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Diversity, taxonomy and specificity of tapeworms (Platyhelminthes: Cestoda) inhabiting typical antbirds (Passeriformes: Thamnophilidae) in Brazilian Amazon
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All content following this page was uploaded by Luís Fábio Silveira on 10 March 2015.
De além-mar
Originário do Velho Mun-
do, esse é o pássaro mais
amplamente distribuído no
planeta. Suas populações
naturais ocorrem na Eu-
ropa, no Oriente Médio e
no norte da África. A partir
do começo do século XIX,
novas áreas foram sendo
Pardal: pássaro mais presente no planeta, em especial onde há aglomerações humanas
ocupadas pela espécie ao
ser introduzida em outras
regiões, intencionalmente ou não. Hoje o 200 exemplares de Portugal para a cidade sil a espécie nunca ocupou e nunca coloni-
Pardal é encontrado em todos os conti- do Rio de Janeiro, sob o pretexto de ajudar zou qualquer formação nativa.
nentes, com exceção apenas da Antártida no combate a insetos transmissores de do-
(recentemente foi registrado também no enças. Sua dispersão para os diversos cen- Adaptação urbana
Japão). tros urbanos brasileiros se deu de maneira A capacidade para aproveitar grande
Habitante assíduo dos assentamentos lenta e gradual, certamente com a comple- quantidade de itens alimentares e a extre-
humanos, característica que vem de tem- mentação de novas importações. ma tolerância do Pardal a ambientes altera-
pos imemoriais, o Pardal tem mencionada a Dificilmente encontramos hoje alguma dos, como pastagens e cidades, desde que
sua vocação para se instalar na proximida- cidade brasileira onde o Pardal ainda não ofereçam cavidades onde possa nidificar,
de dos lares humanos até no nome cientí- tenha sido registrado. Na década de 1990, contribuíram para que encontrasse nas áre-
fico: Passer domesticus (o gênero Passer é até no Oiapoque, no extremo norte do Bra- as urbanizadas, mesmo naquelas menores,
formado por mais 24 espécies distribuídas sil, foram registrados Pardais, completando como as fazendas, locais ideais para a so-
pela Europa, Ásia e África). assim a colonização de todo o País, iniciada brevivência.
No Brasil, ele foi introduzido intencio- pela região sul antes da década de 1960. Tanto as casas baixas com telhados e
nalmente em 1906, com a importação de Por motivos ainda não muito claros, no Bra- beirais cujas cavidades são muito aproveita-
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se acredita até hoje), contribuiu
Birding Axarquia
Carlos Mancilla / Flickr
Anders Lundberg
um por bando – tem, como sinal de sua
posição na hierarquia, o “babador” com
a cor negra mais extensa que o dos de-
mais machos do grupo, cujas extensões
de negro no pescoço nunca alcançam o
desenvolvimento que se vê no dominan-
te. As fêmeas e os filhotes não possuem
Ninho: as mais diversas cavidades são aproveitadas a região da garganta negra e são ligei-
ramente menores, de modo que não é
das pelos Pardais na construção de ninhos, difícil identificar o sexo dos Pardais.
quanto a ampla e abundante presença de Estudos realizados mostram que a hie-
lixo orgânico, rico em restos de alimentos rarquia acontece até mesmo onde esses
dos quais essa ave se alimenta, proporcio- pássaros se reúnem para passar a noi-
naram condições ideais nas cidades para te. Nessas ocasiões, o macho dominante
que os Pardais se proliferassem rapidamen- permanece no centro da copa da árvore,
te. O fato de não competirem com as aves onde está mais protegido de predadores, Babador preto: só os machos têm e é maior
nativas por locais de nidificação nem por enquanto os demais membros, menos pri- no dominante do bando (foto de cima)
alimento nas cidades (ao contrário do que vilegiados na escala social, ocupam grada-
tivamente a partir do centro da copa até a disso, os antigos semáforos, outro tradicio-
periferia, essa última destinada aos exem- nal local de nidificação, têm sido substituí-
Mariza Sanches
plares mais desprotegidos e vulneráveis a dos por novos modelos que não possuem a
ataques noturnos. entrada lateral onde os Pardais colocavam
seus ovos. A redução na oferta de locais
Reprodução para nidificar resulta em menos filhotes, fato
Em cavidades já existentes, sejam natu- seguido por envelhecimento rápido da po-
rais, sejam feitas por outros animais ou pre- pulação e sua diminuição.
sentes em objetos e construções humanas, Além disso, a redução da oferta de ali-
as fêmeas podem colocar até dez ovos, mas mentos, pela ausência cada vez maior de
a média é de quatro ou cinco. A incubação terrenos baldios, ricos em sementes e in-
dura cerca de 14 dias e os filhotes aban- setos, aliada a uma coleta de lixo cada vez
donam o ninho entre duas e três semanas mais eficiente, também contribuem para o
depois de nascidos. declínio gradual da população de Pardais.
A espécie vai ficando, assim, confinada aos
Declínio bairros que ainda possuem casas baixas.
Embora o Pardal seja a típica ave urbana Esse fenômeno tem sido notado tam-
brasileira, o declínio de sua presença vem bém em outras cidades do mundo, indican-
sendo notado especialmente em grandes do que, embora não compita com as aves
cidades. É possível elencar facilmente al- nativas, o Pardal, pelo menos nas grandes
guns fatores para explicar o que vem acon- cidades, corre risco de desaparecer.
tecendo.
O primeiro deles, e o mais claro, é a
Luís Fábio Silveira é doutor em Zoologia e curador das
verticalização crescente. Casas baixas, com coleções ornitológicas Museu de Zoologia da USP; mem-
seus telhados e beirais, estão sendo rapida- bro do Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos
(CBRO); pesquisador associado da World Pheasant Associa-
mente substituídas por prédios altos demais tion (UK); autor de doze livros sobre aves e de dezenas de
Fêmea alimenta filhote: nela não há babador negro para os Pardais alcançarem o topo. Além artigos científicos publicados.