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INTRODUÇÃO

GEOARQ, UMA ABORDAGEM INTEGRADA E APLICADA DA GEOLOGIA SEDIMENTAR

P. S. G. Paim, A. J. V. Garcia, U. F. Faccini & E. L. C. Lavina

Introdução

Este capítulo tem o objetivo de apresentar a abordagem metodológica que norteou a


concepção e o desenvolvimento do projeto “Geometria, arquitetura e heterogeneidades de cor-
pos sedimentares” (GEOARQ). A abordagem contempla a visualização do registro sedimentar
por meio da aplicação integrada de um conjunto de técnicas e teorias usuais no âmbito da geologia
sedimentar, fundamentadas na geologia do petróleo, direcionadas à pesquisa de recursos minerais
contidos em bacias sedimentares (com as adequações necessárias às especificidades de cada caso).
Estes procedimentos procuram relacionar atributos relativos à arquitetura, à geometria e às
heterogeneidades dos corpos sedimentares com questões práticas vinculadas à pesquisa e
explotação de bens minerais e, desde que adequadamente adaptadas, a questões-chave no mane-
jo ambiental. Esta abordagem parte também da premissa de que a integração de dados e interpre-
tações de diferentes escalas permite uma melhor compreensão sobre a origem e distribuição de
recursos minerais diversos associados a bacias sedimentares, sejam esses de origem sindeposicional
(p. ex., placer e carvão) ou pós-deposicional (p. ex., mineralizações metálicas e não-metálicas,
hidrocarbonetos e água subterrânea).
Intervalos litológicos de diferentes ambientes sedimentares são estudados a partir da
integração de dados de superfície (p. ex., mapeamento geológico, descrição e perfilagem de
afloramentos) e subsuperfície (p. ex., testemunhos de sondagens, perfis e dados hidrológicos de
poços, seções de georradar), incluindo também análises petrológicas e ensaios petrofísicos. Ainda
que não utilizadas no projeto, é notório que outras informações geofísicas, principalmente aquelas
vinculadas à sísmica de reflexão, bem como o adequado uso da modelagem física e numérica,
agregam e organizam um volume de informações que pode aumentar em muito a precisão dos
resultados obtidos. O potencial de qualquer modelo físico ou numérico, baseado ou não em um
conjunto de informações sísmicas, será, em grande parte, um reflexo da qualidade do modelo
geológico elaborado ou interpretado. Assim sendo, para enfrentar os problemas inerentes à loca-
lização e extração de recursos minerais, a utilização de modelos geológicos preditivos oferece um
apoio fundamental tanto na pesquisa de novas fronteiras exploratórias como na definição da for-
ma mais adequada para explotação.

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Fundamentação teórica

A definição de modelos, físicos ou conceituais, a partir dos quais são reconhecidas as


prioridades exploratórias ou realizadas simulações de fluxo, é tarefa complexa. Isso se deve à
dificuldade de caracterizar com precisão a disposição espacial e características intrínsecas das
rochas nas diferentes escalas de observação necessárias (da escala de bacia à escala microscópica).
A presença e distribuição de recursos minerais em litologias sedimentares são diretamen-
te relacionadas a processos genéticos específicos, que atuam desde a deposição até a telodiagênese.
Recursos cuja distribuição é controlada pela deposição tendem a se distribuir e a se concentrar de
acordo com as relações entre as propriedades físicas (p. ex., granulometria e densidade) ou quími-
cas (p. ex., estado de oxidação/redução) e as variações de energia e condições químicas do ambi-
ente sedimentar. Recursos minerais de origem pós-deposicional são afetados pelas propriedades
físicas (p. ex., estratificações internas e textura de grãos) e químicas (p. ex., composição dos grãos
do arcabouço) das rochas, devido às suas influências sobre as condições de migração dos fluidos no
interior dos pacotes sedimentares. Enquanto as heterogeneidades internas das fácies afetam a
dinâmica dos fluidos no espaço permoporoso, a composição mineralógica afeta a química desses
fluidos durante a migração. Tais fenômenos participam intensamente, por exemplo, no controle
do fluxo e na composição química da água que percola através dos aqüíferos granulares.
Os fundamentos teóricos utilizados de maneira integrada revelam a importância de estu-
dos multiescalares detalhados que conduzam à geração de modelos reais e/ou conceituais preci-
sos o suficiente para direcionar as atividades de exploração e explotação. Com base em dados,
informações e concepções consistentes com a realidade geológica investigada, pode-se então re-
alizar simulações a partir da elaboração de modelos numéricos que se sustentem na base de dados
conhecida e que permitam projeções para as áreas não conhecidas.

