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Neuropsicologia do transtorno obsessivo-compulsivo CARACTERIZACAO DO TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO © transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) um transtorno neuropsiquistrico de an- siedade que acomete cerca de 0,3 a 3,1% da populagao ao longo da vida, independente- mente de sexo, etnia ou situagao econémica (Andrade, Wang, & Andreoni, 2012; Fonte- nelle, Mendlowicz, & Versiani, 2006). 0 seu diagnéstico é clinico, e, para tal, é necessi- rio que os sintomas obsessivo-compulsivos (SOCs) consumam no mfnimo uma ho- ra diéria, tragam sofrimento ao individuo interfiram significativamente em sua rotina (American Psychiatric Association [APA], 1994). Com frequéncia, 0 TOC provoca ruptura no funcionamento social ¢ profis- sional. A sua caracterizagao é dada pela pre- senga de obsessies e/ou compulsées, sendo sais frequente a presenca de ambas. As obsessoes sao pen- samentos intrusivos que sur- gem repetidamente sem que © individuo tenha contro- le, Esto associadas & anguis- tia ¢ em geral causam gran- de ansiedade, pois, embora © sujeito as reconhera como produto da sua mente, suas tentativas de ignoré-las ou controlé-las costumam ser infrutiferas (World Health Organization [WHO], 1992). Jé as compulsdes sao com- portamentos repetitivos que o individuo se Oe intrusivos que surgem repeti- Co ry tenha controle... As com- ecu Oe nos oe ‘acordo com regras rigidas ou SOR eae crac ers MARCELO CAMARGO BATISTUZZO ANITA TAUB. LEONARDO F FONTENELLE sente compelido a realizar de acordo com regras rigidas ou com o intuito de aliviar e/ou evitar a anguistia gerada pelas obses- soes. As compulsdes também podem ma- nifestar-se sob a forma de rituais mentais, como contagem ou rezas repetitivas, e tém como caracteristicas fundamentais o fato de serem excessivas e nao terem conexio fac- tual com o que procuram prevenir (Abra- mowitz, Taylor, & McKay, 2009). Apesar de avaliarem as suas obsessdes como irracio- nais e suas compulsdes como excessivas, os individuos acometidos pelo TOC sao inca- pazes de utilizar a informagao objetiva pa- raacalmar sua ansiedade e mudar seu com- portamento, Os avangos ocorridos na psiquiatria e na psicologia, particularmente nas tiltimas décadas, tem contribufdo para uma melhor compreensio do TOC ao tragar um cami- nho em direc4o a sua etiolo- gia. Sabe-se que tanto o am- biente como tragos genéticos s20 fatores cruciais para 0 desenvolvimento do com- portamento patolégico: a0 mesmo tempo em que estu- dos de familia com gémeos mostram que 0 TOC é fa- milial’ ¢ depende em gran- de parte do ambiente para o * © que sgnlica dizer que a presenga de um individuo dafamilia acometide peo transtorno aumentaa proba bilidade dea doenga ser encontrada em outro parente 232 Fuentes, Malloy-Dinz, Camargo & Cosenza (orgs.) seu desenvolvimento (Nestadt et al., 2000), eles também apoiam o possivel envolvi- mento de fatores genéticos no transtorno. ‘Um exemplo disso € a maior concordancia de diagnéstico de TOC para gémeos mono- Zigéticos quando comparados a dizig6ticos (Pauls, 2010) 0 TOC apresenta marcante heteroge- neidade em relagao a sua apresentagao cli- nica. Os principais fatores que podem va- riar sao (Abramowitz et al, 2009): a) os sintomas, que vio desde checagem até rituais de lavagem ou organizagao excessivas; b) padrao de comorbidades, entre as quais a depressao € a mais frequente; ©) aidade de infcio dos sintomas; 4d) ahistéria familiar; e ©) aevolucao ea resposta ao tratamento. Essa grande variabilidade é postulada como responsével por introduzir uma alta quantidade