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(CONTO)

O menino que morreu com o vento

― Desce daí menino!


― Dá não tia...
― Claro que dá, o cê conseguiu subi também consegue desce ué!
― Mais quem disse que eu quero desce? Eu quero fica aqui em cima, e daqui ninguém me tira!
Preciso descobri uma coisa!
― Descobri o quê? Tem nada importante aí não...
― Claro que tem, senão eu não tava aqui “ué!”
― É algum ninho de passarinho? Dexa eles queto aí então!
― Que passarinho que nada, cê acha que eu ia subi aqui por causa de passarinho?!
― Que é então?
Nessa hora um bem-te-vi que adejava por ali desapareceu dentro das folhas da copa árvore
deixando só o zumbido das suas asas pra trás.
― Tá vendo?
― Tá vendo o quê menino? Cê falo que não tava procurando passarinho!
― Mais não tô mesmo!
― Ixi... Não tô entendendo mais nada, fala logo ou desce daí, já tá escurecendo...
― Já percebi, daqui de cima dá pra vê tia!
― Então que cê ta esperando pelo amor de Deus!!!
― Aquilo que a asa do passarinho tava levando...
― As penas?!
― Nãããão!!!!!!!!!
― Nem sei então...
― Era o vento tia! Será que ninguém percebe!
― Percebe o quê?
― Tia cê sabe se é o passarinho que traz o vento?
― Ah, muleque para de bobera e saí daí!!
― É ou não é? Eu quero sabe!
Ela abaixou a cabeça um instante, mais no instinto de coçar o braço que tinha acabado de ser
mordido por um mosquito, do que pra pensar numa resposta, estava mais preocupada com a
intempérie que perturbava as folhas secas no chão.
― Desce que vai chove!
― Vem da onde então?
― Vem o quê, os passarinhos?
― Não! De o vento vem?
― Ah sei lá muleque, vem lá de longe...
― Longe onde? Lá detrás daquelas árvores?
― É! Ele vem de lá mesmo! Agora desce!
― Então não é o passarinho que traz o vento né?
― Não, não é! É o vento que traz o passarinho... por isso que eles podem voar...
― E ainda tem vento né tia?
― Claro que tem, cê não ta sentindo aí em cima!
O menino voltou os seus olhos para o horizonte que estava todo pintado de vermelho e
rabiscado de relâmpagos, sentia o vento no corpo todo, imaginou o vento saindo lá de trás
daquelas árvores desenhadas tão longe. Como será que acontecia? Mais isso não tinha
importância. Outro dia ele iria lá ver, o que valia a pena ele já sabia, era o vento que fazia os
passarinhos voarem... ouviu o bem-te-vi pela última vez antes da chuva... fechou os olhos,
sentiu o vento e ouviu mais uma vez e só mais essa vez...
― Desce daí menino...
― Já vô...

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