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Introdução
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Estudante de Graduação do Curso de Publicidade e Propaganda da UNAERP, email: bias.cassao@gmail.com.
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Estudante de Graduação do Curso de Publicidade e Propaganda da UNAERP, email: gabrielhferreira97@gmail.com.
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Doutoranda em Psicologia, Processos Culturais e Subjetivação pela Universidade de São Paulo (USP). Mestra em
Educação e Bacharela em Ciência da Informação e Documentação pela mesma instituição. Atualmente trabalha com
suporte às disciplinas e cursos a distância da UNAERP. E-mail: mprandi@unaerp.br
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Hibridismo cultural
Realizar análises socioculturais é uma habilidade que demanda muita
competência, visto que esses temas possuem muitas variáveis. A sociedade é composta por
indivíduos únicos, que mesmo vivendo sob influência de determinadas formas de poder,
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possuem características ímpares que os diferem uns dos outros. Apesar dessa
complexidade, muitos historiadores e antropólogos destinam sua vida para o estudo da
cultura nas sociedades, um destes autores é Nestor Garcia Canclini, antropólogo argentino
contemporâneo, reconhecido como um dos maiores estudiosos em comunicação, cultura e
sociedade na américa latina.
Em sua obra “Culturas Híbridas: Estratégias para entrar e sair da modernidade”,
Canclini caracteriza hibridismo cultural como sendo um processo em que duas culturas
antes distintas se mesclam abrangendo aspectos culturais, econômicos e políticos. O autor
afirma que isso afeta a forma como se produz e reproduz bens simbólicos, o que gera uma
nova configuração cultural. Contudo, o intuito do autor não é verificar se determinada
cultura é híbrida ou não, e sim, entender como ocorrem os processos de hibridização
cultural e como a sociedade se apropria e usa disso, ele também afirma que em tal processo
podem haver limitações, pois há culturas que não se deixam, não querem, ou não podem
ser híbridas (CANCLINI, 2007, p. 40).
Durante sua obra o autor cita várias formas de hibridismo que ocorrem na América
Latina, como por exemplo a configuração cultural do México, em que ocorre uma mistura
de indígenas, colonizadores europeus, criollos, mexicanos nativos e mexicanos migrantes,
que convivem interagindo suas formas culturais e como consequência concede ao México
características culturais únicas e hibridizadas. Sobre esse efeito o autor faz uma
interessante observação:
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utilizou tubos para representar as fronteiras existentes, e então introduziu nesse cenário
formigas que podiam se movimentar dentro das caixas e através delas pelos tubos. Esse
movimento transitório misturou as cores das bandeiras, e também trouxe cores de outras,
até que tal movimento fizesse com que muitas delas se tornassem irreconhecíveis depois
de um tempo. Na obra em questão, as formigas são como as pessoas e seus movimentos
transitórios que podem mudar totalmente a configuração sócio cultural de um país.
(CANCLINI, 2007, p. 48).
Portanto, como um dos fatores que intensificou a hibridação, Canclini aponta a
expansão urbana, pois ela dissolveu as fronteiras geográficas e culturais entre as pessoas
que saíram do campo para morar nas cidades. Tal fenômeno modificou a estrutura social
das cidades gerando um novo espaço capaz de possibilitar que se encontre até mesmo
índios e artesãos que vendem suas formas tradicionais de artesanato usando técnicas
modernas de produção e comercialização tipicamente capitalistas.
Para analisar melhor como ocorre o processo de hibridação, Canclini trabalha com
dois processos que agem de forma combinada e possibilitam traçar não só um panorama
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cidade. Porém, percebeu que dois terços dessas imagens representavam lugares que
estavam além da cidade, como as lojas para turistas, as fronteiras legais e ilegais e
esculturas que caracterizam um passado histórico da cidade. Isso é aplicável à noção de
desterritorialização, visto que a cultura viaja junto com o indivíduo e se mistura à cultura
da cidade que vive. Essas misturas fortalecem os hibridismos e a heterogeneidade das
culturas. Assim, o indivíduo não é caracterizado pelo seu país de origem ou cultura nativa,
mas sim pela cultura adquirida e por onde ele passa e absorve. Tijuana é tão singular e
híbrida que já não é caracterizada por um povo ou cultura dominante, podendo ser
classificada como uma cidade pós-moderna.
