafelicidade, ou antes no exame das condigSes pelas quais se podcria encontrar essa fic dade, no exame de suas incertezas ou de sua certezs, quese descobre {€ pelo jogo dessa mesma busca) a ideia verdadeira, a felicidade prépria da ideia verdadeira,E a partir dai que a resoluczo de procu- Tar conhecer se desenvolve. Assim a verdade & apresentada como ‘aquilo que Fundomenta tanto o conhecimento como o desejo de co- nhecer.E a partir da verdade que todos os outros elements se desen- volvem e se ordenam ‘Como podemos ver, oda a dispasigio aparente do lex aristo- telco & subvertda, Aqui hi adequagio ene a felicidad ¢ a ideia verdadeis; a partir dai se desenvotvem a vontade de conhecer © 0 conhecimento, Em Arstteles, hi desejo natural de conbecer, mani- {estado diseretamente pela feliz casualidade de sensagBes no muito ‘eis, Mas, na realidade, para que o texto de Aristotlespudesse re- stir seria preciso que ji se delinease a contemplagio(contempla- Jo do verdadeiro e Felicidade contemplativa) © qu, pelo menos Potencialrente, ela se insersse na flicidade sensorial eno desejo de conhecer. Espinosa cita com clareza, ena ordem,o ue trnata possivel a retaiscaclissica. (Ora ¢ justamente isso, a relaglo vontade-conhecimento-ver de, que esi em questio em Nietzsche’ ‘Numa primeira avaliaglo, os textos de Nietache podem (ede- em) set lds con un enttiva pura ibertarv desejo de wonleest da forma eda lei do conhecimento, a1 Tiata-se de mostrar que na raiz do conhecimeno, no ponto histérico de sua irupglo, hd um deseo; © que esse deseo no tem 1 ago na Fgur ne mans deta aul

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