Escalas e controles das características físicas dos corpos sedimentares


As características finais dos depósitos sedimentares são influenciadas por diversos fatores
que atuam desde a escala de bacia (gigaescala) e arquitetura estratigráfica (megaescala), passando
pela escala dos elementos arquiteturais (macroescala) e feições sedimentares (mesoescala), culmi-
nando com a escala dos atributos texturais (microescala) (Fig. 1.1.1). Enquanto a tectônica e o
clima definem a fisiografia das regiões submetidas à erosão e deposição e as próprias taxas de
acumulação, preservação e, conseqüentemente, a arquitetura estratigráfica nas bacias sedimentares
(processos alogênicos atuantes em giga e megaescala), a dinâmica dos sistemas deposicionais con-
trola a arquitetura deposicional e a geometria dos corpos sedimentares (processos autogênicos
atuantes em macro e mesoescala) (Fig. 1.1.2). Os atributos físicos e composicionais reconhecidos
em estudos petrográficos (microescala) decorrem, em última análise, de processos pós-
deposicionais (diagenéticos), afetando ou sofrendo influência dos atributos definidos na etapa an-
terior (sedimentogênese).
Os processos e produtos diagenéticos condicionam a distribuição final do espaço
permoporoso no interior dos corpos sedimentares. Tais processos, relacionados à história de
soterramento, promovem significativas modificações nas propriedades permoporosas primárias
dos sedimentos, fechando ou abrindo caminhos para percolação de fluidos durante sua evolução
diagenética (Fig. 1.1.3).

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Figura 1.1.1 – Hierarquia das heterogeneidades nos depósitos sedimentares com relação às
escalas de campo, reservatório e petrofísica (adaptado de Buchem et al., 1995, e Dreyer, 1993) e
principais agentes de controle (adaptado de Miall, 1996).

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Figura 1.1.2 – (a) Paleogeografia, um produto da tectônica e do clima, condicionando a distribui-


ção dos sistemas deposicionais e a arquitetura estratigráfica (adaptado de Fisher & Brown, 1984);
(b) configuração dos sistemas deposicionais definindo a arquitetura deposicional (porte e geome-
tria dos corpos sedimentares) e feições sedimentares internas (adaptado de Galloway & Dutton,
1979).

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Figura 1.1.3 – Relações de influência do ambiente deposicional, rocha-fonte e história pós-deposicional sobre os atributos responsáveis pela definição de
propriedades-reservatório em rochas sedimentares clásticas terrígenas (adaptado de Hewitt, 1966).
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Recursos minerais sindeposicionais


Dentre os recursos cuja origem e concentração recebem influência direta dos processos
de transporte e deposição, alguns resultam de fenômenos físicos enquanto outros são decorren-
tes de fatores químicos/bioquímicos (p. ex., diamante em placers e turfas/carbonatos marinhos,
respectivamente). Neste contexto, seções de correlação e mapas de distribuição de fácies, assim
como a adequada avaliação das relações entre processos e produtos na escala de elementos
arquiteturais e litofácies, constituem-se em ferramentas importantes para a compreensão da ar-
quitetura estratigráfica e deposicional (Fig. 1.1.4). Mapeamento geológico detalhado e correlação
de fácies auxiliam no entendimento dos padrões de transporte e sedimentação e, conseqüente-
mente, possibilitam a identificação de situações estratigráficas e paleogeográficas favoráveis à con-
centração de recursos minerais. Propriedades físicas, tais como densidade, diâmetro,
arredondamento e esfericidade, afetam o deslocamento dos grãos e a concentração de minerais
(Fig. 1.1.5). Por outro lado, certas propriedades químicas, tais como eletronegatividade e poten-
cial iônico, controlam a mobilidade ou precipitação dos componentes transportados em solução.
A análise em diferentes escalas de investigação favorece, portanto, a previsão de interva-
los litológicos com concentrações minerais, estejam estas associadas à capacidade de transporte
ou ao controle geoquímico.

Figura 1.1.4 – (a) Seções de correlações e mapas de distribuição de litofácies como método
auxiliar para visualização da geometria e conectividade nas escalas mega e macro (adaptado de
Harris & Hewitt, 1977) e (b) visualização na escala de reservatório das heterogeneidades relacio-
nadas à continuidade lateral e conectividade das mesmas (macroescala) – adaptado de Galloway et
al. (1979).