Com essa análise, Canclini também percebeu a ocorrência de um fenômeno muito
peculiar que denominou de “reterritorialização”. Ela surge quando as pessoas passam a
querer se colecionar em alguns aspectos para poder se diferenciar do restante, como por
exemplo, os cidadãos de Tijuana que usam certos tipos de roupas para se diferenciarem
dos turistas e migrantes.
Ambos os processos, desterritorialização e descolecionamento, viabilizam o que o
autor designa de entrada e saída da modernidade, entendendo isso como a capacidade de
um indivíduo ser capaz de interagir e mesclar práticas tradicionais com a modernidade já
que isso possibilita que haja a “relocalizações territoriais relativas, parciais das velhas e
novas produções simbólicas. ” (CANCLINI, 2007, p. 309). Por exemplo, um artesão entra na
modernidade quando usa técnicas comunicacionais modernas para reproduzir e vender
sua arte; e sai dela quando produz este bem simbólico por meio de técnicas tradicionais de
produção.
Isso ratifica a noção do autor de que a hibridização cultural, em conjunto com as
tecnologias modernas, torna-se ferramentas democratizadoras da produção de bens
culturais, já que não limita mais que artistas dependam de um determinado local
(desterritorialização) e um público específico (descolecionamento) para conseguir
produzir e comercializar estes bens.
Neste tópico foi tratado a teoria de hibridismo cultural proposta por Canclini,
juntamente com os conceitos de desterritorialização e descolecionamento. No próximo
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tópico, será apresentado o objeto de estudo da pesquisa, o Festival João Rock, e como ele
se consolidou um dos maiores festivais nacionais.
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partir dessas informações sobre o objeto de estudo, no próximo tópico será analisado se o
conceito de hibridismo cultural pode ser aplicado na 17ª edição do festival João Rock para
verificar quais aspectos apontados por Canclini acontecem no evento.
Existe uma sinergia entre os ritmos e os subgêneros que abraçamos no evento com
o público do rock. Neste ano, essa expectativa de promover a diversidade e o
encontro foi superada com a homenagem à Tropicália. Acreditamos que um
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evento com esse DNA tem o papel de fortalecer, revelar e ampliar todas as
possibilidades do rock. (ROCCI. G, 2018)
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presença em todas as edições do evento de uma pista de Skate, está que está fora de seu
local de origem pois está inserida dentro de um evento musical. Tal fato evidencia as
diferentes maneiras de se aplicar o conceito de desterritorialização no João Rock.
Como consequência da hibridação, Canclini aponta o processo de democratização
da produção de arte, e tal fato é percebido por meio do "Concurso de Bandas" que o João
Rock promove. De acordo com o site de notícias G1, as inscrições são realizadas pelo site, o
qual bandas independentes de diversas cidades e estados do Brasil podem se inscrever. O
prêmio para o vencedor do concurso é o de poder abrir as apresentações do Palco Principal,
que pode aumentar a visibilidade daqueles artistas no cenário musical. Além disso, o palco
"Fortalecendo a Cena" também é um espaço democratizador da arte, pois reúne em um
mesmo espaço, bandas novas que tem ganhado espaço no cenário independente. O Hip-
hop de Rael, o Rap de Froid, a música tradicional com ritmos folclóricos e de Pop Rock de
Francisco del Hombre, o rock argentino de Dônica, o rock de Kilotones e a mistura de Rock,
pop e reggae de Sinara faziam parte deste grande leque cultural que permitiu representar e
dar mais abertura para diferentes culturas.