de rufdo nos estudos focados na avaliagao do funcionamento cognitivo, bem como naqueles que buscam identifi- car biomarcadores (genéticos ou de neuroi- magem). Isso se configura, portanto, como uma importante barreira para a identific: ‘20 de resultados consistentes, o que se re- flete na grande diversidade de resultados encontrada na literatura NEUROBIOLOGIA DO TRANSTORNO Estudos fisiopatol6gicos consideram 0 TOC o resultado nao de um proceso degenerati- vo do cérebro, posto que na maioria das vezes se inicia durante a infincia ou ado- lescéncia, mas provavelmen- te de processos que ocorrem durante 0 neurodesenvol- vimento (American Acade- my of Child and Adolescent Pychiatry [AACAP], 2012). Estudos fisiopatologicos.con- Pee eed de um processo degenerativo a cérebro, posto que na maio- Pe een ee Oooo n CeCe ad CC Re Diversas linhas de evidéncias, sobretudo os estudos de imageamento cerebral iniciados no fim dos anos 1980, contribuiram com grande parte do conhecimento neurobiol6- gico do TOC. Esses estudos de neuroimagem foram influenciados pela revisio de Alexander, De Long ¢ Strick (1986) sobre a descrigéo do funcionamento de cinco algas cértico- -estriado-talamicas, segregadas e paralelas, que conectam o cértex frontal aos ganglios da base. Entre esses circuitos, estao: a) aalga motora; b) aalca oculomotor; ©) um citcuito envolvendo o cértex pré- -frontal dorsolateral (CPFDL); 4) um circuito envolvendo o cértex orbi- tofrontal (COF) lateral e 0 micleo cau- dado; ¢ ¢) um timo circuit conectando o cértex do cingulo anterior (CCA) ¢ 0 estriado ventral. Nos estudos de neuroimagem do ‘TOC, as trés iiltimas algas parecem estar implicadas em sua fisiopatologia Segundo o modelo ncurobiolégico, a manifestacao dos sintomas estaria liga- da 4 hiperatividade de regides do circuito cértico-estriado-pélido-talamico-cortical (CEPTC) (Fig. 18.1). Primeiramente, esse circuito foi postulado por estudos de neu- roimagem funcional em estado de repouso comparando a atividade cerebral de pacien- tes com TOC versus controles. Nesse caso, os pacientes apresentaram hiperativagdes em regides frontais do cérebro e nos gin- glios basais (Del Casale et al, 2011). Mais tarde, os estudos ‘com paradigmas de provoca- ‘sao de sintomas, nos quais os pacientes sio confrontados com os estimulos que lhes ‘causam aversio — por meio da presenga de fotos ou dos 233 Neuropsicalogia proprios objetos -, também corroboraram © modelo das vias CEPTC. Dois estudos com técnicas diferentes, um utilizando to- mografia por emissio de pésitrons (PET), outro, ressonancia_magnética funcio- nal (RMf), mostraram um padrao de flu- xo sanguineo ¢ de ativasao cerebral, ain- da mais acentuado na rede frontoestriatal quando os pacientes tinham seus sintomas agravados, Isso ocorreu no cértex pré-fron- tal, em especial na sua porgao mais orbital =, 0 COF ~ eno CCA, mas também em re- gides como amigdala, télamo e nticleos cau- dado ¢ lentiforme (Mataix- -Cols et al., 2004; Rauch et al,, 1994), Depois desses tra- balhos, intimeros outros, uti- lizando neuroimagem estru- tural e funcional, também Cortex frontal Corpo estriado Globo pélido! ‘Substancia negra =) -—* FIGURA 18.1 Imagem lustrando as ves docircuitoCEPTC, As setas indicam as vias que aparecem excitadas nos pacientes com TOC, geralmente mediades pr glutamato, ‘enquanto os “Ts” epresentam as vies inibidas, mediadas or GABA. Fonte: Adaptada de Kalvae Swed (208) ee Circuito CEPTC é a principal via Sek CoCo aa Pris mostraram regides envolvidas no circui- to CEPTG, sendo que 0 COF ¢ uma das ‘reas mais consistentemente estudadas e re- portadas nas pesquisas (Rotge et al, 2009). Por fim, evidéncias de pesquisas longitu- dinais com neuroimagem funcional, antes ¢ depois do tratamento, indicam reducao da ativagao no COF apés o tratamento, 0 que leva a associagao da hiperativacao des- sa dea a gravidade dos sintomas (Saxena et al,, 1999). Portanto, 0 apanhado dessas evidén- cias e de outras, provindas de estudos neu- roanatémicos, neurocirirgi- cos, neurofarmacolégicos neurofisiolégicos, leva a crer que a alga CEPTC estaria di- retamente ligada & sintoma- tologia do TOC. Ainda as- sim, é importante ressaltar que 0 citcuito CEPTC é a principal via en- volvida nos modelos fisiopatol6gicos atuais do TOC, mas nio a tinica, Estudos recen- tes de neuroimagem e neuropsicologia in- dicam 0 envolvimento de outras éreas cere- brais na fisiopatologia do transtorno, como, por exemplo, regides limbicas (amigdala, hipocampo e insula), citcuitos frontotem- poropatietais e frontocerebelares, corpo ca- oso e hipéfise (Menzies et al., 2008; Milad & Rauch, 2012). NEUROPSICOLOGIA DO TRANSTORNO Embora a neuropsicologia tenha se desen- volvido com o objetivo de avaliar as fungdes cognitivas e associé-las ao funcionamento cerebral, essa tarefa é extremamente com- plexa. Esse é um dos motivos pelos quais os resultados de estudos neuropsicolégi- cos no campo da psiquiatria tém sido tao inconsistentes nos tiltimos tempos, Outro, fator complicador é 0 fato de o TOC ser um transtorno heterogéneo, com diferen- tes apresentagées. Além dos fatores limi- tantes, uma importante lacuna na literatura 234 Fuentes, Malloy-Dinz, Camargo & Cosenza (orgs.) neuropsicolégica diz respeito & natureza dos déficits cognitivos no TOC: se sua pre- senga deve ser considerada ‘como um trago ou um estado associado aos sintomas (Rao, Reddy, Kumar, Kandavel, & ‘Chandrashekar, 2008). A de- finigao de teaco sugere que 0 déficit cognitivo seja anterior € independente da sintoma- tologia; enquanto um estado relacionado a doenca aparece como conse- quéncia de sua sintomatologia, tendendo a melhorar coma remissao dos sintomas. Com o intuito de responder a essa questao, tém si- do feitos estudos envolvendo o tratamen- to do TOC, a avaliagao das fungdes cogniti- vas pré-mérbidas e até mesmo os parentes de primeiro grau nao afetados (endofensti- pos)” (Chamberlain & Menzies, 2009) Qs achados neuropsicolégicos mais consistentes indicam déficits em habilida- des visuoespaciais, na meméria e em fun- bes executivas, ou seja, processos de al- to nivel de complexidade, necessarios para a realizacao de um comportamento (meta dirigida), tais como planejamento, contro- einibit6rio e flexibilidade cognitiva (Kuelz, Hohagen, & Voderholzer, 2004). Entre essas fungdes, o controle inibitério, a flexibilida- de cognitiva e a meméria nao verbal foram propostos como possiveis endofendtipos para o TOG, tanto em estudos com familia- res nao afetados (Chamberlain et al., 2007; Menzies et al, 2007) como naqueles com pacientes em remissao de sintomas versus controles saudaveis (Rao et al, 2008). des verbais, Os endofenstipos, ou fendtipos intermedisios, sto -marcadores comportamentais oubiologicos de predis- posigdo genética, podendo ser uma medida cognitiva ‘So caracteristies altamente herdveis, que precisam estar associadas com a doenga e, a0 mesmo temp serem independentes do seu estado dlinico, ou seja, persistitem mesmo com amelhora dos sintomes, Além disso, devem ocozrer de mancira concomitante nos pacientes ¢ familiares de primeiro grau nao afetados. Pee CoC bal (inteligéncia), os pacien- tes com TOC nao aparentam ter Creer SOC eR eco Com relagao a0 nivel de funciona- mento intelectual global (inteligéncia), os pacientes com TOC nao apa- rentam ter diferengas quan- do comparados a controles, principalmente por conta de suas habilidades verbais Contudo, tendem a apresen- tar dificuldades nas habilida- des visuoespaciais, o que po- de ser notado em testes como “Cubos” do WAIS, Figura de Rey ou Teste de Selecao de Cartas de Wisconsin (WCST). Todas essas tarefas tém em comum o fato de serem nao verbais e, portanto, avaliarem fngdes mais proximamente ligadas ao he- misfério cerebral nao dominante (HCND), na maioria dos casos, o direito. Dois estudos longitudinais acrescen- tam evidéncias para a caracterizacao da hipotese de dificuldades em fungdes do HCND. No primeiro, uma coorte de 1.037 criangas prospectadas ao longo de 32 anos buscou obter informagies sobre 0 per- fil neuropsicolégico pré-mérbido de sujei- tos que desenvolveram TOC na vida adul- ta. Inicialmente, quando tinham 13 anos, os voluntérios foram avaliados por uma ba- teria de testes cognitivos; aos 32. anos, 700 desses sujeitos (68% da corte original) fo- ram teavaliados em relagao a0 diagnéstico de TOC. Os autores compararam o desem- penho neuropsicolégico dos participantes na infincia, dividindo-os entre aqueles que apresentavam TOC (n = 13) ¢ aqueles que nao tinham o diagnéstico (n = 687) na fa- se adulta. Ao fazer isso, constataram que os pacientes com TOC jé apresentavam, desde a infancia, déficits na copia ¢ na evocacao tardia da Figura de Rey, no subteste Matri- zes do WISC e em habilidades motoras, mas nao em atengio, inteligencia (QI) ou habi- lidades verbais (Grisham, Anderson, Poul- ton, Moffitt, & Andrews, 2009). Em outro estudo na mesma linha, Bloch e colabora- dores (2011) acompanharam 24 criansas, todas diagnosticadas com TOC, por sete 235 Neuropsicalogia anos. Verificaram que aquelas com maiores dificuldades na coordenagao motora fina e em praxia construtiva (Cubos) tinham mais chance de persistir com os sintomas duran- tea vida adulta, o que nao ocorreu com tes- tes de inteligencia e meméria. Os resultados de ambos os estudos podem servir como argumento de que os déficits neuropsico- Idgicos apresentados no TOC sao um tra- go do transtorno, uma vez que ja apareciam antes mesmo do inicio dos sintomas. Contudo, existem autores que defen- dem os déficits neuropsicolégicos como es- tado-relacionados @ doenga ¢ criticam 0 pequeno ntimero de pacientes com TOC nesses estudos (13 ¢ 24), argumentando que também hé relatos de individuos que melhoraram os seus desempenhos nos tes- tes neuropsicolégicos apés a remissio dos sintomas. Além disso, embora os resultados advindos dos estudos longitudinais sejam importantes por corroborar a hipétese de deficits cognitivos relacionados com fun- ‘bes ligadas a0 HCND, os estudos de neu- roimagem abordados anteriormente nao especificavam hemisférios no modelo das vias CEPTC. Uma possivel explicacéo al- ternativa para a preponderéncia dos acha- dos de déficits nao verbais no TOC seria a alta demanda de processos estratégicos que cesses estimulos recrutam, jé que, muitas vezes, sua natu- reza € mais abstrata ¢ com- plexa do que a dos estimulos verbais, aos quais se pode dar sentido e significado. Desse modo, mais con- sistentes com os achados de neuroimagem, estudos que sugerem prejuizos nas fungdes executivas dos pacientes com TOC sao abundantes na literatura (Kuelz et al, 2004), Nesses casos, falhas de organizagio ou no processo ini- bitério poderiam estar subjacentes aos sin- tomas do transtorno, como, por exemplo, quando o paciente comeca suas compulsoes eee ternativa para a preponderan- cia dos achados de TEE rae Pe ae de Cre ee Preece