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Figura 1.1.5 – Variações na composição e seleção granulométrica em função da distância e agentes de transporte e estabilidade dos minerais em condições
superficiais, resultando em diferentes graus de maturidade mineralógica e seleção textural dos constituintes detríticos nos diferentes contextos deposicionais
(adaptado de Zuffa, 1991).
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Recursos minerais de origem diagenética


A análise das heterogeneidades definidas pela arquitetura estratigráfica e deposicional,
pela geometria das fácies e pelos atributos texturais, contribui para o reconhecimento de sítios
deposicionais favoráveis à concentração de depósitos minerais. Além disso, essas mesmas
heterogeneidades repercutem também na definição dos caminhos preferenciais de percolação de
fluidos durante os processos diagenéticos.
A presença e a percolação de fluidos no interior das rochas sedimentares constituem os
principais motivos pelos quais ocorrem reações químicas envolvendo processos de dissolução e
precipitação durante a diagênese. Estes processos são responsáveis pelo fechamento total ou
parcial da porosidade primária dos sedimentos, por meio da precipitação de constituintes autigênicos
(cimentos) no interior dos poros ou pela dissolução total ou parcial de componentes, abrindo
novos espaços porosos (porosidade secundária). Uma vez que todo e qualquer processo diagenético
de dissolução ou precipitação resulta da interação fluido-rocha, é importante reconhecer as ca-
racterísticas geoquímicas tanto dos constituintes clásticos como dos fluidos percolantes no interior
dos poros.
Em rochas terrígenas, a composição do arcabouço é produto da interação entre rochas-
fonte, clima, transporte (agente, tipo e distância) e condições de deposição. A composição dos
fluidos intersticiais é um produto combinado da composição original do fluido presente no ambi-
ente deposicional, de sua reação com os constituintes minerais e de sua evolução geoquímica no
decorrer do soterramento e estágios posteriores da diagênese. A evolução geoquímica dos fluidos
depende em parte de sua mobilidade no interior dos intervalos litológicos. Esta mobilidade, por
sua vez, é inicialmente relacionada à distribuição das heterogeneidades de origem deposicional.
Durante a evolução diagenética, processos de dissolução e precipitação são responsáveis por
modificações no espaço permoporoso, abrindo ou fechando espaços, ampliando ou restringindo a
circulação de fluidos.
Os processos de dissolução deixam, comumente, indícios texturais, desde grãos com
bordas corroídas chegando até mesmo à completa dissolução, quando restam apenas poros
agigantados. Neste caso, pouco se pode concluir com relação à composição química do fluido que
percolou a rocha dissolvendo seus componentes minerais. Por outro lado, os processos de preci-
pitação deixam indicações muito mais seguras sobre a composição química dos fluidos precipitantes.
Estas indicações incluem as próprias fases minerais precipitadas (cimentos), cujos constituintes
elementares e isotópicos (carbono e oxigênio, por exemplo, para o caso de cimentos carbonáticos)
refletem as condições geoquímicas no momento da precipitação.
Em resumo, qualquer acumulação mineral de origem diagenética responde à distribuição
dos espaços disponíveis para serem preenchidos (espaço inter e intragranular). Esses espaços
podem ser visualizados como uma unidade física, com limites externos (controle estratigráfico e
deposicional) e atributos internos (controle deposicional e diagenético). O entendimento dessas
questões constitui o principal foco nas investigações voltadas à avaliação de recursos minerais
pós-deposicionais, ou seja, todos aqueles relacionados à migração de fluidos (água, óleo, gás, de-
pósitos minerais relacionados a fluidos diagenéticos; Fig. 1.1.3). As investigações em escala mi-
croscópica devem caracterizar os diferentes tipos de porosidade presentes no intervalo de inte-
resse e suas relações com as heterogeneidades discriminadas nas demais escalas analisadas (meso,
macro e megaescala; Fig. 1.1.4). A quantificação dos diferentes tipos de porosidade e sua visualização
no espaço são requisitos fundamentais na elaboração de modelos geométricos tridimensionais
dos corpos sedimentares que contenham recursos minerais de origem pós-deposicional.