Assim, com base nos conceitos estudados neste artigo, das análises do estudo de
caso e das entrevistas em profundidade, no próximo tópico será necessário verificar se o
objetivo proposto foi atendido e se alguma das hipóteses traçadas para a problemática foi
corroborada: o festival João Rock, ao promover o encontro de diferentes culturas, consegue
torná-las híbridas?
Considerações finais
Por conta da variedade de gêneros musicais e da diversidade de elementos
culturais distintos em um mesmo ambiente, visto por meio dos processos de
desterritorialização e descolecionamento, é possível comprovar que o conceito de
hibridismo cultural pode ser aplicado no evento. Isso também é notado pelos
entrevistados, que possuem um ponto de vista em comum acerca da mistura de culturais
que compõe as atrações musicais e o público do evento. Entretanto, existe certa divisão de
opiniões entre os entrevistados, quando questionados se o festival João Rock consegue
tornar essas culturas híbridas. Observou-se que uma parcela dos entrevistados não acha
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No caso do Sujeito 02, o festival, de certa forma, acrescentou para sua formação
cultural, mas não necessariamente trouxe uma mudança. Para ele, “...acrescentou o modo
de eu olhar os grupos em si." Para o Sujeito 03, foi a 1ª vez que esteve no evento e gostou
muito, mesmo não sendo seu tipo de evento preferido e até acabou se misturando com
outras pessoas.
Em virtude do que foi mencionado, é possível afirmar que, apesar do evento reunir
diversas culturas e proporcionar aspectos culturais híbridos, o hibridismo só acontece, de
fato, quantos os participantes permitem serem “hibridizados”. Isso já era observado por
Canclini a respeito das limitações no hibridismo, quando diz que há culturas que não se
deixam, não querem, ou não podem ser híbridas (CANCLINI, p. 40). Considerando também
que cada indivíduo já vai ao evento com o intuito de assistir e participar das atrações em
que mais lhe interessa, é possível afirmar que para o hibridismo cultural acontecer,
depende exclusivamente do indivíduo, que pode ou não assistir outras apresentações,
interagir com outras pessoas e participar de forma ativa.
Com isso, é possível perceber a importância de estudar e analisar o tema de
hibridismo cultural no campo da comunicação, pois permite que o profissional da área
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tenha um novo olhar sobre a sua atuação em produções culturais, tais como o João Rock.
Isso porque, tendo em vista a complexidade de se caracterizar um determinado público
alvo, já que, atualmente, não existem barreiras que separam o que é culto, popular ou
massivo, como apontado pelo autor. Levando isso em consideração, surgem outras
questões outras questões, como por exemplo, de que forma o profissional de comunicação
consegue realizar a determinação do público alvo de uma produção cultural tendo em vista
os processos de desterritorialização e descolecionamento.
Referências
CANCLINI, N. G. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. 4º ed, São Paulo:
EDUSP, 2007.
Sites:
DINO. TERRA. Público do Festival João Rock transforma Camaleão em mascote. Disponível em:
<https://www.terra.com.br/noticias/dino/publico-do-festival-joao-rock-transforma-camaleao-em-
mascote,6ff7ee95ecc3559fb41590a9320f577bx2xmaann.html> Acesso em 20 de setembro de 2018.
FOLHA DE SÃO PAULO. Festival João Rock, em Ribeirão Preto, homenageia os tropicalistas.
Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2018/06/festival-joao-rock-em-ribeirao-
preto-homenageia-os-tropicalistas.shtml> Acesso em 11 de Setembro de 2018.
TIENGO, Rodolfo. Há 15 anos, festival ganhou nome de João Rock em tributo aos bateristas.
Disponível em <http://g1.globo.com/sp/ribeirao-preto-franca/musica/joao-
rock/2015/noticia/2015/06/ha-15-anos-festival-ganhou-nome-de-joao-rock-em-tributo-aos-
bateristas.html> Acesso em 13 de Setembro de 2018.
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