complexa do que a dos estimu- Pe ree CeCe ue? de checagem ou de organizacao ¢ nao conse- gue interrompé-as antes de chegar ao final. Tais déficits em fungoes executivas poderiam contribuir inclusive para o aparecimento manutengao dos sintomas do TOC, ja que falhas na atensi0 ou no proceso de codifi- cacao da meméria poderiam levar a checa- gem repetitiva ou outras compulsoes. Por fim, a meméria episédica vem sendo um dos principais achados de déficits cognitivos em estudos comparando pacien- tes com TOC a controles saudaveis (Rao et al,, 2008; Savage & Rauch, 2000). Em geral, os pacientes tém dificuldades para recordar informacdes que aprenderam, sejam elas de conteiido verbal ou nao verbal, como listas de palavras, figuras geométricas ou hist6- rias com contexto, Mesmo assim, os estudos ainda nao encontraram falhas na meméria para “autoacdes” (Chamberlain, Blackwell, Fineberg, Robbins, & Sahakian, 2005) ou para a reteng3o do contetido aprendi- do (Kashyap, Kumar, Kandavel, & Reddy, 2013). Isso indica que os déficits encontra- dos nos pacientes com TOC nao sao rela- cionados 4 meméria limbica."" Ao contré- rio, individuos com TOC nao apresentam dificuldades no reconhecimento de estimu- los apresentados previamen- te (Savage et al, 1996). Assim, a deficiéncia parece estar em outro setor da meméria que nao a evocacao. Um exemplo disso costuma ser observado nos rituais de checagem: em- bora o paciente saiba que jé checou e que jé conferiu o es- timulo, acaba ficando na dé- vida se 0 que verificou est, cry * Do inglés self actions: ages realizadas pelo préprio paciente "A meméria limbicaestéassociada ao lobo temporal medial, regito cassicamente associada a consolidagao mnémica ¢ que costuma ser deficitiria nos pacientes com deméncia, como a doenca de Alzheimer, que apresentam prejuizos na evocagao. 236 de fato, da maneira que deveria. Dessa ma- neira, surgiu a hipétese da mediacao, mais consistente com 0 modelo neurobiolégico do TOC, a qual é descrita a seguir. HIPGTESE DA MEDIAGAO Apresenga de estratégias du- rante o aprendizado afeta a subsequente evocagao dos es- timulos. Nesse sentido, quan- to mais “profunda” a codi- ficagéo, por mais tempo a informagao ser4 armazenada. Assim, para testar a hipétese de que dificul- dades no uso de estratégias organizacionais sdo, em grande parte, responséveis pelos dé- ficits mnémicos no TOC (hipstese da me- diacao), foram conduzidos estudos avalian- doa meméria episédica verbal nao verbal. 16 15] 4 13 eos nee) ae oe rer ons Oe eae co Cou Ena ecco Fuentes, Malloy-Dinz, Camargo & Cosenza (orgs.) Com relagéo a primeira, os auto- res avaliaram a meméria epissdica verbal de sujeitos com TOC utilizando o teste de meméria e aprendizado verbal California (CVET), que permite avaliar o grau de es- tratégia durante a apresentasao das pa- lavras. Para isso, basearam-se no indice de categorizagao semantica: se palavras da mesma categoria fossem evocadas subsequen- temente, isso seria um indi- cio de que os sujeitos reali- zaram maior categorizacao semantica durante 0 apren- dizado dos termos. Quan- do testados, os pacientes apresentaram dificuldades de aplicar a estratégia de cate- gorizacao semintica de modo espontineo, © que acarretou piores escores nas evoca- oes (Savage et al., 2000) (Fig. 18.2). Entre- tanto, é interessante notar que os pacientes n ' 10 9 it ake i Controls —] 2 ToC - a i $8388 §g 55 5BE SEs 3 E gEeei¢ 6 oe eeeres Evocagio Evocagao B imediata —tardia.