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INTRODUÇÃO 23

Considerações metodológicas

A utilização de afloramentos análogos na caracterização dos atributos físicos de corpos


sedimentares e na definição de modelos geológicos aplicáveis em estudos de reservatórios de
hidrocarbonetos tornou-se usual. Com esse procedimento busca-se constituir modelos geológi-
cos de caráter preditivo, que sejam mais confiáveis em estudos exploratórios ou de explotação. A
vantagem no uso de análogos consiste na possibilidade de acessar e quantificar os atributos
arquiteturais e geométricos dos estratos sedimentares (macroescala) e a variabilidade lateral de
feições sedimentares no interior dos estratos (mesoescala). Por meio disso, são estabelecidos
critérios que dão suporte à geração de modelos conceituais e, desses, modelos numéricos úteis
em avaliações em subsuperfície.
A abordagem aqui apresentada vale-se, em todos os casos abordados, de estudos de
afloramentos somados com dados de subsuperfície obtidos com ferramentas diversas, função do
bem mineral considerado e da disponibilidade de informações. Aspectos ligados aos principais
elementos arquiteturais, geometria das camadas e fácies sedimentares (com todos os seus atribu-
tos) são mais facilmente acessados e mensurados em afloramentos.
Na pesquisa de recursos minerais de origem sindeposicional, a análise de afloramentos
permite contextualizar as condições deposicionais nas quais as acumulações foram geradas. No
caso de placers, o tema central será a posição espacial relativa das fácies mais promissoras para
concentração de minerais pesados. Em se tratando de camadas de carvão, o tipo e configuração
fisiográfica do sistema deposicional associado à gênese das paleoturfeiras constituirão o foco cen-
tral. A extrapolação das informações de superfície para subsuperfície, seja por levantamentos com
GPR (modelamento 3D em macroescala), seja por dados de poços e testemunhos (modelamento
3D em macro e megaescala), fornecerá a confiabilidade necessária aos modelos construídos. Es-
tudos em microescala (análise de minerais pesados, mineralogia, petrografia orgânica, análises e
ensaios químicos, entre outros) definirão a existência e/ou qualidade do recurso mineral pesquisado.
Para o caso de minerais de origem sindeposicional, o estudo dos processos diagenéticos (e
técnicas associadas) pode não possuir maior relevância, uma vez que a espacialização do espaço
inter e intragranular não é o fator condicionante na disposição do bem mineral considerado.
Em se tratando de recurso mineral de origem pós-deposicional envolvendo a migração
de fluidos, diferentes histórias diagenéticas, mesmo de litologias depositadas em condições
paleoambientais similares, acabam por condicionar importantes diferenças na distribuição do es-
paço permoporoso. Nesses casos, a compreensão dos processos diagenéticos assume uma im-
portância maior. Por conseguinte, as técnicas relacionadas a esta escala de estudo tornam-se pe-
ças-chave. Ensaios petrofísicos e análises na escala microscópica (p. ex., microscopia óptica con-
vencional, catodoluminescência, isótopos estáveis, microscopia eletrônica, microssonda, inclu-
sões fluidas) tornam-se importantes fontes de informação para uma apropriada avaliação da
potencialidade relacionada a recursos diversos, incluindo hidrocarbonetos (óleo e gás), água sub-
terrânea e minerais associados a fluidos hidrotermais. No entanto, é importante ressaltar que
todas as demais técnicas relacionadas ao estudo de afloramentos e a análises de subsuperfície,
previamente consideradas na avaliação de recursos de caráter sindeposicional, continuam a de-
sempenhar o mesmo papel relevante para a completa avaliação do recurso considerado.
Cabe uma ressalva relativa à questão de analogias feitas a partir de afloramentos, pois
duas situações podem ser verificadas: a unidade de interesse em subsuperfície pode ou não aflorar.
No primeiro caso, a correlação é mais direta e de caráter mais abrangente. Deve-se, no entanto,
considerar as possíveis variações de cunho paleogeográfico ou diagenético, na medida em que as
histórias deposicional e de soterramento para a mesma unidade podem variar de forma significa-
tiva no espaço. No segundo caso, além das possíveis diferenças paleogeográficas e diagenéticas,
fatores como especificidades dos sistemas deposicionais, variações na composição do arcabouço
e clima, entre outros, podem interferir aumentando o grau de imprecisão das analogias diretas.
Apesar dessas dificuldades, os modelos conceituais produzidos para as duas situações abordadas

