Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Kahxakjh
Kahxakjh
A filosofia da história
de Walter Benjamin
MICHAEL LÖWY
E
STAMOS habituados a classificar as diferentes filosofias da história em con-
sonância com seu caráter progressista ou conservador, revolucionário ou
nostálgico em relação ao passado. Walter Benjamin escapa a tais classifica-
ções. Trata-se de um crítico revolucionário da filosofia do progresso, um adver-
sário marxista do “progressismo”, um nostálgico do passado que sonha com o
futuro.
A recepção de Benjamin, sobretudo na França, interessou-se prioritariamente
pela vertente estética de sua obra, com certa propensão a considerá-lo, sobretu-
do, historiador da cultura ou crítico literário. Ora, sem negligenciar esse aspecto,
se faz necessário evidenciar o alcance muito mais vasto de seu pensamento, o
qual visa nada menos que uma nova compreensão da história humana. Os escri-
tos sobre arte ou literatura só podem ser compreendidos em relação a essa visão
de conjunto a iluminá-los de seu interior.
A filosofia da história de Walter Benjamin bebe em três fontes diferentes: o
romantismo alemão, o messianismo judeu e o marxismo. Não é uma combinatória
ou “síntese” dessas três perspectivas (aparentemente) incompatíveis, mas a in-
venção, a partir delas, de uma nova concepção, profundamente original.
A expressão “filosofia da história” pode induzir a erro. Não há, em Benja-
min, um sistema filosófico: toda sua reflexão toma a forma do ensaio ou fragmento
– quando não se trata da citação pura e simples, com passagens retiradas de con-
texto e colocadas a serviço de sua própria dinâmica. Qualquer tentativa de siste-
matização é, portanto, problemática e incerta. As breves notas a seguir são ape-
nas algumas pistas de pesquisa.
* * *
Na literatura sobre Benjamin, deparamo-nos, freqüentemente, com dois
erros simétricos, que devem ser evitados a todo custo: o primeiro consiste em
dissociar, por meio de uma operação (no sentido clínico do termo) de “corte
epistemológico”, a obra de juventude “idealista” e teológica da “materialista” e
revolucionária da maturidade; o segundo, em contrapartida, encara sua obra como
um todo homogêneo e não leva absolutamente em consideração a alteração pro-
funda trazida, por volta dos anos 20, pela descoberta do marxismo. Para com-
preender o movimento do seu pensamento, é preciso, pois, considerar simultane-
amente a continuidade de certos temas essenciais e as diversas curvas e rupturas
que pontilham sua trajetória intelectual e política.
e técnico (ou da “contradição entre forças e relações de produção”), mas como a adorno
interrupção de uma evolução histórica que conduz à catástrofe. tbm?
Instituto Goethe
Agência USP
Notas
1 Benjamin, W. “La Vie des Étudiantes” (1915), em Mythe et violence (Paris: Lettres
Nouvelles, 1971), p. 37.
2 __________ Gesammelte Schriften (Frankfurt: Suhrkamp Verlag, 1980), III, p. 171.
3 __________ Sens unique (Paris: Lettres Nouvelles/Maurice Nadeau, 1978), pp. 205-6.
4 __________ “Le Surréalisme. Le Dernier Instantané de l’Intelligence Européenne”,
Mythe et violence, p. 312.
5 Naville, Pierre, La révolution et les intellectuels (Paris: Gallimard, 1965), pp. 76-7,
110-17.
6 Benjamin, W., “Le Surréalisme”, p. 312.
7 __________ Gesammelte Schriften, III, p. 474.
8 __________ “Passagenwerk” em Gesammelte Schriften, V, p. 574.
9 __________ Ibid., p. 820.
10 As citações das “Thèses sur la Philosophie de l’Histoire” foram, na maioria das vezes,
tiradas da tradução de Maurice de Gandillac em Poésie et révolution (Paris: Lettres
Nouvelles, 1971).
11 Benjamin, W. Gesammelte Schriften, I, 3, p. 1244 (notas preparatórias para as Teses).
12 __________ Gesammelte Schriften, I, 3, p. 1244 (notas preparatórias).
13 __________ Gesammelte Schriften, II, 2, p. 488.
14 Habermas, J. “L’actualité de W. Benjamin. La critique: Prise de Conscience ou
Préservation”, Revue d’Esthétique nº 1, p. 121, (1981).
Michael Löwy estudou Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP) e doutorou-se
na Sorbonne sob orientação de Lucien Goldmann. Vive em Paris desde 1969 e é autor de
vários livros, dentre eles, La théorie de la révolution chez le jeune Marx (Maspero); Método
dialético e teoria política (Paz e Terra); Para uma sociologia dos intelectuais revolucionários
(Ciências Humanas); Ideologias e ciência social (Cortez); As aventuras de Karl Marx contra o
barão de Münchhausen (Busca Vida).
Tradução de Gilberto P. Passos. O original em francês – La philosophie de l’histoire de
Walter Benjamin – encontra-se à disposição do leitor no IEA-USP para eventual consulta.
Palestra feita pelo autor em 28 de janeiro de 2002 na sede do Instituto de Estudos Avan-
çados da USP.