-& condigoes é FIGURA 18.2 0 gréfico mostra o resuitado do desempento de pacientes (em pontihado) econtroles (linha continua) nos scores do CVLT. As barra representam o erro padrao da méia, Embora as memérias de curtae longo prazoestejam prejudicadas em todas as medidas nos pacientes com TOC, ees se beneficiam da evocagéo estruturada (por meio de pistas semnticas) e apresentam o reconhecimento semelhante ao dos controls. Fonte Savage ecolaboradores (2000). 237 Neuropsicalogia nao apresentaram dificuldades nos escores de reconhecimento, Além disso, a0 serem instruidos a utilizar estratégias organiza- cionais, com o intuito de melhorar a co- dificagio, obtiveram desempenho tio bom quanto o dos controles (Deckersbach, Otto, & Savage, 2000; Deckersbach et al, 2005). No campo da meméria epis6dica nao verbal, algo semelhante ocorre: quando ins- truidos a copiar uma figura geométrica complexa, como, por exem- plo, a Figura de Rey, os pa- < Diagonais —o1 Linha vertical = ——= 01 media Lina horizontal —— 0-1 mela Vericedo = 0a targus Amplitude da pontuagdo total — 0-6 FIGURA 18.3 Modelo para coreg80 do escare de planeja~ mento da Figura de Rey. Oescore varia de O26, e0retan- ula principal tem maior peso que as demaisestruturas. Foi demonstrado que uma maior pontuagao nesseescare de organizago prevé o desempenha dos partcinantes nas evocagéestarcias Fonte: Savage e colaboradores (1999) 238 Fuentes, Malloy-Dinz, Camargo & Cosenza (orgs.) sao primarios, mas, sim, mediados por di- ficuldades nas fungdes executivas (Savage et al., 2000). Isso significa que o desempe- nho aquém nos testes de meméria poderia set mais bem explicado por falhas na codi- ficagao dos estimulos, mais especificamen- te devido a falta de emprego de estratégias organizacionais adequadas. Essa dificulda- de em realizar estratégias durante a codifi- cacao dos estimulos esté de acordo com 0 modelo das vias CEPTC e com as disfun- ‘Oes de circuitos frontoestriatais. Além dis- so, embora alguns estudos nao tenham con- seguido replicar tais resultados, a hipétese da mediacao foi encontrada tanto para esti- mulos verbais como para nao verbais (An- derson & Savage, 2004) CONSIDERAGOES FINAIS Ainda nao ha conclusoes sobre os déficits neuropsicolégicos apresentados pelos pa- cientes com TOC serem estado ou trago-re- acionados ao transtorno: hé autores defen- dendo ambos os pontos de vista ¢ estudos com resultados que podem ser interpreta- dos de ambas as formas. De fato, & possi- vel que essa relacao seja manifesta de ambas as formas. Contudo, € consenso na literatu- ra que hé déficits importantes nas fungdes executivas ¢ em habilidades visuoespaciais, provavelmente relacionados as areas cere- brais envolvidas no modelo neurobiolégico do transtorno. Esses resultados sao eviden- tes nos testes de meméria verbal e visuoes- pacial em que sejam recrutadas estratégias de organizagao, como a Figura de Rey € 0 CVET: em vez de organizar as informacoes de maneira geral, os pacientes desenvolvem diividas e focalizam os detalhes, sem qual- quer hierarquia, o que dificulta a recupe- ragio, Isso poderia contribuir, por exem- plo, para os comportamentos de checagem. Em outras palavras, deficiéncias na utiliza~ ‘sao de estratégias de organizacao poderiam desencadear as duividas, os SOCs. Como esses fendmenos ocorrem em conjunto com acontecimentos ambientais que geram an- siedade, comportamentos ritualizados tam- bém poderiam representar uma forma de compensar os déficits de organizacio. Re- centemente, estudos vem sendo realizados com o objetivo de desenvolver técnicas es- pecificas de reabilitacao cognitiva, a fim de ajudar nao apenas os déficits cognitivos, mas também os SOCs. REFERENCIAS Abramowitz, J. S. Taylor, S., & McKay, D. 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