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(aflorar ou não) podem incorporar princípios similares e potencialmente aplicáveis. Os modelos


numéricos, no entanto, serão mais frágeis quando não existe uma vinculação direta entre
afloramentos e a zona de interesse em subsuperfície.
A quantificação dos parâmetros a serem modelados nas distintas escalas de observação
(p. ex., elementos arquiteturais, dimensões e geometrias de corpos, dimensões de estruturas
sedimentares, tipos e distribuição de poros) é realizada a fim de compor o banco de dados físicos
utilizado na definição do modelo geológico. Uma vez consideradas as semelhanças e diferenças
entre as unidades em superfície e subsuperfície, o modelo gerado poderá então ser aplicado (ou
modelado em termos numéricos) com finalidade exploratória ou de lavra.
O uso de afloramentos na caracterização de modelos preditivos mostra-se também im-
portante em termos da representatividade da amostragem de rochas para análises petrográficas e
petrofísicas, uma vez que permite um melhor reconhecimento das variações faciológicas, princi-
palmente em situações onde não exista disponibilidade de testemunhos de rocha. Entretanto, o
uso de amostras de superfície como análogas para situações de subsuperfície deve ser realizado
com cautela, pois litologias expostas apresentam alterações diagenéticas produzidas pelo retorno
às condições de soterramento raso, sujeitas à infiltração de fluidos meteóricos (telodiagênese).
Assim, reconhecido o efeito da telodiagênese, os dados quantificados em amostras de superfície
poderão ser utilizados, com reservas, nos estudos de modelagem.

Considerações finais

A definição de modelos preditivos em geologia e, em particular, sua aplicação à explora-


ção mineral e extração de fluidos contidos no espaço permoporoso de litologias sedimentares
exigem, além das ferramentas tecnológicas para modelagem, uma consistente bagagem de conhe-
cimento sobre as condições de origem e evolução das rochas que contêm o recurso prospectado.
Uma vez reconhecidos os processos genéticos relacionados à formação de acumulações
minerais, a maior dificuldade de utilização deste conhecimento na definição de modelos preditivos
reside na aplicação dos mesmos nas diferentes escalas em que as investigações se desenvolvem,
questão essa já destacada por vários autores (p. ex., Galloway & Hobday, 1983). A análise integra-
da de heterogeneidades procura reduzir as incertezas dos modelos a partir da integração de da-
dos associados às diversas escalas de investigações.
A integração dos dados obtidos é facilitada quando o trabalho se desenvolve respeitando
a hierarquia das heterogeneidades geradas por fatores atuantes em distintos momentos evolutivos
das litologias. Um sumário desta abordagem pode ser representado pelos seguintes itens de in-
vestigação: (1) caracterização das heterogeneidades e unidades passíveis de serem discernidas em
giga e megaescala (bacia ou parte desta), buscando definir as variações no tempo e no espaço dos
padrões de preenchimento (arquitetura estratigráfica), utilizando para tanto sondagens regionais
e/ou seções sísmicas; (2) definição das heterogeneidades e unidades em macroescala, por meio do
detalhamento dos sistemas deposicionais alvo e reconhecimento dos elementos arquiteturais que
os constituem, utilizando dados de poço, GPR e afloramento (arquitetura deposicional); (3) iden-
tificação das heterogeneidades em mesoescala, via definição do arcabouço faciológico que carac-
teriza os vários elementos arquiteturais, por meio de estudos de poço, testemunho e afloramento;
e (4) avaliação das heterogeneidades em microescala, por meio de análises petrográficas e
petrofísicas, acompanhadas de estudos petrológicos focados na evolução e distribuição do espaço
inter e intragranular. As escalas relativas aos itens 1 e 2 relacionam-se à fase de trabalho comumente
definida como exploratória, enquanto os itens 3 e 4 são enfatizados nas etapas posteriores, associ-
adas à lavra ou explotação. No entanto, não deve existir rigidez quanto a isso, pois muitas vezes a
resposta a uma questão regional é encontrada em estudos de detalhe e vice-versa. A abordagem
conjunta, em todas as escalas, é, sem dúvida, a que fornecerá maior confiabilidade aos modelos

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geológicos e, assim, a qualquer modelo numérico que possa vir a ser elaborado, seja este aplicável
à exploração ou à explotação.
O projeto GEOARQ, a partir dos conceitos discutidos acima, buscou contribuir para a
aplicação e disseminação de métodos, técnicas e conceitos usuais da Geologia do Petróleo na
pesquisa de outros recursos minerais encontrados em terrenos sedimentares, com as adaptações
necessárias a cada caso. Procurou também preencher uma lacuna e servir como um ponto de
referência para a utilização integrada das disciplinas de estratigrafia, sedimentologia e petrologia
para fins aplicados. Com isso pretendeu interferir na abordagem usualmente utilizada em outras
áreas da Geologia (p. ex.,Hidrogeologia, Geologia do Carvão e Geologia Econômica) bem como
na forma de apresentação de temas vinculados à geologia sedimentar na formação de recursos
humanos em Geologia, em nível de graduação, no Brasil.

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